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Inclusao e Exclusao Alunos Bolsistas
Inclusao e Exclusao Alunos Bolsistas
São Paulo
2014
Marineide de Oliveira Aranha Neto
SÃO PAULO
2014
A662c Aranha Neto, Marineide de Oliveira
Compreendendo a dinâmica de inclusão e/ou exclusão de
alunos bolsistas do ProUni / Marineide de Oliveira Aranha
Neto - 2015.
187f.: il., 30 cm
A Deus eterno e imortal, invisível mas real a minha maior gratidão, pela sabedoria e
força, pela direção e, principalmente, por me incluir em sua família e dispensar sobre mim
todo favor e bondade, conduzindo minha vida e ajudando-me a alcançar meus objetivos e a
realizar meus sonhos.
À Profª. Dra. Darcy Mitiko Mori Hanashiro por conceder-me a honra de tê-la como
minha orientadora, por sua postura séria e profissional, por compartilhar seu extenso
conhecimento, por desafiar-me quando necessário e conter minhas angústias quando estas me
pareceram maiores do que a minha capacidade.
À banca examinadora, Profª. Dra. Patrícia Tuma Martins Bertolin e Prof. Dr. Luiz
Alex Silva Saraiva pelas contribuições feitas no Exame de Qualificação.
Às professoras Dra. Maria Luisa Mendes Teixeira e Dra. Silvia Marcia Russi de
Domenico pelas orientações e considerações emitidas durante os seminários de pesquisa.
Aos sujeitos de pesquisa pela disponibilidade e contribuição com este trabalho,
permitindo-me uma aproximação de suas vivências.
A todos os meus colegas de curso pela troca de experiências, especialmente à Julia
Kenski e Diogo Reatto, que me apoiaram e incentivaram em sala de aula. À minha amiga
Paula Pamplona de Castro, que trilhou esse mesmo caminho antes de mim, apontou em
vários momentos “o caminho das pedras” e me incentivou desde o início.
Aos meus colegas de trabalho, Márcia Núbia Araújo Vieira, Ricardo Bressan e
Aline Wiezel da Silva Vieira pela paciência, companheirismo e incentivo.
Ao Instituto Presbiteriano Mackenzie, por meio do qual obtive a concessão do
benefício da Bolsa de Mestrado.
De modo especial a Francisco Washington da Silva, Renato de Moraes Santiago,
Elisama Silva e a todos os funcionários da Instituição que me apoiaram durante essa
jornada, forneceram-me informações e orientações necessárias e abriram-me portas que
facilitaram o cumprimento desta proposta de pesquisa.
De modo muito particular agradeço ao amigo Flávio Viola Machado por ter me dado
a palavra certa no momento certo, palavra que fez toda a diferença para que eu chegasse ao
final desta jornada, tão desejada, mas ao mesmo tempo tão desafiadora.
À minha amiga Dra. Marina Moura pelo apoio, orientações e importante
contribuição para que eu pudesse finalizar essa etapa.
A todos os meus familiares, meu esposo Carlos Eduardo Aranha Neto, meus filhos,
pais e sogros por me incentivarem, me apoiarem e, acima de tudo, por me proporcionarem
acolhimento e sentimento de pertença, dada a importância de termos com quem contar,
principalmente quando nos vemos diante de obstáculos.
Nunca, nunca, nunca desista!
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Dissertações e Teses por ano de publicação ....................................................... 41
Tabela 2: Distribuição da Produção Acadêmica por Regiões ............................................ 42
Tabela 3: Distribuição de teses e dissertações por área de estudo ..................................... 44
Tabela 4: Motivos de encerramentos de matrículas de 2005 a 2012 .................................. 77
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Vagas ofertadas em São Paulo e no Brasil de 2005 a 2013 ............................. 64
Gráfico 2: Vagas ofertadas e ociosas na IES pesquisada ................................................... 76
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Composição dos conteúdos discursivos .............................................................. 127
LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Categorias de Conteúdo ................................................................................... 71
Quadro 2: Perfil geral dos respondentes ........................................................................... 78
Quadro 3: Legenda das siglas dos respondentes ................................................................ 79
Quadro 4: Características pessoais dos respondentes ......................................................... 95
Quadro 5: Similaridades e diferenças “Nós” e “Eles” ........................................................ 128
Quadro 6: Estratégias de autoinclusão dos alunos prounistas ........................................... 149
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 17
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.................................................. 66
3.1 MÉTODO DE PESQUISA .............................................................................. 66
O ProUni é uma política pública federal e desde que foi institucionalizado, em janeiro de
2005, tem concedido bolsas de estudos integrais e parciais para estudantes de baixa renda em
instituições privadas de ensino superior. Tendo o Programa como objeto de estudo, o objetivo
geral deste trabalho foi o de compreender a dinâmica de inclusão e/ou exclusão do bolsista
ProUni no espaço acadêmico. De modo específicos buscou-se (a) entender as condições
socioeconômicas do aluno prounista; (b) investigar a existência de estereótipos, preconceitos
e discriminação na inclusão/exclusão dos alunos prounistas; (c) verificar as dimensões de
diversidade nas quais os alunos prounistas se reconhecem e são reconhecidos; (d) identificar
as estratégias utilizadas por esses alunos para serem inseridos no grupo; (e) verificar as
percepções do professor acerca dessa dinâmica de inclusão/exclusão e (f) analisar o papel dos
professores junto aos alunos prounistas. Foi realizada uma pesquisa qualitativa interpretativa
básica do tipo descritiva, tendo como sujeitos de pesquisa doze alunos bolsistas do ProUni,
seis alunos não prounistas e quatro professores do curso de Direito de uma mesma
universidade da cidade de São Paulo. Optou-se pela utilização de entrevistas semiestruturadas
e pelo método de análise de conteúdo, sob a perspectiva qualitativa, conforme proposto por
Bardin (2007). A partir análise das entrevistas emergiram dez categorias: (1) Importância e
impacto do ProUni e da IES; (2) Quem são eles; (3) Quem eles dizem que são; (4) Obstáculos
do caminho; (5) Relações interpessoais; (6) Nós e Eles; (7) Manifestações intergrupais; (8)
Experiência de inclusão, (9) Experiência de exclusão e (10) Professor – um agente. Em
função das dissimilaridades percebidas, esses alunos prounistas tornam-se vítimas de
preconceito e discriminação, manifestos principalmente quando da formação de grupos de
trabalho. Os resultados indicaram que as ocorrências de comportamentos desfavoráveis a um
sentimento de inclusão por parte dos alunos não prounistas são mais comuns do que
manifestações de comportamentos inclusivos. A autoinclusão tem sido uma estratégia de
inclusão adotada pelos alunos prounistas, sendo as características pessoais fatores importantes
para percepção de pertencimento ao grupo. Por meio do desempenho superior, esses alunos
conseguem destacarem-se, alcançar posições de prestígio, mobilidade e inclusão social.
ProUni is a Brazilian federal public policy and since it was institutionalized in January 2005,
has awarded full and partial scholarships for low-income students in private institutions of
higher education. Having the program as object of study, the aim of this study was to
understand the dynamics of inclusion and / or exclusion of the ProUni fellow in the academic
space. Specifically we sought to (a) understand the socioeconomic conditions of prounista
student; (b) investigate the existence of stereotypes, prejudice and discrimination in the
inclusion / exclusion of prounistas students; (c) check the dimensions of diversity in which
prounistas students recognize and are recognized; (d) identify the strategies used by these
students to be included in the group; (e) verify the perceptions of teachers about this dynamic
inclusion / exclusion and (f) analyze the role of teachers along with the prounistas students. A
basic interpretive qualitative descriptive research, and as research subject twelve ProUni
fellows, six non-prounistas students and four professors of law from the same university in
the city of São Paulo was held. We opted for the use of semi-structured interviews and the
method of content analysis, the qualitative perspective, as proposed by Bardin (2007). From
analysis of the interviews revealed ten categories: (1) Importance and impact of ProUni and
IES; (2) Who are they; (3) who they say they are; (4) Barriers of the way; (5) interpersonal
relations; (6) Us and Them; (7) Demonstrations intergroup; (8) Experience of inclusion (9)
Experience of exclusion and (10) Teacher - an agent. According to the perceived
dissimilarities, these prounistas students become victims of prejudice and discrimination,
manifest especially when the formation of working groups. The results indicated that the
occurrence of unfavorable behavior to a feeling of inclusion by non-prounistas students are
more common than manifestations of inclusive behaviors. The self-inclusion has been a
strategy of inclusion adopted by prounistas students, and the personal characteristics
important factor for perception of belonging to the group. Through superior performance,
these students can excel yourself, achieve positions of prestige, mobility and social inclusion.
1. INTRODUÇÃO
Rizzo (2010) enfocam o programa enquanto Ação Afirmativa como possibilidade de inclusão
social/profissional e oportunidade de mobilidade social.
A inclusão do negro também tem recebido atenção dos pesquisadores. Em sua
dissertação, Leite (2009) discutiu a construção da identidade do bolsista e constatou que, na
instituição por ele pesquisada, a ausência de iniciativas que promovam o reconhecimento do
estudante cotista desfavorece o processo de constituição da identidade racial do bolsista.
Sotero (2009) analisou a trajetória de estudantes negros da cidade de Salvador, indicando que
a abrangência do programa demanda observação, em direção a uma educação inclusiva que
possibilite o acesso de diferentes classes sociais ao ensino superior.
Na opinião de Carvalho (2006), o benefício que o ProUni pode trazer para muitos
alunos está mais relacionado aos aspectos simbólicos do diploma. Além disso, argumenta que
as chances reais de ascensão são para os poucos que estudarem em instituições privadas de
qualidade.
Em um país como o Brasil, que é reconhecido internacionalmente por seu grau de
desigualdade social (POCHMANN, 2003), a busca por uma qualificação profissional se
apresenta como uma oportunidade para a mobilidade social e construção de uma identidade
social mais positiva; no entanto, ao mesmo tempo, implica uma árdua trajetória para os
bolsistas provenientes das classes mais baixas. Do ingresso à faculdade até a conclusão do
curso, diferentes desafios precisam ser superados, e para que a democratização e a inclusão
sejam efetivas são necessárias políticas voltadas para a permanência dos estudantes, uma vez
que as dificuldades dos bolsistas, seja no processo de aprendizagem ou no âmbito financeiro,
não desaparecem apenas com o ingresso na graduação (ROCHA, 2012).
No trabalho de Ferreira (2012b), o autor verificou haver diferenças no desempenho
de bolsistas ProUni, constatando que os jovens de cor branca são menos defasados em relação
ao nível de desempenho, e que, consideradas as notas médias dos estudantes, os alunos com
bolsa integral apresentam desempenho superior ao dos outros grupos. Tendo em vista que o
ProUni insere um grupo social diverso na universidade, tanto a experiência subjetiva dessa
inserção como a dinâmica envolvida nas interações sociais podem afetar a vida do aluno
prounista.
Atentando para a experiência acadêmica dos alunos prounistas, o trabalho realizado
por Santos (2011) aponta que a desigualdade social vivida na universidade pelos alunos
bolsistas cria, entre outros, o sentimento de inferioridade, que estimula tanto a busca de seus
pares quanto a reclusão e a negação de suas origens. Interagindo em ambiente acadêmicos no
quais as diferenças sociais se evidenciam, esses alunos podem, eventualmente, ser vítimas de
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preconceito, conforme indicam três dos 30 alunos bolsistas do ProUni questionados por
Nogueira (2013).
Embora a revisão dos trabalhos já produzidos mostre que o ProUni vem sendo
amplamente pesquisado e a inclusão e/ou exclusão social dos alunos bolsistas tenha sido
estudada, a abordagem teórica pela qual este trabalho buscará compreender a experiência de
inclusão dos prounistas se faz diferenciada. As lentes teóricas das relações intergrupais, da
diversidade e da inclusão enquanto experiência individual de pertença a um grupo social,
utilizando o ProUni como objeto de estudo, constitui-se uma nova proposta de pesquisas
frente às anteriormente realizadas. Considera-se relevante aprofundar conhecimentos sobre a
experiência pessoal dos alunos prounistas, bem como identificar a percepção dos alunos não
prounistas e dos professores com relação à experiência de inclusão daqueles dentro de uma
IES privada, de primeira linha.
Considerando a importância da educação para a formação de uma sociedade e para o
desenvolvimento de um país, neste momento em que políticas públicas possibilitam o acesso
de camadas de baixa renda ao ensino superior julgamos relevante abordar esse acesso de
alunos de classes sociais menos favorecidas ao espaço acadêmico, bem como discutir o
sentimento de inclusão e/ou exclusão do aluno prounista. Busca-se também a ampliação dos
estudos relativos à diversidade e à inclusão desses grupos minoritários, refletindo sobre a
dinâmica interpessoal que se estabelece durante a trajetória acadêmica desses alunos, bem
como o impacto dessas interações na percepção de pertença deles, que ainda é uma questão
pouco explorada.
Diante do panorama de trabalhos já realizados sobre o ProUni, destacamos como
inquietação fundamental desta pesquisa o seguinte questionamento: Como ocorre a dinâmica
de inclusão/exclusão do bolsista ProUni em uma universidade privada da cidade de São
Paulo?
Decorrente deste problema de pesquisa, o objetivo geral é compreender a dinâmica
de inclusão e/ou exclusão do bolsista ProUni no espaço acadêmico. Dentre os objetivos
específicos, esta pesquisa se propõe a entender as condições socioeconômicas do aluno
prounista, investigar a existência de estereótipos, preconceitos e discriminação na
inclusão/exclusão dos alunos prounistas; verificar as dimensões de diversidade nas quais os
alunos prounistas se reconhecem e são reconhecidos; identificar as estratégias utilizadas por
esses alunos para serem inseridos em grupos; verificar as percepções do professor acerca
dessa dinâmica de inclusão/exclusão e, por fim, analisar o papel dos professores junto aos
alunos prounistas.
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2. REFERENCIAL TEÓRICO
alcançar melhor status funciona como um “motor” para as ações. Por meio da comparação
social o indivíduo se referencia, obtendo uma avaliação de sua posição e status ocupado
perante o grupo, o que reduz sua incerteza e permite uma autoavaliação mais acurada
(TAYLOR; MOGHADDAM, 1994). Tajfel (1982) propõe que, no nível intergrupal,
comparações também possibilitam a compreensão do valor e status relativo do grupo, bem
como status e valor adquirido em virtude de ser membro deste, exercendo importante papel
em modelar as ações dos indivíduos.
Para que se tenha uma compreensão básica da Teoria da Identidade Social, de acordo
com Taylor e Moghaddam (1994) existem quatro conceitos considerados fundamentais:
categorização, identidade e comparação social e distintividade psicológica do grupo. Esses
conceitos serão aqui apresentados e brevemente sintetizados.
Funcionando como uma ferramenta cognitiva a categorização permite que o
indivíduo estruture seu ambiente social, definindo seu lugar neste ambiente (TAYLOR;
MOGHADDAM, 1994). As categorizações sociais dizem respeito aos processos de
categorização de pessoas. Hogg e Abrams (2001) assinalam que, uma vez que classificações
são feitas com base nas similaridades e diferenças em relação a quem está categorizando;
pessoas podem ser percebidas como membros da mesma categoria a qual o indivíduo pertence
(endogrupo) ou como de uma categoria diferente (exogrupo).
A identidade social individual diz respeito ao conhecimento do indivíduo, de saber
que pertence a certo grupo social e ao valor agregado ao ser membro desse grupo, quer em
termos positivos ou negativos. Por essa compreensão conceitual, a participação no grupo é
vista a partir da percepção subjetiva do indivíduo, sendo comum aos membros deste destacar
e dar importância aos valores do grupo de pertença. O pressuposto básico é que os indivíduos
são motivados a alcançar uma identidade social mais positiva (TAYLOR; MOGHADDAM,
1994).
A corrente europeia da Psicologia Social considera que as sociedades atuam como
forças em conflito, mais do que em coesão e, e que em virtude disso, dentro dos grupos
sociais ocorrem competições e lutas a fim de aprimorar suas próprias posições, em contextos
de busca de mudanças das condições sociais. A Teoria da Identidade Social postula que os
membros do grupo almejam uma identidade para seu grupo que seja mais distinta e positiva
quando comparada a de outros grupos, de forma que as relações estabelecem mais por
competição e busca de distinção do que por cooperação (TAYLOR; MOGHADDAM, 1994).
Dentre os pressupostos da teoria da identidade social, o processo sócio-cognitivo de
autoaprimoramento é considerado fundamento importante para o entendimento das relações
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intergrupo, pois compreende que os indivíduos têm necessidade de serem vistos de forma
positiva em relação a outros relevante. Isto é feito por meio de comparações, geralmente
favorecendo aqueles que pertencem ao ingroup (HOGG; TERRY, 2001). Analogamente,
Triands (2003) considera que o etnocentrismo dos seres humanos constitui uma barreira para
as relações intergrupos, uma vez que a cultura própria é utilizada como padrão para julgar
outras culturas. Além disso, aquilo que se passa na própria cultura é considerado como
"natural", "normal" e "correto" e os costumes ingroup como se fossem universalmente
válidos, sem questionamentos.
Competição e conflito são aspectos comuns nas relações intergrupais, pois ao buscar
alcançar posição superior para o endogrupo, comportamentos discriminatórios intergrupos são
manifestos. Situações de potenciais mudanças sociais expressam a natureza dinâmica da
teoria, pois os indivíduos pertencentes aos grupos dominantes desejam e lutam para manter o
status de condição comparativamente superior, enquanto os integrantes dos grupos de
identidade social menos adequada desejam alcançar alguma mudança de status, a fim de
aprimorar a identidade grupal para uma condição superior (TAYLOR; MOGHADDAM,
1994).
A simples percepção de possuir uma identidade social inadequada não é condição
suficiente para se conquistar uma mudança de posição. De acordo com Taylor e Moghaddam
(1994), dois fatores são fundamentais para que membros dos grupos em desvantagem
conquistem melhor situação intergrupo: a princípio, que estes acreditem que a atual situação
pode ser mudada e a posição hierárquica alterada (estabilidade/instabilidade) e, em segundo
lugar, a extensão em que o intergrupo vê a situação posta como única e justa
(legitimidade/ilegitimidade).
Havendo, no indivíduo, uma percepção cognitiva de possíveis alternativas para a
alteração de seu status, de acordo com Taylor e Moghaddam (1994), há quatro estratégias de
mudanças intergrupos possíveis para serem adotadas:
O grupo subordinado tenta ser absorvido pelo grupo dominante;
Redefinir, como positivas, características do grupo anteriormente
avaliadas como negativas;
Criação de novas dimensões, que não tenham sido previamente
utilizadas, para comparação e avaliação, a fim de obter posição mais positiva;
Competição direta com o grupo dominante.
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Os referidos autores assinalam que todas essas estratégias são passíveis de reações
dos grupos dominantes, provocando conflitos e embates a fim de assegurar o status de
dominância. Em circunstâncias nas quais os grupos em desvantagem não percebem
alternativas cognitivas que permitam a alteração da condição do grupo, estratégias específicas
podem ser adotadas por indivíduos, que saem do grupo em desvantagem visando alcançar
posições em grupos melhor avaliados (TAYLOR; MOGHADDAM, 1994).
As respostas à possibilidade de mudanças podem se dar enquanto grupo ou
indivíduo. Taylor e Moghaddam (1994) ressaltam a distinção entre dois conceitos que
diferenciam essas estratégias de mudança: a mobilidade e mudança social. Mobilidade social
consiste em uma “estruturação subjetiva do sistema social” e pressupõe que o sistema é
flexível e permeável e não ameaça a posição relativa dos grupos, possibilitando, assim, uma
mobilidade de partes individuais. A mudança social, no entanto, refere-se ao modo subjetivo
de estruturar o sistema social no qual o indivíduo vive; diz respeito às crenças que delimitam
as fronteiras do grupo de pertença, sem possibilitar movimentos para fora desse a fim de
alcançar melhores posições ou condições de vida, a menos que a mudança se dê enquanto
grupo como um todo. Mudança social implica necessariamente confrontação intergrupo, pois
a busca por uma posição melhor encontra reação dos grupos dominantes, que querem garantir
a manutenção de suas posições favoráveis.
Mesmo em ambiente ausente de conflitos explícitos ou institucionalizados ou de
competição entre grupos, estes tendem a manifestar comportamentos mais favoráveis em
relação ao endogrupo. O grupo social provê aos seus membros uma identidade social positiva
por meio de comparação e distinção em relação a outros grupos, acerca de características
distintivas que tenham claro valor diferencial.
No campo da Psicologia Social, sob a influência da Teoria da Identidade Social, em
1984, Taylor e McKirnan desenvolveram um modelo de cinco estágios das relações
intergrupais. Apresentado por Taylor e Moghaddam (1994), o modelo busca abranger tanto
processos macro quanto micro sociais na interpretação do comportamento intergrupal,
partindo do pressuposto de que raramente os relacionamentos sociais ocorrem entre dois
grupos com status perfeitamente iguais.
Para nomear a condição dos diferentes grupos esses autores utilizam os termos
“vantagem” e “desvantagem”, pois consideram que termos como “majoritário” e
“minoritário” utilizados por alguns pesquisadores fazem referência a números, enquanto a
expressão “dominante” e “subordinado”, utilizados por Tajfel (1982), sugerem que o próprio
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grupo é responsável pela posição ou status que ocupa; desconsidera-se, portanto, que, mais do
que traços grupais, existem condições externas aos grupos responsáveis pelas desigualdades.
Os cinco estágios da dinâmica intergrupos propostos por Taylor e McKirnan (1984)
apud Taylor e Moghaddam (1994) abrangem:
1. Relações intergrupais claramente estratificadas – Não há possibilidade de
mudanças entre as classes, pois o status de cada grupo está rigidamente estabelecido com base
em características inerentes ou atribuídas a seus membros; é próprio aos integrantes de grupos
em desvantagem imputar a si mesmos a reponsabilidade por estar em posição inferior.
2. Ideologia individualística – A base de critério passa a ser as conquistas, as
habilidades e competências do indivíduo, que tem uma percepção do grupo como aberto e,
portanto, considera que há possibilidade de mudança; essa mobilidade se dará de forma
individual e por seu próprio esforço e capacidade, o que isenta o grupo em vantagem de
qualquer responsabilidade em relação à sua posição atual.
3. Mobilidade social individual – Ocorre uma tentativa dos membros do grupo em
desvantagem de migrar para o grupo em vantagem e, para tal, embora retenham fatores do
grupo em desvantagem suficientes para manter sua própria identidade, passam a adotar
características do outro grupo a fim de serem aceitos como membros.
4. Aumento da consciência – Os indivíduos que passaram pelo terceiro estágio, mas
não obtiveram sucesso na tentativa de passar para o grupo em vantagem, retornam ao seu
grupo de origem e tentarão estimular uma ação coletiva; aqueles poucos que foram bem-
sucedidos passam a incorporar as normas do grupo em vantagem e tornam-se mais convictos
de que o sistema é justo e que, portanto, cabe aos outros membros conquistar os próprios
lugares.
5. Ação coletiva – É necessário que parte dos membros do grupo em desvantagem
tome consciência de que habilidades e esforços não são suficientes para que seu grupo
consiga a mobilidade desejada, que percebam que são injustamente discriminados. Uma ação
coletiva deverá ser empreendida e, estratégias de competição, de reavaliação de originalidade
deverão ser adotadas para que assim novas dimensões para comparação social sejam criadas,
novos papéis e novas percepções assumidas.
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tendo função descritiva e prescritiva das formas de pensar, sentir e agir (HOGG; TERRY,
2001).
Tendo em vista que a comparação social conduz ao exagero nas diferenças entre
grupos e as categorias conduzem à formação de estereótipos em relação a si, ao endogrupo e
ao exogrupo, ao operarem juntas, categorização e comparação social geram uma forma de
comportamento do grupo, envolvendo diferenciação, discriminação, favoritismo intragrupo,
percepção de valor mais positivo para endogrupo em relação ao exogrupo e preferência
afetiva pelo endogrupo (HOGG; ABRAMS, 2001).
Uma pesquisa realizada por Jaspars e Warnaem (1982), e citada por Tajfel (1982), na
qual tratam da saliência entre grupos, demonstra que, em geral, endogrupos não
necessariamente avaliam os exogrupos mais negativamente do que a si mesmos e, sim, que
tendem a fazer uma avaliação mais positiva acerca de si mesmos do que são por outros
avaliados, demonstrando um favoritismo ao endogrupo.
tentando ganhar algo, outra pessoa em algum outro grupo está tentando proteger algo. No
meio desse e de outros desafios, o imperativo de lidar com essas diferenças de maneiras novas
e criativas permanece. A partir de uma visão inclusiva da diversidade, o foco das ações deve
se concentrar na busca da ampliação dos recursos disponíveis, a fim de que todos possam se
beneficiar deles. A direção de um pensamento mais sofisticado acerca da diversidade está na
busca da construção de um espaço em que todos se encaixem (DAVIDSON; FERDMAN,
2001).
Até o momento o tema inclusão foi aqui conceituado e discutido como um senso
psicológico e experiência subjetiva de pertencimento a um determinado grupo social. A
Psicologia Social tem dado também um amplo enfoque à exclusão social, tema que, de acordo
com Sawaia (2006), é complexo e contraditório. Nas análises da desigualdade social, a
exclusão é tratada como sinônimo de pobreza, quando abordada sob o enfoque econômico; ao
centrá-la na questão social, o conceito de discriminação é privilegiado; ainda para Sawaia, a
injustiça social é o escopo fundamental de análise da exclusão. Jodelet (2006) considera que o
único nível de abordagem da exclusão em que a unanimidade pode fazer sentido é quando se
atenta para as interações entre pessoas e entre grupos, nos quais os indivíduos se põem como
agentes ou como vítimas, sendo próprio à Psicologia Social atentar-se a esse nível de detalhe.
Processos sociais excludentes remontam ao Brasil colônia (VERAS, 2006), havendo
uma coincidência entre pobreza e raça desde os tempos da escravidão, podendo-se notar que
ao longo da história tem sido negado aos negros a oportunidade de sair da miséria (SMANIO;
BERTOLIN, 2013). Wanderley (2006) assinala que na compreensão contemporânea de
pobreza, exclusão e pobreza estão associadas, apresentando-se como duas faces de uma
mesma moeda, estando vinculada às desigualdades e, especialmente, à privação de poder e de
representação.
Sawaia (2006) argumenta que a inclusão e a exclusão são duas faces de velhos
problemas sociais – a desigualdade social, a injustiça e a exploração, sendo necessário que as
formas de expropriação humana sejam expostas e analisadas, para que se conheça o
sofrimento ético-político vivenciado por aqueles que se veem impedidos de exercer, mesmo
que de forma parcial, seu potencial humano. Acerca dessa experiência, Gonçalves Filho
(1998) aborda a humilhação social sofrida pelos pobres, fenômeno histórico decorrente da
desigualdade política, que se coloca como uma modalidade de angústia disparada pelo enigma
da desigualdade de classes e que torna o humilhado impedido de vivenciar a sua humanidade.
Outra forma de as ciências humanas abordar a exclusão é lançando olhar sobre a
afetividade, o sofrimento e a felicidade, de modo que a ideia de humanidade seja posta como
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central às reflexões sobre a exclusão, e que o pobre seja olhado como sujeito que tem
emoções; que, para além da sobrevivência, se coloca como ser social e de desejos. Sob o olhar
da Psicologia Social, Sawaia (2006) qualifica a exclusão a partir da afetividade, considerando
o sofrimento “ético-político” dela decorrente. Trata do sofrimento vivenciado, da perda de
autonomia e da subjetividade do sujeito excluído; sofrimento este que advém da situação
social de ser tratado como inferior, e que o estar em uma posição sem valor diante da
sociedade tem o poder de afetar o corpo e a alma, mutilando a vida do excluído de diferentes
formas.
Conforme citado na Tabela 3, a área de Educação responde por 58,75% dos trabalhos
publicados, com um total de 34 dissertações e 13 teses. Dentre as temáticas abordadas, os
estudos enfocam o desempenho dos bolsistas (ALVES, 2008; ROCHA, 2008; ROCHA,
2012), a inserção no mercado de trabalho (COSTA, 2012; GERALDO, 2011; SOUZA, 2011),
as representações sociais que os alunos constroem acerca do ProUni (SEBIM, 2008; SILVA,
2007) e a inclusão social dos egressos (GIACON, 2012). Porém, os temas mais recorrentes
nas dissertações e teses são a democratização do acesso ao ensino superior, a privatização da
educação e as políticas públicas de ações afirmativas e de acesso à educação.
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Ferreira (2009) discutiu os impactos diretos e indiretos do ProUni na vida dos alunos,
verificando haver um impacto positivo no capital social e cultural, possibilitando construção
de novas relações sociais, elevação da autoestima e autoconfiança e confiança no futuro.
Simões (2011) também analisou as possiblidades de mudança social na vida dos sujeitos a
partir do ensino superior, pesquisando alunos prounistas e não prounistas. As dificuldades
cotidianas enfrentadas por dez alunos do curso de Pedagogia a fim de obter um bom
aproveitamento acadêmico e garantir assim a permanência no curso foram estudadas por
Neves (2010). O acesso e permanência dos bolsistas em uma universidade comunitária do
Ceará foram discutidos por Rocha (2008) em um trabalho no qual o autor sugere, no próprio
título, que o ProUni oferece um “Processo de Inclusão Ilusória”, uma vez que, em sua
opinião, o argumento da democratização do Programa no estado do Ceará não se sustenta e,
nas instituições locais, a produção da ciência está subjugada aos interesses do mercado,
oferecendo uma formação de qualidade questionável.
Rodrigues (2011) também aborda a questão da permanência dos alunos, porém
investiga as estratégias utilizadas pelos bolsistas para se manterem na universidade antes de
contarem com o apoio fornecido por um fundo social da instituição estudada. O autor aponta a
necessidade da implementação de políticas de assistência estudantil que possibilitem a
permanência dos alunos oriundos dos pré-vestibulares comunitários e do ProUni na
universidade (RODRIGUES, 2008).
O papel do ProUni na promoção da inclusão social foi trabalhado por Santos (2011).
Utilizando a técnica de grupos focais, o autor abordou acessibilidade e inclusão/exclusão,
ascensão social, preconceito, estigmas e deficiências do ensino. Constatou-se que estudantes
de baixa renda têm acesso ao ensino superior, mas em IES privadas acabam sendo submetidos
a novas experiências de exclusão, ao tempo que convivem com grupos socioeconomicamente
distintos.
política pública do Estado Capitalista, que age em benefício das estratégias empresariais das
Instituições de Ensino Superior Privadas (IESP). A receita líquida e o lucro são aumentados,
sendo, assim, garantida uma melhora significativa dos resultados econômicos e da
organização acadêmica das IESP.
estar mais a favor da IES do que dos alunos. Afirmam que o ProUni ressalta o desvio do
Brasil em relação à privatização do ensino superior.
Catani e Giliolli (2005) caracterizam o ProUni como um programa voltado a
promover o acesso – e não a permanência – de estudantes de baixa renda ao nível superior. Na
opinião desses autores, enquanto a adesão ao programa amplia o poder das IES, resolvendo o
problema de vagas ociosas e evasão de alunos em virtude da falta de recursos para
pagamentos de mensalidades, aos bolsistas do ProUni é oferecida uma cidadania de segunda
classe, ficando estes abandonados à iniciativa privada.
Também de forma crítica, Catani et al. (2006) apresentam o programa em termos
numéricos, avaliam-no como de impacto popular, privatista e de baixo custo orçamentário,
afirmando que o MEC optou por conceder benefícios em vez de promover direitos. Além
disso, consideram que até como mera política assistencialista o ProUni é fraco, uma vez que
abre o acesso à educação superior, porém pouco se preocupa com a permanência do
estudante, elemento fundamental para a democratização do ensino superior. Conclui-se que é
atribuído às IES privadas a responsabilidade de assegurar a permanência do estudante
bolsista.
Sob uma perspectiva mais positiva, na área de Políticas Públicas, Amaral e Oliveira
(2011) publicaram dois artigos, nos quais avaliam o impacto da conclusão do ensino superior
no bem-estar dos alunos, a partir de indicadores como renda, inserção no mercado de trabalho
e ascensão profissional. Utilizando questionários respondidos por seis bolsistas, os autores
apontam que os egressos consideram o programa positivo para a obtenção de colocação no
mercado de trabalho e aumento da renda familiar.
Na área da Educação, Oliveira e Molina (2012) estudaram os desafios e implicações
do ProUni nas práticas institucionais de uma IES da região metropolitana do Vale do Aço e a
efetividade do programa para o acesso de estudantes negros da mesma região. De acordo com
depoimentos de professores entrevistados, os quesitos cor/raça não são evidenciados, não
sendo possível identificar quem são esses estudantes, a não ser em situações em que o próprio
bolsista se manifeste como prounista.
Utilizando 163 questionários de pesquisa respondidos por bolsistas e entrevistas
individuais, Santos (2012) analisou a inserção de Prounistas na PUC-Rio, buscando traçar o
perfil socioeconômico destes, identificando incentivos e dificuldades para a permanência no
curso. Afirma que o programa funcionou como um mecanismo positivo de inclusão na
instituição de grupos historicamente excluídos da educação superior, porém aponta a
necessidade de mecanismos que garantam a conclusão do curso (SANTOS, 2012b).
50
certa variação dos fundamentos jurídicos e políticos inerentes a este tipo de política (VERAS,
2006). A constitucionalidade dessas políticas tem sido vigorosamente questionada desde suas
implementações. Leis foram promulgadas e desafios judiciais empreendidos, havendo
posições favoráveis e contrárias à diversificação racial nas universidades públicas (PALMER
et al. , 2013).
Além de altamente competitivos, os processos admissionais das instituições de
ensino superior no país são bastante controversos. Niu e Tienda (2010) apontam que, após a
proibição de considerar o critério de raça em seus processos admissionais, as universidades
estadunidenses têm buscado critérios alternativos de admissão que possibilitem a ampliação
da diversidade, de forma a não ferir a lei e, ao mesmo tempo, assegurar que a meritocracia
seja respeitada.
No estado do Texas, em resposta a referida proibição legal, criou-se uma legislação,
conhecida como Lei Top 10%, que estabelece um modelo de processo seletivo que garante
admissão a 10% de alunos, oriundos de escolas públicas, com melhor desempenho em suas
classes. A filosofia por detrás da referida política é possibilitar que, independente de status
econômico, local de residência ou etnia, todos os melhores alunos possam frequentar as
principais universidades (NIU; TIENDA, 2010).
Oliven (2007) aponta que, ainda na década de 1960, a Universidade da Califórnia foi
uma das primeiras instituições de ensino a estabelecer programas de ampliação do acesso das
minorias em sua comunidade acadêmica. Chegou a contemplar, no ano de 1994, 21% de
calouros pertencentes a grupos minoritários. Porém, em julho de 1995, suspendeu a adoção de
programas de ação afirmativa com base em critérios raciais. No ano de 2001, a instituição
passou a admitir automaticamente, em campi e cursos menos concorridos, alunos oriundos de
escolas públicas com desempenho superior, indiretamente possibilitando o aumento na
diversidade racial dos alunos admitidos.
Decorrente das controvérsias que envolvem essas políticas sensíveis à raça, muitas
IES estão abandonando o uso de ações afirmativas, que poderiam viabilizar o aumento da
diversidade racial em seus campi. As ações remanescentes têm se mostrado insuficientes para
impedir o desânimo e a desistência de estudantes pobres e negros em aventurar-se num
universo cultural altamente centrado nos valores dos grupos étnicos dominantes – europeus e
asiáticos (PALMER et al. , 2013).
Os progressivos questionamentos gerados em torno da questão da implementação das
ações afirmativas por critério étnico-racial integram um processo que, na opinião de Veras
(2006), se movimenta em direção a um modelo mais “flexível” de ação afirmativa, no qual se
53
da Constituição Federal, o princípio da igualdade assevera que “todos são iguais perante a lei,
sem distinção de qualquer natureza”. Ao afirmar a igualdade, estabelece-se o direito formal de
tratamento igualitário, contudo, a proclamação jurídica por si só é insuficiente para reverter o
quadro social brasileiro, dado que o histórico da sociedade brasileira é marcado por um longo
período de escravidão e o status de inferioridade e de discriminação dos grupos sociais
continuam sendo reproduzidos. A Constituição não se limita a proibir a discriminação. Ela
permite também a utilização de medidas que possibilitem uma implementação efetiva da
igualdade material (BARBOSA, 2005). Rompendo com o mero estabelecimento da igualdade
formal, o artigo 3º do texto constitucional admite a existência de uma desigualdade material a
ser combatida (GRAMPA, 2013), determinando entre os objetivos da República brasileira a
erradicação da pobreza e da marginalização; a redução das desigualdades sociais e a
promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação, sendo as ações afirmativas condutas ativas por meio das
quais se busca promover a igualação.
Para o alcance desses objetivos, a atuação ativa do Estado é requerida e as ações
afirmativas visam propiciar a efetiva igualdade de oportunidades a que todos os seres
humanos têm direito (BARBOSA, 2005). Voltadas à garantia da concretização do princípio
constitucional da igualdade material, as ações afirmativas têm como objetivo não apenas
coibir a discriminação, mas, sobretudo, eliminar os “efeitos persistentes” da discriminação do
passado, cujos reflexos são manifestos nas imensas desigualdades sociais existentes em nossa
sociedade (BOLONHA; TEFFÉ, 2012). Esses autores argumentam que, embora formalmente
assegurado constitucionalmente, não foram dispostos mecanismos capazes de garantir
efetivamente tal direito à igualdade.
Bolonha e Teffé (2012) apontam que, permeadas por debates doutrinários em relação
ao princípio de igualdade, nos últimos anos, as ações afirmativas têm oferecido tratamentos
positivos diferenciados, por meio de leis infraconstitucionais, políticas públicas e projetos,
visando promover a igualdade fática entre os cidadãos. As ações afirmativas fundamentam-se
na máxima de que se deve tratar de forma desigual os desiguais, na exata medida de suas
desigualdades.
As ações afirmativas podem ser implementadas por meio de diferentes modalidades e
técnicas, tais como sistema de bônus, incentivos fiscais, estabelecimento de preferências
(BARBOSA, 2005), porém, no cenário brasileiro, as ações afirmativas estão representadas
essencialmente nos programas de cotas, por meio de medidas que contemplam,
55
por expandir o acesso ao ensino superior mediante utilização de vagas que se encontravam
ociosas nas IES privadas. O discurso do governo é de que buscam a democratização do acesso
ao ensino superior e correção das desigualdades via ação afirmativa, entretanto, na opinião de
alguns estudiosos do tema, a medida se configura para as minorias como um benefício ao
invés de um direito (GRAMPA, 2013; CATANI et al. , 2006), e para as IES privadas como
mais uma intervenção do governo em favor das elites dominantes.
outra leitura, feita por Almeida (2006), que argumenta que o ProUni surge como uma
operação de salvamento para o setor privado, devido à profunda crise pela qual passavam as
IES privadas.
em 1990 o IDH brasileiro era de 0,549 e em 1980 de 0,600. Acerca dos níveis de escolaridade
do país, a expectativa era de que o Brasil alcançasse uma média de 13,8 anos de escolaridade
por indivíduo, porém, até o fechamento do relatório, em 2011, a média obtida foi de 7,2 anos
de escolaridade, índice muito aquém do desejado.
Outra forma de análise das condições socioeconômicas de um país é o coeficiente
Gini, fornecido anualmente pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), que mede
o grau de desigualdade na distribuição da renda domiciliar per capta entre indivíduos. Na
variação de valor zero significa que não há desigualdade de rendas e um representa
desigualdade máxima. De acordo com esse índice, em 1991, o Brasil tinha um grau de
desigualdade de 0,63; em 2000, alcançou 0,64, abaixando em 2010 para 0,60, na média
nacional. Os índices nacionais colocam o Brasil entre os seis piores do mundo em termos de
desigualdade social.
Os dados expostos validam o argumento de Nogueira (2013), que indica que o Brasil
não é um país pobre, mas, sim, um país com muitos pobres, no qual existe uma distribuição
de renda perversa e as oportunidades de inclusão econômica, cultural e social para a camada
pobre são poucas.
A sociedade brasileira é caracterizada por extrema desigualdade espacial, de renda e
de oportunidades e essas desigualdades se refletem na educação e nas oportunidades de acesso
ao mercado de trabalho (NOGUEIRA, 2013). Abordar temas sociais no Brasil significa
observar sempre essas questões, pois, comprovadamente, maiores níveis de escolaridade
garantem melhores oportunidades de inserção qualificada no mercado de trabalho. Embora,
como sinalizado por Barbosa (2005), a educação seja o mais importante bem que o indivíduo
recebe ou deve receber do Estado, sob a alegação de não poder fornecê-la de forma universal,
os recursos têm sido destinados à educação da elite. Dado que, historicamente, a exclusão
educacional tem sido reproduzida, significativa parcela da população brasileira tem estado à
margem do acesso a melhores oportunidades profissionais e, por conseguinte, sociais.
A redução das desigualdades sociais e regionais consiste da equalização das
oportunidades de acesso à educação de qualidade, e figura como um dos objetivos do Plano
de Desenvolvimento da Educação (PDE), lançado pelo governo federal (BRASIL, 2009). A
inclusão social integra os temas prioritários do discurso político contemporâneo, como
instrumento de constituição da cidadania e de consolidação da democracia em bases justas
(KRAINSKI, 2011). Assegurada como direito constitucional, a educação apresenta-se como
um meio de acesso à cidadania, de reversão das desigualdades sociais e, portanto, de inclusão
social.
59
mesmo mês e ano, foi produzida a fundamentação legal para que o setor privado educacional
brasileiro pudesse ter características lucrativas. Nessa mesma compreensão, Jezine et al.
(2011) afirmam que a LDB/96 se constituiu um instrumento legal para a expansão acelerada
da educação superior pela via da privatização, materializando os acordos com o Banco
Mundial acerca da diversificação institucional.
Embora não se possa reduzir a educação à dimensão econômica, é notável que o
modelo hegemônico do neoliberalismo não se limita à atividade econômica, tendo especial
reflexo na educação, não mais concebida como um bem social, mas como um produto
comercial, figurando na agenda da globalização neoliberal a partir do conceito de qualidade e
da ideia de educação para todos (JEZINE et al. , 2011).
A meta para a educação, estabelecida no Plano Nacional de Educação (PNE),
aprovada em 2001, era de que o Brasil alcançasse, até o final de 2010, um percentual de 30%
dos jovens, entre 18 e 24 anos, cursando o nível superior (AMARAL; OLIVEIRA, 2011).
Embora dentre os objetivos declarados do PNE encontrem-se a elevação global do nível de
escolaridade da população, a melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis, a redução
das desigualdades sociais e regionais no tocante ao acesso e à permanência, com sucesso, na
educação pública (ALMEIDA, 2006), o governo recorreu ao setor privado, a fim de atingir
essa meta, pois não dispunha de infraestrutura ou pessoal suficiente para isso, uma vez que
não foram priorizados investimentos na educação superior pública (PELEIAS et al. , 2012).
Conceitualmente, para que um sistema seja caracterizado como de massa, este deve
absorver de 15 a 33% da população e para ser considerado universal deve absorver mais de
33% (GUERRA; FERNANDES, 2009). O ProUni foi criado com a missão de democratizar o
ensino superior no Brasil. No entanto, Prestes, Jezine e Scocuglia (2012) consideram
procedente atentar para o fato de que a massificação da educação superior não significa a
queda da tradicional universidade elitista. De acordo com esses autores, a expansão do canal
de acesso ao ensino superior no país, embora represente iniciativas significativas no plano da
democratização do acesso, não possui força suficiente para derrubar a muralha da diferença de
classe social.
passou a atender mais aos interesses de instituições privadas para preenchimento das vagas
ociosas do que a reforçar seu caráter de democratização em relação ao ensino superior.
A despeito do texto da Medida Provisória da Presidência, que institui o Programa,
asseverar que “toda a atuação política relativa ao marco regulatório do ensino superior foi
orientada de forma a buscar a formação de um amplo consenso, incorporando reivindicações e
sugestões de todos os setores envolvidos” (BRASIL, 2004), Guerra e Fernandes (2009)
apontam que as análises da evolução da tramitação do PL até a aprovação final da Lei
mostram que as IES privadas foram o grupo mais ouvido em suas reivindicações, reforçando
opinião contrária ao discurso de democratização.
O texto da Lei estabelece que as instituições com ou sem fins lucrativos e não
filantrópicas concederão uma bolsa integral para cada 10,7 alunos pagantes ou, de forma
alternativa, uma bolsa integral para cada 22 pagantes, com quantidades adicionais de bolsas
parciais (50% e 25%), até atingir 8,5% da receita bruta da IES.
As IES beneficentes devem obrigatoriamente conceder 10% de sua receita bruta em
bolsas integrais para alunos prounistas e destinar outros 10% de gratuidade em bolsas parciais
de 50% e bolsas assistenciais. Para as instituições particulares, com ou sem fins lucrativos, a
participação no programa é voluntária, firmada mediante termo de adesão, enquanto para as
instituições filantrópicas a adesão ao programa e a concessão de bolsas integrais são
obrigatórias. Santos (2011) aponta que o prazo de adesão é de dez anos, podendo ser
renovável pelo mesmo período de tempo, havendo permissão para permutação de bolsas entre
cursos e turnos, até o limite de um quinto das bolsas oferecidas para cada curso e turno.
Guerra (2009) argumenta que, por possibilitar a inclusão no ensino superior de um
estrato da população que não teria acesso a esse nível educacional, devido a limitação de
oferta na rede pública, o ProUni foi apresentado revestido por um discurso de justiça social e
desenvolvimento econômico. No entanto, os discursos oficiais do governo dificilmente
referem-se às pressões exercidas por grupos de interesse das instituições de ensino superior,
cenário marcado por alta concorrência e ociosidade de quase metade das vagas ofertadas.
bolsistas de tempo integral cujas cargas horárias de estudo excedam seis horas diárias, o
número de bolsas disponíveis é baixo, sendo concedidas a um número ainda muito limitado
de alunos; e o valor pago insuficiente para suprir as demandas dos contemplados (PROUNI,
2013).
O ProUni tem sofrido duas críticas básicas: Em primeiro lugar, as instituições de
ensino privadas com status de filantrópicas, que estão submetidas a regras bastante rigorosas,
alegam que para as instituições lucrativas e sem fins lucrativos não beneficentes as regras
mostram-se bem mais flexíveis. A segunda vem dos defensores do ensino gratuito oferecido
pelo Estado que condenam qualquer destinação de recursos públicos a entidades particulares,
pois creem que o melhor seria revertê-los às instituições públicas (ALMEIDA, 2009).
Em análise realizada por Ferreira (2012b) acerca da eficiência do ProUni comparada
à expansão das instituições públicas, o autor aponta que, embora custos muito menores sejam
esboçados com a opção pelo Programa, perpetuar as instituições públicas restritas à classe
mais favorecida, ampliando o acesso dos mais pobres apenas às IES privadas, constitui-se
uma forma de eternizar as disparidades sociais e a discriminação. Entretanto, a promulgação
da Lei 12.711, em 29 de agosto de 2012, com caráter de política de ação afirmativa do
governo federal, que implementa uma reserva de 50% de todas vagas em instituições federais
de ensino às cotas para alunos que tenham estudado em escolas públicas durante toda sua
formação básica, também objetiva reparar essas desigualdades e discriminações.
Para Carvalho (2006) e Catani, Hey e Giliolli (2006), o ProUni aparece como uma
política pública que mascara seu verdadeiro propósito, qual seja: expandir o ensino superior
sem aumentar os gastos do governo, atendendo a um só tempo à demanda da sociedade civil
por mais vagas e os interesses privatistas, na medida em que os bolsistas ocupam as vagas
ociosas das Instituições de Ensino Superior Privadas.
Embora na meta estabelecida no PNE o alvo fosse possibilitar que, no ano de 2010,
30% dos jovens na faixa etária entre 18 e 24 anos estivessem cursando o nível superior, de
acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) somente 13,7%
da população nessa faixa etária estava matriculada no ensino superior em 2009 (AMARAL;
OLIVEIRA, 2011).
66
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Este estudo é uma pesquisa qualitativa interpretativa básica, do tipo descritiva, uma
vez que se busca obter uma compreensão mais aprofundada acerca de um fenômeno social. A
abordagem qualitativa interpretativa básica está interessada em como os significados são
construídos, em como indivíduos dão sentido às suas vidas e aos seus mundos, sendo o
objetivo principal desse tipo de estudo descobrir e interpretar esses significados (MERRIAM,
2002). Para a realização de pesquisas cujo propósito seja a descrição de uma situação social
circunscrita, na qual se busca obter detalhes acerca do fenômeno, conforme objetiva esse
trabalho, Deslauriers e Kérisit (2008), entendem que o método qualitativo melhor se aplica.
Esses autores indicam ainda que a adequação desse método se dá também pelo fato de que o
objeto por excelência da pesquisa qualitativa é a ação interpretada, tanto pelo pesquisador
quanto pelos seus sujeitos de pesquisa.
A abordagem qualitativa busca atentar para aspectos relacionados com a condição
específica do sujeito no mundo. Merriam (2002) assinala que o método incorpora um amplo
“guarda-chuva” de orientações teóricas e filosóficas, das quais as mais comuns são a
interpretativista, a crítica e a pós-modernista. Em comum às diferentes orientações está a
busca por significados e compreensões, sendo papel do pesquisador instrumentalizar a coleta
e análise de dados, a fim de fornecer uma descrição e enriquecer a compreensão do fenômeno.
As pesquisas qualitativas estão interessadas em compreender o que as interpretações
significam em um tempo específico e em um contexto particular.
No paradigma interpretacionista, a realidade social é entendida como uma rede de
representações complexas e subjetivas e cabe ao pesquisador buscar compreender e explicar o
mundo social a partir do ponto de vista das pessoas envolvidas nos processos sociais,
atentando-se para a experiência subjetiva dos indivíduos (VERGARA; CALDAS, 2007). Essa
abordagem mostra-se apropriada para o alcance do objetivo de compreender a dinâmica de
inclusão e/ou exclusão dos alunos do ProUni, o que envolve a interpretação de uma situação
social pela percepção subjetiva dos atores envolvidos.
67
de semestres finais e o grupo de professores. A opção por contemplar de forma distinta alunos
de semestres iniciais e de finais deve-se à busca do entendimento da dinâmica de inclusão e
ou exclusão do aluno durante a formação.
Os alunos participantes foram abordados por meio de um e-mail convite,
configurando-se um critério voluntário de participação. Foram convidados apenas alunos de
segundo e terceiro semestres para compor o grupo de semestres iniciais, uma vez que, apesar
de terem uma chegada recente à Universidade, já obtiveram uma percepção do ambiente
acadêmico. Da mesma forma, a fim de obter uma leitura de maior extensão, alunos de oitavo,
nono e décimo semestres integram o grupo de semestres finais.
A fim de evitar a possibilidade de identificação dos alunos prounistas, os e-mails
foram enviados para os alunos das salas nos semestres de interesse, por meio dos
representantes de classe, ou de forma direta para e-mails de alunos prounistas, indicados por
outros alunos ou ex-alunos prounistas. Em dois momentos a pesquisadora necessitou ir a uma
sala de aula, e, com a devida autorização do professor, expor a proposta de pesquisa,
convidando alunos não prounistas a colaborarem, sendo nesse caso deixado o e-mail para
contato. Três alunos não prounistas foram captados por essa forma de abordagem e os outros
três responderam ao e-mail convite.
Depois de confirmado o interesse e disponibilidade dos alunos, os agendamentos
foram feitos via e-mail, ou por telefone, quando os números eram informados. As entrevistas
foram agendadas de acordo com a conveniência de cada aluno, com exceção de um único
aluno que, embora tendo confirmado o horário de entrevista deixou de comparecer, todos os
agendamentos acordados foram devidamente cumpridos. Os encontros foram realizados
dentro do próprio campus, em sala apropriada, espaço físico confortável e reservado. Apenas
um aluno foi entrevistado em uma das sala de aula, fora de seu horário regular de curso.
Todos os entrevistados mostraram-se bastante receptivos e colaborativos.
No geral, as entrevistas com os alunos prounistas foram mais longas, em função dos
roteiros previamente elaborados para esse grupo serem mais extensos, tendo uma duração
média de cinquenta minutos. Quanto ao grupo de alunos não prounistas, uma das entrevistas
excedeu uma hora de duração, ficando as outras dentro de uma média de trinta minutos, o
mesmo ocorrendo no caso dos professores.
Como critério para escolha do curso de Direito, buscou-se contemplar um curso que
na hierarquia interna entre carreiras no Brasil é considerado imperial (VARGAS, 2010), e que
dentro da IES pesquisada desfruta de tradição e reconhecimento. Com cerca de seis mil alunos
matriculados, consequentemente, oferta grande número de bolsas ProUni, tendo, portanto,
69
uma maior concentração de alunos prounistas nas turmas. O curso de Direito da instituição
conta atualmente com 513 alunos prounistas matriculados, sendo 189 homens e 324 mulheres.
Dentre os alunos prounistas manteve-se uma composição equilibrada entre homens e
mulheres. Para composição dos sujeitos buscou-se respeitar uma proporção entre alunos
prounistas e não-prounistas, porém, por tratar-se de uma pesquisa de natureza qualitativa, a
determinação do número de entrevistas realizadas com alunos prounistas condicionou-se ao
alcance da saturação ou redundância que, de acordo com Godoi e Mattos (2006), refere-se à
percepção que o pesquisador tem de que nada de novo está sendo apreendido pela expansão
do número de sujeitos pesquisados.
A etapa de análise visa dar sentido aos dados coletados e demonstrar como esses
respondem ao problema de pesquisa. Principalmente em pesquisas de natureza qualitativa, a
análise ocupa lugar central (DESLAURIERS; KÉRISIT, 2008). Nas ciências humanas, a
análise de conteúdo constitui-se um instrumento disponibilizado para análise de
comunicações, sendo compreendida como:
Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por
procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de
conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis
inferidas) destas mensagens (BARDIN, 2007, p. 42).
Merriam (2002) ressalta que, embora toda análise de dados qualitativos seja indutiva,
existem diferentes estratégias de análise. Neste trabalho utiliza-se a técnica de análise de
conteúdo para análise dos dados obtidos nas entrevistas. O método, ou conjunto de técnicas,
visa a superação da incerteza, ou seja, garantir que o pesquisador veja no texto aquilo que
efetivamente está nele contido, bem como propiciar um enriquecimento da leitura, permitindo
descobertas de conteúdos e estruturas que confirmem ou neguem o que se busca demonstrar,
esclarecendo significações e mecanismos ainda incompreendidos (BARDIN, 2007).
Embora a análise de conteúdo também possa ser feita por uma abordagem
quantitativa, seguindo uma orientação mais descritiva do conteúdo e utilizando o método de
dedução frequencial para enumerar a frequência com que uma determinada característica de
conteúdo aparece no texto, este trabalho adotou uma abordagem qualitativa, na qual as
análises são feitas por categorias temáticas; as inferências – sempre que realizadas – são
70
Identificação
Quem eles dizem que são
Identidade Social
72
Desempenho
Dificuldades Obstáculos do Caminho
Desigualdades
Ambientação
Dinâmica de sala
Grupo de Convivio Relações Interpessoais
Grupo de Trabalho
Atividades Sociais
Estereótipos
Preconceito
Manifestações Intergrupais
Discriminação
Os agentes
uma fase intermediária, na qual ele faz inferências, ou deduções lógicas, que o permitem
chegar às interpretações, ou seja, extrair as significações existentes no conteúdo comunicado,
alcançando, assim, a mensagem entrevista por meio, ou ao lado, da mensagem primeira. Esse
procedimento foi adotado na discussão dos resultados deste trabalho. A autora aponta que o
objetivo é descobrir, a partir de significantes ou de significados (manipulados), outros
significados. Os novos significados ou saberes deduzidos dos conteúdos podem ser de
natureza psicológica, sociológica, histórica, política ou econômica, não necessariamente
esgotando-se nessas variáveis. Aqui se busca compreender a dinâmica de inclusão/exclusão
do aluno prounista, pela percepção subjetiva dos atores envolvidos e pela lente do
pesquisador.
Procedendo a idas e vindas ao material de análise, para instrumentalização, buscou-
se, por meio da inferência e da interpretação, realçar sentidos que se encontram “por detrás”
da mensagem transmitida, articulando os elementos característicos que constam na superfície
do texto com os fatores que determinaram essas características, estabelecendo uma
correspondência da análise descritiva e as variáveis inferidas (BARDIN, 2007).
Buscando seguir o rigor metodológico e ao mesmo tempo ir além das aparências, por
meio de um processo dedutivo, busca-se identificar as causas antecedentes da mensagem e as
suas consequências, ou possíveis efeitos dela, e alcançar os conhecimentos que se encontram
subjacentes ao conteúdo expresso da mensagem. Conforme apontado por Bardin (2007, p.42),
a intenção da análise de conteúdo é “a inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção ou, eventualmente, de recepção (quem é que fala a quem e em que circunstâncias),
inferência esta que recorre a indicadores (quantitativos ou não)”. Os conteúdos deduzidos
podem ser de naturezas diversas, podendo estar apoiados nos referenciais teóricos; busca-se
estabelecer uma correspondência entre as estruturas semânticas ou linguísticas contidas na
mensagem, e as estruturas psicológicas ou sociológicas dos enunciados, possibilitando que
situações concretas sejam visualizadas segundo o contexto histórico e social de sua produção.
Uma análise objetiva procura fundamentar impressões e juízos intuitivos, por meio
da adoção de procedimentos que conduzam a um resultado de confiança, visando atribuir
significação ao texto, de modo a alcançar resultados que sejam ricos e válidos, produzindo
uma interpretação final fundamentada (BARDIN, 2007). Os trechos considerados relevantes
aos objetivos da pesquisa foram discutidos à luz da teoria e em diálogo com pesquisas
anteriores e com os dados fornecidos pela IES, sendo os discursos analisados de forma
alternada, por vezes fornecendo uma narrativa individualizada e em outros momentos pela
74
composição dos diferentes discursos. Porém o estudo se propõe a compreender o quadro geral
da dinâmica, mais do que fornecer análises individuais.
Para melhor manuseio do material e facilitação da construção das categorias foi
utilizado o Software QSRNVivo10. Ferramentas como o NVivo, conforme apontado por Lage
e Godoy (2008), possuem facilidades para a codificação dos dados (atribuição de nomes para
porções de textos, de acordo com as especificações do pesquisador). Permitem também que
sejam feitos reagrupamentos dos textos já codificados, que estes sejam pesquisados e
recodificados, facilitando a geração de ideias, possibilitando uma proximidade entre o
pesquisador e seus dados.
4. RESULTADOS
Grande parte dos alunos que adentram a IES pesquisada não conclui a graduação. A
Tabela 4 apresenta os principais motivos pelos quais os encerramentos se dão. Numa
perspectiva mais macro, já foram aqui brevemente expostos o contexto político-econômico,
socioeconômico e educacional brasileiro, e discutida a relevância da educação para a mudança
deste. A abrangência do Programa ProUni, enquanto oportunidade para a mobilidade social de
grande parcela da população, no âmbito nacional, estadual e local foi aqui exposta, e
demonstrado o grande interesse de pesquisa que o tema tem despertado. Já apresentado o
cenário mais amplo, busca-se aqui uma aproximação à experiência individual dos alunos
bolsistas do ProUni em um contexto local, a partir das teorias básicas abordadas e que
fundamentarão essa aproximação.
Os alunos respondentes dessa pesquisa estão divididos em dois status: prounistas e não
prounistas. O primeiro grupo de alunos é composto por seis homens e seis mulheres, com uma
faixa etária média de 22 anos, sendo que dez desses alunos se autodeclaram brancos e dois
pardos. Dois homens e quatro mulheres integram o grupo de não prounistas, dos quais cinco
78
se autodeclaram brancos e um pardo. Uma síntese do perfil geral dos entrevistados, com
detalhamento da cidade e do tipo de escola de origem, semestre e período e sigla atribuída ao
sujeito é apresentada no Quadro 2.
Sujeito Sexo Idade Semestre Período Status Escola Origem Cidade Autode claração Cor Sigla
1 Masc 24 Inicial Manhã Prounista Publica Sorocaba - SP Branca P1H - IM
12 Fem 24 Finais Manhã Prounista Publica Mogi das Cruzes - SP Branca P12M-FM
13 Masc 19 Inicial Noturno Não Prounista Part/Publ São Paulo - SP Branca NP1H-IN
14 Fem 24 Inicial Manhã Não Prounista Part/Publ São Paulo - SP Branca NP2M-FM
15 Fem 20 Inicial Manhã Não Prounista Particular São Paulo - SP Branca NP3M-IM
16 Masc 46 Finais Noturno Não Prounista Publica São Paulo - SP Parda NP4M-FN
17 Fem 24 Finais Manhã Não Prounista Particular São Paulo - SP Branca NP5M-FM
18 Fem 22 Finais Noturno Não Prounista Particular São Paulo - SP Branca NP6-FN
1,2,3 Sujeito nº
Atualmente cursa o segundo semestre de Direito no período noturno e está estagiando na área
jurídica.
P4M-IN – Sexo feminino, 19 anos, solteira, branca, estudante de escola pública. Seus pais
cursaram até a 4ª série e são trabalhadores rurais. Fez um ano de cursinho, trabalhando de
madrugada para custeá-lo. Veio do interior de São Paulo após conseguir uma bolsa do
ProUni, em outra faculdade menos conceituada (RUF, 2014). Como seu irmão estava
concluindo o curso de Direito na IES pesquisada, com bolsa do ProUni, tentou no semestre
seguinte, uma bolsa para si e conseguiu. Atualmente cursa o segundo semestre de Direito no
período noturno e trabalha em um escritório de advocacia, com vínculo CLT. Mora com o
irmão, em apartamento próximo à faculdade.
P5M-IN – Sexo feminino, 22 anos, parda, estudou no SESI, em virtude de seu pai atuar no
ramo industrial. Veio da cidade de Jaú, interior de São Paulo, após conseguir a bolsa do
ProUni. Sua mãe é cuidadora de idosos e está fazendo curso técnico em Enfermagem, o pai
estudou até a 8ª série e é calçadista. Trabalhou em um shopping center dos 15 anos até vir
para São Paulo. Divide um apartamento com três amigas, próximo à faculdade. Atualmente
cursa o terceiro semestre de Direito no período noturno. Conta com ajuda dos pais e recebe
uma bolsa de pesquisa da IES, valor com o qual paga seu aluguel.
P6M-IM – Sexo feminino, 19 anos, branca, estudante de escola pública. Relata que em sua
escola havia falta de professores na maioria das matérias, até concluir o ensino médio.
Desenvolveu a disciplina de estudar por conta própria, que a ajudou a conseguir a bolsa do
ProUni. A mãe estudou até a 4ª série e é dona de casa; o pai tem ensino médio incompleto e é
comerciante. Mora com os pais e dois irmãos na cidade de Suzano e demora quase três horas
para deslocar-se diariamente até a faculdade. Atualmente cursa o segundo semestre de Direito
no período da manhã e não está estagiando.
P7H-FN – Sexo masculino, 25 anos, pardo, estudante de escola pública, já conseguiu quatro
vezes bolsas do ProUni. Mora com a mãe em casa própria, na cidade de Carapicuíba, interior
de São Paulo, o pai é falecido. A mãe possui ensino médio incompleto e é dona de casa; o pai
estudou somente a 1ª série e exercia a profissão de pedreiro. Está concluindo o décimo
semestre do curso de Direito no período noturno. Durante os dois primeiros anos da faculdade
trabalhava com Telemarketing e a partir do terceiro passou a estagiar em escritórios de
advocacia; com a conclusão do curso será efetivado.
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P8H-FM – Sexo masculino, 22 anos, branco, solteiro, estudante de escola particular com
bolsa, o que permitiu conseguir a bolsa do ProUni. Seus pais possuem formação superior em
Educação Física e são administradores de academia. Mora com a mãe em apartamento que
adquiriram recentemente pelo programa Minha Casa Minha Vida. Está concluindo o décimo
semestre do curso de Direito no período da manhã, mas não gosta da área. Estagiou durante
alguns semestres e com esses recursos conseguiu fazer um intercâmbio para os EUA.
P9H-FM – Sexo masculino, 29 anos, branco, solteiro, estudante de escola pública. É de São
Lourenço, Minas Gerais e veio pra São Paulo após conseguir a bolsa do ProUni. Filho de
comerciantes, seus pais possuem ensino médio incompleto. Mora com mais quatro pessoas
em apartamento próximo a faculdade e divide aluguel. Está concluindo o décimo semestre do
curso de Direito no período da manhã. Fez estágios em órgãos públicos e quer atuar nesse
setor. Tem prestado concursos. Considera como única deficiência de sua formação o fato de
não ser fluente em inglês.
P10H-FN – Sexo masculino, 21 anos, branco, solteiro, foi estudante de escola pública. Mora
com os pais na cidade de Guarulhos, em casa própria. Sua mãe tem formação superior e é
professora; o pai possui ensino médio completo e é funcionário Público. Atualmente cursa o
nono Semestre de Direito no período noturno. Estagia desde o começo da faculdade,
inicialmente em escritório de advocacia, para obter maior remuneração e mais recentemente
passou a estagiar na área pública, que é a área que mais gosta.
P11M-FM – Sexo feminino, 23 anos, branca, solteira, estudante de escola particular desde a
primeira série, sempre com bolsa integral. Mora com os pais em Itapecerica da Serra, em casa
própria. Seus pais possuem ensino médio incompleto, a mãe é dona de casa e o pai é
vendedor. Está concluindo o décimo semestre do curso de Direito no período da manhã. Fez
estágios em órgãos públicos, área na qual quer fazer carreira.
P12M-FM – Sexo feminino, 24 anos, branca, solteira, estudante de escola pública. Mora com
a mãe em Mogi das Cruzes e usa como meio de transporte até a IES o ônibus fretado. O pai é
falecido e era Policial Civil; a mãe possui formação superior completa e é professora. Contou
com recursos deixados pelo pai para custear-se durante o período da faculdade. Está cursando
o nono semestre do curso de Direito no período da manhã. Fez 11 meses de estágio, mas teve
dificuldade em conciliar a graduação e o estágio morando longe e optou por sair.
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NP4M-FN – Sexo masculino, 46 anos, pardo, casado, estudou em escola pública e indica ser
de origem humilde. Mora com a esposa em São Paulo. Custeia o seu próprio curso e está
concluindo o décimo semestre do curso de Direito no período noturno, sendo esta a sua
segunda formação. Exerce carreira profissional na área de Ciências Contábeis e pretende fazer
outra graduação para atualizar-se, uma vez que o curso que fez já sofreu várias alterações
desde que se formou.
NP5M-FM – Sexo feminino, 24 anos, branca, casada, estudou em escola particular. Mora
com o marido, na cidade de São Paulo. Seus pais possuem formação superior, sendo que a
mãe exerce a função de corretora de imóveis e o pai é advogado. Fez um ano e meio de
Comércio Exterior, mas, como não gostou do curso, mudou para Direito. Cursa atualmente o
nono Semestre, no período da manhã. Está estagiando no Fórum.
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NP6-FN – Sexo feminino, 22 anos, branca, solteira, estudou em escola particular, com bolsa
integral. Mora com a mãe, padrasto e irmão, em casa própria, em bairro próximo à faculdade.
Sua mãe possui formação superior e é professora; seu padrasto é secretário geral de uma
escola renomada, motivo pelo qual obteve a bolsa integral até a conclusão do ensino médio.
Está cursando o oitavo semestre de Direito no período noturno e faz estágios desde o início da
faculdade.
4.2.5 Professores
PROF 01 – Sexo feminino, branca, foi convidada a participar da pesquisa por exercer funções
de coordenação no curso de Direito.
PROF 02 – Sexo feminino, branca, foi convidada a participar da pesquisa por haver sido
citada por alunos prounistas durante suas entrevistas.
PROF 03 – Sexo masculino, branco, foi convidado a participar da pesquisa por haver sido
citado por alunos prounistas durante suas entrevistas.
PROF 04 – Sexo masculino, negro, foi convidado a participar da pesquisa por haver sido
citado por alunos prounistas durante suas entrevistas.
Para o processo de análise dos dados, a primeira atividade realizada foi a leitura
flutuante de cada entrevista. Após contato com o material, realizou-se a codificação dos
dados, sendo estes agrupados por blocos temáticos e, em seguida, criadas as categorizações
dos conteúdos que emergiam do texto. Cada tema abordado foi minuciosamente detalhado e
organizado em subcategorias. Por fim, surgiram dez categorias: 1. Importância e impacto do
ProUni e da IES; 2. Quem são eles; 3. Quem eles dizem que são; 4. Obstáculos do Caminho;
5. Nós e Eles; 6. Relações Interpessoais; 7. Manifestações Intergrupais; 8. Experiência de
Inclusão; 9. Experiência de Exclusão e 10. Professor – um agente. Para melhor manuseio do
material, os dados foram codificados no Software QSRNVivo10. A partir análise dessas
categorias depreendidas, busca-se responder aos objetivos dessa pesquisa.
4.3.1.1 O ProUni
Tanto na análise dos professores entrevistados quanto dos alunos, aspectos positivos e
negativos do ProUni são ressaltados. De modo geral os professores entrevistados mostram-se
simpatizantes ao Programa, o consideram “incrível”, “um fator de inclusão”, uma forma de
fazer “uma ponte entre igualdade formal e igualdade material”, trazendo esperança para esses
alunos.
[...] é uma política pública de verdade e ela tem um alcance muito grande
(PROF 01).
Eu acho um programa maravilhoso. Eu acho que todos os programas de
inclusão do Governo Federal são programas que objetivam fazer a ponte
entre a igualdade formal e a igualdade material (PROF 02).
[...] eu sou entusiasta do ProUni em especial em relação ao tipo de público
que o ProUni traz pra dentro das universidades privadas (PROF 04).
Acho que foi uma medida, digamos, talvez mais política, no sentido de
talvez de minimizar o problema do que resolver. Mas antes isso do que nada,
porque antigamente as pessoas que não podiam pagar simplesmente não
estudavam (PROF 03).
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Embora aspectos críticos sejam apontados, na fala dos bolsistas entrevistados percebe-
se o caráter determinante que o Programa tem para a vida desses alunos. Sendo a educação
considerada um dos mais importantes fatores de ascensão social, uma vez que a obtenção de
melhor qualificação possibilita o alcance de melhores posições profissionais e torna possível a
conquista de melhores condições de vida (RIBEIRO, 2006), o acesso a uma boa formação é
percebida como decisiva pelos prounistas entrevistados. A oportunidade de uma boa
formação, o contato com pessoas, a obtenção de posições de prestígio no mercado de trabalho
e a possibilidade de mobilidade social são vislumbrados como maiores benefícios obtidos.
Nas falas desses alunos fica perceptível que a oportunidade de acesso à educação superior
obtida por meio do ProUni é vista como meio de salvação, sendo dada uma conotação de que
estavam condenados à exclusão social, cheios de sonhos e aspirações, e que agora vislumbram
uma oportunidade de inclusão e ascensão social.
4.3.1.2 A IES
A IES pesquisada é reconhecida como uma instituição com boa qualidade de ensino.
Os principais aspectos percebidos como positivos por esses alunos são a oportunidade de
conhecimento e de pesquisas, boa qualidade dos professores, boa estrutura física, organização
e a força do nome (IES renomada), e consideram capaz de abrir portas no mercado de
trabalho, conforme destacam:
[...] eu acho que um dos pontos positivos é o incentivo à pesquisa, a
qualidade dos professores, ah... Enfim, mercado de trabalho, a qualidade das
aulas (P6M-IM).
Eu adoro a instituição, eu gosto do campus, eu gosto dos ares, eu gosto de
tudo, eu gosto de onde as coisas estão. Eu gosto do prédio, eu gosto das
pessoas, eu gosto dos atendentes, eu gosto dos faxineiros (P11M-FM).
Eu acho a organização daqui, eu sei que tem muita coisa para melhorar, mas
assim, eu gosto do jeito como eles são organizados (P12M-FM).
Eu gosto daqui. O nome no nosso currículo faz muita diferença. Se você fala
que você faz aqui, se você fala que faz X ou faz Y, as pessoas já abrem as
portas de muitos estágios, muitos empregos. Tanto é que eles querem alunos
dessas três faculdades (P1H – IM).
Uma universidade de nome, querendo ou não, esse nome conta (P8H-FM).
Esses alunos relatam uma satisfação com a oportunidade de estar estudando na IES,
externam o desejo de extrair o máximo do que a IES tem para oferecer-lhes e de ânsia pelo
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A falta de políticas internas da IES para apoio aos alunos prounistas foi apontada
como aspecto negativo, desfavorável à inclusão. P10H-FN afirma que os prounistas “[...] têm
certas vantagens... a gente não paga documentos... petição de documentos, que os alunos
comuns pagam. Agora tirando isso de facilitação burocrática mesmo, para o prounistas, não
tem mais nada”. P12M-FM lembra que para “[...] quem é muito, muito carente, é muito
difícil se manter aqui”, e P1H-IM afirma que sua expectativa era que “[...] tivesse mais
políticas” que suprissem “[...] pelo menos algumas coisas básicas”. P12M-FM acredita que a
instituição deveria “[...] ajudar a manter os alunos aqui dentro [...]. ajudar com vale-refeição,
vale-livro, eu acho. Porque eu acho que é uma instituição muito forte, que tem condições de
fazer isso”, porém não particulariza a crítica à IES, pelo contrário, compreende que “[...] não é
só aqui que não se dá assistência para o aluno bolsista, qualquer outra faculdade também não
dá”. Verifica-se que a limitação do benefício é salientada e que a expectativa de P1H-IM e de
P12M-FM é de que a IES proveja assistência que possibilite a manutenção deles, uma vez
que o Governo não concede esse apoio. Diante da ausência de outras fontes de apoio ou
políticas que extrapolem a exigência mínima estabelecida pelo Programa, compete a cada um
desses alunos superar seus próprios obstáculos.
P10H-FN aponta como outro aspecto considerado desfavorável da IES pesquisada, o
fato de que, segundo sua percepção, não é dada atenção às evasões dos alunos prounistas,
sendo estes negligenciados. A argumentação de P10H-FN é de que “[...] a faculdade, creio eu
que ela deveria saber pelo menos o porquê (os alunos se evadem) [...] porque, quando o aluno
prounista ele se desliga, a faculdade não procura saber por quê. Acho que isso é o mínimo,
entendeu... E através dessas pesquisas ela começar a fazer programas para que isso não ocorra
novamente”.
89
concedida. A visão da bolsa do ProUni como um favor ou benefício concedido, e não como
um direito, faz com que as responsabilidades e o desempenho das atividades acadêmicas
sejam “fiscalizados” de forma distinta.
Ao aderir ao Programa ProUni a IES pesquisada está simplesmente seguindo
exigência legal imposta a todas as IES de natureza filantrópica. Fazendo-se uma transposição
dos pressupostos teóricos acerca da gestão da diversidade, abordados por Thomas e Ely
(1996), para o ambiente acadêmico, é possível entender que a concessão de bolsas do ProUni
na IES, enquanto política de inclusão do diverso, restringe-se ao paradigma discriminação-
justiça, pois está limitada ao cumprimento de mandatos e força de lei, sem promover ou
facilitar a inclusão dos alunos beneficiados. Diante das lacunas institucionais existentes,
contemplar políticas de integração, proporcionar condições de permanência ou monitorar a
evasão desses alunos, são ações indicativas de que a IES, mais do que inserir esses alunos e
cumprir as cotas exigidas das instituições de natureza filantrópica, busca inclui-los. Contudo,
o que se constata é a inexistência de políticas de apoio a esses alunos, não havendo indicativos
de que haja alguma preocupação em prover ações integrativas de qualquer natureza,
acompanhamento do dia a dia desses alunos ou mesmo amparo assistencial.
Ciente da falta de políticas para suporte aos alunos dentro da IES, P12M-FM mostra-
se compreensiva e afirma que “[...] não é só aqui que não se dá assistência para o aluno
bolsista, qualquer outra faculdade também não dá”. Pesquisa realizada por Santos (2012),
indica que a PUC-Rio, antes da adesão ao ProUni, já dispunha de uma estrutura de apoio a
estudantes de baixa renda, que mostrou-se fundamental para garantir a permanência dos
alunos prounistas após a implantação do Programa. A autora sinaliza que políticas de acesso
ao ensino superior devem ser acompanhadas por medidas de suporte ao estudante durante sua
vida universitária, a fim de garantir uma formação de qualidade e a conclusão do curso. Frente
aos dados obtidos, depreende-se que aos alunos que ingressam na IES pesquisada é fornecida
uma formação de qualidade, de forma que se concede um tratamento igual para o diferente,
assegura-se o direito formal à formação, mas não é dada atenção para a desigualdade material
existente, desconsidera-se a responsabilidade institucional para além do cumprimento da lei.
Mais do que suporte assistencial, Thomas e Ely (1996) consideram que, para que os
verdadeiros benefícios da diversidade sejam obtidos, é necessário que as diferenças entre
indivíduos sejam internalizadas, de forma que consiga aprender e crescer com eles. Uma vez
que prejulgamentos tão próprios aos seres humanos, mas podem ser modificados diante de
fatos (ALLPORT, 1979), principalmente por tratar-se de um ambiente educacional, compete à
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[E seus pais têm condições de ajudar?] Acho que têm... De ajudar. E o meu
primo também. Já vai ter as despesas de casa também. Eu pensei em arrumar
o trabalho e eu mesma pagar o aluguel e deixar as outras despesas com os
meus pais (P2M – IM).
Meu pai me ajuda com o dinheiro para o transporte, mas a alimentação, se eu
quiser comer por aqui, é tudo na marmita, ou não come. Come um lanche,
traz de casa (P11M-FM).
[...] se ele é um cara expansivo, em trinta segundos ninguém sabe mais que
ele entrou depois, mas, se ele tem um outro perfil, um perfil mais calmo,
mais tranquilo [...] aí começa o nosso problema, que é um problema real.
Acerca das relações entre alunos prounistas e não prounistas em sua sala, P1H-IM
acredita que ser um aluno com bom desempenho facilita as relações, porque os outros alunos
os procuram, mas considera que “[...] não é só a qualidade, acho que tem a conversa também
[...] as pessoas que são muito boas (como alunos), mas são introspectivas não conseguem ter
tantos contatos assim”. Assim, considerando a relevância dos aspectos pessoais para as
interações sociais dos alunos entrevistados, nessa categoria apresentamos as diferenças
individuais como parte da definição de quem são esses alunos.
De acordo com a Escala Fatorial de Autoconceito, proposta por Tamayo (1981, p. 97),
o termo “retraído” descreve aquele “[...] um solitário, fechado aos outros, com uma
capacidade de relacionamento social fraca, tímido, puxado para trás”, enquanto expansivo é
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aquele que “[...] se percebe como uma pessoa social, que gosta de comunicar, aberta aos
outros, popular, desejada pelos outros”.
Com base na autodescrição de cada aluno foram criadas as classificações: retraídos e
expansivos, e cada aluno prounista enquadrado em uma delas, conforme apresentado no
Quadro 04.
Retraídos Expansivos
Sujeito Evidência Sujeito Evidência
Eu sou uma pessoa que
converso com todo mundo,
P2M - IM Eu sou mais na minha P1H - IM
mas eu não dou muita
abertura.
Gosto de brincar, sou uma
Ouço e falo menos do que a
P3H - IN P4M-IN pessoa muito brincalhona, só
maioria
tenho cara de séria, só.
Há outros que recorrem aos cursinhos comunitários e ainda aqueles que elaboram
programas pessoais de preparação.
Eu fiz cursinho comunitário. Eu fiz um cursinho comunitário que tem em
Guarulhos. Era aos fins de semana. [...] Eu fiz só os últimos seis meses do
terceiro ano do ensino médio, entendeu... O resto eu estudei por fora. (P10H-
FN).
[...] eu acabei estudando por conta própria, foi o que ajudou. [...] porque se
dependesse da escola em si... (P6M-IM).
pessoal desses alunos, por proporcionar alegria à família, como expresso na fala de P12M-
FM “[...] é legal ver minha mãe orgulhosa, falar para os vizinhos que eu estou estudando
aqui”. P6M-IM, cujos pais possuem apenas ensino fundamental; refere que quando pequena
era incentivada por eles a estudar e agora é usada como exemplo pelos pais para estimular
seus irmãos, pois agora “[...] eles sempre falam: ‘estuda. Faz igual a P6M-IM fez’”.
A grande maioria dos alunos prounistas informa trabalhar ou estagiar desde o início
do curso, sendo que apenas três alunos dos semestres iniciais ainda estão em busca de
oportunidades de estágio. Alguns alunos do grupo de não prounistas entrevistados, também
declaram estagiar mais por necessidade do que por opção e, em alguns casos, têm que ajudar
no custeio da mensalidade do curso. Dos seis alunos deste segundo grupo, dois têm as
mensalidades custeadas pelos pais e um possui condições socioeconômicas, não referindo
dificuldade para tal; dois obtiveram Financiamento Estudantil (FIES), e uma afirma que se
“[...] não tiver o meu estágio, eu não tenho condições de estar aqui”. Os três últimos casos
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denotam que a condição socioeconômica de metade desse grupo de alunos difere em algum
nível do perfil de alunos predominante na IES, caracterizada como de classe média e classe
média alta, havendo certa aproximação e identificação, pelo menos dessa metade do grupo
com o perfil social do aluno prounista.
Em síntese, a análise dos dados pessoais aponta que os alunos prounistas
entrevistados diferem do grupo de não prounistas principalmente no histórico familiar,
formação escolar anterior e condições sociais. Os alunos do ProUni são provenientes de
famílias cujos pais possuem nível de escolaridade fundamental, que desempenham atividades
profissionais que não exigem qualificação formal e desfrutam de condições socioeconômicas
restritas e, em sua maioria, estudaram em escolas públicas ou em escola particular com bolsa.
Comparado ao grupo de não prounistas entrevistados, se assemelham com metade deles, no
que se refere à necessidade de estagiar ou trabalhar para garantir a manutenção das despesas
do curso, contudo distinguem-se do perfil social predominante entre os alunos não prounistas
da instituição. Cabe observar que acentuadas diferenças entre prounistas e não prounistas
podem trazer implicações negativas para as interações entre eles, uma vez que a percepção de
similaridade é um fator importante nas relações intergrupais, e o status igual entre grupos
possibilitam que contatos sejam mais bem sucedidos (TRIANDS, 2003).
4.3.3.1 Receios
temores esses que antecedem e, em alguns casos, persistem durante a graduação, por tempos
diferentes, dependendo do processo de adaptação de cada aluno.
Em um país como o Brasil, no qual a educação superior sempre esteve destinada à
formação das elites, em que as camadas menos favorecidas da população sempre foram
negligenciadas (OLIVEIRA, 2004), a concessão de acesso a uma IES como a pesquisada
revela as distâncias sociais existentes, fazendo emergir nesses alunos um temor das
implicações que podem advir do convívio social durante o curso. Na fala de P4M-IN, citada a
seguir, constata-se que a chegada à IES é percebida como um adentrar a um lugar ao qual não
faz parte, no qual se vai “cair”. Embora P4M-IN já tivesse referências acerca da instituição,
uma vez que o irmão já estudava nela, a incerteza acerca do tipo de tratamento que receberia e
de como se sentiria diante de um grupo socialmente diverso ao seu já a inquietava antes de
obter a bolsa. P6M-IM também possuía temores acerca do novo ambiente e das pessoas com
as quais passaria a conviver e decide-se por, em um primeiro momento, omitir a informação
acerca de sua condição de prounista, até que estivesse certa de que não lhe seriam
desfavoráveis. P5M-IN relata que seu temor é compartilhado também por outros alunos e
considera que declarar-se prounista é uma informação que não se revela a qualquer pessoa,
sendo necessária uma relação de proximidade com aqueles para quem se “solta” esse tipo de
informação. A expressão “vai soltando” utilizada por P5M-IN dá uma conotação de um
segredo, que só se conta para pessoas de confiança. que sugere haver uma percepção de que
esse ambiente oferece algum tipo de risco, podendo trazer consequência negativa estar ali
com bolsa do ProUni. As falas abaixo evidenciam que P5M-IN faz uma análise de prévia do
ambiente e de seus riscos antes de tomar uma decisão e que P6M-IM tem um comportamento
estratégico em relação aos colegas.
[...] eu ficava pensando: e se eu caísse aqui, como eu seria tratada e como eu
me sentiria?... Onde tem pessoas que têm a classe econômica bem diferente
da minha. Eu me questionava sobre isso (P4M-IN).
Resolvi sentir o clima [dá risada]. Então, de início foi logo no primeiro dia,
eu não vou falar nada [acerca de ser do ProUni], aí se eu perceber que
ninguém falou nada, que está tudo tranquilo eu me manifesto (P6M-IM).
[...] eu lembro que no começo eu tinha o maior receio de falar que eu era
bolsista, vários alunos têm esse receio de falar que são alunos do ProUni.
Mais aí, quando a gente vai tendo mais intimidade a gente vai soltando, é
entrei pelo ProUni (P5M-IN).
[...] no primeiro dia, como estava todo mundo no trote, tinha umas quatro
pessoas dentro da sala, aí chegou uma mulher aquelas que acendem o
Datashow e perguntou se tinha alguém do ProUni, aí que eu achei
esquisito... e ninguém entendeu
Verifica-se que a crença de P6M-IM é de que sua identidade foi revelada a muita
gente em virtude desse episódio, embora somente uma das quatro pessoas presentes na sala
não fosse prounista. Acerca da situação, P2M-IM assinala que “[...] esse foi o meu contato
com a turma, e com os demais, eu acho que quase ninguém soube direto assim... não dá pra
identificar”. Embora P2M-IM acha que há similaridade entre ela e os demais alunos,
entretanto, a opinião de NP4M-FN é de que em virtude do “perfil mais humilde” é possível
sim identificar os alunos prounistas.
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A análise dos dados relativos à identificação dos alunos prounistas frente aos alunos
pagantes da IES fornecem a mesma percepção depreendida por PROF 04, de que “[...] os
alunos Prounistas, eles também têm um pouco de receio de qual pode ser a reação diante
dessa revelação de que são Prounistas” e, por esse motivo, alguns optam por não revelar o
fato, exceto por força da situação. Goffman (1988) considera que uma pessoa está em uma
104
condição de descrédito quando ela possui atributos que são percebidos como discrepantes ao
estereótipo criado acerca de determinado tipo de indivíduo, entretanto essas características
não são imediatamente perceptíveis ou conhecidas dos presentes. Com diferentes expressões,
todas revestidas de um mesmo sentido de esquiva, os prounistas externam o temor de serem
rotulados, e um esforço de acobertamento da revelação de uma identidade percebida como
menos positiva frente ao meio.
Mas, eu também não procuro divulgar (P2M-IM).
[...] eu não canto aos quatro ventos que eu sou bolsista (P6M-IM).
Não que eu me identifique como se fosse um crachá (P10H-FN).
[...] um ou outro pode saber, mas não como por exemplo: Ah, para que time
você torce? (P9H-FM).
Se você falar que você é bolsista pode até ter preconceito, mas é muito
menor do que se você falar que é prounista. Se você falar que é prounista já
tem um certo preconceito, sim (P1H – IM).
[...] falaram com a gente lá no auditório [na palestra de integração dos
prounistas], que independente da gente ser bolsista ou não, a nossa condição
de bolsista não muda em nada a nossa condição como “IESZzista” (P5M-
IN).
revelar-se para os professores entrevistados. Por outro lado a reserva em relação aos alunos
não prounistas pode ser justificada nos argumentos de Taylor e Moghaddam (1994), que
sustentam a existência de forças em conflito entre esses grupos, uma vez que indivíduos
pertencentes aos grupos dominantes desejam e lutam para manter o status de condição
comparativamente superior, enquanto os integrantes dos grupos de identidade social de valor
menos positivo desejam alcançar alguma mudança de status, a fim de aprimorar a identidade
grupal para uma condição superior.
P5M-IN relata que porque “[...] a nota é altíssima, eu já tinha colocado na minha
cabeça fazer mais um ano de cursinho. Já ia ser o terceiro ano de cursinho, compensava ter
feito o ensino médio de novo”, mas que acabou sendo chamada na segunda lista de espera e
conseguiu entrar.
Conforme já constatado por Santos (2011), o acesso de estudantes de baixa renda às
IES privadas implica em convivência com grupos socioeconomicamente distintos e constitui-
se um período no qual acabam sendo submetidos a novas experiências de exclusão. Diferentes
desafios são enfrentados ao longo do período de graduação e têm que ser superados, uma vez
que, como apontado por Rocha (2012) e também aqui verificado, as dificuldades dos
bolsistas, seja no processo de aprendizagem ou no âmbito financeiro, não desaparecem apenas
com o ingresso na graduação. Nessa categoria, busca-se apontar as restrições materiais e as
implicações sociais e emocionais decorrentes da oportunidade de acesso à IES estudada.
Desafiando os próprios limites, com garra e determinação pessoal, esses alunos correm
atrás da realização do desejo de obter uma formação superior, aproveitando a oportunidade
única de acesso a uma universidade de boa qualidade, em curso reconhecido no mercado, é
perceptível no discurso de grande parte dos alunos entrevistados, uma disposição em pagar o
preço e superar os obstáculos, como afirma P12M-FM, “[...] ainda que a gente passe um
pouco de aperto, vale a pena pela qualificação que a gente vai ter”.
Verifica-se que, por força do determinante econômico, os alunos acabam vivenciando
dificuldades outras, havendo restrições financeiras até mesmo para necessidade mais básica
como a alimentação. Observa-se que no campus da IES estudada existe uma ampla variedade
de franquias que vão desde lanchonetes multinacionais, restaurantes, cafeterias e até
esmalteria, estabelecimentos aos quais alunos prounistas não têm acesso, ocorrendo assim
uma exclusão econômica. Conforme argumenta P1H-IM, na “[...] X (outra IES privada), que
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é a X, tem bandeijão. Você paga R$ 6,00 e você come. Se nós formos comer aqui por perto o
almoço mais barato é R$ 12,00 por dia, e não é aquelas coisas. A média é R$ 16,00 por dia”,
de forma que, não havendo nenhuma política de ajuda a esses alunos, a possibilidade de
sobrevivência dentro do campus fica limitada. Sem recursos para custeio alimentar dentro do
campus, os alunos precisam trazer a própria alimentação de casa ou se organizar para
alimentar-se em casa.
[...] a alimentação, se eu quiser comer por aqui, é tudo na marmita, ou não
come. Come um lanche, traz de casa (P11M-FM).
Então, eu não me incomodo muito... No ano passado eu até comprava lanche
aqui. Esse ano eu passei a trazer de casa para economizar um pouco (P2M -
IM).
Mas, eu não sei que tipo de atitude poderia ser tomada para que esses alunos
se sentissem mais confortáveis nesse ambiente [...]. Vale lembrar que as
coisas aqui dentro, também, são bem caras, então... [...] Talvez, quem se
sinta incomodado por essas situações e essas diferenças normalmente,
chegando aqui, provavelmente, vai se sentir um pouco incomodado, se
chatear com esse tipo de coisa (P2M-IM).
Então, eu sempre procurei estágio de quatro horas para poder fazer tudo em
casa, então alimentação em si eu supria fazendo em casa, então dá pra
conciliar (P9H-FM)
financeiros que lhe seriam importantes, devido ao tempo que gasta para deslocar-se até sua
residência; isso indica que seu local de moradia torna-se um impedimento de acesso a outras
atividades, “[...] acho que pra mim hoje [a maior dificuldade] é não poder conciliar trabalho
com a faculdade. Pra mim é isso, porque acabou faltando dinheiro”, portanto é um fator de
exclusão.
Outra dificuldade relatada principalmente pelas alunas prounistas, é referente à falta
de recursos para a aquisição de livros. As queixas são de que infelizmente “[...] os livros não
caem do céu. Nada aqui para a gente se manter” (P12M-FM), e que, embora a “[...] biblioteca
daqui seja ótima, mas, alguns livros atualizados não tem. Então, pela dificuldade financeira eu
não conseguia adquirir esses livros” (P11M-FM). Quer emprestando de amigos, solicitando
doação, recorrendo ao sacrifício familiar, como expressa P6M-IM, os pais fizeram “[...] tudo
o que eles podiam em fazer, em relação a livros... Se há uma necessidade eles dão um jeito”,
ou o que é mais comum, ou renovando constantemente na biblioteca, esses alunos conseguem
driblar essas barreiras. Contudo vivenciam um sentimento de privação, uma vez que, por
necessidade ou por desejo, não podem adquiri-los, conforme apontado por P12M-FM
[...] você tem que se apertar... ou tira xerox, que não [pode].... tem que fazer
isso, ou comprar o livro, se não for muito caro. Eu tive que comprar alguns,
mas eu gostaria de poder comprar mais. Eu acho bonito ter livro [ri].
As expressões “[...] nada aqui cai do céu para a gente se manter”, se “[...] não for
muito caro” (P12M-FM), “[...] eles dão um jeito” (P6M-IM) utilizadas anteriormente
manifestam que toda a manutenção durante o curso é difícil, sendo exigidos esforços a fim de
superar os obstáculos financeiros. Faltando recursos financeiros para o que é básico,
consequentemente esses alunos estão privados também da participação em cursos
extracurriculares, intercâmbios e viagens que impliquem em custos e lamentam ficarem
excluídos, conforme queixas a seguir.
[...] a faculdade divulga alguns cursos que eu não posso pagar, então eu
acabo ficando de fora (P5M-IN).
A IES disponibiliza vários intercâmbios, mas você precisa comprar a
passagem de avião, você precisa se manter quando você está lá, entendeu...
não tem a bolsa integral disso, e por não ter essa integralidade, para mim não
dava (P11M-FM).
Verifica-se que a falta de recursos materiais implicam desgaste emocional, que, vivenciado ao
longo de todo o curso, tornam a trajetória de formação mais longa e mais desgastante.
Ainda que muito se fale sobre a defasagem de formação dos alunos provenientes da
escola pública (LEITE, 2009; SOTERO, 2009; SANTOS, 2011, OLIVEIRA et al. , 2012),
mais do que o desempenho, autocobrança e o desejo de superação impõem um preço
emocional a ser pago pelos alunos prounistas, que se sentem responsáveis e agentes da própria
história, que avança por um caminho árduo.
Dado que a educação formal constitui-se uma das mais importantes vias de mobilidade
social, e que a qualificação educacional é essencial para que se alcance posições de prestígio
em nossa sociedade (RIBEIRO, 2006), esses alunos consideram estudar na IES uma
oportunidade ímpar e sentem-se atribuídos de um peso maior do que o dos outros alunos,
sabida a importância que concluir o curso tem para eles, e manifestam esse peso em suas
falas.
[...] a maioria dos alunos do ProUni, eles estão entre os melhores da sala. Porque a
gente tem essa cobrança interior: “Nossa eu estou aqui dentro [...] numa faculdade que
a faculdade de Direito custa R$ 1.400,00, e eu não estou pagando por isso, e é uma das
faculdades top de linha de São Paulo, só fica atrás...” Aliás, nem fica atrás de X e Y.
Então, a gente tem essa cobrança sabe, de fazer por merecer mesmo (P5M-IN).
Aspecto negativo... [dá uma pausa]. Acho que a pressão que a gente coloca em nós
mesmos. A gente tem que ir bem... A gente tem que ir bem... Essa pressão eu não sei
se pode ser caracterizado como um aspecto negativo: A gente tem que se esforçar na
vida normal e muito mais aqui (P1H-IM).
Eu gosto de estar aqui, eu fico feliz, mas eu ainda tenho aquele sentimento de que eu
tenho que lutar mais. Não é simplesmente estou aqui. É aquele sentimento, eu preciso
continuar aqui. Então, a gente fica um pouco apreensivo, para não pegar DPs, não
pegar notas ruins. O sentimento é esse (P1H-IM).
Você não pode esquecer nem um dia que você tem que lutar mais do que as outras
pessoas, não importa o quanto elas lutam porque o seu caminho é muito maior que o
delas (P1H-IM).
[...] a gente tem que batalhar mais ainda para permanecer na faculdade do que eles,
porque é difícil... não é fácil não (P12M-FM).
combater”, significando que as armas foram obtidas. Diante da grande distância social que
está posta e tendo em vista o ambiente competitivo que enfrentarão no mercado de trabalho, é
realmente necessário lutar aguerridamente para superar os obstáculos e obter uma qualificação
profissional, importante fator de inclusão social.
A condição social dos alunos prounistas e todas as restrições financeiras dela
decorrentes constituem-se obstáculos que dificultam a trajetória acadêmica, porém o desejo de
alcançar melhor status e obter um aprimoramento pessoal funciona como um “motor” para as
ações e para a superação destes. As falhas estruturais do programa, principalmente no que se
refere ao calendário e à falta de políticas que estendam a assistência prestada ao aluno para
além da bolsa, principalmente nos períodos iniciais do curso trazem implicações sociais e
emocionais para esses alunos, que travam uma luta contra a realidade social que está posta e
contra as desigualdades e tornam-se agentes da história.
Eles são bastante receptivos [...] têm sim, algumas exceções. [...] logo nas
primeiras semanas eles já estavam formados e até hoje é o mesmo grupo
assim... não teve nenhuma inclusão. Quando eu cheguei, eu não tive uma
impressão tão boa assim. Quando eu cheguei assim, logo o pessoal já fez
grupinhos separados, e isso tem muito ainda [de não prounistas] (P6M-IM).
Quando eu cheguei... a minha sala, ela é bem dividida. Ela tem três grupos.
Quando eu cheguei assim, já deu para perceber... (P9H-FM).
Esse início foi bem ruim. Eu não sei se as pessoas eram arrogantes, eu não
sei se foi por... eu não faço nem ideia do motivo [...] eu sofri vários
problemas [não aceita no grupo de trabalho e quando inserida por
solicitação, foi discriminada] (P11M-FM).
No primeiro semestre, que ninguém se conhecia assim quase, não foi nada
caloroso demais (P7H-FN)
Essa percepção de grupos fechados e menos receptivos, embora mais frequente, não é
unânime. Chegando ao final da graduação P7H-FN considera que “[...] o pessoal aqui é
receptivo pra caramba. Sempre muito consciente, talvez seja isso também, tem muito bolsista
na graduação”, mas em outro momento afirma ter se sentido ambientado somente após o
terceiro semestre do curso, sendo que antes disso não se sentia acolhido. P12M-FM diz que,
“[...] embora haja assim, diferença entre classes sociais, eu consegui levar numa boa”,
expressando uma experiência individual, mas que atribui a si o mérito de ambientar, mas que
não necessariamente expressa sua impressão em relação ao ambiente em geral.
[...] por que a gente cria os nichos aqui dentro, com os alunos? Eles levam
muito tempo para divulgar [a listas de convocados do ProUni]. Quando esses
alunos são inseridos no sistema, que viram alunos, já teve um tempo de aula
muito grande.
115
facilitando o processo de ambientação quando do início das aulas. Para o aluno não
prounista o tempo da convocação é mais longo, não é feita em caráter público, o que impede
qualquer aproximação antecedente à chegada em sala de aula, acentuando a condição de
desvantagem desse grupo, pois são uma minoria, de condição social inferior e sem rede de
contatos prévios.
A percepção de diferença entre pessoas surge em virtude das categorizações sociais
que são feitas entre indivíduos, podendo o outro ser considerado diverso em função de sua
origem racial, gênero, nacionalidade, orientação sexual, classe social, idade, dentre outras
categorias. Grande parte dos alunos entrevistados relata que, dentro de suas salas de aulas, são
formados feudos, com baixa permeabilidade entre eles e consideram “[...] até feio de se ver”,
quão fragmentadas são as salas, tornando difícil a aceitação de pessoas que possuam
características distintas ao perfil predominante. As falas a seguir demonstram que desunião e
existência de feudos em grande parte das salas é uma percepção compartilhada tanto por
alunos prounistas como por não prounistas. Depreende-se que a fragmentação de sala persiste
durante todo o período do curso, uma vez que esse aspecto é ressaltado por NP4M-FN, aluno
do último semestre. Isso contribui para que o aluno prounista se perceba como alguém com
características distintivas em relação ao grupo social predominante, reduzindo a possibilidade
de contato e empobrecendo a interação social, dado as fronteiras existentes, conforme
ressaltado a seguir.
A nossa sala, ela é meio fragmentada. É bem demarcado. O território está
demarcado. É demarcação (NP4M-FN).
A minha sala é bem desunida, realmente é dividida e segregada (NP3M-IM).
Quando eu cheguei, eu não tive uma impressão tão boa assim. Quando eu
cheguei assim, logo o pessoal já fez grupinhos separados, e isso tem muito
ainda (P6M-IM).
[...] eu tenho o meu grupo, o outro tem o outro grupo, mas não é aquela coisa
que todo mundo fala com todo mundo (P8H-FM).
116
Era muita panela. Era fechada sabe... Era feio até de se ver, era uma classe
desunida. A que eu estou hoje, não. É até bem unida (P12M-FM).
Da mesma forma que P12M-FM percebe grande distinção entre uma sala e outra,
considerando haver em algumas delas maior união e ambiente mais favorável, P9H-FM
também faz a mesma observação quando diz que “[...] minha sala é muito tranquila, muito de
boa, mas eu lembro que a sala D não era uma sala muito legal”. NP4M-FN também observou
essa diferença e relata que pegou uma DP
[...] e vim fazer de manhã [...] naquele grupo da manhã [...] eu percebi que a
divisão era menor [...] eu vi que as pessoas conversam [...] se tiver
dificuldade, ele [o outro aluno] vai lá senta do lado dele e conversa. Isso na
minha sala não acontece.
Às vezes ocorre do aluno ficar de fora, aí a gente vai correndo atrás e quando
não dá eu digo: não tem problema, eu vou receber [o trabalho individual] do
mesmo jeito (PROF 03).
Vai fazer trabalho em grupo, uns gostam, outros não gostam, uns querem
outros não querem, já têm seus amigos (PROF 03).
Na hora do bar não tem problema, na hora de falar mal do professor junto.
Aparece quando tem uma questão de estudo, aparece para a formação de
grupo (PROF 01).
E é legal [fala ironicamente] que eles envolvem professor: Professora, não
pode entrar mais ninguém no grupo, né? (PROF 01).
deveria ser, porque às vezes a gente pega uma equipe que não agrada tanto”. P10H-FN
demonstra certo conformismo com sua “[...] sala já é assim, já é meio dividido em grupos”, e,
por ter alguma dificuldade de transitar entre eles, formou um grupo de quatro amigos no qual
faz todos seus trabalhos. P1H-IM diz que seu grupo de trabalho é formado por afinidade, no
qual a maioria é prounista, indicando uma afinidade por condição social. P11M-FM participa
de um grupo misto e refere que faz por critério de afinidade, o que em seu caso pode ser
sinônimo de aceitação, uma vez que sofreu resistência para ser aceita em outros grupos. P9H-
FM afirma que “[...] sempre mudei, por escolha”, mostrando-se uma exceção em relação aos
outros prounista, pois diz transitar bem entre grupos e fazer os trabalhos cada vez com um
grupo diferente. Cabe ressaltar que esse aluno omitiu ser prounista durante todo o curso, não
se identificando como tal para os demais alunos, pois considera que “[...] isso não faz
diferença”. P12M-FM afirma que na “[...] na minha sala que eu participei mais assim, eles
não ligam se a pessoa é prounista ou não, eles estão mais preocupados se ela vai fazer a
atividade, se ela não é perdida no assunto”, indicando não haver barreiras a admissão de
alunos prounistas nos grupos de trabalho.
A experiência de P11M-FM relata dificuldades enfrentadas para realização de
trabalhos em grupo, expressas como estratégias de exclusão. Descreve que no início do curso,
no momento de formar um grupo, tomou a atitude de abordar um grupo, dizendo:
“Posso fazer com vocês”? Ah. Já tem seis. “Posso fazer com fulano?” já tem
seis, já tem seis, já tem seis. Já tem seis, você tinha que ir até a representante
de sala e falar: “pode me indicar um grupo que ainda falta pessoas”? Aí
quando você é enfiada num grupo, pior ainda, porque é um grupo fechado e
as pessoas não estão nem aí para você.
um grupo tenta privar o acesso de outro, provavelmente com base apenas em prejulgamentos,
sem maiores fundamentações (ALLPORT, 1979).
Em virtude do etnocentrismo existente nos grupos (TRIANDS, 2003), a cultura
própria do grupo é usada como padrão para julgamento dos outros grupos. Os trabalhos em
grupos seriam oportunidades para o que Allport (1979) chama de “hipótese do contato”, pois
a interação entre pessoas com status iguais e com objetivos comuns, em ambientes amistosos,
nos quais a interação cordial endogrupo e exogrupo possibilitaria a percepção de crenças
errôneas e a redução do preconceito, porém, em geral, isso não ocorre. A realização de
trabalhos em grupo poderia ser uma oportunidade de aproximação entre esses alunos, de troca
de experiência e oportunidade de convivência, permitindo revisão de prejulgamentos. Pela
lógica do contato social, a oportunidade de interação nos grupos de trabalhos aumentariam a
atração, a conexão e a compreensão entre as pessoas (PETTIGREW, 1982 apud MANNIX;
NEALE, 2005), no entanto, o que se percebe é que os trabalhos em grupos têm sido utilizados
como oportunidades de demarcação de fronteiras e formas de discriminação, fazendo com que
as diferenças sejam ressaltadas.
É que tem um pessoal que saiu, foi para outra sala, mas a gente continua
conversando, vai para o bar juntos, sai junto, vai na casa um do outro (P7H-
FN).
[...] tem o dia que eu gosto de sentar na frente, tem o dia que eu gosto de
sentar no fundo, então eu conheço todo mundo na sala. Converso com todos
e tenho bom relacionamento com todos (P9H-FM).
Eu entrei na faculdade com um determinado grupo de amigos [...] um desses
eu carrego até hoje [...]a gente tem a mesma forma de pensar. Eu ando com
pessoas que não são do ProUni. São gente que trabalha, sabe o valor do
dinheiro (P8H-FM).
[...] a maioria dos meus amigos mesmos, só eu que sou ProUni na minha
sala. Eu não vejo diferença assim, o tratamento é bem igual (P11M-FM).
Meu grupo é bem diversificado. Mas são todos... Não tem nenhum prounista,
só eu que sou prounista (P12M-FM).
Agora é duas. E tem outras assim... que sentam ali com a gente...
conversam... mais eu sou mais amiga dessas duas e elas também são minhas
amigas (P2M-IM).
[...] na verdade assim, eu não tenho um grupo. Tenho duas amigas minhas
que são mais próximas (P6M-IM).
Tanto alunos prounistas quanto não prounistas relatam que a formação de seus
grupos de convivência levam em conta uma identificação em de termos ideias ou origem
social, indicando que a distinção social é um fator que está sempre em evidência para ambos
os grupos, revelando ser essa uma dimensão de diversidade importante nesse ambiente. A
similaridade de classe social é um critério relevante para formação de grupos. A preposição
“mas” usada no excerto a seguir faz uma distinção de que os amigos ricos de P12M-FM têm
uma característica que não é comum a outros, ser legal, o mesmo ocorrendo com os amigos de
NP4M-FN, que “[...] não ostentam o padrão social”. Por identificação ou por distinção, ao
falar dos grupos de convívio, a questão é recorrente.
Eles são ricos [ri], mas são muito legais (P12M-FM).
No grupo em que eu convivo [...] todos héteros, perfeitos... [ri] Eles têm
gostos semelhantes aos meus, ideais parecidos... Mas eles têm um modo de
vida de classe média alta, que é o que compõe essa faculdade (NP1H-IN).
Eu acho que as pessoas com quem eu me identifico mais são aquelas pessoas
que têm uma situação igual a minha (NP3M-IM).
Eu percebo que dos doze, dois deles têm um padrão um pouco maior, mas
eles não ostentam isso. Então talvez eles se inseriram, porque o padrão é de
uma origem mais humilde, e eu me identifiquei mais com isso (NP4M-FN).
Eu restrinjo meu grupo [de convívio] a uma amiga que ela tem poderes
econômicos, mas ela se identifica muito com as questões sociais [...] esse é o
meu grupo, junto com um outro amigo [...] ele é bolsista pela IES e não pelo
ProUni (P4M-IN).
muito esforço pra ir, porque a gente tem essa sensação de que vai ficar meio de canto”. A fala
a aluna revela um sentimento de exclusão e sua resignação frente ao ambiente, não
considerando que haja perspectiva de que seja aceita. Apenas P7H-FN refere envolver-se em
atividades sociais diversas em companhia dos colegas de sala.
Os dois programas mencionados como atividades sociais mais comumente realizadas
entre amigos são: ir à casa um do outro e frequentar os bares próximos à universidade. P4M-
IN, P7H-FN, P7H-FN e P12M-FM dizem que dormem em casa de amigos da faculdade, o que
sugere uma maior proximidade entre colegas. Em relação ao bar, embora os alunos prounistas
refiram irem juntos ao bar, a partir das falas dos entrevistados depreende-se que este é um
ambiente no qual as barreiras foram flexibilizadas, configurando-se como um espaço
democrático, em que as diferenças são menos evidenciadas.
Na hora do estudo aparece, você é prounista eu não sou. Não é na hora do
bar. Na hora do bar não tem problema (PROF 01).
[...] quando você desce no bar... vai conversar, tomar uma... tá todo mundo
junto, você conversa com o cara que você nem viu... tá mais alegre, e já
começa a conversar (NP1H-IN).
Eu não tomo bebida alcoólica, então eu ia pro bar com o pessoal e ficava
tomando refrigerante (P4M-IN).
A gente sai para ir no bar juntos [...] É normal (P7H-FN).
tem em seu grupo de convívio mais próximo quatro alunos prounistas, refere que busca
transitar entre os diferentes feudos de sua sala, inclusive participando de atividades sociais
com grupos distintos, o que não é percebido como natural por seu grupo de convívio mais
próximo. Relata que
[...] as pessoas saem entre elas. Entre aquele grupo. Saem entre elas. Eu era e
o único lá, diferente daquele grupo. Eu era de um outro [grupo] a principio e
tal... Aí depois as pessoas do meu grupo: “Pô XXX. Você tá jogando com
aqueles meninos lá?” Porque eles são de um perfil... um padrão mais
elitizado. Você está falando com os maur... [mauricinhos]?
A categorização dos “mauricinhos” como exogrupo é feita com base nas diferenças em
relação a quem está categorizando, pois, conforme descrito por NP4M-FN, as pessoas de seu
endogrupo são membros da categoria “[...] de uma origem mais humilde” (HOGG; TERRY,
2001) e, a partir dessas categorias, terão percepções distintas acerca do próprio grupo e do
exogrupo e, com base nessas percepções, se comportarão em relação a eles. A percepção
estereotipada de que o outro grupo tem um perfil mais elitizado demonstra que categorizar os
membros do exogrupo faz que todos os integrantes sejam percebidos como mais homogêneos,
enquanto os do endogrupo serão percebidos como mais heterogêneos.
Nesta categoria são discutidas as percepções dos alunos prounistas e não prounistas
acerca de quais as categorias distintivas de seus grupos de pertença, que estereótipos possuem
acerca de seus outgroups, bem como a percepção dos professores entrevistados acerca de
ambos. Com essa análise, busca-se verificar as dimensões de diversidade nas quais os alunos
prounistas se reconhecem e são reconhecidos. Uma vez que o objeto do presente estudo é o
ProUni e que a experiência acadêmica dos bolsistas do Programa é o foco, os alunos
prounistas são considerados “Nós”, enquanto os alunos não prounistas são “Eles”.
Considera-se relevante discutir as categorizações que prounistas e não prounistas
fazem uns dos outros, uma vez que os comportamentos dos grupos embasam-se nelas
(HOGG; TERRY, 2001). Por meio da utilização de categorias como "Nós" e "Eles", são
delimitadas fronteiras e determinados aspectos são relevantes para distinguir quem pertence
ou não a determinado grupo, de forma que os membros do outgroup foram percebidos como
mais homogêneos e os do ingroup como mais heterogêneos.
124
modo, evidenciam uma percepção de alunos menos comprometidos com a formação, pois
percebem que “[...] metade demonstra dedicação e vontade, enquanto a outra metade não o
faz”. Os professores os consideram “[...] bons alunos, com potencial” e destacam que o tipo
de “[...] comentários e articulações que fazem” são aspectos que distinguem os alunos não
prounistas.
Se ao falar de si mesmos os alunos prounistas entrevistados destacam os aspectos
relativos ao desempenho acadêmico, ao abordarem o perfil social trazem muito pouco acerca
do ingroup e realçam as diferenças sociais existentes entre grupos, colocando em foco as
características do outgroup. “Nós” “[...] somos de uma classe social diferente do perfil geral”
e “[...] sem dinheiro”, enquanto “Eles” possuem
[...] boa condição financeira, são de classe média, sustentados pelos pais, têm
oportunidades de viagens, maior bagagem cultural, não precisam ajudar em
casa, podem comprar livros, [vivem em um] mundo diferente, ganham carros
aos 18 anos.
receptivos” sejam “[...] pessoas que não distratam”, e “[...] alguns [sejam] solidários”, são
“[...] abertos só em um primeiro momento, mas não para amizades”. Essas impressões
evidenciam que a condição social é uma dimensão de diversidade percebida, que delimita
fronteiras grupais e reduz a abertura para maiores interações.
Tantos os alunos prounistas como os professores ressaltam como característico dos
alunos não prounistas o fato destes serem “[...] contra políticas públicas” e serem “[...]
competitivos nos estudos”. Enquanto os prounistas consideram-se alunos que querem “[...]
aproveitar mais o curso para se destacar”, têm a percepção de que “Eles” desfrutam de “[...]
uma maior tranquilidade e menor peso ombros”, pois têm “[...] futuro certo”, “[...] têm mais
contatos”, contam com “[...] suporte para a carreira” e “[...] querem manter as coisas como
estão”. Na compreensão da teoria da Identidade Social, na dinâmica intergrupos, as relações
se estabelecem mais por competição e busca de distintividade do que por cooperação, porque
os membros do grupo desejam alcançar uma identidade para seu grupo que seja mais distinta
e mais positiva quando comparada a de outros grupos (TAYLOR; MOGHADDAM, 1994).
Enquanto os alunos prounistas, que em princípio possuem uma identidade social de valor
menos positivo, buscam alcançar alguma mudança de status, a fim de aprimorar a identidade
grupal para uma condição superior, percebem que os alunos não prounistas, que pertencem ao
grupo dominante, desejam e lutam para manter o status de condição comparativamente
superior, o que gera conflitos entre grupos.
Triandis et al. (1994) ressaltam que emoções positivas aumentam a probabilidade de
interação e intimidade entre pessoas e grupos, o que aumenta a percepção de similaridade, de
forma a criar um ciclo de autoreforço causal, que em casos de dissimilaridades trazem
consequências inversas, gerando condições de distanciamento. A percepção de que os alunos
prounistas mantêm certa reserva e distância em suas interações é consenso entre os três
grupos entrevistados. De si mesmos, os prounistas dizem que são “[...] mais na deles”, “[...]
nem todos se expressam”, possuem um “[...] comportamento mais controlado”, “[...] se
apropriam menos do espaço”; percepção endossada pelos alunos não prounistas quando dizem
que são “[...] introvertidos, não se soltam, não se expõem, acuados com as diferenças sociais”,
opinião ratificada pelos professores que percebem um “[...] comportamento mais contido,
reservado”. Embora manifesto por apenas um entrevistado (NP1H-IN), o estereótipo de que
os alunos prounistas “[...] tiram vaga de quem estuda”, e que, por não prestarem o vestibular
da IES “[...] têm uma vantagenzinha”, indica a opinião de que os alunos prounistas não
estudam tanto quanto eles, que não há mérito pessoal na conquista da vaga e de que essas
vagas não pertencem a eles.
127
Prounista
Não Professor
prounista
Estando diversidade relacionada às diferentes categorias a partir das quais pessoas são
agrupadas em função de denominadores comuns existentes entre elas (MOR-BARAK, 2005),
ao pensar os alunos entrevistados nesta pesquisa buscou-se apontar as diferenças visíveis ou
invisíveis percebidas entre grupos, uma vez que elas podem trazer consequências negativas ou
positivas para eles. De acordo com Loden e Rosener (1991), as dimensões secundárias de
diversidade existentes entre prounistas e não prounistas referem-se principalmente ao
background cultural, à classe social e às experiências pessoais. Uma vez que a diversidade de
classe social, fator mais enfaticamente apontado pelos alunos prounistas, secundariamente
priva esses alunos de oportunidades de viagens, de engajamento em atividades sociais com
outros alunos, reduz a possibilidade de acesso aos mesmos bens de consumo, a frequentar os
mesmos ambientes sociais, ocorre significativa redução dos denominadores comuns entre
grupos. Considerando a lógica do contato social e do pressuposto de que havendo uma maior
interação entre pessoas ou grupos há também um aumento da atração entre eles, a conexão e a
compreensão entre as pessoas (PETTIGREW, 1982 et al. MANNIX; NEALE, 2005), a
condição de diverso implica uma menor interação social, estabelece fronteiras entre grupos,
criando maiores distâncias entre “Nós” e “Eles”.
4.3.7.1 Estereótipos
Nas comparações sociais, as diferenças entre grupos são acentuadas e por meio das
categorias formam-se os estereótipos em relação a si, ao endogrupo e ao exogrupo (HOGG;
ABRAMS, 2001). Uma clara padronização que expressa distinção entre prounistas e não
prounistas é manifesta no diálogo estabelecido com NP1H-IN, no qual:
P: Porque eu não posso comparar agua com óleo... E: Então, o que é a água e
o que é o óleo aqui? P: Água é o cara carente, que ascendeu à faculdade,
atendendo aos requisitos que o ProUni possibilitou a ele. Esse é o água. O
óleo é o cara que tem família que o sustenta, tem padrão alto.
Curiosamente, NP1H-IN, que é uma pessoa que convive mais proximamente com
pelo menos quatro alunos prounistas e se considera uma pessoa de “origem humilde”, escolhe
uma figura de linguagem para exemplificar os dois grupos, utilizando elementos que não se
misturam, sugerindo uma separação entre ambos os grupos. O entrevistado, que está com 46
anos, demonstra um nível de expectativas superior em relação aos alunos prounistas e
evidencia intolerância a qualquer demonstração de descomprometimento da parte desses
alunos, que desfrutam de uma oportunidade que ele não teve quando era mais jovem.
A falsa crença de que não existe preconceito no Brasil e que a paz e a democracia aqui
imperam foi por muito tempo sustentada (GRAMPA, 2012). As opiniões expostas a seguir
demonstram a existência de atitudes negativas em relação aos alunos prounistas, com
justificativas baseadas em estereótipos e generalizações, com manifestações de preconceito
baseadas quase sempre em argumentos infundados.
Um argumento utilizado para justificar os preconceitos está relacionado com a prova
do Enem, pois constitui-se uma forma diferente de entrada na IES, considerada menos
competitivo para o prounista. Alegações de que “[...] o prounista não passou pelos mesmas
provas que eles” P1H-IM, e de tratar-se de “[...] uma prova mais fácil, que é jeito mais fácil”
(PROF 01), são corriqueiras e compartilhadas também por professores em sala de aula.
P10H-FN relata que seu professor durante a aula manifesta sua opinião de “[...] que o ProUni
é uma brecha no vestibular”, entendimento similar ao de NP1H-IN, aluno não prounista, que
também acha “[...] que o ProUni é um atalho para isso”. De acordo com PROF 01 “[...] os
alunos do ProUni, primeiros colocados [na prova do Enem], são compatíveis com as
primeiras listas [dos aprovados no vestibular regular da IES], só num sistema distinto”.
131
manifestações tendem a continuar presentes nesse ambiente, dado que o preconceito está
relacionado com base familiar, valores pessoais introjetados e crenças acerca de si e do outro.
Em sua fala NP1H-IN declara sua intolerância aos prounistas ao dizer que caso “[...] a
pessoa faça o mesmo vestibular que a gente... acho que seria um pouco mais tolerável...”, e se
autoconfessa preconceituoso assumindo que “[...] eu mesmo gero um pouco de preconceito”.
Em sua opinião “[...] tem bastante [preconceito]. Acho que esse manifesto foi o maior
exemplo”. A realização de uma manifestação contra uma possível utilização do Enem como
critério para preenchimento de parte das vagas do vestibular, encabeçada pelos alunos do
curso de Direito da IES pesquisada, virou notícia de jornal, sendo citada por alunos (NP5M-
FM e NP1H-IN) entrevistados como a maior demonstração da existência de preconceito
contra o ProUni dentro da IES pesquisada.
Embora para alguns o manifesto, que ganhou dimensão pública e que levou 800 alunos
para as ruas, buscando assegurar o direito de que a IES se mantenha destinada às elites, seja a
maior evidência de preconceito, contudo há alunos que consideram que “[...] se há um
preconceito IESzista, é um preconceito mascarado, velado [...] mas para bom entendedor você
entendeu” (P6M-IM). NP5M-FM diz nunca ter visto manifestações de preconceito, mas que
“[...] é uma coisa que eu sei que tem, entendeu”. Provavelmente, por determinação em
conquistar a conclusão da formação superior, esses alunos prefiram negar as evidências de
preconceito, para conseguirem manter a maior integridade emocional possível, o que não é
feito sem sofrimento.
O discurso dos alunos entrevistados denota a existência de preconceitos em relação
aos alunos bolsistas em geral, sendo percebidos como mais intensos em relação a uma
categoria de alunos cotistas do que a outras categorias de alunos não pagantes. Ilustrando essa
gradação P2M-IM afirma que “[...] contra o ProUni eu não ouvi, é mais contra as cotas em si.
Só que se olhar pelo ProUni, também são vagas reservadas, então não deixa de ser, mas contra
cotas eu ouço de vez em quando”. Cabe aqui retificar a compreensão de P2M-IM, pois as
vagas do ProUni são vagas ofertadas na proporção de uma para cada dez vagas regulares
disponíveis obedecendo às normas do Programa. Estendendo essa lógica, P6M-IM considera
que “[...] se eles são contra o Programa, com certeza eles também são contra, indiretamente...
[o aluno]”, de modo que o preconceito contra cotistas é também percebido como preconceito
contra prounistas. As argumentações desses alunos transmitem a mensagem de que o
133
preconceito os rodeia; se contra bolsistas, contra prounistas ou contra cotas, o fato é que estão
convivendo com alunos preconceituosos no ambiente acadêmico e isso gera desconforto e
impede um real sentimento de pertença ao local e ao grupo.
Cotas raciais são questões polêmicas dentro da IES, assunto para o qual os alunos se
posicionam mais claramente, havendo inclusive aluno prounista (P9H-FM) contrário ao
sistema de cotas raciais. P1H-IM enfatiza o posicionamento de colegas de sala dizendo que
“[...] elas [alunas da elite] são plenamente contra cotas. Elas defendem isso. Elas falam isso” e
esses posicionamentos preconceituosos são manifestos até mesmo nos interesses científicos
desses alunos. Duas propostas de pesquisa apresentadas a dois professores diferentes
evidenciam uma convergência do preconceito em relação a cotas com o preconceito em
relação ao ProUni e indicam a existência de inquietações e mobilizações acerca disso e das
cotas. Na primeira situação, a professora recusou a proposta de pesquisa, argumentando o
caráter preconceituoso da proposta, uma vez que o aluno não era pedagogo para avaliar
desempenho, enquanto na segunda situação, uma aluna sentiu-se ofendida com a proposta e o
tema foi discutido em sala.
Por ser a IES pesquisada voltada predominantemente às classes média e média alta, e
considerando que o programa é voltado a alunos de baixa renda, diante da diferença de perfil
econômico, o preconceito socioeconômico também é manifesto, conforme destacado por
alguns alunos.
[...] separa a crítica que é a critica que está pensando na qualidade de ensino
[...] do preconceito, que é o preconceito de raça e do preconceito de classe
que eu acho que isso é bem presente e eu sei que existe (PROF 04).
[O preconceito] que eu mais presencio e esse eu vejo é o socioeconômico.
Sabe quando a pessoa olha e fica desprezando porque a pessoa está mal
vestida, mas você olha e vê que a pessoa não está mal vestida porque ela
quer, é porque ela não tem outra roupa para usar (P11M-FM).
Eles são indiferentes, mas não só com as pessoas que são prounistas, eu acho
é com qualquer pessoa que seja abaixo da classe social deles eles são assim
(P12M-F).
Ela falou assim... eu não me lembro quais as palavras, mas ela falou mais ou
menos, também, olha onde você mora... porque ela mora num bairro de alto
padrão lá e eu não. [...] Eu me ofendi (P12M-FM).
134
O ProUni é esse padrão aí... Esse... ess... essa coisa que também só chegou
porque se não tivesse alguém para pensar nesse pessoal, não teria chegado,
iria fazer noutro lugar. É injusto demais... (NP4M-FN).
A partir da análise dos dados, constata-se que a forma como o preconceito é expresso
envolve indiferença em relação ao outro, emissão de comentários ofensivos e colocações
preconceituosas frente ao grupo, podendo ser notadas estratégias de evitação e discriminação,
descritas a seguir.
4.3.7.4 Discriminação
nela e saiu do banheiro xingando. Ela falou: ‘Ai que nojo’ e saiu do banheiro. Então assim,
para mim foi extremamente constrangedor né, eu fiquei assim, atônita”. Diante da evitação de
contato e da utilização de linguagem insultuosa, a aluna se viu hostilizada e exposta a um
constrangimento público, como se possuísse uma doença contagiosa, que pudesse ser
transmitida no toque. A aluna é afetada em sua autoestima, mas se afasta emocionalmente do
contato com a realidade do preconceito manifesto. Utilizando-se de um mecanismo de
negação da gravidade do ato, P6M-IM questiona se a discriminação existe realmente ou se é
mera impressão sua, ao dizer que “[...] sensação a gente tem [de ser discriminada], eu não sei
se é porque a gente já se sente um pouco... né... ou se realmente há [discriminação]”. Embora
não haja indicativo algum de que a outra pessoa soubesse de sua identidade de prounista, ela
acha que sim. A sensação descrita por P6M-IM, de acordo com Goffman (1988), constitui-se
um marca de indivíduos que possuem uma identidade deteriorada, uma vez que eles tendem a
ter as mesmas crenças sobre identidade que os “ditos normais” têm. A aluna manifesta sua
percepção da discriminação existente quando refere-se a uma amigo que
[...] sempre sente essa... porque no caso dele, além de prounista ele é
discriminado pela questão da raça, então ele sofre mais por isso. Então, vira
e mexe ele me conta alguma coisinha que ele sentiu, mas assim, como eu
falei, é tudo muito velado.
Nas expressões “além de prounista” e “sofre mais” fica evidente que a condição de
prounista é percebida como de valor mais negativo e que há um sofrimento emocional na
experiência de confronto com o exogrupo, que tem uma percepção negativa em relação a ela
e/ou a seu grupo de pertença.
Na opinião de P11M-FM, as discriminações ocorrem de forma pontual, mas não são
prática comuns, são “[...] tão poucas pessoas”. Diferentemente de P6M-IM que foi vítima de
discriminação, P8H-FM percebeu-se discriminado de forma indireta ao presenciar uma
situação em que um professor “[...] discutiu com uma aluna. A aluna tinha razão [...], mas
todos os argumentos da aluna foram desqualificados, porque ela era do ProUni”. P8H-FM
relata que o posicionamento de outros alunos foi argumentar: “Você sabe como essa gente do
ProUni é”, comentário configura-se uma generalização, pois desconsidera a individualidades
desses alunos e atribui-se ao grupo características iguais (ARONSON; WILSON; AKERT,
2002). Esse episódio foi repetido por P7H-FN, P8H-FM, NP4M-FN, o que denota não tratar-
se de uma impressão particular do aluno, mas de fato concreto que manifesta que deixou-se de
136
olhar a aluna individualmente, sendo atribuída a ela característica do grupo, visto como
negativo, estereotipada e indigna de crédito (HOGG; TERRY, 2001).
Se os estereótipos são formados, se há preconceito e discriminação, há sempre os
agentes por meio dos quais eles se manifestam. Os apontamentos já discutidos nesta categoria
evidenciam que, embora não se constitua uma maioria, alunos não prounistas tornam-se
agentes de preconceitos e discriminações, que tornam a permanência dos alunos bolsistas do
ProUni na IES mais árida e sofrida, impedindo o pleno gozo de uma experiência de inclusão.
PROF 01 afirma que os alunos “[...] são estimulados a discriminar”, tanto pela
estrutura física (salas mais apertadas em virtude da entrada dos alunos prounistas) como por
professores, indicando que estes também são agentes da discriminação e do preconceito, o que
é percebido por alunos. Com diferentes conteúdos, cada recorte de falas relativas aos
professores evidenciam distintas formas de agirem ou expressarem suas opiniões pessoais em
sala, capazes de fomentar animosidade entre grupos de alunos, conforme destaques.
E: Estimulados por quem? P: Eu acho que pela estrutura, por conta disso,
porque fica muito claro. Eu trabalho num curso que a gente tem problema de
espaço físico, de estrutura física. Se eu falo que eu vou por cinco alunos a
mais significa que eu vou apertar a sala cinco cadeiras a mais. Então, há um
estimulo estrutural (PROF 01).
Ele chega depois [prounistas], e eles [os outros alunos] são estimulados
também pelos professores (PROF 01).
Eu tive só um professor só, que era extremamente elitista. Ele fazia a
chamada e perguntava pelo sobrenome das pessoas, se conhecia tal pessoa...
se tal pessoa era amigo, e... a gente viu que, no final do semestre essas
pessoas ganhavam pontinhos (P1H-IM).
Foi um professor que era totalmente contra o ProUni e ele falava isso
abertamente na sala. Então eu ficava meio receoso, mas no sentido de não
querer discutir com o professor determinadas coisas, então eu preferia ficar
calado, entendeu... mas tirando esse caso... (P10H-FN).
Alguns professores que me perseguiam, mas mais relacionado à condição
social, o de XXX por exemplo, o de XXX, que era terrível, acho que só.
Esses dois são terríveis. É. Acho que são só esses dois mesmos (P7H-FN)
Teve um professor, eu acho que foi esse semestre, que estava falando sobre a
diferenciação da IES antes e agora, e disse que aqui antes era muito barato e
atualmente a IES é muito cara, e segundo entendimento dele, por causa da
quantidade de bolsas. Bolsa de esporte, bolsa daquilo. Aqui tem bolsa para
tudo, então quem sai pagando acaba sendo... De algum lugar tem que vir o
dinheiro, e acaba sendo de quem não é bolsista (P9H-FM).
esse espaço para estimular negativamente os alunos. Proudford e Nkomo (2006) assinalam
que o preconceito e discriminação têm se institucionalizado nas organizações e na sociedade.
Ainda que seja percebido mais como exceção do que como regra, preconceito e discriminação
têm se manifestado no ambiente acadêmico, fazendo como que o acesso à educação e a
apropriação do benefício concedido por direito aos alunos prounistas não seja plenamente
desfrutado. Conforme apontado por Taylor e Moghaddam (1994), na dinâmica intergrupos há
um grupo dominante lutando para manter-se no status de condição superior, enquanto o outro
busca alcançar alguma mudança de status, a fim de aprimorar a identidade grupal para uma
condição superior. Na relação entre alunos prounistas e não prounistas essa luta se estabelece,
pois cada um dos agentes que participam dessa dinâmica contribui para que a
inclusão/exclusão se efetive, sendo que os estereótipos e as manifestações de preconceito e
discriminação só colaboram para efetivação da exclusão, da qual o programa ProUni objetiva
retirá-los.
Você [qualquer pessoa] identifica o problema, você não age, você não ajuda
quem precisa, e deixa esse desfalque (P3H-IN).
Exclusão é não dar oportunidades [...] Exclusão é tudo o que a nossa
sociedade é, porque a nossa sociedade é extremamente excludente (P1H-
IM).
Exclusão é isso: é você não tratar mesmo essas diferenças (PROF 01).
[Exclusão] seria a falta de ações afirmativas, assim... De tentar incluir
pessoas que não têm as mesmas oportunidades que as outras (P12M-FM).
E a exclusão pior é essa que você não sabe que está fazendo, e essa é a típica
da educação. Ah! Eu estou tratando igual... Tratar igual é extremamente
139
avaliados. Hogg e Terry (2001) assinalam que quando uma pessoa passa a ser percebida como
membro do grupo a qual o indivíduo pertence (endogrupo), este será percebido em sua
singularidade; porém quando percebido como diferente (exogrupo) será também visto como
mais homogêneo. Por essas dinâmicas serem reproduzidas nas relações entre prounistas e não
prounistas, a intervenção inicial dos professores, a fim de evitar a formação dos grupos e
promover uma maior interação entre esses alunos, no momento inicial possibilitaria a redução
dos conflitos intergrupais posteriores. Essas formações são feitas porque são feitas
classificações baseadas nas similaridades e diferenças entre eles, que agirão com favoritismo
em relação ao próprio grupo.
Em sua fala, PROF 03 confirma a falta de ação institucional e manifesta sua crítica ao
dizer que “Não se implanta uma política nova sem trabalhar o corpo que vai lidar com as
pessoas. Então, não houve uma preparação, o pouco que nós temos atuado é por acreditarmos,
não temos uma ferramenta, não temos um trabalho de... [qualificação]”. A falta de ações
mostra que não há uma atenção para as interações entre grupos diversos, ou para a promoção
da inclusão, e sim uma inserção desses alunos da IES, de forma que cada um age por seus
próprios valores, não havendo uma atenção da instituição para a promoção de um ambiente
inclusivo.
Da parte institucional as menções de ações excludentes se restringem às acima
apontadas, porém a IES não é a única agente de exclusão. Na fala de P6M-IM, a aluna refere
que “[...] da parte de professor e funcionário, acho que não [houve exclusão]. Nunca senti
nenhuma diferença”, o que sugere perceber que a exclusão existe, mas que vem de outros
agentes, os outros alunos. Acerca do aluno como agente, NP4M-FN diz “[...] ter que insistir
na questão da divisão em grupos”, da mesma forma P9H-FM afirma que em sua sala “[...]
sempre foram os grupinhos fechados”, e assim, complementa PROF 01, se “[...] eles chegam
um mês depois, eles não têm grupos, aí eles formam grupos entre eles, e você começa a ter
um processo de exclusão que é feito pelas circunstâncias” ou, conforme indicado por P11M-
FM, quando solicitam a entrada nos grupos existentes “[...] você é colocada num grupo, pior
ainda, porque é um grupo fechado e as pessoas não estão nem aí para você”.
Uma estratégia considerada de “exclusão agressiva” é relatada por PROF 01, na
qual as “[...] salas fizeram mecanismos físicos de exclusão [...] de não deixar incluir o
fulano”, na qual, a despeito da tentativa de alguns professores de “[...] desarticulação [...] não
fomos vitoriosos” e, por ser “[...] uma sala, a sala não ia mudar de ideia. Então eles [os alunos
prounistas] saíram da sala”. Essa ocorrência traz como agravante o fato de não ser uma ação
de um indivíduo ou de uma “[...] minoria que exclui”, conforme aponta P6M-IM, mas sim
142
coletiva, uma sala toda assumindo uma atitude discriminatória e excludente institucionalizada
na sala. Conforme modelo dos cinco estágios proposto por Taylor e McKirnan (1984) e
apresentado por Taylor e Moghaddam (1994), em geral, as relações sociais ocorrem entre dois
grupos com alguma diferença de status entre eles; no caso citado, a resignação dos alunos
prounistas, que solicitaram ser trocados de sala, demonstra que tanto o grupo em vantagem
como o em desvantagem consideram a estratificação. Os autores apontam que é próprio aos
integrantes de grupos em desvantagem imputar a si mesmos a reponsabilidade por estar em
posição inferior, portanto, caberia a eles resolver a questão, tomando a resolução de mudar de
sala.
Estando o conceito de inclusão-exclusão relacionado com à participação do indivíduo
tanto em processos formais, como o acesso a informações e a canais de tomada de decisões
(MOR BARAK, 2005), aponta-se como outra forma de exclusão que se dá no ambiente
estudado a privação do aluno prounista do acesso a informações. Ainda de acordo com PROF
01 “[...] uma representante, passou um semestre inteiro e não cadastrou o e-mail de nenhum
aluno do ProUni. Tudo o que você mandava de informação eles nunca recebiam”. P11M-FM
relata sua percepção de privação de acesso a informações pelo fato de gabaritos de respostas
de provas já aplicadas serem compartilhadas por e-mail somente para os grupos majoritários,
e não para os outros grupos.
Outra situação indicada por NP1H-IN, na qual
[...] acaba gerando aquela exclusãozinha natural... [...] vai ter um bota fora.
Vamos? Você sabe que o cara não tem. Mas vamos lá... O cara não vai falar:
Meu, eu não tenho R$ 120,00. Mas ele acaba simplesmente não indo, mas
não é porque a gente exclui.
Uma situação provavelmente não será considerada como de exclusão “natural” por
aquele que é vítima dela. As condições socioeconômicas díspares criam barreiras e exclusão
financeira, mas na percepção de PROF 01, a “situações agressivas” não se dão só em relação
à recursos financeiros, também ocorrem “[...] com o prounista: Ah, ele não fala inglês. Eu não
quero no meu grupo. Ele não tem isso... ele não... Eu já ouvi isso: fulano nem convida pro
churrasco, porque ele não vai ter condições de ir”. As passagens indicam que duas dimensões
de diversidade, a condição social e a qualificação pessoal, são apontadas como características
distintivas entre os grupos e em virtude dessas diferenças percebidas as situações de exclusão
ocorrem.
143
Então, ela assim... Ela [colega de sala não prounista e elitista] coloca uma
grande barreira entre ela e as amigas delas para mim e a outras pessoas da
sala. Ela é uma pessoa elitista, ela em específico. Extremamente elitista.
Então, acho que exclusão, só esse fato (P1H – IM).
Às vezes você mora muito longe para poder ir... a IES disponibiliza grupos
de estudo aos finais de semana [pequenos grupos, que se encontram
regularmente para aprofundar discussões sobre temas de interesse comum a
todos]. É uma coisa maravilhosa (P11M-FM).
Há determinados grupos que excluem [...] você vai lá tentar falar com ela,
ela passa a informação e já começa a falar com as outras pessoas e você fica
meio deslocado e acaba saindo fora [...] pelo menos por enquanto, eu não sei
assim, com o passar do tempo, talvez por não se conhecerem ainda muito
bem, esses grupos ficam extremamente fechados (P6M-IM).
Com aquela turma nem tanto [não se sente à vontade]. Às vezes eu quero
fazer uma pergunta e eu espero pra perguntar no final da aula (P11M-FM).
Eu imagino que ocorram casos de exclusão aqui, mas eu não me sinto bem a
dizer sobre isso, porque comigo não aconteceu e eu também não conheço
com quem tenha acontecido (P3H - IN).
Mor Barak (2005) propõe que o senso do indivíduo de ser participante do sistema no
qual está inserido se constrói com base no modo como experiência e percebe suas posições
em relação aos outros grupos sociais predominantes. Porém, chama-se aqui a atenção para o
fato de que os relatos de situações de exclusão apontados são feitos principalmente por
professores e por alunos não prounistas, que de alguma forma as banalizam, enquanto os
alunos prounistas tendem a minimizar as situações de exclusão, ignorando ou racionalizando-
as. Considerando que a percepção dos professores é mais abrangente, uma vez que eles
passam por diferentes salas, e de que, pelo menos em um caso específico, o professor está na
instituição desde o lançamento do Programa, o que lhe confere uma ampla visão dos fatos
relacionados à dinâmica de interação entre prounistas e não prounistas, é possível que alguns
dos alunos prounistas entrevistados, principalmente aqueles que estão nos semestres iniciais,
não tenham realmente experienciado, presenciado ou mesmo tomado conhecimento das
situações de exclusão aqui relatadas, ou ainda que as tenham experienciado, mas não as
reconheçam ou confiram importância às situações vivenciadas.
144
Eu acho que até em parte... A gente nem faz muito esforço pra ir, porque a
gente tem essa sensação de que vai ficar meio de canto.
Eu queria entrar na Atlética, porque eu tinha essa ideia de: vou fazer a
faculdade, não vou ir à faculdade. Mas eu vi que era uma coisa muito
fechada. É aquela coisa, eu venho para a faculdade sete e meia, meio-dia e
meio (sic), tchau, não tem aquela coisa...
estratificadas; e por isso não consideram que a inclusão seja possível, uma vez que percebem
que o status de cada grupo está rigidamente estabelecido e por isso atribuem a si mesmos a
escolha de ficar em posição inferior.
P10H-FN não se envolve em outras atividades da IES e adotou a estratégia de unir-
se aos outros prounistas, criando dentro da sala um espaço deles, conforme relata:
Da mesma forma que a categoria anterior, esta categoria não está isolada a todas as
outras já aqui apresentadas, uma vez que ela compreende todas as histórias e vivências
trazidas anteriormente. Igualmente serão aqui sintetizadas as compreensões dos alunos
entrevistados do que seja inclusão, quais as estratégias de inclusão percebem serem adotadas
pela instituição, pelos colegas e aquelas que adotam pessoalmente dentro do ambiente
acadêmico que favoreçam a experiência de inclusão.
As formas como os sujeitos entrevistados compreendem inclusão são aqui
apresentadas, uma vez que estas servem de referência para que estes se percebam incluídos ou
não. A compreensão de inclusão como “[...] fornecer meios” para o indivíduo crescer ou “[...]
abrir oportunidades para quem não teria” são os entendimentos mais citados, o que expressa
uma ideia de inclusão, como a instrumentalização e concessão de igualdade de condições, o
que deve ocorrer de forma ampla, possibilitando ao indivíduo alcançar autonomia, conforme
explicitado nas falas a seguir.
Fornecer os mesmos meios que se dá a qualquer outro ser que está nesse
ambiente e para o que está de fora, em outro ambiente também. Mas se é
todos os meios, é todos os meios. Então, inclusão mesmo é difícil acontecer
(P1H-IM).
Inclusão seria dar o meio de você conseguir crescer por si só. Seria te
preparar, te dar os instrumentos, que com esses instrumentos, você consiga
caminhar por si só (P9H-FM).
Então inclusão é você ter oportunidade e conseguir se incluir num contexto
que está totalmente fora da sua realidade. A realidade dos meus pais é roça,
146
Um modo mais restrito de pensar inclusão como inserir foi apontado por P2M-IM,
que considera que “[...] inclusão seria pegar alguém que está fora dessa capacidade de poder
estudar, não no sentido intelectual, mas de pertencer àquilo ali, e inserir essa pessoa dentro
desse meio”. Por essa compreensão, entende-se que a simples concessão da bolsa do ProUni
já seria suficiente para que a aluna se considere incluída. O argumento de NP1H-IN diz que
“Inclusão é inserir algo que não é. No caso inclui o que não era aceitável”. Essa fala sugere
que a inclusão vem do meio, que o diferente não é aceitável e que não há da parte de NP1H-
IN uma disposição para acolher e aceitar o diverso; isso, de acordo com Ferdman et al.
(2009), impede uma experiência psicológica de inclusão, uma vez que o comportamento
inclusivo antecede essa experiência.
A obtenção de tratamento igualitário e a possibilidade de ser autêntico são
considerados por Ferdman et al. (2009) dois componentes-chaves da experiência de inclusão,
e para alguns entrevistados é considerado como sinônimo de inclusão, conforme indica P7H-
FN “[...] é tratar como igual o diferente”. Compreendida também como “[...] aceitação das
pessoas, reconhecer [...] o porque você é diferente e não ter preconceito e não ter reservas
quanto a sua situação” (P5M-IN) e como “[...] uma diversidade de pessoas de grupos diferentes
[...] que conseguem conviver e viver [...] sem distinção e sem discriminação” (P6M-IM), e
como “[...] redução de barreiras entre pessoas” (P10H-FN).
realmente pode contribuir para a inclusão desses alunos é o grupo de estudos, mas que atende
mais o objetivo de fomentar interesse científico do que a promover inclusão.
O aluno P7H-FN considera a instituição inclusiva por ter sido condescendente com
ele, e lhe dado atenção a ele quando pegou “[...] quatro DPs, quando poderia ter pego duas só.
Mas aí eles me chamaram pra conversar, pra ver o que estava acontecendo. Eu expliquei, eles
me ajudaram. Dessa instituição eu não posso reclamar nada”. Para esse aluno, o apoio
institucional é percebido como um comportamento inclusivo.
PROF 01 relata que na Faculdade de Direito, ela e alguns outros professores
combinaram entre eles: “Trabalho em grupo... não no primeiro mês. A gente só vai dividir
grupo, a gente só vai estimular isso quando a sala estiver composta, não entra mais ninguém”.
Essa professora também considera que o Moodle (plataforma de ensino à distância utilizada
na IES) “[...] é fantástico para inclusão, porque o professor manda mensagem para todos os
alunos indistintamente”. Nas duas situações, tanto a articulação entre professores como a
utilização do Moodle, embora não sejam estratégias para incluir, prestam-se a minimizar as
exclusões que ocorrem no momento de formação de grupos e na comunicação de grupos,
evitando a omissão de alunos prounistas das listas de e-mail, conforme apontado na categoria
anterior.
Na IES pesquisada não há nenhuma estratégia de inclusão institucionalizada, e até
mesmo entre os professores entrevistados as percepções são distintas, pois enquanto PROF
02 e PROF 03 afirmam nunca terem visto esse tipo de estratégias, PROF 04 considera que há
“[...] uma tradição (histórica) de inclusão, no bom sentido, em relação à IES. Então acho que a
instituição tem suas estratégias”, porém, não indica quais são elas. As ações aqui apontadas
mostram-se tênues diante dos relatos de exclusão anteriormente apontados, cabendo aqui
ratificar a conclusão a que Krames (2010) chegou em sua pesquisa, apontando que o
compromisso social das IES que aderem ao Programa precisa ser traduzido em ações
concretas de acolhimento, orientação e acompanhamento aos alunos bolsistas, o que não pôde
ser constatado na IES pesquisada. PROF 02 indica que a instituição deveria fazer um trabalho
em torno do Programa, a fim de “[...] mudar a mentalidade da maioria que é contrária, porque
as pessoas são contrárias, mas não conhecem”, o que informaria e favoreceria a inclusão. Isso,
de acordo PROF 03, ocorre pois o pouco “[...] sentimento de acolhimento que está
acontecendo é mais por formação dos próprios alunos do que por uma atitude interna da
escola”.
Buscando identificar estratégias de inclusão utilizadas pelos outros alunos, as
respostas obtidas giram em torno da opinião de NP5M-FM, que afirma nunca ter visto “[...]
148
alguém querendo incluir assim, ou algum projeto assim, vamos incluir tal pessoa”, e de P9H-
FM e PROF 04 e PROF 03, que dizem não conhecerem qualquer ação desse tipo. Verifica-se
que esse tipo de estratégia é incomum, pois dos 22 entrevistados, apenas PROF 01 relatou
caso único em que uma ação inclusiva foi voluntariamente tomada por um grupo de alunas,
conforme transcrição do relato:
Duas meninas eu me lembro que tiveram problema de acompanhamento e aí
um grupo de meninas [...] elas se reuniram, e um dia na minha aula elas
falaram: “Professora, você se incomoda se a gente fizer atividade em
conjunto, cada uma vai fazer com uma”. Elas se dividiram entre si e foram
ajudar as outras e elas fizeram assim. Essa tarde a fulana vai te explicar tudo
o que aconteceu dessa disciplina. Elas se organizaram e depois de um tempo
elas já vieram... Essa foi uma coisa que me marcou também, porque foi bem
espontâneo, será que se a gente ser revezar, porque uma não dá pra fazer
tudo, mas se cada uma fizer uma parte... Foi bem legal isso.
[...] eles [os alunos prounistas] sempre estão com a gente. Jogos jurídicos
todo mundo junto. Tanto é que foi uma aluna, que inclusive é prounista, foi
ela que separou a casa de uma amiga dela, e foi a sala inteira pra casa que
era de uma amiga dela na cidade. Então, assim não tem nada de mais.
P9H-FM também se considera livre para se expressar, porém seus colegas não
sabem que ele é aluno prounista, portanto não é possível determinar se sua experiência de
inclusão seria a mesma se sua identidade de prounista fosse conhecida. Ele afirma que:
[...] eu tenho amigos que não são bolsistas e não têm a metade da integração
que eu tenho aqui dentro. Para mim, ser um prounista não muda em nada, ser
prounista é ser IESzista.
P7H-FN considera que foi bem recebido, encontrou uma sala receptiva, se expressa
livremente e conta que:
P11M-FM considera que teve uma experiência positiva durante sua formação, uma
vez que gosta muito da IES e considerou-se valorizada quando os amigos saíram com ela para
comemorar seu aniversário, destacando esse momento com o ponto máximo de experiência de
inclusão, contando que:
É porque eu gosto muito [de estudar aqui], então todos os dias meus são
muito felizes. Tenho que pensar numa [experiência de inclusão] extra. Teve
um dia que eu fiz aniversário, a gente saiu e foi todo mundo comemorar,
esse foi um dia especialmente feliz.
P12M-FM relata como sua experiência mais positiva dentro da IES foi a de poder
compartilhar seu conhecimento com outros colegas, ensinando-os a matéria antes das provas,
uma forma de se sentir aceita, respeitada e valorizada pelo por eles, afirmando que:
ótica, uma vez que não são suprimidas vagas dos outros alunos, porém parte do mainstream
aparentemente considera que estão em uma disputa pela vaga e pelo espaço social. Na
ausência de políticas e ações alinhadas com o objetivo de valorizar a diversidade, para o
alcance de tal objetivo dentro da IES estudada há um longo caminho a ser percorrido. Será
necessário maior comprometimento institucional, dos outros alunos e engajamento dos
professores, a fim de que nesse ambiente as pessoas tenham comportamentos inclusivos em
decorrência dos quais a experiência de inclusão seja possível.
Buscando verificar quais são as percepções dos professores acerca dessa dinâmica de
inclusão/exclusão dos alunos prounistas no ambiente acadêmico, e bem como analisar o papel
dos professores junto aos alunos prounistas, nessa categoria o papel do professor como agente
de inclusão ou de exclusão é apresentado.
Ferdman et al. (2009) apontam que sentir-se valorizado como membro do grupo e
também como ser humano, ser reconhecido e apreciado, propicia ao indivíduo a experiência
de inclusão. PROF 03 percebe essa carência em alguns de seus alunos prounistas e se mostra
disponível a acolhê-los, conforme relata:
[...] o que eu percebo é uma questão de afetos mesmo, que eu sinto que às
vezes eu preciso sentar... eles querem falar comigo. Você vê que no fundo a
carência de atenção e de afeto é tão grande que quando ele percebe que o
professor tem essa abertura, ele quer conversar com você. No fundo ele quer
saber até que ponto você olha para ele e o vê como ser humano (PROF 03).
É um cara que te instiga a pensar. Eu tive contato com esses dois professores
que são acima da média para mim [PROF 02 e PROF 03] (P3H-IN).
Gosto muito dos professores, eu tenho uma relação muito de amizade com os
professores, confesso. Nunca teve nenhum distrato pessoal. Com os
professores formo um vínculo de amizade, mesmo. Tanto é que, tem
professores que eu gosto tanto, que de quinta-feira eu assisto duas vezes a
mesma aula [de PROF 04] (P4M-IN).
153
Ao ser questionada sobre sua experiência mais positiva até o momento dentro da IES,
P4M-IN aponta que a interação com os professores PROF 02 e PROF 04, a sensibilidade
destes às questões sociais, a abertura para trocas com eles são comportamentos que trazem
como consequência o bem-estar, que favorecem a uma experiência de inclusão, conforme
relato:
Ele [PROF 04] desperta a luz de você tentar ter aquela experiência de uma
sociedade mais igualitária, mais justa, e de olhar diferente para as minorias, e
não olhar como empecilho, mas como pessoas que devem ter alguns direitos,
para tentar competir com as pessoas que estão acima. Então, ele é uma luz,
uma luz completamente. E esse semestre também, PROF 02, ela também é
outra luz, outra luz. Tive experiências sensacionais com eles. Troca de
conhecimentos (P4M-IN).
PROF 03 afirma que nunca precisou intervir junto a algum aluno, mas seu discurso
revela que o faz uma intervenção educativa e preventiva, uma vez que “[...] trabalha questões
sociais em sala”, o que é fundamental para a desconstrução de prejulgamentos e crenças
estereotipadas acerca do Programa e dos alunos beneficiados. Portanto, a saída possível, e
para a qual o professor pode ser importante agente, é trabalhar essas questões em sala de aula,
prover o aluno de informações fundamentadas, a partir das quais possam se posicionar. PROF
02 tem convicção de que alunos que são contra políticas públicas e contra o ProUni o fazem
por desinformação, e afirma ter “[...] certeza que se... cota, ProUni, tudo isso, se tivesse um
professor que viesse aqui na frente e falasse: é isso, isso, isso... estudem, analisem a
Constituição, vejam os argumentos a favor e os contra” esses posicionamentos seriam
revistos. Portanto, fornecer informações e discutir essas questões mostra-se o caminho mais
eficaz para fazer com “[...] que as pessoas entendam do que se trata, e tem que ser em sala de
aula. O professor passar trabalhos sobre o tema, porque aí o cara vai mergulhar”. Contudo,
para que esse tipo de conduta seja adotada, é necessário que haja uma crença institucional e
pessoal de cada professor, de que o caminho da inclusão e do respeito ao ser humano em suas
singularidades e diferenças é também o caminho para uma sociedade mais justa e melhor, e
que isso necessariamente passa pela educação e informação.
A percepção de imparcialidade de tratamento dos professores para com os alunos é
indicativo de que estes não se sentiram discriminados por eles, que relatam não perceber
qualquer favoritismo ou preconceito. P1H-IM assinala que “[...] os professores tratam bem
quem se interessa. Não importa sua classe social, não importa sua cor...”, mas em seguida
aponta a existência de uma exceção, que é elitista. Sua opinião é corroborada por outros
154
[...] um professor só, que era extremamente elitista. Ele fazia a chamada e
perguntava pelo sobrenome das pessoas, se conhecia tal pessoa... se tal
pessoa era amigo, e... a gente viu que, no final do semestre essas pessoas
ganhavam pontinhos (P1H-IM).
Alguns professores que me perseguiam, mas mais relacionado a condição
social, o de XXX [dá o nome da matéria] por exemplo, o de YYY [dá o
nome da matéria], que era terrível, acho que só. Esses dois são terríveis. É.
Acho que são só esses dois mesmos (P7H-FN).
Fazer chacota com a ignorância do outro... eu estou buscando conhecimento.
Você é o professor, você está aqui para isso e fazer chacota é o nível mais
baixo que um professor pode chegar, e eu já encontrei isso (P11M-FM).
Ressaltando seu papel de agente de inclusão, PROF 03 diz que está “[...] sempre
acolhendo, mas não é todo o corpo docente, não”. Eventualmente o próprio professor não está
aberto para as questões sociais, não acolhe o aluno prounista e ainda utiliza o espaço de sala
de aula para disseminar suas opiniões preconceituosas e discriminatórias. Em uma sala na
qual 10% dos alunos são bolsistas do ProUni, um professor falar abertamente ser contrário ao
Programa faz no mínimo com que esse aluno, indiretamente, o perceba como desfavorável a
ele. O professor PROF 01 argumenta que “[...] o professor, ele é modelo”, mas que os
comentários tecidos por eles em sala de aula instigam alunos ao preconceito. Mais do que
expressar opinião acerca do Programa, as crenças pessoais são as bases para as ações, e, em
decorrência disso, ao invés do professor atuar como agente de inclusão torna-se agente de
preconceito e exclusão.
[Aluno diz] “Professora você sabe que a gente é contra [o ENEM]... Eu olhei
e eu falei: Não, vocês são elitistas. Elitista é aquele que acha que só quem
teve as mesmas condições têm os mesmos direitos. Não tem problemas,
muita gente nesse país é, mas saiba que você é... [...] E aí ocorreu um
processo legal... Foi assim na primeira semana, na segunda semana eles já
estavam fazendo a campanha a favor (PROF 01).
Eu tenho muito o hábito de chamar o representante: Você se decidiu ter um
cargo representativo, então você vai fazer direito. É... mais isso sou eu. Eu
156
falo mesmo, e eu falo em voz alta e falo pra todo mundo ouvir. Não é
comum (PROF 01).
Este capítulo tem como objetivo articular os dados apresentados no capítulo anterior,
com a literatura. Como em cada uma das categorias já descritas, breves discussões com o
referencial teórico foram introduzidas, este capítulo busca avançar no processo interpretativo,
integrando teorias e dados, a fim de determinar a dinâmica de inclusão e/ou exclusão
depreendida dos dados, de forma a ampliar a compreensão do fenômeno à luz dos referenciais
teóricos da Psicologia Social, contribuindo para a área de estudo. Para efeito deste trabalho,
consideram-se pessoas “diversas” ou “minorias” os alunos pertencentes aos grupos sub-
representados, como cotistas, bolsistas, alunos prounistas, percebidos como de menor status
social.
Hanashiro et al. (2011, p. 3) afirmam que embora os membros de grupos de maioria
sejam historicamente aqueles que tiveram ou têm vantagens em poder e recursos econômicos,
quando comparados com grupos de minoria, estes não percebem seu privilégio. Ofertar uma
bolsa do ProUni para alunos aprovados pelo Enem, aos quais tantas outras oportunidades já
foram negadas devido às restrições socioeconômicas, é considerado por alguns alunos não
prounistas da IES pesquisada uma concessão de vantagem, o que denota essa falta de
percepção das desigualdades de condições.
Não obstante, para alguém com vantagem que possui essa percepção há também uma
imagem de que porque o aluno prounista não entrou pelo vestibular da IES é menos
capacitado; e sua origem social e/ou o fato de sua formação ter sido em escola pública
figuram como marcas ou estigmas vistos como negativos, de forma que, aos olhos de alguns
alunos não prounistas, o potencial desse aluno seja desqualificado (GOFFMAN, 1988).
Assim como as sociedades têm se tornado mais heterogêneas (MOR-BARAK, 2005),
o mesmo tem ocorrido com o perfil dos alunos da IES pesquisada. O perfil do grupo de alunos
não prounistas desta pesquisa evidencia que, embora aparentemente a maioria dos professores
e alunos entrevistados percebam o perfil do aluno da IES como predominantemente de classe
média e média alta, o perfil de parte dos alunos entrevistados evidencia existir uma parcela de
alunos de condições socioeconômicas menores, que trabalham e custeiam com esforço o
próprio curso. Além destes, bolsas filantropia já eram concedidas na IES pesquisada antes que
da adesão ao ProUni. Entretanto, na percepção de alguns alunos, a adesão ao ProUni trouxe
para a instituição um aluno diverso ao perfil predominante. As manifestações de preconceitos
158
A dinâmica das salas evidencia que categorizações, feitas com base em similaridades
percebidas, dão origem aos grupos, sendo a criação de grupos o primeiro passo para o
preconceito (ARONSON; WILSON; AKERT, 2002), uma vez que pessoas que não se
enquadram no protótipo do grupo não são aceitas. Categorias como o “grupo dos
Mauricinhos” ou aqueles que “têm um modo de vida de classe média alta”, “uma situação
financeira muito próxima” ou “prounistas [que] se juntam” são critérios de agrupamentos
referidos pelos entrevistados. Mor-Barak (2005, p. 132) assinala que a diversidade refere-se
ao processo de gerar categorias distintas, “está relacionada, também, com o pertencer a um
grupo diferente quando comparado ao mainstream na sociedade, que o torna suscetível a
sofrer consequências resultantes de uma associação com o pertencer ou não a certo grupo
social”. De acordo com a percepção dos entrevistados desta pesquisa, condições
socioeconômicas, background e cultura/qualificação pessoal são características determinantes
para a aceitação em alguns grupos. Estabelecer inglês fluente como prerrequisito para ser
aceito em um grupo de trabalho, ao invés de domínio do conteúdo; objeção explícita à
aceitação de alunos prounistas em alguns grupos são indicativos de que as essas categorias
determinam as fronteiras intergrupais e estabelecem as características distintivas de pertença
ao grupo, no qual aqueles que são diversos aos critérios estabelecidos não são aceitos.
Portanto, ser prounista é uma dimensão de diversidade, pois traz implicações para a relações
destes com os outros alunos IESzistas.
buscam alcançar uma identidade que seja mais distinta, ao tempo em que os alunos não
prounistas desejam e lutam para manter o status de condição comparativamente superior. A
omissão da identidade é uma estratégia adotada por alguns alunos, eventualmente por todo o
período da formação, para tentarem ser aceitos e incluídos. A busca por um desempenho
superior também é percebida como uma forma funcional de obter distintividade intergrupo,
porém, o que mais se mostra nos dados é que, as características pessoais desempenham
importante papel para que sejam aceitos e a autoinclusão aparentemente é a estratégia mais
efetiva.
Não foram identificadas estratégias do grupo de prounistas para o alcance de alguma
mudança social para o grupo como um todo, verificando-se somente estratégias individuais a
fim de alcançar uma mobilidade social. Com base no modelo dos cinco estágios da dinâmica
intergrupos propostos por Taylor e McKirnan (1984 apud TAYLOR; MOGHADDAM, 1994),
verificou-se um único caso de mudança intergupos, em que a aluna prounista se sente
identificada como IESZista, tendo contudo ocorrido uma mobilidade social individual, o que
faz com que ela considere haver mérito pessoal na conquista dessa mobilidade. Portanto, ao
ser aceita como membro do outro grupo, ela despersonaliza e deixa para trás a identidade de
prounista, para assumir o protótipo de IESZista. Praticamente metade dos alunos prounistas
entrevistados percebe que as relações intergrupais são estratificadas e não há possibilidades de
mudança, enquanto a outra metade acredita que há possibilidade de mobilidade individual,
mas não do grupo, o que provavelmente justifique a falta de qualquer articulação coletiva.
Matéria do jornal A Folha de São Paulo do dia 14/09/2014 noticiou a eleição de uma aluna
negra e prounista do curso de Direito da IES pesquisada para presidente do Centro Acadêmico
do curso, indicando uma situação que quebra um paradigma, pois concede um espaço que é
ocupado por meio de voto democrático a uma representante de um grupo de minoria. A aluna
representa as mulheres, os negros e os prounistas, podendo ser considerada o que Taylor e
Moghaddam (1994) chamam de um “token”, ou seja, uma pessoa de referência, a partir da
qual os alunos podem passar a perceber que são injustamente discriminados; que os faça
tomar consciência de que habilidades e esforços pessoais não são suficientes para vencer as
barreiras sociais e que as dimensões para comparação social, papéis e percepções assumidas
precisam ser renovadas.
Tanto os discursos dos alunos não prounistas como dos professores pesquisados
revelam que estes possuem uma hierarquia subjetiva de níveis ou graus de exclusão e de
discriminação. A menção a uma exclusão leve, exclusão pior e exclusão agressiva é referida
160
Resultados dessa pesquisa diferem dos constatados por Santos (2011), pois a
percepção de todo o grupo de bolsistas por ela estudado indica a existência de sentimentos de
aceitação, integração e a ausência de qualquer situação de diferenciação com professores,
162
colegas e funcionários; alinhando-se com Nogueira (2013), que indica que a experiência
acadêmica promove sentimentos de afeto e emoções contraditórias, tais como preconceito,
exclusão, alegria e vitória. Das dissertações e teses revisadas para este trabalho, apenas Santos
(2011a) teve alunos do curso de Direito como sujeitos de pesquisa, porém seu estudo fez uma
abordagem sociológica, investigando o lugar assumido pelo ProUni em suas trajetórias de
vida. Dessa forma, este trabalho apresenta uma amostra na qual três diferentes agentes de
inclusão e exclusão foram investigados, o faz sob uma perspectiva teórica diferente das
abordagens utilizadas pelos outros pesquisadores e contribui socialmente, dado ser o ProUni
uma política recente, que ainda tem limitações em sua abrangência. Este tem se mostrado
importante meio de acesso ao ensino superior e tanto no âmbito do sistema educacional como
um todo quanto dentro da IES pesquisada, pode ser repensado e aprimorado, para que os
benefícios desta possam ser ampliados e esses alunos incluídos e não inseridos nas IESs.
Conforme assinalado por Hanashiro et al. (2011, p. 14), “[...] a inclusão depende do
próprio indivíduo, de sua vontade e habilidade de desenvolver comportamentos que
contribuem para fomentar sua inclusão”, porém eventuais barreiras a aceitação podem
ocorrer. No momento inicial, em que os alunos estão se conhecendo e se dando a conhecer, o
comportamento de autoinclusão é de fundamental importância. Conforme já apresentado
anteriormente, existem receios dos alunos prounistas em relação ao novo ambiente e ao
tratamento que receberão. Se esses alunos mantiveram uma posição passiva e insegura frente
ao meio, as respostas de parte dos alunos não prounistas será de indiferença. No entanto, os
dados aqui apresentados nos sugerem que há alunos cujos valores e crenças pessoais os fazem
acreditar na distinção, superioridade de uns em relação a outros, e eles manifestam isso nas
relações interpessoais. Em havendo qualquer marca distintiva, seja o tempo da chegada, a
identificação voluntária ou involuntária como prounista, a postura “mais humilde”, tornará
esses alunos suscetíveis a serem vítimas de preconceitos e discriminações.
163
Embora haja evidências de que para os alunos que chegam na primeira lista exista
menor desconforto inicial, infere-se aqui que a autopercepção do aluno como de uma pessoa
desacreditável, conforme referida por Goffman (1988), pode impedir a experiência de
inclusão, pois inibirá a vontade e o desejo de se colocar frente ao meio. Verifica-se que P2M-
IM e P6M-IM, que estão nos semestres iniciais, chegaram na primeira lista e entraram desde o
primeiro dia de aula são retraídas e mantêm essa postura de retraimento desde o início do
curso: não se envolveram em atividades extraclasse para expandir rede de contatos e não estão
estagiando. Uma vez que “[...] a inclusão não reflete um comportamento natural dos
indivíduos” (HANASHIRO et al. , 2011, p. 2), presume-se que se essas alunas não assumirem
um comportamento autoinclusivo, ao término do curso o desfecho será como o de P10H-FN,
que durante toda a formação esteve restrito a um pequeno grupo de convívio com outros
alunos prounistas, sem vivenciar uma experiência de inclusão, não conseguindo quebrar as
barreiras e resistências naturais e inerentes às relações interpessoais e intergrupais. No
entanto, P1H-IM e P4M-IN, ainda no segundo semestre do curso, já ampliaram seus espaços
de convivência, se engajaram em atividades extraclasse, indicam bom desempenho acadêmico
como fator importante e mostram-se autoinclusivos, agentes da própria experiência de
inclusão. P5M-IN expressa sua percepção de ser inclusa quando diz que se sente uma
IESzista, sem fazer distinção entre a condição de prounista e dos outros alunos da IES.
Dessa forma, conclui-se que na dinâmica entre alunos prounistas e não prounistas a
formação de grupos com base nas similaridades percebidas, e em não pertencendo ao grupo
majoritário, os alunos prounistas são percebidos como “exogrupo” e, portanto, mais
homogêneos, dando origem aos estereótipos. Discriminações são manifestas principalmente
no momento de formação de grupos de trabalhos e os preconceitos estão mais relacionados às
condições socioeconômicas. Não havendo identificação ou similaridades percebidas não se
estabelece relações mais próximas, o que impede maior intimidade entre os grupos e
164
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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180
THOMAS, D. A.; ELY, R. J. Making Differences Matter. Harvard Business Review, Sep-
Nov, p. 01-13, 1996.
APÊNDICE A
01. Em primeiro lugar, diga quantos anos você tem, seu curso, semestre e como se descreve
em termos de raça.
02. Fale-me um pouco sobre você. (onde mora, profissão dos pais, nível de escolaridade
deles, estrutura familiar – número de irmãos, moradia e descreva um pouco do seu
temperamento – jeito de ser).
03. Você enfrenta alguma dificuldade com relação ao seu dia a dia?
04. O que significa o ProUni para você e para sua vida?
05. Em termos positivos e negativos, o que significa para você ser um(a) aluno(a) bolsista
ProUni dentro da UPM?
06. O que o significa inclusão para você?
07. O que o significa exclusão para você?
08. Por que escolheu estudar aqui? Expectativas quando chegou e como foi a adaptação no
primeiro momento? Como você percebeu o atendimento inicial na área de bolsas e
secretarias? Conte-me um pouco sobre os procedimentos iniciais de apresentação da
documentação, até chegar à sala de aula.
09. Logo no início, quando você começou a estudar aqui, como foi a atitude dos seus colegas
de sala para com você (receptivas, acolhedoras, indiferentes, facilitadoras)? Você teve algum
tipo de dificuldade para se ambientar?
10. Fale um pouco, por favor, sobre sua turma de convívio mais próximo na faculdade. Hoje,
como é seu relacionamento com o grupo? Como é o tratamento dos seus colegas de sala para
com você?
11. Como foi para você a experiência de interação com professores? E com outros
profissionais da instituição?
12. Fale-me um pouco sobre os seus sentimentos em relação à instituição, aos professores e
aos seus colegas (pedir situações concretas).
13. Quando há trabalhos em grupo a serem feitos, como é formado o seu grupo de trabalho?
14. Até esse momento da sua trajetória acadêmica, que sentimentos melhor descrevem sua
experiência como universitário desta instituição?
15. Você se sente à vontade junto aos seus colegas de sala? Em geral, você se sente à vontade
para se expressar, perguntar, participar das aulas? Por quê?
182
APÊNDICE B
01. Em primeiro lugar, diga quantos anos você tem, seu curso e semestre e como se descreve
em termos de raça.
02. Fale-me, por favor, sobre o seu grupo de convívio mais próximo na faculdade.
03. Como foi para você construir essas amizades com seu grupo?
04. Você sabe identificar os alunos bolsistas do ProUni da sua sala? Como você os
identifica?
05. Como você descreve o perfil do aluno da IES em geral?
06. Como você descreve o perfil geral do aluno prounista?
07. Que diferenças e semelhanças você acha que existe entre o perfil geral dos alunos da IES
e os alunos bolsistas do ProUni?
08. Logo no início, quando você começou a estudar aqui, como foi a atitude dos seus
companheiros de sala para com você (receptivas, acolhedoras, indiferentes, facilitadoras)?
Você teve algum tipo de dificuldade para se ambientar?
09. Fale um pouco sobre sua turma de convívio mais próximo na faculdade. Hoje, como é seu
relacionamento com o grupo? Como é o tratamento dos seus colegas de sala para com você?
10. Como foi para você a experiência de interação com o grupo, com professores e com
outros profissionais da instituição? Fale-me um pouco sobre os seus sentimentos em relação à
instituição, aos professores e aos seus colegas.
11. Quando há trabalhos em grupo a serem feitos, como é formado o seu grupo de trabalho?
12. Como os alunos prounistas são vistos pelos alunos não prounistas?
13. Você já trabalhou em grupos com alunos prounistas? Como foi a interação deles no
grupo?
14. Você já testemunhou alguma atitude ou comportamento negativo em relação algum aluno
pelo fato de ser prounista? Você tem alguma situação que exemplifique?
15. Por algum outro motivo, isso já ocorreu? Você pode me dar exemplos de situações em
que isso tenha ocorrido, mesmo que não seja com você?
16. Como você vê a participação do aluno prounista aqui dentro da instituição? O que o
significa inclusão para você?
17. O que o significa exclusão para você?
184
APÊNDICE C
Ob jetivo Ger a l: Co mp r eend er a d inâ mica d e inclus ã o e/o u exclus ã o d o a luno p r o unis ta no es p a ço a ca d êmico
Ver ifica r a s d imens õ es d e Como você descreve o perfil do aluno da IES em geral? Como você descreve o perfil do aluno da IES em geral? Como você descreve o perfil do aluno da IES em geral?
d iver s id a d e na s q ua is o s a luno s
p r o unis ta s s e r eco nhecem e s ã o Que diferenças e semelhanças você acha que o seu perfil Como você descreve o perfil do aluno prounista? É possível identificar os alunos bolsistas do Prouni nas suas
r eco nhecid o s pessoal tem com desses alunos? salas de aula? Como você os identifica?
Como você percebe que os alunos prounistas são vistos Que diferenças e semelhanças você acha que o seu perfil Que diferenças e semelhanças você acha que o seu perfil
pelos alunos não prounistas? pessoal tem com desses alunos? pessoal tem com desses alunos?
Você se identifica como bolsista para os outros alunos? Você sabe identificar os alunos bolsistas do Prouni da sua
Por que? sala? Como os identifica? XXXXXXXXXXXXXXXXX
Inves tig a r a exis tência d e Como os alunos prounistas são vistos pelos alunos não Como os alunos prounistas são vistos pelos alunos não Como você percebe a interação entre alunos prounistas e
es ter eó tip o s , p r eco nceito s e prounistas? prounistas? não prounistas aqui dentro da IES?
d is cr imina çã o na
inclus ã o /exclus ã o d o s a luno s Você já experienciou alguma atitude ou comportamento Você já testemunhou alguma atitude ou comportamento Você alguma vez percebeu algum aluno ser discriminado
p r o unis ta s negativo em relação à sua pessoa pelo fato de ser aluno negativo em relação a algum aluno pelo fato de ser aluno pelo fato de ser prounista?
do ProUni? Você tem alguma situação que exemplifique? do ProUni? Você tem alguma situação que exemplifique?
Por algum outro motivo, isso já ocorreu? Pode me dar Na sua percepão, existe preconceito dos alunos regulares
XXXXXXXXXXXXXXXXX exemplos de situações em que isso ocorre, mesmo que para com os alunos prounistas? Como se manifesta?
não seja com você?
Ob jetivo Ger a l: Co mp r eend er a d inâ mica d e inclus ã o e/o u exclus ã o d o a luno p r o unis ta no es p a ço a ca d êmico
Ques tõ es d o Ro teir o
Objetivos Específicos:
Pr o uni N ã o Pr o uni Pr o fes s o r es Res p o ns a b ilid a d e So cia l
Co mp r eend er a d inâ mica d e Em temos positivos e negativos, o que significa para você Você percebe em alunos não prounistas alguma estratégia Você percebe em alunos não prounistas alguma estratégia
Inclus ã o /E xclus ã o d o s a luno s ser um(a) aluno(a) bolsista ProUni dentro da UPM? de inclusão ou exclusão de alunos que são prounistas? de inclusão ou exclusão de alunos que são prounistas?
p r o unis ta s na IE S
O que o significa inclusão para você? O que o significa inclusão para você? O que o significa inclusão para você?
O que o significa exclusão para você? O que o significa exclusão para você? O que o significa exclusão para você?
Você considera o ambiente da IES inclusivo ou excludente? Você considera o ambiente da IES inclusivo ou excludente Você considera o ambiente da IES inclusivo ou excludente
Por quê? para os alunos do Prouni? Por quê? para os alunos do Prouni? Por quê?
Você poderia me relatar alguma experiência muito positiva Você nota a existência da algum tipo de estratégia por
que você teve com seu grupo de trabalho que o deixou parte dos alunos prounistas para se inserirem no grupo?
XXXXXXXXXXXXXXXXX
feliz? Porque você acha que isso aconteceu? Quais?
Você poderia me relatar alguma experiência muito negativa Como você percebe a inclusão e ou exclusão dos alunos Como você percebe a inclusão e ou exclusão dos alunos
que você teve com seu grupo de trabalho que o deixou prounistas pela instituição? E em relação aos grupos prounistas na instituição? E em relação aos grupos sociais?
muito triste? Porque você acha que isso aconteceu? sociais?
Você percebe em alunos não prounistas alguma estratégia Você percebe em alunos não prounistas alguma estratégia
de inclusão ou exclusão de alunos que são prounistas? de inclusão ou exclusão de alunos que são prounistas?
XXXXXXXXXXXXXXXXX