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‘Stuart Hall Aidentidade cultural na pés-modernidade ‘Tradugao ‘Tomaz Tadeu da Silva & Guacire Lopes Louro 12% edigdo ‘1 reimpressao H lamparina 1 Aidentidade em questéo visto como um sujeito unificado. A assim chamada “crise de 6 vista como parte de um processo mais amplo de mudanga, «que estédeslocanco as estruturas e processos centrais das sociedades ‘modernas e abalando os quadros de referéneia que davam aos individa- os uma ancoragem estével no mundo socal airmaséo, ver o que suas provaveis consequeé certas complexidades e abertas a contestagio. A opinio dentro da comunidade sociolégica ests ainda profundamente dividida quanto a esses assuntos. As tendéncias ‘Go demasiadamente recentes ¢ ambiguas. O préprio conesito com 0 ‘qual estamos lidando - identidade~ é demasiadamente complexo, mui- to pouco desenvolvido e muito pouco compreendido na ciéncia social contemporines para ser defintivamente posto prova, Como ocorre ‘com muitos outros fenémenos sovais, impossivel ofrecer afirmagBes conclusivas ou fazer julgamentos seguros sobre as alegagBes e propost- 10 ‘Stuart Ha «Ges tebrieas que estio sendo apresentadas. Deve-se ter isso em mente ao se lero restante do livro, Paraaqueles tedrieos que acreditam que as ide cstdo entrando em colapso, o argumento se desenvolve da seguinte forma: um tipo diferente de mudanga estrutural esté transformando identidades pessoais, abalando a ideia que temos de nds prprios como sujeitos integrados. Essa perda de um “sentido de si” estivel é chamada, algumas vezes, de deslocamento ou observa o eritieo cultural Kobena Me ‘toma uma questio quando esta em crise, quando algo que se supoe ‘como fixo, coerente e estivel 6 deslocado pela experiéncia da diivida e Aaiincerteza” (1990, p43) ss de mudanca, tomados em conjunto, representam ‘um processo de transformagao tao fundamental e abrangente que so- ‘mos compelidos a perguntar se nfo 6 propria modemidade que esta ‘sendo transformada. Este livro acrescenta uma nova dimensio aesse argumento: a afirmagao de que naquilo que éd ‘como nosso mundo pés-moderno, nés somos tambés idade— algo que, desde o Numinismo, se supde definiro proprio nicleo ou esséncin de nosso ser fundamentar nossa existéncia co ‘fim deexplorar essa afirmagio, devo examinar primei finigdes de identidade eo caréterda mudanga na modernidade tardia, 14 ‘Trés concep¢6es de identidade Para os propésitos desta exposigio, distinguirei trés concepedes muito diferentes de sujcito sociolbgico e(c) sujeito pés- to estava baseado numa concepeao da pessoa humana como um individuo totalmente centrado, unifica- do, dotado das eapacidades de razio, de consciénciae de ago, cujo ue emergia pela primeira vez se desenvolvia, ainda que perma- necendo essencialmente o mesmo ~ continuo ou “idéntico”a ele - ao ‘Aidentidade cultura na ps-modornidado " longo da existéneia do indi tidade de uma pessoa. Di ito sociolbgico refletia a crescente complexidade ‘do mundo moderno e a consciéneia de que esse niicleo interior do su- no era auténomo eautossuficiente, mas era formado na relagiio res” eas identidades que esses mundos oferecem, Aidentidade, nessa concepeio sociolégica, preenche o espago continuamente em relagio as formas pelas quais somos representados 2 ‘Stuart Hall plenamente unificada, - Ao invés disso, medida que os sistemas de signifieagio e elas se prestam como pontos de apoio para desenvolver o argumento central deste livro, 12 caréter da mudanga na modernidade tardia ‘Um outro aspecto desta questio da ide iter da mudanga na modernidade tardia; em particular, ao processo demmudanga conhecido como “globalizagio’, seu impacto sobre a ‘dentidade cultural. Em esséncia,o angumento é quea mudanga na modernidade tardia tem um earéter muito especifico, Como Marx disse sobre a modernidade, [é 0 permanente revolucionar da produgio,oabalar ininterrupto de todas as condigUes socinis, a incerteza eo movimento venerado e os simbolos sto valorizados porque c ‘experiéncia de geracdes. A tradig&o é um meio de lidar com o tempo © oespago, inserindo qualquer atividade ou esperiéneia particular ‘eperpetuam lade esté relacionado ao ca- de convivéncia com a mudanga répida, abrangente 6 uma forma altamente reflexiva de vida, na qual “as pr: sséo constantemente examinadas e reformadas & luz das| recebidas sobre aquelas préprias praticas, alterando, assim, constitu- tivamente, seu carater” 37-88), Giddens cita, em p: ; 0 ritmo eo aleance da mudanga ~"& ‘medida que éreas diferentes do globo sao postas em interconexio ‘umas com as outras, ondas formagiio social atingem virtual- ‘mente toda.a superficie da Terra” —e a natureva das instituigées mo- relagGes sociais dos contextos locais de interagio e sua reestruturagio a0 longo de escalas indefinidas de espaco-tempo” (ibid, p.21). Vere ‘mos todos esses temas mais adiante, Entretanto, o ponto geral que sgostaria de enfatizar 60 das descontinuidaces. ‘Os modos de vida colocados em aco pela modernidade nos livra- ram, de uma forma bastante inédita, de todos os tipos tradicio- nais de ordem social. Tanto em extensfo, quanto em intensidade, as transformagdes envolvidas na modernidade sfo mais profun- ddas do que a maioria das mudancas caracteristieas dos perfodos anteriores. No plano da extensio, elas serviram para estabelecer formas de interconexao social que cobrem o globo; em termos de intensidade, elas alteraram algunas das caracteristicas mais fnti- ‘mas e pessoais de nossa existéncia cotidiana .. (Giddens, 1990, p.20) David Harvey fala da modernidade como implicando no apenas “um rompimentoimpiedoso com to Laclau (1990) usa o conceito de “deslocame Tocada é aquela cujo centro é desloca “ Stuert Hall Aldentidade culturatna pos-modernidade ipio articulador ou organizador tinico e nao se desenvolvem de seor- mento de uma tinica “causa” ou “le”. A sociedade 9gos pensaram muitas vezes, um todo unificado e itado, uma totalidade, produzindo-se através de mudangas ‘evolucionarias a partir de si mesma, como o desenvolvimento de uma flor a partir de seu bulbo. Ela esté constantemente sendo “descentra- da" ou deslocada por forcas fora desi mesma, podiam ter preconceitos em relaclo a um juiz negro) prov: de igualdade de direitos, eos eleitores negros (que apoiam, lberais em questdes de raga apoiariam Thomas porque ele era ae Em sintese, o presidente: ” Durante as “audiénecias ‘Thomas foi acusado de assédi ler negra, Hill, uma ex-colega de Thomas. As audineias causaram um escénda- Jo piblicoe polarizaram a societiade americana, Alguns negros apoia- am Thomas, baseados na questi da raga; outros seopuseram a.ele, tomando como base a questao sexual. As mulheres negras estavam divididas, dependendo de qual “identidade” prevalecia: sua “identida- de" como negra ou sua *identidade” como mulher. Os homens negros ‘também estavam divididos, dependendo de qual fator prevalecia: seu sexismo ou seu liberalism: mens brancos estavam divididos, dependendo, nao apenas de sua politica, mas da forma como eles se identificavam com respeito ao ravismo e ao sexism. As mulheres conservadoras braneas apoiavam Thomas, no apenas com base em ‘mas também por causa de sua oposicao ao fe- as braneas, que frequentemente tinham posigées epg de dentidade muito diferente e muito mais perturbadora eproviséria do que as duas anteriores (ver seglo1.1, Giddens, Harvey e Laclan oferecem leituras um tanto diferentes, da natureza da mudanga do mundo pés-moderno, mas suas énfases nna descontinuidade, na fragmentagao, na ruptura eno deslocamen~ to contém uma linha comum. Devemos ter issoem mente quando discutirmos o impacto da mudanga contemporfinea conhecida como “globalizagio” suas consequéneias politicas. Consideremos os seguintes elementos: + _Asidentidades eram contraditérias. Eas se cruzavam ou se “des- locavam” mutuamente. + AscontradigGes atuavam tanto “fora”, na sociedade, atravessan- do grupos politicos ctabelecios, quant "dentro" dacabecade cada individwo. + _Nenhume identidade singular ~ por exempl, de classe socal ~ 13 (© que esta em jogo na questio das identidades? Até aqui, os argumentos parecem bastante abstratos. Para dar alguma ideia de como eles se aplicam a uma situa ‘vés da qual todos os variados inter des das pessoas possam ser recon + Deforma crescente, as paisager sio fraturadas dessa forma por id hou a indicagio de Clarence Thomas, um juiz negro de eas conservadoras. No julgamento de Bush, os eleitores brancos (que 6 ‘Stuart Hall advindas, especialmente, da erosdo da “identidade mestra” da classe eda emergéncia de novas identidades, pertencentes & nova base po- litica definida pelos novos movimentos sociais: 0 feminismo, as lutas ‘negras, os movimentos de libertagio nacional, os movimentos antinu- cleares ¢ ecologicos (Mercer, 1990). + Umavez quea identidade muda de acordo com a forma como osujeito ¢ interpelado ou representado, a identificagio nao ¢ automé- tica, mas pode ser ganhada ou perdida. Ela tornou-se politizada. 2 Nascimento e morte do sujeito moderno Neste capitulo, farei um esboco da descricio, feita por alguns tebri- os contemporiineos, das prineipais mudancas na forma pela qual 0 rntidade so coneeitualizaclos no pensamento modemno. Meu objetivo ¢ tragar os estgios através dos quais uma versio parti- ccalar do “sujeito humano” ~ com certas capacidades humanas fixas ¢ lum sentimento estavel de sua propria identidade e lugar na ordem das coisas ~ emergiv pela primeira vez na idadle moderna; como ele se tor- 10% Em seguida,olivro exploraré aquele aspecto da iden- tidade cultural moderna que éformado através do pertencimentoa ‘uma cultura nacional e como os processos de mudanga ~ uma mudan- ‘ca que efetua um desloeamento - compreendidos no conceito de “glo- Dalizagllo” esto afetando isso. inificadas e coerentes e que agora se tornar

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