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Modelos psicoldgicos explicativos do crime -— Qbjetivos de aprendizagem Ao final deste texto, vocé deve apresentar os seguintes aprendizados: _Distinguir o modelo psicanalitico do modelo psi 1 Relacionar criminologia e psicopatologias, ™ Caracterizar oligofrenias, transtornos organicas, esquizofrenia e patoldgico. tran ito com © ordenamento pena storno de humor em individuos em situages de con Introdugao ——_________.. Neste capitulo, vocé vai estudar os modelos psicolégicos explicativos do crime a partir da distingao entre o madelo psicanalitica e o madelo psicapatolégica. Vocé vai conhecer possi eas psicopatologias. Adicionalmente, vai ver caracteristicas de doencas que servem como instrumentos de andlise dos individuos em situagdes is relac6es entre a crimin de conflito com o ordenamento penal al ver, a psicopatologia, de forma geral, se inclina & o de uma perspectiva clinica, contemplando a conduta delitiva como expresséo de um transtorno patolégico da personalidade. A psicologia, por sua vez, estuda 0 comportamento humano, a conduta. Para a psi- cologia, interessa 0 comportamento delitivo tanto como qualquer outro comportamento humano. A psicanélise, por sua vez, concebe o crime como um comportamento funcional simbdlico, expresso de conflitos psiquices profundos. Como vo jo- Modelo psicanalitico e modelo psicopatolégico A criminologia utiliza diversas outras reas da ciéncia para criar seus con- ceitos. Para vocé compreender melhor os modelos psicoldgicos explicativos do crime, vai estuda-los a partir de dois tipos: 0 modelo psicanalitico ¢ 0 modelo psicopatolégico (RIFF, 2003). A psicopatologia é a érea do conhecimento que estuda o sofrimento mental, ou seja, as manifestagdes psiquicas patolégicas do individuo. A andlise etimoldgica da palvra psicopatologia nos auxilia nesta compreensio, veja: psicopatologia (psico, de psiquico, psiqué; pato, de sofrimento; logia, de conhecimento). Em suma, trata-se da area do conhecimento com foco no sofrimento (causado por excessos ou supressdes) de nossos processos psiquicos (MAGTAZ et al., 2012; JASPERS, 1987; HOUZEL et al., 2004). Para a psicopatologia, sob uma visao clinica, a conduta delitiva é a tradugdo de um transtorno patolégico da personalidade. Ja a psicologia entende que 0 comportamento humano é 0 cerne a ser estudado. Ela procura explicar como se adota determinada conduta levando em consideragiio os fatores ¢ varidiveis mais importantes (RIFF, 2003). Para a psicanalise, o crime é um comportamento funcional simbélico, é a expresso de conflitos psiquicos profundos, de desequilibrios da personali- dade que s6 podem ser revelados introspectivamente, partindo do individuo. A psicandlise pode ser considerada a ligagao entre a psiquiatria moderna ¢ a psicologia (RIFF, 2003). A psiquiatria em interface com a psicopatologia, dentre outros, pode nos auxiliar a caracterizar o trasnstorno mental e suas manifestacdes. Os conceitos criados com o apoio da psiquiatria serio elaborados a partir da checagem das diversas categorias patoligicas (psicopatia, neurose, esquizofrenia, etc.) ¢ das manifestagdes delitivas. A psicologia averigua a estrutura, 0 cerne € 0 desenvolvimento da conduta criminal, bem como estuda todos os fatores & variaveis envolvidos nessa conduta. Na psicanalise, se estuda a estrutura psicodinamica da personalidade, englobando os seus conflitos e frustragdes, 0 processo de motivagaio do delin- qlente e a propria interpretagio da conduta delitiva, partindo do inconsciente do individuo, de uma analise introspectiva (RIFF, 2003). Nao ha consenso de teorias dentro da psicandlise, tampouco metodologias inicas. O modelo psicanalitico caracteriza-se, frente aos outros modelos, por trazer alguns elementos muito especificos, como os que vocé pode ver a seguir: = & um modelo psicodindmico, que corresponde a um poderoso deter- minismo biol6gico; | concede particular importancia ao instinto sexual, substrato fundamental e referéncia obrigatéria do comportamento de todo individuo; Modelos psicoldgicas explicativas do crime } | 167 sua teoria psicossexual distingue varias etapas no desenvolvimento da libido, que determinam o psiquismo ¢ a personalidade do individuo (oral, anal, genital, ete.); a divisfo topografica do psiquismo (consciente, pré-consciente ¢ in- consciente) ressalta a transcendéncia etiolégica e interpretativa desta liltima, atribuindo a conduta “consciente” um significado simbélico, como mero reflexo do inconsciente (RIFF, 2003). No modelo psicanalitico, hd trés instancias mentais, conhecidas como id, ego ¢ superego, que integram o aparato intrapsiquico. Freud, médico e neurologista, foi o criador da psicanilise. O estudioso “[...] empregou a palavra ‘aparelho’ para definir uma organizagao psiquica dividida em sistemas, ou instancias psiquicas”, ..] com fungdes es- , cada uma delas “ pecificas, que estdo interligadas entre (LIMA, 2010, p. 280). , ocupando certo lugar na mente” Id O id foi “[..] concebido por Freud como um conjunto de contetidos de natureza pulsional” (LIMA, 2010, p. 280). Ele perfaz o polo psicobiolégico da perso- nalidade, em que ocorrem os processos primitives do pensamento humano e as caracteristicas atribuidas ao sistema inconsciente de cada um. O id é regido pelo principio do prazer e apresenta esséncia orgnica/hereditaria, estando muito ligado ao impuls apresenta como instintos que impulsionam o organismo, mantendo relaco com todos os impulsos no do tipo animal. O id, assim, poderia ser compreendido como a vor que ecoa dentro da cabeca dos homens e mulheres: é a expresso do querer humano. sexual. O id s civilizad Ego O termo ego € latino (“cu”) ¢ essa instancia atuaré de acordo com o principio da realidade, estabelecendo um equilibrio entre as reivindicagdes/manifestagoes do id c as exigéncias impressas pelo superego com relagao ao mundo externo. O ego esta na zona consciente da mente. Enquanto o id ¢ o superego sao as vozes antagénicas que as pessoas ouvem em sua mente, o ego é o responsavel pela tomada de decisties consciente. Superego O superego é a forga que atuara contra o id, representando os pensamentos morais ¢ éticos tidos como civilizados. £ originado do complexo de Edipo, a partir da internalizagao das proibigées, dos limites ¢ da autoridade. O superego serd o indicativo das normas e valores sociais a serem respeitados, que foram transmitidos pelos pais por meio do sistema de castigos e recompensas imposto a seus filhos. O superego ¢ a voz interna que alerta para nao fazer algo pois nio sera certo. O superego é 0 dever. E 0 equilibrio entre essas trés instncias que garante a estabilidade mental do individuo, s O marco psicopatolégico enquadra-se em conflitos infantis que se manifestam durante a vida adulta por meio de processos inconscientes, raz3o pela qual ndo que a sua desordem gera diversas patologias, como a neurose. © tinico método que permite captar a dindmica ¢ © significado simbélico do comportamento humano € 0 introspectivo (RIFF, 2003). Nesse método, esto presentes as trés etapas de um processo dinamico: 1. Eo conflito mental, que se produziria entre a estrutura primaria do individuo — libido — e a expectativa de conformidade a comunidade, ou entre os trés niveis do seu sistema intrapsiquico; 2. Envolve 0 ego, 0 id e o superego, que reprimem no inconsciente os im- pulsos e complexos do individuo: estes emergem ao mundo consciente, vencendo o obstaculo do censor que Thes prendia ali, de sorte que todos 08 atos humanos, incluindo os delitivos, so respostas substitu ou simbélicas que direta ou indiretamente expressam a realidade do inconsciente; 3. Diz respeito ao complexo de Edipo, que tem um poderoso efeito crimindgeno, conforme a teoria psicanalitica, por gerar (quando nao é superado) um complexo de culpa no sujeito cujo componente autopunitivo leva ao delito: precede e motiva o delito, em lugar de suceder-Ihe (RIFF, 2003). Além disso, hd o pensamento psicanalitico “ortodoxo”, representado pelas ideias de Freud (1856-1939). E dele a contraposi¢ao entre dois instintos basicos no homem: o da vida (eros), fortemente focado em sua acepgao sexual, € 0 da morte ou destruigio (thanatos), que permite associar as raizes iiltimas do comportamento delitivo 4 referida forga destruidora inata (RIFF, 2003). Madelos psicalégicos explicativas de crime | ( 169 © complexo de Edipo tem particular importéncia na teoria freudiana, pois muitos atos delitivos, segundo Freud, tém sua explicacdo naquele complexo, que, longe de suceder, precede e impulsiona o cometimento do delito e teria sua origem na vivéncia da crianca. Criminologia e psicopatologias opatologias so um campo fértil para a criminologia. Na medicina legal, hd a psicopatologia criminal ou psicopatologia forense, estudada pela psiquiatria criminal e pela psicologia criminal. ‘A psicologia criminal tem por objeto de estudo a personalidade “normal” e todos os fatores que a influenciam, de ordem biolégica, mesolégica (meio ambiente) ou social. Ja a psiquiatria criminal tem como objeto os transtornos anormais da personalidade, isto é, as doengas mentais, retardos mentais (oli gofrenias), deméncias, esquizofrenias ¢ outros transtornos, de indole psiestica ou nao (PENTEADO FILHO, 2012). ‘A psicopatologia, “enquanto experiéncia hibrida de saber, disciplina e experiéncia [pratica]” partilha sistemas de identificagao de sinais, sintomas e diagnésticos entre a “psicologia, a psiquiatria e a psicanlise” (DUNKER, NETO, 2011, p. 2). Na criminologia, a psiquiatria é a ciéncia que traz 0 conceito de enfermidade ou transtorno mental, bem como as suas maneiras de manifestagaio. Cabe a essa ciéncia trazer para a criminologia os concei- tos de psicopatia, neurose ¢ esquizofrenia ¢ adequa-los as manifestagdes delitivas. ‘Na criminologia, existem as teorias psiquidtricas da criminalidade, que, a partir do século XIX, tragaram uma distingio entre os delinquentes © os enfermos mentais, porém até essa época os enfermos mentais cram tratados como qualquer enfermo, O delinquent era tratado, primitivamente, como ser endemoninhado, anormal ¢ maldito. O positivismo criminolégico substituiu a teoria da “loucura mental” pela da “personalidade criminal”, sendo que esta estabelece a existéncia de um conjunto de caracteristicas ou de uma estrutura psicolégica delitiva (PENTEADO FILHO, 2012). A teoria da personalidade criminal possui dois postulados: 170 Modelos psicolégicos explicativos do crime ™ o principio da diversidade do delinquente; ™ anecessidade de isolar, mensurar e quantificar os fatores patolégicos que incidem no individuo e que determinam o delito, Ao verificar possiveis conexdes entre transtornos ou anomalias psiquicas e crime, a psicopatia obteve papel fundamental, apesar de sua delimitagao nao estimular consenso algum. Isso ocorre pois nao existe um psicopata comum ou dois psicopatas iguais, 0 que tem relacéo com o niimero das personalidades psicopiticas, a etiologia diversificada e a complexidade do problema (PENTEADO FILHO, 2012). A psicanilise, no modelo psicodinamico, estabelece fatores que contri- buem para o comportamento delitivo, chamados de forgas motivacionais, tendéncias e impulsos, que esto abaixo do nivel de consciéncia. Para a psicandlise, a criminologia pode se utilizar do estudo que afirma que no proprio individuo estdo enraizadas as fontes do delito, de modo que esse delito s6 pode ser investigado por meio do método introspective (PENTEADO FILHO, 2012). Patologias comuns em situacées de conflito com o ordenamento penal Agora que vocé ja estudou os modelos psicolégicos explicativos do crime, € importante que conhega algumas patologias, tais como: oligofrenias, trans- tornos organicos, esquizofrenia e transtorno de humor (PENTEADO FILHO, 2012). Veja mais detalhes de cada patologia a seguir. Oligofrenias Oligofrenia é uma palavra de origem grega. Oligos significa “pouco” e phren sgnifica “espirito”. Assim, oligofrenia remete aos niveis de fraqueza mental. A debilidade mental foi batizada de oligofrenia leve, a imbecilidade, de oligofrenia moderada, e a idiotia, de oligofrenia grave (SANCHES; BERLINCK, 2010) No que tange & “[..] relevancia criminolégica do retardamento mental, [.] © déficit congénito ou precoce do desenvolvimento da inteligéncia depende de sua maior ou menor gravidade” (MOLINA; GOMES, 2008, p. 254). E importante considerar, ainda, que o retardamento mental em grau profundo pode diminuir a capacidade real de delinquir. Madelos psicalégicos explicativas do crime J [ 171 OS Transtornos orga Na Classificagio Internacional de Doencas (CID-10), a expressio transtornos mentais orgdnicos é usada para delimitar diferentes transtornos mentais unifi- cados por uma etiologia comum — doenga ou lesfo cerebral que gera disfungao (PENTEADO FILHO, 2012). As disfungdes podem ser primérias ou secunda- rias, Nas disfunges primarias, as doengas, as lesdes ¢ os comprometimentos afetam o cérebro de maneira direta e seletiva. JA nas disfungées secundarias, as doengas ¢ os transtornos sistémicos acometem o cérebro apenas como um dos mitltiplos érgaos ou sistemas organicos envolvidos. Observe, a seguir, a descrigo dos principais transtornos orginicos, conforme Penteado Filho (2012). | Transtorno paranoide: predomina a desconfianga, a sensibilidade excess a contrariedades ¢ 0 sentimento de estar sempre sendo pre- judicado pelos outros; atitudes de autorreferéncia. | Transtorno esquizoide: predomina o desapego, ocorre desinteresse pelo contato social, retraimento afetivo, dificuldade em experimentar prazer; tendéncia a introspeccao. | Transtorno antisocial: prevalcce a indiferenga pelos sentimentos alheios, podendo o sujeito adotar comportamento cruel; desprezo por normas e obrigagées; dissimulagao, baixa tolerncia a frustragdo e baixo limiar para descarga de atos violentos. | Transtorno emocionalmente instavel: marcado por manifestagdes impulsivas e imprevisiveis. Apresenta dois subtipos: = impulsivo — caracterizado pela instabilidade emocional e pela falta de controle dos impulsos; = borderline —além de instabilidade emocional, o sujeito revela per- turbagdes da autoimagem, com dificuldade em definir as preferéncias pessoais € consequente sentimento de vazio (observe a Figura 1). | Transtorno histriénico: prevalece o egocentrismo, a baixa tolerancia a frustragbes, a teatralidade e a superficialidade. Impera a necessidade de fazer com que todos dirijam a atengdo para a pessoa. = Transtorno anancastico: prevalece a preocupagio com detalhes, a rigidez ¢ a teimosia. Existem pensamentos repetitivos intrusi- vos que nao alcangam, no entanto, a gravidade de um transtorno obsessivo-compulsivo. | Transtorno ansioso (ou esquivo): prevalece a sensibilidade excessiva a criticas; sentimentos persistentes de tensio e apreensio, com tendéncia ao re- traimento social por inseguranga de sua capacidade social e/ou profissional. 172] [ Modelos psicolégicos explicativos do crime © Transtorno dependente: prevalece a astenia do comportamento, a caréncia de determinagio e de iniciativa, bem como a instabilidade de propésitos (PENTEADO FILHO, 2012). Sensagao de vazio interior e solidao. Medo de ser abandonado pelos amigos, familiar e pessoa amada. Inritabilidade, ansiedade, raiva, desespero e panico. Alteracao do humor ao longo do dia (euforia e tristeza). Impulsividade e dependéncia por jogos, . ‘Acesso em: 7 jun. 2018. DUNKER, C. LL; KYRILLOS NETO, FA psicopatolagia no limiar entre psicandlise e a psiquiatria: estudo comparativo sobre o DSM. Vincul, v.8, n.2, p. 1-15, 2011. ESTUDO da USP: pesquisa encontra relacao entre transtorno de borderline & adicgao. Wo Estelar, mar. 2017, Disponivel em: . Acesso em: 7 jun. 2018. HOUZEL, D; EMMANUELLI, M; MOGGIO, F. Diciondrio de psicopatologia da crianga e do adolescente.| ishoa: Climepsi Editores, 2004 JASPERS, K. Psicopatotogia geral Rio de Janeiro: Atheneu,1987. LIMA, A. ide, © modelo estrutural de Freud ¢ 0 cérebro: uma proposta de integragao en- trea psicanalise ea neurofisiologia, Revista de Psiquiatria Clinica, v.37, 9.6, 2010. Disponi= velem: . Acesso em: 7 jun, 2018,

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