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Contabilidade

Pública
Administração Pública e a
Contabilidade Pública
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Gerente Editorial
ALESSANDRA VANESSA FERREIRA DOS SANTOS
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autoria
ELAINE CHRISTINE PESSOA DELGADO
DAYANNA DOS SANTOS COSTA MACIEL
AUTORIA
Elaine Christine Pessoa Delgado
Possui graduação em Administração pela Universidade Federal de
Campina Grande (2007) e pós-graduação em Direito Administrativo pela
Faculdade Campos Elíseos (2020). Com experiência técnico-profissional
na área de gerência de empresas por mais de dez anos, Elaine também
é professora conteudista na empresa Modular Criativo.

Dayanna dos Santos Costa Maciel


Mestre em Administração pelo Programa de Pós-Graduação em
Administração da UFPB (2019), área de concentração Administração
e sociedade e Mestre em Recursos Naturais, pelo Programa de Pós-
Graduação em Recursos Naturais da UFCG (2014), com ênfase na
linha de pesquisa Sustentabilidade e Competitividade. Dayanna possui
graduação em Administração pela Universidade Federal de Campina
Grande (2010) e Atua como pesquisadora no Grupo de Estudos
em Gestão da Inovação Tecnológica (GEGIT) – UFCG, cadastrado
no diretório de grupos de pesquisa do CNPq – na linha de pesquisa
Inovação e Desenvolvimento Regional l, com foco nos seguintes temas:
administração geral, gestão da inovação, desenvolvimento regional.
Atuou como pesquisadora do Grupo de Estratégia Empresarial e Meio
Ambiente (GEEMA) – cadastrado no diretório de grupos de pesquisa do
CNPq – na linha de pesquisa Estratégia Ambiental e Competitividade
com ênfase em Modelos e Ferramentas de Gestão Ambiental com foco
nos seguintes temas: administração geral e gestão ambiental.
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez
que:

OBJETIVO: DEFINIÇÃO:
para o início do
desenvolvimento houver necessidade
de uma nova de apresentar um
competência; novo conceito;
NOTA: IMPORTANTE:
quando necessárias as observações
observações ou escritas tiveram que
complementações ser priorizadas para
para o seu você;
conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
sobre o tema em
melhor explicado ou estudo, se forem
detalhado; necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a
bibliográficas necessidade de
e links para chamar a atenção
aprofundamento do sobre algo a
seu conhecimento; ser refletido ou
discutido;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso quando for preciso
acessar um ou mais fazer um resumo
sites para fazer acumulativo das
download, assistir últimas abordagens;
vídeos, ler textos,
ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando uma
atividade de competência
autoaprendizagem for concluída e
for aplicada; questões forem
explicadas;
SUMÁRIO
O que é Administração Pública.............................................................. 12
Quem é a Administração Pública?....................................................................................... 12

Administração direta................................................................................................... 16

Administração indireta............................................................................................... 18

Princípios da Administração Pública.................................................................................. 21

Contabilidade Pública e sua história no Brasil................................ 23


A Contabilidade Pública..............................................................................................................23

História da Contabilidade Pública........................................................................................27

Princípios, objeto, objetivo e aplicação da Contabilidade


Pública.............................................................................................................. 34
Princípios da Contabilidade Pública...................................................................................34

Objeto da Contabilidade Pública......................................................................................... 38

Objetivo da Contabilidade Pública..................................................................................... 40

Campo de aplicação da Contabilidade Pública........................................................42

Regime contábil e exercício financeiro da Administração


Pública.............................................................................................................. 45
Regime contábil................................................................................................................................45

Regime de caixa........................................................................................................... 49

Regime de competência........................................................................................ 50

Exercício financeiro da Administração Pública...........................................................52


Contabilidade Pública 9

01
UNIDADE
10 Contabilidade Pública

INTRODUÇÃO
Você sabe o que é a Contabilidade Pública? E como ela surgiu? E
o que vem a ser o regime contábil e qual é o regime contábil adotado
no Brasil?

A contabilidade aplicada ao setor público é obrigatória para toda


a Administração Pública, ou seja, a União, os estados, o Distrito Federal
e os municípios, bem como em autarquias e Fundações Públicas, no
Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo. Ela surgiu ainda no período
da Monarquia e vem se moldando e se aperfeiçoando cada vez
mais como forma de auxiliar o processo de registro dos atos e fatos
contábeis. A Contabilidade Pública possui objetivos específicos e muito
importantes, como a disponibilização de informações para a sociedade.
Quando perguntamos sobre qual é o regime contábil adotado no
Brasil, a resposta não é tão simples, isso porque ele irá depender do
enfoque a ser abordado, pois ele se diferenciará conforme o enfoque for
orçamentário ou patrimonial. Desse modo, muitos são os pontos a serem
compreendidos nesta unidade e que farão com que você mergulhe
nesse mundo fascinante, que é a Contabilidade Pública.

Entendeu? Ao longo desta unidade letiva, você vai mergulhar


neste universo!
Contabilidade Pública 11

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 1. Nosso objetivo é auxiliar
você no desenvolvimento das seguintes competências profissionais até
o término desta etapa de estudos:

1. Definir os principais conceitos da Administração Pública,


identificando seus atores do cenário profissional.

2. Identificar elementos do contexto histórico da Contabilidade


Pública no Brasil.

3. Entender princípios, objeto, objetivo e campo de aplicação da


Contabilidade Pública.

4. Compreender a dinâmica do regime contábil e o exercício


financeiro da Administração Pública.
12 Contabilidade Pública

O que é Administração Pública


OBJETIVO:

Ao término deste capítulo, você será capaz de entender


o que é Administração Pública e quais são os seus
principais atores. Isso será fundamental para que você
compreenda a contabilidade aplicada ao setor público.
E então? Motivado para desenvolver essa competência?
Então vamos lá. Avante!

Quem é a Administração Pública?


No Brasil, temos uma organização Político-Administrativa formada
por um Estado Federal que, de acordo com a Constituição Federal de
1988, em seu art. 18, é constituído pelos entes federativos, que são a
União, os estados membros, o Distrito Federal e os municípios, cada um
com sua autonomia.

Mas quem é o Estado?

DEFINIÇÃO:

“O Estado é uma pessoa jurídica de direito público


interno, formado pelos seus elementos, que são o povo,
o território e o governo” (ASSUMPÇÃO, 2012, p. 10).

O Estado é responsável por gerir os serviços públicos, com a


finalidade de suprir as necessidades da sociedade. E isso é realizado por
meio da Administração Pública que, através dos seus administradores,
deve conduzir programas governamentais definidos no plano de
governo.

O serviço público traduz-se no exercício de atividades e na


disponibilização de bens para a coletividade, com o intuito de proporcionar
um maior bemestar para a sociedade ou de desenvolvimento público
Contabilidade Pública 13

(SILVA, 2015), como quando um município realiza a coleta de lixo, ou


quando oferece serviços de saúde, transporte público etc.
Figura 1 – Serviço público

Fonte: Freepik

Sobrinho (2021) explica que o Estado é a representação do poder,


por isso no Brasil é adotada a teoria de tripartição de funções do Estado,
na qual essas funções são divididas entre poderes adequadamente
organizados.

Também é preciso compreender que o poder do Estado é uno e


indivisível, mas isso não quer dizer que ele não possa ser dividido entre
os órgãos que fazem parte do Estado. A divisão dos poderes compõe
o princípio orgânico voltado para garantir o domínio e o controle de
todos os órgãos de poder estatal e, com isso, tem-se que a titularidade
de diferentes funções do Estado será delegada a mais de um órgão,
conferindo a cada órgão, predominantemente, uma função e, assim,
evitando-se a concentração. As funções não deixam de ser do Estado,
mas são desempenhadas pelos órgãos em nome do Estado.
14 Contabilidade Pública

IMPORTANTE:

O Estado possui poderes que são subdivididos em


Legislativo, Judiciário e Executivo, e cada um desses
poderes possui funções, chamadas de típicas, ou
principais, e atípicas, que são exercidas dentro de cada
um dos entes federativos, sendo exceção apenas a
função judiciária nos municípios (SOBRINHO, 2021).

Assim, segundo Assumpção (2012), temos que:


•• O Poder Legislativo é formado pelo Congresso Nacional (Senado
Federal e Câmara dos Deputados) no âmbito federal, pelas
Assembleias Legislativas no âmbito estadual e pelas Câmaras
Municipais no âmbito municipal, no qual possui como função
típica legislar.
•• O Poder Judiciário é composto pelos órgãos do Poder Judiciário,
tanto na esfera federal quanto na esfera estadual, como o Supremo
Tribunal Federal, os Tribunais de Justiça dos Estados, os Tribunais
Regionais Federais, os Juízes do Trabalho etc., e possui como
função típica a jurisdicional, ou seja, aplicar as leis.
•• O Poder Executivo é exercido dentro da sua esfera de competência
pelo Presidente da República na esfera federal, pelo governador
de estado na esfera estadual, e pelo prefeito na esfera municipal,
e possui como função típica administrar a coisa pública.
Figura 2 – Poderes

Legislativo Judiciário Executivo

Órgãos do Poder
Judiciário
Senado Federal Tribunais Superiores,
e Câmara dos Conselho Nacional Presidência da
Deputados de Justiça, Tribunais República
Assembleias Regionais, Tribunais Governadoria
Legislativas do Trabalho,
Tribunais Militares, Prefeitura
Câmaras Municipais Tribunais Eleitorais,
Tribunais de Justiça
e Juízes Estaduais

Fonte: Elaborado pelo autor com base em Assumpção (2012).


Contabilidade Pública 15

Todos esses poderes possuem outras funções que não são


predominantes, e, dentre elas, temos que o Poder Legislativo e o Poder
Judiciário também possuem a função de administrar, mas, ao contrário
do Poder Executivo que possui a função de administrar o bem público
no âmbito federal, estadual e municipal, esses outros poderes devem
administrar dentro da sua esfera de competência, isto é, eles exercem
a função administrativa quando fazem contratação de pessoal, quando
realizam licitações ou compras etc.

VOCÊ SABIA?

As ações da Administração Pública devem ser realizadas


de acordo com a lei, por isso ela só pode fazer o que a
lei determina. Além disso, todas as regras referentes à
estrutura e ao funcionamento da Administração Pública
estão previstas na Constituição Federal.

E o que é Administração Pública, você sabe?

Conforme Carvalho (2020):


A expressão Administração Pública, em sentido formal,
orgânico ou subjetivo, designa o conjunto de órgãos e
agentes estatais no exercício da função administrativa,
independentemente do poder a que pertençam – seja
ao Executivo, Judiciário, Legislativo ou a qualquer outro
organismo estatal. (CARVALHO, 2020, p. 35)

No entanto, quando nos referimos à administração pública, escrito


com letra minúscula, estamos mencionando as funções administrativas,
ou seja, as atividades administrativas desempenhadas pelo Estado,
complementa o autor.

A Administração Pública possui quatro tarefas principais, de


acordo com Sobrinho (2021), que são:

•• Poder de polícia – através da limitação ou do condicionamento


dos direitos individuais em prol dos direitos coletivos.
16 Contabilidade Pública

EXEMPLO

A Administração Pública exerce o poder de polícia quando impõe


um limite de velocidade em uma via pública para beneficiar os pedestres.

•• Prestação de serviços públicos – por meio da oferta de serviços


públicos à população.

EXEMPLO

Fornecimento de água potável aos cidadãos.

•• Fomento – mediante incentivo à iniciativa privada para o exercício


de atividades de interesse público em prol do crescimento e
desenvolvimento do país.

EXEMPLO

Fornecimento de incentivos fiscais em atividades exercidas por


particulares.

•• Intervenção – através da regulamentação da atividade econômica


e da atuação direta no domínio econômico.

EXEMPLO

Atuação do Banco do Brasil no mercado, uma sociedade de


economia mista na qual a União é detentora de maior parte do capital.

A Administração Pública atua de forma direta, quando suas tarefas


são exercidas pelos seus órgãos, como também pode atuar de forma
indireta, quando o exercício é realizado através de entes descentralizados.

Dessa forma, a Administração Pública, para Assumpção (2012, p.


10), “tem o intuito de prestar serviços, diretamente ou indiretamente,
sendo responsável pelo seu planejamento, sua execução e controle
para que se alcancem resultados satisfatórios para a população”.

Vamos compreender melhor o que vem a ser a administração


direta e indireta.

Administração direta
Falamos anteriormente que a organização administrativa da
Federação é formada por União, estados membros, municípios e Distrito
Contabilidade Pública 17

Federal. Esses entes atuam dentro das suas competências atribuídas no


texto constitucional e possuem poderes autônomos, sujeitos a um poder
político próprio e único.
Figura 3 – Entes federados

União

Entes Municípios
Estados
federados

Distrito
Federal

Fonte: Elaborado pelo autor (2022).

Desse modo, temos que:

•• A União atua na Administração Federal.

•• Os estados membros atuam na administração estadual.

•• Os municípios atuam na administração municipal.

•• O Distrito Federal acumula funções da administração municipal e


estadual.

A prestação dos serviços públicos pode ser realizada diretamente


através da Administração Pública, ou também pode ser repassada para
que seja realizada por particulares ou entidades especializadas criadas
dentro da própria Administração Pública, em determinados casos
(CARVALHO, 2020).
18 Contabilidade Pública

Quando as atividades são exercidas pelos próprios entes


federados, por meio dos seus órgãos, temos a administração direta.
Nessas situações, ocorre a prestação centralizada do serviço, pois ele
não é transferido para nenhuma outra entidade, complementa o autor.

Desse modo, quando o município se responsabiliza pela realização


de obras em uma rua, através da secretaria de obras, ela é realizada por
meio da distribuição de competência no âmbito interno.

IMPORTANTE:

Órgãos são criados por meio da distribuição interna


de competências dentro de uma mesma pessoa
jurídica através da desconcentração, existindo, assim,
hierarquia derivada do poder hierárquico existente entre
a Administração Pública e os seus órgãos. Com isso,
os órgãos não possuem personalidade jurídica, nem
patrimônio próprio, como também, como regra, não
possuem capacidade processual (CARVALHO, 2020).

Os entes federados possuem personalidade jurídica de direito


público, como também capacidade administrativa, política e legislativa,
no entanto devem se sujeitar às limitações impostas aos entes públicos,
como realizar o procedimento licitatório para as contratações.

Administração indireta

Na administração indireta, ocorre a descentralização, na qual


surge uma nova pessoa jurídica com atribuições específicas para o
desempenho de uma atividade. Assim, a execução dos serviços públicos
e, em alguns casos, a titularidade deles são transferidas para outro ente
diferente do Estado, existindo apenas o controle deste sobre o ente, por
meio da supervisão ministerial.

Desse modo, temos que, na administração direta, as atividades


são exercidas pelos órgãos da própria Administração Pública, já na
administração indireta as atividades são exercidas por outro ente distinto
da Administração Pública.
Contabilidade Pública 19

Figura 4 – Administração Pública

•• execução dos serviços púbicos pelos órgãos da


Administração
direta Administração Pública
•• desconcentração

Administração •• execução dos serviços públicos por outro ente


indireta •• descentralização

Fonte: Elaborado pelo autor (2022).

Isso ocorre em prol de uma maior eficiência da atividade


administrativa, na qual a execução de determinados serviços públicos
é transferida a terceiros especializados, visto que a especialização
pressupõe o alcance de resultados positivos (CARVALHO, 2020).

Segundo Silva (2015), a administração indireta é:


Atividade administrativa descentralizada exercida por
entidades com personalidade jurídica de direito público ou
privado, vinculadas a um órgão da Administração Direta,
criadas ou autorizadas por lei específica, com a função
de prestar serviço público ou de interesse público, para
satisfação do Estado e das necessidades coletivas. (SILVA,
2015, p. 39)

O Decreto-Lei n º 200/67, art. 4ª, II, dispõe que a administração


indireta compreende as seguintes entidades:
•• Autarquias.
•• Empresas públicas.
•• Sociedades de economia mista.
•• Fundações públicas.

Essas entidades possuem características específicas e importantes


que as distinguem. Vejamos as principais.

As autarquias são entidades criadas apenas por lei, com


personalidade jurídica de direito público, com patrimônio e receitas
próprias, para desempenhar atividades típicas de Estado (BRASIL, 1967).
20 Contabilidade Pública

Nesse tipo de entidade, normalmente, são designados serviços


que necessitem de uma maior especialização e, por conseguinte,
organização apropriada, autonomia de gestão e pessoal técnico
especializado, como no caso do INSS e do Banco Central (SILVA, 2015).

IMPORTANTE:

As empresas públicas são entidades de direito privado


autorizadas por lei específica para exploração de
atividade econômica ou prestação de serviços públicos,
cujo capital é totalmente público. Elas submetem-se ao
regime privado nas relações trabalhistas e tributárias
(SOBRINHO, 2021).

São exemplos de empresas públicas a Caixa Econômica Federal


e os Correios. As Sociedades de Economia Mista são pessoas jurídicas
de direito privado, autorizadas por lei específica, que desempenham
atividade de natureza econômica e prestação de serviço, cujo capital é
público e privado, sendo a maioria público, bem como o poder público
participa da sua gestão e organização. A forma jurídica é de sociedade
anônima, e as ações com direito a voto pertencem em maior parte ao
poder público. Também está submetida ao regime privado das relações
trabalhistas e tributárias. São exemplos de sociedades de economia
mista o Banco do Brasil e a Petrobras (SOBRINHO, 2021).

Por fim, temos as fundações públicas, que podem ser pessoa


jurídica de direito público ou privado. Quando forem públicas, serão
criadas por lei, mas, quando forem privadas, serão autorizadas por lei.
São entidades sem fins lucrativos e criadas para desempenhar atividades
que não sejam exclusivas do poder público (SOBRINHO, 2021).

Silva (2015) explica que as fundações possuem objetivos de


interesse coletivo, geralmente de educação, ensino, pesquisa e
assistência social, e têm o amparo e controle constantes da Administração
Pública, como no caso da Fundação Oswaldo Cruz.
Contabilidade Pública 21

Princípios da Administração Pública


A Constituição Federal no capítulo VII traz as disposições gerais
acerca da Administração Pública, dentre elas a exigência de obediência
a princípios, que são norteadores para as atividades exercidas no âmbito
público:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência (BRASIL, 1988, online).

Assim, são princípios expressamente contidos no texto


constitucional, devendo ser obrigatoriamente observados pela
Administração Pública.

Vamos compreender o que vem a ser cada um deles:

No princípio da legalidade, as atuações do administrador público


devem estar sujeitas à lei, só podendo agir quando a lei permitir. Para
ficar mais fácil de compreender, é só pensar que você, como particular,
pode agir de qualquer forma, contanto que não esteja em desacordo
com a lei. Já o poder público só deve agir quando a lei permitir. Não se
trata de agir por vontade, mas sim quando autorizado por lei.

A impessoalidade pressupõe um tratamento igualitário entre as


pessoas, não havendo favorecimentos, exceto aqueles previstos em
lei. Como também o administrador público não deve atuar visando
interesse pessoal ou de terceiros, ele deve agir sempre em nome da
Administração Pública.

IMPORTANTE:

A moralidade está relacionada com aspectos, como boa-


fé, ética, honestidade, devendo estar sempre presentes
na Administração Pública, podendo o agente público
responder por improbidade administrativa quando agir
com desonestidade.
22 Contabilidade Pública

A publicidade refere-se à transparência dos atos e à divulgação


oficial das informações de cunho obrigatório, como determina a
Constituição Federal em seu art. 37:
§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços
e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter
educativo, informativo ou de orientação social, dela
não podendo constar nomes, símbolos ou imagens
que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou
servidores públicos (BRASIL, 1988, online).

Temos também o princípio da eficiência, no qual os serviços


públicos devem ser disponibilizados de forma eficiente, com qualidade,
presteza, economicidade, rendimento etc.

Portanto diversos são os dispositivos que devem ser seguidos


pela Administração Pública no exercício da sua função e voltados para o
bemestar da população.

RESUMINDO:

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu


mesmo tudinho? Agora, só para termos certeza de
que você realmente entendeu o tema de estudo deste
capítulo, vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter
aprendido que a Administração Pública é voltada para
oferecer bens e serviços para a população, visando o bem-
estar e desenvolvimento do país, e que esses serviços
podem ser oferecidos de forma direta, através dos
seus órgãos, como também de forma indireta, por meio
de entidades criadas ou autorizadas especificamente
para isso. Quando o próprio Estado oferece esses
serviços, estamos diante da desconcentração, mas,
quando ela passa para terceiros particulares, ocorre a
descentralização. Você também viu que a administração
indireta pode ser ofertada por alguns entes, como as
autarquias, sociedades de economia mista, fundações e
empresas públicas, cada uma com suas características
próprias que as distinguem. Por fim, você conheceu
os princípios a serem observados obrigatoriamente
pela Administração Pública, que são a legalidade,
impessoalidade, eficiência, moralidade e publicidade.
Contabilidade Pública 23

Contabilidade Pública e sua história no


Brasil
OBJETIVO:

Neste capítulo, você compreenderá o que vem a ser a


Contabilidade Pública e como ela é importante para a
Administração Pública e para toda a sociedade, como
também entenderá como ela se originou no Brasil e
os principais aspectos relacionados com a sua história,
incluindo as leis que marcaram todo o processo histórico.
Vamos juntos?

A Contabilidade Pública
A Contabilidade Pública segue as orientações determinadas na
Lei nº 4.320/1964, que estabelece normas gerais de Direito Financeiro
para elaboração e controle dos orçamentos e balanços de toda a
Administração Pública do país.

O Direito Financeiro faz parte da matéria jurídica da atividade


financeira do Estado, abrangendo receitas, despesas, orçamento e
crédito público, assim ordena a atividade financeira do Estado.

Dessa forma, todos esses elementos disciplinados pelo Direito


Financeiro são indispensáveis para a realização da Contabilidade Pública.
No entanto, antes de compreendermos o que é a Contabilidade Pública,
vamos identificar o que vem a ser a contabilidade.

DEFINIÇÃO:

A contabilidade, para Araújo e Arruda (2020, p. 18), pode


ser compreendida como o “sistema de informações
capaz de captar, registrar, reunir, divulgar e interpretar
os fenômenos avaliáveis monetariamente que afetam
as situações patrimoniais, financeiras e econômicas de
qualquer ente”.
24 Contabilidade Pública

Dessa forma, podemos inferir que a Contabilidade Pública é o


sistema de informações orientado para selecionar, registrar, resumir,
interpretar e divulgar os fatos que ocorrem nos órgãos e nas entidades
públicas.

A Contabilidade Pública é o campo da ciência contábil direcionado


para registrar, controlar e demonstrar os atos e fatos que atingem o
patrimônio da Administração Pública, bem como das autarquias e das
fundações (ARAÚJO; ARRUDA, 2020).

Bezerra Filho (2021) explica que, durante a geração de


informações, a Contabilidade Pública faz uso de princípios e normas
contábeis voltados para o controle patrimonial das entidades do setor
público. Além disso, o Casp controla os fatos referentes ao orçamento
público, aos custos e à verificação de possíveis atos que venham a afetar
o patrimônio futuro, bem como outros controles financeiros, legais e
gerenciais, indispensáveis para o bom desempenho da gestão pública,
para a transparência e monitoramento da população.
Figura 5 – Contabilidade Pública e controle do orçamento público

Fonte: Freepik.

Assim, o Casp registra todos os fatos contábeis como também os


atos potenciais realizados pelo administrador, os quais podem modificar
o patrimônio sob o ponto de vista qualitativo ou quantitativo (SILVA, 2015).
Contabilidade Pública 25

Isso porque a informação financeira no setor público tem


como objetivo contribuir para a avaliação da condição financeira
pública e colaborar para o processo de accountability, pois é dever
da Administração Pública oferecer serviços públicos de qualidade,
possuindo uma boa situação financeira, como também prestar contas à
sociedade sobre as ações efetuadas (LIMA; MUNIZ, 2016).

VOCÊ SABIA?

A Federação Internacional de Contadores (IFAC, 2001)


dispõe sobre accountability no qual afirma que é o
processo pelo qual os entes do setor público e as
pessoas inseridas neles são responsáveis por decisões e
ações, compreendendo a maneira como são conduzidos
os recursos públicos, além de todos os elementos
referentes ao desempenho e aos resultados.

Para Bezerra Filho (2021), a principal função dos entes públicos


é prestar serviços à população, assim o seu desempenho pode ser
parcialmente verificado através da análise da situação patrimonial, da
execução do orçamento e dos fluxos de caixa. Os dados disponibilizados
devem auxiliar a tomada de decisões, a prestação de contas e
responsabilização, como também possibilitar avaliações do tipo:

•• Se foram oferecidos serviços à população de modo eficiente e


eficaz.

•• A quantidade de recursos disponíveis para gastos futuros e quais


são as restrições e condições para que esses recursos possam ser
utilizados.

•• A extensão das alterações da carga tributária dos contribuintes em


períodos futuros utilizados para pagar serviços correntes.

•• A prestação de serviços pelos entes foi aperfeiçoada ou piorada


em comparação com exercícios anteriores.
26 Contabilidade Pública

Portanto, se o poder público tem o dever de suprir as necessidades


da sociedade em relação a bens e serviços públicos, para que possa ser
realizada uma avaliação dessa prestação de serviços, não basta apenas
verificar os resultados financeiros e orçamentários, mas também o
contexto dos resultados da prestação de serviços à população, ou seja,
a sua efetividade, complementa o autor.

Nessa perspectiva, a contabilidade aplicada ao setor público


apresenta-se como um grande instrumento de planejamento e controle
da Administração Pública. Com bem evidencia a Lei 4.320/64:
Art. 85. Os serviços de contabilidade serão organizados
de forma a permitirem o acompanhamento da execução
orçamentária, o conhecimento da composição patrimonial,
a determinação dos custos dos serviços industriais,
o levantamento dos balanços gerais, a análise e a
interpretação dos resultados econômicos e financeiros.

[...]

Art. 89. A contabilidade evidenciará os fatos ligados à


administração orçamentária, financeira patrimonial e
industrial. (BRASIL, 1964)

IMPORTANTE:

Araújo e Arruda (2020) entendem a Contabilidade Pública


como um excelente instrumento de planejamento,
controle e de prestação de contas da Administração
Pública. Além disso, ela proporciona o equilíbrio das
finanças do país, fazendo uso do orçamento como um
relevante instrumento para alcançar esse objetivo.

Dessa forma, não tem como negar a importância que a


Contabilidade Pública exerce não apenas para as finanças e para
o patrimônio da Administração Pública, como também para toda a
sociedade que se beneficia das suas informações.
Contabilidade Pública 27

História da Contabilidade Pública


A contabilidade aplicada ao setor público possui uma história que
se inicia há muito tempo. No Brasil, pode-se dizer que tudo começou
com a chegada da Família Real portuguesa, quando Dom João VI institui
o Erário Régio e o Conselho da Fazenda, trazendo orientações para a
administração real e definindo normas reguladoras da escrituração da
contabilidade desse Erário (ARAUJO; ARRUDA, 2020).
Figura 6 – Família Real

Fonte: Pixabay

Nessa época, já existia a preocupação em fazer uso de mecanismos


de registro e controle do patrimônio público e que até hoje são funções
básicas da contabilidade aplicada ao setor público.

No entanto ainda prevalecia o modelo patrimonialista, no qual não


havia distinção entre os bens do rei e os do Estado, o que só veio a mudar
na segunda metade do século XIX, devido ao aumento da democracia e
do desenvolvimento capitalista.
28 Contabilidade Pública

Um importante dispositivo que tratava da contabilidade estava


contido na Constituição de 1824, que foi outorgada dois anos após
a Declaração de Independência do Brasil, e que demonstra essa
preocupação com as receitas e despesas públicas, no qual:
Art. 170. A Receita, e despesa da Fazenda Nacional,
será encarregada a um Tribunal, debaixo de nome
de ‘Tesouro Nacional” aonde em diversas Estações,
devidamente estabelecidas por Lei, se regulará a sua
administração, arrecadação e contabilidade, em reciproca
correspondência com as Tesourarias, e Autoridades das
Províncias do Império (BRASIL, 1824, online).

Além disso, estavam incluídos na Constituição os princípios da


Administração Pública.

Em 1831, época da regência, ocorreram algumas outras


modificações feitas pelo Imperador que também configuraram como
avanço para a Contabilidade Pública. O sistema contábil foi reformulado
por uma lei em que o Contador Geral era a autoridade responsável para
definir as normas referentes à execução contábil a serem obedecidas
por todos os setores, como forma de unificar o sistema contábil. Essa lei
ainda tratava de:

•• Organizar o Tesouro Nacional e as Tesourarias das Províncias.

•• Obrigar o emprego do método das partidas dobradas.

•• Determinar a contratação do servidor da fazenda apenas através


de concurso público.

REFLITA:

No ano de 1922, foi criado o Código de Contabilidade


Pública, trazendo uma reorganização da contabilidade
e do orçamento público, que trazia diversas disposições
significativas, como a classificação das receitas e
despesas e a responsabilidade dos atos relacionados
com a escrituração das repartições públicas direcionada
à Diretoria Central de Contabilidade (FELIX, 2013).
Contabilidade Pública 29

O Código de Contabilidade era regulamentado pelo Decreto


nº 15.783/22, o qual definia o método das partidas dobradas como
obrigatório para a escrituração dos fatos relacionados com o patrimônio
público e com a realização dos orçamentos (ARAUJO; ARRUDA, 2020).
Figura 7 – Partidas dobradas

Crédito Débito

Fonte: Elaborado pelo autor (2022).

Depois disso, essas normas passaram por modificações, como


também foram criados outros normativos, como forma de aperfeiçoar
os procedimentos contábeis.

No entanto um grande marco para a Contabilidade Pública


foi a publicação da Lei nº 4.320, de 1964, trazendo normas de Direito
Financeiro para a regulação dos orçamentos e balanços dos entes da
federação. Essa lei ainda está em vigor até os dias atuais, buscando
garantir o equilíbrio das finanças públicas do país.

ACESSE:

Para ter acesso à Lei nº 4.320/64 e verificar todos os


dispositivos desse normativo, acesse aqui

Em 1986, foi criada a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) com a


finalidade de “promover a integração e a modernização dos sistemas de
programação financeira, de contabilidade e de execução orçamentária
dos Órgãos e Entidades Públicas do Governo Federal” (FELIX, 2013, p.
14). Logo em seguida, foi criado Sistema Integrado de Administração
Financeira, a ser utilizado por toda administração direta e indireta,
buscando aperfeiçoar ainda mais a Contabilidade do setor público.
30 Contabilidade Pública

Conforme Felix (2013), os objetivos do SIAFI são:

•• Disponibilizar instrumentos apropriados para o controle da


execução financeira, contábil e orçamentária.

•• Proporcionar confiabilidade e tempestividade em relação às


informações gerenciais da Contabilidade Pública.

•• Promover a integração das informações na esfera do governo


federal.

•• Disponibilizar uma maior transparência dos gastos públicos.

A Constituição de 1988 trouxe modificações em relação ao


controle interno, dispondo a recomendação desse controle em todos os
poderes, bem como determinou a competência do controle externo ao
Poder Legislativo com apoio do Tribunal de Contas.

Outro fato importante na história da Contabilidade Pública é a


sanção da Lei nº 101 de 2000, conhecida como Lei da Responsabilidade
Fiscal (LRF), no qual em seu art. 1º determina:
Art. 1º Esta Lei Complementar estabelece normas de
finanças públicas voltadas para a responsabilidade na
gestão fiscal.

§ 1º A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação


planejada e transparente, em que se previnem riscos
e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das
contas públicas, mediante o cumprimento de metas de
resultados entre receitas e despesas e a obediência a
limites e condições no que tange a renúncia de receita,
geração de despesas com pessoal, da seguridade social
e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de
crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão
de garantia e inscrição em Restos a Pagar. (BRASIL, 2000)

Essa lei possui como finalidade, dentre outras, definir instrumentos


de transparência da gestão fiscal para toda a Administração Pública.

Para Araújo e Arruda (2020), a LRF possui quatro pilares básicos:


Contabilidade Pública 31

•• Dar ênfase à necessidade do planejamento governamental,


determinando novos temas para a Lei de Diretrizes Orçamentárias
(LDO) e para a Lei Orçamentária Anual (LOA).

•• Conseguir o equilíbrio fiscal com o incremento da arrecadação.

•• Controlar o endividamento público.

•• Garantir a transparência da gestão fiscal.


Figura 8 – Pilares da Lei de Responsabilidade Fiscal

Ênfase ao planejamento
governamental

Equilíbrio fiscal

LRF
Controlar o endividamento
público

Transparência da gestão
fiscal

Fonte: Elaborado pelo autor com base na Lei nº 101/2000.

Outros normativos muito relevantes quando falamos da história


da Contabilidade Pública são as normas brasileiras de contabilidade,
através de resoluções editadas pelo Conselho Federal de Contabilidade
(CFC), sendo que algumas delas são direcionadas para a contabilidade
aplicada ao setor público. Essas normas foram publicadas no ano de
2008, mas, em 2016, elas foram revogadas, no entanto, ainda assim,
estabelecem um marco com a compatibilização da Contabilidade
Pública do Brasil aos padrões internacionais.
32 Contabilidade Pública

IMPORTANTE:

Essas normas foram revogadas devido ao processo de


convergência direcionada para a unicidade conceitual,
fundamental para que não existam divergências no
entendimento doutrinário e teórico, que poderiam fazer
com que os aspectos formais das Normas Brasileiras
de Contabilidade ficassem comprometidas (ARAUJO;
ARRUDA, 2020).

Assim, o Brasil orienta-se pelas Normas Internacionais de


Contabilidade Aplicadas ao Setor Público, como bem explica Felix (2013):
O setor público segue as IPSAS (Normas Internacionais
de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público), e que
são editadas pelo IFAC (Federação Internacional de
Contadores), que é uma organização mundial, que o
Brasil faz parte, e que tem o objetivo de colaborar com o
desenvolvimento da economia internacional, além de ser
responsável pela edição das IPSAS. (FELIX, 2013, p. 16)

De acordo com as IPSAS, também é elaborado anualmente um


manual com regras e procedimentos a serem obedecidos pelo poder
público referentes a procedimentos contábeis, chamado de Manual de
Contabilidade Aplicada ao Setor Público (MCASP), devendo ser seguido
por todos os entes da federação.

O MCASP traz requisitos obrigatórios referentes ao


reconhecimento, à mensuração e evidenciação das transações e dos
eventos das demonstrações contábeis. Em caso de divergências com
outras normas, devem ser seguidas as normas presentes no manual e,
de forma subsidiária, outras normas (MCASP, 2021).
Contabilidade Pública 33

SAIBA MAIS:

Aprofunde-se na história da Contabilidade Pública


lendo o artigo “Impactos Contábeis Gerados a Partir da
Implantação do Erário Régio no Brasil”. Nele, o autor faz
um panorama de como era contabilidade do setor público
em Portugal e como ele influenciou a sua inserção no
Brasil, mostrando como era antes da implantação do
Erário Régio e como ficou depois. Disponível aqui.

RESUMINDO:

Vimos que a Contabilidade Pública está relacionada


com os fatos patrimoniais, financeiros e econômicos dos
órgãos e das entidades públicas, inclusive das autarquias
e das fundações públicas, registrando todos os fatos
contábeis e potenciais realizados pelo administrador
público. Vimos também que a história da Contabilidade
Pública é marcada por diversos fatos relevantes, tendo
início no período da Monarquia com a instituição do
Erário Régio e o Conselho da Fazenda. Além disso,
você pode compreender que a Constituição Federal de
1824 também trouxe modificações significativas para as
finanças públicas e que, em 1922, foi criado o Código
de Contabilidade. Em seguida, você conheceu a Lei nº
4.320/64, lei esta que ainda está e vigor e que traz normas
de Direito Financeiro como forma de regular o orçamento
e os balanços do poder público. Além disso, viu que a Lei
de Responsabilidade Fiscal é muito importante, pois traz
instrumentos de transparência da gestão fiscal a serem
seguidos pelos entes federados. Por fim, entendeu a
relevância das Normas Internacionais de Contabilidade
Aplicadas ao Setor Público, que são seguidas pelo Brasil
e o Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público
editado anualmente.
34 Contabilidade Pública

Princípios, objeto, objetivo e aplicação


da Contabilidade Pública

OBJETIVO:

Neste capítulo, iremos conhecer os princípios


voltados para a Contabilidade Pública, suas principais
características, o objeto da Contabilidade Pública, os
seus objetivos, como também o campo de aplicação que
serão primordiais para ampliar a compreensão sobre a
Casp.

Princípios da Contabilidade Pública


Os princípios da contabilidade formam em sua essência a estrutura
conceitual em que se baseia a contabilidade, para que assim seus
resultados consigam cumprir com a sua função principal, que é oferecer
informações úteis para a tomada de decisão e apresentar o resultado da
gestão pública para a sociedade.

De acordo com Carvalho (2020), os princípios devem ser


observados como normas gerais impostas que servem como orientação
para a atuação das pessoas, no qual são estabelecidos valores a serem
seguidas as condutas por eles praticadas.

Desse modo, o administrador público, ou qualquer pessoa que


gerencie, controle, ou arrecade bens ou serviços públicos, deve levar
em consideração os princípios contábeis relacionados com o poder
público.
Contabilidade Pública 35

IMPORTANTE:

Os princípios fundamentais definidos para a contabilidade


também são aplicáveis à contabilidade aplicada ao setor
público com determinadas adequações. No entanto
a resolução que trazia esses princípios foi revogada, o
que não faz com que esses princípios sejam extintos.
As revogações das resoluções pelo CFC são tratadas
como necessárias para que não venham a comprometer
aspectos formais das Normas Brasileiras de Contabilidade.
Sendo assim, o estudo dos princípios da contabilidade
ainda se apresentam como muito importantes para a
área (ARAUJO; ARRUDA, 2020).

Ante o exposto, os princípios contábeis são o da entidade, da


continuidade, da oportunidade, do registro pelo valor original, da
competência e da prudência. Vejamos as principais características
desses princípios.
Figura 9 – Princípios da Contabilidade Pública

Fonte: Elaborado pelo autor (2022).


36 Contabilidade Pública

O princípio da entidade está relacionado com a necessidade


de separar o patrimônio da entidade com o do particular,
independentemente de a quem pertença. Quando direcionamos para
o setor público, o fundamento para se constatar a entidade contábil
passa a ser a necessidade de demonstrar a situação das pessoas que
devem prestar contas sobre a gestão de qualquer entidade que possua
orçamento próprio e gerencie recursos públicos (SILVA, 2015).

O princípio da continuidade leva em consideração o futuro


das entidades, visto que elas possuem uma vida útil com prazo
indeterminado, principalmente quando falamos dos entes da federação,
como a União, os estados, municípios e o Distrito Federal.
Figura 10 – Princípio da continuidade

Entidades
Princípio da
Futuro com prazo
continuidade
indeterminado

Fonte: Elaborado pelo autor (2022).

O princípio da oportunidade trata-se da forma como devem ser


apresentados e apreciados os elementos patrimoniais para que possam
gerar informações completas e nos prazos adequados. Assim, a Lei nº
4.320/64 determina a forma de organização das informações contábeis,
para que essas possam evidenciar os componentes patrimoniais, como
também possibilitem o acompanhamento da execução orçamentária.

Esse princípio é muito relevante, visto que a Administração Pública


deve disponibilizar para a sociedade de maneira íntegra e tempestiva
todas as informações que possibilite a prestação de contas pela
população.

O princípio do registro pelo valor original refere-se à maneira


como devem ser registrados os elementos do patrimônio, pois o registro
deve ser realizado pelos valores monetários à data da transação e em
moeda nacional, possibilitando, assim, a uniformização quantitativa dos
registros e das mutações do patrimônio (SILVA, 2015).

A Lei nº 4.320/64, em seu art. 106 corrobora a aplicação desse


princípio quando determina:
Contabilidade Pública 37

Art. 106. A avaliação dos elementos patrimoniais obedecerá


às normas seguintes:

I - os débitos e créditos, bem como os títulos de renda,


pelo seu valor nominal, feita a conversão, quando em
moeda estrangeira, à taxa de câmbio vigente na data do
balanço;

II - os bens móveis e imóveis, pelo valor de aquisição ou


pelo custo de produção ou de construção;

III - os bens de almoxarifado, pelo preço médio ponderado


das compras.

§ 1° Os valores em espécie, assim como os débitos e


créditos, quando em moeda estrangeira, deverão figurar
ao lado das correspondentes importâncias em moeda
nacional. (BRASIL, 1964, online)

Assim, como regra, as avaliações são realizadas de acordo com


os valores de entrada e, depois de incluídos no patrimônio, não podem
mais ter seus valores modificados.

O princípio da competência determina que o reconhecimento dos


efeitos dos eventos seja com os períodos a que se referirem, não sendo
levado em conta recebimento ou pagamento. No entanto, quando
tratamos de Contabilidade Pública, devemos levar em consideração
o que dispõe a Lei nº 4.320/64, em seu art. 35, no qual: “pertencerão
ao exercício financeiro às receitas nele arrecadadas e as despesas nele
legalmente empenhadas”.

Também deve ser observado o que estabelece a Lei de


Responsabilidade Fiscal, no art. 50, em que a despesa e o reconhecimento
de compromisso serão registrados de acordo com o regime de
competência, isto é, na ocorrência do fato gerador (SILVA, 2015).

Já o princípio da prudência abrange a prudência junto aos


julgamentos das estimativas. Na Administração Pública, sua aplicação
deve ser verificada em relação a não ocorrência de excesso de estimação
de ativos e receitas, bem como a diminuição de passivos e despesas,
fazendo assim com que exista uma maior confiabilidade o processo de
aferição e demonstração dos elementos patrimoniais, complementa o
autor.
38 Contabilidade Pública

Objeto da Contabilidade Pública


A contabilidade possui como objeto o patrimônio, assim, quando
voltamos nosso estudo para a contabilidade da Administração Pública,
passamos a ter um objeto mais restrito, que é o patrimônio público.

Conforme Sobrinho (2021), o objeto da Contabilidade Pública é o


patrimônio público, através do registro dos atos e fatos administrativos
e contábeis. Araújo e Arruda (2020) complementam afirmando que a
gestão do patrimônio como objeto da Casp é em relação aos aspectos
contábil, orçamentário, patrimonial, financeiro e de resultado.
Figura 11 – Objeto da contabilidade aplicada ao setor público

Patrimônio
Objeto da Casp
público

Fonte: Elaborado pelo autor (2022).

Mas o que vem a ser atos e fatos?

Atos são hipóteses em que o patrimônio não sofre modificação


no primeiro instante, mas que pode sofrer em um momento futuro. Eles
são registrados no sistema de controle, como a previsão de receita e a
fixação de despesa (SOBRINHO, 2021).

Os fatos modificam o patrimônio e podem ser permutativos, no qual


elementos do ativo ou do passivo são permutados; modificativos, quando
as alterações no patrimônio líquido modificam de forma aumentativa
ou diminutiva; ou, ainda, compostos, quando são permutativos e
modificativos ao mesmo tempo, explica o autor.

E o que vem a ser patrimônio público?

O conceito de patrimônio público foi descrito pela Resolução CFC


nº 1.129/2008.
Patrimônio Público é o conjunto de direitos e bens,
tangíveis ou intangíveis, onerados ou não, adquiridos,
formados, produzidos, recebidos, mantidos ou utilizados
pelas entidades do setor público, que seja portador ou
represente um fluxo de benefícios, presente ou futuro,
inerente à prestação de serviços públicos ou à exploração
Contabilidade Pública 39

econômica por entidades do setor público e suas


obrigações (BRASIL, 2008, online).

No entanto existem algumas particulares importantes a se


compreender em relação ao patrimônio público que, de fato, devem ser
consideradas como objeto da Casp. E para isso é preciso saber quais são
os bens públicos.

Os bens públicos podem ser de uso comum, de uso especial e de


uso dominical, conforme o Código Civil. Vejamos o que vem a ser cada
um deles:

•• Os de uso comum são aqueles direcionados para uso coletivo, ou


seja, que qualquer indivíduo possa aproveitar, como as praias e
as ruas.

•• Os bens de uso especial são os bens utilizados pela Administração


Pública para realizar as prestações de serviços, ou seja, são as
repartições públicas, como as escolas públicas.

•• Os bens dominicais são aqueles que não possuem destinação


específica ou que não estão sendo utilizados no momento, como
no caso dos imóveis públicos desativados (SOBRINHO, 2021).
Figura 12 – Bens de uso comum

Fonte: Pixabay.
40 Contabilidade Pública

Perceba que os bens de uso comum são bens não patrimoniais,


por isso são indisponíveis por natureza. Assim, como regra, eles não
fazem parte do objeto da Contabilidade Pública.

No entanto, o Conselho Federal de Contabilidade dispõe que:


Os bens de uso comum que absorveram ou absorvem
recursos públicos, ou aqueles eventualmente recebidos
em doação, devem ser incluídos no ativo não circulante da
entidade responsável pela sua administração ou controle,
estejam, ou não, afetos a sua atividade operacional (CFC,
2008, online).

Assim, deverão ser registrados na contabilidade todos os bens de


uso especial e os dominicais, como também os de uso comum que se
enquadrarem na exceção imposta pela resolução, ou seja, aqueles que
consumiram ou consomem recursos públicos, como também aqueles
que forem auferidos em doação.

EXEMPLO

Uma empresa X decidiu doar um terreno para o município para a


construção de um hospital. Depois da doação, esse terreno deverá ser
registrado como bem no patrimônio do município.

Uma forma mais fácil de você compreender quais são esses bens
que não se incluem é pensar naqueles em que o poder público não
precisou colocar nenhum tipo de recursos na sua construção, pois são
bens naturais, como os lagos.

Objetivo da Contabilidade Pública


Segundo Silva (2015, p. 22) o objetivo da contabilidade aplicada ao
setor público é:
fornecer informações atualizadas e exatas à Administração
para subsidiar as tomadas de decisões e aos Órgãos de
Controle Interno e Externo, para o cumprimento das
normas legais, bem como às instituições governamentais e
particulares informações estatísticas e outras de interesse
dessas instituições. (SILVA, 2015, p22)
Contabilidade Pública 41

Assim, a produção de informações úteis sobre os entes públicos


por meio dos instrumentos contábeis, como as demonstrações e os
balanços, irá auxiliar o processo de tomada de decisões, como também
a prestação de contas diante do controle externo e o controle social
realizado pela sociedade.
Figura 13 – Objetivos da Contabilidade Pública

Tomada de
decisão

Prestação de
Objetivos contas

Instrumentos para
o controle social

Fonte: Elaborado pelo autor (2020).

Como citamos anteriormente, a contabilidade é um importante


instrumento de transparência pública, o qual possibilita a prestação de
contas para a sociedade e a devida responsabilização dos representantes
(accountability).

SAIBA MAIS:

Aprofunde-se mais nesse tema lendo o artigo “A


Contabilidade Pública como instrumento de controle
social”. Ele traz diversos pontos interessantes sobre
esse objetivo da contabilidade aplicada ao setor público
e a importância de se ter acesso às informações das
instituições públicas para que seja realizado esse
controle. Disponível aqui.
42 Contabilidade Pública

Araújo e Arruda (2020) entendem que a contabilidade aplicada


ao setor público tem como objetivo selecionar, estudar, registrar,
interpretar, controlar, resumir, orientar e demonstrar os fatos que atingem
o patrimônio público.

Campo de aplicação da Contabilidade


Pública
A contabilidade aplicada ao setor público, também conhecida
como Casp, conforme Piscitelli e Timbó (2012, p. 7):
Constitui uma das subdivisões da contabilidade aplicada
a diferentes tipos de atividades, de entidades. Seu campo
de atuação é, assim, o das pessoas jurídicas de Direito
Público Interno – União, estados, Distrito Federal e
municípios e suas autarquias –, bem como o de algumas
de suas entidades vinculadas – fundações públicas e
empresas públicas, estas pelo menos quando utilizam
recursos à conta do Orçamento Público. (PISCITELLI;
TIMBÓ, 2012, p.7)

Assim, a sua área de ação abrange a administração direta nas três


esferas de governo, ou seja, na esfera federal, estadual e municipal, e
nos três Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo, além do Ministério
Público e dos Tribunais de Contas, como também as autarquias, as
fundações públicas e as empresas dependentes.

DEFINIÇÃO:

As empresas dependentes, conforme Silva (2015, p. 24)


“são aquelas que recebem do ente controlador recursos
financeiros para pagamento de despesas com pessoal
ou de custeio em geral ou de capital, excluídos, no último
caso, aqueles provenientes de aumento de participação
acionária”.
Contabilidade Pública 43

Assim, é considerado como gestor de recursos públicos qualquer


indivíduo que guarde, arrecade, coordene ou faça uso de bens ou
valores públicos, por isso deve prestar contas deles, respondendo pelo
patrimônio que está sob sua responsabilidade (SOBRINHO, 2021).
Figura 14 – Campo de aplicação da Contabilidade Pública

Administração Autarquias, Empresas estatais


direta fundações dependentes

Campo de
aplicação

Fonte: Elaborado pelo autor (2022).

Além disso, Araújo e Arruda (2020) citam que também estão


incluídas no campo de aplicação:

•• As entidades que precisem registrar as operações orçamentárias,


em comum acordo.

•• As entidades que atuem no sentido de cumprimento de programas,


projetos e ações de fins ideais.

•• Os serviços sociais.

•• Os conselhos profissionais.

•• Entidades sem fins lucrativos subordinadas a julgamento das


contas pelo controle externo.

Outras entidades também podem adotar os conceitos da


Contabilidade Pública de maneira opcional ou por exigência de seus
órgãos reguladores, como no caso das empresas estatais independentes.
44 Contabilidade Pública

RESUMINDO:

Além disso, você pode compreender que a Contabilidade


Pública possui como objetivo fornecer informações
úteis para a tomada de decisões, como também é um
instrumento importante de transparência, de prestação
de contas e de responsabilização. Além disso, viu quais
são os entes que fazem parte do campo de aplicação da
Contabilidade Pública e que são todos os entes federados
nas três esferas de governo e nos três poderes, até
mesmo as empresas estatais dependentes, autarquias e
a fundação, como também outras entidades, como os
serviços sociais e as entidades de classe.
Contabilidade Pública 45

Regime contábil e exercício financeiro da


Administração Pública
OBJETIVO:

Neste capítulo, iremos compreender a dinâmica do


regime contábil e o exercício financeiro da Administração
Pública, entendendo as características pertinentes
de cada um desses regimes, para que assim possam
ser diferenciados, visto que são fundamentais para a
compreensão da contabilidade aplicada ao setor público.

Regime contábil
O campo de atuação da Contabilidade Pública é praticado por meio
da escrituração realizada pelos entes federados, para que assim possam
compreender e demonstrar as variações que acontecem na estrutura
patrimonial e financeira da entidade, devido às decisões efetuadas pela
Administração Pública, bem como em relação às variáveis externas que
não dependem do controle e poder de decisão dos entes.

DEFINIÇÃO:

A escrituração é uma técnica contábil que corresponde


ao registro dos atos e fatos que acontecem na entidade,
ou seja, os acontecimentos que alteram ou venham a
alterar a situação patrimonial da entidade..

Também é oportuno levar em consideração o que explica Kohama


(2016):
Deve-se observar que a ‘contabilidade, evidenciará os
fatos ligados à administração orçamentária, financeira,
patrimonial e industrial’, por isso, além do registro dos fatos
ligados à execução orçamentária, deve-se cuidar, também,
dos registros dos fatos ligados à execução financeira e
patrimonial, de maneira que os fatos modificativos sejam
levados à conta de resultado e que elas permitam o
46 Contabilidade Pública

conhecimento da composição patrimonial e dos resultados


econômicos e financeiros. (KOHAMA, 2016, p. 44)

Para atender aos objetivos inerentes da Contabilidade Pública,


esta possui uma estrutura diferenciada em relação aos outros campos
da contabilidade, isso por causa da obrigatoriedade de escrituração dos
atos de gestão orçamentária e à adoção das leis e dos normativos para
a realização das transações da Administração Pública.

Desse modo, a estrutura da contabilidade aplicada ao setor público,


segundo Lima e Muniz (2016), abrange algumas particularidades, como:

•• Sistemas próprios de contabilidade para registro e controle das


operações.

•• Instrumentos de controle por fundos especiais.

•• Bases de escrituração distintas para recolhimento dos fluxos


financeiros e econômicos.

•• Relação do orçamento com o patrimônio.

As transações financeiras realizadas pelos entes públicos, ou


seja, o registro das despesas e receitas deve ser efetuado através de
métodos, chamados de regime contábil.

Para Kohama (2016, p. 43), “regime contábil define-se como


um sistema de escrituração contábil”. Existem três tipos de regimes
contábeis que fazem esse registro, que são o regime de caixa, o regime
de competência e o misto.
Figura 15 – Regime contábil

Sistema de
Regime contábil escrituração
contábil

Fonte: Elaborado pelo autor com base em Kohama (2016).

Conforme Bezerra Filho (2021), a Contabilidade Pública adota


o regime contábil misto, formado pelo regime de competência para a
despesa e de caixa para a receita.
Contabilidade Pública 47

Já Kohama (2016) explica que, quando se trata de regime contábil


do Brasil, deve ser levado em conta o enfoque orçamentário e o enfoque
patrimonial. Assim, quando houver qualquer tipo de questionamento
sobre qual é o regime contábil adotado no Brasil, primeiramente deve-
se observar se é em relação ao regime orçamentário ou ao regime
patrimonial.

IMPORTANTE:

Bezerra Filho (2021) também compartilha da mesma


opinião, relatando que, de acordo com a análise dos
princípios e dos pressupostos da ciência contábil, é
possível perceber que a contabilidade aplicada ao
setor público segue os princípios da contabilidade.
Assim, é adotado o princípio da competência na sua
totalidade, isto é, nas receitas e nas despesas, sob o
enfoque patrimonial. E as disposições contidas no art.
35 da Lei nº 4.320/64 estão relacionados com o enfoque
orçamentário, e não patrimonial.

Como dispõe a Lei nº 4.320/64: “Art. 35. Pertencem ao exercício


financeiro: I - as receitas nêle arrecadadas; II - as despesas nêle
legalmente empenhadas”.

Entretanto, também devemos observar o que Lei de


Responsabilidade Fiscal aborda sobre o regime contábil:
Art. 50. Além de obedecer às demais normas de
contabilidade pública, a escrituração das contas públicas
observará as seguintes:

[...]

II - a despesa e a assunção de compromisso serão


registradas segundo o regime de competência, apurando-
se, em caráter complementar, o resultado dos fluxos
financeiros pelo regime de caixa. (BRASIL, 2000)

O enfoque orçamentário também é conhecido como regime


financeiro e busca controlar o orçamento através da escrituração dos
fluxos financeiros de receitas e despesas orçamentárias (LIMA; MUNIZ,
2016).
48 Contabilidade Pública

Para que não fique perdido, precisamos compreender o que vem a


ser receita. “Receita, pelo enfoque orçamentário, são todos os ingressos
de recursos para cobertura das despesas orçamentárias, tendo como
objetivo evitar que a execução das despesas orçamentárias ultrapasse a
arrecadação efetiva.” (HADDAD; MOTA, 2010, p. 67)

Portanto, as entradas de recursos que servem para realizar


pagamentos com despesas são consideradas receitas, como o
pagamento de IPTU.

Diante do enfoque orçamentário, pode-se dizer que o regime


contábil é misto, devido à escrituração da receita orçamentária ser feita
pelo regime de caixa, e o da despesa orçamentária pelo regime de
competência (KOHAMA, 2016).

Nos registros orçamentários, a receita é escriturada pela


arrecadação (caixa) e a despesa orçamentária através do empenho
(competência orçamentária), obedecendo aos princípios orçamentários
constitucionais e àqueles incluídos na Lei nº 4.320/64.

Já quando se trata do regime patrimonial, a receita e a despesa


orçamentária não fazem parte do regime contábil misto, porque são
escrituradas pelo regime de competência (KOHAMA, 2016).
Figura 16 – Regime contábil

Misto
Enfoque
orçamentário Receita regime de caixa e despesa regime de
competência

Regime de competência
Enfoque
patrimonial Receitas e despesas pelo mesmo regime, o de
competência

Fonte: Elaborado pelo autor com base em Kohama (2016).

Os registros de controle e variações patrimoniais devem obedecer


aos princípios contábeis, por isso as receitas e as despesas são
contabilizadas como receitas patrimoniais e despesas patrimoniais.

Vejamos um exemplo para compreendermos na prática como


pode ocorrer a escrituração.
Contabilidade Pública 49

EXEMPLO

Maria possui um terreno na cidade de Santos, por isso precisa


pagar o IPTU, que possui como data de vencimento 20 de abril de
2020. No entanto Maria passou por diversos problemas financeiros e
não conseguiu honrar com esse compromisso junto à prefeitura na data
de vencimento, só vindo a realizar o pagamento no dia 20 de janeiro
de 2021. Desse modo, mesmo a data de vencimento sendo no ano de
2020, o pagamento só foi efetuado no ano de 2021, o que faz com que
a prefeitura de Santos contabilize essa receita como sendo do ano 2021.

Mas o que é regime de caixa e regime de competência, você sabe?

Regime de caixa
O regime de caixa é o regime contábil no qual são levadas em
consideração como receitas e despesas do exercício todas as transações,
sejam recebidas ou pagas, durante o exercício financeiro, mesmo que
sejam débitos ou créditos relacionados com outros exercícios (SILVA,
2015).
Figura 17 – Regime de caixa

Receitas
arrecadadas e
Regime de caixa
despesas pagas
do período
Fonte: Elaborado pelo autor com base em Kohama (2016).

Dessa forma, podemos dizer que o regime de caixa é aquele que


envolve, puramente, todos os recebimentos e pagamentos realizados
no período, até mesmo aqueles que fazem parte de períodos contábeis
anteriores (KOHAMA, 2016).

Nesse regime, é dispensada a apuração do resíduos ativos


(créditos) e de restos a pagar (débitos). Isso porque, depois de terminado
o exercício financeiro atual, são transferidas para o orçamento do
exercício seguinte as receitas e despesas não efetuadas (SILVA, 2015).

Assim, as receitas que ainda serão arrecadadas, mesmo que já


tiverem sido lançadas, e as despesas empenhadas e as liquidadas que
50 Contabilidade Pública

não foram pagas, devem ser repassadas para o exercício financeiro


posterior para que faça parte dele, sem deixar resíduos passivos ou
ativos (KOHAMA, 2016).

IMPORTANTE:

Mais à frente nos nossos estudos, iremos compreender


a fundo o que são despesas empenhadas, despesas
liquidadas e despesas pagas. No entanto, para que
você entenda como funciona o regime de caixa, basta
você saber que as despesas podem passar por três
estágios. Quando ele é empenhado, ocorre a criação
da obrigação pendente de pagamento, demonstrando
que existe aquela despesa a ser paga, já quando ela é
liquidada é porque foi verificado o direito de o credor
receber o devido pagamento, mas essa despesa só é
paga realmente no estágio do pagamento, que é quando
ocorre o desembolso efetivo do valor ao credor.

Para Lima e Muniz (2016), esse regime é ineficiente em relação ao


reconhecimento das transações econômicas da Administração Pública,
devido à mensuração restrita do resultado econômico, pois não alcança
de maneira integral as variações sofridas pelo patrimônio.

Regime de competência
No regime de competência, “as receitas e despesas são
apropriadas como do exercício em razão da data do respectivo fato
gerador (cria a obrigação), e não da época em que ocorre a arrecadação
ou o pagamento”. (SILVA, 2015, p. 25)

Assim, os tributos lançados e não arrecadados e as despesas


empenhadas e não pagas no período serão escrituradas no resultado
do exercício, como se tivessem sido realizadas totalmente no ano de
referência, complementa o autor.

Aqui, as receitas e despesas são pertencentes ao exercício que


lhe deu origem, e não no momento do seu pagamento ou recebimento,
mesmo que já empenhadas. E, se encerrada a vigência do orçamento,
Contabilidade Pública 51

essas receitas e despesas passam para o exercício posterior, para


que sejam pagas ou arrecadadas, mas não deixam de fazer parte do
orçamento de origem.
Figura 18 – Regime de competência

Todas as receitas e
Regime de
despesas pertencem ao
competência
exercício de origem

Fonte: Elaborado pelo autor com base em Silva (2015).

Logo a receita lançada e não arrecadada no período é de fato


receita desse período, passando a fazer parte de resíduos cobrados em
exercícios seguintes na conta receita a arrecadar, bem como a despesa
legalmente empenhada e não paga no período passa a ser despesa
desse período, fazendo parte de resíduos passivos, que serão pagos em
exercícios seguintes, como restos a pagar (KOHAMA, 2016).

IMPORTANTE:

No regime de competência, deve-se realizar a apuração


no final do exercício das operações que devem ser
contabilizadas, como resíduos ativos e restos a pagar
(SILVA, 2015).

Esse regime é adotado no registro de receitas e despesas que


estão mutuamente relacionadas, como em uma relação de causa e
efeito, sendo normalmente empregados pelos fundos proprietários, visto
que esses executam, sobremaneira, transações de ordem econômica
ligadas a atividades empresariais (LIMA; MUNIZ, 2016).
52 Contabilidade Pública

SAIBA MAIS:

Aprofunde-se nesse tema lendo o artigo “O regime de


competência no setor público brasileiro: uma pesquisa
empírica sobre a utilidade da informação contábil”. Nesse
artigo, os autores examinam os benefícios trazidos
pelo regime baseado na competência para a tomada
de decisões e para a gestão das entidades públicas.
Disponível aqui.

Exercício financeiro da Administração


Pública
Exercício financeiro é o intervalo de tempo em que acontecem as
operações financeiras e contábeis da Administração Pública.

Kohama (2016, p. 43) define o exercício financeiro como “o período


de tempo durante o qual se exercem todas as atividades administrativas
e financeiras relativas à execução do orçamento”.

Segundo a Lei nº 4.320/64, art. 34, o exercício financeiro da


contabilidade aplicada ao setor público coincidirá com o ano civil.
Figura 19 – Exercício financeiro

Exercício
financeiro

Coincide com o
ano civil

Fonte: Elaborado pelo autor com base na Lei nº 4.320/64.

Assim, ele corresponderá ao período de 12 meses em que o


orçamento será executado, iniciando-se em 1º de janeiro e terminando
em 31 de dezembro.

Esse período é importante para diversos instrumentos


orçamentários e fiscais, pois envolve todas as atividades relacionadas
Contabilidade Pública 53

com a execução da Lei Orçamentária Anual (LOA), como em relação à


validade de créditos adicionais e para a definição dos restos a pagar e
das despesas de exercícios anteriores.
Durante esse período também ocorrem transações
independentes da execução orçamentária, tais como:
consumo de materiais, atualização de créditos e débitos,
inscrição de restos a pagar e de dívida ativa etc. Nesse
período, a Contabilidade Pública registra o montante da
previsão da receita e da fixação da despesa, bem como faz
a escrituração da arrecadação da receita, da emissão de
empenhos, da liquidação e pagamento da despesa e de
uma série de outros atos e fatos administrativos, tais como
assinatura de contratos, movimentação de almoxarifado
etc. (HADDAD; MOTA, 2010, p. 67)

Além disso, as receitas e despesas devem pertencer ao exercício


financeiro dos registros contábeis (art. 35, Lei nº 4.320/64).

Por isso esse lapso temporal deve ser seguido no momento dos
registros e das demonstrações dos atos e fatos relacionados com o
patrimônio público de todos os entes da federação.

RESUMINDO:

Compreendeu, ainda, que o regime contábil pode ser


regime de caixa, regime de competência e regime misto
e que, no Brasil, o regime a ser utilizado irá depender
do enfoque, pois, quando for pelo enfoque orçamentário,
ele será misto, sendo o regime de caixa para a receita
orçamentária e o regime de competência para a despesa
orçamentária. No entanto, quando o enfoque for
patrimonial, ele será sempre pelo regime de competência.
Além disso, você conheceu os conceitos de cada um dos
regimes, bem como o que diz a legislação sobre o regime
contábil. Por fim, entendeu que o exercício financeiro
da administração pública coincide com o ano civil e
que esse período é onde ocorrem diversas transações
financeiras e orçamentárias relacionadas com a Lei
Orçamentária Anual. Dessa forma, foram muitos pontos
importantes para o seu estudo da contabilidade aplicada
ao setor público que fizeram parte desse estudo e que
serão fundamentais para os próximos conhecimentos.
54 Contabilidade Pública

REFERÊNCIAS
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à prática. São Paulo: Saraiva, 2020.

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sobre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes
para a Reforma Administrativa e dá outras providências. Diário Oficial da
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Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade
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