You are on page 1of 20
INVESTIGANDO O INTERIOR DA TERRA | Marcia Ernesto Leila Soares Marques Jestudo das propriedades fisicas fundamentais Jdo interior da Terra corresponde ao ramo das Geociéncias denominado Geofisica, Muitas informagdes sobre 0 comportamento dinimico do interior do nosso planeta resultam do estudo de suas propriedades fisicas, tais como a gravidade ¢ o magnetismo. Através do estu do global do campo da gravidade, obtém-se informacio acerca das dimensdes, forma e massa da Terra, bem como do modo como a massa se distribui no interior do planeta. Em escala local, a andlise das variagdes de gtavidade é 0 fundamento da prospeccio gravimétrica. © uso ctitetioso desta tltima, combinado com infor mages geolégicas, permite localizar, identificar e avaliar © potencial econdmico de jazidas de minétios diversos, carvio, petréleo, sal, matéria-prima para indistria ceri- mica € de construgio, etc. © campo magnético terrestre origina-se no niicleo tettestre ¢ a observacio na superficie da Terra da forma « vatiagdes desse campo magnético permite estudar a dinmica dessa regio da Terra. As rochas da superficie terrestre, a0 se formarem, registram as informagdes do campo geomagnético da época, e a recuperagio dessas informages permite desvendar a hist6ria do magnetis- mo terrestre no passado geol6gico. Além disso, através das propriedades magnéticas das rochas, é possivel loca- lizar jazidas minerais e tragar os movimentos pretéritos dos blocos litosféricos durante a evolugio da Terra. O objetivo deste capitulo é fornecer os conceitos fun- damentais sobre a gravidade e © campo magnético tertesttes e ilustrar de que forma estas caracteristicas fisi- cas trazem informagées sobre a propria estrutura interna do planeta, 4.1 O que é a Gravidade? Embora os estudos empiticos sobre © movimento de queda livre tenham sido iniciados e publicados por Galilew no final do século XVI, a formulagao da teoria da gravita¢io universal s6 ocorreu praticamente um sé culo depois, quando Newton publicou os seus estudos no ano de 1687. Nessa época, 0 conhecimento de que a ‘Terra possui forma aproximadamente esférica ja estava totalmente difundido, visto que em 1522 Magalhies ha via concluido a primeira viagem de circunavegagio. A gravitagio é uma propriedade fundamental da ‘matéria, manifestando-se em qualquer escala de grande- za, desde a atémica até a césmica. Os fendmenos gravitacionais so deseritos pela lei de Newton, na qual duas massas esféricas m, e m,, com densidades unifor- 64 DeciFRANDO A TERRA ‘mes nos seus interiores, atraem-se na razéio direta do pro- duto de suas massas e na razio inversa do quadrado da distincia entre os seus centros, conforme descrito pela equagio 4.1: my 41) F=G— nna qual m, em, so as massas das esferas, x € a distincia centre clas, F €a forca de atragio que age sobre cada uma das esferas eG é a constante da gravitagio universal (veja tabela de unidades no final do livro). De acordo com a lei de Newton (equagio 4.1), se a esfera com massa m, estiver fixa e a esfera com massa m, puder movimentar-se, ela iri se deslocar em direcio 4 primeira, devido a forca F Neste caso, sua aceleragio 4, seri igual a F/m, ou, substituindo-se na equacio 4.1 F _ (Gm) (4.2) ‘mF Portanto, a aceleracio a, depende apenas da distincia entre as duas esferas e da massa m,, que cria um campo de aceleracio gravitacional a0 seu redor, o qual é igual em todas as ditegies, ou seja, é isotrdpico, Estas caracte- risticas fazem com que um corpo, mesmo possuindo ‘massa muito clevada, produza um campo menos inten- so do que um outro, com massa muito menor, mas situado mais préximo, Como exemplo, podemos citar a queda de meteoritos sobre a superficie terrestre. Em. bota sendo atraidos pelo Sol, muitos deles neabam caindo nna Terra, de massa muito menor, ao passarem em érbita préxima, Além disso, como 0 campo gravitacional é isotxSpico, as foreas de atracfo tendem a aghutinar massa em corpos esféricos. Pista caracteristca explica a forma aproximada. mente esférica do Sol e dos planetas que compdem 0 Sistema Solar, os quais foram formados a partir de uma nuvem de gis e poeira interestelares, ha 4,6 bilhdes de anos, durante 0 processo de acrescio (Cap. 1), Como a Terra executa um movimento de rotagio ao redor de si mesma com um perfodo de 24 horas, qualquer ponto do seu interior ou de sua superficie softe 0 efeito da aceleragio centrifuga dada pela ex- pressio: a= or (43) na qual «9 = 2n/T é a velocidade angular de rotagao, T € 0 periodo de rotacio e r é a distincia ao eixo de rotacio. Como a aceleragio centrifuga € dirigida per- = Aco do vento solar sobre as linhas de forco do campo geomagnético. pendicularmente 0 eixo de rotacio, os tinicos locais onde nao ha aceleracio centrifuga (a, = 0) sio aqueles situados sobre 0 eixo de rotagio, ou seja nos pdlos. ‘Todos os outros pontos da ‘Tetra sofrem uma acele- ragio centrifuga cuja intensidade é diretamente proporcional & distincia do eixo de rotacio, atingindo valores maximos na linha do Equador, como pode set observado na Fig. 41. Fig. 4.1 A aceleracao da gravidode varia de ponte para ponto sobre 0 superticie teresire. A Terra 6 achatoda nos pélos e execute movimento de rotacéo, portanto a aceleragéo da gra- vidade em um dado local resulta da soma vetorial dos, aceleragées graviacional a, ¢ da centrifuga 0,. A direcdo da acelerado da gravidade g ndo 6 radial e sua intensidade atn- {g¢ valores méximos nos pélos e minimos na regiéo equotorial A soma vetorial da aceleragio gravitacional ¢ da aceleracio centrifuga é denominada aceleracio da gra- vidade (Fig, 4.1) ou simplesmente gravidade. B= ata, 44) ‘Tanto a dire¢io como a intensidade de g variam conforme a posi¢ao sobre a superficie terrestre. Em- bora o componente gravitacional a, fossa intensidade aproximadamente constante, sua diregio € variavel, sendo praticamente radial e apontando para o centro da Terra. Jé 0 componente centrifugo a, tem direcio sempre perpendicular 2o eixo de rotacio terrestre, mas sua intensidade varia em funcio da latitude. Desta for- ma, a intensidade de g € maxima nos pélos e igual a0 Co componente a, diminuindo gradualmente em dire- io ao Equador, onde atinge o valor minimo. Como pode ser observado na Fig, 4.1, a diregio de g 86 coincide com aquela do componente gravitacional a, nos pélos € no Equador, sendo que nas demais latitu- des ela nio é radial. 4.2 Medindo a Gravidade Através da medida do campo da gravidade da Terra foram obtidas importantes informagées sobre o seu in- terior, determinando-se também diversas de suas caracteristicas, como sua forma ¢ interagdes com outros coxpos do Sistema Solat. Como vimos antetiormente, 0 campo da gravidade associa a cada ponto da superficie terrestre um vetor de aceleracio da gravidade g. Esse vetor caracteriza-se por sua intensidade, denominada gravidade, e por sua dire- fo, denominada vertical. A gravidade é medida por meio de gravimetros, enquanto a vertical é obtida por méto- dos astronémicos. Em gravimetria, em homenagem a Galileu, utiliza-se como unidade de aceleracao 0 Gal (ver tabela de unidades no final do livro). Dois tipos de gravimetros podem ser utilizados em ‘medidas da gravidade. Os gravimetros absolutos (Fig, 4.2) medem diretamente a intensidade da aceleracio da gravidade em um dado ponto, sendo os do tipo queda Fig. 4.2 Experimento realizado em Valinhos (SP) para a med do da grovidade utlizando um gravimetro absoluto. CT a 2 livre (que se baseiam na medida do tempo de percurso de um corpo em queda livre) os mais utilizados atual- mente. Como sio de dificil transporte, ficam instalados «em laboratbrios, Por outro lado, os gravimetsos diferen- ais sio basicamente balancas de mola que determinam com precisio © peso de uma massa de valor constante, cuja variagio € causada por diferencas no valor de g. Este tipo de gravimetro mede a diferenca de gravidade ( entre dois pontos distintos, € nos casos em que o valor ‘em um dos pontos é conhecido, pode-se determinar a gtavidade no outro, Em levantamentos gravimétricos de detalhe é ne- cessirio medir pequenas variagdes da gravidade, causadas por estruturas ou corpos localizados na sub- superficie, requerendo, uma sensibilidade instrumental da ordem de 0,01 mGal. Para essa finalidade sio go ralmente utilizados gravimetros-diferenciais, que possuem maior sensibilidade do que os absolutos. Nesses gravimetros é possivel medir, por exemplo, variagdes do valor de g quando o instrumento € colo- cado sobre uma mesa ou sobre 0 assoalho de um mesmo local. Entretanto, como sofrem deriva, isto €, diferencas temporais nas medidas devido a mudangas nas propriedades elisticas de seus componentes, esses gravimetros devem ser aferidos em locais euja gravi- dade é conhecida, antes de se iniciar a aquisi¢io de um novo conjunto de medidas. Como isso nem sempre é possivel, costuma-se ao final de cada dia de trabalho tetornar 20 ponto da primeira medida e efetuar nova Jeitura. Dessa forma, determina-se a deriva do instru- mento durante o periodo, para posteriores correcdes. 4.3 A Forma da Terra Como a intensidade de g é maior nos pélos do que no Equador, a ‘Terra nio possui forma totalmen- te esférica, sendo que o seu raio equatorial (6.378 km) é ligeiramente maior do que o raio polar (6.357 km). Portanto, a Terra possui a forma de um esferdide achatado nos pélos ¢ isto explica, por exemplo, por- que um objeto é levemente mais pesado nos pélos do que no Equador. O grau de deformagio do esferdide é medido pelo seu achatamento, definido como sen- do a diferenga relativa entre os raios equatorial e polar do esferdide, conforme a expressi pete 43) a na qual a é 0 raio equatorial, ¢ é 0 raio polar ¢ Fé 0 achatamento, Como a diferenga entre os raios equatorial ¢ po- Jar é relativamente pequena (21 km), em comparacio com as dimensées da Terra, seu achatamento é mui- to pequeno, sendo de 1/298,247, quando calculado precisamente, Portanto, em primeira aproximacio, po- demos considerar que a Terra é esfética A atragio gravitacional mantém a Terra, os outros planetas do Sistema Solar e 0 préptio Sol cocsos. Eneretanto, contrariamente ao que ocorre na ‘Terra, nem todos os planetas possuem achatamento tio pe- queno. Por exemplo, jipiter apresenta um achatamento polar (1/15) bem mais acentuado. Mesmo assim, esse achatamento é pouco perceptivel em fotografia. Para se ter uma idéia, para um raio equatorial de 10 cm, 0 raio polar seria de 9,3 cm. Jipiter efetua um répido movimento de rotagio (periodo de cerca de 10 ho- tas) € possui também elevadas dimensdes (raio ‘equatorial de 71.600 km), implicando grandes distin- cias de pontos localizados em sua superficie em relacio a0 cixo de rotagio. Bstes dois fatores fazem com que a aceleragio centrifuga no bojo equatorial de Jupiter seja muito maior do que a equivalente na superficie terrestre, provocando assim um maior achatamento. © achatamento terrestre forneceu informagées fundamentais para o conhecimento do interior do nosso planeta. Com a suposigio de que a Terra possui densidade constante e é constituida por um fluido em perfeito equilfbrio hidrostitico, Newton calculou um achatamento de 1/230. Com os conhecimentos atuais sobre a velocidade de rotagio da Terra e de suas di- mensdes, 0 achatamento polar tedrico é de 1/2995, bastante préximo do valor aceito hoje, obtido por meio da observagio precisa das drbitas de satélites artificiais. Esse resultado indica que grande parte do interior da Terra comporta-se como um fluido. A principio, isto parece contraditério, tendo em vista os resultados obtidos pela Sismologia, que indicam que a crosta, manto terrestte e micleo interno sao sélidos. A expli- cago para esse fato € que as rochas do manto terrestre comportam-se como um sélido elistico em curtos intervalos de tempo (segundos), durante a passagem das ondas sfsmicas por exemplo, e como um fluido viscoso na escala do tempo geolégico (milhdes de anos). Considerando que a Terra formou-se ha 4,6 bilhdes de anos, houve tempo suficiente para ocorrer deformagio plistica das rochas que compéem o man- to tetrestre, originando assim, seu achatamento devido a0 movimento de rotacio. 4.4 Interpretando Anomalias Gravimétricas Na superficie terrestre, o valor médio da gravidade & de aproximadamente 9,80 m/s ou 980 Gal. Devido a0 movimento de rotagio e ao achatamento na regio po- lar, o valor da gravidade diminui cerca de 5,3 Gal dos polos a0 Equador, © que representa uma vatiagio em torno de 0,5%, Além disso, a atracio exercida pela Lua € pelo Sol, bem como as diferengas de altitude entre os pontos de medida causam alteracio no valor da gravi- dade. Como todas essas variagBes se superpOem, torna-se necessirio quantifici-las e eliminé-las ao maximo para, entio, estudar aquelas variagbes causadas por diferencas ‘na composigio e estrutura da crosta ou do manto supe- rior da ‘Terra A maior variagio no valor de g é a latitudinal, causa- da pela rotagio ¢ achatamento terrestres. O valor teérico da gravidade 7 a0 nivel do mar é descrito pela Formula Internacional da Gravidade, estabelecida em 1980 como: +(0}=978,0318(1 +0,0083024sen"% 0,00000587sen2)Gal (4.6) na qual é a latitude sobre um ponto do elipsdide de referéncia, cuja superficie é a que melhor se ajusta i for- ma da Terra. As variagies da gravidade devido & agio da Lua e do Sol (efeitos de maré) sto descritas por meio de tabelas publicadas periodicamente. As variagdes causadas por di- ferencas de altitude, devido & topografa do terreno, também podem ser climinadas através de duas corregdes, denomi- nadas corregao ar-livre ¢ correcio Bouguer. Esta tiltima deve seu nome a uma homenagem a Pierre Bouguer por seus estudos, no século XVII, sobre a forca de atracio gravitacional exercida pela Terra. A corregiio de artivre € aplicada para eliminar o efei- to causado pela. diferenca de altitude entre © ponto de observagio ¢ o nivel do mar (Equagio 4.6) no valor da gravidade. Esta correcio é dada por 0,03086 x h mGal, ‘onde h é a altitude em metros, ¢ deve ser somada-2e, valor medido, ja que a gravidade diminui com a altitude), Como existem massas rochosas entre 0 ponto de medida e o nivel do mar, em areas continentais, aplica-se a corre¢io Bouguer para eliminar o efeito gravitacional dessa porgiio crustal, sendo conveniente conhecer a sua densidade com a melhor exatidio possivel. A corregio de Bouguer & dada por -0,0419 x p mGal por metro de altitude, em que p é a densidade em g/cm'. Quando esse pariimetro é desconhecido, utiliza-se 2,67 g/em’, Tele MoM ALU Le] que corresponde & média da crosta continental. A corre- fo Bouguer é aplicada conjuntamente com a de altitude (arlivre), restando apenas o efeito devido a atragio dos ‘materiais situados abaixo do nivel do mar. Emm regides muito acidentadas, é efetuada uma ter- ccira corregiio, denominada corregao de terreno, que Jeva em conta as feigdes topogrificas de uma area. Em eral, como seus valores no ultrapassam algumas deze- nas de mGal, sio aplicadas somente nos levantamentos de detalhe. Em jireas ocednicas, onde as medidas sio realizadas 0 nivel do mar, costuma-se efetuar apenas correcdes ar-livre, enquanto em dreas continentais utiliza se também a correcio Bouguer. Seo interior da ‘Terra fosse uniforme, os valores pre- visto © medido da gravidade seriam iguais, apés todas essas corregdes, Entretanto, como existem importantes variagGes laterais e verticais nas rochas que compdem 0 interior da Terra, esses valores sio geralmente distintos. A diferenca entre o valor medido ¢ o previsto é chama- da de anomalia de gravidade. Dependendo da correcio aplicada, a anomalia recebe o nome de anomalia ae live ou de anomalia Bouguer. ‘As anomalias gravimétricas resultam de variagBes na densidade dos diferentes materiais que constituem o inte- rior da Terra, Os contrastes de densidade entre diferentes tipos de rochas modificam a massa ¢ causam, conseqiien- temente, mudancas nos valores da gravidade (Fig, 4.3). Libiitenl i J 2 ‘gen Fig. 4.3 Intervalos de variagéio da densidade de algumas ro- chas freaientemente encontradas na supericie terrestre & densidades médias para essas mesmos rochas. A titulo de com- paragéo, enconiram-se também representados os valores, rmédios da crosta continental eda crosta oceénica. a ee TN Nas anomalias negativas de gravidade, os valo- res medidos sio menores do que os previstos, apés todas as corregdes, sendo causadas por rochas com densidade relativamente baixa ou sedimentos loca- lizados na sub-superficie, em contato com outras rochas de maior densidade existentes no substrato. Por exemplo, anomalias negativas sio encontradas em cadeias montanhosas (que possuem raizes pro- fundas constituidas por rochas com densidade relativamente baixa), ou ainda associadas presen- ca de corpos rochosos intrusivos de baixa densidade (Fig, 4.4) - Fig. 4.4 Anomalia de grovidede causada pelo gronito Touréo. (situado no Estado do Rio Grande do Norte, Brasil. perfil A, indicado no mapa, mostra uma acertuada queda no valor de gra- vidode que coincide com o setor de maior profundidade do gronito, menos denso que as rochas encaixantes. Note que extensdo horizontal do corpo intrusivo (~ 50 km) & cerca de dez vezes maior que a sua profundidade méxima (~ 5 km). Cortesio de RLF Trindade As anomalias negativas sio geradas também pela presenca de domos de sal de baixa densidade, for- mados pela’ evaporagao da agua de antigos mares rasos. Como este ambiente é propicio para a de- posigio de matéria orginica, que pode originar pe- tréleo, essas anomalias podem indicar areas potencialmente favoraveis & prospeccio. Anomalias positivas de gravidade ocorrem quan- do os valores de gravidade medidos sio maiores do que os previstos e sio causados pela presenca de materiais com alta densidade na superficie ou em profundidade. Assim, locais onde ocorrem r0- chas com alta densidade so caracterizados por apresentarem anomalias positivas. Na regiio meri- dional do Brasil hi uma anomalia dessa natureza (Fig. 4.5), causada por uma das maiores manifesta- des de vulcanismo baséltico do planeta, que originou, ha aproximadamente 130 Ma, a Forma- io Serra Geral da Bacia do Parand. vey 3 Z; ‘Anomalia positive de gravidade Fig. 4.5 Anomolias positivas de gravidade podem ser cousa~ dos pela presenca de rochas de alta densidade préximas da supericie. Na Bacio do Poran, onde houve a extrustio de uma grande quantidade de magmas bésicos, observa-se uma pro: niunciada anomalia positiva de gravidade. Capitulo 4 Depésitos de minerais metilicos de alta densi- dade localizados em sub-superficie podem também ser identificados em levantamentos gravimétricos de detalhe, por produzirem anomalias positivas de gravidade. A representacio de anomalias gravimétricas & feita por meio de mapas de curvas iso-andmalas, cujas linhas unem pontos com os mesmos valores de anomalia, Nesses mapas (Fig. 4.6) ocorrem al- tos € baixos gravimétricos causados por diferencas na densidade dos materiais que ocorrem na crosta € no manto superior. As anomalias que possuem dimensdes de até dezenas de quilémetros sio de- ‘io geralmente associadas a corpos rochosos relativamente peque- nos, com densidade andmala, localizados proximos da superficie (na crosta superior). Por outro lado, as anomalias regionais possuem dimensdes de até milhares de quilémetros e sio, em geral, associadas, a feigdes de grande escala. Por exemplo, os altos gravimétricos de escala regional que ocorrem em bacias oceiinicas profundas sio causados pela pro- ximidade das rochas do manto, uma vez que a crosta ocefinica é pouco espessa (6 a 7 km). nominadas anomalias locais, € 80" -70° -65° -60° 80° -75° -70° 65° -60° -55° -50" Fig. 4.6 Mopo de anomalias Bouguer do Brosi e éreas adjocentes. O intervalo das linhas de contomo.é de 20 mGal. Fonte: é etal. 1993, eaecu n um 4.5 O Principio da Isostasia Entre 1735 €'1745 foi realizada uma expedicio francesa para o Peru, liderada por P. Bouguer, com © objetivo de determinar a forma da Terra. Nessa viagem, Bouguer notou que as montanhas da Cor- dilheira dos Andes exerciam uma forca de atragio gravitacional menor do que a esperada para o res- pectivo volume. Cerca de um século mais tarde, G. Everest fez a mesma observa¢Zo nos Himalaias, durante uma expedicio a India. Na época, foi sugerida a hipétese de que as montanhas teriam menor massa do que as Areas adjacentes; no havia, entretanto, uma explicacio geolégica razoavel para esse tipo de fendmeno comum, A explicagio viria em 1855, quando J. H. Pratt € G. Airy propuseram, independentemente, hipte- ses para explicar essas observagées, € em 1889 0 termo isostasia foi utilizado para denominar o me- canismo que as explica. De acordo com 0 conceito de isostasia, ha uma deficiéncia de massa abaixo das rochas da cordilheita aproximadamente igual 4 massa das prdprias montanhas. -45° -40° -30° ee ae © conceito de isostasia baseia-se no principio de equilibrio hidrostatico de Arquimedes, no qual um corpo ao flutuar desloca uma massa de 4gua equivalente 4 sua propria. Nesse caso, uma cadeia montanhosa poderia comportat-se como uma to- Iha flutuando na agua. De acordo com este principio, a camada superficial da Terra relativamen- te rigida flutua sobre um substrato mais denso. Sabemos hoje que essa camada corresponde cros- ta e parte do manto superior, que integram a litosfera. O substrato denso é denominado astenosfera (Cap. 5), comportando-se como um. fluido viscoso, no qual ocorrem deformacées plas- ticas na escala do tempo geol6gico. O equilibrio isostitico é atingido quando um aciimulo de carga ou perda de massa existente na parte emersa é contrabalangada, respectivamente, por uma perda de massa ou actimulo de carga na parte submersa. nivel do mar Fig. 4.8 llustragio do modelo de compensacéo isostética de Pratt. A camada superior rigid & composta por blocos. de igual profundidade, mas com densidades diferentes ¢ menorés do que aquela do substrato pléstico. A condigio de equilfbrio isostético é atingido pele variacdo da densi- dode, de modo que as rochas sob os cadeias montanhosas 360 menos densas, enquanto os dos bacias ocednicas s0 mais densos ‘Nas duas hipsteses de compensagio isostatica, a superficie terrestre é considerada suficientemente tigida para preservar as feicdes topograficas e me- nos densa do que o substrato plistico. No modelo de Airy, as montanhas sio mais altas por possui- rem raizes profundas, da mesma forma que um imenso bloco de gelo flutuando no mar (Fig. 4.7). nivel do mar lamina d’égua Sabemos hoje que os dois modos de compen- sagio isostatica ocorrem na natureza, As montanhas so mais altas, pois se projetam para as partes mais profundas do manto, conforme informacées obti- das através da Sismologia. Por outro lado, os continentes situam-se acima do nivel do mar devi- do as diferencas de composicio e densidade (Fig, 4.3) entre crosta continental e a crosta oceani- ca (Fig, 4.9). Mesmo apés ter sofrido intemperismo. € erosio intensos no decorrer do tempo geolégi- co, a crosta continental situa-se acima do nivel do mat devido 4 isostasia, pois @ medida que a erosio remove as camadas mais superficiais, ocorre lento soerguimento, Portanto, rochas originadas em pro- Fig. 4.7 llustracdo do modelo de compensacéo isostética de Airy. A camada superior rigida possui densidade cons- tante mas inferior aquela do substrato plastico. A condigo de equilibrio isostético 6 atingido pela variagdo de espes- ‘sura da camada superior, de modo que as montanhas tém raizes profundas. Por outro lado, no modelo de Pratt, as monta- has sio elevadas por serem compostas por rochas de menor densidade do que as existentes nas regides vizinhas (Fig, 4.8), havendo neste caso diferencas late- rais na densidade. fundidades maiores acabam atingindo niveis superficiais. Uma confirmagio desse fato é a ocor- réncia de rochas metamérficas, formadas em condigies de alta pressio ¢ temperatura, compativeis com as exis tentes na base da crosta continental ¢ que hoje encontram-se expostas em varias regides do plancta. No Brasil, estas rochas (granulitos) sio vistas, por exem- plo, em varios pontos do Estado da Bahia (Craton do Sao Francisco). fer) crosta crosta oceanica continental EE Cu er) Fig. 4.9 Os dois modelos de compensagéo isostética ope- rom simultaneamente. As montanhos possuem ratzes profundas, ompostes por rochas com densidade relaivamente baixa,fa- zendo.com due a costae litsfera sejam mais espestos nessas regides, conforme previsto no modelo de Airy. Por outro lado, ‘ crosta oceGnica situa-se em niveis topogréticos mais baixos do que a crosta continental, devido sua maior densidade, conforme previsio no modelo de Prat Em geral, a litosfera suporta grandes esforcos sem softer deformagio. Entretanto, em algumas situagoes geol6gicas, uma carga muito elevada pode ser adicio- nada ou removida da litosfera, deformando-a. Podemos citar como exemplo a adigio de massa cau- sada pelo extravasamento de grandes quantidades de basaltos em provincias igneas, pela sedimentacio ou pela formacio de calotas de gelo. Essa massa adici nal faz com que a litosfera entre em subsidéncia, para que 0 equilibrio isostatic seja atingido. Atualmente, na Groenlindia, esta ocorrendo unr processo desse tipo, devido ao peso da espessa camada de gelo da sua superficie, de modo que suas rochas encontram- se abaixo do nivel do mat. litosfera Ee ue) Fig. 4.10 Movimentos verticais da litosfera cousados pela ‘odigdo (a) e remocGo (¢) de uma carga (calote de gelo, sedi mentos, derrames de basollos, et.) no sua superficie, A linha pontihada refee-se ao valor da gravidade antes de adicdo ou remodo da carga (stvacéo de equilbrio isosttico). A linha tracejada indica como a gravidade varia com a adicéo ov re mogio da carga quando ainda néo ocorrev a compensacéo isosttica, como ilustrado em (a) e(c Beene) © processo oposto, soerguimento, resulta da remogio de uma_carga existentt na superficie da crosta, como nos casos do degelo de calotas glaci- ais ou da erosio intenisa de éreas montanhosas, A Escandinavia, por exemplo, encontra-se em fase de soerguimento (de até 1em/ano), retornando ao equilibrio isostatico, devido ao desaparecimento do gelo que ali existia ha cerca de 10.000 anos. E movimento persistira até que 0 equilibrio isostatico seja totalmente atingido. Nessas situacdes, a falta de equilibrio isostitico pode ser revelada pela pre- senga de anomalias de gravidade (Fig, 4.10), 4.6 A Terra como um Imenso ima Hoje estamos absolutamente familiarizados com © magnetismo terrestre através do uso da buissola para orientagao. Este instrumento nada mais é do que uma agulha imantada, livre para girar no plano horizontal, sendo atraida pelos polos magnéticos da Terra, De de ha séculos, esta propriedade fisica da Terra conhecida e tem-se relatos de que a biissola ja era da por volta de 1100 d.C. pelos chineses, a quem é atribuida sua descoberta. Evidentemente, a forma da btissola era muito diferente da atual: uma colecio de contos persas escritos em 1232 descreve uma folha de ferro em forma de peixe usada como biissola dez anos antes ou, como relatado por eseritores arabes, uma agulha magnetizada flutuava em Agua apoiada em madeira ou junco. (b) litosfera EOC ey (©) rence) Fcc) 72 DeciFRANDO A TERRA ‘Mas as primeiras investigagGes sobte fendmeno do dessa esfera 6 semelhante & de um ima de barra que cha- ‘magnetismo s6 tiveram inicio em 1269 com as experién- _mamos de dipolo, Podemos entio imaginar a Terra como cias de Petrus Peregrinus de Maricourt. Ele esculpiu _ uma esfera, no centro da qual existe um dipolo ou ima de magnetita (mineral magnético de éxido de ferro) numa _arra (Fig. 4.11). O eixo do dipolo geocéntrico esti pro- forma esférica, da qual aproximava pequenos mis De- _ximo do eixo de rotagio da Terra ¢ faz. com ele um Angulo senhou sobre a superficie esférica as diregdes indicadas _de cerca de 11,5°, Por esta razao, a agulha de uma bissola, ppor eles, obtendo linhas que circundavam a esferae inter- em geral, nfo aponta para o norte mas sua direcio faz ceptavam-se em dois pontos, da mesma forma que as linhas da longitude sobre a Terra interceptam-se nos po- los, Por analogia, ele denominou esses pontos de pélos do ja. Na Inglaterra, William Gilbert repetiu e ampliou tais experiéncias, reunindo todo © conhecimento de até entio sobre magnetismo no tratado De Magute, publica- do em 1600. A partir das semelhancas no comportamento ‘magnético com a magnetita esférica, ele reconheceu que a propria Terra era um imenso ima Mas foi apenas depois de 1838 que se péde conhecer melhora distribuigio do campo magnético terrestre, quan- do Carl Friedrich Gauss comecou a fazer medidas sistemticas da intensidade do campo geomagnético. Atra- vés de anilise matemtica, mostrou que 95% do campo ‘magnético da Terra originam-se no seu interior e somente ‘uma pequena parte restante provém de fontes externas. Por outro lado, a conchusio de Gilbert de que o cam- po magnético da Terra é semelhante ao da esfera de magnetita equivale a dizer que a Terra uma esfera unifor- memente magnetizada. A forma do campo magnético Fig. 4.11 © campo magnético terresie 6 equivalente oo cam: pode um dipolo, cujo eo faz um éngulo de 11,5° com eixo de rotagio da Tera e esté um pouco ofastado de seu centro. 30° o 60° -180° 120° 0 60° 120° 180° Fig. 4.12 Mapo de declinacéo magnética indicando a posicdo dos pélos ea linha de declinacdo zero. Fonta Langel et al., 1980. ore) uum fingulo com a ditegio norte-su, fato este jé conhecido dos grandes navegantes desde o século XVI. Esse angulo de desvio da agulha é a declinagao magnética A agulha da bissola desvia do norte geogréfico pata Leste ou para Oeste segundo um angulo que dependeri do local onde se encontra 0 observador em relagio aos pélos geogrifico ¢ magnético. Desta forma, se o ponto de observagio ¢ esses polos estive- rem alinhados sobre o mesmo meridiano, entio a declinagio seri zero, Se 0 eixo do dipolo coincidisse com 0 eixo geogrifico, niio haveria declinagio (Fig, 4.12). Somente nos pontos correspondentes a linha de declinagio zero (ou linha agénica) da Fig. 4.12 é que a agulha indicara o norte geogrifico verdadeiro. Entretanto, 0 campo magnético da Terra nio é um dipolo perfeito e cerca de 5% desse campo € irre- gular, ou seja, nio-dipolar. A conjugagio desses dois campos provoca desvios nas linhas de declinagio magnética, bem como em todas as linhas de forca do ‘campo magnético terrestre, pois 0 campo nao-dipolar é diferente para cada regio da superficie da Terra, resultando numa distribuicio de intensidades Fig, 4.13) diferente daquela esperada para um campo dipolar. A intensidade do campo geomagnético é muito fraca, cerca de 50,000 x 10° T ou 50.000 nT (T repre- senta Tesla que é a unidade de indugio magnética no Sistema Internacional; correntemente usa-se também 60° 30° o 60° 180° ~120° Fig. 4.13 Mapo de intensidade total do campo geomagnético em milhres de nT. relate Roles AD a unidade gamma - y que equivale 1 iT; (ver tabela de unidades no final do livro). Isto corresponde a um ‘campo centenas de vezes mais fraco do que o campo entre os pélos de um ima de brinquedo. A intensidade varia conforme a regio considerada sobre a superfi- cie da Terra, sendo menor préximo ao Equador ¢ ‘maior em diregio aos pélos (60.000 nT no pélo mag- nético norte € 70.000 nT no pélo magnético sul), como pode ser observado na Fig, 4.13. Uma agulha imantada livre para girar em torno de um eixo horizontal nfo permanece na horizontal. Ela acompanha as linhas de forca do campo magnético (Fig, 4.11), de tal forma que a extremidade norte da agulha inclina-se para baixo no hemisfério Norte ¢, para cima no hemisfério Sul. O angulo que a agulha faz com o plano horizontal é chamado de inclinagao magnética. Sobre os pélos magnéticos a agulha co- loca-se na posicio vertical e portanto a inclinagio é de 90°. Em pontos intermediftios, o angulo de inclina- io varia até chegar a zero no equador magnético, onde as linhas de forca sio paralelas a superficie. Os pélos ‘magnéticos esto localizados a aproximadamente 78°N 104°W e 65°S 139°B, portanto niio sio diametralmente simétricos, afastando-se cerca de 2.300 km do antipoda. Desta forma, a melhor representagio do campo magnético terrestre é a de um dipolo cujo exo esti deslocado em relagio a0 centro da Terra de 490 km. Este dipolo é chamado dipolo excéntrico. 180° 74 DeciFRANDO A TERRA Os pélos magnéticos migram a uma velocidade de cerca de 0,2° por ano a0 redor do pélo geogrifico (Fig, 4.14), em geral sem se afastar mais do que 30° deste Ultimo, porém descrevendo uma trajetéria irregular. As- sim é que a declinagio magnética de um local muda continuamente, aumentando ou diminuindo, Torna-se centio necessitio corrigir 0 valor de declinagio conheci- do para um determinado ponto da superficie terrestre a cada cinco anos aproximadamente. Como se pode de- duzir facilmente, os pélos magnéticos levam alguns milhares de anos para percorrer os 360° de trajet6ria 20 redor dos pélos geogritficos. pe aces |e Fig. 4.14 Movimento do pélo magnético norte ao redor do élo geogréfico durante o periodo compreendido entre apro- ximadamente 69.000 e 45.500 anos atrés, como registrado tem rochas sedimentares do JopGo. Fonte Dawson e Newit, 1982. Nio sé a dire¢io, mas também a intensidade do cam- po geomagnético variam com petiodos muito lentos ¢, or isso, 0 conjunto dessas varingdes recebe 0 nome de vvariagio secular. A origem da variagdo secular é interna Terra e deve-se aos processos geradores do campo geomagnético que ocorrem no miicleo da ‘Terra. 4.7. Representagio Vetorial do Campo Magnético Uma vez que o campo magnético terrestre nao é constante no espaco, variando tanto em diresio como em intensidade, torna-se necessitio representi-lo ‘vetorialmente num sistema de eixos ortogonais conveni- entemente escolhidos, como mostra a Fig. 4.15. O eixo x tem direcio norte-sul, y tem diregio leste-oeste € 0 eixo vertical z é tomado com sentido positivo para baixo. O Angulo de declinagio D € o fingulo entre o meridiano magnético que passa pelo ponto considerado e a dire- io norte-sul. A inclinacio magnética I o angulo que 0 vetor campo magnético total F faz com o plano hori- 2 (vertical) Fig. 4.15 Representacéo vetorial do campo geomagnético ‘Oseeinos x ey coincidem com as direcdes geogréficas @ o eixo tem sentido positivo em direco oo centro de Terra. Os én- gulos D e | sdo, respectivamente, a declinacéo e inclinagéo mognéticas Como é visto na Fig: 4.15, os componentes do campo geomagnético relacionam-se através das equa- gies abaixo: =z" (47) ou F=xy4z)* (4.8) D=areg(Z) Se A) 4.10) 4.8 A Magnetosfera Apesar de fraco, 0 campo geomagnético ocupa um volume muito grande, com suas linhas de forga esten- dendo-se a distincias de 10 a 13 raios terrestres (vide segio 4.3). A regio ocupada pelo campo magnético terrestre recebe o nome de magnetosfera (Fig, 4.16). F. ‘uma regio com forma caracteristica, assimétrica em re- lagio 4 Tetra, assemelhando-se a uma gota com cauda extremamente comprida, Essa forma particular é con- seqiiéncia principalmente do chamado vento solar, que seri explicado a seguir. eee ee Fig. 4.16 Representacdo esquemética da magnetosfera e agéo do vento solar sobre os linhos de forga do campo geomagniico. 7 igando o Interior da Terra ‘mente 4 superficie da Terra, as particulas penetram facil- mente até a atmosfera superior ou ionosfera inferior (W km a 100 km de altitude), porque sio conduzidas pelas proprias linhas de campo, A ionosfera corresponde 4 camada mais externa da atmosfera terrestre (Fig, 4.17) e se caracteriza por ser uma ‘camada eletricamente condutora, constituida por fons ‘outras particulas carregadas (elétrons e prétons). Por essa tazio, ela é utilizada na radiocomunicagio, propagando ¢ refletindo ondas de ridio. Quando essa camada é inva- dida por um fluxo de radiagio solar mais intenso, sua condutividade elétrica é alterada, podendo causar inter- rupges na comunicacio de ridio. Observagdes com equipamentos a bordo de naves espaciais levaram a con- clustio de que o espago entre 0 Sol ¢ a ‘Terra no é um vacuo quase perfeito como se acreditava, mas esti preenchido por um gis ionizado constituido de par- ticulas com diferentes enerpias (aticleos de 4tomos, principalmente de hidrogénio e elétrons), que so emitidas pelo Sol e por isso chamado de vento solar. O vento solar flui a uma velocidade de cerea de 300 a 500 km/s; préximo da ‘Terra exer- ce uma pressdo sobre o campo magnético, comprimindo-o. No lado da ‘Tetta que nio esti sendo iluminado pelo Sol, isto é no lado noite, as linhas de for- ‘ca do campo nao sofrem essa pressio € estendem-se a distdncias que cotrespondem a mais de 2.000 vezes 0 taio da Terra, chegando a atingir a Lua. Pressao (mbar) Altitude (kn) © campo magnético terrestre desem- penha um papel importante como blindagem, impedindo que as particulas solares mais energéticas atinjam a superfi- cic terrestte, causando danos 4 biosfera. Quando ocorrem erupgées solares, ha emissio de grande quantidade de parti- clas de alta velocidade, que aleangam a Terra em algumas dezenas de minutos. £ $$ 3 8 ole ae 0 Parte dessa radiacio é bloqueada pelo ‘campo geomagnético ¢ nio atinge a at- mosfera. Entretanto, nas regides polares, onde as linhas de forca do campo geomagnético colocam-se perpendicular- ° ‘Temperatura (<) Fig. 4.17 Desenho esquemético das camadas que compéem @ aimosfero, ilustrondo a propagagao e reflexdio de ondas eletromagnéticas utlizados na radiocomunicacéo. A linha vermelha representa a variacdo de temperatura na Ozonosfera e na lonosfera. Fonte: A. Miller, 1972. 4.9 Por que o Campo Magnético é Variavel? O efeito da atividade solar é sentido pela mag- netosfera continuamente, sendo que o lado da Terra iluminado pelo Sol (lado dia) é 0 lado que sofre as, perturbacdes. O lado noite, em geral, nio é afeta- do. Dependendo da intensidade da atividade solar, faz-se a distinco entre dias magneticamente cal- mos e dias ativos ou perturbados (Fig. 4.18). A magnitude das variagées geomagnéticas regulares (dias calmos) é somente cerca de 1/1,000 da inten- sidade do campo geomagnético total. Em determinados dias, contudo, ocorrem grandes per- turbagdes equivalentes a varios graus na declinacio € a até 1.000 nT (1.000 G) ou mais em intensidade. Esses disturbios sio chamados de tempestades magnéticas. Fig. 4.18 Diagramas de variagéo da intensidade geomagnética ao longo de periodos de 24 horas durante dias magneticamente colmos (11/03/1979) e perturbados (1 e 8/03/1979}, conforme registrado no observatério mognético de Toolangi, Austria. 76 DeciFranoo a Terra Uma tempestade magnética ocorre em geral um dia apés o aparecimento das chamas solares, que siio emissdes luminosas de grandes proporgées da regiio mais externa do Sol (a cromosfera). Por ocasiio desses fendmenos, o Sol emite nao s6 radi- agio de onda visivel, mas também um fluxo corpuscular que viaja com velocidade de 1000 km/s ¢ atinge toda a Terra causando distirbios magnéti . As tempestades so freqiientes e podem ocorrer até varias vezes durante um mesmo més. Tém inicio repentino ¢ seus efeitos sio sentidos durante um dia ou varios dias, Uma vez que as tem: pestades causam interferéncia na comunicacio de radio, € interessante poder prever sua ocorréncia, Entretanto, os scus "sintomas" s6 so percebidos nas observagdes magnéticas pouco antes de acon: tecerem. co Uma tempestade pode ser acompanhada pelo aparecimento de um dos fendmenos luminosos mais intensos ¢ fascinantes no céu, que so as auro- ras boreais ou austrais nas regides polares norte ou sul, respectivamente, A aurora é causada pela emis. sio de luz da atmosfera superior numa forma parecida com uma descarga elétrica (Fig, 4.19) Aparece como uma cortina luminosa de cor esverdeada ou résea, com a borda inferior a cerca de 100 km de altura ea superior talvez a 1.000 km. fluxo de energia emitido por uma aurora intensa € apenas trés vezes menor do que o fluxo de ener- gia refletido pela Lua na fase cheia Fig. 4.19 Fotografia de uma aurora boreal Wer eta en Ls 4.1 Auroras e Outras Manifestagdes do Campo Geomagnético Um dos fenémenos naturis. mais espetaculares da Terra sio as auroras, que podem ser visas em noite cats em locas situados a alas latitudes, tanto no hemisfério norte como no sul. As auroras ocorrem na alta atmosfera (~100 km de altnade) ¢ sio causadas por particulas enengéticas, principalmente elétrons que sio guiados para dentro da atmosfera pelo campo magnético da ‘Tetra, Portanto, as estruturas observadas nas auroras so freqtientemente alinhadas com 0 campo geomagnético, As auroras podem ser muito ativas ¢ is vezes apresentam uma fase expan- siva em que se espalham por uma regio correspondente a varios graus de latitude no lado noite da Terra e dissipam cenergia a taxas compariveis com 0 consumo de energja clétrica dos Estados Unidos. A cor dominante das auroras €0 verde, mas outras cores podem ser vistis em periodos de alta atvidade. A cor verde deve-se a emissies de ‘energia por étomos de oxigénio e a cor vermelha que pode aparecer nas bordas, as emissdes de nitrogénio moleculat. PParticulas energéticas que nio sio conduzidas pelas linhas de forca do campo geomagnético as regides polares sio também aprisionadas por este campo e quando desaceleradas concentram-se em regides anelares ao redor da Terra, ‘com mais de 36,000 km de raio, chamnadas de Cinturdes de Van Allen. Quando esses cinturdes foram detectados, ba ‘cerca de 40 anos, acreditava-se que eram muito estiveis, sendo seus elétrons dissipados em periodos de meses. Pela rede de satéites, verficou-se, entretanto, que 0s elétrons podem ser acelerados pelas variacdes do campo geomagnético, até atingirem velocidades préximas as da luz. Nessas condigdes, os elétrons podem atravessar uma limina de aluminio com mais de um centimetro de espessura, Estagdes € Gnibus espaciais orbitam a cerca de 450 km da superficie da Terra estando, portanto, mergulhados nos ‘campos elétricos mais intensos dos cinturdes; seus equipamentos eletrdnicos podem estar sujeitos a interferéncias, devido a agio dos elétrons acelerados. Da mesma forma, os satéites de telecomunicagio estio sujcitos a essa interferéncia, que pode causar mau funcionamento de "pagers" e telefones celulares. Foi o que realmente aconteceu em maio de 1998, quando dez satéltes cientficos dos EUA receberam sinais de que os elétrons estavam acelerando 6 finalmente, em 19 de maio, o satéite Galaxy 4 sofreu pane ¢ 45 milhées de usuarios perderam 0 servigo de pagers". Os cientistas esperam que os Cinturdes de Van Allen tornem-se particularmente dinamicos no final do ano 2000, durante o periodo de mixima atividade solar, que iri produzir violentas tempestades solares, causando _ntensas emissdes de parsculas eléticas ¢ fortes tempestades geomagnética. Fonte: Space Science News, NASA, 08/12/98, 4.10 Mapas Magnéticos e Anomalias Magnéticas A distribuigio do campo geomagnético sobre a superficie da Terra é melhor observada em cartas isomagnéticas, isto é, mapas nos quais linhas unem pontos que correspondem a um mesmo valor de um, determinado parimetro magnético. Contornos de igual intensidade para qualquer com- ponente do campo sio chamados de linhas isodinamicas (Figs. 4.12 e 4.13). E importante obser- var que um fenémeno como 0 campo geomagnético mostre tio pouca relacio com as feicées piincipais da geologia © geografia. As linhas isomagnéticas cruzam continentes e oceanos sem distirbios e no mostram relagdes Sbvias com as grandes cadeias de montanhas, ou com as cadeias submarinas. Esse fato deixa claro que a origem do campo geomagnético necessariamen- te tem de ser profunda, O mapa da intensidade total do campo (Fig, 4.13) ‘mostra que 0 campo magnético terrestre é mais com- plicado que o campo que seria associado a um simples dipolo geocéntrico. Se 0 campo fosse exatamente um campo dipolar, as linhas de mesmo valor da intensi- dade total (Fig. 4.13) seriam linhas paralelas a0 equador magnético do dipolo (linha sobre a qual a inclinagio magnética é igual a zero), isto é, exceto perto dos po- los, elas seriam praticamente retas nesse mapa, Esta diferenga é chamada de campo nio-dipolar ou ano- malia geomagnética, Quando as cartas isomagnéticas sio construidas a partir de pesquisas mais pormenori- zadas, 0s contornos aparecem superpostos por campos localizados devido a fontes magnéticas na crosta da ‘Terra. Estas anomalias com segdes transversais de 1 a 100 km ou mais niio podem ser representadas num mapa de escala global (Fig. 4.20). Concentragio de minerais magnéticos em rochas ¢ algumas correntes elétricas fracas na crosta ou nos ocea- 78 DeEcIFRANDO A TERRA i 3 geeeg°eess oe v0 78 4782 W Fig. 4.20 Anomalia magnética de intensidade total gerado Por concentragio de minerais magnéticos em corpo igneo intrusivo na regiéo de Juquié, Estado de Sdo Paulo. Cortesio de W. Shukowsky. ‘nos sio as principais fontes responsiveis pelos cam- os localizados. Essas itregularidades de superficie ou anomalias magnéticas podem ter intensidades corres- pondentes a uma pequena porcentagem do campo normal mas, acima de jazidas de ferro ou depésitos magnéticos préximos a superficie, estas anomalias po- dem excedér 0 campo da Terra. F. na busca interpretacio dessas anomalias que se baseia 0 méto- do magnético em prospecsio geofisica. 4.11 O Mecanismo de Dinamo na Geragio do Campo Magnético Como visto até aqui, 0 campo magnético da Terra é razoavelmente bem representado por um dipolo mag- nético localizado em seu centro, Entretanto, cabe a pergunta ~ 0 que poderia causar esse magnetismo? A presenga de minerais permanentemente magnetizados nas, ‘camadas superficisis da Terra nfo é suficiente para expli- cara intensidade do campo geomagnético. Além do mais, esses minerais niio sio suficientemente méveis para ex- plicar as mudancas periddicas na direcio ¢ intensidade do campo. Desta forma, algum outro mecanismo ca- paz de gerar um campo magnético com as caracteristicas “observadas deve ser proposto. A anilise de ondas sismi- cas indica que pelo menos parte do niicleo da ‘Terra é fluido. Jé é universalmente aceito que o movimento des- se fluido metilico gera correntes elétricas que, por sua ‘vez, induzem campo magnético, Entretanto, discute-se ainda de que forma o fluido metilico flui no niicleo, que fonte de energia coloca o fluido em movimento ¢ como esse movimento dé origem a um campo magnético, Essas questées sio dificeis de responder porque o niicleo siio pode ser investigado diretamente ¢ as altas presses temperaturas li existentes sio dificeis de reproduzir em laboratério, Mas a combinacio de resultados tedricos experimentais jé permitiu estabelecer alguns fatos. (© niicleo consiste de uma esfera gigante, essencial- mente metilica, do tamanho aproximado do planeta Marte. Sob condigdes normais, o nticleo fluido conduz calor ¢ eletricidade até melhor que o cobre, ¢ tem prova- velmente a mesma viscosidade que a gua. Com um taio médio de 3.485 km, corresponde a cerca de 1/6 do volume da ‘Terra e a cerca de 1/3 de sua massa, A den- sidade do niicleo varia de, no minimo, 9 vezes a den: da agua nas suas bordas até 12 vezes a densidade da agua no seu centro, Os célculos de densidade combinados com as hipéteses acerca da origem do sistema solar su- .gefem que 0 niicleo é composto principalmente de ferro € niquel com tragos de elementos mais leves como en- xofie ¢ oxigénio. No seu interior, localiza-se um niicleo interno com propriedades diferentes. Tem um raio de 1.220 km, 0 que cottesponde a 2/3 do tamanho da Lua 6 a0 contririo do niicleo externo, é sélido. ‘A partir dessas informagGes, a tinica teoria vivel de geracio do campo magnético terrestre é aquela que trata © niicleo como uma espécie de dinamo auto-susten- tavel. Este modelo foi desenvolvido por volta de 1950 por Bullard ¢ Elsasser. Um dinamo é qualquer mecanis- mo que converte energia mecinica em energia elétrica, como aquele utilizado em centrais hidrelétricas. O dina- mo da Terra é auto-sustentivel porque, depois de haver sido disparado por um campo magnético que poderia ter sido muito fraco (como por exemplo o prdprio cam- po do sistema solar), continuou produzindo seu proprio campo sem suprimento de campo externo. O liquido metilico do niicleo terrestre, movendo-se de maneira apropriada (Fig, 4.21), agiria como um dinamo, necessi- tando apenas de um suprimento continuo de energia para ‘manter o material em movimento, ‘Uma das fontes de energia mais provaveis nesse caso seria a movimentagio do fluido causada pelo seu tesfiiamento, com a cristalizacao e fracionamento de fa- ses minerais densas,liberando energia potencial, Pode-se estabelecer assim um movimento de convecgio provo- cado por diferencas de temperatura e composi¢io do fluido, que devem ser mantidas para que o movimento niio cesse. O movimento de rotagio da Terra exerce uma forga no fluido do nticleo, chamada forga de Coriolis, que atua em qualquer massa que desereva um movimento de rotacio. Esta é a mesma forga responsa- eres vel pelos movimentos ciclénicos do ar ¢ das correntes marinhas. A r massa € acelerada em uma dire- co perpendicular ao seu movimento, fazendo com que, ‘no caso do fluido condutor do niiicleo, estabelegam-se espirais de ‘material condutor que vio gerar campo magnético com resultan- te aproximadamente paralela a0 eixo de rotagio da Terra. 4.12 O Magnetismo da Terra no Pas- sado Geolégico As observagées do campo magnético terrestre resumem- se a apenas alguns séculos, considerando-se ai aquelas mais rudimentares em que, por questées priticas de nave- gaclo, media-se a declinagao em rotas maritimas e portos visitados. Este € um intervalo de tempo muito curto em comparagio a hist6ria da Terra. Entio cabe perguntar: tera tido 0 campo magnético terrestre sempre 0 mesmo pa- drio que o atual? Tera sempre existido o magnetismo da Terra ou seré apenas transitorio? Questdes desse tipo puderam ser respondidas a partir de quando se verificou (meados do século XX) que a histéria magnética da Terra no se perde completamente, mas fica registrada como um mag- netismo fossil nas rochas. Alguns minerais que contém ferro, ao serem submetidos a um campo magnético, comportam-se como imis permanen- tes, isto é, esses minerais retém uma magnetizacio que é chamada remanescente, mesmo depois de cessada a agio do campo magnético. Substincias desse tipo so chamadas ferromagnéticas. Os prin- cipais minerais magnéticos presentes nas rochas sio os éxidos de ferro, como por exemplo, a magnetita (Fe,0,) ¢ a hematita (Fe,0,). Embora estejam presentes em pequena proporgiio (cerca de 1%), esses minerais sio, em geral, os responsiveis pelas propriedades magnéticas de uma rocha. A intensidade de magnetizacio das rochas é em ge- ral fraca mas, através de instrumentos sensiveis,¢ possivel determinar a direcio da magnetizagio remanescente € ene n nue) Zona de Auroras Manto sélido ‘Nicleo externo jacleo interno i Movimento do fluido Fig. 4.21 Movimento do fluido condutor do nicleo externo e geragéo do campo magnético dipolar, indicado pelas linhas de forga. Fonte: Jeanloz, 1983. tentar reconstruir 0 passadlo magnético da Terra, O estu- do sistemitico das rochas com essa finalidade é chamado de Paleomagnetismo. O mesmo principio do Paleomagnetismo pode ser aplicado a cerimicas e fornos arqueologicos este estudo recebe 0 nome de Arqueomagnetismo, Esses materiais ceriimicos sio particularmente apropriados para se determinar a inten- sidade do campo durante os tempos hist6ricos. Foi através do Arqueomagnetismo que se constataram as variagies de intensidade do campo da Terra. Os estudos paleomagnéticos indicam que a Terra tem tido um campo magnético significativo, pelo menos durante os tiltimos 2,7 bilhdes de anos. Entre- tanto, virias rochas apresentam magnetizacio inversa 4 esperada, isto é, compativel com um campo geomagnético de polaridade oposta a do campo atu- al, com linhas de forca que emergem do pélo norte ¢ convergem para o pélo sul. Acreditava-se, a principio, ‘que aquelas rochas teriam propriedades especiais, ad- quirindo magnetizagio contriria 4 do campo magnetizante. Porém, grande mimero de experiéncias mostrou que somente algumas poucas rochas apre- sentavam tal propriedade. Datagdes por métodos radiométricos, associadas a determinacées de polati- dade demonstram claramente que tem havido intervalos nos quais as rochas de todas as regides da lL ee ‘Terra adquitiram magnetizacio com polaridade igual 4 atual ¢, alternadamente, intervalos em que todas as rochas adquiriram polaridade oposta. Nos anos 60 foi estabelecida uma escala de reversdes (Fig, 4.22), agrupando-se os dados normais e reversos de virias regides da Terra numa seqiiéncia cronolégica, confir- mando conclusivamente a realidade das reverses. O campo geomagnético permanece em uma deter- minada polatidade durante intervalos variiveis de aproximadamente 10° a 10” anos, para comple- tar-se uma transicio de polaridade sio necessirios 10° a 10* anos. Fig. 4.22 Escala de inversées de poloridade ou reverses do compo geomagnético nos titimos 80 milhées de anos. Faixas escuras representam polaridade normal efaixas cloras, polari- dade inversa. A direita, detalhe da coluna, ressaltando épocas @ eventos de polaridade ocorridos nos titimos 4,5 milhdes de ‘anos @ que recebem nomes especiois. 4.13 A Histéria Gravada das Inversées de Polaridade Na época em que se iniciaram as pesquisas magné- ticas nas rochas da crosta ocenica, feitas pot navios oceanogrificos levando a bordo magnetémetros, re- velou-se um fato surpreendente, A nordeste do Oceano Pacifico, foi mapeado um padrio de anomalias mag- néticas lineares, diferente de qualquer padrio conhecido nos continentes. Esse padtio é formado por faixas de polaridades alternadas e dispostas sime- tricamente em relagio a cadeia meso-oceanica, como ilustrado na Fig, 4.23. Vine ¢ Mathews propuseram em 1963 que esse padrio "zebrado" era conseqiiéncia da expansio do assoalho oceinico ¢ das reversdes do campo geomag- nético, através de um processo representado esquematicamente na Fig. 4.23. O material fundido Fig. 4.23 Padréo "zebrado" de anomalias do assoalho oced- nico e sua relagdo com a tecténica de placos. one) do manto, ascendendo em correntes de conveccio atra- vés das cadeias oceinicas, esfria ao atingir a superficie terrestre, Os minerais ferromagnéticos (principalmen- te magnetita) cristalizados nese magma adquirem magnetizacio induzida pelo campo geomagnético. Essa magnetizagio seri permanentemente retida por cesses minerais quando atingirem temperaturas abaixo de um certo valor caracteristico. Essas temperaturas siio chamadas de temperaturas de Curie que, para a magnetita, é da ordem de 580°C. A nova rocha assim formada e jé magnetizada constitui-se num novo seg- mento do assoalho oceinico, que lentamente afasta-se da cadeia, enquanto por ela novo material ascende. Nesta fase, se 0 campo geomagnético inverteu a pola- ridade, surgird entiio uma nova faixa de assoalho, desta vez com polaridade invertida. Assim, surge, a longo prazo, 0 padtio zebrado simétrico cadeia, tal como foi observado. O assoalho oceinico comporta-se, portanto, como uma esteira rolante que grava a hist6- ria das reversGes do campo geomagnético tal qual uma fita magnética, a medida que vai se formando no tem- po geolégico. 4.14 Magnetismo das Rochas e a Deriva dos Continentes O paleomagnetismo nao s6 contribui para a reconstituigo da hist6ria do campo magnético da Terra, como também fornece informacdes quantitativas sobre 6s processos que afetam as camadas superficiais da ‘Ter- ra, revelados como grandes movimentos laterais dos continentes ou deriva continental. Nos anos 50, resulta- dos paleomagnéticos reavivaram o interesse nas sugestdes de que 05 continentes se moveram consideravelmente durante 0 tempo geol6gico. Alfred Wegener propds em 1910 que todos os continentes jé haviam estado agrupa- dos num tinico "supercontinente”, que ele chamou de Pangea. Ele sugetiu que esse supercontinente teria se desmembrado ha cerca de 200 milhdes de anos. Entre- tanto, suas idéias niio foram aceitas por muitos cientistas a discussio sobre a deriva continental ficou estagnada até que os resultados paleomagnéticos trouxeram novas cevidéncias, ‘A magnetizagio remanescente de rochas de mesma idade e magnetizadas simultaneamente pelo mesmo cam- po magnético deve indicar a mesma localizagio para os pélos magnéticos associados a esse campo indutor. En- ‘retanto, a magnetizagio de rochas antigas e de mesma ‘dade, provenientes de distintos continentes, indicam pé- los (pélos paleomagnéticos) diferentes (Fig, 4.24). cay Fig. 4.24 Correlagio entre o vetor magnetizagéo de uma rocha (seta), definido pelos dngulos de declinagéo {D) e in- clinagéo (I), obtido em um sitio (8), e @ posigéo do polo paleomagnético (P}. Sabendo-se que 0 campo geomagnético s6 pode ser representado por um tinieo dipolo magnético, isto é, existe apenas um par de pélos norte e sul situados préxi- mos aos pélos geogrificos, a existéncia de varios pélos no passado geolégico tem de ser descartada. A explica- cio para 0 fato esta baseada no deslocamento dos continentes que modifica a orientagio da magnetizacio registrada em suas rochas, em relagio a0 pélo geogrifi- co. Pélos paleomagnéticos de mesma idade e pertencentes a diferentes blocos continentais podem ser deslocados até que coincidam. Ao fazermos isso, os continentes de ‘onde foram extraidas as rochas analisadas também se deslocam, chegando-se a reconstrugdes paleogeogificas surpreendentes, tal como a ilustrada na Fig, 4.25 para a América do Sul e Africa. A maneira mais conveniente de se representarem dados paleomagnéticos para o estudo da deriva con- tinental é em termos da posicio de pélos paleomagnéticos. Pélos paleomagnéticos para perio- dos geolégicos consecutivos e, de um tinico continente, sio interligados para produzir-um caminho ou uma curva de deriva polar (Fig. 4.25). Torna-se aparente, quando se comparam as curvas para os vitios conti- nentes que, durante um longo intervalo de tempo, os continentes moveram-se conjuntamente e depois afas- taram-se. O grau de divergéncia entre duas cutvas de 82 DeciFRANDO A TERRA deriva polar é a medida do grau de separacio dos continentes. Uma relagio entre a inclinagio do vetor magnetizacio (1) e latitude paleogeogrifica (b) pode set facilmente obtida do modelo de dipolo geocéntrico, por trigonometria esfética tanl = tang (4) Com este dado € possivel avaliar quantitativamente a paleolatitude em que se encontrava uma determina da regido da ‘Terra. Por exemplo, os fildes de rochas igneas (diques) que cortam as praias de Ihéus € Olivenea, na regio sul do Estado da Bahia, apresen- tam magnetizacio cujo vetor coloca-se a ~66° de Fig. 4.25 Curvas de inelinagao em relacio ao plano horizontal. Utilizando- datos pelea parol: sea formula 4.11, calcula-se que a latitude em que se ica do Sul'e Afficn @ formaram essas rochas ha um bilhiio de anos era de reccstrocns: datene 48°, portanto muito mais elevada do que a atual (15°S), continentes, com a jus indicando que aquela regio era de clima frio. toposicgo de parte dessos curvas. Notor que entre 200 e 130 rmilhdes de anos alrés as Neste capitulo estudamos os campos de gravida- de © magnético da Terra, Vimos como estas importantes propriedades fisicas podem ser utilizadas, se comnegras che para se entender processos dinimicos que ocottem gir porque os dois em nosso planeta. Além disso, 0 mapeamento continentes migraram gravimétrico e magnético da superficie permite iden- independentemente. tificar anomalias que refletem estruturas das camadas ‘mais superficiais ou esto diretamente relacionadas com sitos minerais. Desta forma, méto- dos de investigagio baseados em gravimetria ¢ magnetometria constituem importantes ferramentas geofisicas voltadas & prospeccio de bens minerais. Leituras Recomendadas BUTLER, R. F. Palomagnetism: Magnetic Damains to Geologic Terranes. Oxford: Blackwell Scientific Publications, 1991. BROWN, G. C, & MUSSET, A. E. The Inaccessible Earth, London: George Allen & Unwin, 1985, FOWLER, C.M.R.The Solid Earth: An Introduction 10 Global Geaphysies. Cambridge: Cambridge University Press, 1992, JEANLOZ, R. The Earth's Core, Scientific American, v.249, 1983, LOWRIE, W. Fundamentals of Geophysics, Cambridge: Cambridge University Press, 1997. ‘TELFORD, W. M; GELDART, L. P; SHERIFF, R. Es KEYS, D. A. Applied Geophysics. Cambridge: Cambridge University Press, 1985.

You might also like