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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

Centro de Ciências Sociais e Aplicadas


Programa de Pós-Graduação em Administração de Empresas

Marineide de Oliveira Aranha Neto

Compreendendo a dinâmica de inclusão e/ou exclusão de alunos


bolsistas do ProUni

São Paulo
2014
Marineide de Oliveira Aranha Neto

Compreendendo a dinâmica de inclusão e/ou exclusão de alunos


bolsistas do ProUni

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Administração de Empresas da
Universidade Presbiteriana Mackenzie como
requisito parcial para a obtenção do título de Mestre
em Administração de Empresas.

Orientadora: Profa. Dra. Darcy Mitiko Mori Hanashiro

SÃO PAULO
2014
A662c Aranha Neto, Marineide de Oliveira
Compreendendo a dinâmica de inclusão e/ou exclusão de
alunos bolsistas do ProUni / Marineide de Oliveira Aranha
Neto - 2015.
187f.: il., 30 cm

Dissertação (Mestrado em Administração de Empresas) –


Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2015.
Orientação: Profª. Drª. Darcy Mitiko Mori Hanashiro
Bibliografia: f. 169-180

1. ProUni. 2. Diversidade. 3. Inclusão. 4. Identidade social.


5. Preconceito. I. Título.
CDD 302.35
Reitor da Universidade Presbiteriana Mackenzie
Prof. Dr. Benedito Guimarães Aguiar Neto

Decano de Pesquisa e Pós-Graduação


Profa. Dra. Helena Bonito Couto Pereira

Coordenadora Geral de Pós-Graduação Stricto Sensu


Profa. Dra. Angélica Tanus Benatti Alvim

Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Administração de Empresas


Prof. Dr. Walter Bataglia
Ao meu esposo Carlos Eduardo, aos meus filhos Cadu,
Gustavo e Flávia, e minha nova filha Gabriela,
pessoas que me apoiaram nessa longa jornada e
compreenderam minha necessária ausência.
Embora o Senhor vos dê pão de angústia e água
de aflição, contudo, não se esconderão mais os teus
mestres; os teus olhos verão os teus mestres.
Bíblia Sagrada, Isaías 30:20
AGRADECIMENTOS

A Deus eterno e imortal, invisível mas real a minha maior gratidão, pela sabedoria e
força, pela direção e, principalmente, por me incluir em sua família e dispensar sobre mim
todo favor e bondade, conduzindo minha vida e ajudando-me a alcançar meus objetivos e a
realizar meus sonhos.
À Profª. Dra. Darcy Mitiko Mori Hanashiro por conceder-me a honra de tê-la como
minha orientadora, por sua postura séria e profissional, por compartilhar seu extenso
conhecimento, por desafiar-me quando necessário e conter minhas angústias quando estas me
pareceram maiores do que a minha capacidade.
À banca examinadora, Profª. Dra. Patrícia Tuma Martins Bertolin e Prof. Dr. Luiz
Alex Silva Saraiva pelas contribuições feitas no Exame de Qualificação.
Às professoras Dra. Maria Luisa Mendes Teixeira e Dra. Silvia Marcia Russi de
Domenico pelas orientações e considerações emitidas durante os seminários de pesquisa.
Aos sujeitos de pesquisa pela disponibilidade e contribuição com este trabalho,
permitindo-me uma aproximação de suas vivências.
A todos os meus colegas de curso pela troca de experiências, especialmente à Julia
Kenski e Diogo Reatto, que me apoiaram e incentivaram em sala de aula. À minha amiga
Paula Pamplona de Castro, que trilhou esse mesmo caminho antes de mim, apontou em
vários momentos “o caminho das pedras” e me incentivou desde o início.
Aos meus colegas de trabalho, Márcia Núbia Araújo Vieira, Ricardo Bressan e
Aline Wiezel da Silva Vieira pela paciência, companheirismo e incentivo.
Ao Instituto Presbiteriano Mackenzie, por meio do qual obtive a concessão do
benefício da Bolsa de Mestrado.
De modo especial a Francisco Washington da Silva, Renato de Moraes Santiago,
Elisama Silva e a todos os funcionários da Instituição que me apoiaram durante essa
jornada, forneceram-me informações e orientações necessárias e abriram-me portas que
facilitaram o cumprimento desta proposta de pesquisa.
De modo muito particular agradeço ao amigo Flávio Viola Machado por ter me dado
a palavra certa no momento certo, palavra que fez toda a diferença para que eu chegasse ao
final desta jornada, tão desejada, mas ao mesmo tempo tão desafiadora.
À minha amiga Dra. Marina Moura pelo apoio, orientações e importante
contribuição para que eu pudesse finalizar essa etapa.
A todos os meus familiares, meu esposo Carlos Eduardo Aranha Neto, meus filhos,
pais e sogros por me incentivarem, me apoiarem e, acima de tudo, por me proporcionarem
acolhimento e sentimento de pertença, dada a importância de termos com quem contar,
principalmente quando nos vemos diante de obstáculos.
Nunca, nunca, nunca desista!
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Dissertações e Teses por ano de publicação ....................................................... 41
Tabela 2: Distribuição da Produção Acadêmica por Regiões ............................................ 42
Tabela 3: Distribuição de teses e dissertações por área de estudo ..................................... 44
Tabela 4: Motivos de encerramentos de matrículas de 2005 a 2012 .................................. 77

LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Vagas ofertadas em São Paulo e no Brasil de 2005 a 2013 ............................. 64
Gráfico 2: Vagas ofertadas e ociosas na IES pesquisada ................................................... 76

LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Composição dos conteúdos discursivos .............................................................. 127

LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Categorias de Conteúdo ................................................................................... 71
Quadro 2: Perfil geral dos respondentes ........................................................................... 78
Quadro 3: Legenda das siglas dos respondentes ................................................................ 79
Quadro 4: Características pessoais dos respondentes ......................................................... 95
Quadro 5: Similaridades e diferenças “Nós” e “Eles” ........................................................ 128
Quadro 6: Estratégias de autoinclusão dos alunos prounistas ........................................... 149
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BIRD Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento


CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CDES Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
COFINS Contribuição para Financiamento da Seguridade Social
ENADE Exame Nacional de Desempenho de Estudantes
ENEM Exame Nacional do Ensino Médio
FGV Fundação Getúlio Vargas
FIES Financiamento Estudantil
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
IES Instituição de Ensino Superior
IESP Instituição de Ensino Superior Privada
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
IPEA Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas
ISS Imposto sobre Serviços
INSS Instituto Nacional de Serviço Social
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação
MEC Ministério da Educação e Cultura
MP Medida Provisória
OATD Open Access Thesis and Dissertations
PCE Programa de Crédito Educativo
PDE Plano de Desenvolvimento da Educação
PIB Produto Interno Bruto
PIS Programa de Integração Social
PL Projeto de Lei
PNE Plano Nacional de Educação
PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PPP’s Parceria Público-Privado
PROUNI Programa Universidade para Todos
PUCs Pontifícia Universidade Católicas
SCIELO Scientific Electronic Library Online
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 17

2. REFERENCIAL TEÓRICO ......................................................................... 23

2.1 TEORIA DA IDENTIDADE SOCIAL ............................................................ 23

2.2 TEORIA DA AUTOCATEGORIZAÇÃO ....................................................... 28

2.3 ESTEREÓTIPOS, PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO ............................ 30

2.4 DIVERSIDADE E INCLUSÃO/EXCLUSÃO ................................................ 33

2.5 DELINEAMENTO DA PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE O PROUNI .. 40

2.5.1 Principais enfoques das Pesquisas ................................................................. 42

2.5.2 Principais áreas de Estudo.............................................................................. 44

2.5.3 Pesquisas na área de Educação ...................................................................... 44

2.5.4 Pesquisas na área de Serviço Social .............................................................. 45

2.5.5 Pesquisas na área de Psicologia ..................................................................... 45

2.5.6 Pesquisas na área de Administração ............................................................. 46

2.5.7 Publicações em Periódicos .............................................................................. 48

2.6 A EDUCAÇÃO SUPERIOR – CONTEXTO POLÍTICO, ECONÔMICO E


SOCIAL ........................................................................................................... 50
2.6.1 Breve Cenário das Ações Afirmativas nos Estados Unidos ........................ 51

2.6.2 Ações Afirmativas no Brasil ........................................................................... 53

2.6.3 Cenário Político-Econômico antecedente ao ProUni ................................... 56

2.6.4 Contexto Socioeconômico Brasileiro e a Desigualdade Social .................... 57

2.6.5 Contexto Político-Educacional antecedente ao ProUni ............................... 59

2.7 O PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS – PROUNI .................... 60

2.7.1 Critérios Seletivos............................................................................................ 62

2.7.2 O ProUni em números .................................................................................... 63

2.7.3 Críticas ao Programa ...................................................................................... 64

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.................................................. 66
3.1 MÉTODO DE PESQUISA .............................................................................. 66

3.2 TÉCNICA COLETA DE DADOS ................................................................... 67

3.3 SUJEITOS DE PESQUISA .............................................................................. 67

3.4 TÉCNICA DE ANÁLISE DE DADOS ............................................................ 69

3.5 CARACTERIZAÇÃO DA IES ....................................................................... 74


4. RESULTADOS ............................................................................................... 75

4.1. O PROUNI NA IES PESQUISADA ................................................................ 75

4.2 PERFIL DOS RESPONDENTES .................................................................... 77

4.2.1 Alunos prounistas de semestres iniciais ........................................................ 79

4.2.2 Alunos prounistas de semestres finais ........................................................... 80


4.2.3 Alunos não prounistas de semestres iniciais ................................................. 82
4.2.4 Alunos não prounistas de semestres finais ................................................... 82
4.2.5 Professores ....................................................................................................... 83
4.3 ANÁLISE DOS DADOS................................................................................... 83
4.3.1 Categoria: Importância e impacto do ProUni e da IES .............................. 84
4.3.1.1 O ProUni ........................................................................................................... 84
4.3.1.2 A IES ................................................................................................................. 87
4.3.2 Categoria: Quem são eles .............................................................................. 91
4.3.2.1 Contexto Familiar............................................................................................. 92
4.3.2.2 Características Pessoais................................................................................... 94
4.3.2.3 Base Educacional ............................................................................................. 95
4.3.2.4 Escolha da IES ................................................................................................. 96
4.3.2.5 Atividades profissionais .................................................................................... 98
4.3.3 Categoria: Quem eles dizem que são ............................................................. 99
4.3.3.1 Receios ............................................................................................................. 99
4.3.3.2 Identificação/não identificação ........................................................................ 101
4.3.3.3 Revelação voluntária/involuntária .................................................................. 103
4.3.4 Categoria: Obstáculos do Caminho ............................................................. 107
4.3.4.1 Período preparatório ....................................................................................... 107
4.3.4.2 Restrições Materiais ........................................................................................ 108
4.3.5 Categoria: Relações interpessoais ................................................................. 113
4.3.5.1 Impressões iniciais ........................................................................................... 113
4.3.5.2 Divisão em feudos ............................................................................................ 114
4.3.5.3 Trabalhos em grupo ......................................................................................... 117
4.3.5.4 Grupos de convivência (em sala de aula) ........................................................ 119
4.3.5.5 Grupo de atividades sociais ............................................................................. 121
4.3.6 Categoria: Nós e Eles ..................................................................................... 123
4.3.7 Categoria: Manifestações intergrupais ........................................................ 129
4.3.7.1 Estereótipos....................................................................................................... 129
4.3.7.2 Razões do preconceito ...................................................................................... 130
4.3.7.3 Manifestações de preconceito .......................................................................... 132
4.3.7.4 Discriminação .................................................................................................. 134
4.3.8 Categoria: Experiência de Exclusão ............................................................. 137
4.3.8.1 Comportamentos excludentes e experiências de exclusão ............................... 139
4.3.9 Categoria: Experiência de Inclusão .............................................................. 145
4.3.9.1 Comportamentos inclusivos e experiências de inclusão .................................. 146
4.3.10 Categoria: Professor – Um Agente ............................................................... 152
5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .............................................................. 157
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................... 165
REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 169
APÊNDICES ..................................................................................................................... 181
RESUMO

O ProUni é uma política pública federal e desde que foi institucionalizado, em janeiro de
2005, tem concedido bolsas de estudos integrais e parciais para estudantes de baixa renda em
instituições privadas de ensino superior. Tendo o Programa como objeto de estudo, o objetivo
geral deste trabalho foi o de compreender a dinâmica de inclusão e/ou exclusão do bolsista
ProUni no espaço acadêmico. De modo específicos buscou-se (a) entender as condições
socioeconômicas do aluno prounista; (b) investigar a existência de estereótipos, preconceitos
e discriminação na inclusão/exclusão dos alunos prounistas; (c) verificar as dimensões de
diversidade nas quais os alunos prounistas se reconhecem e são reconhecidos; (d) identificar
as estratégias utilizadas por esses alunos para serem inseridos no grupo; (e) verificar as
percepções do professor acerca dessa dinâmica de inclusão/exclusão e (f) analisar o papel dos
professores junto aos alunos prounistas. Foi realizada uma pesquisa qualitativa interpretativa
básica do tipo descritiva, tendo como sujeitos de pesquisa doze alunos bolsistas do ProUni,
seis alunos não prounistas e quatro professores do curso de Direito de uma mesma
universidade da cidade de São Paulo. Optou-se pela utilização de entrevistas semiestruturadas
e pelo método de análise de conteúdo, sob a perspectiva qualitativa, conforme proposto por
Bardin (2007). A partir análise das entrevistas emergiram dez categorias: (1) Importância e
impacto do ProUni e da IES; (2) Quem são eles; (3) Quem eles dizem que são; (4) Obstáculos
do caminho; (5) Relações interpessoais; (6) Nós e Eles; (7) Manifestações intergrupais; (8)
Experiência de inclusão, (9) Experiência de exclusão e (10) Professor – um agente. Em
função das dissimilaridades percebidas, esses alunos prounistas tornam-se vítimas de
preconceito e discriminação, manifestos principalmente quando da formação de grupos de
trabalho. Os resultados indicaram que as ocorrências de comportamentos desfavoráveis a um
sentimento de inclusão por parte dos alunos não prounistas são mais comuns do que
manifestações de comportamentos inclusivos. A autoinclusão tem sido uma estratégia de
inclusão adotada pelos alunos prounistas, sendo as características pessoais fatores importantes
para percepção de pertencimento ao grupo. Por meio do desempenho superior, esses alunos
conseguem destacarem-se, alcançar posições de prestígio, mobilidade e inclusão social.

Palavras Chaves: ProUni. Diversidade. Inclusão. Identidade social. Preconceito.


ABSTRACT

ProUni is a Brazilian federal public policy and since it was institutionalized in January 2005,
has awarded full and partial scholarships for low-income students in private institutions of
higher education. Having the program as object of study, the aim of this study was to
understand the dynamics of inclusion and / or exclusion of the ProUni fellow in the academic
space. Specifically we sought to (a) understand the socioeconomic conditions of prounista
student; (b) investigate the existence of stereotypes, prejudice and discrimination in the
inclusion / exclusion of prounistas students; (c) check the dimensions of diversity in which
prounistas students recognize and are recognized; (d) identify the strategies used by these
students to be included in the group; (e) verify the perceptions of teachers about this dynamic
inclusion / exclusion and (f) analyze the role of teachers along with the prounistas students. A
basic interpretive qualitative descriptive research, and as research subject twelve ProUni
fellows, six non-prounistas students and four professors of law from the same university in
the city of São Paulo was held. We opted for the use of semi-structured interviews and the
method of content analysis, the qualitative perspective, as proposed by Bardin (2007). From
analysis of the interviews revealed ten categories: (1) Importance and impact of ProUni and
IES; (2) Who are they; (3) who they say they are; (4) Barriers of the way; (5) interpersonal
relations; (6) Us and Them; (7) Demonstrations intergroup; (8) Experience of inclusion (9)
Experience of exclusion and (10) Teacher - an agent. According to the perceived
dissimilarities, these prounistas students become victims of prejudice and discrimination,
manifest especially when the formation of working groups. The results indicated that the
occurrence of unfavorable behavior to a feeling of inclusion by non-prounistas students are
more common than manifestations of inclusive behaviors. The self-inclusion has been a
strategy of inclusion adopted by prounistas students, and the personal characteristics
important factor for perception of belonging to the group. Through superior performance,
these students can excel yourself, achieve positions of prestige, mobility and social inclusion.

Key-Words: ProUni. Diversity. Inclusion. Social Identity. Prejudice.


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1. INTRODUÇÃO

Apesar de encontrar-se entre as dez maiores economias mundiais, o Brasil


permanece entre as nações com pior distribuição de renda, sendo necessário que políticas
públicas sejam articuladas para que se ofereça uma estratégia de inclusão social
(POCHMANN, 2003). Para Ribeiro (2006), na sociedade contemporânea a educação formal
constitui-se uma das mais importantes vias de mobilidade social, sendo a qualificação
educacional essencial para se alcançar posições de prestígio.
Com origem nos Estados Unidos, ações afirmativas têm sido empregadas a fim de
corrigir ou mitigar os efeitos ainda presentes da discriminação praticada no passado. Estas
têm por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais,
como a educação e o emprego (GOMES; SILVA, 2001).
De acordo com Lima (2010), a educação superior é o tema que mais mobiliza o
debate público sobre ações afirmativas; extensa produção acadêmica tem sido publicada
discutindo os princípios destas ações, bem como as políticas de cotas nas instituições de
ensino superior público. Políticas de ações afirmativas tomam como base para sua
implementação a extrema desigualdade racial brasileira no acesso ao ensino superior.
Dados acerca do sistema de ensino brasileiro, publicados nas versões de 2008 e 2011
do caderno Retratos das Desigualdades de Gênero e Raça, dão uma dimensão das
desigualdades existentes na educação do país. Constata-se que a média de anos de estudo para
brancos era de 8,4 anos, enquanto que entre os negros era de 6,7 anos, e a escolarização das
mulheres superior à dos homens. Mesmo que no período estudado tenha-se alcançado um
aumento médio de dois pontos percentuais no nível de escolaridade e as taxas de
analfabetismo tenham sido diminuídas, a redução das desigualdades ocorre de forma lenta.
A inclusão social figura como um dos eixos estratégicos da política educacional do
Ministério da Educação e Cultura (MEC), e a propagação da existência de uma educação
inclusiva no país vem sendo difundida nas campanhas de marketing utilizadas pelo Governo
Federal. Moehlecke (2009) chama a atenção para o slogan “Brasil, um país de todos”, que
serviu de marca de governo, e que, para o setor educacional, ganhou versões tais como
“Educação para todos” e "Todos juntos para democratizar a educação", que tentam transmitir
essa mensagem.
Regulamentado por Medida Provisória em 2004 e institucionalizado pela Lei nº
11.096 de 13 de Janeiro de 2005, o Programa Universidade para Todos (ProUni) foi criado
com o objetivo de possibilitar o acesso de jovens de baixa renda ao convívio acadêmico e à
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formação universitária. Estabelecido com a proposta de oferecer bolsas de graduação,


integrais ou parciais, para alunos que tenham estudado em escolas públicas ou em escolas
privadas na condição de bolsistas integral e que se enquadrem no critério de renda per capta
familiar, o programa também estipula obrigatoriedade que parte das bolsas seja direcionada a
ações afirmativas, por meio de cotas para portadores de deficiência, negros e indígenas.
Desde sua criação até o processo seletivo do primeiro semestre de 2013, o programa
já atendeu mais de 1,2 milhão de estudantes, sendo 68% com bolsas integrais (PROUNI,
2013).
Com base no número de estudantes atendidos desde seu lançamento, Lima (2010)
afirma que, em termos redistributivos, o ProUni é a política afirmativa de maior impacto
social. Seguindo uma tendência crescente, o número de vagas ofertadas já foi praticamente
dobrado desde seu lançamento, em 2005. No ano de 2013 foram ofertadas 252.374 bolsas
integrais e parciais (MEC, 2013).
Ao longo dos nove anos transcorridos desde o lançamento do programa ProUni,
muitos outros trabalhos têm se voltado para o tema, em diferentes áreas do saber e por
diferentes lentes teóricas. Uma revisão nos bancos de teses e dissertações da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e da Open Access Thesis and
Dissertations (OATD), utilizando o verbete “ProUni” como critério de busca, foi apontada a
existência de 57 dissertações e 23 teses neste tema. As produções estão predominantemente
concentradas na área de Educação, que responde por 58,75% do total de trabalhos, seguido de
Serviço Social, área em que se concentra 7,5% da produção total. As áreas de estudo de
Ciências Sociais, Sociologia e Administração respondem, cada uma, por 5% do montante de
pesquisas, com quatro publicações em cada uma das áreas.
A partir da implementação do Programa, em 2005, grandes debates têm sido criados
em torno deste e despertado grande interesse do meio acadêmico. Carvalho e Lopreato (2005)
discutiram os aspectos políticos e econômicos que permeiam o referido programa. Em tom
crítico, Carvalho (2005) argumenta que, por trás do discurso de caráter social atribuído ao
ProUni, existe um jogo político e uma lógica financeira que, na opinião da autora, são
contrários aos interesses de parte significativa da população, que demanda acesso a
oportunidades de ensino de qualidade.
O programa tem sido analisado sob a ótica de políticos – como explorado por Corcini
(2007), que apresenta a visão de seis deputados federais acerca do reflexo das políticas
educacionais no abrandamento das desigualdades sociais, de professores e gestores (STIEG,
2009; OLIVEIRA, 2009) e, principalmente, sob a percepção dos alunos bolsistas
19

(GERALDO, 2010; FERREIRA, 2012a; SENA, 2011). Sob diferentes abordagens, as


diversas áreas do saber buscam compreensões do mesmo programa.
Dentre os temas das pesquisas, o impacto do ProUni na vida dos egressos é a ênfase
predominante. Também são discutidas as dificuldades na trajetória dos alunos (ALMEIDA,
2009; ESTACIA, 2009), acesso e permanência, abordando os principais obstáculos, as
estratégias utilizadas e os estímulos recebidos (ROCHA, 2008a; SENA, 2011), o desempenho
acadêmico (ALVES, 2008; LIRA, 2010; PONTES, 2011), a inserção no mercado de trabalho
(COSTA, 2012) e as condições socioeconômicas e socioculturais dos alunos bolsistas
(COUTO, 2008; COSTA, 2012).
O ProUni, enquanto Política Pública de acesso ao ensino superior, é a segunda
temática mais discutida entre os trabalhos de pesquisa, evidenciando que o programa deixa
margem para muitas críticas. Os trabalhos de Mello (2007) e Valle (2009) ampliam o debate
acerca do tema, questionando o jogo de interesses políticos e o direcionamento dado às
políticas educacionais, no sentido de conduzi-las a uma privatização da educação superior no
Brasil.
Em sete do total de trabalhos pesquisados, o programa ProUni foi o objeto de análise.
Sob uma perspectiva econômica, Pontes (2011) discutiu o valor da bolsa, buscando identificar
diferenças entre o desempenho acadêmico de alunos bolsistas parciais e integrais. A
percepção dos alunos acerca do programa foi investigada por Santana (2009), Oliveira (2012)
e Melo Neto (2011). O processo de implantação do Programa dentro de uma Instituição de
Ensino Superior (IES) foi estudado por Silva (2007b).
Realizadas buscas nas revistas acadêmicas Qualis A1 a B2 da área de Administração
e no portal da Scientific Electronic Library Online (Scielo), verificou-se que poucos artigos
relativos ao tema ProUni têm sido publicados. Na área de Administração, apenas um artigo
foi identificado, enquanto que, no total das áreas que envolvem Educação, Ciências Políticas e
Sociais, foram encontrados 13 artigos abordando o programa. Quanto às temáticas dos
estudos, tem sido dada maior ênfase à discussão da inclusão social (ALMEIDA et al. , 2010;
CARVALHO, 2007; OLIVEIRA et al. , 2012) e ao impacto da implantação do programa nas
Instituições de Ensino (OLIVEIRA; MOLINA, 2012; PELEIAS et al. , 2012) e na vida dos
alunos (APRILE; BARONE, 2008).
Por dar margem a muita polêmica, o discurso de democratização do acesso ao Ensino
Superior utilizado pelo Governo para criação do programa é questionado em pesquisas de
Almeida (2009), Martins (2011) e Valle (2009), enquanto os trabalhos de Simões (2011) e
20

Rizzo (2010) enfocam o programa enquanto Ação Afirmativa como possibilidade de inclusão
social/profissional e oportunidade de mobilidade social.
A inclusão do negro também tem recebido atenção dos pesquisadores. Em sua
dissertação, Leite (2009) discutiu a construção da identidade do bolsista e constatou que, na
instituição por ele pesquisada, a ausência de iniciativas que promovam o reconhecimento do
estudante cotista desfavorece o processo de constituição da identidade racial do bolsista.
Sotero (2009) analisou a trajetória de estudantes negros da cidade de Salvador, indicando que
a abrangência do programa demanda observação, em direção a uma educação inclusiva que
possibilite o acesso de diferentes classes sociais ao ensino superior.
Na opinião de Carvalho (2006), o benefício que o ProUni pode trazer para muitos
alunos está mais relacionado aos aspectos simbólicos do diploma. Além disso, argumenta que
as chances reais de ascensão são para os poucos que estudarem em instituições privadas de
qualidade.
Em um país como o Brasil, que é reconhecido internacionalmente por seu grau de
desigualdade social (POCHMANN, 2003), a busca por uma qualificação profissional se
apresenta como uma oportunidade para a mobilidade social e construção de uma identidade
social mais positiva; no entanto, ao mesmo tempo, implica uma árdua trajetória para os
bolsistas provenientes das classes mais baixas. Do ingresso à faculdade até a conclusão do
curso, diferentes desafios precisam ser superados, e para que a democratização e a inclusão
sejam efetivas são necessárias políticas voltadas para a permanência dos estudantes, uma vez
que as dificuldades dos bolsistas, seja no processo de aprendizagem ou no âmbito financeiro,
não desaparecem apenas com o ingresso na graduação (ROCHA, 2012).
No trabalho de Ferreira (2012b), o autor verificou haver diferenças no desempenho
de bolsistas ProUni, constatando que os jovens de cor branca são menos defasados em relação
ao nível de desempenho, e que, consideradas as notas médias dos estudantes, os alunos com
bolsa integral apresentam desempenho superior ao dos outros grupos. Tendo em vista que o
ProUni insere um grupo social diverso na universidade, tanto a experiência subjetiva dessa
inserção como a dinâmica envolvida nas interações sociais podem afetar a vida do aluno
prounista.
Atentando para a experiência acadêmica dos alunos prounistas, o trabalho realizado
por Santos (2011) aponta que a desigualdade social vivida na universidade pelos alunos
bolsistas cria, entre outros, o sentimento de inferioridade, que estimula tanto a busca de seus
pares quanto a reclusão e a negação de suas origens. Interagindo em ambiente acadêmicos no
quais as diferenças sociais se evidenciam, esses alunos podem, eventualmente, ser vítimas de
21

preconceito, conforme indicam três dos 30 alunos bolsistas do ProUni questionados por
Nogueira (2013).
Embora a revisão dos trabalhos já produzidos mostre que o ProUni vem sendo
amplamente pesquisado e a inclusão e/ou exclusão social dos alunos bolsistas tenha sido
estudada, a abordagem teórica pela qual este trabalho buscará compreender a experiência de
inclusão dos prounistas se faz diferenciada. As lentes teóricas das relações intergrupais, da
diversidade e da inclusão enquanto experiência individual de pertença a um grupo social,
utilizando o ProUni como objeto de estudo, constitui-se uma nova proposta de pesquisas
frente às anteriormente realizadas. Considera-se relevante aprofundar conhecimentos sobre a
experiência pessoal dos alunos prounistas, bem como identificar a percepção dos alunos não
prounistas e dos professores com relação à experiência de inclusão daqueles dentro de uma
IES privada, de primeira linha.
Considerando a importância da educação para a formação de uma sociedade e para o
desenvolvimento de um país, neste momento em que políticas públicas possibilitam o acesso
de camadas de baixa renda ao ensino superior julgamos relevante abordar esse acesso de
alunos de classes sociais menos favorecidas ao espaço acadêmico, bem como discutir o
sentimento de inclusão e/ou exclusão do aluno prounista. Busca-se também a ampliação dos
estudos relativos à diversidade e à inclusão desses grupos minoritários, refletindo sobre a
dinâmica interpessoal que se estabelece durante a trajetória acadêmica desses alunos, bem
como o impacto dessas interações na percepção de pertença deles, que ainda é uma questão
pouco explorada.
Diante do panorama de trabalhos já realizados sobre o ProUni, destacamos como
inquietação fundamental desta pesquisa o seguinte questionamento: Como ocorre a dinâmica
de inclusão/exclusão do bolsista ProUni em uma universidade privada da cidade de São
Paulo?
Decorrente deste problema de pesquisa, o objetivo geral é compreender a dinâmica
de inclusão e/ou exclusão do bolsista ProUni no espaço acadêmico. Dentre os objetivos
específicos, esta pesquisa se propõe a entender as condições socioeconômicas do aluno
prounista, investigar a existência de estereótipos, preconceitos e discriminação na
inclusão/exclusão dos alunos prounistas; verificar as dimensões de diversidade nas quais os
alunos prounistas se reconhecem e são reconhecidos; identificar as estratégias utilizadas por
esses alunos para serem inseridos em grupos; verificar as percepções do professor acerca
dessa dinâmica de inclusão/exclusão e, por fim, analisar o papel dos professores junto aos
alunos prounistas.
22

Considerando a importância das relações intergrupais, a experiência de pertença ou


exclusão, a aceitação ou a discriminação e o preconceito, e a percepção de como se formam
os vínculos sociais durante a formação acadêmica dos alunos prounistas são aspectos
relevantes a serem investigados.
Com o objetivo de responder ao problema de pesquisa proposto, este trabalho está
estruturado em uma introdução e quatro capítulos. Iniciado com o referencial teórico, o
capítulo 1 traz as teorias de fundamentação deste trabalho, que são Teorias da Identidade
Social e da Autocategorização, os conceitos e diferenciações entre estereótipos, preconceito e
discriminação, diversidade e inclusão/exclusão; também apresenta uma revisão de literatura
sobre o tema do ProUni e o contexto histórico antecedente à criação deste. No capítulo 2, são
expostos os procedimentos metodológicos, sujeitos de pesquisa, técnica de coleta de dados,
método de análise e caracterização da IES pesquisada. Em seguida, no capítulo 3, é feita a
análise dos dados e discussão dos resultados. Posteriormente, no capítulo 4, as considerações
finais, as limitações do estudo e recomendações para futuras agendas de pesquisa são
apresentadas.
23

2. REFERENCIAL TEÓRICO

Inicialmente apresenta-se uma compreensão da experiência intergrupal a partir da


teoria da identidade social e teoria da autocategorização. São abordados estereótipos,
preconceitos e discriminação, sendo apresentado o conceito de diversidade e, por fim,
alcançando o nível mais micro, o de senso psicológico da experiência de inclusão e/ou
exclusão.

2.1 TEORIA DA IDENTIDADE SOCIAL

Primeiramente introduzida por Tajfel (1982), a teoria da identidade social é definida


como o conhecimento do indivíduo de saber-se pertencente a certos grupos sociais, bem como
o significado emocional e o valor que há, para ele, em ser membro do grupo. A ideia básica da
teoria é a de que as categorias sociais às quais pertencemos são determinantes para a formação
do nosso autoconceito, prescrevem formas de pensamento e comportamentos e, ao mesmo
tempo, fornecem referencial para comparação com outros grupos (HOGG; TERRY, 2001).
Hogg e Terry (2001) apontam que, de acordo com essa teoria, a identidade social e
os comportamentos intergrupais são guiados pela busca de uma identidade social de valor
positivo, por meio da obtenção de uma distinção intergrupal positiva que, por sua vez, é
motivada pela necessidade de autoestima positiva.
Faz parte do escopo da Teoria da Identidade Social buscar compreender as razões
que levam os indivíduos a desejarem pertencer a grupos de mais alto status, em que situações
os membros dos grupos agem e que ações eles empreendem para tentar mudar situações com
as quais não estão satisfeitos. Além disso, a teoria atenta também para quais são as estratégias
individuais adotadas para mudar as posições desses indivíduos (TAYLOR; MOGHADDAM,
1994).
A análise das relações interpessoais por meio da teoria identidade social parte do
pressuposto de que indivíduos são motivados a alcançar uma identidade social mais positiva;
concepção esta que se estende também para o nível intergrupal, compreendendo que os
indivíduos são motivados a pertencer a grupos positivamente avaliados, adotando estratégias
comportamentais a fim de mudar sua condição quando percebem a própria identidade como
inadequada (TAYLOR; MOGHADDAM, 1994).
Nessa perspectiva teórica, compreende-se que ao agirem nos grupos os indivíduos
têm como objetivo alcançar uma identidade social mais positiva, de modo que o desejo de
24

alcançar melhor status funciona como um “motor” para as ações. Por meio da comparação
social o indivíduo se referencia, obtendo uma avaliação de sua posição e status ocupado
perante o grupo, o que reduz sua incerteza e permite uma autoavaliação mais acurada
(TAYLOR; MOGHADDAM, 1994). Tajfel (1982) propõe que, no nível intergrupal,
comparações também possibilitam a compreensão do valor e status relativo do grupo, bem
como status e valor adquirido em virtude de ser membro deste, exercendo importante papel
em modelar as ações dos indivíduos.
Para que se tenha uma compreensão básica da Teoria da Identidade Social, de acordo
com Taylor e Moghaddam (1994) existem quatro conceitos considerados fundamentais:
categorização, identidade e comparação social e distintividade psicológica do grupo. Esses
conceitos serão aqui apresentados e brevemente sintetizados.
Funcionando como uma ferramenta cognitiva a categorização permite que o
indivíduo estruture seu ambiente social, definindo seu lugar neste ambiente (TAYLOR;
MOGHADDAM, 1994). As categorizações sociais dizem respeito aos processos de
categorização de pessoas. Hogg e Abrams (2001) assinalam que, uma vez que classificações
são feitas com base nas similaridades e diferenças em relação a quem está categorizando;
pessoas podem ser percebidas como membros da mesma categoria a qual o indivíduo pertence
(endogrupo) ou como de uma categoria diferente (exogrupo).
A identidade social individual diz respeito ao conhecimento do indivíduo, de saber
que pertence a certo grupo social e ao valor agregado ao ser membro desse grupo, quer em
termos positivos ou negativos. Por essa compreensão conceitual, a participação no grupo é
vista a partir da percepção subjetiva do indivíduo, sendo comum aos membros deste destacar
e dar importância aos valores do grupo de pertença. O pressuposto básico é que os indivíduos
são motivados a alcançar uma identidade social mais positiva (TAYLOR; MOGHADDAM,
1994).
A corrente europeia da Psicologia Social considera que as sociedades atuam como
forças em conflito, mais do que em coesão e, e que em virtude disso, dentro dos grupos
sociais ocorrem competições e lutas a fim de aprimorar suas próprias posições, em contextos
de busca de mudanças das condições sociais. A Teoria da Identidade Social postula que os
membros do grupo almejam uma identidade para seu grupo que seja mais distinta e positiva
quando comparada a de outros grupos, de forma que as relações estabelecem mais por
competição e busca de distinção do que por cooperação (TAYLOR; MOGHADDAM, 1994).
Dentre os pressupostos da teoria da identidade social, o processo sócio-cognitivo de
autoaprimoramento é considerado fundamento importante para o entendimento das relações
25

intergrupo, pois compreende que os indivíduos têm necessidade de serem vistos de forma
positiva em relação a outros relevante. Isto é feito por meio de comparações, geralmente
favorecendo aqueles que pertencem ao ingroup (HOGG; TERRY, 2001). Analogamente,
Triands (2003) considera que o etnocentrismo dos seres humanos constitui uma barreira para
as relações intergrupos, uma vez que a cultura própria é utilizada como padrão para julgar
outras culturas. Além disso, aquilo que se passa na própria cultura é considerado como
"natural", "normal" e "correto" e os costumes ingroup como se fossem universalmente
válidos, sem questionamentos.
Competição e conflito são aspectos comuns nas relações intergrupais, pois ao buscar
alcançar posição superior para o endogrupo, comportamentos discriminatórios intergrupos são
manifestos. Situações de potenciais mudanças sociais expressam a natureza dinâmica da
teoria, pois os indivíduos pertencentes aos grupos dominantes desejam e lutam para manter o
status de condição comparativamente superior, enquanto os integrantes dos grupos de
identidade social menos adequada desejam alcançar alguma mudança de status, a fim de
aprimorar a identidade grupal para uma condição superior (TAYLOR; MOGHADDAM,
1994).
A simples percepção de possuir uma identidade social inadequada não é condição
suficiente para se conquistar uma mudança de posição. De acordo com Taylor e Moghaddam
(1994), dois fatores são fundamentais para que membros dos grupos em desvantagem
conquistem melhor situação intergrupo: a princípio, que estes acreditem que a atual situação
pode ser mudada e a posição hierárquica alterada (estabilidade/instabilidade) e, em segundo
lugar, a extensão em que o intergrupo vê a situação posta como única e justa
(legitimidade/ilegitimidade).
Havendo, no indivíduo, uma percepção cognitiva de possíveis alternativas para a
alteração de seu status, de acordo com Taylor e Moghaddam (1994), há quatro estratégias de
mudanças intergrupos possíveis para serem adotadas:
 O grupo subordinado tenta ser absorvido pelo grupo dominante;
 Redefinir, como positivas, características do grupo anteriormente
avaliadas como negativas;
 Criação de novas dimensões, que não tenham sido previamente
utilizadas, para comparação e avaliação, a fim de obter posição mais positiva;
 Competição direta com o grupo dominante.
26

Os referidos autores assinalam que todas essas estratégias são passíveis de reações
dos grupos dominantes, provocando conflitos e embates a fim de assegurar o status de
dominância. Em circunstâncias nas quais os grupos em desvantagem não percebem
alternativas cognitivas que permitam a alteração da condição do grupo, estratégias específicas
podem ser adotadas por indivíduos, que saem do grupo em desvantagem visando alcançar
posições em grupos melhor avaliados (TAYLOR; MOGHADDAM, 1994).
As respostas à possibilidade de mudanças podem se dar enquanto grupo ou
indivíduo. Taylor e Moghaddam (1994) ressaltam a distinção entre dois conceitos que
diferenciam essas estratégias de mudança: a mobilidade e mudança social. Mobilidade social
consiste em uma “estruturação subjetiva do sistema social” e pressupõe que o sistema é
flexível e permeável e não ameaça a posição relativa dos grupos, possibilitando, assim, uma
mobilidade de partes individuais. A mudança social, no entanto, refere-se ao modo subjetivo
de estruturar o sistema social no qual o indivíduo vive; diz respeito às crenças que delimitam
as fronteiras do grupo de pertença, sem possibilitar movimentos para fora desse a fim de
alcançar melhores posições ou condições de vida, a menos que a mudança se dê enquanto
grupo como um todo. Mudança social implica necessariamente confrontação intergrupo, pois
a busca por uma posição melhor encontra reação dos grupos dominantes, que querem garantir
a manutenção de suas posições favoráveis.
Mesmo em ambiente ausente de conflitos explícitos ou institucionalizados ou de
competição entre grupos, estes tendem a manifestar comportamentos mais favoráveis em
relação ao endogrupo. O grupo social provê aos seus membros uma identidade social positiva
por meio de comparação e distinção em relação a outros grupos, acerca de características
distintivas que tenham claro valor diferencial.
No campo da Psicologia Social, sob a influência da Teoria da Identidade Social, em
1984, Taylor e McKirnan desenvolveram um modelo de cinco estágios das relações
intergrupais. Apresentado por Taylor e Moghaddam (1994), o modelo busca abranger tanto
processos macro quanto micro sociais na interpretação do comportamento intergrupal,
partindo do pressuposto de que raramente os relacionamentos sociais ocorrem entre dois
grupos com status perfeitamente iguais.
Para nomear a condição dos diferentes grupos esses autores utilizam os termos
“vantagem” e “desvantagem”, pois consideram que termos como “majoritário” e
“minoritário” utilizados por alguns pesquisadores fazem referência a números, enquanto a
expressão “dominante” e “subordinado”, utilizados por Tajfel (1982), sugerem que o próprio
27

grupo é responsável pela posição ou status que ocupa; desconsidera-se, portanto, que, mais do
que traços grupais, existem condições externas aos grupos responsáveis pelas desigualdades.
Os cinco estágios da dinâmica intergrupos propostos por Taylor e McKirnan (1984)
apud Taylor e Moghaddam (1994) abrangem:
1. Relações intergrupais claramente estratificadas – Não há possibilidade de
mudanças entre as classes, pois o status de cada grupo está rigidamente estabelecido com base
em características inerentes ou atribuídas a seus membros; é próprio aos integrantes de grupos
em desvantagem imputar a si mesmos a reponsabilidade por estar em posição inferior.
2. Ideologia individualística – A base de critério passa a ser as conquistas, as
habilidades e competências do indivíduo, que tem uma percepção do grupo como aberto e,
portanto, considera que há possibilidade de mudança; essa mobilidade se dará de forma
individual e por seu próprio esforço e capacidade, o que isenta o grupo em vantagem de
qualquer responsabilidade em relação à sua posição atual.
3. Mobilidade social individual – Ocorre uma tentativa dos membros do grupo em
desvantagem de migrar para o grupo em vantagem e, para tal, embora retenham fatores do
grupo em desvantagem suficientes para manter sua própria identidade, passam a adotar
características do outro grupo a fim de serem aceitos como membros.
4. Aumento da consciência – Os indivíduos que passaram pelo terceiro estágio, mas
não obtiveram sucesso na tentativa de passar para o grupo em vantagem, retornam ao seu
grupo de origem e tentarão estimular uma ação coletiva; aqueles poucos que foram bem-
sucedidos passam a incorporar as normas do grupo em vantagem e tornam-se mais convictos
de que o sistema é justo e que, portanto, cabe aos outros membros conquistar os próprios
lugares.
5. Ação coletiva – É necessário que parte dos membros do grupo em desvantagem
tome consciência de que habilidades e esforços não são suficientes para que seu grupo
consiga a mobilidade desejada, que percebam que são injustamente discriminados. Uma ação
coletiva deverá ser empreendida e, estratégias de competição, de reavaliação de originalidade
deverão ser adotadas para que assim novas dimensões para comparação social sejam criadas,
novos papéis e novas percepções assumidas.
28

2.2 TEORIA DA AUTOCATEGORIZAÇÃO

A teoria da autocategorização é uma teoria cognitiva do comportamento dos


indivíduos no contexto grupal e, portanto, atenta para as mudanças que ocorrem do nível
pessoal para o social da identidade (TAYLOR; MOGHADDAM, 1994).
A categorização é considerada um processo cognitivo fundamental para a adaptação
do funcionamento humano, uma vez que possibilita uma simplificação das percepções e que
uma infinita variabilidade de estímulos existentes seja estruturada em um número distinto de
categorias. É um processo necessário e útil, pois reduz os processos cognitivos, possibilita que
estímulos muito diferentes sejam percebidos como se fossem idênticos (TRIANDS, 2003),
permitindo que pessoas respondam rapidamente a estímulos sem necessitar de avaliações
exaustivas. De forma efetiva, a categorização acentua a percepção de similaridades entre
objetos, possibilitando classificá-los em uma mesma categoria; ou de dissimilaridade,
diferenciando estímulos entre diferentes categorias (TAYLOR; MOGHADDAM, 1994).
Por meio desse processo cognitivo de categorização são delimitadas as fronteiras e
estabelecidos os aspectos relevantes utilizados para distinguir aqueles que pertencem ou não a
determinado grupo; além disso, por meio destas, os membros do exogrupo são percebidos
como mais homogêneos e os do endogrupo como mais heterogêneos.
A noção de protótipo é um conceito considerado central na teoria da
autocategorização. Segundo Hogg e Terry (2001) os protótipos são construídos a partir de
representações cognitivas das afirmações e atributos do grupo que são relativamente
consensuais; incorporam crenças, atitudes e sentimentos. Estabelecidos com base na
referência de um membro exemplar ou na definição de um tipo ideal de membro, se prestam a
fornecer suporte moral e validação aos integrantes do grupo.
Ao integrar o grupo o indivíduo deixa de ser visto como singular e passa a incorporar
o protótipo do grupo; deixa de ser uma personalidade individual e assume o self do grupo. Os
protótipos são formados pelo princípio do metacontraste, de forma que as diferenças do
intergrupo para o intragrupo são maximizadas. Portanto, a discriminação entre os grupos se dá
com base na menor diferença percebida, agrupando-se, num mesmo conjunto, os elementos
que, comparativamente, são menos diferentes entre si (HOGG; TERRY, 2001).
De acordo com esses autores, o ato de categorizar alguém como membro do grupo
transforma o modo como a pessoa é vista, uma vez que esta passará a ser percebida por meio
das lentes do protótipo. Ocorre uma despersonalização do indivíduo, enquanto singular, e este
assumirá as características do grupo de pertença, passando a ser visto como possuindo
29

atributos da categoria ou desse grupo. A despersonalização refere-se à mudança na


autoconceitualização e na base da percepção dos outros, havendo uma tendência a produzir
uma percepção favorável em relação ao endogrupo e uma percepção negativa ou degradante
em relação ao exogrupo.
A categorização social é ao mesmo tempo útil e necessária, porém, embora se
constitua um processo cognitivo simples, tem implicações profundas (ARONSON; WILSON;
AKERT, 2002), uma vez que por meio dela, são despersonalizados tanto os membros do
ingroup como os membros do outgroup, pois perceber o outgroup como despersonalizado
configura-se estereótipo (HOGG; TERRY, 2001). Em virtude disso, a categorização é
considerada prejudicial às relações intergrupo, pois resulta em categorias como “Nós” e
“Eles”. Portanto, os seres humanos devem superar as dificuldades distintas de estar junto
àqueles que são diferentes (TRIANDS, 2003).
É comum as sociedades possuírem uma grande quantidade de categorias, tais como
raça, sexo, religião, classe social, profissão, dentre outras, das quais decorrem as diferentes
relações de poder, prestígio e status nas relações entre grupos. Em virtude de existir, nas
sociedades, uma estrutura social, um sistema de valores e uma ideologia a partir do local de
nascimento, cor da pele, família de origem, pessoas são categorizadas como pertencentes a
um e não a outro grupo. Por meio da internalização e identificação com essas categorias
estabelecidas, os indivíduos adquirem uma identidade social particular, avaliativamente mais
positiva ou negativa. Integrar grupos dominantes ou grupos subordinados confere aos
indivíduos estruturas de crenças subjetivas diferentes acerca da natureza da sociedade e das
relações entre grupos (HOGG; ABRAMS, 2001).
Na perspectiva da identidade social, todo conhecimento deriva de comparações. Por
meio das comparações sociais o indivíduo cria percepções sobre si mesmo, sobre os outros e
sobre o mundo em geral. Contudo as comparações sociais intergrupais não são percepções
imparciais; pelo contrário, há uma tendência à maximização da distinção positiva do ingrupo,
em que os diferentes consensos são formados por crenças enraizadas que diferem em termos
de parâmetros determinados por diferentes grupos (HOGG; ABRAMS, 2001).
A autocategorização é considerada um processo importante, uma vez que pertencer a
um grupo traz consigo um significado implícito de valor afetivo, capaz de reduzir a incerteza
dos integrantes do grupo de como se comportar e o que esperar de um determinado contexto
social. A hipótese da redução de incerteza é considerada o core da motivação humana, uma
vez que confere significado à vida do indivíduo e influencia a construção de autoconceito,
30

tendo função descritiva e prescritiva das formas de pensar, sentir e agir (HOGG; TERRY,
2001).
Tendo em vista que a comparação social conduz ao exagero nas diferenças entre
grupos e as categorias conduzem à formação de estereótipos em relação a si, ao endogrupo e
ao exogrupo, ao operarem juntas, categorização e comparação social geram uma forma de
comportamento do grupo, envolvendo diferenciação, discriminação, favoritismo intragrupo,
percepção de valor mais positivo para endogrupo em relação ao exogrupo e preferência
afetiva pelo endogrupo (HOGG; ABRAMS, 2001).
Uma pesquisa realizada por Jaspars e Warnaem (1982), e citada por Tajfel (1982), na
qual tratam da saliência entre grupos, demonstra que, em geral, endogrupos não
necessariamente avaliam os exogrupos mais negativamente do que a si mesmos e, sim, que
tendem a fazer uma avaliação mais positiva acerca de si mesmos do que são por outros
avaliados, demonstrando um favoritismo ao endogrupo.

2.3 ESTEREÓTIPOS, PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO

Dentre as abordagens teóricas dominantes nos estudos, na Teoria das Relações


Intergrupais, definida como relações entre dois ou mais grupos e seus respectivos membros, o
preconceito e a discriminação têm sido os aspectos mais comumente pesquisados. Na Teoria
Psicodinâmica, pesquisadores como Adorno, Frankel-Brunswich, Levinson e Sanford, nos
anos 1950, faziam associação entre a ideologia e a personalidade para dar conta de explicar
tomadas de posições racistas e antidemocráticas, argumentando que o preconceito decorre das
diferenças de personalidade, sendo a personalidade autoritária preditora de preconceito
(JODELET, 2006; PROUDFORD; NKOMO, 2006). A teoria da Identidade Social (TAJFEL,
1982), no entanto, postula que a necessidade de autoestima positiva leva ao preconceito e que
a solução para o preconceito é a redução da saliência entre fronteiras grupais (contato).
O preconceito racial e étnico se faz presente em quase todas as partes do mundo,
sendo raro encontrar uma sociedade em que um grupo não seja classificado como “outro”
com base na etnia ou raça. No Brasil, o “mito da democracia racial” marcou secularmente o
país, estabelecendo uma falsa cultura de que no país não existe preconceito e que a paz e a
democracia aqui imperam (GUIMARÃES, 2002) mas, conforme já indicado por Aronson,
Wilson e Akert (2002) este é um fenômeno social onipresente.
Na perspectiva da Psicologia Social, o preconceito é compreendido como atitude
negativa em relação a membros de outro grupo social, decorrente de estereótipos e
31

generalizações; a discriminação, como comportamento negativo em relação aos membros


desse grupo social; e o racismo é visto como a combinação de ambos (PROUDFORD;
NKOMO, 2006).
Três diferentes formas de compreender o preconceito são indicadas por Allport
(1979) em que: a primeira considera que o preconceito refere-se a julgamentos baseados em
experiências anteriores; na segunda é compreendido como um julgamento prévio e
precipitado, sem o adequado exame dos fatos; na terceira, o preconceito é considerado como
um sentimento combinado com julgamento prévio e sem justificativas.
O preconceito é considerado uma atitude, uma vez que comporta componentes
afetivos ou emocionais, cognitivos e comportamentais. Aronson, Wilson e Akert (2002)
definem preconceito como “[...] uma atitude negativa ou hostil contra pessoas de um grupo
identificável, baseada exclusivamente na sua condição de membro do grupo”, sem qualquer
justificativa que o fundamente. Mor-Barak (2005, p. 138) também ressalta o caráter negativo
do preconceito conceituando-o como “[...] um julgamento pré-concebido ou opinião
sustentada por membros de um grupo; o preconceito é percebido como atitude irracional de
hostilidade dirigida a um indivíduo, um grupo, uma raça ou às suas supostas características”.
Para compreender o componente cognitivo do preconceito, de acordo com Aronson,
Wilson e Akert (2002), é necessário entender o conceito de estereótipo, geralmente definido
como uma generalização acerca de um grupo de pessoas, em que características idênticas são
atribuídas a um grupo de pessoas, praticamente sem levar em conta suas individualidades.
Uma dimensão social é atribuída aos estereótipos, quando estes são compreendidos
como crenças ou conhecimentos amplamente partilhados por um grupo sobre a natureza do
endogrupo e dos exogrupos. Considerado como “padronizações” ou “figuras mentais
supersimplificadas” (MOR-BARAK, 2005) que construímos acerca de pessoas, instituições,
ou eventos e cujos pressupostos compartilhamos com outras pessoas, o estereótipo, em geral,
se faz acompanhar por preconceitos, ou seja, por pré-disposições favoráveis ou desfavoráveis
em relação à pessoa ou categoria em questão (TAJFEL, 1982).
Embora o escopo desse trabalho esteja fundamentado na Psicologia Social, cabe aqui
uma menção a abordagem sociológica do trabalho de Goffman (1988), em que o autor trata do
conceito de estigma, apontando que, a partir de atributos que são percebidos como
discrepantes ao estereótipo criado acerca de determinado tipo de indivíduo, pessoas podem
passar a ser vistas como estragadas e diminuídas, e em decorrência disso lhes ser atribuído
descrédito. O autor considera duas perspectivas distintas de se perceber a pessoa que possui
um estigma: a condição de desacreditado, que se dá quando os atributos distintivos são
32

conhecidos e evidentes e a condição de desacreditável que ocorre quando essas características


não são imediatamente perceptíveis ou conhecidas dos presentes.
Difíceis de serem mudados, os estereótipos são mecanismos cognitivos ou maneira
adaptativa de lidar com eventos complexos, mas que se tornam disfuncionais e injustos
quando cegam as percepções, impedindo que diferenças individuais entre classes de pessoas
sejam percebidas (ARONSON; WILSON; AKERT, 2002).
O último componente do preconceito refere-se ao aspecto comportamental. Segundo
os autores anteriormente citados, crenças estereotipadas geralmente resultam em tratamento
injusto. A isso denominam “discriminação”, ou seja, “[...] ação negativa injustificada ou
prejudicial contra os membros de um grupo, simplesmente porque pertencem a esse grupo”.
Allport (1979) considera que discriminação ocorre quando é negada a indivíduos ou grupos de
pessoas a igualdade de tratamento que elas desejam. Para Dovidio et al. (2010, p. 10), a
discriminação pode ser definida como o comportamento de um indivíduo que cria, mantém ou
reforça vantagem para alguns grupos e seus membros em relação a outros grupos e seus
membros.
Goffman (1988) aponta que as discriminações podem ocorrer em virtude de que as
atitudes dos ditos “normais” partem da crença de que os estigmatizados, ou aqueles que
possuem uma marca distintiva, são inferiores, sendo possível que outras imperfeições sejam
inferidas a estes indivíduos a partir da imperfeição ou marca original.
De acordo com Allport (1979), pré-julgamentos são naturais do ser humano e se
modificam diante de fatos, enquanto preconceitos são irreversíveis e mantêm-se mesmo
diante do correto conhecimento dos fatos. O autor propõe uma tipologia das manifestações de
preconceitos, que evoluem de atitudes para ação, a partir de linguagens insultuosas, evitação,
discriminação (modo ativo de tentar privar o outro), ataque físico (atos de violência) e
extermínio (a manifestação mais extrema).
Manifestações de preconceito e discriminação têm se institucionalizado nas
organizações e na sociedade (PROUDFORD; NKOMO, 2006), pois, conforme assinalam
Aronson, Wilson e Akert (2002), este é um problema de e para toda a humanidade, com
impacto sobre a autoestima e ao qual ninguém passa incólume. Portanto, ele precisa ser
combatido e abandonado, o que só se dará por meio da aceitação do diverso e da inclusão,
uma vez que em decorrência do preconceito o que o advém é a exclusão.
33

2.4 DIVERSIDADE E INCLUSÃO/EXCLUSÃO

Ao longo dos tempos e em diferentes culturas, a necessidade de ser incluído


socialmente tem importante função para a sobrevivência e, de acordo com Mor-Barak (2005),
as percepções de inclusão ou exclusão são formas contínuas de avaliação pessoal por meio
das quais os indivíduos avaliam suas posições nos grupos ou nas organizações. A necessidade
de pertença é uma poderosa base motivacional para o comportamento interpessoal, sendo esta
frustrada quando se vivencia uma rejeição ou exclusão social.
Dada a importância do tema, revisão de literatura realizada por Proudford e Nkomo
(2006) aponta que diferentes correntes teóricas têm se dedicado a pesquisar a temática de
raça, etnicidade e questões relativas à diversidade, tais como preconceito, discriminação e
racismo. A noção de diversidade é predominantemente usada para referir-se à variedade de
indivíduos e grupos com os quais as organizações são confrontadas em seu mercado de
trabalho, entre seus consumidores e seus empregados (MOR-BARAK, 2005).
Triands (2003) assinala que em virtude da limitação humana para processamento de
informações, agrupamentos mentais são criados para melhor manejo das informações, recurso
que é utilizado também para categorização de pessoas; categorias essas que definem
diversidade, em que o uso de “nós” e “eles” significa que algumas pessoas são vistas como
semelhantes e outras como diferentes. O autor considera que diversidade pode estar em
qualquer atributo humano, especialmente sexo, classe social, raça, etnia, cultura, idade,
orientação sexual, estilo de vida e religião.
Sob uma perspectiva subjetiva, diversidade é conceituada por Loden e Rosener
(1991) como alteridade ou aquelas qualidades humanas que são diferentes das nossas e dos
grupos aos quais pertencemos, ou seja, presentes em outros indivíduos e grupos. Nessa
perspectiva, “outros” são pessoas que são diferentes de nós sob uma ou várias dimensões, tais
como idade, orientação sexual, etnicidade, dentre outras dimensões possíveis de se classificar
características pessoais.
Nos estudos de diversidade propostos por Loden e Rosener (1991), são categorizadas
as dimensões de diversidade com base nos traços, dividindo-os em duas dimensões: a
dimensão primária, que se refere aos traços relativamente imutáveis do indivíduo, como
idade, etnia, gênero, habilidades físicas, raça e orientação sexual; e a dimensão secundária,
referente aos traços menos observáveis, porém mais mutáveis, formados em função e a partir
do contexto social, tais como: background educacional, naturalidade geográfica, renda, estado
34

civil, experiências pessoais e profissionais prévias, crenças religiosas (LODEN; ROSENER,


1991).
Em revisão de literatura realizada por Mannix e Neale (2005), os autores apontam
trabalhos de pesquisa tanto com enfoques positivos como negativos acerca dos efeitos da
diversidade. Na vertente mais otimista da diversidade, a criação de valores e melhoria dos
resultados são apontados como possíveis benefícios. Nessa linha, há indicativos de que grupos
heterogêneos produzem soluções de mais alta qualidade, de que há, nesses grupos, um
aprimoramento da capacidade de resolução de conflitos e o benefício da melhoria da
qualidade de tarefas que requerem criatividade. Diversidade funcional tem a capacidade de
aumentar a comunicação com pessoas de fora do grupo, impactando nas possibilidades de
inovação do time.
Entretanto, a linha com visão mais pessimista da diversidade compreende que
diversidade cria divisão social, empobrecimento da integração e impacta negativamente nos
resultados do grupo, e considera que a composição demográfica da organização pode
determinar processos tais como inovação, comunicação e performance (MANNIX; NEALE,
2005).
Mannix e Neale (2005) apontam dois paradigmas por meio dos quais a questão da
natureza da diversidade pode ser abordada. O primeiro é a abordagem baseada em fatores, que
trabalha com identificação e medidas de diversidade, focando as diferenças visíveis e
invisíveis da diversidade. Essa abordagem considera que no nível superficial estão as
diferenças demográficas, enquanto no nível mais profundo ficam as atitudes e crenças. O
segundo paradigma, baseado em proporção demográfica entre maiorias e minorias, e,
fundamentado na lógica do contato social, compreende que a interação aumenta a atração, a
conexão e a compreensão entre as pessoas (PETTIGREW, 1982 apud MANNIX; NEALE,
2005).
Na visão de Mor-Barak (2005), diversidade refere-se ao processo de gerar categorias
distintas, no qual o grupo é percebido como possuindo um denominador comum em um
contexto nacional ou cultura específica. Dentro da compreensão global de diversidade,
proposta pela autora, diversidade refere-se necessariamente às diferenças, visíveis ou
invisíveis, que trazem consequências negativas ou positivas para a vida do indivíduo; está
relacionada, também, com o pertencer a um grupo diferente quando comparado ao
mainstream na sociedade, que o torna suscetível a sofrer consequências resultantes de uma
associação com o pertencer ou não a certo grupo social.
35

Para além de traços ou qualidades humanas, a compreensão de Thomas e Ely (1996)


difere dos autores já aqui apresentados, pois consideram diversidade como as variadas
perspectivas e abordagens para o trabalho, trazidas pelos membros de diferentes grupos de
identidade e que são incorporadas às práticas organizacionais. Para que as pessoas sejam
incluídas, os autores propõem que a diversidade necessita ser gerida e apresentam três
paradigmas ou modos de se fazer a gestão da diversidade. Apontam que os paradigmas
discriminação-justiça e acesso-legitimidade têm guiado as iniciativas de gestão da diversidade
e propõem o paradigma da aprendizagem-efetividade como o melhor modo de promover a
integração dos diferentes.
O paradigma discriminação-justiça é a forma dominante de entendimento da
diversidade e envolve cumprimento de mandatos e força de lei. Seus pressupostos
assemelham-se aos que fundamentam as ações afirmativas e seu foco está em torno do
conceito da assimilação. Embora tenha o benefício de aumentar a diversidade demográfica,
apresenta a limitação de que traz implícita a suposição de que “somos todos iguais”. O
modelo de gestão dentro desse paradigma prioriza mais a contratação e retenção de pessoas
“diversas” do que propiciar condições que permitam a exploração do melhor potencial dos
indivíduos e possibilite que esses realizem o trabalho de maneira mais efetiva.
O paradigma acesso-legitimidade está baseado na aceitação e celebração das
diferenças. Organizado em torno da diferenciação, sua ênfase está no papel das diferenças
culturais em uma empresa, sem realmente analisá-las, a fim de compreender como elas afetam
a execução do trabalho. Neste paradigma, as capacidades dos integrantes dos grupos diversos
são aplicadas de forma utilitarista, uma vez que as diferenças são subvertidas a fim de obter os
melhores resultados por meio delas, sem, contudo, atentar para como essas poderiam ser
integradas aos trabalhos do mainstream da organização.
A principal limitação do paradigma acesso-legitimidade é que, sob sua influência, as
motivações para a diversidade são imediatistas, visando obter um melhor resultado ou atender
a uma necessidade específica em um determinado momento, sem incorporar à organização os
conhecimentos, habilidades, crenças ou práticas trazidos pelos membros dos grupos diversos
(THOMAS; ELY, 1996). Esses autores apontam que grupos de trabalho que adotam a
perspectiva da diferenciação reconhecem o valor da diversidade como meio para o alcance de
mercados, porém os membros das minorias não são considerados como parte da cultura maior
da organização, ficando sujeitos a isolamento.
Thomas e Ely (1996) propuseram o que chamam de um paradigma emergente e
argumentam pela utilização do paradigma aprendizagem-efetividade para a gestão da
36

diversidade, visando atingir os verdadeiros benefícios da diversidade. Além de promover


igualdade de oportunidades, como ocorre no paradigma discriminação-justiça, e de
reconhecer as diferenças culturais, como ocorre no paradigma acesso-legitimidade, no
paradigma emergente o objetivo é que a organização internalize as diferenças entre os
empregados de forma que consiga aprender e crescer com eles. Ele organiza-se em torno da
integração, na qual a todos são dadas iguais oportunidades, permitindo que a organização
internalize diferenças entre os funcionários, que aprenda e cresça por causa deles. Ao mesmo
tempo, possibilita que os membros sintam que estão no mesmo time, com suas diferenças, e
não apesar delas.
Giovannini (2004, p. 27) assevera que “[...] se diversidade é a questão, inclusão é a
resposta”. Na mesma ênfase, Miller e Katz (2002) consideram que diversidade sem inclusão
não funciona, pois somente quando todas as pessoas, com todas as suas similaridades e
diferenças reconhecidas, participam das tomadas de decisão e contribuem para a identificação
e resolução de problemas será possível que a produtividade individual e coletiva de uma força
de trabalho diversa esteja completamente engajada.
Shore et al. (2011) assinalam que a inclusão consiste no grau com que cada
indivíduo se percebe como um membro estimado de seu grupo de trabalho, que tenha uma
experiência de um tratamento que satisfaça sua necessidade de pertença e de singularidade.
Os autores afirmam que indivíduos querem se sentir pertencentes e valorizados por seus
atributos singulares e propõem um modelo referencial de inclusão baseado na premissa de que
singularidade e pertencimento trabalham juntas para criar o sentimento de inclusão (SHORE
et al. , 2011), no qual:
 Inclusão ocorre quando o indivíduo é tratado como um insider e também é
encorajado a manter sua singularidade no grupo de trabalho.
 Assimilação ocorre quando há um alto pertencimento e uma baixa
singularidade, sendo necessário que se adapte às normas da cultura dominante
para ser tratado como um insider.
 Diferenciação ocorre quando há um baixo grau de pertença, mas alto valor
para sua singularidade.
 Exclusão ocorre quando o indivíduo não é tratado como um insider de valor
singular no grupo de trabalho, enquanto outros empregados são.
Pela proposição de Ferdman et al. (2009, p.07) acerca da inclusão, dois
componentes estão envolvidos: o comportamento inclusivo e a experiência de inclusão. O
37

comportamento inclusivo antecede a experiência de inclusão e refere-se a “[...]


comportamentos manifestados por uma pessoa e pelos membros de seu grupo de trabalho,
junto às políticas e procedimentos organizacionais, que promovem um clima inclusivo”. O
segundo componente, a experiência de inclusão, é “[...] o senso psicológico da parte de um
indivíduo de que está de fato sendo incluído”.
Ferdman et al. (2009) categorizam como comportamentos inclusivos: criar segurança
(relativo a fronteiras físicas e psicológicas que determinam a pertença ao grupo), reconhecer o
outro (cumprimentar, valorizar trabalhos relevantes, compartilhar detalhes da vida pessoal),
lidar com conflitos e diferenças (buscar soluções alternativas), habilidade e desejo de
aprender, ter e dar voz (suporte afetivo permite percepção de ser valorizado pelo outro) e
aumentar a representação de membros de grupos de “minoria” (diferentes pessoas presentes
nos diferentes níveis da organização).
O sentimento de pertença a um determinado grupo social, de acordo com Ferdman et
al. (2009), está diretamente relacionado com o sentir-se incluído. Inclusão é descrita por
Giovannini (2004) como o estado de estar sendo valorizado, respeitado e apoiado, enquanto
Ferdman et al. (2009, p.07) consideram que “[...] em um senso mais geral, inclusão envolve
ambos, sermos completamente nós mesmos e permitir que outros sejam completamente eles
mesmos, no contexto de engajamento em atividades comuns”.
Dentre os componentes-chave da experiência de inclusão estão o envolvimento
(FERDMAN et al. , 2009), o sentir-se ouvido e tendo voz na tomada de decisões (MOR-
BARAK; CHERIN, 1998), o sentir-se valorizado e reconhecido como indivíduo e como
membro do grupo, com espaço para autenticidade e liberdade de expressão (BERG, 2002) e a
obtenção de tratamento igualitário.
Berg (2002) aponta um dilema existente nas relações intergrupais. Afirma que,
frequentemente, indivíduos decidem levar somente uma parte de si mesmos para o ambiente
organizacional e para ambientes heterogêneos, excluindo voluntariamente partes da própria
identidade por temor às consequências que podem advir de trazer-se integralmente para
ambientes nos quais a mensagem transmitida é a de que “somos todos iguais aqui”. A reflexão
do autor é de que se faz necessário que indivíduos possam ser encorajados a estar como um
todo, sendo, para tanto, necessária uma gestão dessas diferenças, de forma que resultem em
um conjunto colaborativo e mais criativo e inovador. De acordo com o autor, embora a ênfase
nas similaridades e nas características comuns tenha como objetivo reduzir a possibilidade de
conflitos decorrentes das diferenças, essas também reduzem os lampejos de criatividade que
podem emergir do grupo.
38

Nesse sentido, Davidson e Ferdman (2001) argumentam que diversidade não se


refere a cumprimento de cotas legais ou contagem do número de um tipo de pessoa ou de
outro, mas trata-se da construção de uma organização de amplo escopo, na qual a confiança e
o respeito são as opções padrão para todos os membros da comunidade. Valorizar a
diversidade e as diferenças em uma comunidade significa que as políticas, estruturas e normas
de comportamento devem ser alinhadas de tal forma que cada membro da comunidade seja
respeitado e incluído.
Mor Barak (2005) considera que o conceito de inclusão-exclusão no local de trabalho
refere-se ao senso do indivíduo de ser participante do sistema organizacional, tanto de
processos formais, como o acesso a informações e a canais de tomada de decisões, quanto dos
processos informais, como participação em atividades e encontros informais, nos quais se tem
acesso a informações e decisões informais são tomadas. Na compreensão da autora, esse
conceito de inclusão-exclusão funciona como um indicador do modo como os empregados de
uma organização vivenciam e percebem suas posições em relação ao mainstream
organizacional.
Processos de inclusão e exclusão podem existir em diferentes níveis e formas. Podem
ocorrer em grande escala geográfica, em virtude de crenças religiosas e diferenças étnicas,
baseada na cultura ou nos níveis de desenvolvimento econômico entre países. No nível
institucional também é possível, no qual os critérios de pertença dos membros são
estabelecidos e a partir desses definido quem é membro (incluído) e quem está fora
(excluído). Ao nível das relações interpessoais, exclusão ocorre quando uma pessoa exclui
outra, negando-lhe a possibilidade de estabelecer um relacionamento e, ao nível intrapessoal
(autoexclusão), a exclusão ocorre quando o próprio indivíduo cognitiva e emocionalmente
não considera a possibilidade de se incluir em outros relacionamentos (ABRAMS; HOGG;
MARQUES, 2005).
Diferentes formas de exclusão e inclusão operam nas relações, indo de formas mais
abstratas, como ideologias sociais, convenções morais e princípios, a modos mais específicos,
como os processos de categorização, que se configuram como formas de exclusão, uma vez
que o ato de atribuir pessoas a diferentes categorias sociais envolve inclusão e exclusão de
membros de um ou outro grupo, em função das características compartilhadas (ABRAMS;
HOGG; MARQUES, 2005).
A gestão da diversidade tem como objetivo final a inclusão (JESUS, 2013). As
dificuldades e falhas nas tentativas de gerar e nutrir a diversidade, de acordo com Davidson e
Ferdman (2001), ocorrem porque, na dinâmica social, enquanto uma pessoa ou grupo está
39

tentando ganhar algo, outra pessoa em algum outro grupo está tentando proteger algo. No
meio desse e de outros desafios, o imperativo de lidar com essas diferenças de maneiras novas
e criativas permanece. A partir de uma visão inclusiva da diversidade, o foco das ações deve
se concentrar na busca da ampliação dos recursos disponíveis, a fim de que todos possam se
beneficiar deles. A direção de um pensamento mais sofisticado acerca da diversidade está na
busca da construção de um espaço em que todos se encaixem (DAVIDSON; FERDMAN,
2001).
Até o momento o tema inclusão foi aqui conceituado e discutido como um senso
psicológico e experiência subjetiva de pertencimento a um determinado grupo social. A
Psicologia Social tem dado também um amplo enfoque à exclusão social, tema que, de acordo
com Sawaia (2006), é complexo e contraditório. Nas análises da desigualdade social, a
exclusão é tratada como sinônimo de pobreza, quando abordada sob o enfoque econômico; ao
centrá-la na questão social, o conceito de discriminação é privilegiado; ainda para Sawaia, a
injustiça social é o escopo fundamental de análise da exclusão. Jodelet (2006) considera que o
único nível de abordagem da exclusão em que a unanimidade pode fazer sentido é quando se
atenta para as interações entre pessoas e entre grupos, nos quais os indivíduos se põem como
agentes ou como vítimas, sendo próprio à Psicologia Social atentar-se a esse nível de detalhe.
Processos sociais excludentes remontam ao Brasil colônia (VERAS, 2006), havendo
uma coincidência entre pobreza e raça desde os tempos da escravidão, podendo-se notar que
ao longo da história tem sido negado aos negros a oportunidade de sair da miséria (SMANIO;
BERTOLIN, 2013). Wanderley (2006) assinala que na compreensão contemporânea de
pobreza, exclusão e pobreza estão associadas, apresentando-se como duas faces de uma
mesma moeda, estando vinculada às desigualdades e, especialmente, à privação de poder e de
representação.
Sawaia (2006) argumenta que a inclusão e a exclusão são duas faces de velhos
problemas sociais – a desigualdade social, a injustiça e a exploração, sendo necessário que as
formas de expropriação humana sejam expostas e analisadas, para que se conheça o
sofrimento ético-político vivenciado por aqueles que se veem impedidos de exercer, mesmo
que de forma parcial, seu potencial humano. Acerca dessa experiência, Gonçalves Filho
(1998) aborda a humilhação social sofrida pelos pobres, fenômeno histórico decorrente da
desigualdade política, que se coloca como uma modalidade de angústia disparada pelo enigma
da desigualdade de classes e que torna o humilhado impedido de vivenciar a sua humanidade.
Outra forma de as ciências humanas abordar a exclusão é lançando olhar sobre a
afetividade, o sofrimento e a felicidade, de modo que a ideia de humanidade seja posta como
40

central às reflexões sobre a exclusão, e que o pobre seja olhado como sujeito que tem
emoções; que, para além da sobrevivência, se coloca como ser social e de desejos. Sob o olhar
da Psicologia Social, Sawaia (2006) qualifica a exclusão a partir da afetividade, considerando
o sofrimento “ético-político” dela decorrente. Trata do sofrimento vivenciado, da perda de
autonomia e da subjetividade do sujeito excluído; sofrimento este que advém da situação
social de ser tratado como inferior, e que o estar em uma posição sem valor diante da
sociedade tem o poder de afetar o corpo e a alma, mutilando a vida do excluído de diferentes
formas.

2.5 DELINEAMENTO DA PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE O PROUNI

Atuando como entrevistadora, na área de Recrutamento e Seleção, tenho me


deparado com muitos candidatos a vagas de estágios e até mesmo de trabalho, que são
bolsistas pelo Programa Universidade para Todos (ProUni); muitos deles revelam grande
empenho e anseio pela conquista de um espaço no mercado de trabalho, que lhes abram
oportunidades de ascensão profissional e pessoal. A partir do contato com esses alunos nos
últimos dois anos, o interesse de estudo acerca do programa foi despertado; porém, até o
início das primeiras pesquisas, não era possível ter uma dimensão de quão grande interesse o
tema vem despertando nos pesquisadores acadêmicos, nas mais variadas áreas e sob
abordagens diversificadas.
Resultados de um levantamento bibliográfico das produções acadêmicas acerca do
tema ProUni, publicadas desde o lançamento do programa em 2005, são aqui apresentados,
destacando-se dissertações, teses e artigos acadêmicos que abordam o programa, os principais
enfoques das pesquisas, o objeto de estudo, as metodologias e sujeitos de pesquisa.
Para realização dessa revisão, foram consultados os bancos de teses e dissertações da
CAPES e da Open Access Thesis and Dissertations (OATD). Para levantamento dos artigos
científicos, a busca foi realizada nos periódicos da área de Administração, Contabilidade e
Turismo, classificados pela CAPES nos estratos Qualis de excelência A2, B1 e B2, além do
portal da Scientific Electronic Library Online (Scielo). O verbete “ProUni” foi utilizado como
critério de busca e considerados apenas trabalhos cujo objeto de estudo fosse exclusivamente
o programa ou que contemplassem, no máximo, mais um tema, além do deste. Foram
identificados três trabalhos anteriores que apresentaram levantamentos bibliográficos sobre o
tema, conforme detalhado nos parágrafos a seguir.
41

No artigo de Almeida et al. (2010), no qual são discutidas políticas públicas e


inclusão social, os autores argumentam que a quantidade de estudos produzidos em âmbito
acadêmico reflete os inúmeros debates suscitados em torno do programa ProUni, apontando
que, no período entre 2005 e 2010, foram produzidas 32 dissertações, cinco teses e oito
artigos, dos quais sete foram publicados na área da Educação.
Com o objetivo de investigar como o ProUni vem sendo pesquisado, Felicetti,
Rossoni e Gomes (2011) publicaram artigo que revisa as teses e dissertações produzidas entre
os anos de 2007 e 2011. Ao final do trabalho, apontam a necessidade de estudos que
envolvam maior número de bolsistas ProUni, quer ainda em fase de estudos, quer egressos,
dada a importância de constatar a eficiência do Programa em escala regional, estadual e
nacional (FELICETTI; ROSSONI; GOMES, 2011).
Na tese de Ferreira (2012a), na qual estudou a compreensão do sujeito bolsista em
relação ao ProUni, o autor apresenta o “Estado da Arte” dentro da temática do ProUni,
produzido entre os anos de 2006 e 2010. Identificadas vinte e oito teses e dissertações
acadêmicas, o autor indica cinco categorias de conteúdos mais analisadas nesses trabalhos,
que são: Democratização do Ensino Superior, Inclusão Social e Profissional, Política
Neoliberal, Influência e Motivação Familiar (FERREIRA, 2012a).
Verifica-se uma crescente produção sobre o tema e até o mês de abril de 2013, data
em que foi feita a coleta dos dados, 80 trabalhos integravam os bancos de teses e dissertações
pesquisados para este trabalho, sendo 57 dissertações e 23 teses. 57,2% das dissertações e
teses existentes acerca do ProUni foram publicadas entre os anos de 2009 e 2011, apontando
que, após as primeiras turmas de prounistas concluírem os cursos em 2008, houve um
crescimento do interesse pelo tema, como se pode observar na tabela 1.
Tabela 1: Dissertações e Teses por ano de publicação

Ano de publicação Dissertação Tese Total geral


2006 02 - 02
2007 09 01 10
2008 07 01 08
2009 11 04 15
2010 09 06 15
2011 11 05 16
2012 8 05 13
2013 - 01 01
Total geral 57 23 80
Fonte: Elaborado pela autora.
42

Classificados em termos de natureza da instituição, verificamos que as universidades


federais respondem por 31% dos trabalhos de pesquisas acerca do ProUni, e as PUCs por
28,7%, dos quais a maioria foi realizado pela PUC São Paulo, instituição com a maior
quantidade de publicações sobre o tema em todo o Brasil.
Em termos geográficos, mantém-se o predomínio de trabalhos produzidos na região
sudeste, conforme já identificado por Ferreira (2012b). Em seus apontamentos, o autor indica
que o Sudeste respondia por 43,3% das produções naquele período, predomínio este que se
acentuou uma vez que, no momento, essa região responde por 61,25% das pesquisas de
mestrado e doutorados já realizadas. A tabela 2 detalha a distribuição regional.
Tabela 2: Distribuição da Produção Acadêmica por Regiões

Distribuição da produção acadêmica por regiões – período 2005 a 2013


Centro-oeste 07 8,75%
Nordeste 09 11,25%
Norte 01 1,25%
Sudeste 49 61,25%
Sul 14 17,5%
Total geral 80 100%
Fonte: Elaborado pela autora.
A perspectiva dos alunos foi considerada em 51% dos trabalhos. Os egressos foram
ouvidos por três autores e gestores universitários foram entrevistados em sete pesquisas. Seis
deputados federais responderam questionário de pesquisas, no trabalho de Corcini (2007), e
reitores e pró-reitores foram entrevistados por Stieg (2009). Dos 80 trabalhos identificados, 22
utilizaram revisão de literatura e pesquisa documental, sendo constatado um predomínio da
utilização de métodos qualitativos de pesquisa, e que apenas 11 trabalhos foram analisados
por métodos quantitativos.

2.5.1 Principais enfoques das pesquisas

O impacto do ProUni na vida dos alunos é o principal enfoque abordado nas


dissertações e teses produzidas no período de 2005 a 2013. No estudo de caso realizado por
Ferreira (2009), junto a alunos bolsistas de Salvador, são apontadas a mudança de
comportamento e a obtenção de capital cultural como ganhos possíveis. Na opinião dos
alunos pesquisados, o acesso à universidade configura-se como um caminho em direção à
produção de novos conhecimentos, culturas e ao desenvolvimento das qualificações
necessárias para a inserção no mundo do trabalho (FACEIRA, 2009), como oportunidade
43

única para a mudança de vida (KRAMES, 2010) e como possibilidade de inclusão em um


grupo de maior prestígio e status, em que seja possível ter voz e vez (MONGIM, 2010).
Diversos trabalhos abordam o ProUni como possibilidade de democratização do
ensino superior (BISPO, 2007; GASPAR, 2012; MARINELLI, 2010; VALLE, 2009),
enquanto Rocha (2008) aponta o caráter discursivo e mercantilista existente em torno do
programa. Embora, nos resultados de algumas pesquisas, diversos autores tenham apontado
que a maioria dos bolsistas pesquisados considera que o programa democratiza o Ensino
Superior (ALMEIDA, 2012; FARIAS, 2010), na opinião de Rocha (2012), para que a
democratização e a inclusão sejam efetivas, são necessárias políticas voltadas para a
permanência dos estudantes, uma vez que o acesso é possibilitado, porém a permanência não
é garantida. Pesquisa aponta que a evasão se dá em virtude de dificuldades acadêmicas e
financeiras enfrentadas pelos bolsistas (MARTINS, 2011).
Sendo o ProUni uma política pública que contempla cotas raciais, dentre os trabalhos
pesquisados, quatro autores discutiram a inserção do negro na universidade. Na área da
Educação, foi estudada a experiência de inserção do negro em duas IES de Mato Grosso do
Sul (MARQUES, 2010). A identidade racial do estudante negro foi discutida sob a
perspectiva da Psicologia Social (LEITE, 2009), da Teologia (LIMA, 2007) e da Sociologia
(SOTERO, 2009).
Relatos de estranhamento de alunos brancos em relação à presença dos alunos negros
no espaço acadêmico e percepção da existência de preconceito e discriminação expressos de
forma implícita e explícita foram apontados por Marques (2010). Utilizando a história de vida
de um aluno negro, a pesquisa de Leite (2009) aponta que, mesmo diante de dificuldades
socioeconômicas, defasados devido à deficiência do ensino médio, enfrentando e necessitando
superar situações de discriminação racial, esses alunos mostram que é possível ressignificar
suas trajetórias e suas identidades a fim de alcançar emancipação e autonomia. Acerca da
construção da identidade étnico racial do negro, Lima (2007) afirma que tanto a identidade
objetiva (para autorreconhecimento), como a identidade subjetiva (para identificação a partir
do outro) dos alunos é permeada por representações da inferioridade da raça. Alunos
entrevistados por Sotero (2009) consideram que a raça é importante na constituição de suas
identidades, sendo ingrediente fundamental para a percepção de que o lugar ocupado pelo
negro na sociedade é fruto de uma estrutura social que age de forma a tentar mantê-lo em
posições inferiores.
44

2.5.2 Principais áreas de estudo

Com referência às áreas de estudo, verifica-se uma predominância de trabalhos


publicados na área da Educação e do Serviço Social, porém o tema tem despertado interesse
de outras áreas do saber como Teologia, Direito e Engenharia, conforme abaixo descrito na
Tabela 3.
Tabela 3: Distribuição de teses e dissertações por área de estudo

Área de estudo Dissertação Tese Total geral %


Administração 03 01 04 5,00%
Antropologia - 01 01 1,25%
Ciências Contábeis 01 - 01 1,25%
Ciências Sociais 03 01 04 5,00%
Direito 02 01 03 3,75%
Economia 02 01 03 3,75%
Educação 34 13 47 58,75%
Engenharia 01 - 01 1,25%
Estudos Étnicos e Africanos 01 - 01 1,25%
Interdisciplinar 01 - 01 1,25%
Politicas Públicas 01 - 01 1,25%
Psicologia 01 01 02 2,50%
Serviço Social 03 03 06 7,50%
Sociologia 03 01 04 5,00%
Teologia 01 - 01 1,25%
Total geral 57 23 80 100%
Fonte: Elaborado pela autora.

2.5.3 Pesquisas na área de Educação

Conforme citado na Tabela 3, a área de Educação responde por 58,75% dos trabalhos
publicados, com um total de 34 dissertações e 13 teses. Dentre as temáticas abordadas, os
estudos enfocam o desempenho dos bolsistas (ALVES, 2008; ROCHA, 2008; ROCHA,
2012), a inserção no mercado de trabalho (COSTA, 2012; GERALDO, 2011; SOUZA, 2011),
as representações sociais que os alunos constroem acerca do ProUni (SEBIM, 2008; SILVA,
2007) e a inclusão social dos egressos (GIACON, 2012). Porém, os temas mais recorrentes
nas dissertações e teses são a democratização do acesso ao ensino superior, a privatização da
educação e as políticas públicas de ações afirmativas e de acesso à educação.
45

2.5.4 Pesquisas na área de Serviço Social

Ferreira (2009) discutiu os impactos diretos e indiretos do ProUni na vida dos alunos,
verificando haver um impacto positivo no capital social e cultural, possibilitando construção
de novas relações sociais, elevação da autoestima e autoconfiança e confiança no futuro.
Simões (2011) também analisou as possiblidades de mudança social na vida dos sujeitos a
partir do ensino superior, pesquisando alunos prounistas e não prounistas. As dificuldades
cotidianas enfrentadas por dez alunos do curso de Pedagogia a fim de obter um bom
aproveitamento acadêmico e garantir assim a permanência no curso foram estudadas por
Neves (2010). O acesso e permanência dos bolsistas em uma universidade comunitária do
Ceará foram discutidos por Rocha (2008) em um trabalho no qual o autor sugere, no próprio
título, que o ProUni oferece um “Processo de Inclusão Ilusória”, uma vez que, em sua
opinião, o argumento da democratização do Programa no estado do Ceará não se sustenta e,
nas instituições locais, a produção da ciência está subjugada aos interesses do mercado,
oferecendo uma formação de qualidade questionável.
Rodrigues (2011) também aborda a questão da permanência dos alunos, porém
investiga as estratégias utilizadas pelos bolsistas para se manterem na universidade antes de
contarem com o apoio fornecido por um fundo social da instituição estudada. O autor aponta a
necessidade da implementação de políticas de assistência estudantil que possibilitem a
permanência dos alunos oriundos dos pré-vestibulares comunitários e do ProUni na
universidade (RODRIGUES, 2008).
O papel do ProUni na promoção da inclusão social foi trabalhado por Santos (2011).
Utilizando a técnica de grupos focais, o autor abordou acessibilidade e inclusão/exclusão,
ascensão social, preconceito, estigmas e deficiências do ensino. Constatou-se que estudantes
de baixa renda têm acesso ao ensino superior, mas em IES privadas acabam sendo submetidos
a novas experiências de exclusão, ao tempo que convivem com grupos socioeconomicamente
distintos.

2.5.5 Pesquisas na área de Psicologia

Dois trabalhos foram publicados na área da Psicologia, sendo uma dissertação na


área de Psicologia Social e uma tese em Psicologia Educacional. Ambas as pesquisas são de
natureza qualitativa e utilizam história de vida de sujeito único.
46

A dissertação de Leite (2009) visou compreender como o estudante negro, que


ingressou na universidade pela Ação Afirmativa ProUni, constrói sua identidade, bem como
identificar em que medida essa política contribui para sua formação identitária racial. Ao final
do trabalho, a autora infere que o modelo de inclusão social e racial que está posto atualmente
pode ser ilusório, considerado uma política de inclusão numa posição subalterna, uma vez que
não promove mudanças significativas e efetivas no processo de formação de estudantes
negros cotistas.
A tese de Nogueira (2013) investiga “Quais os sentidos subjetivos constituídos pelo
estudante pobre, que ascende à Universidade por meio do ProUni, sobre o seu processo de
escolarização”, utilizando macro dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e do Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), além de revisão teórica, questionários e uma
entrevista em profundidade com uma bolsista, aluna do curso de psicologia da PUC-SP. A
autora conclui que sentimentos de insegurança, ambivalências entre pertencer ou não ao grupo
da Universidade, reconhecimento da colaboração da família ou dos amigos no processo,
críticas àqueles que não são vistos como apoiadores, valorização da experiência escolar
anterior, orgulho pela conquista, sentimento de vitória pela conclusão do processo e a
perspectiva de mudança de vida são aspectos que compõem a dimensão subjetiva da
experiência de ser bolsista ProUni.

2.5.6 Pesquisas na área de Administração

Na área de Administração, apenas quatro trabalhos foram identificados (BISPO,


2007; GUERRA, 2009; FERREIRA, 2012b; HOPFER, 2011), sendo três dissertações e uma
tese, correspondendo a apenas 5% da produção científica acerca do ProUni. Os quatro
trabalhos têm o próprio Programa como objeto de estudo. Três dessas pesquisas estudam
exclusivamente o ProUni, enquanto um trabalho aborda também o sistema de cotas,
discutindo se as estratégias utilizadas no Programa permitirão uma democratização do ensino
superior e a redução das desigualdades sociais. Em relação ao foco de discussão das
dissertações, Ferreira (2012b) volta-se para a efetividade da política pública; Guerra (2009)
aborda o processo de criação do programa e os jogos de interesses políticos que envolvem a
sua implantação, e a tese de Hopfer (2011) busca posicionar o ProUni como um elemento do
modo capitalista de produção.
47

A dissertação de Bispo (2007) é uma revisão bibliográfica, na qual a autora discute


desigualdades sociais, educação, ações afirmativas e sistema de cotas. Aponta que o ProUni e
ações afirmativas para o acesso de afrodescendentes ao ensino superior são medidas tomadas
pelo governo, buscando ampliar o acesso à educação superior no Brasil. Na opinião da autora,
a adoção de ações afirmativas é apenas um passo em direção à democratização do acesso ao
ensino superior, porém considera que o sistema de cotas vem se mostrando eficaz, pois, pela
primeira vez na história, começa a se admitir uma presença minimamente expressiva de
negros em um espaço altamente privilegiado e excludente que é a universidade.
Numa perspectiva crítica, fundamentada na Teoria da Escolha Racional, a
dissertação de Guerra (2009) discute a criação do ProUni e, por meio de pesquisa documental
em dados do Ministério da Educação e Cultura (MEC), Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), PNUD e Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), busca compreender o
processo de criação do ProUni, evidenciando os interesses intervenientes que permearam a
sua formulação. Investiga os interesses que moveram os atores envolvidos no contexto do
ProUni em suas escolhas. Conclui que, na prática, o ProUni se mostra como um programa que
reflete a lógica de atuação do governo brasileiro em relação à educação superior, na qual as
Parcerias Público-Privado (PPPs) funcionam como elemento central da política de educação
superior nacional, de forma que os limites entre público e privado são eliminados ou
consideravelmente minimizados.
A proposta da dissertação de Ferreira (2012b) foi analisar em que medida o ProUni
contribui para a universalização do acesso à educação superior, sem perder de vista a
qualidade do ensino. O estudo buscou identificar relações entre o ProUni e o desempenho dos
estudantes no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE), o aumento de
matrículas e a diminuição da evasão. A autora aponta que, quando consideradas as notas
médias dos estudantes, os alunos com bolsa integral do ProUni apresentam desempenho
superior aos outros grupos e que os jovens de cor branca são os menos defasados em relação
ao nível de ensino que frequentam, confirmando as desigualdades que ainda separam brancos
e negros. Com referência à evasão, a pesquisa aponta que a proporção de concluintes alcançou
46% dos ingressantes.
A tese desenvolvida por Hopfer (2011) se propõe a integrar os aspectos externos ou
sociais do programa com os aspectos internos administrativos, acadêmicos e de gestão. A
autora aborda o Programa de forma crítica, defendendo que, a despeito de ser originariamente
caracterizado como um programa de cunho acadêmico-social, o ProUni representa uma
48

política pública do Estado Capitalista, que age em benefício das estratégias empresariais das
Instituições de Ensino Superior Privadas (IESP). A receita líquida e o lucro são aumentados,
sendo, assim, garantida uma melhora significativa dos resultados econômicos e da
organização acadêmica das IESP.

2.5.7 Publicações em periódicos

Se por um lado verifica-se uma grande quantidade de dissertações e teses publicadas


abordando o Programa ProUni, poucas publicações de artigos científicos foram identificadas.
Dentro do critério de revistas Qualis A1 a B2, considerando a classificação por área de
conhecimento, mantém-se o predomínio de publicações na área de Educação, seguido por
revistas voltadas às politicas públicas. Especificamente na área de Administração apenas uma
publicação foi encontrada. Verifica-se que muitos autores adotam uma abordagem crítica
acerca do programa, enquanto um segundo grupo adota uma perspectiva de análise mais
positiva.
O artigo de Carvalho e Lopreatto (2005) foi o primeiro publicado abordando o
ProUni com um posicionamento crítico dos aspectos políticos e econômicos do programa;
este tem sido referência para estudos no tema. Os autores apontam que o ProUni pode ser
visto como a alternativa pela qual o governo se valeu para aumentar o número de vagas no
ensino superior sem ampliar diretamente o volume de gastos federais e questionam o porquê
de não se utilizar os recursos destinados ao ProUni para aumentar as vagas nas
universidades/instituições públicas.
Seguindo na mesma linha de pensamento, Carvalho (2006) aborda o contexto das
finanças públicas e o jogo político em torno do programa e analisa o programa como política
de acesso para as camadas mais pobres. A autora discute a efetividade social do ProUni e as
isenções oferecidas às instituições que aderem a ele. Questiona a efetividade do programa,
afirmando que apenas conceder gratuidade integral ou parcial para estudar é insuficiente para
os alunos, sendo necessárias condições que apenas as instituições públicas podem oferecer.
Buscando complementar a pesquisa de Carvalho (2006), o trabalho de Guerra e
Fernandes (2009) discute os grupos de interesses que envolveram o processo de mudança
ocorrido da medida provisória à aprovação da Lei do ProUni. Enfatizam o caráter
assistencialista da priorização do acesso ao ensino superior sem garantia de permanência do
estudante e apontam como de maior gravidade o fato do caráter assistencialista do programa
49

estar mais a favor da IES do que dos alunos. Afirmam que o ProUni ressalta o desvio do
Brasil em relação à privatização do ensino superior.
Catani e Giliolli (2005) caracterizam o ProUni como um programa voltado a
promover o acesso – e não a permanência – de estudantes de baixa renda ao nível superior. Na
opinião desses autores, enquanto a adesão ao programa amplia o poder das IES, resolvendo o
problema de vagas ociosas e evasão de alunos em virtude da falta de recursos para
pagamentos de mensalidades, aos bolsistas do ProUni é oferecida uma cidadania de segunda
classe, ficando estes abandonados à iniciativa privada.
Também de forma crítica, Catani et al. (2006) apresentam o programa em termos
numéricos, avaliam-no como de impacto popular, privatista e de baixo custo orçamentário,
afirmando que o MEC optou por conceder benefícios em vez de promover direitos. Além
disso, consideram que até como mera política assistencialista o ProUni é fraco, uma vez que
abre o acesso à educação superior, porém pouco se preocupa com a permanência do
estudante, elemento fundamental para a democratização do ensino superior. Conclui-se que é
atribuído às IES privadas a responsabilidade de assegurar a permanência do estudante
bolsista.
Sob uma perspectiva mais positiva, na área de Políticas Públicas, Amaral e Oliveira
(2011) publicaram dois artigos, nos quais avaliam o impacto da conclusão do ensino superior
no bem-estar dos alunos, a partir de indicadores como renda, inserção no mercado de trabalho
e ascensão profissional. Utilizando questionários respondidos por seis bolsistas, os autores
apontam que os egressos consideram o programa positivo para a obtenção de colocação no
mercado de trabalho e aumento da renda familiar.
Na área da Educação, Oliveira e Molina (2012) estudaram os desafios e implicações
do ProUni nas práticas institucionais de uma IES da região metropolitana do Vale do Aço e a
efetividade do programa para o acesso de estudantes negros da mesma região. De acordo com
depoimentos de professores entrevistados, os quesitos cor/raça não são evidenciados, não
sendo possível identificar quem são esses estudantes, a não ser em situações em que o próprio
bolsista se manifeste como prounista.
Utilizando 163 questionários de pesquisa respondidos por bolsistas e entrevistas
individuais, Santos (2012) analisou a inserção de Prounistas na PUC-Rio, buscando traçar o
perfil socioeconômico destes, identificando incentivos e dificuldades para a permanência no
curso. Afirma que o programa funcionou como um mecanismo positivo de inclusão na
instituição de grupos historicamente excluídos da educação superior, porém aponta a
necessidade de mecanismos que garantam a conclusão do curso (SANTOS, 2012b).
50

Utilizando questionários eletrônicos enviados por meio do Sistema de Gestão


Acadêmica da IES, respondidos por 1.475 alunos de diferentes cursos, questionários enviados
pelo Sistema de Gestão Acadêmica do Professor, respondidos por 165 docentes, e
depoimentos de 73 alunos, obtidos por meio de grupos focais, Oliveira et al. (2012)
analisaram a implantação do Programa ProUni na PUC-MG a partir de uma perspectiva de
inclusão social e desempenho dos bolsistas. Seus resultados indicam que o ProUni tem tido
êxito como Política de Inclusão Social: a maioria dos bolsistas tem obtido desempenhos
positivos e a evasão é pequena. Alunos indicam que superar a precariedade do ensino médio
público é um desafio; referem contar com incentivo dos pais; consideram que o Exame
Nacional do Ensino Médio (ENEM) facilita o acesso à universidade e valorizam o ProUni
como política pública de acesso ao ensino superior; apontam que o acesso a material didático
e bens culturais como viagens e cursos de línguas é difícil; muitos aderem a programas de
iniciação científica e extensões, porém outros relatam dificuldades em alcançar bom
desempenho por necessitar conciliar trabalho e estudo. Embora relatem que as relações com
colegas e professores sejam boas, alguns mencionam sentimento de diferenciação e
discriminação frente aos não bolsistas. A maioria dos professores (87%) avalia o programa
como positivo. Os alunos também foram avaliados positivamente por 78% dos professores,
sendo que alguns declaram não perceber diferenças entre bolsistas e não bolsistas, enquanto
outros apontam um desnivelamento entre os dois grupos.
O único artigo na área de Administração, de autoria de Saraiva e Nunes (2011),
discute a efetividade do ProUni e aborda a educação como forma de inclusão. Na análise do
discurso de entrevistas em profundidade realizadas com 11 alunos bolsistas do curso de
Administração, esses se referem à receptividade positiva na inserção nas IES particulares,
melhoria do desenvolvimento pessoal e, por conseguinte, condições de maior igualdade para
concorrer com outros profissionais a vagas no mercado de trabalho.

2.6 A EDUCAÇÃO SUPERIOR – CONTEXTO POLÍTICO, ECONÔMICO E


SOCIAL

A educação superior brasileira esteve destinada, desde sua origem, no período do


Brasil Colônia, à formação das elites, havendo, em todos os momentos da história do país, um
predomínio da assistência ao ensino das elites, enquanto a universalização da educação
popular, condição necessária para a consolidação da democracia brasileira, era negligenciada
(OLIVEIRA, 2004). O Brasil é um país reconhecido por sua extrema desigualdade na
51

distribuição espacial, de renda e de oportunidades e essas diferenças estão refletidas na


educação e nas oportunidades de acesso ao mercado de trabalho (SILVA, 2007). A
democratização do acesso à educação exerce papel fundamental para a redução dessas
diferenças (GIACON, 2012).
Embora, como já apontado anteriormente, a formulação do Programa tenha surgido
permeada por interesses intervenientes (GUERRA, 2009), que, conforme argumentado por
Hopfer (2011), representem uma política pública do Estado Capitalista que beneficiam as
Instituições de Ensino Superior Privadas (IESP), o ProUni, descrito a seguir, foi criado pelo
governo federal e apresentado sob o argumento de visar a redução de diferenças e
democratização do acesso ao ensino superior no país. É um programa de ação afirmativa,
operacionalizado mediante concessão de bolsas a alunos de baixa renda (GRAMPA, 2013),
que contempla também cota de vagas para deficientes, negros e indígenas.

2.6.1 Breve cenário das ações afirmativas nos Estados Unidos

Os Estados Unidos é pioneiro na adoção das políticas sociais denominadas de ações


afirmativas. Criadas na década de 1960 e tendo a idealização destas atribuída ao então
presidente do país, John F. Kennedy (BERTOLIN; BENEDITO, 2013), as ações afirmativas
foram concebidas inicialmente como mecanismos tendentes a solucionar o problema da
marginalização social e econômica do negro na sociedade americana, sendo posteriormente
estendidas às mulheres, a outras minorias étnicas e nacionais, aos índios e aos deficientes
físicos (BARBOSA, 2005). Além disso, destinavam especial consideração para
empregabilidade, educação e decisão de contratação desses grupos minoritários (PALMER et
al. , 2013). Nas instituições educacionais, essas políticas visavam ampliar o acesso dessas
minorias à educação superior.
Veras (2006) assinala que, em períodos de prosperidade econômica, os programas de
ação afirmativa baseados em critérios étnicos raciais foram amplamente adotados nos Estados
Unidos. Após um período de recessão passaram a ser amplamente questionados, conduzindo a
um processo de desmantelamento dos programas com esse enfoque. A autora atribui a
ocorrência desse processo de desmantelamento a dois fatores: a supressão dos programas de
discriminação positiva e a falta de um posicionamento definitivo da Suprema Corte
Americana acerca da questão.
Nos Estados Unidos, as políticas de discriminação positiva têm revelado a
inexistência de um modelo fixo e imutável de ação afirmativa, verificando-se uma tendência a
52

certa variação dos fundamentos jurídicos e políticos inerentes a este tipo de política (VERAS,
2006). A constitucionalidade dessas políticas tem sido vigorosamente questionada desde suas
implementações. Leis foram promulgadas e desafios judiciais empreendidos, havendo
posições favoráveis e contrárias à diversificação racial nas universidades públicas (PALMER
et al. , 2013).
Além de altamente competitivos, os processos admissionais das instituições de
ensino superior no país são bastante controversos. Niu e Tienda (2010) apontam que, após a
proibição de considerar o critério de raça em seus processos admissionais, as universidades
estadunidenses têm buscado critérios alternativos de admissão que possibilitem a ampliação
da diversidade, de forma a não ferir a lei e, ao mesmo tempo, assegurar que a meritocracia
seja respeitada.
No estado do Texas, em resposta a referida proibição legal, criou-se uma legislação,
conhecida como Lei Top 10%, que estabelece um modelo de processo seletivo que garante
admissão a 10% de alunos, oriundos de escolas públicas, com melhor desempenho em suas
classes. A filosofia por detrás da referida política é possibilitar que, independente de status
econômico, local de residência ou etnia, todos os melhores alunos possam frequentar as
principais universidades (NIU; TIENDA, 2010).
Oliven (2007) aponta que, ainda na década de 1960, a Universidade da Califórnia foi
uma das primeiras instituições de ensino a estabelecer programas de ampliação do acesso das
minorias em sua comunidade acadêmica. Chegou a contemplar, no ano de 1994, 21% de
calouros pertencentes a grupos minoritários. Porém, em julho de 1995, suspendeu a adoção de
programas de ação afirmativa com base em critérios raciais. No ano de 2001, a instituição
passou a admitir automaticamente, em campi e cursos menos concorridos, alunos oriundos de
escolas públicas com desempenho superior, indiretamente possibilitando o aumento na
diversidade racial dos alunos admitidos.
Decorrente das controvérsias que envolvem essas políticas sensíveis à raça, muitas
IES estão abandonando o uso de ações afirmativas, que poderiam viabilizar o aumento da
diversidade racial em seus campi. As ações remanescentes têm se mostrado insuficientes para
impedir o desânimo e a desistência de estudantes pobres e negros em aventurar-se num
universo cultural altamente centrado nos valores dos grupos étnicos dominantes – europeus e
asiáticos (PALMER et al. , 2013).
Os progressivos questionamentos gerados em torno da questão da implementação das
ações afirmativas por critério étnico-racial integram um processo que, na opinião de Veras
(2006), se movimenta em direção a um modelo mais “flexível” de ação afirmativa, no qual se
53

constata a ocorrência de certa “desracialização” dos fundamentos jurídicos e políticos


inerentes a esse tipo de política, caracterizada pela promoção da diversidade no lugar da
igualdade, assim como da promoção do indivíduo em vez do grupo. De acordo com Palmer et
al. (2013), as previsões para o futuro sinalizam o final da utilização de ações afirmativas no
ensino superior nos EUA, em decorrência da relutância das IES em fazer uso dessas por temor
de litígios.

2.6.2 Ações afirmativas no Brasil

O debate sobre políticas de ação afirmativa no Brasil é relativamente recente.


Somente a partir de 1990 o diálogo acerca da implantação de ações afirmativas tem se tornado
mais expressivo, alcançando espaço nos meios de comunicação de massa e rodas de
discussão. A partir da III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação
Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada em 2001, em Durban, África do Sul, na
qual o Brasil posicionou-se favorável a políticas públicas que beneficiem grupos
historicamente discriminados, o tema ganhou maior repercussão social (OLIVEN, 2007).
As ações afirmativas são políticas de inclusão especiais e temporárias, tomadas ou
determinadas pelo Estado, de forma espontânea ou compulsória (ESTACIA, 2009), previstas
com o objetivo de garantir a inclusão das minorias em áreas fundamentais da vida humana,
como educação e trabalho (BERTOLIN; BENEDITO, 2013). Atualmente, as ações
afirmativas podem ser definidas como:
Um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório,
facultativo ou voluntário, concebidas com vistas ao combate à discriminação
racial, de gênero, por deficiência física e de origem nacional, bem como para
corrigir ou mitigar os efeitos presentes da discriminação praticada no
passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de
acesso a bens fundamentais como a educação e o emprego (GOMES;
SILVA, 2011 p. 94).

Por definição, devem ser adotadas por um período de vigência determinado,


enquanto perdurarem as condições que justificaram sua criação (APRILE; BARONE, 2008).
Essas políticas objetivam garantir igualdade de oportunidades e de tratamento, bem como
compensar perdas provocadas por discriminação e marginalização, decorrentes de motivos
raciais, étnicos, religiosos, sociais, econômicos, de gênero e outros.
A partir da Constituição de 1988, o debate sobre ações afirmativas foi intensificado e
a constitucionalidade destas questionada. Fundamentado no artigo 5º, caput, cláusula pétrea
54

da Constituição Federal, o princípio da igualdade assevera que “todos são iguais perante a lei,
sem distinção de qualquer natureza”. Ao afirmar a igualdade, estabelece-se o direito formal de
tratamento igualitário, contudo, a proclamação jurídica por si só é insuficiente para reverter o
quadro social brasileiro, dado que o histórico da sociedade brasileira é marcado por um longo
período de escravidão e o status de inferioridade e de discriminação dos grupos sociais
continuam sendo reproduzidos. A Constituição não se limita a proibir a discriminação. Ela
permite também a utilização de medidas que possibilitem uma implementação efetiva da
igualdade material (BARBOSA, 2005). Rompendo com o mero estabelecimento da igualdade
formal, o artigo 3º do texto constitucional admite a existência de uma desigualdade material a
ser combatida (GRAMPA, 2013), determinando entre os objetivos da República brasileira a
erradicação da pobreza e da marginalização; a redução das desigualdades sociais e a
promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação, sendo as ações afirmativas condutas ativas por meio das
quais se busca promover a igualação.
Para o alcance desses objetivos, a atuação ativa do Estado é requerida e as ações
afirmativas visam propiciar a efetiva igualdade de oportunidades a que todos os seres
humanos têm direito (BARBOSA, 2005). Voltadas à garantia da concretização do princípio
constitucional da igualdade material, as ações afirmativas têm como objetivo não apenas
coibir a discriminação, mas, sobretudo, eliminar os “efeitos persistentes” da discriminação do
passado, cujos reflexos são manifestos nas imensas desigualdades sociais existentes em nossa
sociedade (BOLONHA; TEFFÉ, 2012). Esses autores argumentam que, embora formalmente
assegurado constitucionalmente, não foram dispostos mecanismos capazes de garantir
efetivamente tal direito à igualdade.
Bolonha e Teffé (2012) apontam que, permeadas por debates doutrinários em relação
ao princípio de igualdade, nos últimos anos, as ações afirmativas têm oferecido tratamentos
positivos diferenciados, por meio de leis infraconstitucionais, políticas públicas e projetos,
visando promover a igualdade fática entre os cidadãos. As ações afirmativas fundamentam-se
na máxima de que se deve tratar de forma desigual os desiguais, na exata medida de suas
desigualdades.
As ações afirmativas podem ser implementadas por meio de diferentes modalidades e
técnicas, tais como sistema de bônus, incentivos fiscais, estabelecimento de preferências
(BARBOSA, 2005), porém, no cenário brasileiro, as ações afirmativas estão representadas
essencialmente nos programas de cotas, por meio de medidas que contemplam,
55

prioritariamente, a inserção social de grupos minoritários com histórico de exclusão (étnicos,


raciais e deficientes), adotando a reserva de vagas (GUARNIERI; MELO-SILVA, 2007).
A partir de 2001, em algumas universidades públicas foram introduzidas cotas raciais
e de renda, e a política de ações afirmativas foi adotada por algumas universidades federais
(SENA, 2011). No âmbito das universidades, as cotas sociais e raciais significam a efetivação
de uma discriminação positiva, capaz de ampliar a diversidade cultural, racial e social nas
instituições de ensino (BOLONHA; TEFFÉ, 2012). Enquanto as cotas e as políticas de ação
afirmativa são vistas como medidas compensatórias, na compreensão de alguns autores,
outros reconhecem nessas ações a possibilidade de políticas de inclusão social e a
oportunidade de dar enfoque à questão racial. O debate sobre as ações afirmativas é
antagônico e complexo. Uma das críticas mais comumente apresentadas refere-se à falta de
clareza no Brasil para definição de “afrodescendentes” em virtude de raça ser uma construção
social ideológica (FACEIRA, 2009). Pautados pelo princípio da igualdade de oportunidades
na competição entre indivíduos, as políticas de ações afirmativas estão fundamentadas na
desigualdade de tratamento apenas como meio de restituição da igualdade (MOEHLECKE,
2009).
Bolonha e Teffé (2012) assinalam que as universidades públicas brasileiras vêm se
posicionando favoravelmente à adoção de diretrizes de admissão sensíveis à raça e à condição
financeira do cidadão. Apontam que, no ano de 2012, pelo menos 56 instituições públicas já
utilizavam o sistema de cotas como ação afirmativa, traçando e delimitando internamente as
regras, seja por lei ou por resolução universitária.
Com o mesmo objetivo de reparação das desigualdades, em caráter de ação
afirmativa, por meio da Lei 12.711, publicada em 29 de agosto de 2012, foi assegurada a
reserva de vagas para acesso das minorias às instituições federais de ensino. Obrigando uma
reserva de 50% das vagas em instituições federais às cotas, de forma similar ao ProUni, a
política contempla estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas
públicas. Dessas vagas, metade é reservada a alunos com renda familiar per capta igual ou
inferior a 1,5 salário mínimo e a outra metade independe da renda. As cotas raciais são
diferentes em cada Estado, pois são proporcionais à composição étnico-racial verificada pelo
IBGE, e devem incidir sobre a totalidade das vagas reservadas às cotas (50%). Essa proporção
étnico-racial é dividida entre pretos, pardos e indígenas; nenhum segmento étnico/racial pode
ficar sem reserva de cotas (BRASIL, 2012).
No caso das instituições de Ensino Superior privadas, a definição política do
Governo Federal para a eliminação das desigualdades se deu pela criação do ProUni, que opta
56

por expandir o acesso ao ensino superior mediante utilização de vagas que se encontravam
ociosas nas IES privadas. O discurso do governo é de que buscam a democratização do acesso
ao ensino superior e correção das desigualdades via ação afirmativa, entretanto, na opinião de
alguns estudiosos do tema, a medida se configura para as minorias como um benefício ao
invés de um direito (GRAMPA, 2013; CATANI et al. , 2006), e para as IES privadas como
mais uma intervenção do governo em favor das elites dominantes.

2.6.3 Cenário político-econômico antecedente ao ProUni

No período antecedente à criação do ProUni, de acordo com Carvalho (2006), o


controle do déficit público ocupava lugar central na política macroeconômica do Brasil. Outra
significativa alteração no cenário nacional se deu com a abertura dos mercados financeiros e o
crescente fluxo de investimentos disponíveis por parte dos países em desenvolvimento,
momento a partir do qual demonstrar gozar de boa situação fiscal tornou-se insuficiente para
o país; a garantia para com os credores da sustentabilidade da dívida passou a ser o novo
indicador de confiança dos países para recebimento de recursos internacionais (CARVALHO;
LOPREATO, 2005).
Em 1998, o governo de Fernando Henrique Cardoso firmou um acordo com o FMI,
passando a ser exigido pelo referido órgão que o governo garantisse a manutenção de um
superávit primário capaz de assegurar a sustentabilidade da dívida do país. Dado o cenário de
elevadas taxas de juros reais, instabilidade cambial e evolução insignificante do Produto
Interno Bruto (PIB), a alternativa possível foi promover constantes aumentos do superávit
primário. Na gestão do presidente Lula, duas medidas foram adotadas visando a elevação do
superávit: promoção do aumento da carga tributária (30% do PIB, em 1998, para 35% em
2003) e significativos cortes nos gastos públicos (CARVALHO; LOPREATO, 2005;
CARVALHO, 2006).
Para o alcance do equilíbrio orçamentário dos países em desenvolvimento, como é o
caso do Brasil, é recomendado que o país promovesse a redução dos gastos públicos, a
desregulamentação dos mercados domésticos e a privatização das empresas e dos serviços
públicos, dentre os quais estão incluídos os serviços relativos à educação (GUERRA, 2009).
Na opinião de Lopreato e Carvalho (2006), o ProUni pode ser visto como a
alternativa da qual o governo se valeu para aumentar o número de vagas no ensino superior,
sem ampliar diretamente o volume de gastos federais, lógica que atende à política de controle
de gastos públicos e aos objetivos de sustentabilidade da dívida. Cabe aqui mencionar uma
57

outra leitura, feita por Almeida (2006), que argumenta que o ProUni surge como uma
operação de salvamento para o setor privado, devido à profunda crise pela qual passavam as
IES privadas.

2.6.4 Contexto socioeconômico brasileiro e a desigualdade social

Acerca da realidade social do Brasil, Pochmann (2003) chama a atenção para a


contradição existente no país. Paradoxalmente, enquanto o Brasil está classificado entre as
maiores economias mundial, sua distribuição de renda está entre as piores do mundo.
Também apontando os antagonismos existentes no país, Nogueira (2013) argumenta que,
apesar das dimensões continentais e da grande projeção econômica obtida pelo Brasil nos
últimos anos, as desigualdades são muitas e antigas, questões históricas, culturais, econômicas
e subjetivas que estruturam boa parte das relações da população brasileira.
Somos uma sociedade visceralmente desigual desde a nossa origem (OLIVEN,
2007). A origem da educação superior brasileira data do período da chegada da família real e
da corte de Lisboa no Brasil, em 1808, quando surgiram os primeiros cursos superiores,
naquela época, baseados em aulas avulsas e ensinos práticos. Desde o período do Império, as
instituições públicas destinavam-se à formação das elites e, em todos os momentos históricos,
predominou a assistência ao ensino das elites e o despropósito com a universalização da
educação popular, condição necessária para a consolidação da democracia brasileira
(OLIVEIRA, 2004).
O Brasil está colocado como a sexta maior economia do mundo desde 2011, quando
ultrapassou o Reino Unido. A economia brasileira, a partir dessa nova colocação, fica atrás
apenas dos Estados Unidos, da China, do Japão, da Alemanha e da França. A posição leva em
conta o Produto Interno Bruto (PIB), que é a soma de tudo o que um país produz. A renda per
capta brasileira permanece baixa quando comparada aos países ricos (US$ 12,5 mil no Brasil
contra US$ 40 mil no Reino Unido, por exemplo), apesar de ter triplicado na última
década (BRASIL, 2013).
Economicamente, o Brasil está bem posicionado, porém, quando analisado a partir
da perspectiva do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), de acordo com o Relatório do
Desenvolvimento Humano (2011), o status do país fica comprometido, ressaltando as
diferenças existentes. Ocupando o 84º lugar no ranking mundial, o IDH do país é de 0,718,
ficando abaixo de países como Equador e Peru. Embora classificado em posição ruim, o país
tem obtido uma trajetória positiva comparado com as duas décadas anteriores, uma vez que
58

em 1990 o IDH brasileiro era de 0,549 e em 1980 de 0,600. Acerca dos níveis de escolaridade
do país, a expectativa era de que o Brasil alcançasse uma média de 13,8 anos de escolaridade
por indivíduo, porém, até o fechamento do relatório, em 2011, a média obtida foi de 7,2 anos
de escolaridade, índice muito aquém do desejado.
Outra forma de análise das condições socioeconômicas de um país é o coeficiente
Gini, fornecido anualmente pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), que mede
o grau de desigualdade na distribuição da renda domiciliar per capta entre indivíduos. Na
variação de valor zero significa que não há desigualdade de rendas e um representa
desigualdade máxima. De acordo com esse índice, em 1991, o Brasil tinha um grau de
desigualdade de 0,63; em 2000, alcançou 0,64, abaixando em 2010 para 0,60, na média
nacional. Os índices nacionais colocam o Brasil entre os seis piores do mundo em termos de
desigualdade social.
Os dados expostos validam o argumento de Nogueira (2013), que indica que o Brasil
não é um país pobre, mas, sim, um país com muitos pobres, no qual existe uma distribuição
de renda perversa e as oportunidades de inclusão econômica, cultural e social para a camada
pobre são poucas.
A sociedade brasileira é caracterizada por extrema desigualdade espacial, de renda e
de oportunidades e essas desigualdades se refletem na educação e nas oportunidades de acesso
ao mercado de trabalho (NOGUEIRA, 2013). Abordar temas sociais no Brasil significa
observar sempre essas questões, pois, comprovadamente, maiores níveis de escolaridade
garantem melhores oportunidades de inserção qualificada no mercado de trabalho. Embora,
como sinalizado por Barbosa (2005), a educação seja o mais importante bem que o indivíduo
recebe ou deve receber do Estado, sob a alegação de não poder fornecê-la de forma universal,
os recursos têm sido destinados à educação da elite. Dado que, historicamente, a exclusão
educacional tem sido reproduzida, significativa parcela da população brasileira tem estado à
margem do acesso a melhores oportunidades profissionais e, por conseguinte, sociais.
A redução das desigualdades sociais e regionais consiste da equalização das
oportunidades de acesso à educação de qualidade, e figura como um dos objetivos do Plano
de Desenvolvimento da Educação (PDE), lançado pelo governo federal (BRASIL, 2009). A
inclusão social integra os temas prioritários do discurso político contemporâneo, como
instrumento de constituição da cidadania e de consolidação da democracia em bases justas
(KRAINSKI, 2011). Assegurada como direito constitucional, a educação apresenta-se como
um meio de acesso à cidadania, de reversão das desigualdades sociais e, portanto, de inclusão
social.
59

A educação é considerada um dos fatores mais importantes de ascensão social, uma


vez que sem qualificações educacionais não é possível, por exemplo, ocupar posições de
profissionais liberais, entre outras, que proporcionam condições de vida relativamente mais
confortáveis (RIBEIRO, 2006). A educação exerce papel fundamental em proporcionar aos
indivíduos uma bagagem de conhecimentos, habilidades e competências necessárias para uma
participação ativa na sociedade e na economia. De acordo com Pochmann (2003), o processo
de inclusão social das pessoas que não possuem renda é possível, urgente e necessário.

2.6.5 Cenário político-educacional antecedente ao ProUni

De acordo com as determinações normativas da Reforma Universitária de 1968, as


IES de qualquer natureza, quer universidades, escolas ou faculdades isoladas, devem ser,
perante a lei, consideradas fundações ou associações. A partir do lançamento da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996, foram estabelecidas novas diretrizes e bases
para regulamentar a educação nacional e, por conseguinte, as instituições de ensino. De
acordo com o Art. 20 da LDB de 1996, a natureza das IES privadas enquadra-se nas seguintes
categorias:
I – particulares em sentido estrito, assim entendidas as que
são instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas
de direito privado que não apresentem as características dos incisos
abaixo;
II – comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por
grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas,
inclusive cooperativas educacionais, sem fins lucrativos, que incluam
na sua entidade mantenedora representantes da comunidade (redação
dada pela Lei nº 12.020, de 2009);
III – confessionais, assim entendidas as que são instituídas
por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas
que atendem a orientação confessional e ideologia específicas e ao
disposto no inciso anterior;
IV – filantrópicas, na forma da lei.
Guerra e Fernandes (2009) assinalam que, no mesmo contexto da LDB, em agosto de
1997, por meio da medida provisória 1.477-39 (que dispõe sobre cobranças de mensalidades
escolares) e do decreto 2.306 (que regulamenta as práticas jurídicas da IES) publicados no
60

mesmo mês e ano, foi produzida a fundamentação legal para que o setor privado educacional
brasileiro pudesse ter características lucrativas. Nessa mesma compreensão, Jezine et al.
(2011) afirmam que a LDB/96 se constituiu um instrumento legal para a expansão acelerada
da educação superior pela via da privatização, materializando os acordos com o Banco
Mundial acerca da diversificação institucional.
Embora não se possa reduzir a educação à dimensão econômica, é notável que o
modelo hegemônico do neoliberalismo não se limita à atividade econômica, tendo especial
reflexo na educação, não mais concebida como um bem social, mas como um produto
comercial, figurando na agenda da globalização neoliberal a partir do conceito de qualidade e
da ideia de educação para todos (JEZINE et al. , 2011).
A meta para a educação, estabelecida no Plano Nacional de Educação (PNE),
aprovada em 2001, era de que o Brasil alcançasse, até o final de 2010, um percentual de 30%
dos jovens, entre 18 e 24 anos, cursando o nível superior (AMARAL; OLIVEIRA, 2011).
Embora dentre os objetivos declarados do PNE encontrem-se a elevação global do nível de
escolaridade da população, a melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis, a redução
das desigualdades sociais e regionais no tocante ao acesso e à permanência, com sucesso, na
educação pública (ALMEIDA, 2006), o governo recorreu ao setor privado, a fim de atingir
essa meta, pois não dispunha de infraestrutura ou pessoal suficiente para isso, uma vez que
não foram priorizados investimentos na educação superior pública (PELEIAS et al. , 2012).
Conceitualmente, para que um sistema seja caracterizado como de massa, este deve
absorver de 15 a 33% da população e para ser considerado universal deve absorver mais de
33% (GUERRA; FERNANDES, 2009). O ProUni foi criado com a missão de democratizar o
ensino superior no Brasil. No entanto, Prestes, Jezine e Scocuglia (2012) consideram
procedente atentar para o fato de que a massificação da educação superior não significa a
queda da tradicional universidade elitista. De acordo com esses autores, a expansão do canal
de acesso ao ensino superior no país, embora represente iniciativas significativas no plano da
democratização do acesso, não possui força suficiente para derrubar a muralha da diferença de
classe social.

2.7 O PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS – PROUNI

Criado por meio da MP nº 213/2004 e institucionalizado pela Lei nº 11.096, de 13 de


janeiro de 2005, o ProUni surgiu imbuído de um discurso de justiça social (CARVALHO,
2006), tendo como finalidade a concessão de bolsas de estudos integrais e parciais a
61

estudantes de baixa renda em cursos de graduação e sequenciais de formação específica, em


instituições privadas de ensino superior.
De acordo com Guerra e Fernandes (2009), o projeto de Lei 3.582/2004, concebido
pelo Governo Federal Brasileiro, que propõe a concessão de isenção fiscal às instituições de
ensino superior privado em troca da oferta de bolsas de estudo a alunos oriundos da rede
pública, teve como modelo o programa de isenção parcial do Imposto sobre Serviços (ISS),
utilizado inicialmente pela Prefeitura de São Paulo.
O ProUni é um programa de ação afirmativa, constitui-se uma política pública
federal, política redistributiva, uma vez que atende às classes sociais menos favorecidas e de
governo (GRAMPA, 2013, p. 214). Tem como objetivo a promoção da inclusão social, por
meio da concessão de vagas para estudantes de baixa renda em instituições privadas de ensino
superior, destina cotas para os que se autodeclaram pretos, pardos ou índios e optam por ser
beneficiários desse sistema no ato da inscrição, além de uma reserva de vagas para deficientes
físicos (LIMA, 2010). Visa também a promoção e aprimoramento do magistério, sendo
ofertadas bolsas para a formação de professores de ensino básico da rede pública, com
possíveis impactos positivos na qualidade da aprendizagem dos alunos da educação básica.
De autoria do Ministério da Educação (MEC), o projeto de lei foi enviado ao
Congresso sob o argumento de que a implantação do ProUni possibilitaria a criação de novas
vagas no Ensino Superior, para alunos cotistas, sem, contudo, requerer investimento adicional
por parte do governo federal (AMARAL; OLIVEIRA, 2011). Em contrapartida à concessão
das bolsas, o governo oferece isenção de alguns tributos àquelas instituições de ensino
particulares que aderem ao Programa, de acordo com a modalidade jurídica das instituições
(CARVALHO, 2006).
Ao optarem pela adesão ao ProUni, as IES com fins lucrativos recebem isenção da
maioria dos tributos federais; as IES sem fins lucrativos ficam liberadas do recolhimento da
Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS) e para o Programa de
Integração Social (PIS). Para todas as IES filantrópicas existe a obrigatoriedade da adesão ao
ProUni e concessão de bolsas integrais, visto que os tributos municipais podem ser
negociados com os poderes locais. O INSS patronal pode ser parcelado nos cinco primeiros
anos, conforme expresso na legislação do ProUni (SANTOS, 2011).
Para Catani, Hey e Giliolli (2006, p.126), a integridade da proposta inicial do
Programa ProUni, enquanto medida de acesso ao ensino superior para pessoas de baixa renda,
ficou comprometida em virtude das “diversas alterações, influenciadas pelas IES privadas e
beneficentes” e, conforme apontado por Valle (2009), em seu resultado final, o programa
62

passou a atender mais aos interesses de instituições privadas para preenchimento das vagas
ociosas do que a reforçar seu caráter de democratização em relação ao ensino superior.
A despeito do texto da Medida Provisória da Presidência, que institui o Programa,
asseverar que “toda a atuação política relativa ao marco regulatório do ensino superior foi
orientada de forma a buscar a formação de um amplo consenso, incorporando reivindicações e
sugestões de todos os setores envolvidos” (BRASIL, 2004), Guerra e Fernandes (2009)
apontam que as análises da evolução da tramitação do PL até a aprovação final da Lei
mostram que as IES privadas foram o grupo mais ouvido em suas reivindicações, reforçando
opinião contrária ao discurso de democratização.
O texto da Lei estabelece que as instituições com ou sem fins lucrativos e não
filantrópicas concederão uma bolsa integral para cada 10,7 alunos pagantes ou, de forma
alternativa, uma bolsa integral para cada 22 pagantes, com quantidades adicionais de bolsas
parciais (50% e 25%), até atingir 8,5% da receita bruta da IES.
As IES beneficentes devem obrigatoriamente conceder 10% de sua receita bruta em
bolsas integrais para alunos prounistas e destinar outros 10% de gratuidade em bolsas parciais
de 50% e bolsas assistenciais. Para as instituições particulares, com ou sem fins lucrativos, a
participação no programa é voluntária, firmada mediante termo de adesão, enquanto para as
instituições filantrópicas a adesão ao programa e a concessão de bolsas integrais são
obrigatórias. Santos (2011) aponta que o prazo de adesão é de dez anos, podendo ser
renovável pelo mesmo período de tempo, havendo permissão para permutação de bolsas entre
cursos e turnos, até o limite de um quinto das bolsas oferecidas para cada curso e turno.
Guerra (2009) argumenta que, por possibilitar a inclusão no ensino superior de um
estrato da população que não teria acesso a esse nível educacional, devido a limitação de
oferta na rede pública, o ProUni foi apresentado revestido por um discurso de justiça social e
desenvolvimento econômico. No entanto, os discursos oficiais do governo dificilmente
referem-se às pressões exercidas por grupos de interesse das instituições de ensino superior,
cenário marcado por alta concorrência e ociosidade de quase metade das vagas ofertadas.

2.7.1 Critérios Seletivos

Nas IES privadas, os critérios utilizados para selecionar os beneficiários do programa


de bolsas do ProUni são a obtenção de, no mínimo, 450 (quatrocentos e cinquenta) pontos na
média aritmética das notas obtidas nas provas do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM)
e o perfil sócio econômico do estudante, sem necessidade de submissão a processos de
63

vestibular das instituições privadas. As bolsas são destinadas a estudantes oriundos de


famílias cuja renda per capta não exceda um salário mínimo e meio, em caso de pleitos de
bolsa integral, e três salários mínimos mensais, no caso de bolsas parciais (MEC, 2013).
Compete a IES aferir a veracidade das informações prestadas pelo estudante no ato
da entrega dos documentos para matrícula. As instituições podem estabelecer processos
próprios para submeter os candidatos que, uma vez aprovados, são inseridos no programa
mediante termo de concessão de bolsa. Durante a formação é requerido um aproveitamento
acadêmico de 75% (setenta e cinco por cento), sob pena de perda da concessão da bolsa.

2.7.2 O ProUni em números

O Programa ProUni tem seguido uma tendência crescente e já teve o número de


vagas ofertadas praticamente dobrado desde seu lançamento, em 2005. Desde a implantação
do ProUni, o número de vagas ofertadas tem crescido semestralmente. No primeiro semestre
de 2005, quando o programa foi lançado, de acordo com dados do MEC, no Brasil inteiro
foram ofertadas 112.275 vagas, distribuídas entre bolsas parciais e integrais. No primeiro
semestre de 2012 já se atingiu um total de 194.311 vagas ofertadas, perfazendo um
crescimento de 73,1% no total de vagas disponíveis. Grande percentual dessas vagas ofertadas
está no Estado de São Paulo, onde a tendência de crescimento das vagas disponíveis
acompanha os números de vagas nacionais, conforme demonstrado no gráfico a seguir.
64

Gráfico 1: Vagas ofertadas em São Paulo e no Brasil de 2005 a 2013


Fonte: MEC/2014 (elaborado pela autora).

De acordo com os dados estatísticos relativos ao ProUni, as vagas ofertadas no


Brasil, por critério de gênero, estão muito equitativamente distribuídas, sendo que 48% delas
estão ocupadas por alunos do sexo masculino e 52% por alunas do sexo feminino. A
distribuição em termos de raça não segue a mesma tendência distributiva e estão
predominantemente alocadas com alunos brancos (46,8%) e pardos (37%), e o restante
(12,4%), minoritariamente distribuídas entre negros, indígenas e amarelos.
No processo seletivo do primeiro semestre de 2013, o ProUni registrou a inscrição de
1.032.873 candidatos a bolsas de estudos em instituições particulares de educação superior.
(PLANALTO, 2013). Verifica-se, assim, uma relação de 6,4 candidatos para cada vaga
ofertada. De acordo com dados oficiais do ProUni, desde sua criação até o processo seletivo
do primeiro semestre de 2013, o programa já atendeu mais de 1,2 milhão de estudantes, sendo
68% com bolsas integrais (PROUNI, 2013).

2.7.3 Críticas ao Programa

A efetividade do ProUni tem sido amplamente questionada. Levantando debate


acerca do programa, Carvalho (2006) argumenta ser insuficiente a simples concessão de
gratuidade integral ou parcial nas IES privadas para as camadas de baixa renda. Embora,
desde 2006, o MEC tenha passado a fornecer uma bolsa permanência de R$ 300,00 para
65

bolsistas de tempo integral cujas cargas horárias de estudo excedam seis horas diárias, o
número de bolsas disponíveis é baixo, sendo concedidas a um número ainda muito limitado
de alunos; e o valor pago insuficiente para suprir as demandas dos contemplados (PROUNI,
2013).
O ProUni tem sofrido duas críticas básicas: Em primeiro lugar, as instituições de
ensino privadas com status de filantrópicas, que estão submetidas a regras bastante rigorosas,
alegam que para as instituições lucrativas e sem fins lucrativos não beneficentes as regras
mostram-se bem mais flexíveis. A segunda vem dos defensores do ensino gratuito oferecido
pelo Estado que condenam qualquer destinação de recursos públicos a entidades particulares,
pois creem que o melhor seria revertê-los às instituições públicas (ALMEIDA, 2009).
Em análise realizada por Ferreira (2012b) acerca da eficiência do ProUni comparada
à expansão das instituições públicas, o autor aponta que, embora custos muito menores sejam
esboçados com a opção pelo Programa, perpetuar as instituições públicas restritas à classe
mais favorecida, ampliando o acesso dos mais pobres apenas às IES privadas, constitui-se
uma forma de eternizar as disparidades sociais e a discriminação. Entretanto, a promulgação
da Lei 12.711, em 29 de agosto de 2012, com caráter de política de ação afirmativa do
governo federal, que implementa uma reserva de 50% de todas vagas em instituições federais
de ensino às cotas para alunos que tenham estudado em escolas públicas durante toda sua
formação básica, também objetiva reparar essas desigualdades e discriminações.
Para Carvalho (2006) e Catani, Hey e Giliolli (2006), o ProUni aparece como uma
política pública que mascara seu verdadeiro propósito, qual seja: expandir o ensino superior
sem aumentar os gastos do governo, atendendo a um só tempo à demanda da sociedade civil
por mais vagas e os interesses privatistas, na medida em que os bolsistas ocupam as vagas
ociosas das Instituições de Ensino Superior Privadas.
Embora na meta estabelecida no PNE o alvo fosse possibilitar que, no ano de 2010,
30% dos jovens na faixa etária entre 18 e 24 anos estivessem cursando o nível superior, de
acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) somente 13,7%
da população nessa faixa etária estava matriculada no ensino superior em 2009 (AMARAL;
OLIVEIRA, 2011).
66

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3.1 MÉTODO DE PESQUISA

Este estudo é uma pesquisa qualitativa interpretativa básica, do tipo descritiva, uma
vez que se busca obter uma compreensão mais aprofundada acerca de um fenômeno social. A
abordagem qualitativa interpretativa básica está interessada em como os significados são
construídos, em como indivíduos dão sentido às suas vidas e aos seus mundos, sendo o
objetivo principal desse tipo de estudo descobrir e interpretar esses significados (MERRIAM,
2002). Para a realização de pesquisas cujo propósito seja a descrição de uma situação social
circunscrita, na qual se busca obter detalhes acerca do fenômeno, conforme objetiva esse
trabalho, Deslauriers e Kérisit (2008), entendem que o método qualitativo melhor se aplica.
Esses autores indicam ainda que a adequação desse método se dá também pelo fato de que o
objeto por excelência da pesquisa qualitativa é a ação interpretada, tanto pelo pesquisador
quanto pelos seus sujeitos de pesquisa.
A abordagem qualitativa busca atentar para aspectos relacionados com a condição
específica do sujeito no mundo. Merriam (2002) assinala que o método incorpora um amplo
“guarda-chuva” de orientações teóricas e filosóficas, das quais as mais comuns são a
interpretativista, a crítica e a pós-modernista. Em comum às diferentes orientações está a
busca por significados e compreensões, sendo papel do pesquisador instrumentalizar a coleta
e análise de dados, a fim de fornecer uma descrição e enriquecer a compreensão do fenômeno.
As pesquisas qualitativas estão interessadas em compreender o que as interpretações
significam em um tempo específico e em um contexto particular.
No paradigma interpretacionista, a realidade social é entendida como uma rede de
representações complexas e subjetivas e cabe ao pesquisador buscar compreender e explicar o
mundo social a partir do ponto de vista das pessoas envolvidas nos processos sociais,
atentando-se para a experiência subjetiva dos indivíduos (VERGARA; CALDAS, 2007). Essa
abordagem mostra-se apropriada para o alcance do objetivo de compreender a dinâmica de
inclusão e/ou exclusão dos alunos do ProUni, o que envolve a interpretação de uma situação
social pela percepção subjetiva dos atores envolvidos.
67

3.2 TÉCNICA COLETA DE DADOS

A coleta de dados deu-se em duas etapas. Em um primeiro momento foi realizado um


encontro com dois profissionais da área de Responsabilidade Social da IES pesquisada
(responsável pela gestão do Programa ProUni), visando obter uma visão geral acerca da
gestão do Programa dentro da instituição, seguido de análise de dados secundários, como
relatórios e estatísticas fornecidos pela área. Em um segundo momento, foram realizadas
entrevistas em profundidade com alunos e professores, orientadas por roteiros estruturados
previamente elaborados, com base nos objetivos específicos e as perguntas adaptadas em três
versões, com adaptações específicas para cada grupo de atores, de forma a contemplar alunos
prounistas (apêndice A), alunos não prounistas (apêndice B) e professores (apêndice C). Os
roteiros elaborados para os alunos foram revistos após realização de entrevista-piloto. As
entrevistas foram gravadas, transcritas e posteriormente categorizadas e analisadas.
Godoi e Mattos (2006) assinalam que as entrevistas qualitativas contêm um
significado que está radicado na comunicação humana, funcionando como um instrumento
dialógico, constituindo-se uma forma de realização de conversação com fins de pesquisa,
capaz de construir novas situações de conhecimento. Nas entrevistas em profundidade, o
objeto de investigação é constituído pela vida – experiência, ideias, valores e estrutura
simbólica do entrevistado. A opção por esse tipo instrumento de coleta de dados mostrou-se
adequada uma vez que entrevistas dessa natureza tendem a construir um quadro geral e
dinâmico da configuração vivencial e cognitiva do sujeito entrevistado.
Para a coleta de dados foi seguida a recomendação de Rubin e Rubin (2005) que
indicam aos entrevistadores a introdução de temas, encorajam o entrevistado a elaborar sua
fala dentro de uma gama delimitada de assuntos, possibilitando que o discurso seja
apresentado de modo mais estruturado. Compete ao entrevistador ouvir de forma a identificar
o significado do que está sendo dito, buscando obter uma compreensão mais profunda daquilo
que está sendo comunicado, identificando aquilo que é importante para responder ao
problema de pesquisa que está sendo estudado.

3.3 SUJEITOS DE PESQUISA

São considerados sujeitos desta pesquisa, 18 alunos e quatro professores do curso


Direito de uma mesma IES, sendo seis alunos prounistas de semestres iniciais, seis prounistas
de semestres finais, três alunos não prounistas de semestres iniciais, três alunos não prounistas
68

de semestres finais e o grupo de professores. A opção por contemplar de forma distinta alunos
de semestres iniciais e de finais deve-se à busca do entendimento da dinâmica de inclusão e
ou exclusão do aluno durante a formação.
Os alunos participantes foram abordados por meio de um e-mail convite,
configurando-se um critério voluntário de participação. Foram convidados apenas alunos de
segundo e terceiro semestres para compor o grupo de semestres iniciais, uma vez que, apesar
de terem uma chegada recente à Universidade, já obtiveram uma percepção do ambiente
acadêmico. Da mesma forma, a fim de obter uma leitura de maior extensão, alunos de oitavo,
nono e décimo semestres integram o grupo de semestres finais.
A fim de evitar a possibilidade de identificação dos alunos prounistas, os e-mails
foram enviados para os alunos das salas nos semestres de interesse, por meio dos
representantes de classe, ou de forma direta para e-mails de alunos prounistas, indicados por
outros alunos ou ex-alunos prounistas. Em dois momentos a pesquisadora necessitou ir a uma
sala de aula, e, com a devida autorização do professor, expor a proposta de pesquisa,
convidando alunos não prounistas a colaborarem, sendo nesse caso deixado o e-mail para
contato. Três alunos não prounistas foram captados por essa forma de abordagem e os outros
três responderam ao e-mail convite.
Depois de confirmado o interesse e disponibilidade dos alunos, os agendamentos
foram feitos via e-mail, ou por telefone, quando os números eram informados. As entrevistas
foram agendadas de acordo com a conveniência de cada aluno, com exceção de um único
aluno que, embora tendo confirmado o horário de entrevista deixou de comparecer, todos os
agendamentos acordados foram devidamente cumpridos. Os encontros foram realizados
dentro do próprio campus, em sala apropriada, espaço físico confortável e reservado. Apenas
um aluno foi entrevistado em uma das sala de aula, fora de seu horário regular de curso.
Todos os entrevistados mostraram-se bastante receptivos e colaborativos.
No geral, as entrevistas com os alunos prounistas foram mais longas, em função dos
roteiros previamente elaborados para esse grupo serem mais extensos, tendo uma duração
média de cinquenta minutos. Quanto ao grupo de alunos não prounistas, uma das entrevistas
excedeu uma hora de duração, ficando as outras dentro de uma média de trinta minutos, o
mesmo ocorrendo no caso dos professores.
Como critério para escolha do curso de Direito, buscou-se contemplar um curso que
na hierarquia interna entre carreiras no Brasil é considerado imperial (VARGAS, 2010), e que
dentro da IES pesquisada desfruta de tradição e reconhecimento. Com cerca de seis mil alunos
matriculados, consequentemente, oferta grande número de bolsas ProUni, tendo, portanto,
69

uma maior concentração de alunos prounistas nas turmas. O curso de Direito da instituição
conta atualmente com 513 alunos prounistas matriculados, sendo 189 homens e 324 mulheres.
Dentre os alunos prounistas manteve-se uma composição equilibrada entre homens e
mulheres. Para composição dos sujeitos buscou-se respeitar uma proporção entre alunos
prounistas e não-prounistas, porém, por tratar-se de uma pesquisa de natureza qualitativa, a
determinação do número de entrevistas realizadas com alunos prounistas condicionou-se ao
alcance da saturação ou redundância que, de acordo com Godoi e Mattos (2006), refere-se à
percepção que o pesquisador tem de que nada de novo está sendo apreendido pela expansão
do número de sujeitos pesquisados.

3.4 TÉCNICA DE ANÁLISE DE DADOS

A etapa de análise visa dar sentido aos dados coletados e demonstrar como esses
respondem ao problema de pesquisa. Principalmente em pesquisas de natureza qualitativa, a
análise ocupa lugar central (DESLAURIERS; KÉRISIT, 2008). Nas ciências humanas, a
análise de conteúdo constitui-se um instrumento disponibilizado para análise de
comunicações, sendo compreendida como:
Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por
procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de
conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis
inferidas) destas mensagens (BARDIN, 2007, p. 42).

Merriam (2002) ressalta que, embora toda análise de dados qualitativos seja indutiva,
existem diferentes estratégias de análise. Neste trabalho utiliza-se a técnica de análise de
conteúdo para análise dos dados obtidos nas entrevistas. O método, ou conjunto de técnicas,
visa a superação da incerteza, ou seja, garantir que o pesquisador veja no texto aquilo que
efetivamente está nele contido, bem como propiciar um enriquecimento da leitura, permitindo
descobertas de conteúdos e estruturas que confirmem ou neguem o que se busca demonstrar,
esclarecendo significações e mecanismos ainda incompreendidos (BARDIN, 2007).
Embora a análise de conteúdo também possa ser feita por uma abordagem
quantitativa, seguindo uma orientação mais descritiva do conteúdo e utilizando o método de
dedução frequencial para enumerar a frequência com que uma determinada característica de
conteúdo aparece no texto, este trabalho adotou uma abordagem qualitativa, na qual as
análises são feitas por categorias temáticas; as inferências – sempre que realizadas – são
70

fundadas na presença ou ausência do índice (tema, palavra, personagem) e não na frequência


de aparições na comunicação (BARDIN, 2007).
A análise qualitativa de dados possui características particulares, sendo válida,
sobretudo, na elaboração de deduções específicas em relação a um acontecimento ou a uma
variável de inferência precisa, e não em inferências gerais. Essas análises podem funcionar
sobre corpus reduzidos, cabendo ao pesquisador zelar para que o contexto da mensagem e a
compreensão exata do conteúdo desta sejam adequadamente interpretados (BARDIN, 2007).
Visando extrapolar a compreensão dos significados imediatos das comunicações,
Bardin (2007) aponta que a análise de conteúdo se dá por meio de técnicas ou procedimentos
que auxiliam na descrição e interpretação de documentos produzidos, a fim de identificar
conceitos e temas centrais do texto. Estudos dessa natureza são desenvolvidos seguindo uma
sequência de três etapas: (a) a pré-análise; (b) a exploração do material; (c) o tratamento dos
resultados – a inferência e a interpretação (BARDIN, 2007).
A primeira etapa, de pré-análise, consiste em uma fase de organização do material,
podendo-se utilizar vários procedimentos, tais como: leitura flutuante, escolha dos
documentos a serem analisados, formulações de hipóteses e objetivos e, por fim, elaboração
de indicadores que fundamentem a interpretação final. Para a pesquisa aqui proposta, o
material de análise já estava previamente estabelecido, consistindo das transcrições de
entrevistas e os macro-dados fornecidos pela área de Responsabilidade Social da IES
pesquisada. A leitura flutuante foi a primeira atividade realizada pela pesquisadora neste
trabalho, uma vez que, conforme assinalado por Bardin (2007), esse procedimento possibilita
estabelecer um primeiro contato com o material a ser analisado, obter as primeiras impressões
sobre o conteúdo e, progressivamente, avançar em precisão de conhecimento, em função da
projeção das teorias sobre o material de análise, possibilitando uma melhor organização do
conteúdo e uma maior compreensão do fenômeno. As entrevistas transcritas literalmente e
impressas foram lidas e relidas, feitas anotações com indicações dos temas e aspectos
relevantes das transcrições, a partir das quais foram feitos os agrupamentos.
Na segunda etapa, os dados foram codificados a partir das unidades de registro e
unidades de contexto. Os segmentos de conteúdo foram agrupados de forma a transformar os
dados brutos em unidades que possibilitassem uma descrição das características do conteúdo e
que fossem pertinentes face ao material analisado e aos objetivos gerais e específicos dessa
pesquisa. Bardin (2007) assinala que a codificação é organizada a partir de recortes feitos no
texto, em nível semântico, seja por temas eixo em redor dos quais o discurso se organize, por
palavra (palavra-chave, palavra-tema ou categoria de palavra – substantivos, adjetivos,
71

verbos) ou por frase. Dentre os temas, ou unidades de significações, pode-se considerar o


objeto, o personagem, o acontecimento, o documento.
Na última etapa foi feita a categorização ou classificação dos elementos, sendo estes
agrupados em função de semelhanças e diferenças, com posterior reagrupamento, em função
de características comuns dos elementos sob análise. A categorização tem como objetivo
primeiro fornecer, por meio da condensação, uma representação simplificada dos dados brutos
(BARDIN, 2007), podendo ser empregados dois diferentes processos para realização da
categorização:
 A partir de funcionamentos teóricos hipotéticos, as categorias são previamente
estabelecidas, o material é organizado e à medida que os elementos vão sendo
encontrados são repartidos nas categorias, chamadas por Bardin (2007) de “caixas”,
nas quais os elementos ocupam as “gavetas”.
 Não há um estabelecimento prévio das categorias, sendo essas resultantes de
uma classificação analógica e progressiva dos elementos, método esse chamado por
Bardin (2007) de “milha”. Nesse processo, o título conceitual de cada categoria
somente é definido ao final da operação.
A análise das transcrições das entrevistas foi feita com base no método de
categorização progressiva, nomeado pela autora como “milhas”, de modo que ao debruçar
sobre o material, em um processo analítico contínuo de similaridades de significações
contidas nas transcrições, as categorias foram emergindo dos dados. Prioritariamente, os
conteúdos das entrevistas foram organizados por temas-eixos, dando origem inicialmente a 48
temas ou subcategorias, agrupadas por similaridade de assuntos, sendo posteriormente
reagrupadas e organizadas em dez categorias. Aa derivações dos conteúdos a partir dos quais
as categorias foram criadas são apresentados no Quadro 1, apresentado a seguir.

Quadro 1 – Categorias de Conteúdo


Sub-categorias Categorias Finais
Histórico familiar
Condições socio-economicas
Condições de moradia
Base Educacional Quem são eles
Características Pessoais
Experiências profissionais
Escolha da IES

Identificação
Quem eles dizem que são
Identidade Social
72

Desempenho
Dificuldades Obstáculos do Caminho
Desigualdades

Perfil do prounista sob a ótica dos mesmos


Perfil do prounista sob a ótica dos não prounistas
Nós e Eles
Perfil do não prounista sob a ótica dos mesmos
Perfil do não prounista sob a ótica dos prounistas

Prouni - Aspectos Positivos


Prouni - Aspectos Negativos
Estrutura IES - Aspectos Positivos
Estrutura IES - Aspectos Negativos Percepções acerca da IES e do
Atendimento Institucional Programa
Expectativas em relação a IES
Significados de ser prounista
Sentimentos

Ambientação
Dinâmica de sala
Grupo de Convivio Relações Interpessoais
Grupo de Trabalho
Atividades Sociais

Estereótipos
Preconceito
Manifestações Intergrupais
Discriminação
Os agentes

Crenças acerca de Inclusão


Vivências de Inclusão
Estratégias de Inclusão - Institucionais
Estratégias de Inclusão - Pessoais Experiência de Inclusão
Estratégias de Inclusão - Outros alunos
Percepção do Ambiente
Os Agentes

Crenças acerca de Exclusão


Vivências de Exclusão
Estratégias de Exclusão - Institucionais
Estratégias de Exclusão - Pessoais Experiência de Exclusão
Estratégias de Exclusão - Outros alunos
Percepção do Ambiente
Os Agentes

O papel do professor Professor - um agente

Fonte: Elaborado pela autora.

A metodologia de Bardin (2007) propõe que após um primeiro momento no qual o


pesquisador faz a descrição resumida do texto, enumerando suas características, passa-se a
73

uma fase intermediária, na qual ele faz inferências, ou deduções lógicas, que o permitem
chegar às interpretações, ou seja, extrair as significações existentes no conteúdo comunicado,
alcançando, assim, a mensagem entrevista por meio, ou ao lado, da mensagem primeira. Esse
procedimento foi adotado na discussão dos resultados deste trabalho. A autora aponta que o
objetivo é descobrir, a partir de significantes ou de significados (manipulados), outros
significados. Os novos significados ou saberes deduzidos dos conteúdos podem ser de
natureza psicológica, sociológica, histórica, política ou econômica, não necessariamente
esgotando-se nessas variáveis. Aqui se busca compreender a dinâmica de inclusão/exclusão
do aluno prounista, pela percepção subjetiva dos atores envolvidos e pela lente do
pesquisador.
Procedendo a idas e vindas ao material de análise, para instrumentalização, buscou-
se, por meio da inferência e da interpretação, realçar sentidos que se encontram “por detrás”
da mensagem transmitida, articulando os elementos característicos que constam na superfície
do texto com os fatores que determinaram essas características, estabelecendo uma
correspondência da análise descritiva e as variáveis inferidas (BARDIN, 2007).
Buscando seguir o rigor metodológico e ao mesmo tempo ir além das aparências, por
meio de um processo dedutivo, busca-se identificar as causas antecedentes da mensagem e as
suas consequências, ou possíveis efeitos dela, e alcançar os conhecimentos que se encontram
subjacentes ao conteúdo expresso da mensagem. Conforme apontado por Bardin (2007, p.42),
a intenção da análise de conteúdo é “a inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção ou, eventualmente, de recepção (quem é que fala a quem e em que circunstâncias),
inferência esta que recorre a indicadores (quantitativos ou não)”. Os conteúdos deduzidos
podem ser de naturezas diversas, podendo estar apoiados nos referenciais teóricos; busca-se
estabelecer uma correspondência entre as estruturas semânticas ou linguísticas contidas na
mensagem, e as estruturas psicológicas ou sociológicas dos enunciados, possibilitando que
situações concretas sejam visualizadas segundo o contexto histórico e social de sua produção.
Uma análise objetiva procura fundamentar impressões e juízos intuitivos, por meio
da adoção de procedimentos que conduzam a um resultado de confiança, visando atribuir
significação ao texto, de modo a alcançar resultados que sejam ricos e válidos, produzindo
uma interpretação final fundamentada (BARDIN, 2007). Os trechos considerados relevantes
aos objetivos da pesquisa foram discutidos à luz da teoria e em diálogo com pesquisas
anteriores e com os dados fornecidos pela IES, sendo os discursos analisados de forma
alternada, por vezes fornecendo uma narrativa individualizada e em outros momentos pela
74

composição dos diferentes discursos. Porém o estudo se propõe a compreender o quadro geral
da dinâmica, mais do que fornecer análises individuais.
Para melhor manuseio do material e facilitação da construção das categorias foi
utilizado o Software QSRNVivo10. Ferramentas como o NVivo, conforme apontado por Lage
e Godoy (2008), possuem facilidades para a codificação dos dados (atribuição de nomes para
porções de textos, de acordo com as especificações do pesquisador). Permitem também que
sejam feitos reagrupamentos dos textos já codificados, que estes sejam pesquisados e
recodificados, facilitando a geração de ideias, possibilitando uma proximidade entre o
pesquisador e seus dados.

3.5 CARACTERIZAÇÃO DA IES

Localizada na cidade de São Paulo e considerada uma das principais instituições de


ensino do país, a IES pesquisada é confessional e filantrópica e possui tradição em ensino
superior. Atuando há mais de cem anos, conta atualmente com cerca de 44 mil alunos,
predominantemente de classe média e classe média alta (com base no consenso dos
entrevistados). Além das bolsas disponibilizadas para o ProUni, a IES oferece gratuidade para
seus funcionários e filhos de funcionários e possui também uma política de bolsas
precariedade disponibilizadas para a comunidade.
Consta de documentos oficiais da instituição pesquisada que no princípio de sua
história ela buscava romper as barreiras raciais, de classes e de sexo, recebendo em suas salas
de aula filhos de escravos e implantando a prática de salas mistas (BALANÇO SOCIAL,
2010). Contam as publicações históricas acerca da instituição que filhas de protestantes, de
republicanos e de positivistas foram os primeiros alunos recebidos na instituição, vindo
posteriormente os primeiros meninos, um católico e um protestante e ainda uma filha de
escravos, compondo assim um grupo bem diverso; esta era prática incomum à época, mas
que, de acordo com Garcez (2004), alinhava-se aos princípios adotados pela instituição
nascente, uma vez que o respeito à crença, isenção de preconceitos raciais e liberdade política
eram preconizados por seus fundadores. Mais de um século depois, essa perspectiva histórica
retratada fica como o pano de fundo e a IES figura como o cenário a partir do qual são
discutidas as percepções dos atuais alunos acerca de preconceitos, inclusão e exclusão em seu
ambiente acadêmico atual.
A faculdade de Direito da IES pesquisada é renomada por altos índices de aprovação
no Exame de Ordem, sendo possuidora do selo OAB Recomenda. Com uma proposta de aliar
75

ensino e pesquisa, teoria e prática, a Faculdade de Direito dispõe de um Núcleo de Prática


Jurídica, um Escritório Modelo, um Juizado Especial Cível e um Juizado Especial para Micro
e Pequenas Empresas, a fim de possibilitar formação mais abrangente aos seus alunos (SITE
IES, 2014).
O curso de Direito, escolhido para este estudo, existe há quase 61 anos, contando
atualmente com mais de seis mil alunos matriculados, dos quais cerca 10% são bolsistas pelo
Programa ProUni. O vestibular para ingresso no referido curso é concorrido, tendo uma média
de 11 candidatos para cada vaga no processo seletivo do primeiro semestre de 2014.

4. RESULTADOS

4.1 O PROUNI NA IES PESQUISADA

A presente pesquisa restringe sua investigação a apenas uma instituição de ensino da


cidade de São Paulo, escolhida de forma intencional, por critério de acessibilidade, sendo a
seguir apresentados dados relativos ao programa ProUni na referida IES. A fim de obter-se
uma visão inicial do programa na IES, em um primeiro momento foram solicitados dados
secundários desta, que foram fornecidos pela área de Responsabilidade Social, responsável
pela gestão do programa na instituição. Por tratar-se de uma instituição filantrópica, a adesão
ao ProUni data do lançamento do Programa.
O número de vagas ofertadas semestralmente pelas IESs é estabelecido em função da
previsão de recebimento de novos alunos, tendo, em geral, um pico mais alto no primeiro
semestre do ano com uma tendência a ser menor no segundo semestre. Pela análise das vagas
ofertadas, desde a adesão ao programa até o primeiro semestre de 2013, observa-se que, na
IES pesquisada, houve dois picos de ofertas de vagas: um no segundo semestre de 2006 e
outro no primeiro semestre de 2009. De acordo com os dados demonstrados, no início do
Programa, o número de vagas que permaneciam ociosas era grande, chegando a um número
de até 51 vagas em um semestre, número esse que tem diminuído, chegando a quase zero.
76

Gráfico 2: Vagas ofertadas e ociosas na IES pesquisada


Fonte: Dados fornecidos pela IES pesquisada (elaborado pela autora).

Desde a implantação do ProUni na IES estudada, 6.408 alunos já foram admitidos. A


evasão dos alunos admitidos é uma questão preocupante: dados fornecidos pela IES apontam
que, dos 6408 alunos matriculados desde o início do programa, 43,9% deles ainda estão
cursando a graduação, 20% deles concluíram o curso e 36,1% tiveram suas bolsas suspensas,
por solicitação do aluno ou por reprovação.
Dentre os principais motivos apontados para o encerramento das matrículas, o maior
índice é o de solicitações do próprio aluno, seguido por baixo rendimento acadêmico e
evasão. Para o MEC, o índice de evasão é calculado apenas com base no percentual de alunos
que deixaram de comparecer ao curso sem notificação, critério que justifica os baixos índices
de evasão que são oficialmente publicados. No presente trabalho, consideramos evasão
qualquer tipo de encerramento de matrículas, notificados ou não pelos alunos. A Tabela 4
aponta os principais motivos de encerramentos de matrículas na IES pesquisada e os referidos
percentuais.
77

Tabela 4: Motivos de encerramentos de matrículas de 2005 a 2012

Motivos de encerramento de matrículas ProUni


Solicitação do Bolsista 34,0%
Rendimento acadêmico insuficiente 26,3%
Evasão 13,8%
Substancial mudança socioeconômica 13,2%
Suspensão por trancamento de matrícula 3,8%
Constatação de irregularidades na supervisão do bolsista 2,9%
Encerramento da matrícula 2,0%
Inexistência de matrícula 1,8%
Não comparecimento do bolsista no processo de supervisão 0,7%
Não apresentação documentação pendente 0,4%
Esgotamento de prazo de utilização / suspensão da bolsa 0,5%
Decisão judicial 0,1%
Falsidade de informação prestada 0,1%
Matrícula em instituição pública 0,1%
Outros 0,3%
Fonte: IES (elaborada pela autora com dados fornecidos pela Área de Responsabilidade Social).

Grande parte dos alunos que adentram a IES pesquisada não conclui a graduação. A
Tabela 4 apresenta os principais motivos pelos quais os encerramentos se dão. Numa
perspectiva mais macro, já foram aqui brevemente expostos o contexto político-econômico,
socioeconômico e educacional brasileiro, e discutida a relevância da educação para a mudança
deste. A abrangência do Programa ProUni, enquanto oportunidade para a mobilidade social de
grande parcela da população, no âmbito nacional, estadual e local foi aqui exposta, e
demonstrado o grande interesse de pesquisa que o tema tem despertado. Já apresentado o
cenário mais amplo, busca-se aqui uma aproximação à experiência individual dos alunos
bolsistas do ProUni em um contexto local, a partir das teorias básicas abordadas e que
fundamentarão essa aproximação.

4.2 PERFIL DOS RESPONDENTES

Os alunos respondentes dessa pesquisa estão divididos em dois status: prounistas e não
prounistas. O primeiro grupo de alunos é composto por seis homens e seis mulheres, com uma
faixa etária média de 22 anos, sendo que dez desses alunos se autodeclaram brancos e dois
pardos. Dois homens e quatro mulheres integram o grupo de não prounistas, dos quais cinco
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se autodeclaram brancos e um pardo. Uma síntese do perfil geral dos entrevistados, com
detalhamento da cidade e do tipo de escola de origem, semestre e período e sigla atribuída ao
sujeito é apresentada no Quadro 2.

Quadro 2: Perfil geral dos respondentes

Sujeito Sexo Idade Semestre Período Status Escola Origem Cidade Autode claração Cor Sigla
1 Masc 24 Inicial Manhã Prounista Publica Sorocaba - SP Branca P1H - IM

2 Fem 19 Inicial Manhã Prounista Publica Garopaba - SC Branca P2M -IM

3 Masc 20 Inicial Noturno Prounista Publica São Paulo - SP Branca P3H - IN

4 Fem 19 Inicial Noturno Prounista Publica Tanabi - SP Branca P4M-IN

5 Fem 22 Inicial Noturno Prounista Publica Jau - SP Parda P5M-IN

6 Fem 19 Inicial Manhã Prounista Publica Suzano - SP Branca P6M-IM

7 Masc 25 Finais Noturno Prounista Publica Carapicuiba - SP Parda P7H-FN

8 Masc 22 Finais Manhã Prounista Particular São Paulo - SP Branca P8H-FM

9 Masc 29 Finais Manhã Prounista Publica São Lourenço - MG Branca P9H-FM

10 Masc 21 Finais Noturno Prounista Publica Guarulhos - SP Branca P10H-FN

11 Fem 23 Finais Manhã Prounista Particular Itap da Serra - SP Branca P11M-FM

12 Fem 24 Finais Manhã Prounista Publica Mogi das Cruzes - SP Branca P12M-FM

13 Masc 19 Inicial Noturno Não Prounista Part/Publ São Paulo - SP Branca NP1H-IN

14 Fem 24 Inicial Manhã Não Prounista Part/Publ São Paulo - SP Branca NP2M-FM

15 Fem 20 Inicial Manhã Não Prounista Particular São Paulo - SP Branca NP3M-IM

16 Masc 46 Finais Noturno Não Prounista Publica São Paulo - SP Parda NP4M-FN

17 Fem 24 Finais Manhã Não Prounista Particular São Paulo - SP Branca NP5M-FM

18 Fem 22 Finais Noturno Não Prounista Particular São Paulo - SP Branca NP6-FN

19 Fem Professora Branca PROF01

20 Fem Professora Branca PROF02

21 Masc Professor Branca PROF03

22 Masc Professor Negro PROF04


Fonte: Elaborado pela autora.

As siglas especificadas no Quadro 2 foram atribuídas a cada um dos respondentes, de


acordo com a legenda a seguir e serão utilizadas para identificação dos sujeitos de pesquisa,
na etapa de análise dos dados.
79

Quadro 3: Legenda das siglas dos respondentes

P/NP Prounista ou Não Prounista

1,2,3 Sujeito nº

M/H Mulher ou Homem

I/F Semestres Iniciais ou Semestres Finais

M/N Manhã ou Noturno

Fonte: Elaborado pela autora.

4.2.1 Alunos prounistas de semestres iniciais

P1H-IM – Sexo masculino, 24 anos, solteiro, branco, estudante de escola pública e é de


Sorocaba. Fez quatro anos de cursinho, dois anos em sua cidade e dois em São Paulo, pois
sonhava entrar em uma universidade pública. Chegou ao cursinho sem saber tabuadas e após
quatro anos consecutivos tentando aprovação em IES pública desistiu de tentar quando
conseguiu a bolsa do ProUni na IES privada. Seus pais são aposentados, cursaram o Ensino
Fundamental incompleto. Começou trabalhar aos 13 anos, entregando panfletos e saiu do
emprego para estudar. Mora em uma república com mais cinco pessoas, nas proximidades da
universidade e atualmente cursa o segundo semestre de Direito no período da manhã e não
está estagiando.
P2M-IM – Sexo feminino, 19 anos, solteira, branca, estudante de escola pública e é do
interior de Santa Catarina. Fez um semestre de cursinho gratuito em uma cidade vizinha a que
morava, pois desejava cursar universidade federal, mas não conseguiu passar. Considerava
inviável continuar fazendo cursinho particular, devido aos custos e por estar a 90 km de
distância de sua casa. Conseguiu a bolsa do ProUni e veio pra São Paulo, pois tinha a
possibilidade de morar com seus tios, em bairro próximo à faculdade. Sua mãe é cabelereira e
possui ensino superior incompleto; o pai é comerciante e cursou o ensino fundamental
incompleto. Atualmente cursa o segundo semestre de Direito no período da manhã e está em
busca de estágio.
P3H-IN – Sexo masculino, 20 anos, solteiro, branco, estudante de escola pública, é da cidade
de São Paulo. Sua mãe cursou o ensino fundamental. Mora com a avó, em uma casa alugada
em bairro próximo à faculdade. Esta é sua segunda bolsa do ProUni, sendo que anteriormente
cursou três semestres de Direito, em outra faculdade menos conceituada (RUF, 2014).
80

Atualmente cursa o segundo semestre de Direito no período noturno e está estagiando na área
jurídica.
P4M-IN – Sexo feminino, 19 anos, solteira, branca, estudante de escola pública. Seus pais
cursaram até a 4ª série e são trabalhadores rurais. Fez um ano de cursinho, trabalhando de
madrugada para custeá-lo. Veio do interior de São Paulo após conseguir uma bolsa do
ProUni, em outra faculdade menos conceituada (RUF, 2014). Como seu irmão estava
concluindo o curso de Direito na IES pesquisada, com bolsa do ProUni, tentou no semestre
seguinte, uma bolsa para si e conseguiu. Atualmente cursa o segundo semestre de Direito no
período noturno e trabalha em um escritório de advocacia, com vínculo CLT. Mora com o
irmão, em apartamento próximo à faculdade.
P5M-IN – Sexo feminino, 22 anos, parda, estudou no SESI, em virtude de seu pai atuar no
ramo industrial. Veio da cidade de Jaú, interior de São Paulo, após conseguir a bolsa do
ProUni. Sua mãe é cuidadora de idosos e está fazendo curso técnico em Enfermagem, o pai
estudou até a 8ª série e é calçadista. Trabalhou em um shopping center dos 15 anos até vir
para São Paulo. Divide um apartamento com três amigas, próximo à faculdade. Atualmente
cursa o terceiro semestre de Direito no período noturno. Conta com ajuda dos pais e recebe
uma bolsa de pesquisa da IES, valor com o qual paga seu aluguel.
P6M-IM – Sexo feminino, 19 anos, branca, estudante de escola pública. Relata que em sua
escola havia falta de professores na maioria das matérias, até concluir o ensino médio.
Desenvolveu a disciplina de estudar por conta própria, que a ajudou a conseguir a bolsa do
ProUni. A mãe estudou até a 4ª série e é dona de casa; o pai tem ensino médio incompleto e é
comerciante. Mora com os pais e dois irmãos na cidade de Suzano e demora quase três horas
para deslocar-se diariamente até a faculdade. Atualmente cursa o segundo semestre de Direito
no período da manhã e não está estagiando.

4.2.2 Alunos prounistas de semestres finais

P7H-FN – Sexo masculino, 25 anos, pardo, estudante de escola pública, já conseguiu quatro
vezes bolsas do ProUni. Mora com a mãe em casa própria, na cidade de Carapicuíba, interior
de São Paulo, o pai é falecido. A mãe possui ensino médio incompleto e é dona de casa; o pai
estudou somente a 1ª série e exercia a profissão de pedreiro. Está concluindo o décimo
semestre do curso de Direito no período noturno. Durante os dois primeiros anos da faculdade
trabalhava com Telemarketing e a partir do terceiro passou a estagiar em escritórios de
advocacia; com a conclusão do curso será efetivado.
81

P8H-FM – Sexo masculino, 22 anos, branco, solteiro, estudante de escola particular com
bolsa, o que permitiu conseguir a bolsa do ProUni. Seus pais possuem formação superior em
Educação Física e são administradores de academia. Mora com a mãe em apartamento que
adquiriram recentemente pelo programa Minha Casa Minha Vida. Está concluindo o décimo
semestre do curso de Direito no período da manhã, mas não gosta da área. Estagiou durante
alguns semestres e com esses recursos conseguiu fazer um intercâmbio para os EUA.
P9H-FM – Sexo masculino, 29 anos, branco, solteiro, estudante de escola pública. É de São
Lourenço, Minas Gerais e veio pra São Paulo após conseguir a bolsa do ProUni. Filho de
comerciantes, seus pais possuem ensino médio incompleto. Mora com mais quatro pessoas
em apartamento próximo a faculdade e divide aluguel. Está concluindo o décimo semestre do
curso de Direito no período da manhã. Fez estágios em órgãos públicos e quer atuar nesse
setor. Tem prestado concursos. Considera como única deficiência de sua formação o fato de
não ser fluente em inglês.
P10H-FN – Sexo masculino, 21 anos, branco, solteiro, foi estudante de escola pública. Mora
com os pais na cidade de Guarulhos, em casa própria. Sua mãe tem formação superior e é
professora; o pai possui ensino médio completo e é funcionário Público. Atualmente cursa o
nono Semestre de Direito no período noturno. Estagia desde o começo da faculdade,
inicialmente em escritório de advocacia, para obter maior remuneração e mais recentemente
passou a estagiar na área pública, que é a área que mais gosta.
P11M-FM – Sexo feminino, 23 anos, branca, solteira, estudante de escola particular desde a
primeira série, sempre com bolsa integral. Mora com os pais em Itapecerica da Serra, em casa
própria. Seus pais possuem ensino médio incompleto, a mãe é dona de casa e o pai é
vendedor. Está concluindo o décimo semestre do curso de Direito no período da manhã. Fez
estágios em órgãos públicos, área na qual quer fazer carreira.
P12M-FM – Sexo feminino, 24 anos, branca, solteira, estudante de escola pública. Mora com
a mãe em Mogi das Cruzes e usa como meio de transporte até a IES o ônibus fretado. O pai é
falecido e era Policial Civil; a mãe possui formação superior completa e é professora. Contou
com recursos deixados pelo pai para custear-se durante o período da faculdade. Está cursando
o nono semestre do curso de Direito no período da manhã. Fez 11 meses de estágio, mas teve
dificuldade em conciliar a graduação e o estágio morando longe e optou por sair.
82

4.2.3 Alunos não prounistas de semestres iniciais

NP1H-IN – Sexo masculino, 19 anos, branco, solteiro, estudou predominantemente em escola


particular, sendo somente dois anos em escola pública. Mora com a avó em bairro próximo à
faculdade. Sua mãe está cursando Pós-graduação e é professora; o pai é Administrador e está
concluindo mestrado. Atualmente cursa o segundo semestre de Direito no período noturno,
conciliando com formação militar.
NP2M-FM – Sexo feminino, 24 anos, branca, solteira, estudou em escola particular. É de
uma cidade próxima e veio para São Paulo para fazer a faculdade. Sua mãe possui formação
superior e é professora; nunca conviveu com seu pai. Iniciou graduação em Administração na
IES pesquisada, com Financiamento Estudantil (FIES), e posteriormente conseguiu
transferência para o curso de Direito, estando atualmente no segundo semestre, no período da
manhã. Mora com uma amiga próximo à faculdade e não está estagiando ou trabalhando no
momento.
NP3M-IM – Sexo feminino, 20 anos, branca, solteira, estudou em escola particular. Mora
com a mãe, duas tias, a avó e um irmão mais novo; o pai mora em outro país. A mãe possui
formação superior completa e atua como Corretora de Seguros. Cursa atualmente o segundo
semestre, no período da manhã. Estagia desde o primeiro semestre, pois é responsável por
pagar metade da mensalidade, sendo a parte restante paga por sua mãe.

4.2.4 Alunos não prounistas de semestres finais

NP4M-FN – Sexo masculino, 46 anos, pardo, casado, estudou em escola pública e indica ser
de origem humilde. Mora com a esposa em São Paulo. Custeia o seu próprio curso e está
concluindo o décimo semestre do curso de Direito no período noturno, sendo esta a sua
segunda formação. Exerce carreira profissional na área de Ciências Contábeis e pretende fazer
outra graduação para atualizar-se, uma vez que o curso que fez já sofreu várias alterações
desde que se formou.
NP5M-FM – Sexo feminino, 24 anos, branca, casada, estudou em escola particular. Mora
com o marido, na cidade de São Paulo. Seus pais possuem formação superior, sendo que a
mãe exerce a função de corretora de imóveis e o pai é advogado. Fez um ano e meio de
Comércio Exterior, mas, como não gostou do curso, mudou para Direito. Cursa atualmente o
nono Semestre, no período da manhã. Está estagiando no Fórum.
83

NP6-FN – Sexo feminino, 22 anos, branca, solteira, estudou em escola particular, com bolsa
integral. Mora com a mãe, padrasto e irmão, em casa própria, em bairro próximo à faculdade.
Sua mãe possui formação superior e é professora; seu padrasto é secretário geral de uma
escola renomada, motivo pelo qual obteve a bolsa integral até a conclusão do ensino médio.
Está cursando o oitavo semestre de Direito no período noturno e faz estágios desde o início da
faculdade.

4.2.5 Professores

PROF 01 – Sexo feminino, branca, foi convidada a participar da pesquisa por exercer funções
de coordenação no curso de Direito.
PROF 02 – Sexo feminino, branca, foi convidada a participar da pesquisa por haver sido
citada por alunos prounistas durante suas entrevistas.
PROF 03 – Sexo masculino, branco, foi convidado a participar da pesquisa por haver sido
citado por alunos prounistas durante suas entrevistas.
PROF 04 – Sexo masculino, negro, foi convidado a participar da pesquisa por haver sido
citado por alunos prounistas durante suas entrevistas.

4.3 ANÁLISE DOS DADOS

Para o processo de análise dos dados, a primeira atividade realizada foi a leitura
flutuante de cada entrevista. Após contato com o material, realizou-se a codificação dos
dados, sendo estes agrupados por blocos temáticos e, em seguida, criadas as categorizações
dos conteúdos que emergiam do texto. Cada tema abordado foi minuciosamente detalhado e
organizado em subcategorias. Por fim, surgiram dez categorias: 1. Importância e impacto do
ProUni e da IES; 2. Quem são eles; 3. Quem eles dizem que são; 4. Obstáculos do Caminho;
5. Nós e Eles; 6. Relações Interpessoais; 7. Manifestações Intergrupais; 8. Experiência de
Inclusão; 9. Experiência de Exclusão e 10. Professor – um agente. Para melhor manuseio do
material, os dados foram codificados no Software QSRNVivo10. A partir análise dessas
categorias depreendidas, busca-se responder aos objetivos dessa pesquisa.

4.3.1 Categoria: Importância e impacto do ProUni e da IES

Nessa categoria, são abordados os conteúdos relativos aos aspectos positivos e


negativos do ProUni e da estrutura da IES estudada, impressões acerca do atendimento
84

institucional, os significados de ser prounista e os sentimentos que envolvem a experiência


acadêmica nesta universidade. Considera-se relevante abordar esses aspectos, uma vez que
compõem “o pano de fundo”, permeando o cenário no qual ocorre a dinâmica de
inclusão/exclusão dos alunos bolsistas do ProUni. Embora a vivência de inclusão/exclusão
seja do aluno prounista, as opiniões de professores e demais alunos entrevistados também são
apontadas, tendo em vista que são agentes nessa dinâmica e suas opiniões pessoais pautam
suas ações.

4.3.1.1 O ProUni
Tanto na análise dos professores entrevistados quanto dos alunos, aspectos positivos e
negativos do ProUni são ressaltados. De modo geral os professores entrevistados mostram-se
simpatizantes ao Programa, o consideram “incrível”, “um fator de inclusão”, uma forma de
fazer “uma ponte entre igualdade formal e igualdade material”, trazendo esperança para esses
alunos.
[...] é uma política pública de verdade e ela tem um alcance muito grande
(PROF 01).
Eu acho um programa maravilhoso. Eu acho que todos os programas de
inclusão do Governo Federal são programas que objetivam fazer a ponte
entre a igualdade formal e a igualdade material (PROF 02).
[...] eu sou entusiasta do ProUni em especial em relação ao tipo de público
que o ProUni traz pra dentro das universidades privadas (PROF 04).

As limitações da política do ProUni também foram abordadas pelo grupo de


professores. Apontada como uma medida insuficiente que minimiza porém não resolve o
problema de acesso de alunos de classes menos favorecidas à educação superior; é criticada
também por tirar do Estado a responsabilidade de abrir vagas em IES públicas. A crítica feita
por Catani et al. (2006) em relação à qualidade questionável dos cursos superiores ofertados
nas IES privadas e filantrópicas é ratificada pelo PROF 04, que considera que, salvo algumas
exceções dentre as quais a IES pesquisada se inclui, são concedidas muitas bolsas em IES de
qualidade ruim. Tendo em vista que, historicamente, a educação superior no Brasil tem sido
destinada às elites, enquanto a universalização da educação popular sempre foi negligenciada
(OLIVEIRA, 2004), o PROF 03 salienta que, considerando esse contexto anterior, o ProUni é
um avanço.

Acho que foi uma medida, digamos, talvez mais política, no sentido de
talvez de minimizar o problema do que resolver. Mas antes isso do que nada,
porque antigamente as pessoas que não podiam pagar simplesmente não
estudavam (PROF 03).
85

[...] é importante abrir a possibilidade de o aluno estudar, mas é importante


também que as boas universidades estejam abertas pra receber esses alunos e
também haja uma reconstrução dos alunos das universidades públicas que é
onde estes alunos também têm que estar, ou seja, a gente tem que pensar em
qualidade do ensino. Aqui (na IES) é certeza de sucesso, que vai ter
qualidade de ensino, agora em outras universidades... É essa a crítica que se
faz ao ProUni (PROF 04).

A estrutura e o calendário do Programa são alvos da reprovação dos professores, que


traz consequências diretas para o aluno prounista. PROF 01 sinaliza que o calendário do
ProUni, embora usado pelas IES particulares, foi criado para as públicas e sugere haver um
desconhecimento por parte de alguns professores acerca das especificidades do Programa,
sendo o aluno a maior vítima.
Você pega um professor no curso de Direito ele só vai saber: ele chegou um
mês depois e ele está me pedindo para fazer uma atividade... então para ele é
mais serviço. Ele não percebeu que foi toda uma estrutura que foi desenhada
desse jeito, e que esse aluno também é uma vítima, que ele queria estar aqui
um mês antes (PROF 01).

A orientação assistencialista do ProUni, que oferece benefícios ao invés de direitos


aos bolsistas, tem sido criticada por pesquisadores (GRAMPA, 2013; CATANI et al. , 2006).
A limitação da política do ProUni é criticada também pelos alunos. P6M-IM indica que nas
discussões em sala de aula “Quando eles entram nessas medidas compensatórias, eles já
começam a levantar debate, e aí essa política assistencialista do país é muito criticada”.
NP5M-FM diz que “Todo mundo critica essas formas de beneficiar um aluno e não corrigir o
problema em si... [...] tentar tapar o problema com uma peneira [...]”. NP2M-FM considera
ser necessário “Mudar todo o sistema. Esse eu acho que é o grande problema, as pessoas não
pensam em mudar o sistema de educação. Elas pensam só em injetar o dinheiro”. Embora
sejam críticas procedentes, destaca-se que as críticas ao caráter assistencialista da Política
ProUni provêm de alunos não prounistas, que apresentam certa resistência a medidas
compensatórias. Na percepção dos alunos prounistas entrevistados, as necessidades são
maiores do que a simples concessão da bolsa, contemplada pela política, e argumentam que
“só livrar o aluno da mensalidade [...] não é o suficiente” P12M-FM.
As principais críticas indicadas pelos alunos prounistas entrevistados referem-se à
abrangência do Programa, que se mostra insuficiente para democratizar o acesso ao ensino
superior, a dificuldade de acesso a faculdades de qualidade, a imagem de um programa
assistencialista, que concede oportunidade de formação, assegurada constitucionalmente,
como um benefício e não como um direito.
86

Embora aspectos críticos sejam apontados, na fala dos bolsistas entrevistados percebe-
se o caráter determinante que o Programa tem para a vida desses alunos. Sendo a educação
considerada um dos mais importantes fatores de ascensão social, uma vez que a obtenção de
melhor qualificação possibilita o alcance de melhores posições profissionais e torna possível a
conquista de melhores condições de vida (RIBEIRO, 2006), o acesso a uma boa formação é
percebida como decisiva pelos prounistas entrevistados. A oportunidade de uma boa
formação, o contato com pessoas, a obtenção de posições de prestígio no mercado de trabalho
e a possibilidade de mobilidade social são vislumbrados como maiores benefícios obtidos.
Nas falas desses alunos fica perceptível que a oportunidade de acesso à educação superior
obtida por meio do ProUni é vista como meio de salvação, sendo dada uma conotação de que
estavam condenados à exclusão social, cheios de sonhos e aspirações, e que agora vislumbram
uma oportunidade de inclusão e ascensão social.

Oportunidade de vida. Simples. Direto. Uma maneira de alcançar o que eu


quero (P1H – IM).
Contatos. Isso em qualquer profissão é necessário. No Direito mais ainda. O
Direito é basicamente contatos. Nós temos bons professores e temos vários
colegas na sala que são filhos de pessoas influentes e, querendo ou não,
ajuda. E ajuda bastante (P1H – IM).
O ProUni veio para mim, como um salva-vidas mesmo. Uma esperança de
que eu podia sim, ter um ensino superior, eu podia sim estudar numa
faculdade de renome (P5M-IN).
ProUni para mim foi tudo. Foi o diferencial entre a vida que eu achava que
eu ia ter e a vida que eu queria ter (P5M-IN).
Eu acho que é uma oportunidade. Eu vejo como uma megaoportunidade.
Estou encarando como uma ultraoportunidade de efetivamente poder
concretizar esse sonho, que é advogar ou, enfim, ter uma função essencial à
justiça (P6M-IM).
O ProUni para mim, foi a salvação da minha vida, assim... uma chance de
mudar de vida, com certeza. Se não fosse o ProUni eu não sei o que ia
acontecer com a minha vida, o que eu ia fazer... (P7H-FN).
[...] a chance de ingressar numa universidade e me qualificar para o mercado
de trabalho, faz toda diferença (P11M-FM).

A utilização das expressões “salva-vidas”, “salvação da minha vida” e “oportunidade


de vida”, utilizadas pelos alunos, denotam um sentimento de privação, de falta de
oportunidades e de exclusão. Esses alunos consideram que o ProUni “[...] traz esperança para
muita gente” (P5M-IN) e constitui-se “[...] um aspecto de inclusão”, que tem um “[...] fator
social” P1H - IM, portanto, valorizam o Programa e manifestam um sentimento de gratidão à
IES.
87

4.3.1.2 A IES

Acerca da qualidade do atendimento no momento da admissão, de modo unânime, os


alunos consideraram que receptividade, seriedade e atenção foram dispensadas. Informam que
é realizada uma cerimônia ou reunião de recepção inicial para os alunos prounistas, na qual
são explicadas as regras e dadas orientações gerais em relação às matérias, provas e DPs,
avaliadas como fundamentais para o primeiro momento de ambientação na IES. No discurso
dos profissionais responsáveis pela gestão do programa, a igualdade de condições entre
prounistas e não prounistas, também é ressaltada, conforme informam os entrevistados.

A cerimônia de recepção foi bem tranquila. Nós fomos até orientados no


começo a correr atrás das matérias, perguntar, para cobrir esse prejuízo,
entendeu... (P10H-FN).
[...] falaram com a gente lá no auditório, que independente da gente ser
bolsista ou não, a nossa condição de bolsista não muda em nada a nossa
condição como IESzista (P5M-IN).
Eu lembro que teve uma palestra no início, para as pessoas que foram
aprovadas depois de entregar a documentação. Eu achei que foi fundamental
também. Eles explicaram como que era a instituição, eles falaram que a
gente tinha que dar valor a bolsa, como se a gente não soubesse... (P12M-
FM).

A IES pesquisada é reconhecida como uma instituição com boa qualidade de ensino.
Os principais aspectos percebidos como positivos por esses alunos são a oportunidade de
conhecimento e de pesquisas, boa qualidade dos professores, boa estrutura física, organização
e a força do nome (IES renomada), e consideram capaz de abrir portas no mercado de
trabalho, conforme destacam:
[...] eu acho que um dos pontos positivos é o incentivo à pesquisa, a
qualidade dos professores, ah... Enfim, mercado de trabalho, a qualidade das
aulas (P6M-IM).
Eu adoro a instituição, eu gosto do campus, eu gosto dos ares, eu gosto de
tudo, eu gosto de onde as coisas estão. Eu gosto do prédio, eu gosto das
pessoas, eu gosto dos atendentes, eu gosto dos faxineiros (P11M-FM).
Eu acho a organização daqui, eu sei que tem muita coisa para melhorar, mas
assim, eu gosto do jeito como eles são organizados (P12M-FM).
Eu gosto daqui. O nome no nosso currículo faz muita diferença. Se você fala
que você faz aqui, se você fala que faz X ou faz Y, as pessoas já abrem as
portas de muitos estágios, muitos empregos. Tanto é que eles querem alunos
dessas três faculdades (P1H – IM).
Uma universidade de nome, querendo ou não, esse nome conta (P8H-FM).

Esses alunos relatam uma satisfação com a oportunidade de estar estudando na IES,
externam o desejo de extrair o máximo do que a IES tem para oferecer-lhes e de ânsia pelo
88

saber. Vivenciam a conquista da vaga na IES como a realização de um sonho e manifestam


intensidade ao declarar amor, paixão e gratidão à instituição. Conforme expresso por P12M-
FM, a IES representa um “troféu”, uma grande conquista para ela. As declarações a seguir
exemplifiquem os sentimentos.
A IES digamos assim, é um troféu para mim, então eu sou apaixonada pela
instituição, então eu gosto daqui (P12M-FM).
Sou IESzista de coração (P11M-FM).
Eu sou grato a IES. Eu gosto muito da Universidade. Gratidão pelo tempo
que eu passei aqui (P10H-FN).
Ah! IES na veia. Isto é IES, né... (fala rindo) Eu amo a instituição. Gosto
muito da instituição. Falar que estudo aqui é um orgulho (P4M-IN).
Sou muito feliz de falar: Estudei aqui. Dá até orgulho (P9H-FM).

A falta de políticas internas da IES para apoio aos alunos prounistas foi apontada
como aspecto negativo, desfavorável à inclusão. P10H-FN afirma que os prounistas “[...] têm
certas vantagens... a gente não paga documentos... petição de documentos, que os alunos
comuns pagam. Agora tirando isso de facilitação burocrática mesmo, para o prounistas, não
tem mais nada”. P12M-FM lembra que para “[...] quem é muito, muito carente, é muito
difícil se manter aqui”, e P1H-IM afirma que sua expectativa era que “[...] tivesse mais
políticas” que suprissem “[...] pelo menos algumas coisas básicas”. P12M-FM acredita que a
instituição deveria “[...] ajudar a manter os alunos aqui dentro [...]. ajudar com vale-refeição,
vale-livro, eu acho. Porque eu acho que é uma instituição muito forte, que tem condições de
fazer isso”, porém não particulariza a crítica à IES, pelo contrário, compreende que “[...] não é
só aqui que não se dá assistência para o aluno bolsista, qualquer outra faculdade também não
dá”. Verifica-se que a limitação do benefício é salientada e que a expectativa de P1H-IM e de
P12M-FM é de que a IES proveja assistência que possibilite a manutenção deles, uma vez
que o Governo não concede esse apoio. Diante da ausência de outras fontes de apoio ou
políticas que extrapolem a exigência mínima estabelecida pelo Programa, compete a cada um
desses alunos superar seus próprios obstáculos.
P10H-FN aponta como outro aspecto considerado desfavorável da IES pesquisada, o
fato de que, segundo sua percepção, não é dada atenção às evasões dos alunos prounistas,
sendo estes negligenciados. A argumentação de P10H-FN é de que “[...] a faculdade, creio eu
que ela deveria saber pelo menos o porquê (os alunos se evadem) [...] porque, quando o aluno
prounista ele se desliga, a faculdade não procura saber por quê. Acho que isso é o mínimo,
entendeu... E através dessas pesquisas ela começar a fazer programas para que isso não ocorra
novamente”.
89

Tanto na crítica à falta de assistência aos alunos prounistas exposta anteriormente,


quanto no questionamento de P10H-FN, está implícita a percepção de que não são garantidas
condições de permanência a esses alunos, dispensada atenção ou estabelecida qualquer
estratégia de monitoramento a fim de assegurar sua permanência. Cabe ressaltar que cerca de
18% dos alunos ingressantes na instituição com bolsas do ProUni acabam solicitando o
encerramento do benefício ou evadindo-se sem notificar a IES, enquanto aproximadamente
9% desses alunos não alcançam rendimento acadêmico suficiente, tendo a bolsa encerrada,
conforme estabelece a política do programa. Embora ofereça formação de qualidade, a falta
de uma atuação mais efetiva da instituição no sentido de assegurar condições de permanência,
faz com que a expressiva quantidade de vagas ofertadas se reduza a um número menor de
beneficiários, e que a permanência seja a mais dura pena, por falta de reais políticas de
inclusão, que extrapolem a concessão de acesso.
No contato com a área de Responsabilidade Social, responsável pela gestão do ProUni,
não foi mencionada qualquer ação sistemática que vise à retenção dos alunos prounistas. Cabe
ressaltar que o benefício da isenção dos impostos é concedido pelo período, em função do
preenchimento das vagas, portanto, evasões ocorridas durante o semestre não implicam
prejuízo para a instituição, somente a obriga a ajustar a proporção de vagas ofertadas no
semestre subsequente.
A falta de acompanhamento da instituição em relação às condutas inadequadas de
alunos prounistas, também foi abordada como indicativo de descaso institucional. Na
condição de aluno “[...] que paga a faculdade” NP4M-FN questiona não haver por parte da
IES mecanismos de supervisão de alunos prounistas, que, em sua opinião, se comportam
inadequadamente, deixando de assistir aulas. “Então, eu acho que no mínimo é na questão da
frequência perguntar para o aluno: ‘porque é que você tem um grau de [...] ausência nas aulas
tão elevadas’?”. Afirma que isso lhe faz ter “[...] descrédito da instituição, de como ela não
consegue supervisionar isso. [...] E quando teria mecanismos muito fáceis de fazê-lo”. Dado
que na IES pesquisada, o controle de frequência é registrado e que há uma exigência de
frequência mínima de 75% de presença para que qualquer aluno seja aprovado, a opinião do
aluno é de que, ao faltar às aulas, esses alunos estão negligenciando o benefício recebido, o
que não deveria ser aceito pela IES. Embora o conteúdo da fala de NP4M-FN se apresente
como uma cobrança à IES, ela evidencia sua percepção discriminatória, pois transmite a ideia
de que os direitos e deveres de prounistas e não prounistas são diferentes, em que aos
primeiros não é dado o direito de faltar às aulas, mesmo que dentro daquilo que é regulamento
geral de frequência, pois isso significa negligenciar a oportunidade de estudo a eles
90

concedida. A visão da bolsa do ProUni como um favor ou benefício concedido, e não como
um direito, faz com que as responsabilidades e o desempenho das atividades acadêmicas
sejam “fiscalizados” de forma distinta.
Ao aderir ao Programa ProUni a IES pesquisada está simplesmente seguindo
exigência legal imposta a todas as IES de natureza filantrópica. Fazendo-se uma transposição
dos pressupostos teóricos acerca da gestão da diversidade, abordados por Thomas e Ely
(1996), para o ambiente acadêmico, é possível entender que a concessão de bolsas do ProUni
na IES, enquanto política de inclusão do diverso, restringe-se ao paradigma discriminação-
justiça, pois está limitada ao cumprimento de mandatos e força de lei, sem promover ou
facilitar a inclusão dos alunos beneficiados. Diante das lacunas institucionais existentes,
contemplar políticas de integração, proporcionar condições de permanência ou monitorar a
evasão desses alunos, são ações indicativas de que a IES, mais do que inserir esses alunos e
cumprir as cotas exigidas das instituições de natureza filantrópica, busca inclui-los. Contudo,
o que se constata é a inexistência de políticas de apoio a esses alunos, não havendo indicativos
de que haja alguma preocupação em prover ações integrativas de qualquer natureza,
acompanhamento do dia a dia desses alunos ou mesmo amparo assistencial.
Ciente da falta de políticas para suporte aos alunos dentro da IES, P12M-FM mostra-
se compreensiva e afirma que “[...] não é só aqui que não se dá assistência para o aluno
bolsista, qualquer outra faculdade também não dá”. Pesquisa realizada por Santos (2012),
indica que a PUC-Rio, antes da adesão ao ProUni, já dispunha de uma estrutura de apoio a
estudantes de baixa renda, que mostrou-se fundamental para garantir a permanência dos
alunos prounistas após a implantação do Programa. A autora sinaliza que políticas de acesso
ao ensino superior devem ser acompanhadas por medidas de suporte ao estudante durante sua
vida universitária, a fim de garantir uma formação de qualidade e a conclusão do curso. Frente
aos dados obtidos, depreende-se que aos alunos que ingressam na IES pesquisada é fornecida
uma formação de qualidade, de forma que se concede um tratamento igual para o diferente,
assegura-se o direito formal à formação, mas não é dada atenção para a desigualdade material
existente, desconsidera-se a responsabilidade institucional para além do cumprimento da lei.
Mais do que suporte assistencial, Thomas e Ely (1996) consideram que, para que os
verdadeiros benefícios da diversidade sejam obtidos, é necessário que as diferenças entre
indivíduos sejam internalizadas, de forma que consiga aprender e crescer com eles. Uma vez
que prejulgamentos tão próprios aos seres humanos, mas podem ser modificados diante de
fatos (ALLPORT, 1979), principalmente por tratar-se de um ambiente educacional, compete à
91

instituição a responsabilidade de promover uma gestão mais inclusiva, proporcionando um


espaço de discussão e sensibilização para as questões de diversidade.
A criação de espaços de discussão seria ferramenta importante para sensibilização ao
diverso, caso a instituição estivesse atentando promovê-la. A percepção da falta desses
espaços e a importância que teriam para que professores e alunos pudessem melhor
internalizar as diferenças é indicada por PROF 02, quando diz ter “[...] certeza que se tivesse
um debate em sala de aula, um estudo aprofundado dos programas sociais, inclusive do
próprio Bolsa Família, que é tão vilipendiado, tenho certeza que a grande maioria mudaria de
opinião”, e endossada por NP2M-FM, que considera que “[...] o aluno de Direito, que não
percebe como existe a desigualdade. Precisa de um seminário”. A afirmação de PROF 01 de
que “[...] existem situações excludentes, que se agravam por falta de uma ação rápida, por
conta disso: os nossos coordenadores não são preparados, os nossos professores não são
preparados. Eu acho que a gente nunca teve uma conversa assim com os professores”, valida a
percepção de que, dentro da IES pesquisada, está se fazendo cumprir a lei e distante de um
paradigma voltado à diversidade.
Dentro do paradigma aprendizagem-efetividade para a gestão da diversidade, proposto
por Thomas e Ely (1996), a IES teria que atentar para a integração desses alunos dentro da
instituição, buscando garantir igualdade de oportunidades e tratamento justo para todos, com
suas diferenças, e não apesar delas. Também pressupõe que as opiniões e perspectivas desses
alunos deveriam ser trazidas para dentro do ambiente acadêmico, que a variedade de
conhecimentos por eles trazidas pudesse ser compartilhada contribuindo para que todos
pudessem aprender e crescer com eles, nas interações e trocas. Entretanto, diante da ausência
de ações integrativas, o que se percebe é que grande parte dos alunos prounistas ficam à
margem dos acontecimentos, “correndo pelas beiradas”, são emocionalmente afetados, uma
vez que condições marginais afetam a autoestima, refletindo no bem-estar individual desses
alunos, ficando impedida uma troca maior de experiências e aprendizados mútuos.

4.3.2 Categoria: Quem são eles

A fim de entender as condições socioeconômicas dos alunos prounistas, essa categoria


refere-se aos dados pessoais desse grupo. Dentro dessa categoria foram analisados os tópicos:
contexto familiar, características pessoais, base educacional, razão da escolha da IES e
atividades profissionais do estudante.
92

4.3.2.1 Contexto Familiar

Conforme já detalhado no histórico dos respondentes, nas famílias dos alunos


prounistas entrevistados, em 42% dos casos a escolaridade dos pais é Ensino Fundamental
incompleto, 33% têm Ensino Médio incompleto. Como já chamava a atenção de Ferreira
(2012), o nível de escolaridade dos pais dos estudantes constitui-se um fator importante para
mensurar a equidade de acesso ao ensino superior. No exame dos dados de pesquisa da autora,
esta constatou uma disparidade, quando comparado o grau de escolaridade das famílias de
alunos prounistas e dos não prounistas, o que se corrobora neste trabalho. No grupo de
prounistas sujeitos dessa pesquisa, em apenas dois casos os pais obtiveram acesso à formação
superior, sendo que em um dos casos ambos conseguiram concluir o curso; porém, no
segundo caso, apenas a mãe é graduada e o pai não concluiu. Há evidente contraste em
relação aos alunos não prounistas entrevistados, uma vez que neste grupo apenas um
entrevistado não declarou a escolaridade dos pais, e em todos os outros casos os pais possuem
formação superior completa. A inclusão em uma universidade significa para os alunos
prounistas uma possibilidade de mudança na história de suas famílias e uma diferenciação da
geração atual em relação aos pais.
Tanto é que ele (o irmão, também prounista na mesma IES) é o primeiro
neto do meu avô, por parte de pai, a conseguir um título de graduação. Ele
vai conseguir agora, no meio do ano. Ele já passou na OAB. Ele trabalha
num escritório bem grande aqui em São Paulo (P4M-IN).
Na minha família ninguém nunca fez faculdade, então eu só estou
conseguindo agora por causa do ProUni (P11M-FM).
Acredito que seja o primeiro a estar concluindo o ensino superior (P9H-FM).

De forma geral, os pais dos prounistas entrevistados desempenham atividades


profissionais que não exigem qualificação formal: as mães realizam trabalhos informais como
cabelereira, cuidadora de idosos, dona de casa, e os pais trabalham principalmente com
comércio. A renda per capta sendo um dos critérios básicos para concessão de bolsas do
ProUni, pressupõe-se que as atividades desempenhadas por esses familiares são
financeiramente pouco rentáveis, assim, considerando que o benefício concedido pelo ProUni
limita-se à bolsa, torna-se difícil para a família manter o aluno durante a graduação,
implicando o custeio das despesas um sacrifício, como se depreende nas falas abaixo.
[...] ele conseguiu ao longo da minha faculdade dar uma melhorada nas
contas dele. Antes ele vivia com as contas atrasadas, então eu passei metade
do curso, nossa, num perrengue [...] mas o básico está bem mantido e isso já
me deixa bem feliz (P11M-FM).
[...] eliminei moradia sem ter que pagar, então isso foi um alívio gigantesco.
Alimentação o estágio supria. Então, eu sempre procurei estágio de quatro
93

horas, para poder fazer tudo em casa, então alimentação em si eu supria


fazendo em casa, então dá pra conciliar. Basicamente seria isso. Não sobra,
mas também não passa fome (ri) (P9H-FM).

As restrições socioeconômicas familiares interferem nas condições de moradia,


sendo possível constatar que os alunos que moram com suas famílias em casas próprias
geralmente estão fora da cidade de São Paulo. Residir muito distante da faculdade acarreta
maior tempo de deslocamento e isso acaba interferindo no processo de inclusão desses
estudantes, pois restringe a possibilidade de participação desses alunos em atividades
extracurriculares, reduzindo assim o convívio com colegas de curso (esse tema será
posteriormente discutido). Alternativa também bastante comum entre os alunos entrevistados
é a opção de dividir apartamento mais próximo à faculdade ou residir com parentes em bairros
próximos. Nenhum dos alunos entrevistados que mora próximo à IES reside em casa própria
ou com os pais; por restrições financeiras, a possibilidade de moradia é em regiões mais
periféricas ou cidades próximas, assim, para o aluno estar próximo à faculdade, via de regra,
tem que estar longe da família.
Enquanto P12M-FM diz que “[...] moro em Itapecerica da Serra e antes eu morava em
Capão Redondo, ou seja, só periferia, né...”, P11M-FM optou por morar mais próximo, “[...]
a gente paga aluguel, a gente não tem casa própria, nem nada [...]” e, como a mãe mora fora
de São Paulo, considera ser mais econômico estar próximo à faculdade dividindo com amigas,
uma vez que “[...] sai R$ 400,00 para cada uma, para um apartamento aqui”. Rearranjos
familiares são feitos a fim de acomodar os filhos estudantes e facilitar o acesso destes à
faculdade. “Agora que ela (a mãe) está conseguindo comprar um apartamento pelo Minha
Casa Minha Vida, mas, assim, ainda nem financiou pela Caixa. A minha avó tem casa própria
e eu moro na casa dela”.
Com exceção de P4M-IN que, por morar com o irmão e ambos estarem trabalhando,
afirma que “[...] eu e meu irmão nós dependemos zero dos meus pais atualmente”, e de
P12M-FM que contou com ajuda extra de “[...] um seguro de vida que meu pai deixou pra
mim”[...]”, principalmente nos semestres iniciais os alunos prounistas dependem
financeiramente dos pais, que nem sempre possuem recursos suficientes para custeio das
necessidades básicas de manutenção dos filhos, sendo estes de alguma forma obrigados a
arcar com parte das despesas.
[...] quando acabou o meu seguro desemprego, começou a minha iniciação
científica, então eu não fiquei nenhum mês sem receber dinheiro [...] o meu
pai me paga pensão... Então, a pensão que ele me manda é para eu me
alimentar (P5M-IN).
94

[E seus pais têm condições de ajudar?] Acho que têm... De ajudar. E o meu
primo também. Já vai ter as despesas de casa também. Eu pensei em arrumar
o trabalho e eu mesma pagar o aluguel e deixar as outras despesas com os
meus pais (P2M – IM).
Meu pai me ajuda com o dinheiro para o transporte, mas a alimentação, se eu
quiser comer por aqui, é tudo na marmita, ou não come. Come um lanche,
traz de casa (P11M-FM).

Morar distante da faculdade implica para esse aluno restrição ao envolvimento em


atividades paralelas dentro da instituição. As condições socioeconômicas inserem essas
famílias em classe social distinta da classe social predominante entre os alunos da IES,
considerada de classe média (com base na percepção dos próprios entrevistados), dois fatores
relevantes que podem interferir na inclusão desses alunos na IES.

4.3.2.2 Características Pessoais

As características pessoais dos alunos podem influenciar tanto o processo de


interação social e construção de vínculos, como a percepção do aluno acerca de sua
experiência de inclusão e exclusão no ambiente acadêmico. P5M-IN considera que para sua
experiência de ambientação na IES “[...] o diferencial mesmo foi o meu temperamento,
porque eu sou muito comunicativa, eu falo com todo mundo, se eu tenho uma dúvida eu vou
lá e pergunto, eu não tenho vergonha”. Conforme percebido pela professora PROF 01

[...] se ele é um cara expansivo, em trinta segundos ninguém sabe mais que
ele entrou depois, mas, se ele tem um outro perfil, um perfil mais calmo,
mais tranquilo [...] aí começa o nosso problema, que é um problema real.

Acerca das relações entre alunos prounistas e não prounistas em sua sala, P1H-IM
acredita que ser um aluno com bom desempenho facilita as relações, porque os outros alunos
os procuram, mas considera que “[...] não é só a qualidade, acho que tem a conversa também
[...] as pessoas que são muito boas (como alunos), mas são introspectivas não conseguem ter
tantos contatos assim”. Assim, considerando a relevância dos aspectos pessoais para as
interações sociais dos alunos entrevistados, nessa categoria apresentamos as diferenças
individuais como parte da definição de quem são esses alunos.
De acordo com a Escala Fatorial de Autoconceito, proposta por Tamayo (1981, p. 97),
o termo “retraído” descreve aquele “[...] um solitário, fechado aos outros, com uma
capacidade de relacionamento social fraca, tímido, puxado para trás”, enquanto expansivo é
95

aquele que “[...] se percebe como uma pessoa social, que gosta de comunicar, aberta aos
outros, popular, desejada pelos outros”.
Com base na autodescrição de cada aluno foram criadas as classificações: retraídos e
expansivos, e cada aluno prounista enquadrado em uma delas, conforme apresentado no
Quadro 04.

Quadro 04 – Características pessoais dos respondentes

Retraídos Expansivos
Sujeito Evidência Sujeito Evidência
Eu sou uma pessoa que
converso com todo mundo,
P2M - IM Eu sou mais na minha P1H - IM
mas eu não dou muita
abertura.
Gosto de brincar, sou uma
Ouço e falo menos do que a
P3H - IN P4M-IN pessoa muito brincalhona, só
maioria
tenho cara de séria, só.

Eu faço amizades rápido


P6M-IM Eu sou mais tímida P5M-IN também... então, eu já fiz
amizades com a minha sala...

Não se definiu, porém se


P8H-FM encaixa mais no perfil P7H-FN Mais falante
introspectivo
Eu sou muito reservado Eu conheço todo mundo na
também, muito na minha, não sala. Converso com todos e
P10H-FN P9H-FM
gosto muito de me envolver tenho bom relacionamento
com coisas desnecessárias. com todos.
Eu sou muito alegre, muito
animada, muito falante [...] O
P11M-FM
meu lado é mais extrovertido,
espontâneo.
Eu sou fácil para comunicar
P12M-FM com as pessoas, então acabei
fazendo amizade rapidamente
Fonte: Elaborado pela autora.

4.3.2.3 Base Educacional

Enquanto dentre os alunos não prounistas entrevistados, apenas um provém de escola


pública, os alunos prounistas são predominantemente oriundos destas, a exceção de dois que
96

conseguiram bolsas integrais em escola particulares, por critério de precariedade. É


recorrente, entre os entrevistados, haver maior prejuízo na área de Exatas. Alguns relatos dão
uma dimensão da defasagem do ensino obtido pela maioria deles. “Não tive nenhuma aula de
física nem de química durante o Ensino Médio inteiro”, afirma P1H-IM. Embora tendo
obtido um ensino de baixa qualidade, P2M-IM ainda considera-se, em algumas disciplinas,
sob alguma perspectiva privilegiada, uma exceção em termos de padrão de qualidade do
ensino recebido, quando diz que: “Eu não sei nada de matemática. Eu tive a sorte de ter, da
quinta ao terceiro ano, duas professoras excelentes de língua portuguesa, mas em outras áreas
era bem crítico”.
Diante de tão grande déficit escolar, o sonho de conquistar uma vaga em uma
universidade de melhor qualidade requer uma reparação mínima da formação, porém, em
virtude dos limitados recursos financeiros familiares, cursinhos preparatórios de boa
qualidade só são possíveis para alguns alunos que obtêm bolsas de estudos. Verifica-se que
eventualmente o cursinho se presta a corrigir a formação básica, fazendo-se acompanhar de
uma pressão psicológica, pois muitos desses alunos sabem que precisam conseguir superar
essa barreira restritiva da má formação para conquistar a bolsa, que pode representar um
ponto de virada em suas vidas.
Penei muito porque eu não tinha noção de praticamente nada, porque eu
senti uma grande diferença do ensino que eu tinha na escola para o ensino do
cursinho [...] Eu tive que me dedicar completamente a Humanas, porque eu
não tinha condições de fazer mais um ano de cursinho e não aguentaria, acho
que psicologicamente... (dá uma respirada cansada) (P4M-IN).
[...] entrei no cursinho sem saber tabuada [...] Fiz quatro anos de cursinho.
Eu chegava a estudar 16 horas por dia, de segunda a segunda. Eu estudava
de segunda a sábado e no domingo fazia prova [...] (P1H - IM.).

Há outros que recorrem aos cursinhos comunitários e ainda aqueles que elaboram
programas pessoais de preparação.
Eu fiz cursinho comunitário. Eu fiz um cursinho comunitário que tem em
Guarulhos. Era aos fins de semana. [...] Eu fiz só os últimos seis meses do
terceiro ano do ensino médio, entendeu... O resto eu estudei por fora. (P10H-
FN).
[...] eu acabei estudando por conta própria, foi o que ajudou. [...] porque se
dependesse da escola em si... (P6M-IM).

4.3.2.4 Escolha da IES


97

A IES pesquisada possui tradição e reconhecimento pela qualidade de seu ensino. Na


concepção de Carvalho (2006), a obtenção de uma bolsa do ProUni em instituições privadas
de qualidade é uma oportunidade concedida para poucos alunos, para os quais haverá chances
reais de ascensão profissional e, consequentemente, social.
A escolha da IES para a qual o aluno se candidata no ProUni pode fazer grande
diferença na qualidade da formação. Carvalho (2005) assinala que parte significativa da
população demanda acesso a oportunidades de ensino de qualidade. Metade dos alunos aqui
entrevistados refere que tinham o desejo de cursar uma universidade pública, mas que pela
dificuldade de obtenção de aprovação no processo seletivo escolheram uma faculdade privada
de boa qualidade.
[...] meu primeiro foco sempre foi USP, como a maioria das pessoas, é o
sonho e tudo mais, e eu queria bastante. Só que a prova era muito difícil [...]
(P11M-FM).
[...] eu consegui a minha vaga aqui. Não pensei duas vezes... Eu não vou
continuar estudando mais dois anos se eu já consegui uma vaga numa
instituição muito boa (P11M-FM).

Seriedade e qualidade foram os principais critérios mencionados pelos alunos para


justificar a escolha da IES. Alguns alunos que obtiveram bolsas em outras faculdades menos
conceituadas, aspirando uma melhor formação, acabaram prestando o Enem novamente e,
conseguindo aprovação posterior, ingressaram então na IES foco deste estudo. Em um único
caso, o aluno afirma que o motivo de sua vinda para a IES foi a não formação de turma em
outra instituição de ensino com qualidade de ensino reconhecidamente inferior.
Eu sou o único dos meus amigos que está numa boa faculdade (P1H-IM).
Ah... porque eu sabia que para o curso que eu queria era uma das melhores
universidades (P2M-IM).
Eu tinha bolsa na XXX de Direito também, aí eu fiz até o 3º semestre e aí eu
falei: Ah, vamos tentar um passo além. Eu vim pra cá, passei (P3H-IN).
[...] ano passado, eu consegui a bolsa aqui e vim pra cá. E assim, foi como a
realização de um sonho [...] E assim, eu passava todo o tempo frustrada, com
vontade de ir para uma universidade melhor (P6M-IM).

Pesquisas anteriores (SANTOS, 2011; SENA, 2011) já relataram que os alunos


prounistas são considerados o orgulho da família e aqueles que proporcionam novos rumos
sociais para os familiares. O acesso a uma formação que, por motivos diversos, não foi
possível aos pais, dão a esses alunos um papel de destaque e os tornam referências em seus
lares. Ao falar do irmão que está concluindo o curso de Direito, é notável a empolgação de
P4M-IN ao dizer que ele “[...] foi o primeiro neto, dos dois avôs, a entrar numa universidade
[...]”, por isso tornou-se o “[...] orgulho da família completamente”. Nota-se uma gratificação
98

pessoal desses alunos, por proporcionar alegria à família, como expresso na fala de P12M-
FM “[...] é legal ver minha mãe orgulhosa, falar para os vizinhos que eu estou estudando
aqui”. P6M-IM, cujos pais possuem apenas ensino fundamental; refere que quando pequena
era incentivada por eles a estudar e agora é usada como exemplo pelos pais para estimular
seus irmãos, pois agora “[...] eles sempre falam: ‘estuda. Faz igual a P6M-IM fez’”.

4.3.2.5 Atividades profissionais

Alguns alunos prounistas entrevistados relatam terem iniciado atividades


profissionais desde muito novos, executando trabalhos informais, tais como entrega panfletos
aos 13 anos, trabalhar em shopping center com 15 anos ou trabalhar na extração de látex, para
juntar dinheiro para fazer cursinho. Muitos desses alunos têm a responsabilidade por
contribuir para o orçamento familiar e, conforme anteriormente sinalizado por alunos
pesquisado por Oliveira et al. (2012), a remuneração recebida, ainda que pequena, contribui
tanto para possibilitar a permanência desses alunos na instituição, quanto para suas formações
acadêmicas. A fala de P11M-FM acerca do término de seu contrato de estágio expressa a
relevância econômica que o estágio tem para a manutenção de alguns alunos: “Então fica esse
buraco financeiro, porque, querendo ou não, você ganha R$ 500,00, mas são R$ 500,00, que
na minha família faz muita diferença”. As dificuldades financeiras permeiam as tomadas de
decisão desses alunos, que, por vezes, acabam restringidos em suas possibilidades de escolhas
profissionais, de forma que o critério financeiro prevalece sobre os interesses e gostos
pessoais. P10H-FN informa que
[...] desde o começo da faculdade eu tive que trabalhar. Agora que eu
consegui largar um pouco o trabalho mais pesado, porque antes eu estagiava
só em escritório de advocacia, para ganhar mais, agora, fui para a área
pública que é uma área que eu gosto.

A grande maioria dos alunos prounistas informa trabalhar ou estagiar desde o início
do curso, sendo que apenas três alunos dos semestres iniciais ainda estão em busca de
oportunidades de estágio. Alguns alunos do grupo de não prounistas entrevistados, também
declaram estagiar mais por necessidade do que por opção e, em alguns casos, têm que ajudar
no custeio da mensalidade do curso. Dos seis alunos deste segundo grupo, dois têm as
mensalidades custeadas pelos pais e um possui condições socioeconômicas, não referindo
dificuldade para tal; dois obtiveram Financiamento Estudantil (FIES), e uma afirma que se
“[...] não tiver o meu estágio, eu não tenho condições de estar aqui”. Os três últimos casos
99

denotam que a condição socioeconômica de metade desse grupo de alunos difere em algum
nível do perfil de alunos predominante na IES, caracterizada como de classe média e classe
média alta, havendo certa aproximação e identificação, pelo menos dessa metade do grupo
com o perfil social do aluno prounista.
Em síntese, a análise dos dados pessoais aponta que os alunos prounistas
entrevistados diferem do grupo de não prounistas principalmente no histórico familiar,
formação escolar anterior e condições sociais. Os alunos do ProUni são provenientes de
famílias cujos pais possuem nível de escolaridade fundamental, que desempenham atividades
profissionais que não exigem qualificação formal e desfrutam de condições socioeconômicas
restritas e, em sua maioria, estudaram em escolas públicas ou em escola particular com bolsa.
Comparado ao grupo de não prounistas entrevistados, se assemelham com metade deles, no
que se refere à necessidade de estagiar ou trabalhar para garantir a manutenção das despesas
do curso, contudo distinguem-se do perfil social predominante entre os alunos não prounistas
da instituição. Cabe observar que acentuadas diferenças entre prounistas e não prounistas
podem trazer implicações negativas para as interações entre eles, uma vez que a percepção de
similaridade é um fator importante nas relações intergrupais, e o status igual entre grupos
possibilitam que contatos sejam mais bem sucedidos (TRIANDS, 2003).

4.3.3 Categoria: Quem eles dizem que são

Nesta categoria são discutidos os aspectos relativos à identificação e à identidade do


aluno prounista frente ao grupo, das subcategorias: Receios, Identificação/Não Identificação e
Revelação Voluntária/Involuntária.

4.3.3.1 Receios

Verifica-se que da aprovação do aluno no processo seletivo do ProUni até a chegada à


IES há um período permeado por sentimentos ambivalentes. Embora, em geral, os alunos
prounistas vivenciem um sentimento de alívio e de superação pela conquista da almejada
bolsa do ProUni, sintam-se felizes por serem considerados motivos de orgulho para seus
familiares, no início há também um receio da reação dos colegas em relação aos prounistas,
do tipo tratamento que receberão durante o processo de formação dentro da instituição;
100

temores esses que antecedem e, em alguns casos, persistem durante a graduação, por tempos
diferentes, dependendo do processo de adaptação de cada aluno.
Em um país como o Brasil, no qual a educação superior sempre esteve destinada à
formação das elites, em que as camadas menos favorecidas da população sempre foram
negligenciadas (OLIVEIRA, 2004), a concessão de acesso a uma IES como a pesquisada
revela as distâncias sociais existentes, fazendo emergir nesses alunos um temor das
implicações que podem advir do convívio social durante o curso. Na fala de P4M-IN, citada a
seguir, constata-se que a chegada à IES é percebida como um adentrar a um lugar ao qual não
faz parte, no qual se vai “cair”. Embora P4M-IN já tivesse referências acerca da instituição,
uma vez que o irmão já estudava nela, a incerteza acerca do tipo de tratamento que receberia e
de como se sentiria diante de um grupo socialmente diverso ao seu já a inquietava antes de
obter a bolsa. P6M-IM também possuía temores acerca do novo ambiente e das pessoas com
as quais passaria a conviver e decide-se por, em um primeiro momento, omitir a informação
acerca de sua condição de prounista, até que estivesse certa de que não lhe seriam
desfavoráveis. P5M-IN relata que seu temor é compartilhado também por outros alunos e
considera que declarar-se prounista é uma informação que não se revela a qualquer pessoa,
sendo necessária uma relação de proximidade com aqueles para quem se “solta” esse tipo de
informação. A expressão “vai soltando” utilizada por P5M-IN dá uma conotação de um
segredo, que só se conta para pessoas de confiança. que sugere haver uma percepção de que
esse ambiente oferece algum tipo de risco, podendo trazer consequência negativa estar ali
com bolsa do ProUni. As falas abaixo evidenciam que P5M-IN faz uma análise de prévia do
ambiente e de seus riscos antes de tomar uma decisão e que P6M-IM tem um comportamento
estratégico em relação aos colegas.
[...] eu ficava pensando: e se eu caísse aqui, como eu seria tratada e como eu
me sentiria?... Onde tem pessoas que têm a classe econômica bem diferente
da minha. Eu me questionava sobre isso (P4M-IN).
Resolvi sentir o clima [dá risada]. Então, de início foi logo no primeiro dia,
eu não vou falar nada [acerca de ser do ProUni], aí se eu perceber que
ninguém falou nada, que está tudo tranquilo eu me manifesto (P6M-IM).
[...] eu lembro que no começo eu tinha o maior receio de falar que eu era
bolsista, vários alunos têm esse receio de falar que são alunos do ProUni.
Mais aí, quando a gente vai tendo mais intimidade a gente vai soltando, é
entrei pelo ProUni (P5M-IN).

Verifica-se que todas as alunas dos semestres iniciais entrevistadas referem-se à


vivência de um temor inicial, mas que, conforme afirma P5M-IN, “[...] com o tempo passa”,
sendo que nos semestres finais não são mais mencionados. Para cada indivíduo a experiência
da inclusão no espaço acadêmico é singular, cada alegria ou temor é vivenciado de acordo
101

com a subjetividade própria de cada um e em resposta a objetividade das pessoas e do meio


social. Pode-se afirmar que no grupo de alunos entrevistados os temores por eles referidos
estão relacionados com a convivência e a reação do grupo de alunos não prounistas da IES, e
em relação aos tratamentos e revelação da identidade de prounista.

4.3.3.2 Identificação/não identificação

Não há consenso acerca da possibilidade de identificação dos alunos prounistas.


Dentre o grupo de prounistas, alguns creem que a identificação é possível, enquanto outros
afirmam categoricamente que, a menos que seja dito, não se pode saber se um aluno é ou não
prounista e essas opiniões diferem do mesmo modo entre o grupo de não prounistas. Todos os
professores entrevistados afirmam que só identificam os alunos que lhes contam.
De um lado, há um entendimento de que eles se reconhecem entre si, manifesta na fala
de P5M-IN. “Olha é uma coisa estranha. A gente se identifica, sabia... a gente acaba se
identificando. Não sei se pela própria história de vida, né, a gente acaba se identificando” e,
por outro lado, pela fala “[...] eu não sei explicar... Dá pra saber que é ProUni”. Nesses
trechos há uma percepção dos alunos de que haja alguma característica distintiva a partir da
qual se pode identificar esses alunos, porém não nomeiam quais, como se não quisessem dizer
em que aspectos se percebem diversos aos outros alunos, nomeiam como uma “[...] coisa
estranha” “[...] que não se sabe explicar”.
O grupo de alunos não prounistas entrevistados também percebe de forma diferente a
possibilidade de identificação dos alunos prounistas. NP3M-IM acredita que “[...] é bem
escondido mesmo. Elas acabam tendo vergonha de admitir: Ah. Eu fui beneficiado pelo FIES
ou pelo ProUni”. Em sua percepção os prounistas “[...] não têm confiança [...] ela não vai
falar [...]”, pois dizer que é prounista “[...] é como falar que eu sou pobre”. A aluna considera
haver uma associação da identidade de prounista com a de uma pessoa pobre, portanto,
aparentemente internalizou e está identificada com essa categoria, considerada de valor mais
negativo frente ao meio, pelo que tende a evitar dar a conhecê-la por temor das implicações
que pode trazer para sua relação com o grupo dominante (HOGG; ABRAMS, 2001). NP4M-
FN convive com um grande grupo de alunos prounistas, uma vez que em sua sala de aula tem
cerca de dez alunos bolsistas do programa, dos quais quatro integram seu grupo de trabalho.
Em sua opinião, a identificação é possível em virtude do “perfil mais humilde” desses alunos.
Frente a um ambiente em que as condições socioeconômicas são distintas, o perfil social
predominante na IES difere do perfil estabelecido para enquadramento nos critérios do
102

ProUni, as diferenças individuais acabam interferindo na forma como cada indivíduo se


percebe e é percebido e em como responde ao ambiente.
Na fala de NP3M-IM, citada anteriormente, a entrevistada faz uma associação da
identidade de prounista com a de uma pessoa pobre, portanto, para conviver dentro de uma
IES considerada de classe média e classe média alta essa identidade deve ser omitida, motivo
pelo qual, segundo ela, eles não se identificam. A entrevistada refere-se ao sentimento de
vergonha e de não pertença, argumentando que estes “[...] não se sentem em casa, para falar
que eu sou beneficiária pelo Programa, porque vão falar que eu não sou daquele meio”
NP3M-IM. Berg (2002) aborda esse tipo de experiência como um dilema das relações
intergrupais, em que, encontrando-se em ambientes heterogêneos, indivíduos excluem
voluntariamente partes da própria identidade por temor às consequências que podem advir de
trazer-se integralmente para o ambiente.
A situação a seguir ilustra como a temática da identificação dos alunos prounistas é
subjetiva e envolve formas de pensamento e percepções individuais. P2M-IM e P6M-IM
vivenciaram uma mesma situação na qual, no primeiro dia de aula, foram constrangidas a se
identificarem como prounistas, sendo solicitadas a erguer uma das mãos e ambas relatam o
episódio. P2M-IM descreve o momento em que

[...] no primeiro dia, como estava todo mundo no trote, tinha umas quatro
pessoas dentro da sala, aí chegou uma mulher aquelas que acendem o
Datashow e perguntou se tinha alguém do ProUni, aí que eu achei
esquisito... e ninguém entendeu

P6M-IM continua a narrativa dizendo que a referida pessoa perguntou

[...] alguém aqui é bolsista? E aí eu e essas duas pessoas.... era pouquinha


gente que tinha na sala. Nós levantamos a mão, e aí ela falou assim: “Ah!
Que bom, tal...” e foi embora. E assim, por conta desse episódio, muita gente
sabe que a gente é bolsista.

Verifica-se que a crença de P6M-IM é de que sua identidade foi revelada a muita
gente em virtude desse episódio, embora somente uma das quatro pessoas presentes na sala
não fosse prounista. Acerca da situação, P2M-IM assinala que “[...] esse foi o meu contato
com a turma, e com os demais, eu acho que quase ninguém soube direto assim... não dá pra
identificar”. Embora P2M-IM acha que há similaridade entre ela e os demais alunos,
entretanto, a opinião de NP4M-FN é de que em virtude do “perfil mais humilde” é possível
sim identificar os alunos prounistas.
103

No dia a dia, várias outras situações se apresentam como reveladoras da identidade


desses alunos, dentre elas as mais apontadas são o tempo da chegada, o momento da
renovação da bolsa, a eminência/temor de pegar disciplinas pendentes (DPs), perguntas que
surgem em conversas informais, ou mesmo a falta de uma história compartilhada, como a
experiência do vestibular. O tempo da divulgação da lista de aprovados do ProUni figura
como o marcador mais expressivo da possibilidade de identificação e, como sugerido na fala
de PROF 01, pode trazer mais implicações negativas para o prounista.
Metade dos problemas que a gente tem é porque a lista do ProUni sai muito
tempo depois. Não só o problema... Não estou falando só do problema da
sala de aula, porque você fica identificado (PROF 01).
Entrevistador: Como você sabe [que ele é prounista]? Respondente: É de
comentar assim... Ah. Abriu o prazo para renovar a bolsa. Ou de encontrar
alguns lá renovando a bolsa (P12M-FM).
Ela ia pegar DP e ela pediu, se eu podia ajudá-la a fazer o requerimento. Ela
estava muito nervosa na hora, chorando, até por uns fatores externos
também. Aí ela me contou que não poderia pegar [para não perder a bolsa]
(NP6-FN).
Os colegas às vezes chegavam e perguntavam: “Nossa! Porque você chegou
tão tarde?” aí eu falava: “Ah! Porque a lista demorou para sair” (P5M-IN).
Às vezes os alunos vinham perguntar: Quanto você tirou na sua redação
quando você fez o vestibular? Aí a gente acaba falando: eu não fiz
vestibular, eu sou bolsista do ProUni aqui (P5M-IN).

As falas apresentadas refletem primeiramente uma preocupação de esses alunos de


serem identificados e de dar a conhecer sua condição de prounista, provavelmente em virtude
de acreditarem possuir atributos percebidos como discrepantes ao que se considera perfil do
aluno da IES; em função dessas diferenças, temem ser vistos como pessoas diminuídas e cair
em descrédito. Assim, em sendo conhecidos os aspectos que os distinguem, virem ocupar a
condição de desacreditados e em decorrência disso serem discriminados, uma vez que a
crença de que essas características distintivas tornam essas pessoas inferiores interfere no tipo
de atitude dos não prounistas em relação a eles (GOFFMAN, 1988).

4.3.3.3 Revelação voluntária/involuntária

A análise dos dados relativos à identificação dos alunos prounistas frente aos alunos
pagantes da IES fornecem a mesma percepção depreendida por PROF 04, de que “[...] os
alunos Prounistas, eles também têm um pouco de receio de qual pode ser a reação diante
dessa revelação de que são Prounistas” e, por esse motivo, alguns optam por não revelar o
fato, exceto por força da situação. Goffman (1988) considera que uma pessoa está em uma
104

condição de descrédito quando ela possui atributos que são percebidos como discrepantes ao
estereótipo criado acerca de determinado tipo de indivíduo, entretanto essas características
não são imediatamente perceptíveis ou conhecidas dos presentes. Com diferentes expressões,
todas revestidas de um mesmo sentido de esquiva, os prounistas externam o temor de serem
rotulados, e um esforço de acobertamento da revelação de uma identidade percebida como
menos positiva frente ao meio.
Mas, eu também não procuro divulgar (P2M-IM).
[...] eu não canto aos quatro ventos que eu sou bolsista (P6M-IM).
Não que eu me identifique como se fosse um crachá (P10H-FN).
[...] um ou outro pode saber, mas não como por exemplo: Ah, para que time
você torce? (P9H-FM).

Conforme apontam Taylor e Moghaddam (1994), a motivação dos indivíduos está


direcionada para o alcance de uma identidade social mais positiva, o mesmo se dando a nível
intergrupal pela busca de pertencer a grupos positivamente avaliados. Quando a própria
identidade é percebida como inadequada, estratégias comportamentais são adotadas visando
mudar a condição existente. Das falas dos alunos entrevistados, pôde-se depreender uma
hierarquia de identidades sociais mencionadas pelos alunos. Foram elencadas a condição de
cotista, prounista, bolsista e, o que aqui chamamos de, “IESzista” (a fim de preservar o nome
da instituição). Embora cientes de que o Programa ProUni é um tipo de cota, por ser
hierarquicamente a condição de menor status, não é uma identidade utilizada por estar mais
associada a cotas raciais e alvo de preconceitos mais explícitos. A condição de prounista,
embora em muitos casos seja evitada, é eventualmente usada. Bolsista, que é uma condição
mais genérica, dado que existem vários tipos de bolsas, torna-se a identidade mais assumida
por aqueles que preferem não se identificar como do ProUni. Dentro da IES, existem várias
categorias de alunos bolsistas, sendo possível obter bolsa por participação na Atlética
(concedidas a alunos que integrem equipes esportivas e representam a instituição em
competições), bolsa filantropia, bolsa para funcionários e para filhos de funcionários, dentre
outras. Por fim, constata-se que alguns alunos omitem durante toda a graduação a identidade
de prounista, assumindo a identidade de “IESzista”. As falas a seguir evidenciam essa
hierarquização.
Então [se revelasse ser prounista] eles tratariam do mesmo jeito que um
cotista, com as mesmas segregações e com os mesmos preconceitos (P1H –
IM).
Uma menina que era cotista, talvez ela fosse prounista, Não sei se ela era
prounista ou se ela já foi beneficiada por cota em outros espaços... (PROF
02).
105

Se você falar que você é bolsista pode até ter preconceito, mas é muito
menor do que se você falar que é prounista. Se você falar que é prounista já
tem um certo preconceito, sim (P1H – IM).
[...] falaram com a gente lá no auditório [na palestra de integração dos
prounistas], que independente da gente ser bolsista ou não, a nossa condição
de bolsista não muda em nada a nossa condição como “IESZzista” (P5M-
IN).

Mediante situações nas quais são involuntariamente levados a responder a


questionamentos, e com isso necessariamente expor a condição de aluno prounista, alguns o
fazem, enquanto outros acabam optando por declarar-se bolsista; isto, na compreensão destes,
é uma identidade social percebida como de valor menos negativo que a de prounista, embora
até mesmo essa identidade seja evitada por alguns.
A maioria da sala sabe porque eu falo. Eu não tenho vergonha [...] Eu falo
que eu sou bolsista, não que eu sou prounista (P1H-IM).
Eu sempre falo que eu sou bolsista e nunca me falaram nada além de
parabéns. Que legal (P3H – IN).
Se perguntar: Ah! Você é bolsista? Eu falo sim, mas eu não canto aos quatro
ventos que eu sou bolsista (P6M-IM).

A teoria da identidade social propõe que os comportamentos intergrupais são guiados


pela busca de uma identidade social de valor positivo, uma vez que a distinção intergrupal
positiva confere ao indivíduo autoestima positiva (HOGG; TERRY, 2001). O conteúdo das
falas desses alunos revela a existência de uma hierarquia subjetiva em suas cabeças, havendo
uma distinção entre bolsistas e prounistas, identidades provavelmente associadas à condição
de pobreza, que, ao ser comparada em relação ao status dos outros alunos da IES, faz com que
a identidade desses primeiros grupos sejam vistas como mais negativas e menos desejadas,
afetando, portanto a autoestima destes.
Determinantes para a formação do nosso autoconceito de quem somos, as categorias
sociais às quais pertencemos; prescrevem formas de pensamento e comportamentos e, ao
mesmo tempo, fornecem referencial para comparação com outros grupos. Assim, as
diferenças sociais entre prounistas e não prounistas e o receio de que o dar-se a conhecer
como aluno prounista traga consequências negativas para si, influenciam a decisão de como e
se a identidade de cada um é revelada ou mantida encoberta.
Você se sente um pouco constrangido em falar que é do programa (P6M-
IM).
Mas, eu não procuro deixar muito claro, não. Tirando para as pessoas com
quem eu ando, que todo mundo sabe (P2M – IM).
[...] a menina que mora comigo [há um ano] ficou sabendo esses dias que eu
sou bolsista (P5M-IN).
106

De modo semelhante, em sua pesquisa, Souza (2011) já havia constatado a hesitação e


temor dos alunos prounistas, relatando o que chamou de manifestação de autodefesa, ou
autoproteção, em que os alunos por ele pesquisados também optavam por não revelarem a
identidade de bolsista do ProUni, expressando “vergonha” de sê-los. Em seu trabalho, o autor
observou que tal comportamento era mais comum no período inicial do curso, alterando-se ao
longo dos semestres, porém que isso não ocorria com todos os bolsistas. Na presente
pesquisa, verifica-se que todas as evidências de esquiva destacadas acima são provenientes de
alunos dos semestres iniciais, mas não são utilizadas por todos eles, o que sugere um padrão
similar ao constatado por Souza (2011). Dos alunos em final de curso, metade afirma que
todos sabem que são prounistas porque eles mesmos falam, enquanto dois deles só o fazem
para amigos mais próximos e um deles não o faz, porque considera que isso é “indiferente”
para as outras pessoas. Embora em número menor, alguns alunos que se posicionam e
assumem a condição de prounistas, não demonstrando qualquer dificuldade ou
constrangimento, afirmam revelar de forma natural e voluntária.
O pessoal da sala sabe. Meus amigos sabem que eu sou prounista e eles
falam: nossa que bacana, você é superdedicada [...] Tanto é, que eu falo pra
todo mundo que eu sou prounista mesmo [dá uma arrastada na entonação
enfatizando o ser prounista] [...] (P4M-IN).
Prounista. Não tenho vergonha não. Para mim é até motivo de orgulho. Eu
tenho bolsa 100%, eu consegui, foi meu mérito. Eu estudei para isso. Para
mim não tem problema (P11M-FM),
Eu tenho orgulho de falar que eu sou prounista, sabe. Eu acho que é muito
bom isso pra gente [...] (P12M-FM).

Se para com outros alunos a identidade de prounista é omitida, com os professores os


alunos sentem-se mais à vontade para contar que o são, conforme relatam todos os
professores: “[...] alguns alunos se sentem a vontade de me contar que são prounistas, eles
gostam de falar pra mim” (PROF 04). “Hoje eu sei quem são meus alunos do ProUni porque
a maioria faz questão de falar [...] contaram superorgulhosos” (PROF 02). “Às vezes nunca
conversa, às vezes num debate, numa conversa particular: eu sou prounista” (PROF 03). A
PROF 01 diz que os alunos usam a condição de prounistas para “chorar nota”, argumentando
que se “[...] reprovar em três matérias eu perco a minha bolsa, porque eu sou ProUni”. Pode-
se observar que de alguma forma os alunos prounistas se sentem ameaçados em relação aos
não prounistas, entretanto na relação com esses professores mencionados não existe
necessidade de “proteção da identidade”, e eles podem usar sua condição para obter ganhos.
Com prazer, com orgulho pessoal, por se sentirem à vontade com os professores e até,
por um lado, a intenção de obter benefícios pessoais, não há reservas de esses alunos em
107

revelar-se para os professores entrevistados. Por outro lado a reserva em relação aos alunos
não prounistas pode ser justificada nos argumentos de Taylor e Moghaddam (1994), que
sustentam a existência de forças em conflito entre esses grupos, uma vez que indivíduos
pertencentes aos grupos dominantes desejam e lutam para manter o status de condição
comparativamente superior, enquanto os integrantes dos grupos de identidade social de valor
menos positivo desejam alcançar alguma mudança de status, a fim de aprimorar a identidade
grupal para uma condição superior.

4.3.4 Categoria: Obstáculos do Caminho

Nessa categoria as principais dificuldades enfrentadas pelos alunos prounistas desde


o período preparatório, antecedente ao ingresso na instituição até a conclusão do curso, são
discutidas por meios das categorias: Período preparatório, Restrições Materiais e Implicações
Emocionais.

4.3.4.1 Período preparatório

Estudar em universidades particulares com boa qualidade de ensino, em geral implica


o pagamento de altos valores de mensalidades, requerendo consideráveis investimentos, até
mesmo para famílias de classes mais favorecidas, conforme apontado por NP5M-FM, que é
aluna pagante, “[...] eu acho um absurdo assim, eu pagar R$ 1.400,00 de faculdade [...]”.
A concessão da bolsa integral aos alunos do ProUni é um benefício importante, e
representa a possibilidade de acesso de jovens de baixa renda à formação universitária em
universidades privadas. Porém, os relatos demonstram que, embora isentos de mensalidades,
o acesso e a permanência desses alunos na IES envolve outros custos, tanto materiais como
emocionais. P4M-IN, afirma que durante seu período preparatório para o exame “Eu não via
meu namorado. Eu não namorava, não saia de casa... irritada o tempo todo, estressada por
aquela pressão, de não conseguir passar, eu tenho que passar”, o que exemplifica o custo
emocional envolvido na busca de acesso a uma bolsa de ProUni. Especialmente quando se
deseja obter uma vaga em instituições de melhor qualidade, a pressão não só pela aprovação
no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), mas também por obter uma boa nota é
vivenciada por aqueles que não possuem condições socioeconômicas suficientes para pagar o
curso.
108

Alunos que inicialmente preparavam-se para tentar ingressar em universidades


públicas relatam o período do cursinho preparatório como um período desgastante, em virtude
do déficit de qualidade da educação até o ensino médio. P1H-IM conta que

[...] não aguentava mais fazer cursinho, eu já estava saturado. Eu fiquei


muito mal, entrei em depressão quando eu não passei, eu fiquei 06 meses
fazendo acompanhamento psicológico, todas essas coisas.

P5M-IN relata que porque “[...] a nota é altíssima, eu já tinha colocado na minha
cabeça fazer mais um ano de cursinho. Já ia ser o terceiro ano de cursinho, compensava ter
feito o ensino médio de novo”, mas que acabou sendo chamada na segunda lista de espera e
conseguiu entrar.
Conforme já constatado por Santos (2011), o acesso de estudantes de baixa renda às
IES privadas implica em convivência com grupos socioeconomicamente distintos e constitui-
se um período no qual acabam sendo submetidos a novas experiências de exclusão. Diferentes
desafios são enfrentados ao longo do período de graduação e têm que ser superados, uma vez
que, como apontado por Rocha (2012) e também aqui verificado, as dificuldades dos
bolsistas, seja no processo de aprendizagem ou no âmbito financeiro, não desaparecem apenas
com o ingresso na graduação. Nessa categoria, busca-se apontar as restrições materiais e as
implicações sociais e emocionais decorrentes da oportunidade de acesso à IES estudada.

4.3.4.2 Restrições Materiais

Desafiando os próprios limites, com garra e determinação pessoal, esses alunos correm
atrás da realização do desejo de obter uma formação superior, aproveitando a oportunidade
única de acesso a uma universidade de boa qualidade, em curso reconhecido no mercado, é
perceptível no discurso de grande parte dos alunos entrevistados, uma disposição em pagar o
preço e superar os obstáculos, como afirma P12M-FM, “[...] ainda que a gente passe um
pouco de aperto, vale a pena pela qualificação que a gente vai ter”.
Verifica-se que, por força do determinante econômico, os alunos acabam vivenciando
dificuldades outras, havendo restrições financeiras até mesmo para necessidade mais básica
como a alimentação. Observa-se que no campus da IES estudada existe uma ampla variedade
de franquias que vão desde lanchonetes multinacionais, restaurantes, cafeterias e até
esmalteria, estabelecimentos aos quais alunos prounistas não têm acesso, ocorrendo assim
uma exclusão econômica. Conforme argumenta P1H-IM, na “[...] X (outra IES privada), que
109

é a X, tem bandeijão. Você paga R$ 6,00 e você come. Se nós formos comer aqui por perto o
almoço mais barato é R$ 12,00 por dia, e não é aquelas coisas. A média é R$ 16,00 por dia”,
de forma que, não havendo nenhuma política de ajuda a esses alunos, a possibilidade de
sobrevivência dentro do campus fica limitada. Sem recursos para custeio alimentar dentro do
campus, os alunos precisam trazer a própria alimentação de casa ou se organizar para
alimentar-se em casa.
[...] a alimentação, se eu quiser comer por aqui, é tudo na marmita, ou não
come. Come um lanche, traz de casa (P11M-FM).
Então, eu não me incomodo muito... No ano passado eu até comprava lanche
aqui. Esse ano eu passei a trazer de casa para economizar um pouco (P2M -
IM).
Mas, eu não sei que tipo de atitude poderia ser tomada para que esses alunos
se sentissem mais confortáveis nesse ambiente [...]. Vale lembrar que as
coisas aqui dentro, também, são bem caras, então... [...] Talvez, quem se
sinta incomodado por essas situações e essas diferenças normalmente,
chegando aqui, provavelmente, vai se sentir um pouco incomodado, se
chatear com esse tipo de coisa (P2M-IM).
Então, eu sempre procurei estágio de quatro horas para poder fazer tudo em
casa, então alimentação em si eu supria fazendo em casa, então dá pra
conciliar (P9H-FM)

Sendo a alimentação uma necessidade básica para a sobrevivência, não havendo,


portanto, outra opção a não ser supri-la, e bem ou mal, esses alunos o tem feito, mas não sem
certo grau de desconforto, devido à falta de políticas públicas mais abrangentes, que cubram
de forma efetiva as necessidades dos bolsistas do ProUni.
O local de moradia também é um quesito importante, que funciona como fator de
inclusão ou de exclusão do aluno. Morar perto da instituição implica custos de aluguel,
enquanto para aqueles que moram longe acarreta desgastes físico e emocional, além de
restringir as oportunidades de convivência. A distância da residência em relação ao campus
foi apontada como uma das principais dificuldades por alguns alunos. “Meu primeiro
obstáculo é morar longe, então pra conseguir vir para a faculdade, eu acordo 4h30 [...] é toda
uma saga até chegar na faculdade ” relata P11M-FM, opinião compartilhada por P7H-FN,
quando diz que “[...] a distância é o pior, Itapecerica da Serra é muito, muito longe”. Embora
economicamente possa ser a opção mais viável para essas famílias, ou a única opção, há
prejuízos sociais e mesmo profissionais decorrentes da distância que o aluno está da
faculdade. P11M-FM sente que a distância a impede de participar de atividades sociais que
possibilitariam maior interação com os outros alunos, e diz que “[...] às vezes eu saio [com os
colegas de curso], mas não é muito. Como eu moro longe da faculdade, fica difícil para eu vir
aqui nos finais de semana”. P12M-FM optou por deixar de estagiar, abrindo mão dos valores
110

financeiros que lhe seriam importantes, devido ao tempo que gasta para deslocar-se até sua
residência; isso indica que seu local de moradia torna-se um impedimento de acesso a outras
atividades, “[...] acho que pra mim hoje [a maior dificuldade] é não poder conciliar trabalho
com a faculdade. Pra mim é isso, porque acabou faltando dinheiro”, portanto é um fator de
exclusão.
Outra dificuldade relatada principalmente pelas alunas prounistas, é referente à falta
de recursos para a aquisição de livros. As queixas são de que infelizmente “[...] os livros não
caem do céu. Nada aqui para a gente se manter” (P12M-FM), e que, embora a “[...] biblioteca
daqui seja ótima, mas, alguns livros atualizados não tem. Então, pela dificuldade financeira eu
não conseguia adquirir esses livros” (P11M-FM). Quer emprestando de amigos, solicitando
doação, recorrendo ao sacrifício familiar, como expressa P6M-IM, os pais fizeram “[...] tudo
o que eles podiam em fazer, em relação a livros... Se há uma necessidade eles dão um jeito”,
ou o que é mais comum, ou renovando constantemente na biblioteca, esses alunos conseguem
driblar essas barreiras. Contudo vivenciam um sentimento de privação, uma vez que, por
necessidade ou por desejo, não podem adquiri-los, conforme apontado por P12M-FM

[...] você tem que se apertar... ou tira xerox, que não [pode].... tem que fazer
isso, ou comprar o livro, se não for muito caro. Eu tive que comprar alguns,
mas eu gostaria de poder comprar mais. Eu acho bonito ter livro [ri].

As expressões “[...] nada aqui cai do céu para a gente se manter”, se “[...] não for
muito caro” (P12M-FM), “[...] eles dão um jeito” (P6M-IM) utilizadas anteriormente
manifestam que toda a manutenção durante o curso é difícil, sendo exigidos esforços a fim de
superar os obstáculos financeiros. Faltando recursos financeiros para o que é básico,
consequentemente esses alunos estão privados também da participação em cursos
extracurriculares, intercâmbios e viagens que impliquem em custos e lamentam ficarem
excluídos, conforme queixas a seguir.

[...] a faculdade divulga alguns cursos que eu não posso pagar, então eu
acabo ficando de fora (P5M-IN).
A IES disponibiliza vários intercâmbios, mas você precisa comprar a
passagem de avião, você precisa se manter quando você está lá, entendeu...
não tem a bolsa integral disso, e por não ter essa integralidade, para mim não
dava (P11M-FM).

Dificuldades para custear matérias, transportes e alimentação foram indicadas como


as principais restrições vivenciadas pela maioria dos alunos pesquisados por Santos (2012).
111

Verifica-se que a falta de recursos materiais implicam desgaste emocional, que, vivenciado ao
longo de todo o curso, tornam a trajetória de formação mais longa e mais desgastante.

4.3.4.3 Implicações emocionais

Embora durante toda a formação seja requerido um aproveitamento acadêmico de


75% (setenta e cinco por cento), sob pena de perda da bolsa, os alunos prounistas
entrevistados não apontam desempenho como um peso ou dificuldade, exceto nos primeiros
semestres, isso, muitas vezes, em função da chegada tardia e do processo de adaptação. Para a
convocação dos alunos prounistas são publicadas duas chamadas, duas listas de espera e
posteriormente feita a oferta de vagas remanescentes. Na primeira lista, as vagas não são
todas preenchidas, pois nem todos os convocados preenchem os prerrequisitos do Programa.
Alguns não se enquadram no critério de renda, outros não apresentam a documentação
exigida pelo MEC e há ainda casos de convocados que deixam de comparecer para a
matrícula. Sucessivamente são reconvocados novos candidatos, até que as vagas sejam
completamente preenchidas, sendo a última lista de espera divulgada quase dois meses após o
início das aulas. Por problema estrutural do Programa, o calendário do ProUni é uma das
dificuldades impostas e que acarreta dificuldades outras para esses alunos (inclusive com
implicações para o processo de inclusão/exclusão desses alunos, aspecto que será abordado
posteriormente), tornando o período inicial do curso mais difícil conforme evidenciado na
comunicação dos alunos:
[...] o aluno prounista já entra um pouco atrasado, e aí, como deu esse problema, eu
entrei mais atrasado ainda. Então eu tive alguns problemas nesse sentido, para me
adaptar a essa correria, entendeu... Mas, tirando isso foi tranquilo (P10H-FN).
[...] desempenho dá pra acompanhar. No começo foi um pouco difícil acho, mas agora
já dá pra levar [...] No começo eu estudava muito mais, porque eu me sentia insegura,
mas eu estudei numa escola boa assim... [...] (P12M-FM).
[...] O primeiro semestre foi terrível. Cheguei a perder a bolsa inclusive. Eu só fui me
recuperar mesmo no terceiro, eu pegava todas as DPS, aí o pessoal da minha sala
passou a estudar junto... grupos de estudo, aí ficou melhor. E melhorou o desempenho
realmente [...] (P7H-FN).

Os recortes apresentados evidenciam que o início do curso é um período mais crítico


para esses alunos, em que várias situações de dificuldades são vivenciadas, quer de adaptação
ao ritmo do curso, temor de não conseguir acompanhá-lo e das disciplinas pendentes (DPs)
que põem em risco o benefício da bolsa conquistada ao longo do tempo, essas dificuldades
vão sendo superadas, permitindo que cheguem ao final do curso.
112

Ainda que muito se fale sobre a defasagem de formação dos alunos provenientes da
escola pública (LEITE, 2009; SOTERO, 2009; SANTOS, 2011, OLIVEIRA et al. , 2012),
mais do que o desempenho, autocobrança e o desejo de superação impõem um preço
emocional a ser pago pelos alunos prounistas, que se sentem responsáveis e agentes da própria
história, que avança por um caminho árduo.
Dado que a educação formal constitui-se uma das mais importantes vias de mobilidade
social, e que a qualificação educacional é essencial para que se alcance posições de prestígio
em nossa sociedade (RIBEIRO, 2006), esses alunos consideram estudar na IES uma
oportunidade ímpar e sentem-se atribuídos de um peso maior do que o dos outros alunos,
sabida a importância que concluir o curso tem para eles, e manifestam esse peso em suas
falas.
[...] a maioria dos alunos do ProUni, eles estão entre os melhores da sala. Porque a
gente tem essa cobrança interior: “Nossa eu estou aqui dentro [...] numa faculdade que
a faculdade de Direito custa R$ 1.400,00, e eu não estou pagando por isso, e é uma das
faculdades top de linha de São Paulo, só fica atrás...” Aliás, nem fica atrás de X e Y.
Então, a gente tem essa cobrança sabe, de fazer por merecer mesmo (P5M-IN).
Aspecto negativo... [dá uma pausa]. Acho que a pressão que a gente coloca em nós
mesmos. A gente tem que ir bem... A gente tem que ir bem... Essa pressão eu não sei
se pode ser caracterizado como um aspecto negativo: A gente tem que se esforçar na
vida normal e muito mais aqui (P1H-IM).
Eu gosto de estar aqui, eu fico feliz, mas eu ainda tenho aquele sentimento de que eu
tenho que lutar mais. Não é simplesmente estou aqui. É aquele sentimento, eu preciso
continuar aqui. Então, a gente fica um pouco apreensivo, para não pegar DPs, não
pegar notas ruins. O sentimento é esse (P1H-IM).
Você não pode esquecer nem um dia que você tem que lutar mais do que as outras
pessoas, não importa o quanto elas lutam porque o seu caminho é muito maior que o
delas (P1H-IM).
[...] a gente tem que batalhar mais ainda para permanecer na faculdade do que eles,
porque é difícil... não é fácil não (P12M-FM).

Como denotam as experiências até aqui apresentadas, do ingresso até a conclusão do


curso, um árduo caminho foi percorrido e após superarem todos esses obstáculos, alguns
alunos dos semestres finais entrevistados já obtiveram aprovação no Exame da Ordem dos
Advogados e expressam um sentimento de vitória. Eles denotam ter consciência de que é uma
luta que terá ainda continuidade, mas para a qual, conforme a expressão usada por P9H-FM,
pelo menos em termos “[...] de conteúdo que a faculdade ensina para advogar, matéria de
direito profissional, não tenho do que reclamar, me considero capaz de combater... disputar
uma vaga com qualquer aluno da X, da Y ou de qualquer outro”. Percebe-se pelas expressões
utilizadas pelos alunos entrevistados que num país de extrema desigualdade social como o
Brasil, no qual rígidas barreiras sociais estão firmadas, o sentimento desses alunos é de que
estão em uma “batalha”, que necessitam “lutar”, mas que saem da graduação “capazes de
113

combater”, significando que as armas foram obtidas. Diante da grande distância social que
está posta e tendo em vista o ambiente competitivo que enfrentarão no mercado de trabalho, é
realmente necessário lutar aguerridamente para superar os obstáculos e obter uma qualificação
profissional, importante fator de inclusão social.
A condição social dos alunos prounistas e todas as restrições financeiras dela
decorrentes constituem-se obstáculos que dificultam a trajetória acadêmica, porém o desejo de
alcançar melhor status e obter um aprimoramento pessoal funciona como um “motor” para as
ações e para a superação destes. As falhas estruturais do programa, principalmente no que se
refere ao calendário e à falta de políticas que estendam a assistência prestada ao aluno para
além da bolsa, principalmente nos períodos iniciais do curso trazem implicações sociais e
emocionais para esses alunos, que travam uma luta contra a realidade social que está posta e
contra as desigualdades e tornam-se agentes da história.

4.3.5 Categoria: Relações interpessoais

A categoria “Relações interpessoais” é bastante relevante ao objetivo geral desta


pesquisa, uma vez que nesta categoria são abordados aspectos relacionados à ambientação dos
alunos prounistas na IES, às diferentes dinâmicas de sala, aos grupos de convívio, ou seja,
com quem esses alunos se relacionam de forma mais próxima, aos critérios de formação de
grupos de trabalho e envolvimento em atividades sociais extra-curriculares são importantes
indicadores de como se dão as relações e quão permeáveis ou fechados os grupos são
percebidos. Os conteúdos foram organizados nas subcategorias: Impressões Iniciais, Divisão
Atividades Sociais.

4.3.5.1 Impressões iniciais

A convivência entre pessoas é um desafio, especialmente quando os grupos são mais


heterogêneos, sendo requerido que os seres humanos superem as dificuldades distintas de
estar junto àqueles que são diferentes (TRIANDS, 2003). A chegada em um ambiente
desconhecido em geral envolve algum nível de expectativa e ansiedade, por medo do
desconhecido. Os alunos prounistas entrevistados, conhecendo o perfil geral dos alunos da
IES pesquisada, sabem que há minimamente uma distinção social entre eles e, conforme já
apontado anteriormente, chegam com certo receio. Ao relatarem a experiência de ambientação
inicial, os alunos prounistas apontam algumas dificuldades iniciais. Aqueles que são dos
114

semestres iniciais referem “[...] dificuldade para se ambientar” (P2M-IM), em um primeiro


momento “[...] sentir-se deslocada” (P4M-IN) e vivenciar “[...] um receio com os colegas”
(P5M-IN). Quando chegam à IES já existem grupos formados e alguma resistência a sua
aceitação é manifesta, deixando uma impressão inicial negativa para alguns; quando a
inserção no grupo é feita de forma requerida, por professor ou representante de sala, incorre
em tratamentos discriminatórios (tema que será mais amplamente discutido na categoria
posterior), conforme indicado nas falas a seguir.

Eles são bastante receptivos [...] têm sim, algumas exceções. [...] logo nas
primeiras semanas eles já estavam formados e até hoje é o mesmo grupo
assim... não teve nenhuma inclusão. Quando eu cheguei, eu não tive uma
impressão tão boa assim. Quando eu cheguei assim, logo o pessoal já fez
grupinhos separados, e isso tem muito ainda [de não prounistas] (P6M-IM).
Quando eu cheguei... a minha sala, ela é bem dividida. Ela tem três grupos.
Quando eu cheguei assim, já deu para perceber... (P9H-FM).
Esse início foi bem ruim. Eu não sei se as pessoas eram arrogantes, eu não
sei se foi por... eu não faço nem ideia do motivo [...] eu sofri vários
problemas [não aceita no grupo de trabalho e quando inserida por
solicitação, foi discriminada] (P11M-FM).
No primeiro semestre, que ninguém se conhecia assim quase, não foi nada
caloroso demais (P7H-FN)

Essa percepção de grupos fechados e menos receptivos, embora mais frequente, não é
unânime. Chegando ao final da graduação P7H-FN considera que “[...] o pessoal aqui é
receptivo pra caramba. Sempre muito consciente, talvez seja isso também, tem muito bolsista
na graduação”, mas em outro momento afirma ter se sentido ambientado somente após o
terceiro semestre do curso, sendo que antes disso não se sentia acolhido. P12M-FM diz que,
“[...] embora haja assim, diferença entre classes sociais, eu consegui levar numa boa”,
expressando uma experiência individual, mas que atribui a si o mérito de ambientar, mas que
não necessariamente expressa sua impressão em relação ao ambiente em geral.

4.3.5.2 Divisão em feudos

O professor PROF 01 faz um questionamento retórico de

[...] por que a gente cria os nichos aqui dentro, com os alunos? Eles levam
muito tempo para divulgar [a listas de convocados do ProUni]. Quando esses
alunos são inseridos no sistema, que viram alunos, já teve um tempo de aula
muito grande.
115

Verifica-se que quando os alunos convocados pelo vestibular regular chegam à


instituição já fizeram contatos com outros integrantes da lista de aprovados. Conforme
informado por NP6-FN “[...] com as redes sociais, é um pouco mais rápido também”, pois
com a divulgação da lista de convocados, os alunos fazem contatos prévios entre eles. NP3M-
IM que é aluna não prounista, diz que

[...] antes mesmo de começar as aulas a gente já montou um grupo no


Facebook e aí a gente conversou... [...] a gente já meio que se conhecia
quando começou as aulas, mas eu não tive dificuldade nenhuma, assim, de
me inserir nesse meio,

facilitando o processo de ambientação quando do início das aulas. Para o aluno não
prounista o tempo da convocação é mais longo, não é feita em caráter público, o que impede
qualquer aproximação antecedente à chegada em sala de aula, acentuando a condição de
desvantagem desse grupo, pois são uma minoria, de condição social inferior e sem rede de
contatos prévios.
A percepção de diferença entre pessoas surge em virtude das categorizações sociais
que são feitas entre indivíduos, podendo o outro ser considerado diverso em função de sua
origem racial, gênero, nacionalidade, orientação sexual, classe social, idade, dentre outras
categorias. Grande parte dos alunos entrevistados relata que, dentro de suas salas de aulas, são
formados feudos, com baixa permeabilidade entre eles e consideram “[...] até feio de se ver”,
quão fragmentadas são as salas, tornando difícil a aceitação de pessoas que possuam
características distintas ao perfil predominante. As falas a seguir demonstram que desunião e
existência de feudos em grande parte das salas é uma percepção compartilhada tanto por
alunos prounistas como por não prounistas. Depreende-se que a fragmentação de sala persiste
durante todo o período do curso, uma vez que esse aspecto é ressaltado por NP4M-FN, aluno
do último semestre. Isso contribui para que o aluno prounista se perceba como alguém com
características distintivas em relação ao grupo social predominante, reduzindo a possibilidade
de contato e empobrecendo a interação social, dado as fronteiras existentes, conforme
ressaltado a seguir.
A nossa sala, ela é meio fragmentada. É bem demarcado. O território está
demarcado. É demarcação (NP4M-FN).
A minha sala é bem desunida, realmente é dividida e segregada (NP3M-IM).
Quando eu cheguei, eu não tive uma impressão tão boa assim. Quando eu
cheguei assim, logo o pessoal já fez grupinhos separados, e isso tem muito
ainda (P6M-IM).
[...] eu tenho o meu grupo, o outro tem o outro grupo, mas não é aquela coisa
que todo mundo fala com todo mundo (P8H-FM).
116

Era muita panela. Era fechada sabe... Era feio até de se ver, era uma classe
desunida. A que eu estou hoje, não. É até bem unida (P12M-FM).

No entanto, alguns alunos relatam experiências mais positivas.


Eu acho o ambiente muito bom, muito tranquilo (P3H-IN).
A minha sala é uma sala muito unida para falar a verdade (P5M-IN).

Da mesma forma que P12M-FM percebe grande distinção entre uma sala e outra,
considerando haver em algumas delas maior união e ambiente mais favorável, P9H-FM
também faz a mesma observação quando diz que “[...] minha sala é muito tranquila, muito de
boa, mas eu lembro que a sala D não era uma sala muito legal”. NP4M-FN também observou
essa diferença e relata que pegou uma DP

[...] e vim fazer de manhã [...] naquele grupo da manhã [...] eu percebi que a
divisão era menor [...] eu vi que as pessoas conversam [...] se tiver
dificuldade, ele [o outro aluno] vai lá senta do lado dele e conversa. Isso na
minha sala não acontece.

As diferenças entre salas ocorrem tanto no período da manhã, como no período da


noite, não sendo possível determinar maior divisão em um horário ou outro.
De acordo com os entrevistados, o tamanho das salas no curso de Direito varia de 40
até 90 alunos por classe, dos quais, pela média geral, cerca de 9% são alunos prounistas.
PROF 01 menciona ocorrer séria dificuldade de inclusão destes nos grupos já formados e
afirma que “[...] depois que você forma time, você forma equipe, é muito difícil de... e aí ele
[o aluno prounista] chega, chega como o sem time”, e assim, dependendo do tipo de dinâmica
de sala, pode gerar sérios problemas para criarem seus próprios grupos de pertença.
Embora o tempo de chegada seja um dificultador real para a ambientação do aluno
prounista, chama atenção o relato de dois alunos não prounistas, que, por motivos outros,
também tiveram entrada tardia na IES, porém consideraram-se bem recebidos e incluídos.
NP1H-IN informa que chegou “[...] no meio do semestre letivo [...] me receberam muito
bem”, experiência também vivenciada por NP5M-FM que informa que “[...] como eu entrei
depois, elas já tinham esse grupinho delas formado, então elas meio que me incluíram”. A
percepção de similaridade percebida é um fator importante nas relações intergrupais, havendo
uma tendência a aproximação entre pessoas que se veem como semelhante umas às outras
(TRIANDS, 2003); assim, mesmo chegando após o início das aulas NP1H-IN e NP5M-FM
foram recebidos e incluídos nos grupos, enquanto a chegada tardia do aluno prounista, que
está sempre em minoria nas salas, é considerada justificativa para as discriminações e
exclusão.
117

4.3.5.3 Trabalhos em grupo

Sendo a realização de trabalhos em grupo uma exigência do curso, a obrigatoriedade


de formação de grupos revela uma dinâmica de seu funcionamento e das salas. Dos seis
alunos não prounistas entrevistados, cinco deles referem terem escolhido os seus grupos de
trabalho, sendo que NP1H-IN, NP3M-IM e NP4M-FN consideram o critério de afinidade,
NP5M-FM diz ter sido convidada a integrar seu grupo, NP6-FN utiliza o critério de qualidade
para composição de grupos. Apenas NP2M-FM indica não ter muita escolha e diz buscar “[...]
grupos alternativos”, uma vez que não se identifica muito com sua sala, e considera os outros
alunos não prounistas “[...] elitistas”.
Para os alunos prounistas entrevistados, a formação de grupos de trabalho nem sempre
se dá segundo seus próprios critérios de escolha. Considerando que para que um indivíduo
seja incluído em determinado ambiente é necessário que anteriormente sinta-se valorizado e
reconhecido como membro do grupo (BERG, 2002), percebe-se que o status de membro de
um grupo de trabalho, para alguns prounistas é conquistado quase à força. O relato dos
professores evidencia que há resistências de alguns alunos em aceitar o ingresso de alunos
prounistas em alguns grupos de trabalho, sendo empreendidas estratégias por outros alunos a
fim de impedir a entrada de alunos prounistas, em alguns grupos de trabalho. Dessa forma, é
exigido desses professores, que também são agentes implicados no processo de
inclusão/exclusão, intervir a fim de evitar que o aluno seja prejudicado, tentando inclui-lo em
algum grupo já formado. Eventualmente, não obtendo sucesso na busca de um grupo, o aluno
fica excluído e acaba fazendo trabalho individual.

Às vezes ocorre do aluno ficar de fora, aí a gente vai correndo atrás e quando
não dá eu digo: não tem problema, eu vou receber [o trabalho individual] do
mesmo jeito (PROF 03).
Vai fazer trabalho em grupo, uns gostam, outros não gostam, uns querem
outros não querem, já têm seus amigos (PROF 03).
Na hora do bar não tem problema, na hora de falar mal do professor junto.
Aparece quando tem uma questão de estudo, aparece para a formação de
grupo (PROF 01).
E é legal [fala ironicamente] que eles envolvem professor: Professora, não
pode entrar mais ninguém no grupo, né? (PROF 01).

Dentre os alunos prounistas entrevistados, há evidente diferença nos relatos de suas


experiências pessoais, no que se refere à formação de grupos de trabalho. Apesar de P2M-IM
fazer trabalhos com as pessoas que lhe são mais próximas, mas “[...] às vezes eu acho que não
118

deveria ser, porque às vezes a gente pega uma equipe que não agrada tanto”. P10H-FN
demonstra certo conformismo com sua “[...] sala já é assim, já é meio dividido em grupos”, e,
por ter alguma dificuldade de transitar entre eles, formou um grupo de quatro amigos no qual
faz todos seus trabalhos. P1H-IM diz que seu grupo de trabalho é formado por afinidade, no
qual a maioria é prounista, indicando uma afinidade por condição social. P11M-FM participa
de um grupo misto e refere que faz por critério de afinidade, o que em seu caso pode ser
sinônimo de aceitação, uma vez que sofreu resistência para ser aceita em outros grupos. P9H-
FM afirma que “[...] sempre mudei, por escolha”, mostrando-se uma exceção em relação aos
outros prounista, pois diz transitar bem entre grupos e fazer os trabalhos cada vez com um
grupo diferente. Cabe ressaltar que esse aluno omitiu ser prounista durante todo o curso, não
se identificando como tal para os demais alunos, pois considera que “[...] isso não faz
diferença”. P12M-FM afirma que na “[...] na minha sala que eu participei mais assim, eles
não ligam se a pessoa é prounista ou não, eles estão mais preocupados se ela vai fazer a
atividade, se ela não é perdida no assunto”, indicando não haver barreiras a admissão de
alunos prounistas nos grupos de trabalho.
A experiência de P11M-FM relata dificuldades enfrentadas para realização de
trabalhos em grupo, expressas como estratégias de exclusão. Descreve que no início do curso,
no momento de formar um grupo, tomou a atitude de abordar um grupo, dizendo:

“Posso fazer com vocês”? Ah. Já tem seis. “Posso fazer com fulano?” já tem
seis, já tem seis, já tem seis. Já tem seis, você tinha que ir até a representante
de sala e falar: “pode me indicar um grupo que ainda falta pessoas”? Aí
quando você é enfiada num grupo, pior ainda, porque é um grupo fechado e
as pessoas não estão nem aí para você.

PROF 01 chama isso de experiência clássica de exclusão, que “[...] é os grupos


separados, de não deixar incluir o fulano”, e relata que em uma determinada sala faziam isso
de forma tão explícita que alguns professores tiveram que fazer “[...] um trabalho de
desarticulação, mas nós não fomos vitoriosos. No outro semestre os alunos que eram
prounistas pediram pra mudar de sala”. PROF 01 afirma que dinâmica de sala agressiva nesse
nível é exceção, mas que “[...] situações agressivas é a regra em todo lugar, em toda sala”.
Dessa forma, constata-se que a formação de grupos de trabalho é um momento no qual
preconceitos e discriminações emergem, gerando situações de exclusão ao nível interpessoal,
dado que é negada a essas pessoas a possibilidade de estabelecer relacionamentos (ABRAMS;
HOGG; MARQUES, 2005). Essa é uma situação de discriminação, na qual, de forma ativa
119

um grupo tenta privar o acesso de outro, provavelmente com base apenas em prejulgamentos,
sem maiores fundamentações (ALLPORT, 1979).
Em virtude do etnocentrismo existente nos grupos (TRIANDS, 2003), a cultura
própria do grupo é usada como padrão para julgamento dos outros grupos. Os trabalhos em
grupos seriam oportunidades para o que Allport (1979) chama de “hipótese do contato”, pois
a interação entre pessoas com status iguais e com objetivos comuns, em ambientes amistosos,
nos quais a interação cordial endogrupo e exogrupo possibilitaria a percepção de crenças
errôneas e a redução do preconceito, porém, em geral, isso não ocorre. A realização de
trabalhos em grupo poderia ser uma oportunidade de aproximação entre esses alunos, de troca
de experiência e oportunidade de convivência, permitindo revisão de prejulgamentos. Pela
lógica do contato social, a oportunidade de interação nos grupos de trabalhos aumentariam a
atração, a conexão e a compreensão entre as pessoas (PETTIGREW, 1982 apud MANNIX;
NEALE, 2005), no entanto, o que se percebe é que os trabalhos em grupos têm sido utilizados
como oportunidades de demarcação de fronteiras e formas de discriminação, fazendo com que
as diferenças sejam ressaltadas.

4.3.5.4 Grupos de convivência (em sala de aula)

Os grupos de trabalho discutidos anteriormente são de caráter instrumental, criados


para atender exigências de disciplina, embora na maioria das vezes tenham liberdade de
constituir os próprios grupos, eventualmente obedecem a critérios de formação estabelecidos
pelos professores. Os grupos de convivência, aqui considerados como as pessoas mais
próximas, com quem escolhem manter uma vinculação maior, têm uma conotação diferente,
voltada mais para o social e informal. Olhar para as particularidades dessas interações é
importante, uma vez que inclusão-exclusão, de acordo com Mor Barak (2005), envolve
engajamento tanto nos processos formais quanto informais, como participação em atividades
e encontros informais, nos quais se tem acesso a informações e decisões informais são
tomadas. Para Ferdman et al. (2009) a inclusão é vista como uma experiência psicológica de
ser aceito como membro de um determinado grupo social, ser valorizado, respeitado e
apoiado.
Nas descrições dos alunos se percebe dois grupos distintos: enquanto alguns alunos
gozam de um amplo espaço de convivência, com bom trânsito entre prounistas e não
prounistas, um segundo grupo tem um espaço mais restrito de convivência, com uma pequena
rede de contatos.
120

É que tem um pessoal que saiu, foi para outra sala, mas a gente continua
conversando, vai para o bar juntos, sai junto, vai na casa um do outro (P7H-
FN).
[...] tem o dia que eu gosto de sentar na frente, tem o dia que eu gosto de
sentar no fundo, então eu conheço todo mundo na sala. Converso com todos
e tenho bom relacionamento com todos (P9H-FM).
Eu entrei na faculdade com um determinado grupo de amigos [...] um desses
eu carrego até hoje [...]a gente tem a mesma forma de pensar. Eu ando com
pessoas que não são do ProUni. São gente que trabalha, sabe o valor do
dinheiro (P8H-FM).
[...] a maioria dos meus amigos mesmos, só eu que sou ProUni na minha
sala. Eu não vejo diferença assim, o tratamento é bem igual (P11M-FM).
Meu grupo é bem diversificado. Mas são todos... Não tem nenhum prounista,
só eu que sou prounista (P12M-FM).
Agora é duas. E tem outras assim... que sentam ali com a gente...
conversam... mais eu sou mais amiga dessas duas e elas também são minhas
amigas (P2M-IM).
[...] na verdade assim, eu não tenho um grupo. Tenho duas amigas minhas
que são mais próximas (P6M-IM).

Tanto alunos prounistas quanto não prounistas relatam que a formação de seus
grupos de convivência levam em conta uma identificação em de termos ideias ou origem
social, indicando que a distinção social é um fator que está sempre em evidência para ambos
os grupos, revelando ser essa uma dimensão de diversidade importante nesse ambiente. A
similaridade de classe social é um critério relevante para formação de grupos. A preposição
“mas” usada no excerto a seguir faz uma distinção de que os amigos ricos de P12M-FM têm
uma característica que não é comum a outros, ser legal, o mesmo ocorrendo com os amigos de
NP4M-FN, que “[...] não ostentam o padrão social”. Por identificação ou por distinção, ao
falar dos grupos de convívio, a questão é recorrente.
Eles são ricos [ri], mas são muito legais (P12M-FM).
No grupo em que eu convivo [...] todos héteros, perfeitos... [ri] Eles têm
gostos semelhantes aos meus, ideais parecidos... Mas eles têm um modo de
vida de classe média alta, que é o que compõe essa faculdade (NP1H-IN).
Eu acho que as pessoas com quem eu me identifico mais são aquelas pessoas
que têm uma situação igual a minha (NP3M-IM).
Eu percebo que dos doze, dois deles têm um padrão um pouco maior, mas
eles não ostentam isso. Então talvez eles se inseriram, porque o padrão é de
uma origem mais humilde, e eu me identifiquei mais com isso (NP4M-FN).
Eu restrinjo meu grupo [de convívio] a uma amiga que ela tem poderes
econômicos, mas ela se identifica muito com as questões sociais [...] esse é o
meu grupo, junto com um outro amigo [...] ele é bolsista pela IES e não pelo
ProUni (P4M-IN).

Triands (2003) considera diversidade como qualquer atributo humano, especialmente


sexo, classe social, raça, etnia, cultura, idade, orientação sexual, estilo de vida e religião. Para
Mor-Barak (2005), ser considerado diverso, em qualquer dimensão, pode trazer
121

consequências negativas ou positivas para a vida do indivíduo e torná-lo suscetível a sofrer


consequências da associação com a pertença ou não a certo grupo social, presume-se que
essas diferenças reflitam na forma de tratamento entre indivíduos e grupos. P1H-IM
considera que “[...] para uma real amizade [os alunos não prounistas] são mais fechados”, mas
P4M-IN diz que gosta “[...] do tratamento das pessoas”, sendo que na opinião de P12M-FM a
“[...] maioria é bem receptiva, eu diria isso... É uma minoria que não seria, sabe... Aquele
grupo de pessoas que são totalmente fora da nossa realidade”. Acerca dessa minoria, a
percepção de P12M-FM é de “[...] uma indiferença desagradável”. A percepção de um grupo
que é exceção em termos de tratamento é destacada também no comentário de P11M-FM,
que relata que em sua sala “[...] tinha um grupinho de três pessoas e que elas adoravam fazer
chacota com tudo”, distratando os alunos prounistas, mas não exclusivamente eles.

4.3.5.5 Grupo de atividades sociais

A participação em atividades extramuros da universidade é prática comum entre


jovens estudantes. Conforme já apontado por Ferdman et al. (2009) a experiência de inclusão
envolve a possibilidade de que pessoas possam ser elas mesmas, permitindo que outros sejam
eles mesmos, no contexto de engajamento em atividades comuns. O envolvimento em
atividades sociais é aqui considerado fator indicativo de inclusão ou exclusão, uma vez que
demonstra a natureza dos vínculos estabelecidos entre esses alunos, bem como as fronteiras
existentes e os fatores que acentuam ou atenuam essas vivências.
De acordo com P10H-FN “[...] a maioria dos prounistas não participa das mesmas
coisas que os não... de festas da IES, de festas dos Centros Acadêmicos, esse tipo de coisa”.
Percebe-se nos argumentos dos alunos prounistas entrevistados que restrições financeiras e
distância da residência são as principais “razões” que lhes impedem a participação em
atividades sociais fora da IES. P3H-IN diz que não participa em virtude de outros
compromissos pessoais, P6M-IM, P11M-FM e P12M-FM por morarem longe, P9H-FM que
tem 29 anos de idade, argumenta que “[...] a maioria deles são mais novos, então não dá pra
acompanhar”, enquanto para P8H-FM a razão é financeira, pois considera “[...] totalmente
fora de noção [...] ir para uma balada e pagar R$ 500,00 para entrar”. P10H-FN também não
tem “[...] muito contato assim, de sair junto, ir pra casa, nada disso assim...É mais dentro da
faculdade mesmo”. P6M-IM diz que as alunas de sua sala “[...] são muito participativas,
principalmente socialmente, então saem muito juntas” acredita que não sai mais por falta de
“[...] articulação social do que o próprio dinheiro. Eu acho que até em parte... a gente nem faz
122

muito esforço pra ir, porque a gente tem essa sensação de que vai ficar meio de canto”. A fala
a aluna revela um sentimento de exclusão e sua resignação frente ao ambiente, não
considerando que haja perspectiva de que seja aceita. Apenas P7H-FN refere envolver-se em
atividades sociais diversas em companhia dos colegas de sala.
Os dois programas mencionados como atividades sociais mais comumente realizadas
entre amigos são: ir à casa um do outro e frequentar os bares próximos à universidade. P4M-
IN, P7H-FN, P7H-FN e P12M-FM dizem que dormem em casa de amigos da faculdade, o que
sugere uma maior proximidade entre colegas. Em relação ao bar, embora os alunos prounistas
refiram irem juntos ao bar, a partir das falas dos entrevistados depreende-se que este é um
ambiente no qual as barreiras foram flexibilizadas, configurando-se como um espaço
democrático, em que as diferenças são menos evidenciadas.
Na hora do estudo aparece, você é prounista eu não sou. Não é na hora do
bar. Na hora do bar não tem problema (PROF 01).
[...] quando você desce no bar... vai conversar, tomar uma... tá todo mundo
junto, você conversa com o cara que você nem viu... tá mais alegre, e já
começa a conversar (NP1H-IN).
Eu não tomo bebida alcoólica, então eu ia pro bar com o pessoal e ficava
tomando refrigerante (P4M-IN).
A gente sai para ir no bar juntos [...] É normal (P7H-FN).

A opinião de PROF 01 em relação às fronteiras entre grupos existentes no contexto


das atividades acadêmica possibilita presumir que o status de aluno da IES, historicamente
concedido àqueles que possuem recursos financeiros para custeio educacional, torna-se
motivo de competição. No ambiente acadêmico ocorrem manifestações de discriminação, pois
alguns alunos agem de forma a buscar manter ou reforçar vantagem para alguns grupos e seus
membros em relação a outros grupos e seus membros, conforme observam Dovidio et al.
(2010). Por meio de categorizações são delimitadas as fronteiras e estabelecidos os aspectos
relevantes utilizados para distinguir aqueles que pertencem ou não a determinado grupo
(TAYLOR; MOGHADDAM, 1994). Dentro da instituição, categorias como aluno pagante,
aluno bolsista, aluno prounista ou aluno cotista são categorias comparativas, enquanto que
provavelmente no bar outros aspectos são considerados relevantes para categorização dos
indivíduos; talvez nesse ambiente o prounista “perca” a identidade de exogrupo e seja visto
como um outro sujeito qualquer, sendo mais importante aspectos como “ser divertido”, “ter
um bom papo”, “ser um contador de piadas”.
Quer no grupo de trabalho, no grupo de convívio ou no envolvimento em atividades
sociais, o etnocentrismo característico dos seres humanos fica evidenciado e cada grupo usa
aquilo que lhes é próprio como padrão para julgar o outro (TRIANDS, 2003). NP4M-FN, que
123

tem em seu grupo de convívio mais próximo quatro alunos prounistas, refere que busca
transitar entre os diferentes feudos de sua sala, inclusive participando de atividades sociais
com grupos distintos, o que não é percebido como natural por seu grupo de convívio mais
próximo. Relata que

[...] as pessoas saem entre elas. Entre aquele grupo. Saem entre elas. Eu era e
o único lá, diferente daquele grupo. Eu era de um outro [grupo] a principio e
tal... Aí depois as pessoas do meu grupo: “Pô XXX. Você tá jogando com
aqueles meninos lá?” Porque eles são de um perfil... um padrão mais
elitizado. Você está falando com os maur... [mauricinhos]?

A categorização dos “mauricinhos” como exogrupo é feita com base nas diferenças em
relação a quem está categorizando, pois, conforme descrito por NP4M-FN, as pessoas de seu
endogrupo são membros da categoria “[...] de uma origem mais humilde” (HOGG; TERRY,
2001) e, a partir dessas categorias, terão percepções distintas acerca do próprio grupo e do
exogrupo e, com base nessas percepções, se comportarão em relação a eles. A percepção
estereotipada de que o outro grupo tem um perfil mais elitizado demonstra que categorizar os
membros do exogrupo faz que todos os integrantes sejam percebidos como mais homogêneos,
enquanto os do endogrupo serão percebidos como mais heterogêneos.

4.3.6 Categoria: Nós e Eles

Nesta categoria são discutidas as percepções dos alunos prounistas e não prounistas
acerca de quais as categorias distintivas de seus grupos de pertença, que estereótipos possuem
acerca de seus outgroups, bem como a percepção dos professores entrevistados acerca de
ambos. Com essa análise, busca-se verificar as dimensões de diversidade nas quais os alunos
prounistas se reconhecem e são reconhecidos. Uma vez que o objeto do presente estudo é o
ProUni e que a experiência acadêmica dos bolsistas do Programa é o foco, os alunos
prounistas são considerados “Nós”, enquanto os alunos não prounistas são “Eles”.
Considera-se relevante discutir as categorizações que prounistas e não prounistas
fazem uns dos outros, uma vez que os comportamentos dos grupos embasam-se nelas
(HOGG; TERRY, 2001). Por meio da utilização de categorias como "Nós" e "Eles", são
delimitadas fronteiras e determinados aspectos são relevantes para distinguir quem pertence
ou não a determinado grupo, de forma que os membros do outgroup foram percebidos como
mais homogêneos e os do ingroup como mais heterogêneos.
124

A autoimagem descrita pelos alunos prounistas volta-se especialmente para o


desempenho, aspecto para o qual consideram possuir características distintivamente mais
positivas. Cientes de que chegam à IES com um “[...] maior déficit educacional”, consideram-
se “[...] bons alunos”, com “[...] maior predisposição para aprender”, “[...] maior empenho e
seriedade”, mais “[...] focado, estudiosos” e que obtêm “[...] notas altas”. As falas desses
alunos expressam um desejo de superação e um senso de que compete a eles mudar a própria
história e conquistar posições de maior prestígio. Dizem que “[...] se cobram mais”, “[...]
correm atrás do que querem”, ou seja, “[...] querem estar entre os melhores” e “[...] aproveitar
mais o curso para se destacar”, uma vez que “[...] não estão interessados só no diploma”.
Embora solicitados a descrever o perfil do grupo de pertença, verifica-se em expressões como
“[...] maior predisposição”, “[...] maior empenho”, um favoritismo ao ingroup manifesto via
comparação. A comparação social constitui-se o meio pelo qual o indivíduo obtém avaliação
da posição e status por ele ocupado perante o grupo, possibilitando uma redução da incerteza
e permitindo uma acurada auto avaliação (TAYLOR; MOGHADDAM, 1994).
A percepção dos alunos não prounistas entrevistados em relação ao perfil do aluno
prounista encontra considerável convergência com a autoimagem descrita anteriormente. Há
um reconhecimento por parte desse segundo grupo de que embora “culturalmente menos”
preparados, realmente “[...] são ótimos alunos”, de forma que destacam quão “[...]
batalhadores e empenhados” os percebem, consideram que “[...] são dedicados” e que “[...] a
luta dos mesmos (sic) é maior”.
De igual modo, os professores também destacam o desempenho dos alunos prounistas
e confirmam que “[...] a maioria está entre os melhores da sala”, que “[...] fazem os melhores
trabalhos, levam o curso mais a sério e têm maior interesse por pesquisa”. Reconhecendo a
existência de certo “déficit intelectual” antecedente ao ingresso na graduação, os professores
endossam que esses alunos realmente desejam “[...] retirar da universidade aquilo que ela tem
de melhor a proporcionar”.
Diferentemente do grupo de prounistas, que na descrição da autoimagem de seu grupo
dá especial ênfase aos aspectos relativos ao perfil estudantil e ao desempenho, os alunos não
prounistas entrevistados deram pouco destaque a esses aspectos ao descreverem o perfil do
grupo de pertença. De forma sintética referem como distintividade “inteligência”, possuírem
uma “[...] formação cultural mais abrangente”; consideram que “[...] estudam, mas que
deixam para a última hora”, denotando menor empenho. De acordo com o estereótipo descrito
pelos alunos prounistas “Eles” possuem “[...] nível intelectual mais elevado”, “[...] tiveram
uma educação decente”, “[...] alguns estudam, enquanto outros levam com barriga”. De igual
125

modo, evidenciam uma percepção de alunos menos comprometidos com a formação, pois
percebem que “[...] metade demonstra dedicação e vontade, enquanto a outra metade não o
faz”. Os professores os consideram “[...] bons alunos, com potencial” e destacam que o tipo
de “[...] comentários e articulações que fazem” são aspectos que distinguem os alunos não
prounistas.
Se ao falar de si mesmos os alunos prounistas entrevistados destacam os aspectos
relativos ao desempenho acadêmico, ao abordarem o perfil social trazem muito pouco acerca
do ingroup e realçam as diferenças sociais existentes entre grupos, colocando em foco as
características do outgroup. “Nós” “[...] somos de uma classe social diferente do perfil geral”
e “[...] sem dinheiro”, enquanto “Eles” possuem

[...] boa condição financeira, são de classe média, sustentados pelos pais, têm
oportunidades de viagens, maior bagagem cultural, não precisam ajudar em
casa, podem comprar livros, [vivem em um] mundo diferente, ganham carros
aos 18 anos.

A quantidade de aspectos mencionados e a forma como enfatizam as diferenças sociais


existentes demonstra que a condição social é importante fator de distinção entre grupos. Os
aspectos sociais, embora mais evidenciados pelos prounistas, foram destacados também pelos
não prounistas. Acerca da própria condição social, “Eles” dizem que possuem “[...] um padrão
social mais alto, que são sustentados pelos pais, se vestem melhor, são mais atraentes e não
precisam trabalhar”. Os professores endossam essa última descrição acerca do perfil social do
aluno não prounista e complementam que a maioria não trabalha e “[...] aqueles que
trabalham, fazem estágios para aprender porque não precisam”, uma vez que são “[...]
sustentados pelos pais, têm condições financeiras para ter carro, oportunidades de viagens,
possuem uma bagagem cultural maior, falam duas, três línguas”. Essas descrições evidenciam
que no estereótipo do aluno não prounista é dada maior ênfase à diferença social e não nos
aspectos estudantis.
Considerando que o convívio com pessoas com maiores similaridades percebidas
resultam em emoções e atitudes intergrupais positivas (TRIANDIS et al. , 1994), pressupõe-
se que as dissimilaridades ressaltadas tragam com elas uma carga de emoções negativas que
interferem nas interações entre os grupos, gerando sofrimento psíquico para o grupo em
desvantagem. Ao tratarem dos aspectos comportamentais relativos a “Eles”, os alunos
prounistas os descrevem como “[...] elitistas, egocêntricos, esnobes, preconceituosos,
hipócritas, competitivos”, e que embora se mostrem “[...] educados”, “[...] sociáveis”, “[...]
126

receptivos” sejam “[...] pessoas que não distratam”, e “[...] alguns [sejam] solidários”, são
“[...] abertos só em um primeiro momento, mas não para amizades”. Essas impressões
evidenciam que a condição social é uma dimensão de diversidade percebida, que delimita
fronteiras grupais e reduz a abertura para maiores interações.
Tantos os alunos prounistas como os professores ressaltam como característico dos
alunos não prounistas o fato destes serem “[...] contra políticas públicas” e serem “[...]
competitivos nos estudos”. Enquanto os prounistas consideram-se alunos que querem “[...]
aproveitar mais o curso para se destacar”, têm a percepção de que “Eles” desfrutam de “[...]
uma maior tranquilidade e menor peso ombros”, pois têm “[...] futuro certo”, “[...] têm mais
contatos”, contam com “[...] suporte para a carreira” e “[...] querem manter as coisas como
estão”. Na compreensão da teoria da Identidade Social, na dinâmica intergrupos, as relações
se estabelecem mais por competição e busca de distintividade do que por cooperação, porque
os membros do grupo desejam alcançar uma identidade para seu grupo que seja mais distinta
e mais positiva quando comparada a de outros grupos (TAYLOR; MOGHADDAM, 1994).
Enquanto os alunos prounistas, que em princípio possuem uma identidade social de valor
menos positivo, buscam alcançar alguma mudança de status, a fim de aprimorar a identidade
grupal para uma condição superior, percebem que os alunos não prounistas, que pertencem ao
grupo dominante, desejam e lutam para manter o status de condição comparativamente
superior, o que gera conflitos entre grupos.
Triandis et al. (1994) ressaltam que emoções positivas aumentam a probabilidade de
interação e intimidade entre pessoas e grupos, o que aumenta a percepção de similaridade, de
forma a criar um ciclo de autoreforço causal, que em casos de dissimilaridades trazem
consequências inversas, gerando condições de distanciamento. A percepção de que os alunos
prounistas mantêm certa reserva e distância em suas interações é consenso entre os três
grupos entrevistados. De si mesmos, os prounistas dizem que são “[...] mais na deles”, “[...]
nem todos se expressam”, possuem um “[...] comportamento mais controlado”, “[...] se
apropriam menos do espaço”; percepção endossada pelos alunos não prounistas quando dizem
que são “[...] introvertidos, não se soltam, não se expõem, acuados com as diferenças sociais”,
opinião ratificada pelos professores que percebem um “[...] comportamento mais contido,
reservado”. Embora manifesto por apenas um entrevistado (NP1H-IN), o estereótipo de que
os alunos prounistas “[...] tiram vaga de quem estuda”, e que, por não prestarem o vestibular
da IES “[...] têm uma vantagenzinha”, indica a opinião de que os alunos prounistas não
estudam tanto quanto eles, que não há mérito pessoal na conquista da vaga e de que essas
vagas não pertencem a eles.
127

Os alunos prounistas entrevistados consideram que comparativamente possuem “[...]


direitos diferentes”, que o caminho por eles trilhado é mais difícil, pois pertencem a uma “[...]
classe social diferente do perfil geral”, “[...] moram longe” e “[...] não têm dinheiro”, porém,
consideram possuir uma “garra” que os distingue, pelo que driblam as dificuldades, “[...]
juntam-se entre si”, “[...] trabalham e estudam ao mesmo tempo”, “[...] correm atrás” e “[...]
dão o melhor” de si na busca reduzir as distâncias sociais que os separam não só dos alunos
da IES, mas das classes sociais mais favorecidas. Jodelet (2006) argumenta que nas interações
entre pessoas e grupos, os indivíduos colocam- se como agentes ou como vítimas. Diante de
um ambiente no qual se percebem em condição social diferente do perfil social predominante,
esses alunos valem-se do desempenho como meio de obter maior distinção positiva e
aceitação nos grupos e um meio de instrumentalizarem-se para o exercício profissional e
obtenção de melhores posições, uma vez que colocam-se como agentes da própria mobilidade
social.
A partir dos conteúdos trazidos pelos alunos entrevistados acerca de seu grupo de
pertença, o protótipo relatado pelo outgroup e a percepção dos professores já discutidos nessa
categoria, foram criado perfis comparativos entre grupos, buscando-se as divergências e
intersecções da imagem do endogrupo e do exogrupo, conforme expresso na Figura 1.

Figura 1: Composição dos conteúdos discursivos

Prounista

Não Professor
prounista

Fonte: Elaborado pela autora.

As descrições da autoimagem dos alunos prounistas, as similaridades, ou


denominadores comuns entre grupos, bem como os aspectos que os distinguem foram
comparados conforme sintetizado no Quadro 5.
128

Quadro 5: Similaridades e diferenças “Nós” e “Eles”


Autoimagem Perfil Geral alunos Perfil Prounista Perfil Aluno IES
Prounista Consensual Consensual
* Maior seriedade * Assíduos * Classe social inferior * Classe Social mais alta
* Garra * Amam a IES * Ótimos alunos * Maior bagagem cultural
* Quer se destacar * Estudiosos * Menor bagagem e base escolar
* Caminho mais difícil * Educados cultural e base escolar * Vestimentas melhores
* Direitos diferentes * Respeito aos *Vestimentas mais * Sustentado pelos pais
* Quer aproveitar curso professores simples * Têm futuro certo
para se destacar *Comportamento mais * Contra Políticas
contido Públicas
* Correm atrás futuro * Quer manter coisas
melhor como estão
*Beneficiado Políticas * Não precisam trabalhar
Públicas
*Quer mudar condição
* Precisam trabalhar

Fonte: Elaborado pela autora.

Estando diversidade relacionada às diferentes categorias a partir das quais pessoas são
agrupadas em função de denominadores comuns existentes entre elas (MOR-BARAK, 2005),
ao pensar os alunos entrevistados nesta pesquisa buscou-se apontar as diferenças visíveis ou
invisíveis percebidas entre grupos, uma vez que elas podem trazer consequências negativas ou
positivas para eles. De acordo com Loden e Rosener (1991), as dimensões secundárias de
diversidade existentes entre prounistas e não prounistas referem-se principalmente ao
background cultural, à classe social e às experiências pessoais. Uma vez que a diversidade de
classe social, fator mais enfaticamente apontado pelos alunos prounistas, secundariamente
priva esses alunos de oportunidades de viagens, de engajamento em atividades sociais com
outros alunos, reduz a possibilidade de acesso aos mesmos bens de consumo, a frequentar os
mesmos ambientes sociais, ocorre significativa redução dos denominadores comuns entre
grupos. Considerando a lógica do contato social e do pressuposto de que havendo uma maior
interação entre pessoas ou grupos há também um aumento da atração entre eles, a conexão e a
compreensão entre as pessoas (PETTIGREW, 1982 et al. MANNIX; NEALE, 2005), a
condição de diverso implica uma menor interação social, estabelece fronteiras entre grupos,
criando maiores distâncias entre “Nós” e “Eles”.

4.3.7 Categoria: Manifestações intergrupais


129

Nesta categoria são discutidas as manifestações intergrupais de estereótipos,


preconceitos e discriminações, suas razões e seus agentes, uma vez que são aspectos
diretamente relacionados à experiência de inclusão/exclusão dos alunos prounistas.

4.3.7.1 Estereótipos

Já discutida anteriormente na categoria “Obstáculos do caminho”, a temática do perfil


do aluno prounista e seu desempenho é um dos estereótipos depreendidos das falas dos alunos
não prounistas entrevistados. Considerado o componente cognitivo do preconceito, os
estereótipos são generalizações (ARONSON; WILSON; AKERT, 2002) ou padronizações
(MOR-BARAK, 2005) feitas acerca de um grupo de pessoas, portanto, compreende-se que ao
usar o argumento de que o aluno que entra pelo ProUni “[...] vai pegar uma vaga de um cara
que está estudando” NP1H-IN explicita o estereótipo de que o aluno prounista não estuda. O
entrevistado sugere que, ao contrário dele, quem não estuda “consegue pegar” a vaga, o que
também sugere que essa vaga é obtida à força, quase que tirada dele. Tendo em vista que,
conforme já discutido na categoria “Nós” e “Eles”, o desempenho dos alunos prounistas é
considerado ótimo tanto por professores como por outros alunos não prounistas, não há
argumento concreto no qual sua argumentação se sustente.
A inconsistência de argumento é manifesta também na associação da imagem do aluno
prounista a alguém de comportamento inadequado, tanto em relação ao comprometimento
com a aula quanto pela postura frente ao ambiente, generalizações atribuídas a esses alunos,
sendo sugerido haver “um regimento”, ou seja, um modo esperado do aluno da IES agir, uma
capacidade de adequação ao ambiente para que pudesse conviver nesse meio social (o aluno é
militar de onde provavelmente advém a ideia de regimento). Além dos estereótipos relativos
ao aluno do ProUni, verifica-se que a imagem da escola pública também é estereotipada e
vista como um local de “baderna”, conforme indicado nos excertos a seguir.

Entrevistador: como você chegou à identificação desses alunos [prounistas]?


Entrevistado: Pelo comportamento. Pelo comportamento, né... É visível... a
pessoa que chega e entra, sai... vai beber e volta no final da aula, para pegar
a chamada, o que a gente pode concluir? (NP4M-FN).
Hoje o que você tem nas escolas públicas é baderna, é zona. Então se ele
chegasse aqui com o devido respeito [...] mas se comportasse segundo o
regimento da IES, eu não veria mal nenhum (NP1H-IN).
[Os alunos não prounistas] aqui têm uma pensamento distorcido em relação
ao bolsa família. É a mesma coisa em relação aos alunos do ProUni. Acham
que são vagabundos, que não merecem estar aqui (NP2M-FM).
130

Nas comparações sociais, as diferenças entre grupos são acentuadas e por meio das
categorias formam-se os estereótipos em relação a si, ao endogrupo e ao exogrupo (HOGG;
ABRAMS, 2001). Uma clara padronização que expressa distinção entre prounistas e não
prounistas é manifesta no diálogo estabelecido com NP1H-IN, no qual:

P: Porque eu não posso comparar agua com óleo... E: Então, o que é a água e
o que é o óleo aqui? P: Água é o cara carente, que ascendeu à faculdade,
atendendo aos requisitos que o ProUni possibilitou a ele. Esse é o água. O
óleo é o cara que tem família que o sustenta, tem padrão alto.

Curiosamente, NP1H-IN, que é uma pessoa que convive mais proximamente com
pelo menos quatro alunos prounistas e se considera uma pessoa de “origem humilde”, escolhe
uma figura de linguagem para exemplificar os dois grupos, utilizando elementos que não se
misturam, sugerindo uma separação entre ambos os grupos. O entrevistado, que está com 46
anos, demonstra um nível de expectativas superior em relação aos alunos prounistas e
evidencia intolerância a qualquer demonstração de descomprometimento da parte desses
alunos, que desfrutam de uma oportunidade que ele não teve quando era mais jovem.

4.3.7.2 Razões do preconceito

A falsa crença de que não existe preconceito no Brasil e que a paz e a democracia aqui
imperam foi por muito tempo sustentada (GRAMPA, 2012). As opiniões expostas a seguir
demonstram a existência de atitudes negativas em relação aos alunos prounistas, com
justificativas baseadas em estereótipos e generalizações, com manifestações de preconceito
baseadas quase sempre em argumentos infundados.
Um argumento utilizado para justificar os preconceitos está relacionado com a prova
do Enem, pois constitui-se uma forma diferente de entrada na IES, considerada menos
competitivo para o prounista. Alegações de que “[...] o prounista não passou pelos mesmas
provas que eles” P1H-IM, e de tratar-se de “[...] uma prova mais fácil, que é jeito mais fácil”
(PROF 01), são corriqueiras e compartilhadas também por professores em sala de aula.
P10H-FN relata que seu professor durante a aula manifesta sua opinião de “[...] que o ProUni
é uma brecha no vestibular”, entendimento similar ao de NP1H-IN, aluno não prounista, que
também acha “[...] que o ProUni é um atalho para isso”. De acordo com PROF 01 “[...] os
alunos do ProUni, primeiros colocados [na prova do Enem], são compatíveis com as
primeiras listas [dos aprovados no vestibular regular da IES], só num sistema distinto”.
131

Em relação à qualidade do ensino e ao desempenho do aluno prounista, no trabalho de


Souza (2011), o autor indicou que na PUC de Minas Gerais o argumento de que a entrada dos
alunos prounistas comprometeria a qualidade do ensino não se confirmou. Na IES pesquisada,
PROF 04 assinala que o preconceito também “[...] se manifesta muito nessa ideia de associar
ProUni com queda na qualidade”, criando-se “[...] uma falsa ideia de que o aluno do ProUni
tem um desempenho pior, que ele tem um desempenho diferente, isso não é verdade, isso é
mentira”. As pessoas contrárias ao programa acreditam que “[...] por ser uma prova fácil, está
deixando entrar pessoas que têm deficiência da escola pública” (P4M-IN), de forma que
consideram que a “[...] culpa toda é dos prounistas. O pessoal fala que o professor está tendo
que reforçar matéria” PROF 01. Cabe ressaltar que embora a prova do ENEM seja chamada
de “prova fácil”, as notas de corte para universidades conceituadas são altas.
Conforme assinalado por Aronson, Wilson e Akert (2002), crenças estereotipadas
geralmente resultam em “discriminação” e em tratamento injusto ou prejudicial contra os
membros de um grupo, simplesmente porque pertencem a esse grupo. PROF 01 diz que já
teve “[...] grandes debates na sala dos professores, de o professor falar: fulano, que é o pior
aluno, é do ProUni; e eu falei: pois é, mas em compensação, fulano, que é o melhor aluno
também é do ProUni”. Tendo em vista a fala do referido professor, presume-se que o mesmo
já categorizou seus alunos em “piores” e “melhores” e associa a qualidade do aluno com sua
condição de prounista.
Enquanto para alguns o caráter assistencialista do Programa é razão do preconceito,
uma vez que “[...] acham que você não tem que dar o peixe, tem que ensinar a pescar”
NP2M-FM, outros assinalam a existência de “[...] um preconceito de que, eu pago para os
outros fazerem as coisas” NP5M-FM, opinião essa reforçada na fala de NP4M-FN que diz já
ter “[...] ouvido aqui na faculdade: ‘isso não lhe diz respeito, pois quem paga isso é a
presidenta Dilma’. Isso não é verdade. É a sociedade que banca tudo isso [...]”. Em sua fala a
professora PROF 02 argumenta que o preconceito se dá em virtude da falta de informação,
recorrente do fato de “[...] a pessoa não sabe nem o que é o programa”.
Allport (1979) considera que situações de preconceito ocorrem sempre que uma
atitude negativa em relação a uma pessoa ou grupo é tomada com base em suposições
generalizadas. Tendo em vista que os argumentos utilizados para manifestar a posição
contrária ao programa ProUni e outras políticas estão baseados em estereótipos, falta de
informações e alegações infundadas, compreende-se que essas alegações buscam justificar os
preconceitos, que de forma manifesta ou velada existem na IES. Pressupõe-se que essas
132

manifestações tendem a continuar presentes nesse ambiente, dado que o preconceito está
relacionado com base familiar, valores pessoais introjetados e crenças acerca de si e do outro.

4.3.7.3 Manifestações de preconceito

Em sua fala NP1H-IN declara sua intolerância aos prounistas ao dizer que caso “[...] a
pessoa faça o mesmo vestibular que a gente... acho que seria um pouco mais tolerável...”, e se
autoconfessa preconceituoso assumindo que “[...] eu mesmo gero um pouco de preconceito”.
Em sua opinião “[...] tem bastante [preconceito]. Acho que esse manifesto foi o maior
exemplo”. A realização de uma manifestação contra uma possível utilização do Enem como
critério para preenchimento de parte das vagas do vestibular, encabeçada pelos alunos do
curso de Direito da IES pesquisada, virou notícia de jornal, sendo citada por alunos (NP5M-
FM e NP1H-IN) entrevistados como a maior demonstração da existência de preconceito
contra o ProUni dentro da IES pesquisada.
Embora para alguns o manifesto, que ganhou dimensão pública e que levou 800 alunos
para as ruas, buscando assegurar o direito de que a IES se mantenha destinada às elites, seja a
maior evidência de preconceito, contudo há alunos que consideram que “[...] se há um
preconceito IESzista, é um preconceito mascarado, velado [...] mas para bom entendedor você
entendeu” (P6M-IM). NP5M-FM diz nunca ter visto manifestações de preconceito, mas que
“[...] é uma coisa que eu sei que tem, entendeu”. Provavelmente, por determinação em
conquistar a conclusão da formação superior, esses alunos prefiram negar as evidências de
preconceito, para conseguirem manter a maior integridade emocional possível, o que não é
feito sem sofrimento.
O discurso dos alunos entrevistados denota a existência de preconceitos em relação
aos alunos bolsistas em geral, sendo percebidos como mais intensos em relação a uma
categoria de alunos cotistas do que a outras categorias de alunos não pagantes. Ilustrando essa
gradação P2M-IM afirma que “[...] contra o ProUni eu não ouvi, é mais contra as cotas em si.
Só que se olhar pelo ProUni, também são vagas reservadas, então não deixa de ser, mas contra
cotas eu ouço de vez em quando”. Cabe aqui retificar a compreensão de P2M-IM, pois as
vagas do ProUni são vagas ofertadas na proporção de uma para cada dez vagas regulares
disponíveis obedecendo às normas do Programa. Estendendo essa lógica, P6M-IM considera
que “[...] se eles são contra o Programa, com certeza eles também são contra, indiretamente...
[o aluno]”, de modo que o preconceito contra cotistas é também percebido como preconceito
contra prounistas. As argumentações desses alunos transmitem a mensagem de que o
133

preconceito os rodeia; se contra bolsistas, contra prounistas ou contra cotas, o fato é que estão
convivendo com alunos preconceituosos no ambiente acadêmico e isso gera desconforto e
impede um real sentimento de pertença ao local e ao grupo.
Cotas raciais são questões polêmicas dentro da IES, assunto para o qual os alunos se
posicionam mais claramente, havendo inclusive aluno prounista (P9H-FM) contrário ao
sistema de cotas raciais. P1H-IM enfatiza o posicionamento de colegas de sala dizendo que
“[...] elas [alunas da elite] são plenamente contra cotas. Elas defendem isso. Elas falam isso” e
esses posicionamentos preconceituosos são manifestos até mesmo nos interesses científicos
desses alunos. Duas propostas de pesquisa apresentadas a dois professores diferentes
evidenciam uma convergência do preconceito em relação a cotas com o preconceito em
relação ao ProUni e indicam a existência de inquietações e mobilizações acerca disso e das
cotas. Na primeira situação, a professora recusou a proposta de pesquisa, argumentando o
caráter preconceituoso da proposta, uma vez que o aluno não era pedagogo para avaliar
desempenho, enquanto na segunda situação, uma aluna sentiu-se ofendida com a proposta e o
tema foi discutido em sala.

Semana passada um aluno, na aula de metodologia, segundo semestre fez


uma proposta: Se o desempenho de um cotista é igual. Fez essa pergunta. Se
o desempenho de um cotista do ProUni é igual o dos outros alunos (PROF
01).
Semestre passado aconteceu que um grupo fez uma pergunta para os
entrevistados que era a seguinte: Ah, era sobre cotas... Você aceitaria ser
operado por um médico que foi formado em uma universidade e entrou pelo
sistema de cotas? (PROF 02).

Por ser a IES pesquisada voltada predominantemente às classes média e média alta, e
considerando que o programa é voltado a alunos de baixa renda, diante da diferença de perfil
econômico, o preconceito socioeconômico também é manifesto, conforme destacado por
alguns alunos.
[...] separa a crítica que é a critica que está pensando na qualidade de ensino
[...] do preconceito, que é o preconceito de raça e do preconceito de classe
que eu acho que isso é bem presente e eu sei que existe (PROF 04).
[O preconceito] que eu mais presencio e esse eu vejo é o socioeconômico.
Sabe quando a pessoa olha e fica desprezando porque a pessoa está mal
vestida, mas você olha e vê que a pessoa não está mal vestida porque ela
quer, é porque ela não tem outra roupa para usar (P11M-FM).
Eles são indiferentes, mas não só com as pessoas que são prounistas, eu acho
é com qualquer pessoa que seja abaixo da classe social deles eles são assim
(P12M-F).
Ela falou assim... eu não me lembro quais as palavras, mas ela falou mais ou
menos, também, olha onde você mora... porque ela mora num bairro de alto
padrão lá e eu não. [...] Eu me ofendi (P12M-FM).
134

O ProUni é esse padrão aí... Esse... ess... essa coisa que também só chegou
porque se não tivesse alguém para pensar nesse pessoal, não teria chegado,
iria fazer noutro lugar. É injusto demais... (NP4M-FN).

A partir da análise dos dados, constata-se que a forma como o preconceito é expresso
envolve indiferença em relação ao outro, emissão de comentários ofensivos e colocações
preconceituosas frente ao grupo, podendo ser notadas estratégias de evitação e discriminação,
descritas a seguir.

4.3.7.4 Discriminação

Considera-se discriminação com uma ação ou comportamento negativo e injustificado


(PROUDFORD; NKOMO, 2006; ARONSON; WILSON; AKERT, 2002) de um indivíduo
que cria, mantém ou reforça vantagem para alguns grupos e seus membros em relação a
outros grupos e seus membros (DOVIDIO et al. 2010).
Na convivência entre grupos de status diferentes, como é o do contexto desse estudo,
na tentativa de manter vantagem para o endogrupo discriminações em relação ao exogrupo
podem ser manifestas. De forma similar a constatada por Souza (2011), a serem questionados
acerca de ocorrências de discriminações no ambiente acadêmico, a maioria dos alunos
prounistas entrevistados afirmam nunca terem sido discriminados ou testemunhado
discriminações. Na percepção de P12M-FM, “[...] O aluno prounista, não sofre discriminação
por isso. Eu acho que sofre mais, entre aspas, discriminação um aluno bagunceiro do que o
prounista”. A opinião de P12M-FM, contraditória às percepções dos outros alunos
anteriormente relatados, é de igual modo compartilhada por três dos quatro professores
entrevistados, que também acreditam não ocorrer situações de discriminação em relação a
esses alunos.
Contudo, embora representem uma minoria, PROF 01 e alguns alunos referem terem
testemunhado situações discriminatórias. Enquanto NP5M-FM alivia ou banaliza uma ação
tão grave, dizendo achar “[...] que tem um ‘quezinho’ de discriminação, porque, enfim... ele
não está pagando... Ele estuda com o meu dinheiro”, expressão que inclusive revela seu
desconhecimento em relação ao Programa ProUni; de forma oposta, PROF 01 afirma que já
viu “[...] de monte” alunos serem discriminados e já testemunhou também alunos reagindo.
Em seu depoimento, P6M-IM que é a única pessoa entrevistada que relata ter sido
vítima de discriminação direta, descreve uma situação em que ao encostar-se
involuntariamente em outra pessoa “[...] ela ficou extremamente irritada porque eu encostei
135

nela e saiu do banheiro xingando. Ela falou: ‘Ai que nojo’ e saiu do banheiro. Então assim,
para mim foi extremamente constrangedor né, eu fiquei assim, atônita”. Diante da evitação de
contato e da utilização de linguagem insultuosa, a aluna se viu hostilizada e exposta a um
constrangimento público, como se possuísse uma doença contagiosa, que pudesse ser
transmitida no toque. A aluna é afetada em sua autoestima, mas se afasta emocionalmente do
contato com a realidade do preconceito manifesto. Utilizando-se de um mecanismo de
negação da gravidade do ato, P6M-IM questiona se a discriminação existe realmente ou se é
mera impressão sua, ao dizer que “[...] sensação a gente tem [de ser discriminada], eu não sei
se é porque a gente já se sente um pouco... né... ou se realmente há [discriminação]”. Embora
não haja indicativo algum de que a outra pessoa soubesse de sua identidade de prounista, ela
acha que sim. A sensação descrita por P6M-IM, de acordo com Goffman (1988), constitui-se
um marca de indivíduos que possuem uma identidade deteriorada, uma vez que eles tendem a
ter as mesmas crenças sobre identidade que os “ditos normais” têm. A aluna manifesta sua
percepção da discriminação existente quando refere-se a uma amigo que

[...] sempre sente essa... porque no caso dele, além de prounista ele é
discriminado pela questão da raça, então ele sofre mais por isso. Então, vira
e mexe ele me conta alguma coisinha que ele sentiu, mas assim, como eu
falei, é tudo muito velado.

Nas expressões “além de prounista” e “sofre mais” fica evidente que a condição de
prounista é percebida como de valor mais negativo e que há um sofrimento emocional na
experiência de confronto com o exogrupo, que tem uma percepção negativa em relação a ela
e/ou a seu grupo de pertença.
Na opinião de P11M-FM, as discriminações ocorrem de forma pontual, mas não são
prática comuns, são “[...] tão poucas pessoas”. Diferentemente de P6M-IM que foi vítima de
discriminação, P8H-FM percebeu-se discriminado de forma indireta ao presenciar uma
situação em que um professor “[...] discutiu com uma aluna. A aluna tinha razão [...], mas
todos os argumentos da aluna foram desqualificados, porque ela era do ProUni”. P8H-FM
relata que o posicionamento de outros alunos foi argumentar: “Você sabe como essa gente do
ProUni é”, comentário configura-se uma generalização, pois desconsidera a individualidades
desses alunos e atribui-se ao grupo características iguais (ARONSON; WILSON; AKERT,
2002). Esse episódio foi repetido por P7H-FN, P8H-FM, NP4M-FN, o que denota não tratar-
se de uma impressão particular do aluno, mas de fato concreto que manifesta que deixou-se de
136

olhar a aluna individualmente, sendo atribuída a ela característica do grupo, visto como
negativo, estereotipada e indigna de crédito (HOGG; TERRY, 2001).
Se os estereótipos são formados, se há preconceito e discriminação, há sempre os
agentes por meio dos quais eles se manifestam. Os apontamentos já discutidos nesta categoria
evidenciam que, embora não se constitua uma maioria, alunos não prounistas tornam-se
agentes de preconceitos e discriminações, que tornam a permanência dos alunos bolsistas do
ProUni na IES mais árida e sofrida, impedindo o pleno gozo de uma experiência de inclusão.
PROF 01 afirma que os alunos “[...] são estimulados a discriminar”, tanto pela
estrutura física (salas mais apertadas em virtude da entrada dos alunos prounistas) como por
professores, indicando que estes também são agentes da discriminação e do preconceito, o que
é percebido por alunos. Com diferentes conteúdos, cada recorte de falas relativas aos
professores evidenciam distintas formas de agirem ou expressarem suas opiniões pessoais em
sala, capazes de fomentar animosidade entre grupos de alunos, conforme destaques.

E: Estimulados por quem? P: Eu acho que pela estrutura, por conta disso,
porque fica muito claro. Eu trabalho num curso que a gente tem problema de
espaço físico, de estrutura física. Se eu falo que eu vou por cinco alunos a
mais significa que eu vou apertar a sala cinco cadeiras a mais. Então, há um
estimulo estrutural (PROF 01).
Ele chega depois [prounistas], e eles [os outros alunos] são estimulados
também pelos professores (PROF 01).
Eu tive só um professor só, que era extremamente elitista. Ele fazia a
chamada e perguntava pelo sobrenome das pessoas, se conhecia tal pessoa...
se tal pessoa era amigo, e... a gente viu que, no final do semestre essas
pessoas ganhavam pontinhos (P1H-IM).
Foi um professor que era totalmente contra o ProUni e ele falava isso
abertamente na sala. Então eu ficava meio receoso, mas no sentido de não
querer discutir com o professor determinadas coisas, então eu preferia ficar
calado, entendeu... mas tirando esse caso... (P10H-FN).
Alguns professores que me perseguiam, mas mais relacionado à condição
social, o de XXX por exemplo, o de XXX, que era terrível, acho que só.
Esses dois são terríveis. É. Acho que são só esses dois mesmos (P7H-FN)
Teve um professor, eu acho que foi esse semestre, que estava falando sobre a
diferenciação da IES antes e agora, e disse que aqui antes era muito barato e
atualmente a IES é muito cara, e segundo entendimento dele, por causa da
quantidade de bolsas. Bolsa de esporte, bolsa daquilo. Aqui tem bolsa para
tudo, então quem sai pagando acaba sendo... De algum lugar tem que vir o
dinheiro, e acaba sendo de quem não é bolsista (P9H-FM).

Sendo a academia um espaço de formação e aprendizagem, onde se obtém


conhecimento, presume-se que os professores sejam referências para a formação dos alunos.
Formadores de opinião e com o domínio da palavra, aqueles que deveriam ensinar do direito à
igualdade, sensibilizar sobre as causas sociais e o direito constitucional, acabam utilizando
137

esse espaço para estimular negativamente os alunos. Proudford e Nkomo (2006) assinalam
que o preconceito e discriminação têm se institucionalizado nas organizações e na sociedade.
Ainda que seja percebido mais como exceção do que como regra, preconceito e discriminação
têm se manifestado no ambiente acadêmico, fazendo como que o acesso à educação e a
apropriação do benefício concedido por direito aos alunos prounistas não seja plenamente
desfrutado. Conforme apontado por Taylor e Moghaddam (1994), na dinâmica intergrupos há
um grupo dominante lutando para manter-se no status de condição superior, enquanto o outro
busca alcançar alguma mudança de status, a fim de aprimorar a identidade grupal para uma
condição superior. Na relação entre alunos prounistas e não prounistas essa luta se estabelece,
pois cada um dos agentes que participam dessa dinâmica contribui para que a
inclusão/exclusão se efetive, sendo que os estereótipos e as manifestações de preconceito e
discriminação só colaboram para efetivação da exclusão, da qual o programa ProUni objetiva
retirá-los.

4.3.8 Categoria: Experiência de Exclusão

Não há como pensar esta categoria isoladamente de todas as outras já discutidas


anteriormente, mas como um ponto de convergência, que expressa a percepção e a
experiência individual de exclusão. Compreendendo que a experiência de inclusão ou
exclusão se configura a partir daquilo que cada um traz de seu contexto familiar, de suas
características pessoais, de suas percepções acerca da IES e do Programa ProUni, de suas
expectativas pessoais, da qualidade das relações interpessoais e das manifestações
intergrupais, muito do que já foi discutido nas categorias anteriores expressam facetas de
exclusão. Assim, nesta categoria sintetizamos a compreensão desses alunos acerca do que seja
exclusão, que situações excludentes ocorrem por parte da instituição, dos colegas e mesmo a
autoexclusão se dão no ambiente acadêmico que contribuem para que esses alunos se
percebam excluídos.
Uma vez que as crenças pessoais influenciam as percepções individuais, para
compreender a experiência de exclusão se faz necessário primeiramente conhecer o que é
exclusão para os entrevistados. Shore et al. (2011) consideram que para que uma pessoa
sinta-se incluída é necessário que ela receba um tratamento que satisfaça sua necessidade de
pertença e de singularidade, podendo-se entender que a exclusão se dá quando, de forma
oposta, não há espaço para expressão dessa singularidade e não é concedido um tratamento
138

respeitoso a despeito das diferenças. Os principais entendimentos dos entrevistados acerca do


conceito de exclusão serão aqui apontados.
A experiência de inclusão ou exclusão do indivíduo se dá mediante trocas nos
ambientes sociais, de forma que, em ambientes não receptíveis, os indivíduos possam ser
tolhidos da liberdade de expressão e da possibilidade de autenticidade (BERG, 2002),
fundamentais para um sentimento de pertença real. As narrativas de alguns sujeitos
entrevistados seguem essa linha de compreensão, na qual uma primeira forma de compreender
exclusão é como a não aceitação das diferenças e as manifestações de tratamento negativo
dela decorrentes, compreensões essas que vão de não aceitação das diferenças ao desprezo e
evitação, conforme indicado nas falas:

Exclusão para mim é a não aceitação só porque você é diferente (P5M-IN).


Exclusão é você ser realmente tratado muito diferente... (NP3M-IM).
Então a exclusão, ou ela vem por preconceito ou por cultura, e esse
comportamento de rechaçar os diferentes faz com que as pessoas vivam
realidades não verdadeiras, simplesmente porque é mais fácil ser maioria, ao
invés de viver na sua singularidade. Isso é o mais grave, você não ser
respeitado, reconhecido, você ser olhado como menor, como se você tivesse
uma doença contagiosa, que você precisa ser evitado (PROF 03).

Em uma segunda compreensão, a exclusão é vista como conceder tratamento igual


para aqueles que tiveram oportunidades diferentes (considerada por PROF 02 como a pior
forma de exclusão, como se houvesse níveis), não propiciar oportunidades para redução das
distâncias sociais tão rigidamente estabelecidas, não utilizar ações afirmativas para reduzir
essas diferenças, atribuir ao sujeito a responsabilidade de conquistar por si só o seu espaço,
embora desfrutando de condições distintamente menores, são apontadas nas definições feitas
pelos entrevistados. Os conceitos expostos a seguir demonstram que esses alunos não
consideram justo enfrentarem sozinhos todas as barreiras econômicas e sociais e que precisam
do apoio do Governo em prover medidas compensatórias, que lhes permitam acessos e
oportunidades que de outra forma não os teriam.

Você [qualquer pessoa] identifica o problema, você não age, você não ajuda
quem precisa, e deixa esse desfalque (P3H-IN).
Exclusão é não dar oportunidades [...] Exclusão é tudo o que a nossa
sociedade é, porque a nossa sociedade é extremamente excludente (P1H-
IM).
Exclusão é isso: é você não tratar mesmo essas diferenças (PROF 01).
[Exclusão] seria a falta de ações afirmativas, assim... De tentar incluir
pessoas que não têm as mesmas oportunidades que as outras (P12M-FM).
E a exclusão pior é essa que você não sabe que está fazendo, e essa é a típica
da educação. Ah! Eu estou tratando igual... Tratar igual é extremamente
139

excludente, porque você vai pressupor que os dois tenham as mesmas


condições, e não é verdade (PROF 02).

A terceira forma de compreensão da exclusão é vista como ação intencional de


isolar, de impedir ou restringir o acesso de alguém a determinado lugar, com base em suas
características pessoais. Isso o PROF 01 chama de um “caráter mais agressivo” de exclusão.

Eu [qualquer pessoa agente de exclusão] fecho determinado local, situação, e


não, você não pode entrar porque você não tem determinados requisitos para
entrar aqui. Se você não tem certo requisitos para entrar aqui, desculpa, não
é problema meu. Vá para onde você conseguir com as suas condições (P8H-
FM).
É você [alguém] colocar dificuldade para que essa pessoa não integre
determinado grupo. Não precisa nem ser expresso isso, você... Às vezes
essas dificuldades são colocadas são de forma implícita, entende...? (P10H-
FN).
Aquela eu não quero por tal motivo, sai fora (NP1H-IN).
Quando você começa a limitar o acesso a qualquer coisa que seja um direito
fundamental da pessoa, qualquer coisa, por questões múltiplas... desde por
padrões sociais ou limitações de acesso (NP4M-FN).
Por essa pessoa ser diferente, você tirá-la do convívio do coletivo, não
permitir que ela participe do todo ali (NP5M-FM).
Aí tem a exclusão agressiva, que daí é você, além de você não dar
oportunidades, você tira dela oportunidades (PROF 01).

A evolução das compreensões emitidas pelos entrevistados expressam as diferentes


formas de exclusão, que, conforme já apontado por Abrams, Hogg e Marques (2005), podem
ter formas mais abstratas, como ideologias sociais, convenções morais e princípios, a modos
mais específicos, como os processos de categorização. De forma sintética, depreende-se das
falas dos entrevistados que exclusão é compreendida como não aceitação das diferenças,
como desconsideração das diferenças sociais existentes e falta de ações que visem repará-las,
de forma a conceder tratamento diferente para os diferentes com vistas a promover a
igualdade. De forma mais grave, além de não aceitar e de não agir para minimizar as
diferenças aponta-se o entendimento de que exclusão refere-se ao tratamento negativo, ao
impedimento de acesso ou afastamento, que, conforme Abrams, Hogg e Marques (2005),
configura-se exclusão uma vez que, em decorrência disso, é negada a possibilidade de
estabelecer relacionamentos entre elas.

4.3.8.1 Comportamentos excludentes e experiências de exclusão


140

Ao abordar as estratégias institucionais de exclusão do aluno prounista apenas dois


alunos prounistas se posicionaram, sendo a falta de políticas assistenciais (P12M-FM) de
ajuda a eles o único aspecto indicado. De acordo com P9H-FM, o “[...] aluno bolsista aqui, a
única coisa que ele tem direito é ali [usar da estrutura física e assistir aula]. Direito de entrar
na faculdade, direito de usar os livros, tudo... mas não além”. Aponta a falta de apoio para
qualificação em línguas estrangeiras, considerando que existe um centro de línguas dentro da
IES e que poderiam permitir que por “[...] uma taxinha de R$ 50,00 [...]. Eu acho que seria
mais isso, para ajudar esse aluno a se preparar”, porém esse acesso não é concedido.
Subjacente à fala desses alunos prounistas parece haver uma noção de que o “outro”, seja IES
ou Governo, têm que fazer algo para melhorar a condição deles.
Ao falar sobre diversidade, NP2M-FM reclama que a IES não proporciona “[...] um
espaço para você discutir sobre isso, falar com a universidade” , e considera que o ambiente se
tornará mais excludente uma vez que a IES está “[...] tirando os espaços de convivência dos
alunos para colocar lanchonetes”, percebendo que a exclusão é mais ampla, abrangendo a
todos, prounistas e não prounista.
PROF 01 argumenta que, devido ao despreparado de coordenadores e professores,
para lidar com “[...] situações excludentes” que ocorrem dentro da IES “[...] não são tomadas
ações rápidas”, o que seria resolvido se a IES fornecesse qualificação aos seus profissionais;
em não havendo, a percepção de exclusão é aumentada. Sua fala é endossada por NP4M-FN
ao relatar sua opinião de que a formação de grupos no período inicial do curso e que se torna
um fator que contribui para a exclusão e discriminação, teria danos reduzidos se houvesse
intervenção institucional e dos professores, conforme relata:

Se os professores, a faculdade, ficassem mais atentos, naquele período mais


propedêutico, você corrige vícios que depois você não conserta mais. Esse
negócio que eu estou te falando dos feudos, eu acho uma coisa muito grave.
Não deveria ter acontecido, mas aconteceu. E depois de estabelecido você
não muda mais. Os professores deveriam exercer, e isso é papel do
professor, criar mecanismos de interação (NP4M-FN).

Os indivíduos são motivados a pertencer a grupos positivamente avaliados; por meio


de comparações estabelecem o valor e status relativo de cada grupo e determinam o valor e
status que tem ser membro de tal grupo (TAJFEL, 1972). De acordo com o modelo dos cinco
estágios de Taylor e McKirnan (1984) apud Taylor e Moghaddam (1994), nas relações
intergrupais as ações dos grupos em vantagem visam manter o status de valor positivo de seu
grupo, enquanto as estratégias comportamentais daqueles que pertencem a grupos em
desvantagem, objetivam mudar a condição para um grupo de status mais positivamente
141

avaliados. Hogg e Terry (2001) assinalam que quando uma pessoa passa a ser percebida como
membro do grupo a qual o indivíduo pertence (endogrupo), este será percebido em sua
singularidade; porém quando percebido como diferente (exogrupo) será também visto como
mais homogêneo. Por essas dinâmicas serem reproduzidas nas relações entre prounistas e não
prounistas, a intervenção inicial dos professores, a fim de evitar a formação dos grupos e
promover uma maior interação entre esses alunos, no momento inicial possibilitaria a redução
dos conflitos intergrupais posteriores. Essas formações são feitas porque são feitas
classificações baseadas nas similaridades e diferenças entre eles, que agirão com favoritismo
em relação ao próprio grupo.
Em sua fala, PROF 03 confirma a falta de ação institucional e manifesta sua crítica ao
dizer que “Não se implanta uma política nova sem trabalhar o corpo que vai lidar com as
pessoas. Então, não houve uma preparação, o pouco que nós temos atuado é por acreditarmos,
não temos uma ferramenta, não temos um trabalho de... [qualificação]”. A falta de ações
mostra que não há uma atenção para as interações entre grupos diversos, ou para a promoção
da inclusão, e sim uma inserção desses alunos da IES, de forma que cada um age por seus
próprios valores, não havendo uma atenção da instituição para a promoção de um ambiente
inclusivo.
Da parte institucional as menções de ações excludentes se restringem às acima
apontadas, porém a IES não é a única agente de exclusão. Na fala de P6M-IM, a aluna refere
que “[...] da parte de professor e funcionário, acho que não [houve exclusão]. Nunca senti
nenhuma diferença”, o que sugere perceber que a exclusão existe, mas que vem de outros
agentes, os outros alunos. Acerca do aluno como agente, NP4M-FN diz “[...] ter que insistir
na questão da divisão em grupos”, da mesma forma P9H-FM afirma que em sua sala “[...]
sempre foram os grupinhos fechados”, e assim, complementa PROF 01, se “[...] eles chegam
um mês depois, eles não têm grupos, aí eles formam grupos entre eles, e você começa a ter
um processo de exclusão que é feito pelas circunstâncias” ou, conforme indicado por P11M-
FM, quando solicitam a entrada nos grupos existentes “[...] você é colocada num grupo, pior
ainda, porque é um grupo fechado e as pessoas não estão nem aí para você”.
Uma estratégia considerada de “exclusão agressiva” é relatada por PROF 01, na
qual as “[...] salas fizeram mecanismos físicos de exclusão [...] de não deixar incluir o
fulano”, na qual, a despeito da tentativa de alguns professores de “[...] desarticulação [...] não
fomos vitoriosos” e, por ser “[...] uma sala, a sala não ia mudar de ideia. Então eles [os alunos
prounistas] saíram da sala”. Essa ocorrência traz como agravante o fato de não ser uma ação
de um indivíduo ou de uma “[...] minoria que exclui”, conforme aponta P6M-IM, mas sim
142

coletiva, uma sala toda assumindo uma atitude discriminatória e excludente institucionalizada
na sala. Conforme modelo dos cinco estágios proposto por Taylor e McKirnan (1984) e
apresentado por Taylor e Moghaddam (1994), em geral, as relações sociais ocorrem entre dois
grupos com alguma diferença de status entre eles; no caso citado, a resignação dos alunos
prounistas, que solicitaram ser trocados de sala, demonstra que tanto o grupo em vantagem
como o em desvantagem consideram a estratificação. Os autores apontam que é próprio aos
integrantes de grupos em desvantagem imputar a si mesmos a reponsabilidade por estar em
posição inferior, portanto, caberia a eles resolver a questão, tomando a resolução de mudar de
sala.
Estando o conceito de inclusão-exclusão relacionado com à participação do indivíduo
tanto em processos formais, como o acesso a informações e a canais de tomada de decisões
(MOR BARAK, 2005), aponta-se como outra forma de exclusão que se dá no ambiente
estudado a privação do aluno prounista do acesso a informações. Ainda de acordo com PROF
01 “[...] uma representante, passou um semestre inteiro e não cadastrou o e-mail de nenhum
aluno do ProUni. Tudo o que você mandava de informação eles nunca recebiam”. P11M-FM
relata sua percepção de privação de acesso a informações pelo fato de gabaritos de respostas
de provas já aplicadas serem compartilhadas por e-mail somente para os grupos majoritários,
e não para os outros grupos.
Outra situação indicada por NP1H-IN, na qual

[...] acaba gerando aquela exclusãozinha natural... [...] vai ter um bota fora.
Vamos? Você sabe que o cara não tem. Mas vamos lá... O cara não vai falar:
Meu, eu não tenho R$ 120,00. Mas ele acaba simplesmente não indo, mas
não é porque a gente exclui.

Uma situação provavelmente não será considerada como de exclusão “natural” por
aquele que é vítima dela. As condições socioeconômicas díspares criam barreiras e exclusão
financeira, mas na percepção de PROF 01, a “situações agressivas” não se dão só em relação
à recursos financeiros, também ocorrem “[...] com o prounista: Ah, ele não fala inglês. Eu não
quero no meu grupo. Ele não tem isso... ele não... Eu já ouvi isso: fulano nem convida pro
churrasco, porque ele não vai ter condições de ir”. As passagens indicam que duas dimensões
de diversidade, a condição social e a qualificação pessoal, são apontadas como características
distintivas entre os grupos e em virtude dessas diferenças percebidas as situações de exclusão
ocorrem.
143

Os dados aqui obtidos mostram que as experiências pessoais de exclusão relatadas


pelos alunos prounistas não são muito enfatizadas em seus discursos, são mais descritas como
ocorrências casuais, de um grupo minoritário que não dá abertura para relacionamentos, com
o sentimento de privação da liberdade de expressão e com a distância geográfica entre a
residência e a IES que impedem envolvimentos em atividades sociais e acadêmicas, conforme
indicado a seguir.

Então, ela assim... Ela [colega de sala não prounista e elitista] coloca uma
grande barreira entre ela e as amigas delas para mim e a outras pessoas da
sala. Ela é uma pessoa elitista, ela em específico. Extremamente elitista.
Então, acho que exclusão, só esse fato (P1H – IM).
Às vezes você mora muito longe para poder ir... a IES disponibiliza grupos
de estudo aos finais de semana [pequenos grupos, que se encontram
regularmente para aprofundar discussões sobre temas de interesse comum a
todos]. É uma coisa maravilhosa (P11M-FM).
Há determinados grupos que excluem [...] você vai lá tentar falar com ela,
ela passa a informação e já começa a falar com as outras pessoas e você fica
meio deslocado e acaba saindo fora [...] pelo menos por enquanto, eu não sei
assim, com o passar do tempo, talvez por não se conhecerem ainda muito
bem, esses grupos ficam extremamente fechados (P6M-IM).
Com aquela turma nem tanto [não se sente à vontade]. Às vezes eu quero
fazer uma pergunta e eu espero pra perguntar no final da aula (P11M-FM).
Eu imagino que ocorram casos de exclusão aqui, mas eu não me sinto bem a
dizer sobre isso, porque comigo não aconteceu e eu também não conheço
com quem tenha acontecido (P3H - IN).

Mor Barak (2005) propõe que o senso do indivíduo de ser participante do sistema no
qual está inserido se constrói com base no modo como experiência e percebe suas posições
em relação aos outros grupos sociais predominantes. Porém, chama-se aqui a atenção para o
fato de que os relatos de situações de exclusão apontados são feitos principalmente por
professores e por alunos não prounistas, que de alguma forma as banalizam, enquanto os
alunos prounistas tendem a minimizar as situações de exclusão, ignorando ou racionalizando-
as. Considerando que a percepção dos professores é mais abrangente, uma vez que eles
passam por diferentes salas, e de que, pelo menos em um caso específico, o professor está na
instituição desde o lançamento do Programa, o que lhe confere uma ampla visão dos fatos
relacionados à dinâmica de interação entre prounistas e não prounistas, é possível que alguns
dos alunos prounistas entrevistados, principalmente aqueles que estão nos semestres iniciais,
não tenham realmente experienciado, presenciado ou mesmo tomado conhecimento das
situações de exclusão aqui relatadas, ou ainda que as tenham experienciado, mas não as
reconheçam ou confiram importância às situações vivenciadas.
144

Ao pensar na subjetividade da experiência desses alunos, não há como desconsiderar o


sofrimento decorrente de ser tratado como inferior e de como o sofrimento pode afetar o
corpo e a alma daqueles em condições menos favoráveis (SAWAIA, 2006). Portanto, é
possível que alguns alunos prounistas entrevistados não tenham vivenciado experiências
como essas relatadas, porém cabe também considerar que para um aluno implicado e vítima
da exclusão o contato com essas situações podem ser racionalizadas, a fim de não tomarem
contato com parte do que ocorre ao redor, para melhor alcançar o objetivo da formação.
Embora a exclusão possa ocorrer de forma institucional, da parte de professores e dos
colegas, o próprio aluno prounista pode ser agente de auto exclusão, pois, conforme apontam
Abrams, Hogg e Marques (2005), ao nível intrapessoal (autoexclusão), esta ocorre quando o
aluno cognitiva e emocionalmente não considera a possibilidade de se incluir em outros
relacionamentos e opta por manter certo afastamento do grupo. Dos doze alunos prounistas
entrevistados, cinco deles são mais retraídos, referem não engajarem-se em atividades fora de
classe, alguns se relacionam com poucas pessoas e não demonstram interesse em ampliar a
rede de contatos. PROF 02 considera P3H-IN “[...] menos incluído [...] acho que porque ele
não é daquela sala, ele está fazendo adaptação, então as pessoas também não conhecem muito,
então ele não é muito inserido”.
P2M-IM diz que não se envolve em atividade fora de sala ainda, vai para casa
estudar após a aula e tem dificuldades para se ambientar, mas que:

Ao mesmo tempo eu também não me importo tanto assim, sabe? Eu percebo


que todo mundo está muito junto, mas não é o que me incomoda.

P6M-IM relata esquivar-se de envolvimento em algumas atividades, porque:

Eu acho que até em parte... A gente nem faz muito esforço pra ir, porque a
gente tem essa sensação de que vai ficar meio de canto.

P8H-FM relata que:

Eu queria entrar na Atlética, porque eu tinha essa ideia de: vou fazer a
faculdade, não vou ir à faculdade. Mas eu vi que era uma coisa muito
fechada. É aquela coisa, eu venho para a faculdade sete e meia, meio-dia e
meio (sic), tchau, não tem aquela coisa...

Analisando os relatos de P6M-IM e P8H-FM acima apontados utilizando o modelo


dos cinco estágios da dinâmica intergrupos propostos por Taylor e McKirnan (1984), e
apresentado por Taylor e Moghaddam (1994), fica evidenciado que ambos estão no primeiro
nível, pois expressam a percepção de que as relações intergrupais dentro da IES são
145

estratificadas; e por isso não consideram que a inclusão seja possível, uma vez que percebem
que o status de cada grupo está rigidamente estabelecido e por isso atribuem a si mesmos a
escolha de ficar em posição inferior.
P10H-FN não se envolve em outras atividades da IES e adotou a estratégia de unir-
se aos outros prounistas, criando dentro da sala um espaço deles, conforme relata:

Quando eu cheguei, no primeiro dia... no primeiro dia, teve uma questão


assim, é... De união dos prounistas, se fosse ver dessa forma... Todos sentam
ali, mais ou menos naquela região.

Ao adotar estratégias de isolamento, de formação de guetos entre iguais, não


buscando ampliar o espaço de convivência, esses alunos tornam-se agentes da própria
exclusão.

4.3.9 Categoria: Experiência de Inclusão

Da mesma forma que a categoria anterior, esta categoria não está isolada a todas as
outras já aqui apresentadas, uma vez que ela compreende todas as histórias e vivências
trazidas anteriormente. Igualmente serão aqui sintetizadas as compreensões dos alunos
entrevistados do que seja inclusão, quais as estratégias de inclusão percebem serem adotadas
pela instituição, pelos colegas e aquelas que adotam pessoalmente dentro do ambiente
acadêmico que favoreçam a experiência de inclusão.
As formas como os sujeitos entrevistados compreendem inclusão são aqui
apresentadas, uma vez que estas servem de referência para que estes se percebam incluídos ou
não. A compreensão de inclusão como “[...] fornecer meios” para o indivíduo crescer ou “[...]
abrir oportunidades para quem não teria” são os entendimentos mais citados, o que expressa
uma ideia de inclusão, como a instrumentalização e concessão de igualdade de condições, o
que deve ocorrer de forma ampla, possibilitando ao indivíduo alcançar autonomia, conforme
explicitado nas falas a seguir.

Fornecer os mesmos meios que se dá a qualquer outro ser que está nesse
ambiente e para o que está de fora, em outro ambiente também. Mas se é
todos os meios, é todos os meios. Então, inclusão mesmo é difícil acontecer
(P1H-IM).
Inclusão seria dar o meio de você conseguir crescer por si só. Seria te
preparar, te dar os instrumentos, que com esses instrumentos, você consiga
caminhar por si só (P9H-FM).
Então inclusão é você ter oportunidade e conseguir se incluir num contexto
que está totalmente fora da sua realidade. A realidade dos meus pais é roça,
146

interior. Inclusão... Para mim, na verdade, é você abrir oportunidades para a


pessoa (P4M-IN).

Um modo mais restrito de pensar inclusão como inserir foi apontado por P2M-IM,
que considera que “[...] inclusão seria pegar alguém que está fora dessa capacidade de poder
estudar, não no sentido intelectual, mas de pertencer àquilo ali, e inserir essa pessoa dentro
desse meio”. Por essa compreensão, entende-se que a simples concessão da bolsa do ProUni
já seria suficiente para que a aluna se considere incluída. O argumento de NP1H-IN diz que
“Inclusão é inserir algo que não é. No caso inclui o que não era aceitável”. Essa fala sugere
que a inclusão vem do meio, que o diferente não é aceitável e que não há da parte de NP1H-
IN uma disposição para acolher e aceitar o diverso; isso, de acordo com Ferdman et al.
(2009), impede uma experiência psicológica de inclusão, uma vez que o comportamento
inclusivo antecede essa experiência.
A obtenção de tratamento igualitário e a possibilidade de ser autêntico são
considerados por Ferdman et al. (2009) dois componentes-chaves da experiência de inclusão,
e para alguns entrevistados é considerado como sinônimo de inclusão, conforme indica P7H-
FN “[...] é tratar como igual o diferente”. Compreendida também como “[...] aceitação das
pessoas, reconhecer [...] o porque você é diferente e não ter preconceito e não ter reservas
quanto a sua situação” (P5M-IN) e como “[...] uma diversidade de pessoas de grupos diferentes
[...] que conseguem conviver e viver [...] sem distinção e sem discriminação” (P6M-IM), e
como “[...] redução de barreiras entre pessoas” (P10H-FN).

4.3.9.1 Comportamentos inclusivos e experiências de inclusão

Questionados acerca do que consideram estratégias institucionais existentes dentro da


IES a fim de promover a inclusão, os entrevistados citam que a instituição estimula os alunos
a praticarem a solidariedade, convidando-os a se engajarem como voluntários em projetos
sociais patrocinados pela instituição (NP6-FN, NP6-FN, P9H-FM, P12M-FM) e oferta outras
bolsas de estudo além daquelas destinadas ao ProUni (P12M-FM e PROF 04). A formação de
grupos de estudo, prática comum dentro da universidade e extensiva a qualquer aluno do
curso de Direito, embora não tenha como objetivo primeiro promover inclusão, é indicada por
NP4M-FN como estratégia importante, visto que “[...] tenta buscar estimular essa inclusão...
[...] um convívio social melhor. Que não ficava restrito ao ambiente de sala”. Observa-se que
das menções feitas anteriormente, nenhuma delas destina-se especificamente à inclusão dos
alunos prounistas, embora fosse esse o questionamento inicial. Dessas estratégias, a única que
147

realmente pode contribuir para a inclusão desses alunos é o grupo de estudos, mas que atende
mais o objetivo de fomentar interesse científico do que a promover inclusão.
O aluno P7H-FN considera a instituição inclusiva por ter sido condescendente com
ele, e lhe dado atenção a ele quando pegou “[...] quatro DPs, quando poderia ter pego duas só.
Mas aí eles me chamaram pra conversar, pra ver o que estava acontecendo. Eu expliquei, eles
me ajudaram. Dessa instituição eu não posso reclamar nada”. Para esse aluno, o apoio
institucional é percebido como um comportamento inclusivo.
PROF 01 relata que na Faculdade de Direito, ela e alguns outros professores
combinaram entre eles: “Trabalho em grupo... não no primeiro mês. A gente só vai dividir
grupo, a gente só vai estimular isso quando a sala estiver composta, não entra mais ninguém”.
Essa professora também considera que o Moodle (plataforma de ensino à distância utilizada
na IES) “[...] é fantástico para inclusão, porque o professor manda mensagem para todos os
alunos indistintamente”. Nas duas situações, tanto a articulação entre professores como a
utilização do Moodle, embora não sejam estratégias para incluir, prestam-se a minimizar as
exclusões que ocorrem no momento de formação de grupos e na comunicação de grupos,
evitando a omissão de alunos prounistas das listas de e-mail, conforme apontado na categoria
anterior.
Na IES pesquisada não há nenhuma estratégia de inclusão institucionalizada, e até
mesmo entre os professores entrevistados as percepções são distintas, pois enquanto PROF
02 e PROF 03 afirmam nunca terem visto esse tipo de estratégias, PROF 04 considera que há
“[...] uma tradição (histórica) de inclusão, no bom sentido, em relação à IES. Então acho que a
instituição tem suas estratégias”, porém, não indica quais são elas. As ações aqui apontadas
mostram-se tênues diante dos relatos de exclusão anteriormente apontados, cabendo aqui
ratificar a conclusão a que Krames (2010) chegou em sua pesquisa, apontando que o
compromisso social das IES que aderem ao Programa precisa ser traduzido em ações
concretas de acolhimento, orientação e acompanhamento aos alunos bolsistas, o que não pôde
ser constatado na IES pesquisada. PROF 02 indica que a instituição deveria fazer um trabalho
em torno do Programa, a fim de “[...] mudar a mentalidade da maioria que é contrária, porque
as pessoas são contrárias, mas não conhecem”, o que informaria e favoreceria a inclusão. Isso,
de acordo PROF 03, ocorre pois o pouco “[...] sentimento de acolhimento que está
acontecendo é mais por formação dos próprios alunos do que por uma atitude interna da
escola”.
Buscando identificar estratégias de inclusão utilizadas pelos outros alunos, as
respostas obtidas giram em torno da opinião de NP5M-FM, que afirma nunca ter visto “[...]
148

alguém querendo incluir assim, ou algum projeto assim, vamos incluir tal pessoa”, e de P9H-
FM e PROF 04 e PROF 03, que dizem não conhecerem qualquer ação desse tipo. Verifica-se
que esse tipo de estratégia é incomum, pois dos 22 entrevistados, apenas PROF 01 relatou
caso único em que uma ação inclusiva foi voluntariamente tomada por um grupo de alunas,
conforme transcrição do relato:
Duas meninas eu me lembro que tiveram problema de acompanhamento e aí
um grupo de meninas [...] elas se reuniram, e um dia na minha aula elas
falaram: “Professora, você se incomoda se a gente fizer atividade em
conjunto, cada uma vai fazer com uma”. Elas se dividiram entre si e foram
ajudar as outras e elas fizeram assim. Essa tarde a fulana vai te explicar tudo
o que aconteceu dessa disciplina. Elas se organizaram e depois de um tempo
elas já vieram... Essa foi uma coisa que me marcou também, porque foi bem
espontâneo, será que se a gente ser revezar, porque uma não dá pra fazer
tudo, mas se cada uma fizer uma parte... Foi bem legal isso.

Quando as ações institucionais falham, o aluno prounista adota suas próprias


estratégias a fim de lidar com os estímulos do ambiente, quer de acolhimento ou de rejeição.
Uma forma, considerada por alguns entrevistados eficiente, de buscar conquistar o próprio
espaço dentro da instituição é quando o aluno prounista consegue se impor frente aos outros
alunos, a fim de garantir respeito, sua própria identidade e direito de estar ali, conforme
evidenciado nas falas:
A gente estava numa aula de Sociologia e o professor estava falando sobre
essa ajuda do governo, até que um aluno, bem “reaça” [reacionário] da sala
fez um comentário bem ruim [...] “que você não tem que dar o peixe, tem
que ensinar a pescar” e ela [a aluna prounista) foi pra cima mesmo... (entrou
na discussão e argumentou]: “Tem que dar oportunidade mesmo, nem todo
mundo pode pagar a faculdade. Você não sabe o quanto é difícil pagar uma
faculdade. Você tem pais que pagam para você. Você consegue isso. Seus
pais ganham o suficiente” [...] Aí ele se posicionou mesmo. Foi bem legal.
Daí ele ficou quieto (NP2M-FM).
Eu já ouvi algumas coisas [...] Mas assim, eu já cortei ela [amiga não
prounista que fez comentário preconceituoso sobre o lugar que ela mora] e
coloquei ela no lugar dela, então parou... Mas, acho que eu sei me impor
(P12M-FM).
Essa minha aluna se revelou prounista porque pra ela virou uma bandeira,
pra ela é um... pra ela, ela coloca, são as armas que ela põe na mesa, fala
assim, ó “eu sou mulher negra, Ieszista, prounista e se você tem algum
problema com isso, por favor, fale agora ou cale-se para sempre” (PROF
04).

Ferdman (2014) volta especial atenção para a experiência psicológica de inclusão e


para a responsabilidade do indivíduo em conseguir incluir-se. O autor assinala que a
autoinclusão pode reduzir os resultados negativos e aumentar os resultados positivos para o
indivíduo, trazendo benefícios tanto para ele quanto para a instituição. Ao falar da
autoinclusão, o autor ressalta que não está com isso negando ou mesmo minimizando a
149

importância de combater a opressão, a discriminação ou qualquer outro impedimento


estrutural para a inclusão.
Considera-se comportamento de autoinclusão dos alunos prounistas as iniciativas de
envolvimento em atividades fora de classe, quer sejam as atividades sociais, grupos de
estudos, monitorias, Atlética, Centro Acadêmico, iniciação científica, busca proativa de
expandir as redes de contatos. A análise dos dados permite uma clara relação entre as
características pessoais do aluno com sua iniciativa de autoinclusão, verificando-se que todos
os alunos que se autodefinem como mais expansivos envolvem-se em outras atividades fora
de classe e de igual modo, os alunos que se consideram retraídos restringem suas atividades
acadêmica à sala de aula, com exceção de um aluno (P8H-FM), que diz ter participado de
grupo de estudos somente para contar horas complementares, o que indica também a não
participação em outros tipos de eventos. Percebe-se que alguns alunos se envolvem
paralelamente em atividades diversas, como é o caso de P1H-IM e P5M-IN, enquanto outros
não participam de nenhuma atividade, conforme mostra o Quadro 6.
Quadro 6 - Estratégias de autoinclusão dos alunos prounistas
EXPANS IVO / AUTOINCLUS ÃO
ALUNO TIPO DE ATIVIDADE
RES ERVADO S im / Não
Centro Acadêmico, Leituras livros, aproximação
P1H - IM Expansivo Sim
outros alunos, bateria

Não participa em nenhum tipo de atividade -


P2M -IM Reservado Não
Vai embora após aula - Dificuldade se ambientar

P3H - IN Reservado Não Não participa em nenhum tipo de atividade

P4M-IN Expansivo Sim Grupo Estudo, Iniciação, Fala com todos,

Monitoria, Representante sala, Grupo Estudo,


P5M-IN Expansivo Sim
Teatro, Plantão de dúvidas, Temperamento ajuda

P6M-IM Reservado Não Não participa em nenhum tipo de atividade

P7H-FN Expansivo Sim Sai com turma, Grupo de Estudos

Não participa em nenhum tipo de atividade -


P8H-FM Reservado Não Vai embora após aula - Tentou Atlética e Grupo
Estudo só pelas horas complementares
Sai às vezes com turma, não se envolve muito mas
P9H-FM Expansivo Sim
fala com todos. Entrou na Atlética mas não gostou

Não participa em nenhum tipo de atividade.


P10H-FN Reservado Não
Agrupa-se com outros prounistas - Sentam juntos

P11M-FM Expansivo Sim Grupo Estudo, Iniciação Científica

Entrou Grupo Estudo, mas saiu por morar longe. Sai


P12M-FM Expansivo Sim
às vezes com a turma, amigas não são prounistas

Fonte: Elaborado pela autora.


150

A influência das características pessoais para a experiência de inclusão é


exemplificada na situação de participação dos alunos de Direito nos Jogos Jurídicos. P6M-
IM, que é uma pessoa retraída e não se envolve em outras atividades, justifica não participar
dos jogos porque
[...] quem vai nos jogos jurídicos é esses grupos já formados. Então, assim,
eu prounista, esse colega que eu falei pra você que é prounista, a gente não
tem um grupo e mesmo que a gente tivesse condição financeira pra ir, a
gente ficaria meio que de canto. Eu acho que a questão dos jogos jurídicos é
esse compartilhar, e aí, você ir lá para ficar de canto não é muito legal.

No entanto, NP6-FN relata que

[...] eles [os alunos prounistas] sempre estão com a gente. Jogos jurídicos
todo mundo junto. Tanto é que foi uma aluna, que inclusive é prounista, foi
ela que separou a casa de uma amiga dela, e foi a sala inteira pra casa que
era de uma amiga dela na cidade. Então, assim não tem nada de mais.

Ferdman et al. (2009) consideram a experiência de inclusão como a percepção dos


indivíduos de quão seguros, confiados, aceitos, respeitados, suportados, valorizados,
engajados e autênticos se sentem em seus ambientes, tanto como indivíduos quanto como
membros de um grupo particular de identidade. Expressões utilizadas por alunos prounistas
evidenciam que alguns deles vivenciam uma experiência de inclusão dentro do ambiente
acadêmico da IES. PROF 02 afirma que P4M-IN “[...] ela é muito inserida com as meninas
de classe alta da sala, é amiga de todo mundo, superquerida na sala”; a aluna diz que ser
incluída faz parte da sua característica, que se sente à vontade para discordar e se posicionar:

Eu discordei dele [colega de sala com pensamento divergente do seu] na


frente de toda a classe, e aí travamos o maior debate. E eu discordo mesmo.
Discordei dele e disse: tá. Se fundamente que eu vou me fundamentar
também.

P9H-FM também se considera livre para se expressar, porém seus colegas não
sabem que ele é aluno prounista, portanto não é possível determinar se sua experiência de
inclusão seria a mesma se sua identidade de prounista fosse conhecida. Ele afirma que:

Eu não tenho problema em divergir, desde que seja fundamentado. Sempre


quando a questão era polêmica eu me sentia a vontade para perguntar.

P05M-IN demonstra engajamento e pertencimento quando diz participar de tudo


igual ou mais do que os alunos não prounistas e considera ser uma IESZista, o que indica que
se sente incluída, uma vez que:
151

[...] eu tenho amigos que não são bolsistas e não têm a metade da integração
que eu tenho aqui dentro. Para mim, ser um prounista não muda em nada, ser
prounista é ser IESzista.

P7H-FN considera que foi bem recebido, encontrou uma sala receptiva, se expressa
livremente e conta que:

O primeiro semestre foi terrível. Cheguei a perder a bolsa inclusive. Eu só


fui me recuperar mesmo no terceiro, eu pegava todas as DPS, aí o pessoal da
minha sala passou a estudar juntos... grupos de estudo, aí ficou melhor. E
melhorou o desempenho realmente.

P11M-FM considera que teve uma experiência positiva durante sua formação, uma
vez que gosta muito da IES e considerou-se valorizada quando os amigos saíram com ela para
comemorar seu aniversário, destacando esse momento com o ponto máximo de experiência de
inclusão, contando que:

É porque eu gosto muito [de estudar aqui], então todos os dias meus são
muito felizes. Tenho que pensar numa [experiência de inclusão] extra. Teve
um dia que eu fiz aniversário, a gente saiu e foi todo mundo comemorar,
esse foi um dia especialmente feliz.

P12M-FM relata como sua experiência mais positiva dentro da IES foi a de poder
compartilhar seu conhecimento com outros colegas, ensinando-os a matéria antes das provas,
uma forma de se sentir aceita, respeitada e valorizada pelo por eles, afirmando que:

Às vezes eu gostava de estudar e antes da prova ensinar os meus amigos que


não estudaram muito, sabe, eu gosto disso.

Alcançar o objetivo de incluir socialmente, de incluir também no sentido de


proporcionar ao aluno um senso psicológico de pertencimento, a partir do qual possa dizer de
si mesmo que é IESzista, porque não existe diferenças de tratamento dentro da IES seria o
ideal. A percepção de que alguns desses alunos conseguem trazer parte de si mesmos para
esse ambiente no qual diferem do perfil social predominante apresenta-se como uma
perspectiva positiva, embora aparentemente parte do mérito esteja no próprio aluno e não no
ambiente. Para Davidson e Ferdman (2001), valorizar a diversidade e as diferenças requer que
políticas, estruturas e normas de comportamento sejam alinhadas de tal forma que os
membros da comunidade se sintam respeitados e incluídos, porém assinalam que a verdadeira
inclusão extrapola essa compreensão. Defendem que um pensamento de diversidade requer
que a organização enfatize ao mainstream que o objetivo não é que eles deixem de ocupar tal
posição, mas que esse espaço possa ser ampliado de forma a beneficiar a todos e que se
busque construir um espaço em que todos se encaixem. O ProUni pode ser pensado por essa
152

ótica, uma vez que não são suprimidas vagas dos outros alunos, porém parte do mainstream
aparentemente considera que estão em uma disputa pela vaga e pelo espaço social. Na
ausência de políticas e ações alinhadas com o objetivo de valorizar a diversidade, para o
alcance de tal objetivo dentro da IES estudada há um longo caminho a ser percorrido. Será
necessário maior comprometimento institucional, dos outros alunos e engajamento dos
professores, a fim de que nesse ambiente as pessoas tenham comportamentos inclusivos em
decorrência dos quais a experiência de inclusão seja possível.

4.3.10 Categoria: Professor – Um Agente

Buscando verificar quais são as percepções dos professores acerca dessa dinâmica de
inclusão/exclusão dos alunos prounistas no ambiente acadêmico, e bem como analisar o papel
dos professores junto aos alunos prounistas, nessa categoria o papel do professor como agente
de inclusão ou de exclusão é apresentado.
Ferdman et al. (2009) apontam que sentir-se valorizado como membro do grupo e
também como ser humano, ser reconhecido e apreciado, propicia ao indivíduo a experiência
de inclusão. PROF 03 percebe essa carência em alguns de seus alunos prounistas e se mostra
disponível a acolhê-los, conforme relata:

[...] o que eu percebo é uma questão de afetos mesmo, que eu sinto que às
vezes eu preciso sentar... eles querem falar comigo. Você vê que no fundo a
carência de atenção e de afeto é tão grande que quando ele percebe que o
professor tem essa abertura, ele quer conversar com você. No fundo ele quer
saber até que ponto você olha para ele e o vê como ser humano (PROF 03).

O desdobramento de comportamentos inclusivos é proporcionar ao aluno uma


experiência de inclusão. Dois alunos prounistas entrevistados (P4M-IN e P3H-IN) citam que
alguns professores, incluindo PROF 02, PROF 03 e PROF 04 são pessoas que lhes servem
de referência, que os instigam, lhes são acessíveis e consideram que o comportamento destes
em relação a eles proporciona uma experiência positiva dentro da IES.

É um cara que te instiga a pensar. Eu tive contato com esses dois professores
que são acima da média para mim [PROF 02 e PROF 03] (P3H-IN).
Gosto muito dos professores, eu tenho uma relação muito de amizade com os
professores, confesso. Nunca teve nenhum distrato pessoal. Com os
professores formo um vínculo de amizade, mesmo. Tanto é que, tem
professores que eu gosto tanto, que de quinta-feira eu assisto duas vezes a
mesma aula [de PROF 04] (P4M-IN).
153

Ao ser questionada sobre sua experiência mais positiva até o momento dentro da IES,
P4M-IN aponta que a interação com os professores PROF 02 e PROF 04, a sensibilidade
destes às questões sociais, a abertura para trocas com eles são comportamentos que trazem
como consequência o bem-estar, que favorecem a uma experiência de inclusão, conforme
relato:

Ele [PROF 04] desperta a luz de você tentar ter aquela experiência de uma
sociedade mais igualitária, mais justa, e de olhar diferente para as minorias, e
não olhar como empecilho, mas como pessoas que devem ter alguns direitos,
para tentar competir com as pessoas que estão acima. Então, ele é uma luz,
uma luz completamente. E esse semestre também, PROF 02, ela também é
outra luz, outra luz. Tive experiências sensacionais com eles. Troca de
conhecimentos (P4M-IN).

PROF 03 afirma que nunca precisou intervir junto a algum aluno, mas seu discurso
revela que o faz uma intervenção educativa e preventiva, uma vez que “[...] trabalha questões
sociais em sala”, o que é fundamental para a desconstrução de prejulgamentos e crenças
estereotipadas acerca do Programa e dos alunos beneficiados. Portanto, a saída possível, e
para a qual o professor pode ser importante agente, é trabalhar essas questões em sala de aula,
prover o aluno de informações fundamentadas, a partir das quais possam se posicionar. PROF
02 tem convicção de que alunos que são contra políticas públicas e contra o ProUni o fazem
por desinformação, e afirma ter “[...] certeza que se... cota, ProUni, tudo isso, se tivesse um
professor que viesse aqui na frente e falasse: é isso, isso, isso... estudem, analisem a
Constituição, vejam os argumentos a favor e os contra” esses posicionamentos seriam
revistos. Portanto, fornecer informações e discutir essas questões mostra-se o caminho mais
eficaz para fazer com “[...] que as pessoas entendam do que se trata, e tem que ser em sala de
aula. O professor passar trabalhos sobre o tema, porque aí o cara vai mergulhar”. Contudo,
para que esse tipo de conduta seja adotada, é necessário que haja uma crença institucional e
pessoal de cada professor, de que o caminho da inclusão e do respeito ao ser humano em suas
singularidades e diferenças é também o caminho para uma sociedade mais justa e melhor, e
que isso necessariamente passa pela educação e informação.
A percepção de imparcialidade de tratamento dos professores para com os alunos é
indicativo de que estes não se sentiram discriminados por eles, que relatam não perceber
qualquer favoritismo ou preconceito. P1H-IM assinala que “[...] os professores tratam bem
quem se interessa. Não importa sua classe social, não importa sua cor...”, mas em seguida
aponta a existência de uma exceção, que é elitista. Sua opinião é corroborada por outros
154

alunos que apontam o comportamento inadequado de professores agentes de discriminação


em função da condição social ou base cultural.

[...] um professor só, que era extremamente elitista. Ele fazia a chamada e
perguntava pelo sobrenome das pessoas, se conhecia tal pessoa... se tal
pessoa era amigo, e... a gente viu que, no final do semestre essas pessoas
ganhavam pontinhos (P1H-IM).
Alguns professores que me perseguiam, mas mais relacionado a condição
social, o de XXX [dá o nome da matéria] por exemplo, o de YYY [dá o
nome da matéria], que era terrível, acho que só. Esses dois são terríveis. É.
Acho que são só esses dois mesmos (P7H-FN).
Fazer chacota com a ignorância do outro... eu estou buscando conhecimento.
Você é o professor, você está aqui para isso e fazer chacota é o nível mais
baixo que um professor pode chegar, e eu já encontrei isso (P11M-FM).

Ressaltando seu papel de agente de inclusão, PROF 03 diz que está “[...] sempre
acolhendo, mas não é todo o corpo docente, não”. Eventualmente o próprio professor não está
aberto para as questões sociais, não acolhe o aluno prounista e ainda utiliza o espaço de sala
de aula para disseminar suas opiniões preconceituosas e discriminatórias. Em uma sala na
qual 10% dos alunos são bolsistas do ProUni, um professor falar abertamente ser contrário ao
Programa faz no mínimo com que esse aluno, indiretamente, o perceba como desfavorável a
ele. O professor PROF 01 argumenta que “[...] o professor, ele é modelo”, mas que os
comentários tecidos por eles em sala de aula instigam alunos ao preconceito. Mais do que
expressar opinião acerca do Programa, as crenças pessoais são as bases para as ações, e, em
decorrência disso, ao invés do professor atuar como agente de inclusão torna-se agente de
preconceito e exclusão.

Eu tive já nesses 10 semestres, comportamentos inadequados de alguns


professores, em relação a alguns alunos. Às vezes ele era prounista, às vezes
eles não eram. Os professores deveriam exercer, e isso é papel do professor,
criar mecanismos de interação. Não pode deixar (NP4M-FN).
Eu acho que eles estão sendo muito estimulados esse jogo [disputa entre
grupos maioritários e minoritários] e eu fico sempre preocupada com isso. E
é problemático porque os professores fazem muito (PROF 02).

Ao invés de emitir comportamentos que criam, mantêm ou reforçam vantagem para


alguns grupos e seus membros em relação a outros grupos e seus membros (DOVIDIO et al. ,
2010), os professores deveriam agir no sentido de desconstruir crenças e quebrar interações
sociais disfuncionais, intervir a fim de combater manifestações de preconceito e
discriminação que promovem a exclusão. Caso na IES houvesse uma política de gestão da
155

diversidade, necessariamente esses comportamentos inclusivos seriam adotados com base em


normas institucionais, em condutas preconizadas que expressassem valores e princípios
institucionais (DAVIDSON; FERDMAN, 2001); não o sendo, baseiam-se nos valores
pessoais desses professores. Portanto, não havendo apoio institucional e não sendo alguns
deles sensíveis a essas questões, não só não se mobilizam a intervir, como erram eles mesmos
em suas condutas, conforme sugerido por NP4M-FN.

Acredito que um professor com um pouco mais de percepção, ele perceberia


e poderia quebrar algumas coisas que se sedimentaram na nossa sala
[fragmentação da sala em feudos bem demarcados]. Aqueles professores que
pegam muito pesado com alguns alunos, um pouquinho mais é... sabe...
[humildes]. Embora sei e conheça professores que são um pouco exagerados,
de alguma forma no trato, não posso dizer se eles sabiam que o aluno era do
ProUni (NP4M-FN).

Questionados acerca de intervenções pessoais e papéis que eventualmente


desempenham junto aos alunos prounistas, os professores entrevistados PROF 02, PROF 03
e PROF 04 afirmam nunca terem sido necessárias intervenções pessoais, pois nunca
presenciaram qualquer manifestação de preconceito ou discriminação. No entanto, ao
adotarem uma postura disponível e manifestarem frente à sala um posicionamento pessoal
sensível às questões sociais já se tornam agentes de inclusão, pois servem de referência
positiva para eles e utilizam o espaço acadêmico para ampliar o debate sobre as questões
sociais. PROF 01 afirma já ter feito intervenções pontuais para resolver problemas quando a
omissão de aluno prounista nas listas de e-mail da sala foi utilizada com estratégia de
exclusão, para privá-los do acesso a informação, resolvendo a questão ao cuidar pessoalmente
do envio das mensagens. A professora assumiu a conduta de “[...] mandar o e-mail pra elas
(alunas prounistas excluídas da lista) com cópia para o grupo”. Também afirma ter feito
intervenções de caráter educativo/informativo, discutindo o tema com seus alunos e indo à
lousa estabelecer conceitos, comprometendo representante de sala, em representar a sala, o
que inclui os alunos prounistas, e não seus amigos pessoais, conforme relatado:

[Aluno diz] “Professora você sabe que a gente é contra [o ENEM]... Eu olhei
e eu falei: Não, vocês são elitistas. Elitista é aquele que acha que só quem
teve as mesmas condições têm os mesmos direitos. Não tem problemas,
muita gente nesse país é, mas saiba que você é... [...] E aí ocorreu um
processo legal... Foi assim na primeira semana, na segunda semana eles já
estavam fazendo a campanha a favor (PROF 01).
Eu tenho muito o hábito de chamar o representante: Você se decidiu ter um
cargo representativo, então você vai fazer direito. É... mais isso sou eu. Eu
156

falo mesmo, e eu falo em voz alta e falo pra todo mundo ouvir. Não é
comum (PROF 01).

Intervenção simples de um professor, com resultados positivos e que produziu


mudança de comportamento do grupo, o exemplo relatado é indicativo de que discutir essas
questões e conscientizar todos os agentes envolvidos na vida acadêmica são caminhos
necessários, para que os benefícios da diversidade sejam vistos na IES pesquisada. De forma
otimista, PROF 01 afirma que está percebendo que “[...] alguns professores agora já estão
começando, não só a perceber [as manifestações de preconceitos e discriminações] como a
responsabilizar [seus agentes]”. Após oito anos da implantação do Programa na IES, alguns
professores “começam a perceber” as situações excludentes que ocorrem no ambiente
acadêmico. É necessário que esse olhar se amplie, bem como o nível de consciência e de
informação de todos os agentes, para que comportamentos inclusivos e percepção subjetiva de
inclusão possam ser regra e não exceção.
157

5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Este capítulo tem como objetivo articular os dados apresentados no capítulo anterior,
com a literatura. Como em cada uma das categorias já descritas, breves discussões com o
referencial teórico foram introduzidas, este capítulo busca avançar no processo interpretativo,
integrando teorias e dados, a fim de determinar a dinâmica de inclusão e/ou exclusão
depreendida dos dados, de forma a ampliar a compreensão do fenômeno à luz dos referenciais
teóricos da Psicologia Social, contribuindo para a área de estudo. Para efeito deste trabalho,
consideram-se pessoas “diversas” ou “minorias” os alunos pertencentes aos grupos sub-
representados, como cotistas, bolsistas, alunos prounistas, percebidos como de menor status
social.
Hanashiro et al. (2011, p. 3) afirmam que embora os membros de grupos de maioria
sejam historicamente aqueles que tiveram ou têm vantagens em poder e recursos econômicos,
quando comparados com grupos de minoria, estes não percebem seu privilégio. Ofertar uma
bolsa do ProUni para alunos aprovados pelo Enem, aos quais tantas outras oportunidades já
foram negadas devido às restrições socioeconômicas, é considerado por alguns alunos não
prounistas da IES pesquisada uma concessão de vantagem, o que denota essa falta de
percepção das desigualdades de condições.
Não obstante, para alguém com vantagem que possui essa percepção há também uma
imagem de que porque o aluno prounista não entrou pelo vestibular da IES é menos
capacitado; e sua origem social e/ou o fato de sua formação ter sido em escola pública
figuram como marcas ou estigmas vistos como negativos, de forma que, aos olhos de alguns
alunos não prounistas, o potencial desse aluno seja desqualificado (GOFFMAN, 1988).
Assim como as sociedades têm se tornado mais heterogêneas (MOR-BARAK, 2005),
o mesmo tem ocorrido com o perfil dos alunos da IES pesquisada. O perfil do grupo de alunos
não prounistas desta pesquisa evidencia que, embora aparentemente a maioria dos professores
e alunos entrevistados percebam o perfil do aluno da IES como predominantemente de classe
média e média alta, o perfil de parte dos alunos entrevistados evidencia existir uma parcela de
alunos de condições socioeconômicas menores, que trabalham e custeiam com esforço o
próprio curso. Além destes, bolsas filantropia já eram concedidas na IES pesquisada antes que
da adesão ao ProUni. Entretanto, na percepção de alguns alunos, a adesão ao ProUni trouxe
para a instituição um aluno diverso ao perfil predominante. As manifestações de preconceitos
158

e discriminação em relação a esses alunos aqui apontadas permitem inferir que a


heterogeneização ocorrida não é vista de forma positiva por uma parcela dos alunos.
Os dados analisados evidenciam que os grupos de prounistas e não prounistas
percebem haver mais dissimilaridades do que similaridades entre eles. Considerando que a
interação com pessoas com maiores similaridades percebidas resulta em emoções e atitudes
intergrupais positivas, a partir das quais ciclos de autorreforço causal são criados
(TRIANDS et al, 1994), a percepção de dissimilaridades entre esses dois grupos de alunos
reduz a probabilidade de interação e consequentemente de intimidade entre eles. A diferença
de classe social e experiências pessoais, principalmente, restringem a interação social,
devido às restrições financeiras e barreiras intergrupos.

A dinâmica das salas evidencia que categorizações, feitas com base em similaridades
percebidas, dão origem aos grupos, sendo a criação de grupos o primeiro passo para o
preconceito (ARONSON; WILSON; AKERT, 2002), uma vez que pessoas que não se
enquadram no protótipo do grupo não são aceitas. Categorias como o “grupo dos
Mauricinhos” ou aqueles que “têm um modo de vida de classe média alta”, “uma situação
financeira muito próxima” ou “prounistas [que] se juntam” são critérios de agrupamentos
referidos pelos entrevistados. Mor-Barak (2005, p. 132) assinala que a diversidade refere-se
ao processo de gerar categorias distintas, “está relacionada, também, com o pertencer a um
grupo diferente quando comparado ao mainstream na sociedade, que o torna suscetível a
sofrer consequências resultantes de uma associação com o pertencer ou não a certo grupo
social”. De acordo com a percepção dos entrevistados desta pesquisa, condições
socioeconômicas, background e cultura/qualificação pessoal são características determinantes
para a aceitação em alguns grupos. Estabelecer inglês fluente como prerrequisito para ser
aceito em um grupo de trabalho, ao invés de domínio do conteúdo; objeção explícita à
aceitação de alunos prounistas em alguns grupos são indicativos de que as essas categorias
determinam as fronteiras intergrupais e estabelecem as características distintivas de pertença
ao grupo, no qual aqueles que são diversos aos critérios estabelecidos não são aceitos.
Portanto, ser prounista é uma dimensão de diversidade, pois traz implicações para a relações
destes com os outros alunos IESzistas.

Devido à necessidade própria dos indivíduos de serem vistos de forma positiva em


relação a outros relevantes, comparações sociais são feitas, geralmente favorecendo aqueles
que pertencem ao ingroup (HOGG; TERRY, 2001). Decorrente de comparações, a condição
de prounista é percebida como uma identidade de valor mais negativo, por isso esses alunos
159

buscam alcançar uma identidade que seja mais distinta, ao tempo em que os alunos não
prounistas desejam e lutam para manter o status de condição comparativamente superior. A
omissão da identidade é uma estratégia adotada por alguns alunos, eventualmente por todo o
período da formação, para tentarem ser aceitos e incluídos. A busca por um desempenho
superior também é percebida como uma forma funcional de obter distintividade intergrupo,
porém, o que mais se mostra nos dados é que, as características pessoais desempenham
importante papel para que sejam aceitos e a autoinclusão aparentemente é a estratégia mais
efetiva.
Não foram identificadas estratégias do grupo de prounistas para o alcance de alguma
mudança social para o grupo como um todo, verificando-se somente estratégias individuais a
fim de alcançar uma mobilidade social. Com base no modelo dos cinco estágios da dinâmica
intergrupos propostos por Taylor e McKirnan (1984 apud TAYLOR; MOGHADDAM, 1994),
verificou-se um único caso de mudança intergupos, em que a aluna prounista se sente
identificada como IESZista, tendo contudo ocorrido uma mobilidade social individual, o que
faz com que ela considere haver mérito pessoal na conquista dessa mobilidade. Portanto, ao
ser aceita como membro do outro grupo, ela despersonaliza e deixa para trás a identidade de
prounista, para assumir o protótipo de IESZista. Praticamente metade dos alunos prounistas
entrevistados percebe que as relações intergrupais são estratificadas e não há possibilidades de
mudança, enquanto a outra metade acredita que há possibilidade de mobilidade individual,
mas não do grupo, o que provavelmente justifique a falta de qualquer articulação coletiva.
Matéria do jornal A Folha de São Paulo do dia 14/09/2014 noticiou a eleição de uma aluna
negra e prounista do curso de Direito da IES pesquisada para presidente do Centro Acadêmico
do curso, indicando uma situação que quebra um paradigma, pois concede um espaço que é
ocupado por meio de voto democrático a uma representante de um grupo de minoria. A aluna
representa as mulheres, os negros e os prounistas, podendo ser considerada o que Taylor e
Moghaddam (1994) chamam de um “token”, ou seja, uma pessoa de referência, a partir da
qual os alunos podem passar a perceber que são injustamente discriminados; que os faça
tomar consciência de que habilidades e esforços pessoais não são suficientes para vencer as
barreiras sociais e que as dimensões para comparação social, papéis e percepções assumidas
precisam ser renovadas.

Tanto os discursos dos alunos não prounistas como dos professores pesquisados
revelam que estes possuem uma hierarquia subjetiva de níveis ou graus de exclusão e de
discriminação. A menção a uma exclusão leve, exclusão pior e exclusão agressiva é referida
160

por professores, enquanto os alunos minimizam ou banalizam esses comportamentos,


utilizando termos como um “quezinho” de discriminação, uma “discriminaçãozinha” ou uma
“exclusãozinha”, que dão uma conotação de distanciamento das implicações psíquicas e
emocionais para aqueles que são vítimas de tais comportamentos.
No balanço geral, verifica-se que existem três atitudes básicas em relação aos alunos
prounistas: o mais raro, que é o acolhimento, ocorre eventualmente em relação a uma pessoa,
porém em relação ao grupo só foi relatado uma caso; o mais comum, uma indiferença, por
vezes desagradável; e, por fim, uma rejeição, que, embora não seja citada por todos, tem a
força de transmitir uma mensagem de que esses alunos não são bem-vindos nesse ambiente.
As análises sugerem que as estratégias de autoinclusão são capazes de quebrar as
indiferenças, mas não as rejeições. Portanto, as características pessoais mostram-se uma
dimensão importante para a inclusão em um meio que não é naturalmente receptivo.
Observa-se que o caráter de inclusão social do programa não é adequadamente
alcançado, pois, no âmbito de Programa, a política do ProUni é limitada, uma vez que provê
ao aluno somente condições de acesso, mas não de manutenção em uma IES com custos de
manutenção altos. Esta seria necessária dado o perfil da região onde está localizada a IES e o
padrão socioeconômico dos alunos prounistas, insuficientes para o pleno custeio do curso,
enquanto a inclusão psicológica dificilmente é atingida, uma vez que esta depende também do
comportamento dos outros indivíduos.
Infere-se que as práticas acadêmicas são voltadas para atender os interesses dos
alunos pagantes, por serem supostamente “aqueles que mantêm a instituição” e garantem a
sustentabilidade econômica dos cursos. Portanto, quando os valores e crenças pessoais de um
grupo de alunos não prounista é contrária a aceitação de grupos diversos dentro da IES, estes
se articulam e usam de estratégias de exclusão, como passeatas contra o Enem. Estando a
inclusão relacionada ao sentimento de pertença a um determinado grupo social, os
comportamentos de indiferença, e por vezes de rejeição, manifestos para com alguns alunos
pode ser impeditivo para que esses tenham uma experiência real de inclusão, uma vez que
essas são precedidas por comportamentos inclusivos. A inclusão também envolve a
possibilidade de que, na interação com outras pessoas, o indivíduo possa ser completamente
ele mesmo, permitindo aos outros serem completamente eles mesmos no contexto de
engajamento em atividades comuns (FERDMAN et al., 2009). Porém, os dados evidenciam
que a identidade de prounista é escamoteada por vários alunos, por considerarem que os
alunos não prounistas “não os tratariam tão bem assim” se a revelassem. Alguns se veem
161

impedidos de acesso a algumas pessoas e grupos, impossibilitados de um engajamento em


atividades comuns como grupos de trabalho, de convívio e de atividades sociais.
Se por um lado, da parte de alguns alunos não prounistas há uma clara posição de
rejeição em relação ao Programa e por vezes a seus beneficiários, por outro não foram
identificadas, na prática institucional, políticas ou ações que visem promover a inclusão, quer
seja fornecendo preparo ou orientação clara aos professores de condutas possíveis ou
minimamente discutidas as políticas de cotas e do ProUni com professores ou alunos. De
acordo com Ferdman et al. (2009), o ingrediente-chave para que se obtenha os benefícios da
diversidade é a inclusão. Ao omitir-se, a IES prossegue com o Programa de inserção de alunos
e cumprimento de cotas, não se atentando aos conflitos e manifestações intergrupais de
preconceitos, discriminação, que trazem consequências emocionais para os alunos bolsistas,
reduzindo o caráter inclusivo do programa à concessão de acesso, mas não de pertencimento.
Dentro da IES, o modelo utilizado para gestão do ProUni está no que Thomas e Ely
(1996) intitulam de Paradigma da Discriminação-justiça, cumpre-se a lei, inserem-se os
alunos, sem maior preocupação com suas diferenças e dificuldades. A fim de reconhecer e
valorizar as diferenças, as práticas da IES deveriam estar voltadas para o paradigma
aprendizagem-efetividade, atentando para a integração desse grupo diverso, provendo
condições para que estes pudessem se sentir respeitados nas diferenças e integrados à
academia, à sala e ao grupo. Nesse paradigma, as diversas perspectivas trazidas pelos alunos
deveriam ser reconhecidas e valorizadas, possibilitando criar uma universidade para todos
efetivamente, na qual as experiências de vida e as diferenças na forma de pensar, aprender e
crescer uns com os outros fossem incorporadas.
Comportamentos inclusivos podem ser ações individuais, ações dos grupos e também
institucionais, que se supõe, precedem a experiência de inclusão. Portanto, requer-se um
compromisso institucional com uma atenção à diversidade; que as tensões e conflitos que
ocorrem em seu ambiente ou seus agentes não sejam ignorados, e que os professores sejam
preparados para resolução destes e inibidos de reproduzi-los. Os dados evidenciaram como
estratégias possíveis, como encorajar discussões e debates, ampliando o conhecimento tanto
de alunos como de professores acerca do que é essa política, do que o Programa preconiza,
buscar evitar que situações de discriminações e exclusão sejam estimuladas ou reproduzidas.

Resultados dessa pesquisa diferem dos constatados por Santos (2011), pois a
percepção de todo o grupo de bolsistas por ela estudado indica a existência de sentimentos de
aceitação, integração e a ausência de qualquer situação de diferenciação com professores,
162

colegas e funcionários; alinhando-se com Nogueira (2013), que indica que a experiência
acadêmica promove sentimentos de afeto e emoções contraditórias, tais como preconceito,
exclusão, alegria e vitória. Das dissertações e teses revisadas para este trabalho, apenas Santos
(2011a) teve alunos do curso de Direito como sujeitos de pesquisa, porém seu estudo fez uma
abordagem sociológica, investigando o lugar assumido pelo ProUni em suas trajetórias de
vida. Dessa forma, este trabalho apresenta uma amostra na qual três diferentes agentes de
inclusão e exclusão foram investigados, o faz sob uma perspectiva teórica diferente das
abordagens utilizadas pelos outros pesquisadores e contribui socialmente, dado ser o ProUni
uma política recente, que ainda tem limitações em sua abrangência. Este tem se mostrado
importante meio de acesso ao ensino superior e tanto no âmbito do sistema educacional como
um todo quanto dentro da IES pesquisada, pode ser repensado e aprimorado, para que os
benefícios desta possam ser ampliados e esses alunos incluídos e não inseridos nas IESs.

Há evidências de que os semestres iniciais são considerados mais críticos para os


alunos prounistas e as resistências entre grupos são mais acentuadamente percebidas. No
entanto, alguns desses alunos insistem em manter contato com todos, aumentando a
possibilidade de vencerem as “barreiras”. Aqueles que conseguem formar vínculos de
amizade, ao se sentirem aceitos no grupo, relatam até mesmo melhoria no desempenho,
mudando os sentimentos iniciais, o que lhes possibilita uma experiência de inclusão.

Conforme assinalado por Hanashiro et al. (2011, p. 14), “[...] a inclusão depende do
próprio indivíduo, de sua vontade e habilidade de desenvolver comportamentos que
contribuem para fomentar sua inclusão”, porém eventuais barreiras a aceitação podem
ocorrer. No momento inicial, em que os alunos estão se conhecendo e se dando a conhecer, o
comportamento de autoinclusão é de fundamental importância. Conforme já apresentado
anteriormente, existem receios dos alunos prounistas em relação ao novo ambiente e ao
tratamento que receberão. Se esses alunos mantiveram uma posição passiva e insegura frente
ao meio, as respostas de parte dos alunos não prounistas será de indiferença. No entanto, os
dados aqui apresentados nos sugerem que há alunos cujos valores e crenças pessoais os fazem
acreditar na distinção, superioridade de uns em relação a outros, e eles manifestam isso nas
relações interpessoais. Em havendo qualquer marca distintiva, seja o tempo da chegada, a
identificação voluntária ou involuntária como prounista, a postura “mais humilde”, tornará
esses alunos suscetíveis a serem vítimas de preconceitos e discriminações.
163

Embora haja evidências de que para os alunos que chegam na primeira lista exista
menor desconforto inicial, infere-se aqui que a autopercepção do aluno como de uma pessoa
desacreditável, conforme referida por Goffman (1988), pode impedir a experiência de
inclusão, pois inibirá a vontade e o desejo de se colocar frente ao meio. Verifica-se que P2M-
IM e P6M-IM, que estão nos semestres iniciais, chegaram na primeira lista e entraram desde o
primeiro dia de aula são retraídas e mantêm essa postura de retraimento desde o início do
curso: não se envolveram em atividades extraclasse para expandir rede de contatos e não estão
estagiando. Uma vez que “[...] a inclusão não reflete um comportamento natural dos
indivíduos” (HANASHIRO et al. , 2011, p. 2), presume-se que se essas alunas não assumirem
um comportamento autoinclusivo, ao término do curso o desfecho será como o de P10H-FN,
que durante toda a formação esteve restrito a um pequeno grupo de convívio com outros
alunos prounistas, sem vivenciar uma experiência de inclusão, não conseguindo quebrar as
barreiras e resistências naturais e inerentes às relações interpessoais e intergrupais. No
entanto, P1H-IM e P4M-IN, ainda no segundo semestre do curso, já ampliaram seus espaços
de convivência, se engajaram em atividades extraclasse, indicam bom desempenho acadêmico
como fator importante e mostram-se autoinclusivos, agentes da própria experiência de
inclusão. P5M-IN expressa sua percepção de ser inclusa quando diz que se sente uma
IESzista, sem fazer distinção entre a condição de prounista e dos outros alunos da IES.

P9H-FM e P10H-FN assumiram uma postura de omitir a identidade social de


prounista, mas, aparentemente, por razões e com consequências diferentes. P9H-FM diz que
não se identificava porque isso é indiferente, portanto, nas relações interpessoais se
posicionou e se relacionou e de forma coerente com sua crença, interagindo com bom trânsito
em sua sala e sentindo-se livre para expressar-se. P10H-FN, no entanto, omitindo sua
identidade prounista, não se sente IESzista nem prounista, e até refere os prounistas como aos
IESZistas como “eles”, indicando que não foi incluído ou identificado em qualquer dos
grupos.

Dessa forma, conclui-se que na dinâmica entre alunos prounistas e não prounistas a
formação de grupos com base nas similaridades percebidas, e em não pertencendo ao grupo
majoritário, os alunos prounistas são percebidos como “exogrupo” e, portanto, mais
homogêneos, dando origem aos estereótipos. Discriminações são manifestas principalmente
no momento de formação de grupos de trabalhos e os preconceitos estão mais relacionados às
condições socioeconômicas. Não havendo identificação ou similaridades percebidas não se
estabelece relações mais próximas, o que impede maior intimidade entre os grupos e
164

desconstrução de crenças estereotipadas. Verifica-se inexistência de estratégias grupais de


inclusão, sendo a autoinclusão a estratégia mais comumente observada, na qual engajamento
em atividades extraclasse, desempenho superior e iniciativas pessoais de construção de redes
de contato são as estratégias mais utilizadas e aparentemente mais funcionais. Uma vez que a
necessidade de pertencimento é fundamental para o ser humano e constitui-se uma poderosa
base motivacional para o comportamento interpessoal, quando o indivíduo vivencia uma
experiência de exclusão ou rejeição e ela é frustrada, este passa a reagir com ódio,
ressentimento e retaliação (MOR-BARAK, 2005; TWENGE; BAUMEISTER, 2005 apud
HANASHIRO et al. , 2011). Ao perceber tanto por parte da IES como do grupo a inexistência
de comportamentos inclusivos o aluno prounista fica impedido de vivenciar uma experiência
subjetiva de inclusão, sendo por isso afetado em sua autoestima, o que pode comprometer seu
desempenho. Constata-se que tanto para que haja uma experiência subjetiva de inclusão que
possibilite a esses alunos um senso psicológico de pertencimento ao ambiente acadêmico da
IES pesquisada quanto para que ocorra uma inclusão social que permita ao prounista desfrutar
de uma universidade que é para todos, na qual a inclusão é regra e não exceção, há um longo
caminho a ser percorrido.
165

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho se propôs a compreender o fenômeno da inclusão e/ou exclusão do


bolsista ProUni no espaço acadêmico, de acordo com a percepção de professores, alunos
prounistas e não prounistas, buscando responder ao seguinte questionamento: Como ocorre a
dinâmica de inclusão/exclusão do bolsista ProUni em uma universidade privada da cidade de
São Paulo?
Constitui-se objetivo geral deste trabalho compreender a dinâmica de inclusão e/ou
exclusão do bolsista ProUni no espaço acadêmico. Para alcançar essa compreensão, foram
determinados os objetivos específicos: (a) entender as condições socioeconômicas do aluno
prounista; (b) investigar a existência de estereótipos, preconceitos e discriminação na
inclusão/exclusão dos alunos prounistas; (c) verificar as dimensões de diversidade nas quais
os alunos prounistas se reconhecem e são reconhecidos; (d) identificar as estratégias utilizadas
por esses alunos para serem inseridos em grupos; (e) verificar as percepções do professor
acerca dessa dinâmica de inclusão/exclusão e (f) analisar o papel dos professores junto aos
alunos prounistas.
Na busca de entender as condições socioeconômicas dos alunos prounistas, verifica-
se que, embora estes considerem a abrangência do Programa limitada, o benefício da bolsa
tem caráter determinante para a vida dos alunos prounistas, considerado como um “salva-
vidas”, pois dada as condições socioeconômicas familiares constitui-se uma possibilidade de
mobilidade social. Esses alunos tornaram-se agentes da própria história, e embora as
restrições financeiras familiares seja obstáculo no caminho, lutam para superá-las e, chegado
os semestres finais, a aprovação no Exame da Ordem dos Advogados lhes confere um
sentimento de vitória.
Ao investigar a existência de estereótipos, preconceitos e discriminação na
inclusão/exclusão dos alunos prounistas, percebe-se que a existência de “feudos” é
relativamente comum e, na formação de grupos de trabalhos, as estratégias de exclusão dos
alunos prounistas são evidenciadas. Alunos mais expansivos tendem a gozar de grupos de
convivência maiores, enquanto os alunos mais retraídos ficam restritos em pequenos grupos.
Os estereótipos do prounista como um aluno que não estuda e de escola pública como
“baderna” estão presentes no ideário de alguns alunos não prounistas e até mesmo de alguns
professores. As razões de seus preconceitos estão pautados no argumento de que o Enem é
uma prova fácil, que o Programa tem caráter assistencialista e que pagam para o outro estudar,
trazendo como consequência discriminações na forma de evitação e até manifestos públicos.
166

Verificadas as dimensões de diversidade nas quais os alunos prounistas se


reconhecem e são reconhecidos, constata-se que as maiores dissimilaridades em relação aos
outros alunos são background cultural, classe social e experiências pessoais, sendo que essas
diferenças trazem como consequências negativas uma menor interação social, uma vez que as
fronteiras entre grupos são estabelecidas em função de similaridades, criando maiores
distâncias entre “Nós” e “Eles”. Ou seja, são dimensões menos visíveis e mais profundas, de
acordo com a tipologia de diversidade baseada em fatores (MANNIX; NEALE, 2005).
Aponta-se a existência de estratégias individuais e até mesmo de salas inteiras a fim de
impedir a aceitação de alunos prounistas em grupos de trabalho, exclusão de alunos dos
mailings de sala e privação de acesso à informação. Ao serem identificadas as estratégias
utilizadas por esses alunos para serem inseridos em grupos, constata-se que ao sentirem que o
ambiente não lhes é receptivo alguns alunos adotam estratégias de autoinclusão, enquanto
outros aceitam o que está posto e se autoexcluem, preferindo não agir sobre o meio. A
formação de grupos de estudos fora de classe é apontado como importante fator de inclusão e
metade dos alunos prounistas entrevistados se engajam nesses grupos. Outras estratégias de
autoinclusão utilizadas por esses alunos são: buscar se impor frente aos outros alunos, obter
desempenho superior, envolvimento em atividades fora de classe, sendo essa última prática
comum a todos os alunos que se autodefinem como mais expansivos, mostrando que as
características pessoais são também fatores de inclusão.
Buscou-se verificar as percepções do professor acerca dessa dinâmica de
inclusão/exclusão, sendo por eles apontada a existência de “situações agressivas”, de
discriminação e preconceito. A falta de qualificação de professores para manejo de situações
conflituosas entre grupos diversos foi apontada como um aspecto negativo, que contribui para
a manutenção ou agravamento dos conflitos. A decisão pontual de alguns professores de não
formarem grupos de trabalho no primeiro mês de aulas é indicada como uma iniciativa para
minimizar ações excludentes.
A análise do papel dos professores junto aos alunos prounistas foi feita por meio da
categoria “Professor – um agente”, mostrando que os professores são importantes agentes,
alguns para inclusão e outros para a exclusão e discriminação de alunos. Por um lado,
professores “mais voltados às questões sociais” são considerados “luz” e proporcionam
experiência positiva para alunos prounistas entrevistados, por outro fica evidenciado que
professores ideologicamente contrários às Políticas Públicas, em especial ao ProUni, tornam-
se eles mesmos agentes de preconceito e discriminação e instigadores dos outros alunos.
Apenas um professor aponta ter feito intervenções em prol de alunos prounistas, mas há um
167

entendimento de que, em sendo o professor pessoalmente favorável ao Programa, seu


posicionamento pessoal frente à sala funciona como uma intervenção, capaz de reduzir
crenças estereotipadas e munir os alunos de informações fundamentadas.
São consideradas limitações deste trabalho, em primeiro lugar o fato de que a
maioria dos alunos não prounistas entrevistados possui perfil muito próximo aos dos alunos
prounistas, o que faz com a amostra não represente adequadamente o perfil de alunos
predominante na instituição. Isso provavelmente ocorreu porque o e-mail convite enviado a
todos os alunos foi atendido por aqueles que tinham alguma identificação com o tema ou com
os alunos prounistas. De igual modo, todos os professores entrevistados se intitulam e são
reconhecidos por alguns alunos como pessoas mais sensíveis às questões sociais, quando o
ideal seria uma amostra mais heterogênea, que permitisse uma aproximação a sujeitos mais
críticos em relação ao Programa, uma vez que isso enriqueceria o debate e a propiciaria uma
compreensão do fenômeno.
Ao olhar para a atual forma de gestão do Programa ProUni dentro da IES pesquisada,
entende-se que esta pesquisa tem importante papel, pois traz como contribuição prática uma
aproximação às manifestações de preconceito, discriminações e situações excludentes que
ocorrem com alunos dentro da instituição. Uma vez que o ProUni, enquanto ação afirmativa,
visa reduzir a exclusão educacional a qual os grupos sociais menos favorecidos têm sido
historicamente submetidos. Mostra-se relevante discutir essas questões, contribuindo com a
ampliação da discussão do tema, de modo que ações e medidas sejam tomadas para que o
direito ao acesso a uma educação de qualidade possa deixar de ser percebida como um favor e
que esses alunos possam ser notados e tratados como sujeitos com direito legítimo de acesso à
IES.
Esse trabalho evidencia que há uma desinformação dos alunos acerca do Programa e
aponta que uma melhor preparação dos professores é requerida, cabendo à IES
instrumentalizar essa qualificação e ampliar os espaços de discussão acerca das políticas
públicas, e em especial ao ProUni. Como contribuição teórica, esta pesquisa amplia os
estudos de diversidade no Brasil e o escopo de pesquisa sobre inclusão e exclusão, apontando
a condição de prounista como uma dimensão de diversidade dentro do espaço acadêmico e as
consequências que traz para os alunos beneficiários. A pesquisa contribui com uma amostra,
na qual a visão do professor, do aluno prounista e não prounista fazem dialogam, ampliando a
compreensão acerca da dinâmica de inclusão e exclusão, que, compreendida como senso
psicológico de pertencimento, é uma temática pouco explorada nos estudos aqui revistos.
168

Para uma futura agenda de pesquisa, indica-se um estudo comparativo entre


diferentes cursos, uma vez alunos entrevistados que já haviam começado outros cursos dentro
da IES percebem alguns cursos mais inclusivos e outros mais excludentes. Também propõe-se
um estudo da trajetória de carreira de alunos prounistas egressos da IES, a fim de analisar a
inclusão desses alunos no mercado de trabalho, o acolhimento nas organizações e a
mobilidade social
169

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181

APÊNDICE A

ROTEIRO DE ENTREVISTA COM ALUNOS PROUNISTAS

01. Em primeiro lugar, diga quantos anos você tem, seu curso, semestre e como se descreve
em termos de raça.
02. Fale-me um pouco sobre você. (onde mora, profissão dos pais, nível de escolaridade
deles, estrutura familiar – número de irmãos, moradia e descreva um pouco do seu
temperamento – jeito de ser).
03. Você enfrenta alguma dificuldade com relação ao seu dia a dia?
04. O que significa o ProUni para você e para sua vida?
05. Em termos positivos e negativos, o que significa para você ser um(a) aluno(a) bolsista
ProUni dentro da UPM?
06. O que o significa inclusão para você?
07. O que o significa exclusão para você?
08. Por que escolheu estudar aqui? Expectativas quando chegou e como foi a adaptação no
primeiro momento? Como você percebeu o atendimento inicial na área de bolsas e
secretarias? Conte-me um pouco sobre os procedimentos iniciais de apresentação da
documentação, até chegar à sala de aula.
09. Logo no início, quando você começou a estudar aqui, como foi a atitude dos seus colegas
de sala para com você (receptivas, acolhedoras, indiferentes, facilitadoras)? Você teve algum
tipo de dificuldade para se ambientar?
10. Fale um pouco, por favor, sobre sua turma de convívio mais próximo na faculdade. Hoje,
como é seu relacionamento com o grupo? Como é o tratamento dos seus colegas de sala para
com você?
11. Como foi para você a experiência de interação com professores? E com outros
profissionais da instituição?
12. Fale-me um pouco sobre os seus sentimentos em relação à instituição, aos professores e
aos seus colegas (pedir situações concretas).
13. Quando há trabalhos em grupo a serem feitos, como é formado o seu grupo de trabalho?
14. Até esse momento da sua trajetória acadêmica, que sentimentos melhor descrevem sua
experiência como universitário desta instituição?
15. Você se sente à vontade junto aos seus colegas de sala? Em geral, você se sente à vontade
para se expressar, perguntar, participar das aulas? Por quê?
182

16. Você se envolve em alguma atividade extraclasse? Quais?


17. O que o motivou a ingressar nessa atividade? (Investigar: PIBIC, Empresa Júnior,
representação de classe, atléticas, monitorias, atividades culturais, corais, teatro.) Que
benefícios isso trouxe para você?
18. Você participa de alguma atividade social junto com os outros alunos de sua sala?
19. Como você descreve o perfil do aluno da IES em geral?
20. Que diferenças e semelhanças você acha que o seu perfil pessoal tem com o desses
alunos?
21. Como você percebe que os alunos prounistas são vistos pelos alunos não prounistas?
22. Você se identifica como aluno prounista para os outros alunos? Por quê?
23. Você já vivenciou alguma atitude ou comportamento negativo em relação à sua pessoa
pelo fato de ser aluno do ProUni? Você tem alguma situação que exemplifique isso?
24. Eu queria que você me contasse algo que aconteceu aqui na instituição com você, que foi
extremamente positivo para você. E uma que você se sentiu feliz.
25. Eu queria que você me contasse algo que aconteceu aqui na instituição com você, que foi
extremamente negativo para você. E uma que você se sentiu infeliz.
183

APÊNDICE B

ROTEIRO DE ENTREVISTA COM ALUNOS NÃO PROUNISTAS

01. Em primeiro lugar, diga quantos anos você tem, seu curso e semestre e como se descreve
em termos de raça.
02. Fale-me, por favor, sobre o seu grupo de convívio mais próximo na faculdade.
03. Como foi para você construir essas amizades com seu grupo?
04. Você sabe identificar os alunos bolsistas do ProUni da sua sala? Como você os
identifica?
05. Como você descreve o perfil do aluno da IES em geral?
06. Como você descreve o perfil geral do aluno prounista?
07. Que diferenças e semelhanças você acha que existe entre o perfil geral dos alunos da IES
e os alunos bolsistas do ProUni?
08. Logo no início, quando você começou a estudar aqui, como foi a atitude dos seus
companheiros de sala para com você (receptivas, acolhedoras, indiferentes, facilitadoras)?
Você teve algum tipo de dificuldade para se ambientar?
09. Fale um pouco sobre sua turma de convívio mais próximo na faculdade. Hoje, como é seu
relacionamento com o grupo? Como é o tratamento dos seus colegas de sala para com você?
10. Como foi para você a experiência de interação com o grupo, com professores e com
outros profissionais da instituição? Fale-me um pouco sobre os seus sentimentos em relação à
instituição, aos professores e aos seus colegas.
11. Quando há trabalhos em grupo a serem feitos, como é formado o seu grupo de trabalho?
12. Como os alunos prounistas são vistos pelos alunos não prounistas?
13. Você já trabalhou em grupos com alunos prounistas? Como foi a interação deles no
grupo?
14. Você já testemunhou alguma atitude ou comportamento negativo em relação algum aluno
pelo fato de ser prounista? Você tem alguma situação que exemplifique?
15. Por algum outro motivo, isso já ocorreu? Você pode me dar exemplos de situações em
que isso tenha ocorrido, mesmo que não seja com você?
16. Como você vê a participação do aluno prounista aqui dentro da instituição? O que o
significa inclusão para você?
17. O que o significa exclusão para você?
184

18. Em sua opinião, o ambiente da instituição é inclusivo ou excludente para os alunos do


ProUni? Por quê?
19. Como você percebe a inclusão e ou exclusão dos alunos prounistas pela instituição? E em
relação aos grupos sociais?
20. Você percebe em alunos não prounistas alguma estratégia de inclusão ou exclusão de
alunos que são prounistas?
185

APÊNDICE C

ROTEIRO DE ENTREVISTA COM PROFESSORES

01. Qual a sua opinião com relação ao programa ProUni?


02. Você sabe identificar os alunos bolsistas do ProUni da sua sala?
03. Como você os identifica?
04. Como você descreve o perfil do aluno da IES em geral?
05. Que diferenças e semelhanças você acha que existem entre o perfil geral dos alunos da
IES e os alunos bolsistas do ProUni?
06. Como você percebe que os alunos prounistas são vistos pelos alunos não prounistas?
07. Você percebe preconceito dos outros alunos pelo fato de um aluno ser prounista?
08. Por algum outro motivo, isso já ocorreu? Dê-me exemplos de situações em que isso
ocorreu, mesmo que não seja com você.
09. Você alguma vez percebeu algum aluno ser discriminado pelo fato de ser prounista?
10. Você fez alguma coisa para intervir?
11. Você alguma vez tomou alguma ação específica em relação a esses alunos?
12. Você nota a existência da algum tipo de estratégia por parte dos alunos prounistas para se
inserirem no grupo? Quais?
13. Você percebe em alunos não prounistas alguma estratégia de inclusão ou exclusão dos
alunos que são prounistas?
14. Você já viu estratégias da instituição pra promover a inclusão dos alunos?
15. O que o significa inclusão para você?
16. O que o significa exclusão para você?
17. Na sua percepção, o ambiente da IES é inclusivo ou excludente? Por quê?
18. Você já interveio, teve que intervir ou tomou alguma atitude em favor de algum aluno
prounista?
186

Matriz de amarração – Questionários/objetivos específicos


Pr o b lema d e Pes q uis a : Co mo o co r r e a d inâ mica d e inclus ã o /exclus ã o d o b o ls is ta Pr o Uni em uma univer s id a d e p r iva d a d a cid a d e d e Sã o Pa ulo ?

Ob jetivo Ger a l: Co mp r eend er a d inâ mica d e inclus ã o e/o u exclus ã o d o a luno p r o unis ta no es p a ço a ca d êmico

Objetivos Específicos: Ques tõ es d o Ro teir o


Pr o uni N ã o Pr o uni Pr o fes s o r es Res p o ns a b ilid a d e So cia l
E ntend er a s co nd içõ es Primeiramente diga quantos tem, seu curso e semestre e Primeiramente diga quantos tem, seu curso e semestre e
s ó cio eco nô mico d o a luno como se declara em termos de raça. como se declara em termos de raça. XXXXXXXXXXXXXXXXX
p r o unis ta
Me fale um pouco sobre você. (Onde você mora, profissão Quem paga a sua faculdade?
dos pais, nível de escolaridade deles, estrutura familiar, nº
de irmãos, condições de moradia) XXXXXXXXXXXXXXXXX

Descreva seu temperamento, jeito de ser. XXXXXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXXXXX


Porque escolheu estudar no Mackenzie? Como foi o
atendimento inicial? XXXXXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXXXXX

Você enfrenta alguma difulcade com relação ao seu dia-a-


XXXXXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXXXXX
dia?

Ver ifica r a s d imens õ es d e Como você descreve o perfil do aluno da IES em geral? Como você descreve o perfil do aluno da IES em geral? Como você descreve o perfil do aluno da IES em geral?
d iver s id a d e na s q ua is o s a luno s
p r o unis ta s s e r eco nhecem e s ã o Que diferenças e semelhanças você acha que o seu perfil Como você descreve o perfil do aluno prounista? É possível identificar os alunos bolsistas do Prouni nas suas
r eco nhecid o s pessoal tem com desses alunos? salas de aula? Como você os identifica?

Como você percebe que os alunos prounistas são vistos Que diferenças e semelhanças você acha que o seu perfil Que diferenças e semelhanças você acha que o seu perfil
pelos alunos não prounistas? pessoal tem com desses alunos? pessoal tem com desses alunos?

Você se identifica como bolsista para os outros alunos? Você sabe identificar os alunos bolsistas do Prouni da sua
Por que? sala? Como os identifica? XXXXXXXXXXXXXXXXX

Você sabe identificar outros alunos prounistas? Como os


identifica? XXXXXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXXXXX

Inves tig a r a exis tência d e Como os alunos prounistas são vistos pelos alunos não Como os alunos prounistas são vistos pelos alunos não Como você percebe a interação entre alunos prounistas e
es ter eó tip o s , p r eco nceito s e prounistas? prounistas? não prounistas aqui dentro da IES?
d is cr imina çã o na
inclus ã o /exclus ã o d o s a luno s Você já experienciou alguma atitude ou comportamento Você já testemunhou alguma atitude ou comportamento Você alguma vez percebeu algum aluno ser discriminado
p r o unis ta s negativo em relação à sua pessoa pelo fato de ser aluno negativo em relação a algum aluno pelo fato de ser aluno pelo fato de ser prounista?
do ProUni? Você tem alguma situação que exemplifique? do ProUni? Você tem alguma situação que exemplifique?

Por algum outro motivo, isso já ocorreu? Pode me dar Na sua percepão, existe preconceito dos alunos regulares
XXXXXXXXXXXXXXXXX exemplos de situações em que isso ocorre, mesmo que para com os alunos prounistas? Como se manifesta?
não seja com você?

Por algum outro motivo, isso já ocorreu? Pode me dar


XXXXXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXXXXX exemplos de situações em que isso ocorre?

Matriz de amarração (Continuação)


Matriz de Amarração – Continuação
187

Matriz de Amarração (Continuação)


Pr o b lema d e Pes q uis a : Co mo o co r r e a d inâ mica d e inclus ã o /exclus ã o d o b o ls is ta Pr o Uni em uma univer s id a d e p r iva d a d a cid a d e d e Sã o Pa ulo ?

Ob jetivo Ger a l: Co mp r eend er a d inâ mica d e inclus ã o e/o u exclus ã o d o a luno p r o unis ta no es p a ço a ca d êmico

Ques tõ es d o Ro teir o
Objetivos Específicos:
Pr o uni N ã o Pr o uni Pr o fes s o r es Res p o ns a b ilid a d e So cia l

Co mp r eend er a d inâ mica d e Em temos positivos e negativos, o que significa para você Você percebe em alunos não prounistas alguma estratégia Você percebe em alunos não prounistas alguma estratégia
Inclus ã o /E xclus ã o d o s a luno s ser um(a) aluno(a) bolsista ProUni dentro da UPM? de inclusão ou exclusão de alunos que são prounistas? de inclusão ou exclusão de alunos que são prounistas?
p r o unis ta s na IE S

O que o significa inclusão para você? O que o significa inclusão para você? O que o significa inclusão para você?

O que o significa exclusão para você? O que o significa exclusão para você? O que o significa exclusão para você?

Você considera o ambiente da IES inclusivo ou excludente? Você considera o ambiente da IES inclusivo ou excludente Você considera o ambiente da IES inclusivo ou excludente
Por quê? para os alunos do Prouni? Por quê? para os alunos do Prouni? Por quê?

Você poderia me relatar alguma experiência muito positiva Você nota a existência da algum tipo de estratégia por
que você teve com seu grupo de trabalho que o deixou parte dos alunos prounistas para se inserirem no grupo?
XXXXXXXXXXXXXXXXX
feliz? Porque você acha que isso aconteceu? Quais?

Você poderia me relatar alguma experiência muito negativa Como você percebe a inclusão e ou exclusão dos alunos Como você percebe a inclusão e ou exclusão dos alunos
que você teve com seu grupo de trabalho que o deixou prounistas pela instituição? E em relação aos grupos prounistas na instituição? E em relação aos grupos sociais?
muito triste? Porque você acha que isso aconteceu? sociais?

Você percebe em alunos não prounistas alguma estratégia Você percebe em alunos não prounistas alguma estratégia
de inclusão ou exclusão de alunos que são prounistas? de inclusão ou exclusão de alunos que são prounistas?
XXXXXXXXXXXXXXXXX

Você nota a existência da algum tipo de estratégia por


parte dos alunos prounistas para se inserirem no grupo?
XXXXXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXXXXX
Quais?

Como você percebe a interação entre alunos prounistas e


não prounistas aqui na faculdade?
Ver ifica r a p er cep çã o d o s
p r o fes s o r es a cer ca d es s a XXXXXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXXXXX
Você já percebeu algum tipo de discriminação ou
d inâ mica r ela cio na l
preconceito em relação a esses alunos?

Ana lis a r o p a p el d o s Você fez alguma coisa para intervir?


p r o fes s o r es junto a o s a luno s
p r o unis ta s
XXXXXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXXXXX Você alguma vez tomou alguma ação específica para esses
alunos?

Matriz de amarração (Conclusão)

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