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POLITICAS SOCIAIS E EXCLUSAO EM PORTUGAL Eduardo Vitor Rodrigues, Florbela Samagaio, Hélder Ferreira, Maria Manuela Mendes e Susana Janudrio Resumo As sociedades esta associada a produgao e a reprodugdo de desigualdades sociais, que contribuem para o surgimento de processos e fendmenos de pobreza e de exclusao social. O estado promove respostas que se constituem em medidas de caracier politico e que, num sentido alargado, tém © objectivo de promover a proteccdo social. Neste artigo analisaremos a evolugao das politicas sociais em Portugal. Num primeiro momento, procederemos a uma contextualizagao da produgio de medidas de proteccio social no nosso pais, onde se evidencia a evolucdo hist6rica do sistema de seguranga social. Apresenta-se a anélise das politicas sociais segmentadas em grandes areas — Seguranga Social, Emprego e Educacao — implementadas entre 1986 e 1997. Em cada uma das éreas coexistem duas estratégias analitico-expositivas: a reflexdo sobre os principais diplornas estruturantes, nomeadamente os anteriores a 1986, eaandlise da legislacZo promuigada entre 1986-1997, que da conta das principais tendéncias verificadas em cada uma dessas areas. Palavras-chave Politicas sociais, exclus&o social, estado-providéncia. As politicas sociais em Portugal: contextualizagdo e evolugao (1966-1997} As politicas sociais visam responder a situacdes de desigualdade social, na suama- ioria relacionadas com fendmenos de pobreza e de exclusao social, o que nos reme- mnvariavelmente para um enterdimento alargado de proteccdo social. Esta tenta promover, por um iado, um conjunto de mecanismos (ou servigos) que visem es- sencialmente a previdéncia e, por outro, um coniunto de accdes de cardcter mai cial ou assistencial, isto ¢, que respondam as situages de caréncia e ne existentes. A protecc&o social deve ser entendida, ainda, como um comsromisso social geral, de forma a que as necessidades colectivas dos membros de uma soci dade sejam garantidas (Rodrigues, 1995). Para analisar as formas de proteccao social ao longo do tempo € necessario efectuar uma incursao pela evolucao da propria seguranga social, até porque, para além desta ser um sistema que assegura a protecgao em relagao aos riscos, “conti- nua a ser 0 elemento fundamental dos sistemas de proteccao social” (Rodrigues, 1995: 8). As politicas sociais em Portugal e as preocupagées com a protecgao social registaram um percurso evolutivo, o qual pode ser dividide em varios momen- tos, que correspondem a determinados periodos historico-politicos especificos SOCIOLOGIA, PROBLEMAS F PRATICAS, n.°31, 1999, pp. 39-67 40 Eduendo Vitor Rodrigues, Florbela Samagalo, Helder Ferreira, Maria Manuela Mendes e Susana Januécio (Guibentif, 1996). Salientam-se dois perfodos historicos, divididos por um marco fundamental: a Revolucdo de 25 de Abril de 1974, No perfodo anterior a 1974, sobressaem as politicas sociais desenvolvidas nos tiltimos anos do Estado Novo; a partir de 1974, evidencia-se a importancia da transigao democratica e, mais tarde, a adesdo 4 Comunidade Econémica Europeia, com impactes no do- minio da proteccao social. Aolongo deste século, 0 papel do estadonos assuntos sociais ampliou-se pro- gressivamente, embora de forma ténue (Guibentif, 1996), passandode um papel de controlo ou supervisao das actividades de organizagGes privadas (que maioritaria- mente tém a sua origem no século XIX, comas mutualidades e as instituicées religi- osas de caridade), no inicio do século, para paulatinamente assumir um papel activo. Assim sendo, criaram-se estruturas politico-institucionais de cobertura so- cial posteriormente reformadas,? das quais se evidencia a criagao dos seguros so ais obrigatérios (em 1919) e a sua consolidag&o (com o Estado Novo) num sistema de base corporativa, © que evoluiu para a criagao de varias instituigdes de previ-~ déncia (1935).’ Os anos 60 constituem um contexto social enquadrador da reforma do sistema de proteccao social, marcando o inicio das grandes transformagées soci- ais que hoje estao consolidadas em Portugal. So os factos e transformagées ocorridos a partir deste momento que nos per- mitem uma real e sucessiva aproximacao a outros paises da Europa: a crescente in- dustrializag&o, a par de um acelerado desenvolvimento do sector terciario; a diminuicéo da importancia do sector agricola, bem como da populac&o rural; a acentuagao das migra¢Ges interior-litoral, que se concretiza num desenvolvimento dualista, traduzido nos fendmenos de litoralizag&o e de urbanizacao; a transic¢ao politica para a democracia e para um sistema econdmico de mercado aberto; a rees- truturacdo do mercado de trabalho, bem como uma recomposic¢4o socioprofissio- nal, consubstanciada fundamentalmente na insercéo das mulheres; o inicio da recomposi¢ao da estrutura de classes sociais, com o aumento das classes médias, bem como a elevacao das aspiragées sociais e culturais, com traducao directa aoni- vel do consumo e das presses em relacao ao sistema de ensino (ibidem). Ainda neste breve contexto, importa destacar o surgimento de mecanismos proprios dos designados estados-providéncia.’ A sistematizacao e reorganizacao sucessiva de varias politicas que enquadram o “social” torna-se evidente. A de- monstr4-lo est a criacdo de servicos puiblicos de educa¢ao, satide e seguranga soci- al (Almeida e¢ al, 1994; Barreto, 1997). Assim, a Lei n.° 2115, de 18 de Junho de 1962 inicia 0 verdadeiro papel inter- ventor do estado na previdéncia social (Guibentif, 1996; Carreira, 1996). Esta lei en- quadra, na generalidade, uma nova gestao dos beneficios e prestacdes do sistema de previdéncia, bem como um novo modelo de financiamento. Sendo esta a prime- ira grande lei de reforma do sistema, permitia 0 alargamento das eventualidades cobertas (até aqui incipientes e desiguais devido ao sistema corporativo e ao privi- lgio do trabalhador industrial e por conta de outrem)2 Agestao da proteccao social passa a basear-se em quatro tipos de instituigdes: as caixas sindicais de previdéncia (comércio, indtistria e servigos) ¢ as casas de pes- cadores; as caixas de reforma ou de previdéncia (de inscrigdo obrigatéria, POLITICAS SOCTAIS E EXCLUSAO EM PORTUGAL AL destinadas a trabalhadores por conta propria); as associagées de socorros mtituos (definidas como instituigdes de previdéncia de inscric&o facultativa, com fins de auxilio rigoroso) e as instituigdes de previdéncia destinadas ao funcionalismo pt- blico, civil ou militar e demais pessoas ao servico do estado e dos corpos adminis- trativos (compreende a Caixa Geral de Aposentacées e 0 Montepio dos Servidores do Estado). As caixas de previdéncia e abono de familia passam a ser organizadas com base na divisao distrital, abrangendo trabalhadores de todas as profissdes e actividades econémicas. As caixas de previdéncia, em particular, competia admi- nistrar as prestagdes imediatas da doenga, maternidade, desemprego e abono de familia. Ainda em 1962, surgem as caixas de seguros, sob a forma de um tinico orga- nismo — a Caixa Nacional de Seguros e Doengas Profissionais. As suas competén- cias incidiam na cobertura de riscos cuja inclusfo nas outras caixas nao fosse considerada. Em 1965, 6 criada a Caixa Nacional de Pensées, com 0 objectivo de assegurar a atribuiggo das prestagdes de invalidez, velhice e morte aos beneficidrios e familiares. Nesta década, nota-se a influéncia dos principios que estruturam os regimes de seguranga social europeus e as convencées da Organizacdo Internacional do Trabalho (Comissao do Livro Branco da Seguranga Social, 1997: 6). Surge inicio de uma consciencializacao da relacao entre previdénciae satide (Guibentif, 1996). As politicas sociais comegam a ser compreendidas nos seus vari- os sectores e de forma inter-relacionada. Embora as grandes lacunas ficassem por colmatar, nomeadamente a protecc4o dos trabalhadores agricolas e independentes (Carreira, 1996), a reforma de 1962 assume um caracter estrutural significativo na evoluc&o da seguranca social em Portugal (Guibentif, 1996). Acontinuidade desta reforma da-se durante os tiltimos anos do Estado Novo, com ochamado “estado social” de Marcelo Caetano. Alias, antes disso, é nos finais dos anos 60 que algumas das lacunas do sistema serao ultrapassadas, em especial com o alargamento das coberturas no que respeita 4 maternidade e ao desemprego involuntério, a protec¢ao dos trabalhadores rurais e protecc4o no ambito de do- engas profissionais. As reformas ocorridas neste perfodo aconteceram predomi- nantemente ao nivel dos beneficios e nao propriamente ao nivel das estruturas, nomeadamente as politico-institucionais e estatais, que continuavam desenhadas em torno do Estado Novo corporativo (Guibentif, 1996). Se ao nivel da previdéncia o sistema sofreu alteracdes no que diz respeito as prestagdes e beneficios, ao nivel da assisténcia e da satide as transformag6es foram estruturais. Foi promovida a reorganizagao do Ministério da Satide e Assisténcia e a unificacZo dos varios institutos dependentes desta tutela num tinico, o Instituto da Familia e Accao Social (Guibentif, 1996). As reformas dos anos 60 foram ainda oculminar de passos, iniciados em 1935, nosentido de delimitara lista das principais eventualidades cobertas pela seguran- ca social em Portugal (Carreira, 1996). A consolidacao destas reformas ocorreu ain- da antes da Revolugao do 25 de Abril de 1974, com uma ampliagao das vantagens atribuidas aos beneficiarios da previdéncia social. Realga-se a aprovacao das bases 42. Eduardo Vitor Rodrigues, Flosbela Samagaio, Helder Ferreira, Maria Manuela Mendes ¢ Susana Janvétio de reorganizacao das casas do povo e dos regimes de previdéncia rural; a extensao do ambito pessoal e material dos regimes de protecc4o dos trabalhadores rurais e equiparados; a revisao do esquema de proteccao dos pescadores com vista @ sua posterior integracdo no regime geral de previdéncia; a criagao de um esquema de proteccao para os trabalhadores do servico doméstico; a integracao de varios gru- pos de trabalhadores auténomos de fracos recursos econdémicos nas caixas sindica- is de previdéncia; a criagdo de uma Caixa Geral de Seguranga Social dos trabalhadores migrantes, com fim de assegurar a aplicacao das convenc6es inter- nacionais sobre a seguranga social; a integracao da pensao de sobrevivéncia no es- quema normal de beneficios da Caixa Nacional de PensGes e nas caixas sindicais de previdéncia e de reforma; a publicagao da nova lei-quadro da protec¢ao social nos acidentes de trabalho e doengas profissionais; a redu¢ao dos prazos de garantia das pensdes de invalidez e velhice para trés anos de inscrigao e 24 meses com a entrada de contribuigdes (passando o valor das pensdesa ser calculado a partir dos melho- res cinco dos tiltimos dez anos de contribuigées) e, por tiltimo, a eliminacao do limi- te superior de remunerac6es sobre o qual incidiam as contribuigdes. perfodo politico que se inaugurou em Abril de 1974 constitui o segundo grande momento historico a salientar. A institucionalizagao da democracia culmi- nou num conjunto de transformacées politicas, parte das quais ja tinham sido inici- adas na década de 60 (Barreto, 1997). A democracia consolida-se a par de uma tentativa de aproximagao aos paises europeus mais desenvolvidos. Esta aproxima- ao evidenciaas insuficiéncias e os dualismos estruturais de um processo de desen- volvimento intermédio que caracteriza a sociedade portuguesa. Assim, importa reter a evolucao das politicas sociais a partir de 1974, Os pri- meiros governos provisérios confrontaram-se com a necessidade de introduzir medidas no campo social, com 0 objectivo de promoverem a mudanga politica e le- gitimar um discurso de justica social (Guibentif, 1985 e 1996). As reformas imedia- tas mais importantes est&o relacionadas com o sistema de assisténcia ao desemprego e a criacao da pensao social. Das medidas implementadas, destacam-se a criaco do salario minimo na- cional, o aumento do abono de familia, o aumento da pensao minima (definin- do-se que esta nao podera ser menor que 50% do salario minimo) e a criagao da pensdo social. Ao contrario da reforma dos anos 60, as mudangas operadas ao nivel social apés 0 25 de Abril foram de cardcter estrutural, levando ao desmantelamento das estruturas administrativas do anterior regime (a organizacao corporativa)®e a reor- ganizagao da assisténcia ao nivel dos cuidados medicamentosos — um primeiro momento da criag&o do Servigo Nacional de Satide. Antes da promulgacao da Constituigado de 1976, outras medidas foram avan- cadas pelos governos provisérios: a instituicéo de um subsidio de Natal aos pensi- onistas; a criagéo de alguma protecg4o no desemprego, com cardcter assistencialista e nao integrada no regime geral de seguranga social; a criagdo do suplemento de grande invalidez; o alargamento do Ambito pessoal e a extensdo das prestag6es de maternidade, subsidio por morte e pensao de sobrevivéncia do regi- me especial dos trabalhadores agricolas. POLITICAS SOCIAIS E EXCLUSAO EM PORTUGAL 43 A Constituicao da Republica de 1976 reconhece novos direitos, tais como os direitos 4 seguranca social e A proteccdo social (artigos 63.° e 64.°, respectivamente), conferindo ainda ao estado a organiza¢ao, co-organizagao e financiamento de um sistema de seguranca social unificado ea descentralizacao e a promogao de um ser- vico de satide universal, livre e nacional (Guibentif, 1996).” A Constituicao reconhece ainda o direito de participagao das associacées sin- dicais e outras organizacOes representativas das classes trabalhadoras na imple- mentagio das medidas de seguranca social e destaca o papel das instituicées particulares de solidariedade social (IPSS), regulamentadas por lei e sujeitas a fis- calizagao do Estado. Por outro lado, consagram-se, como objectivos da seguranga social, a protec- dona doenca, no desemprego, na velhice, na invalidez, na viuvez,na orfandade e noutras situacdes de falta ou diminuicdo de meios de subsisténcia ou de capacida- de para o trabalho. Podemos afirmar que s6a partir de 1974 é que um verdadeiro regime de segu- ranga social come¢ou a ser efectivamente implementado em Portugal, porque até entdo vigorava uma estrutura corporativa de previdéncia baseada nos seguros so- ciais obrigatorios (Carreira, 1996). Os anos 80 caracterizam-se por uma maior estabilidade politica. O estado procura racionalizar a sua estrutura (fiscal e financeira) perante 0 desafio da inte- gracao na CEE. E dada uma certa continuidade as reformas politico-institucionais, nomeadamente com a criagdo do Ministério da Satide, do Ministério do Trabalho e Seguranca Social e do Conselho de Concertagao Social (a partir de 1983), visando intervir nas questées laborais, salariais e na protecgao social dos trabalhadores, numa légica de parceria nas decisées. As dificuldades econémicas exigiram algumas medidas de caracter avulso, orientadas para a regulagao do mercado laboral, nomeadamente no que diz respei- toa proteccao de situagdes de desemprego e de emprego (neste caso, salientamos a regulamentacao do tempo de trabalho). Em 1984, é promulgada a Lei de Bases da Seguranga Social (Lei n.° 28/84, de 24 de Agosto). Ao nivel das estruturas institucionais regista-se, em 1993, a reorganizagao dos centros regionais de seguranca social, onde se opera a transicao das activida- des de um nivel distrital para um nivel regional (Guibentif, 1996). Em 1990, assiste-se ao inicio das preoctrpag6es com os problemas da pobreza por parte de organismos de estado e associacées privadas. A par do sistema de ac- Gao social, que complementa o regime de seguranga social, surgem medidas comu- nitarias que procuram promover e melhorar as situagdes de necessidade, erradicar a pobreza e garantir a proteccéio aos grupos sociais mais vulneraveis, Neste ambito destaca-se o Programa Europeu de Luta contra a Pobreza (III Programa), que en- quadra o Programa Nacional de Luta contra a Pobreza. Estas medidas tém efeitos nas politicas sociais directamente relacionadas com o combate 4 exclusdo, permi- tindo uma maior participagao dos actores sociais na concepcao, implementaciio e controlo das polfticas sociais, uma maior descentralizago das actividades e uma melhor coordenac&o das politicas, com o intuito de aumentar a sua eficdcia (Perei- rinha, 1996). 44 Eduardo Vitor Rodrigues, Horbele Semagaio, Hélder Ferreira, Maria Menuela Mendes e Susana Januario Em 1995, verificam-se algumas transformag6es da seguranca social, concreta- mente a nivel estrutural, com a divisdo dos ministérios que tutelam a protecc&o so- cial e a consequente criacio do Ministério do Emprego e do Ministério da Solidariedade e Seguranga Social (dividindo-se este em duas secretarias de estado, a Secretaria de Estado da Seguranca Social e a Secretaria de Estado da Integracao Social). Estes ministérios, no entanto, por razGes organizacionais, voltariam a ser agregados mais tarde, passandoa designar-se Ministério do Trabalho e da Solidari- edade. A criacao do rendimento minimo garantido, em 1996, constitui a principal e mais importante mudanga na actualidade ao nivel da proteccao social. Para Guibentif (1996), a seguranca social nunca foi, até muito recentemente, um t6pico importante da agenda politica. A excessiva governamentalizagéo ou “estatizagao” das medidas e das politicas resultou na auséncia do debate no interi- or da sociedade civil, tendo os mais interessados (os potenciais beneficiados) fica- do arredados deste importante debate. A criagéo da Comissao do Livro Branco insere-se num contexto em que urge levar a efeito um conjunto de medidas que via- bilizasse o sistema. Inicia-se assim uma intervengao técnica e especializada, o que constituiu um importante passo para a discussao alargada em torno da reorganiza- cao do sistema de seguranca social (Guibentif, 1985). Aacgao e desenvolvimento do estado-providéncia em Portugal manifesta-se na implementagao e concretizacao das “politicas sociais gerais e compensatérias de proteccéio de determinados segmentos da populacao", na ”implementacao de politicas macroeconémicase de regulacdo da esfera econémica privada, intervindo nas disfuncionalidades das regras do mercado”, bem como no estabelecimento de “formas de conciliagao, isto é, institucionalizando a concertagao entre parceiros so- ciais e econémicos em torno dos grandes objectivos, como o crescimento econémi- co ea diminuico das desigualdades sociais” (Mozzicafreddo, 1997: 32). Face a uma evolugao no sentido de efectivas preocupagées sociais, que se tra- duz na propria producao de reais politicas sociais* (ainda que ineficientes, desade- quadas ou ainda insuficientes), tém-se vindo a implementar mecanismos caracteristicos de estado-providéncia em Portugal, os quais tém sofrido uma evo- luc&o no sentido da aproximagao, em determinados momentos, a um ou a outro dos varios modelos de estado-providéncia (Rhodes, 1996).? Ser, ento, possivel concluir desde ja que as politicas sociais em Portugal sao descontinuas, fragmentadas e sectoriais. Para Mozzicafreddo, estas tém sido orien- tadas no sentido de resolverem situagdes de forte necessidade, designadamente através dos varios tipos de pens6es e das prestagdes sociais. Nesta linha, procederemos seguidamente a andlise da produgio legislativa, categorizada nas seguintes Areas: seguranca social, emprego e educacao. Importa referir que, ao nivel da recolha de informa&o, procedeu-se A consulta e andlise da base de dados de legislag&o — Datajuris — e dos Didrios da Repiblica, A informagaéo recolhida foi posteriormente confrontada com elementos bibliograficos comple- mentares. Ressalva-se a nao exaustividade desta recolha, dado que se optou por re- colher prioritariamente os diplomas mais importantes para o estudo, Por questdes de andlise, s’o consideradas as diferentes areas de incidéncia das varias politicas. Este procedimento 6 metodoldgico-analitico, pois a realidade de actuacao de POLITICAS SOCIAIS F EXCLUSAO EM PORTUGAL. 45 muitas das politicas apresentadas é transversal e inter-relacionada. Excluimos pro- visoriamente as Areas da habitacio, satide, familia e justica, tratadas no projecto, dada a extens&o das andlises. Seguranga social O sistema portugués de seguranca social foi regulamentado pela Lei n.° 28/84, de 14 de Agosto. Os grandes objectivos deste sistema foram fundamentalmente dois: a pro- tecco dos trabalhadores e das suas familias “nas situag6es de falta ou diminuicdo de capacidade para o trabalho, de desemprego involuntario e de morte”, garantindo “a compensacao de encargos familiares” e a proteccao das pessoas “que se encontramem situacao de falta ou diminuicao de meios de subsisténcia” (Lei n.° 28/84, de 14/8). Ossistema de seguranga social assenta nos principios de universalidade, uni- dade, igualdade, eficdcia, descentralizacio, garantia judiciéria, solidariedade e participacao, princfpios inerentes a propria concepcao do estado-providenciae das politicas sociais que 0 caracterizam. Esta aqui em causa a pretensao de garantir, para além do alargamento progressivo das prestacoes e dos beneficiérios, a articu- lac&o dos varios regimes que constituem 0 sistema, bem como a equidade entre os varios grupos sociais, a eficiéncia e qualidade das formas como os beneffcios sao prestados e a autonomia das instituigGes para melhor responderem as populacées. Assim, compete ao estadoa garantia da administracao dosistema constituido pelos regimes geral endo contributivo e pela accao social. Trata-se de um entendi- mento alargado de seguranga social, que alia medidas que visam a acgao social (proteccao dos que se encontram em situagGes de caréncia) aquelas que promovem a proteccao social (CISEP, CIEF e FEDEA, 1997). Oregime contributivo abrange, em principio, os trabalhadores em geral (por conta de outrem e os trabalhadores independentes),!° cobrindo varias eventualida- des, nomeadamente doenga, maternidade, acidentes de trabalho, doengas profissi- onais, desemprego, invalidez, velhice, morte e encargos familiares. O financiamento deste regime é assegurado pelas contribuigdes dos trabalhadores e das entidades empregadoras. O regime nao coniributivo promove a protecgdo das pessoas que nao se en- contram abrangidas pelo regime geral contributivo. As eventualidades cobertas por este regime so os encargos familiares (abono de familia, aleitagao, abonocom- plementar a criancas e jovens deficientes e subsidio por frequéncia em estabeleci- mentos de educac&o especial), o desemprego, a invalidez (pensao social de invalidez e subsidio para assisténcia de terceiros) ¢ a morte (pensdes de orfandade e viuvez). As transferéncias do estado so a sua base de financiamento, Osistema de seguranga social compreende ainda a chamada protec¢ao social facultativa, 0 seguro social voluntério, que foi instituido em 1989. Para além de constituir uma modalidade complementar ao sistema estatal de protec¢ao social, esta medida anuncia o fim da exclusividade do estado na intervengao a este nivel. 46. Eduardo Vitor Rodrigues, Florbela Samageto, Helder Ferrers, Maria Manuela Mendes e Susana Januério Aacc&osocial funciona como complemento dos dois regimes, assumindo me- didas que pretendem assegurar o bem-estar como um justo direito de todos. Tem como objectivos “a prevencao de situagées de caréncia, disfungaoe marginalizacao social e a integragdo comunitaria”, e destina-se a “assegurar especial proteccao aos grupos mais vulneraveis, nomeadamente criangas, jovens, deficientes e idosos, bem como outras pessoas em situacio de caréncia social ou sob 0 efeito de disfun- do ou marginalizacao social...” (Lein.° 28/84, 14/8). Para finalizar esta breve incursao pela Lei de Bases da Seguranga Social, con- sidera-se o papel que é consagrado pela mesma as IPSS no dominio da proteccao social. O estado reconhece, valorizando-as, as acgées desenvolvidas por estas insti- tuigdes “na prossecucao dos objectivos da seguranca social” (Lei n.° 28/84, 14/8). Para além de se encontrar prevista uma relagao entre o estado e as institui¢des refe- ridas, aquele caberd ainda uma accao tutelar sobre as mesmas, de fiscalizagao e de inspeccfo. Importa, neste momento, dar conta do que de mais importante foiimplemen- tado apés a Lei de Bases. A anélise a proceder, para além de descrever os diplomas considerados mais importantes no ambito da seguranga social (tendo em conta, se- paradamente, a sua naturezajuridica), avaliara a evolucao do préprio sistema por- tugués de seguranga social no sentido de perceber a prossecu¢do dos objectivos e dos principios previstos e estabelecidos na sua Lei de Bases. Ainda neste ambito, atentar-se-4 nas respostas que o sistema criou face as exigéncias veiculadas pelas transformacées sociais ocorridas desde a promulgacao daquele diploma. Da andlise dos diplomas mais relevantes evidenciam-se os principais eixos evolutivos: — acontinuidade da regulamentagao no sentido de desenvolver o sistema de se- guranga social, nomeadamente a actualizac&o das prestagées, a actualizagao dos métodos e coeficientes de base para o calculo das prestagdes e contribui Ges e a definicao de principios regulamentadores e ordenadores das institui- Ges, medidas de seguranca social no sentido de uma maior articulacéo com 0 ambito local; — oalargamento dos ambitos dos regimes de seguranca social no que respeita a dimensao social, isto é, a abrangéncia de um ntimero cada vez maior de cate- gorias ou grupos sociais / ocupacionais e no que se refere a criagdo de novos beneficios; — acriag&o de esquemas complementares de protecgao social; — oalargamento do ambito da acco social quer pela abrangéncia de novos gru- pos (“em risco”) e por acces direccionadas a novas tematicas (como a toxico- dependéncia), quer por medidas dirigidas 4 exclusdo social e A pobreza; — anecessidade crescente de enquadrar o papel das IPSS e outras (as associa- g6es mutualistas, por exemplo) na cooperacao e da complementaridade na proteccao social; — __ ofinanciamento do proprio sistema (medidas de combate a fraude e dividas a seguranga social), na perspectiva de uma reforma. POLITICAS SOCIAIS E BXCLUSAO EM PORTUGAL 47 Ao longo dos onze anos em andlise (1986-1997), subsiste a preocupagao de equili- brar o préprio sistema de seguranga social. Na verdade, assiste-se nao s6 4 promul- gagdo de legislacéo regulamentar, mas também a actualizagéo constante das prestacGes previstas nos regimes de seguranga social. Se, por um lado, existe uma progressiva aten¢do em relacdo as prestacdes do regime geral (pens6es de velhice, invalidez ou sobrevivéncia, por exemplo), por outro, ha uma preocupagaono senti- do do alargamento dos beneficios ao nivel do regime nao contributivo, bem como no ambito da accao social. Destas medidas, destacam-se como mais exemplificativas a regulamenta- cao do regime de seguranca social dos trabalhadores independentes (o DL n.° 328/93, de 25/09, 0 DLn.°217/95, de 26/08 ¢ 0 DRn.°6/97, de 10/03), os esque- mas de calculo no que respeita quer as contribuigGes, quer as prestagdes (nome- adamente, 0 DLn.° 140-D/86, de 14/06, o DL n.° 295/86, de 19/09, a Portaria n.° 917/90, de 28/09, a Lein.°39-B/94, de27/12ea Portarian,.°309/97,de12/05),a tentativa de harmonizar os varios regimes de proteccéo (nomeadamente o regi- me geral da seguranga social e 0 regime dos funcionérios ptiblicos — DL n° 143/88, de 22/04 eo DL n.° 106/92, de 30/05), a necessidade de abranger atra- vés de diplomas legais proprios as Regides Auténomas dos Acores e da Madei- ra, no que diz respeito as varias modificac6es realizadas (DL R n.° 11/87/A, de 19/05 e DLRn.° 13/92/M, de 30/04) e o aperfeicoamento da participagao dos diferentes parceiros sociais na discuss&o e elaboracao de medidas no ambito da seguranga social (realca-se a criagao, em 1991, do Conselho Econémico Social, através da Lein.° 108/91, de 17/8, bem como a sua regulamentacao, j4 em 1992, pelo DL n.° 90/92, de 21/05). Destaca-se ainda a reorganizagao dos centros regionais de seguranca social (DLn2 260/93, de 23/07), cujo objectivo é procurar adaptar as estruturas de segu- ranga social a transformacao das realidades socioeconémicas do pais nosentido de melhorar a gest&o dos recursos existentes. Neste Ambito, merece ainda destaque o estabelecimento da pensao tinica (DL n° 159/92, de 31/07, e Portaria n.°2/93, de 2/1), a reformulacao do regime de pro- teccdo na velhice e na invalidez dos beneficidrios do regime geral da seguranga so- cial (DL n.° 329/93, de 25/09) e a nova tabela nacional de incapacidades (DL n° 341/93, de 30/9). Estes diplomas e medidas surgem no sentido de responderem as necessidades e transformac6es importantes, nomeadamente no que diz respeito as novas exigéncias econémicas, sociais e demograficas. O novo regime de pensdes enquadra aigualdade da idade para beneficio de pensdes para homens e mulheres, define melhor algumas das figuras que entretanto foram introduzidas (nomeada- mente a reforma antecipada) e estabelece novos métodos de calculo enovos prazos de garantia para aceder as pensées. Sera conveniente reter que, também ao nivel da proteccéio da maternidade e da paternidade, a protecg&o tornou-se mais efectiva (DLn.° 154/88, de 29/04,a Lei n.° 17/95, de 09/06 eo DL n.° 194/96, de 16/10). Oalargamento do 4mbito da seguranca social faz-se com dois objectivos: por um lado, no sentido de abranger um maior ntimero de pessoas e, por outro, coma intengdo de aumentar a eficdcia na atribuig&o dos beneficios e dos direitos. 48. Eauardo Vitor Rodrigues, Forbea Samagelo, Helder Ferrers, Maria Manuela Mendes e Sostna Jonuério Das categorias sociais que foram sendo integradas no sistema de seguranca social, salientam-se os trabalhadores das actividades agricolas (DL n.° 401/86, de 2/12, e DRn.° 75/86, de 30/12). Ao nivel das prestagdes e beneficios e mesmo de novas figuras juridicas no sistema de seguranga social, relevam-se as mais significativas: a preocupagao crescente com a protecc&o no desemprego, que se materializa na criacao de um subsidio de desemprego para jovens candidatos ao primeiro emprego (Lei n.° 35/87, de 18/8), na institucionalizagao de um subsidio de in- sercdo de jovens na vida activa (Lei n.° 50/88, de 19/04), no alargamento da proteccdono desemprego aosjovens contratados para 0 exercicio de activida- des enquadradas nos servicos militares (Portaria n.° 227-A/92, de 24/7), na harmonizacao da legislacao neste ambita, nomeadamente com o regulamen- to CEE n.° 1408/71, de 14 de Junho, relativo a aplicagao dos regimes de segu- ranca social aos trabalhadores e suas familias que se deslocam na Comunidade (DL n.° 46/93, de 20/02), e ainda no alargamento do perfodo de subsidio social de desemprego (DLn.° 57/96, de 22/5);" oalargamento da proteccao aos pensionistas, com acriacao do”14.° més”, de- terminando que no més de Julho os pensionistas de todos os regimes tenham direito a receber, para além da pensao normal, uma prestacao adicional de igual montante (Portaria n.° 470/90, de 23/06); no que diz respeito a novas “figuras” abrangidas pelo sistema de seguranca social, salienta-se 0 enquadramento das situagées de pré-reforma (DL n.°261/91, de 25. 7), uma vez que estas se desenvolvem a partir de reestrutu- races empresariais que sdo frequentemente causa de situacées de instabili- dade para os trabalhadores, designadamente os mais idosos; a criacdo de prestagdes e apoios suplementares para os beneficiérios de pen- sGes por incapacidade permanente ou por morte decorrentes de acidentes de trabalho (Portaria n.° 1237/93, de 2/12); aregulamentacdo da prestacdo por morte nas situagdes de uniao de facto (DR n.° 1/94, de 18/01), 0 que equivalerd a concretizacao de uma resposta face as transformacées e caracteristicas da sociedade contemporanea Simultaneamente a progressiva consolidacaio do sistema de seguranga social, este procura constituir-se em bases cada vez mais sdlidas e abrangentes, existindo uma preocupacio paralela: a de promover e enquadrar esquemas complementares de proteccio social. Destacam-se, a este respeito, as seguintes medidas: ainstituigéo do seguro social voluntario(DLn.° 40/89, de 01/02), quealargao Ambito do sistema de seguranga social, conforme previstona Lei de Bases de 1984; a criacao e enquadramento dos planos poupanca-reforma (PPR), pelos DL n.° 205/89, de 27/6, Portaria n.° 872-A/89, de 9/6 e DL n.° 145/90, de 7/5; a instituico do regime juridico de constituicéo de fundos de pensées, (DL n.° 415/91, de 25/10, e Portaria n.° 1152-E/94, de 27/12). POLITICAS SOCIAIS E EXCLUSAO EM PORTUGAL 49 Importa referir que estas medidas nao deixam de reflectir uma primeira preocupa- ao em criar as bases para eventuais regimes alternativos ao estado. A sistematiza- cao e reformulacéo do enquadramento normativo global e modernizado das associacdes mutualistas, originando o Cédigo das Associagées Mutualistas (DL n.° 72/90, de 3 de Margo), vem demonstrar a crescente preocupagaéo com formas complementares de protecgao social. Alids, 0 Livro Branco da Seguranga Social (1998) reconhece a importancia destas estruturas na seguranga social. As preocupacées com a proteccio de alguns grupos sociais de risco e mais desfavorecidos acentuam-se particularmente a partir de 1990. Por seu turno, novos problemas sociais exigem da parte do sistema respostas concretas e localizadas na tentativa da sua resolugdo, Neste ambito, salienta-se, no que respeita ao combate & pobreza e exclusao social: — acriac&o dos Comissariados Regionais do Norte e Sul de Luta Contra a Pobre- za, sob tutela do Ministério do Emprego e Seguranga Social (RCM n.°8/90, de 3/3),no seguimento do Programa Nacional de Luta Contra a Pobreza, criado também em 1990; — a instituicdo do Rendimento Minimo Garantido, que se consubstancia numa prestagao (no ambito do regime nao-contributivo da seguranca social) de modo a assegurar recursos aos individuos mais carenciados e suas familias e num programa de insergao social (Lei n.° 19-A/96, de 29/06; Portaria n.° 237-A/96, de 1/7; Despacho Conjunto n.°7/97, de 15/5; DLn.° 164-4/97, de 27/6; DLn.° 196/97, de 31/7). Estas medidas reflectem uma preocupagio de ambito local. Tanto os comissariados regionais de luta contra a pobreza como o rendimento minimo garantido consubs- tanciam-se em medidas e projectos de base regional e local. Desta feita, esboga-se uma preocupacao de responder aos problemas sociais de forma especifica, direcci- onada e localizada. Nos tiltimos anos, o fenédmeno da toxicodependéncia constitui objecto de legislagao. Em 1990, é criado o servico de Prevencao e Tratamento da Toxicode- pendéncia (DLn.° 83/90, de 14/03), reforca-se o Programa Nacional de Comba- te a Droga (RCM n.° 17/90, de 21/04) e, em 1994, é regulamentada a Lei Organica do Servigo de Prevencao e Tratamento da Toxicodependéncia (DL n.° 43/94, de 17/2). As medidas de apoio e prevencao multiplicam-se até a actu- alidade (por exemplo, a Lein.° 7/97, de 8/3), com preocupagées cada vez mais consistentes quer com a prevencao, quer com a reabilitagao e insercao dos indi- viduos em causa. Por outro lado, as minorias étnicas constituem um grupo sobre o qual aumen- tam as preocupacées ao nivel de integracao social. Assim, é criadoo Alto Comissa- rio para a Imigracdo e Minorias Etnicas (DLn.°3-A/96, de 26/1) e é promovidoum processo de regularizacao extraordinaria da situacao dos imigrantes clandestinos (Lei n.° 17/96, de 24/05). A familia, as criancas eas mulheres continuam a ser os mais visados com polf- ticas directas e indirectas e medidas de proteccao social. 50. Eduardo Vitor Rodrigues, Florbela Samagaio, Hélder Ferreira, Maria Manuela Mendes e Susana Januérlo O mesmo se passa com os equipamentos e medidas (estatais e privadas) di- reccionadas para os idosos (Despacho 11/SEIS/96, de 29/5). Surgem assim medi- das que retardam e impedem, pelo apoio a familias de acolhimento, a institucionalizagao dos mais idosos ea sua saida do nucleo familiar e comunitério. As IPSS, pela importancia que assumem na prossecugao de objectivos de pro- tecc&io e seguranca social, so alvo de medidas que procuram sistematizar as suas competéncias, estatuto e os niveis de cooperac&o, por um lado, e regulamentar a re- lagéo quemantém com o estado, por outro. Desde a aprovacao do Estatuto das IPSS (DLn.° 119/83, de 25/2), que as competéncias das mesmas tém sofrido alterages. E instituido, em 1985, oregime de isen¢ao de impostos (DLn.° 89/95, de 1/4),émodi- ficado o seu estatuto em 1986 (DLn.° 29/86, de 19/02), so regulamentadas as com- participacées financeiras por parte do estado (D. N. n° 41/87, de 3/4) e regulada consecutivamente a cooperacao entre estas instituicdes ¢ 0 estado (D. N.n.° 12/88, de 22/2; D. N.n.° 75/92, de 20/5; Portaria n.° 328/96, de 2/8). ALei de Bases da Seguranga Social jé reconhecia e reguiamentava o papel das IPSS no sistema de seguranga social. Estas, apesar de muitas vezes dependerem do proprio estado, sobretudo ao nivel do seu financiamento, nao deixam de ocupar um importante e significativo papel de proteccao e apoio social junto das popula~ Ges. A sua accéo colmata, pela proximidade que mantém junto daquelas, muitas das insuficiéncias deixadas pela intervencao estatal. Cada vez mais, 0 estado vai reconhecendo este modelo de protecgao, permi- tindo, através de legislacdo espectfica, a regulamentacio de formas mais organiza- das e diversificadas de solidariedade social. Salienta-se, em particular, 0 reconhecimento (oficial) das fundagées de solidariedade social, em 1996 (DL n° 152/96, de 30/8). O financiamento do sistema ou das politicas de seguranga social constitui uma preocupagao central. Jé em 1976, a legislacao denota esta preocupacao, visandoregu- lar formas de pagamento de dividas a seguranga social (Comissao do Livro Branco da Seguranca Social, 1998). Este posicionamento constitui uma resposta esperada, se tivermos em conta que 0 sistema de seguranga social surge, em Portugal, no momen- toem que outros sistemas, designadamente os dos paises do Norte e Centro da Euro- pa, comecam a sentir problemas no que respeita a sua sustentabilidade financeira. Para além do debate sobre a sustentabilidade da seguranga social, muita da legislagao no Ambito dos ministérios procura solucionar alguns problemas imedia- tos, que se prendem com o financjamento do préprio sistema. Assim, vislumbra-se um conjunto de medidas que visam incentivar o pagamento dos montantes em di- vida & seguranca social. A este respeito, pode ter-se em conta os seguintes diplo- mas:0DLn.° 20-D/86, de 13/02, oDLn.°69/89, de 25/02,0DLn.°411/91,de17/10 eoDLn.° 140/95, de 14/06. Por outro lado, é feito um esforgo no sentido de comba- ter de forma sistematica as fraudes para obtencdo de subsidios e pensdes (por exemplo, no caso dos subsidios por doenca e nas reformas por invalidez ou incapa- cidade, através da criacdo e aperfeigoamento do sistema de verificagao de incapaci- dades para o trabalho). A Portarian.°615-A/87, de 17/7, regulamenta e aperfeicoa o sistema de verificagao de incapacidade, criado em 1982, tal como acontece, mais recentemente, com 0 DL n.° 360/97, de 17/12. POLITICAS SOCIAIS E EXCLUSAO EM PORTUGAL 51 Assim, Aconstituigao da Comissao do Livro Branco da Seguranga Social (R.C. M.n.° 22/96, de 9/9) esta subjacente a necessidade de avaliar o sistema de seguran- ¢a social existente, levantar e percepcionar as actuais condicionantes da prépria Pprotecg&o social, sistematizar os problemas do sistema e prospectivar alternativas e novas bases de financiamento Ao nomear este conjunto de caracteristicas, persistentes, da seguranga social em Portugal, pretende-se, acima de tudo, levantar algumas pistas para uma refle- xAo 0 mais alargada possivel, uma vez que parece ser certa a reforma do sistema num futuro préximo. Emprego Acentralidade do trabalho (e particularmente do trabalho em situagao de empre- go) esta consagrada na garantia de emprego (DLn.° 444/80, de 4/10) enodireitoao trabalho definido na Constituigao (art.° 58.°). Para uma maior clarificagao da andlise desenvolvida, impSe-se uma breve caracterizac4o da evolugio das politicas sociais de emprego no perfodo de tem- po que antecede o explicitamente considerado (1986-1997). Este periodo defi- ne-se pelo esbogo de algumas medidas importantes, tais como a reanimagao da negociacao colectiva (e que se traduz, por exemplo, na dinamica de actualizagao regular de saldrios em alguns sectores de actividade), o alargamento da protec- 40 social ao nivel das reformas, dos abonos de familia e dos subsidios de doen- ga e acidentes de trabalho (apesar de os projectos de criacéo de um subsidio de desemprego e de definicéo de um salario minimo nao terem passado das inten- des, devido a obstdculos politicos) e o langamento de uma politica de educa- ¢40/formac&o mais ambiciosa, com vista a ampliar a cobertura escolar dos jovens ea criar circuitos de formagao de operarios qualificados e de quadros mé- dios e superiores (Rodrigues, 1988). Depois de 1974 sucedem-se varias fases de desenvolvimento de legislagao centrada na area do emprego, iniciadas com a fixagao do salério minimo, enquanto importante valor de referéncia (DL n.° 217/74, de 27/5). Numa primeira fase (1974-75) destacam-se as transformagées inerentes a re- lagao salarial, em particular no respeitante ao estabelecimento do direito a greve (que seria posteriormente objecto da Lein. 65/77, de 26/8), da proibicao de lock out eda liberalizagao da organizagdo dos parceiros sociais, a restrigao das possibilid. des de despedimento colectivo e individual (DL n.° 372-A/75, de 16/7), & imposi-~ do de niveis salariais minimos e maximos, a extensdo das modalidades de salério indirecto (DL n.° 169-D/75, que institui o subsidio de desemprego) e & reducao da durac&o semanal do trabalho. De realgar que, desta forma, foram criadas condig6es para reforcar 0 movi- mento sindical (DLn.°215-B/75, de 30/4) e os mecanismos de negociagao colectiva (através, por exemplo, da formac&o de comissées de trabalhadores em muitas 82 Eduardo Vitor Rodrigues, Florbela Samagalo, Helder Ferreira, Maria Mantela Mendes e Susana Janutrio s empresas) e, simultaneamente, restringiu-se o despedimento individual (eli- minando a inadaptacdo fisica e técnica e as reestruturacdes como justa causa de despedimento) e regulamentou-se o despedimento colectivo, estipulando os seus motivos e desenvolvendo apertados mecanismos de controlo ptiblico (Ro- drigues, 1988). Numa segunda fase (1976-1977), ocorreu a normalizacao, controlo e orienta- go das transformagées precedentes, patente na regulamentacao das relagdes co- lectivas de trabalho (negociagao colectiva, comissées de trabalhadores e liberdade sindical) e introduziu-se a figura juridica do trabalho a prazo (DL n.° 781/76, de 28/10), no sentido de uma maior flexibilizagao da gestao da mao-de-obra assalaria- da. Foram também relevantes, neste periodo, as medidas de protecc&o social e 0 apoio 4 manutengao de postos de trabalho, através dos contratos de viabilizacao das empresas em dificuldades econdmicas, do qual constitui exemplo o DL n.° 353-H/77, de 29/08, que regulamenta a suspens&o do IRC no caso das empresas em situacgao econémica dificil (Rodrigues, 1988). Entre 1978 e 1979 situa-se a terceira fase, profundamente marcada pelo aban- dono dos objectivos de carécter estrutural em detrimento dos problemas conjuntu- rais urgentes. As poucas intervencGes de caracter estrutural visaram sobretudo regulamentar a participagao dos trabalhadores na elabora¢ao da legislacao do tra- balho e as comissdes de trabalhadores (Lei n.° 16/79, de 26/05, e Lein.° 46/79, de 12/9, respectivamente), bem como estabelecer o direito das mulheres a igualdade perante o trabalho (DL n° 392/79, de 20/09) (Rodrigues, 1988). Entre 1980-1982 foi atribuida a prioridade maxima a integrac&o na CEE, pelo que foi introduzida uma politica diversificada, baseada em grandes eixos instituci- onais ejuridicos, comoa promulgacao da lei que precisa o conceito de promocao de emprego (DL n.° 445/80, de 04/10) e a adopgao das convengées da Organizagao Internacional do Trabalho sobre politica de emprego, formacio profissional esegu- tanga social. Assiste-se a formulagao de medidas de apoio técnicoe financeiro a cri~ aco e manutengao de postos de trabalho, ao desenvolvimento do artesanato e do sector cooperativo e a integracao profissional dos deficientes (DL n.° 40/83, de 24/06, que estabelece o regime do emprego protegido), entre outros. Norespeitante a politica industrial e regional, regista-se uma primeira tenta- tiva de esbogo desta, com a criagao de um sistema integrado de incentivos ao inves- timento, a definicéio de regides, sectores e profissdes prioritarias ao nivel do emprego ea regulamentacao dos programas integradores de desenvolvimento re- gional e de promogao de emprego. Oalcance efectivo destas medidas foi limitado nao sé devido a dificuldades organizativas e financeiras, mas também ao nivel das atitudes dos agentes. A au- séncia de definig&o de uma estratégia global de desenvolvimento, conciliadacoma marginalizacao do objectivo emprego face aos objectivos conjunturais considera- dos mais urgentes, contribuiu também para a reducao do impacte destas medidas (Rodrigues, 1988). Numa quinta fase (1983-1985) registaram-se alguns progressos na organiza- do de um sistema de aprendizagem e formagao profissional (DL n.° 102/84, de 29/03) ena criagao de dispositivos para amortecer a austeridade (a Lei de Bases da POLITICAS SOCIAIS E EXCLUSAO EM PORTUGAL 53 Seguranga Social em vigor foi promulgada em 1984), com a transformacao do sub- sidio de desemprego em seguro de desemprego (DLn.°20/85, de 17/01), a institu- cionalizac4o do fundo de garantia salarial (DL n.° 50/85, de 27/02) ea extensao do direito de protecgao no desemprego aos trabalhadores com saldrio em atraso (D.N. n° 35/84, de 13/02). Ao nivel da revisio do enquadramentojuridico do contrato de trabalho regis- tam-se importantes divergéncias que opdem as associagGes patronais (orientadas para a liberalizacdo das possibilidades de despedimento individual, contrabalan- ada por uma maior restrigéo no recurso aos contratos de trabalho a prazo) as orga- nizagoes sindicais, que resistem a estas intengdes (Rodrigues, 1988). Foi neste contexto que surgiu, por exemplo, o DLn.° 398/83, de 2/11 (suspensao do contrato de trabalho), o DLn.° 421/83, de 12/12 (trabalho suplementar) e a Lei n.° 4/84, de 5/4 (Lei da Maternidade e Paternidade). Sao estas as caracteristicas que definem o emprego no perfodo que antecede os anos de 1986 a 1997. Sendoo mercado de emprego um campo de acco de agentes varios e diferen- ciados, evidencia-se como importante, no periodo considerado, a criagéo de novos actores institucionais, como o Conselho Econdémico e Social (Lei n.° 108/91, de 17/8), onde os dirigentes e trabalhadores, através das respectivas associagGes re- presentativas, negoceiam o significadoe valor social do trabalho, bem comoas con- dicdes de seguranca no emprego e a proteccao dos trabalhadores, a Comissao para o Mercado Social de Emprego (RCM n.° 104/96, de 9/07) ea Comissao para a Igual- dade no Trabalho e Emprego (que tem como objecto as disparidades ao nivel do emprego, em termos de sexo, idade, grupos sociais, etc.). De realgar ainda a implementagao do sistema de informag4o profissional inserido no mercado de emprego (DLn.° 54/92, de 13/04), bem como os incen- tivos de combate as assimetrias regionais, através dos incentivos a mobilidade dos trabalhadores (DL n.° 225/87, de 5/6 e DL n.° 301/87, de 4/8, por exemplo). Em termos de projectos e programas, a area doemprego revela-se fértil, assis- tindo-se ao langamento de varios programas ligados ao desenvolvimento do em- Prego e aos apoios as actividades econémicas. Em termos de programas orientados para o emprego, referenciam-se: — 0 Programa de Correccao Estrutural do Défice Externo e do Desemprego — PCEDED (RCM n.° 22/87, de 20/4); — _ oSistema de Incentivos a Diversificacao Industrial do vale do Ave (Sindaye), ‘um programa especificamente direccionado para 0 vale do Ave, no ambito do qual se promulgaram diversos diplomas de incentivos a criagdo e manuten- ¢ao de postos de trabalho e de combate ao desemprego (RCM n.° 8/91, de 16/3, DLn.° 101/92, de 30/5 e a Portaria 753/92, de 3/8); — 0 Programa de Iniciativas de Desenvolvimento Regional (RCM n.°57/95, de 17/6); — Sistema de Incentivos a Jovens Empres4rios —SIJE (DLn.°22/97,de23/1)e 0 Sistema de Apoio a Jovens Empresdrios — SAJE (DN n.° 31/97, de 23/1); 54. Eduardo Vitor Rodrigues, Florbela Samagalo. Hilder Ferreira, Matha Manuela Mendes e Susana Janusrio — os Programas PEDIP (medida 2) e Programa Comunitario Leonardo da Vinci (ambos na area da formacio profissional); — 0 Programa de Insergao de Jovens na Vida Activa (aprovado na RCM n2 44/97, de 21/3), relacionado com as unidades de inser¢4o de jovens na vida activa (Univa); — as Iniciativas Locais de Emprego — ILE (D. N. n° 46/86, de 4/6, R.C,M.n.° 57/95, de 17/6 e DLn. 189/96, de 8/10); —~ _ osprogramas de Ocupacao dos Tempos Livres (OTL) e Ocupaco Temporéria de Jovens — OTJ (ambos relangados na RCM n.° 2/87, de 30/12), bem como os programas ocupacionais de combate ao desemprego. Refira-se ainda o projecto-piloto destinado a fomentar a cooperacdo entre universi- dades, centros de investigagdo, empresas e associagGes (Portaria n.° 469/93 de 4de Maio), que pretende fomentar a criagéo de mecanismos de superagao do fosso que geralmente separa as instituigdes de ensino dos agentes econémicos. Uma outra vertente em andlise enquadra a legislagao sobre 0 contrato indivi- dual de trabalho, sendoimperativo referir, como ponto de partida obrigatério, o di- ploma que define o enquadramento do regime juridico do trabalho e da proteccao do vinculo laboral, patente no DL n.° 49408, de 24 de Novembro de 1969. Para além deste, assumem particular importancia o principio da igualdade (trabalho igual, salario igual), dispostono Acérdao 16/96, de 4 de Fevereiro, eo re~ gime juridico das relagées colectivas (originalmente promulgado no DL n.° 519-C/79, de 29/12 e posteriormente alterado pelo DL n.° 209/92, de 05/10). Em estreita relacéo com o regime jurfdico do contrato individual de trabalho, foi promulgada diversa legislagao destinada a regulamentar: — acessac4o do contrato individual de trabalho (Portugal aprovou a Conven- cdo n.° 158 da Organizacao Internacional de Trabatho, relativa a cessacaio do contrato de trabalho por iniciativa do empregador) e a cessacgio por incapaci- dade do trabathador, intimamente relacionada com os despedimentos (DLn.° 64-A/89, de 27/02, DLn.° 400/91, de 16/10, e Lei n.° 38/96, de 31/08); — as condigdes de celebragao e caducidade do contrato de trabalho (DL n.° 64-A/89, de 27/2); — _ asuspensao do contrato e redugao da prestacao de trabalho, vulgo /ay off (DL n.° 64-B/89, de 27/2 e DLn.° 210/92, de 5/10); — as férias e as licencas sem vencimento (DLn2 397/91, 16/10); — e, por tiltimo, o perfodo experimental (DL n.° 403/91, de 16/10). Algumas das situa¢6es referenciadas constituem potenciais focos de conflitualida- de ao nivel das relacdes laborais, podendo eventualmente gerar (dependendo das disposices legais em vigor) zonas de vulnerabilidade, quando se traduzem no en- fraquecimento do vinculo contratual, na supressao de direitos ou na precariedade de emprego, pelo que se justifica a necessidade de legislac&o especifica. A legislagao acompanhou também a evolucao do conceito e significado do trabalho, enquadrando, por exemplo, o trabalho de menores (no DL n.° 396/91, de POLITICAS SOCIAIS E EXCLUSAO EM PORTUGAL 55 16/10, introduziram-se alteragdes ao DLn.° 49 408, no respeitante a este tema), sen- do este cada vez mais uma op¢ao legal e socialmente condenavel, em conformida- de com o crescimento da escolaridade e com a aposta clara na formac&o das gerag6es mais novas, no sentido de que o maior percurso escolar lhes atribua quali- ficagGes valorizadas no mercado de trabalho. Alguns dos diplomas analisados versam as agéncias privadas de colocacéo (DL n.° 124/89, de 14/4) e as empresas de trabalho temporério (DL n.° 358/89, de 24/1), regulamentando as condigées de actividade destas e definindo o enquadra- mento legal do trabalho temporério. O trabalho em comissao de servi¢go (DL n.° 404/91, de 16/10) e o trabalho ao domictflio (DL n.° 440/91, de 14/11) foram tam- bém objecto de diplomas legais. Também a dura¢ao do trabalho foi objecto de disposigdes legais, com uma primeira regulamentacao que instituiu as 44 horas de trabalho semanais (DL n.° 398/91, de 16/10) e, posteriormente, a promulgacao da semana de trabalho de 40 horas, na Lei n.° 21/96, de 23/7. Esta transformagao radica no seguimento de ou- tras semelhantes registadas ao nivel de outros paises e justifica-se, em parte, pelas pressées dos préprios parceiros sociais no sentido de as reflectir e adoptar. A protecgao na doenga e as condigées de trabalho foram também abordadas, tendo-se regulamentado as actividades de higiene, seguranga e satide no trabalho (DLn.°26/94, de 1/2), 0s acidentes e doencas profissionais, através da consagracéo do principio de igualdade de direitos em ambas as situacées (DL 22/92, de 14/8) ea proteccéiona exposic&o prolongada ao ruido (DLn.°5/94, de 11/1), porexemplo. A terceira area em anilise é a da protecg4o e promogao dc emprego. Aeste ni- vel apresenta-se como objectivo fundamental o de desenvolver legislago que pro- teja os postos de trabalho existentes e que crie incentivos a sua manutengao, bem como regule os beneficios destinados a protecgao em tempo de nao emprego. A proteccéo do emprego consubstancia-se, designadamente, em apoios fi- nanceiros as empresas (por exemplo, no caso das microempresas), no sentido de evitar a extingao de postos de trabalho, que permitam a estas empresas melhores condigdes para dinamizar a sua competitividade, garantindo a estabilidade dos postos de trabalho. ‘A promocio do emprego abrange a implementacao de politicas passivas de emprego (através de variados mecanismos destinados a incentivar a proteccdo e manutencao de emprego) e de politicas activas de emprego (cujo objecto se centra nas iniciativas de auto-emprego). A este nivel destaca-se, desde jé, a preciso do conceito de promocao de emprego, explicitadonoDLn.°445/80,de 4/10, elemento basilar de ambas as estratégias. As politicas passivas de emprego assumiram diferentes caracterfsticas, tendo sido promulgada legislacao destinada a definir incentivos a criagéo e manuten¢gao de postos de trabalho, a estabelecer incentivos fiscais a sua criag&o em zonas de ele- vado desemprego (DLn.° 301/87, de 4/8) ea fomentar a criacao de postos de traba- tho para jovens a procura do primeiro emprego (DL n.° 89/95, de 6/5). Para estes foi também instituido 0 subsfdio de inserc4o na vida activa). Foram ainda estabelecidos incentivos e apoios financeiros a contrataco (Por- taria 34/86, de 18/4) e apoios a criago de actividades independentes geradoras de 56 Eduardo Vitor Rodrigues, Florbola Samageto, Helder Ferreira, Maria Manuele Mendes e Susana Janusrio emprego (DN n.° 46/86, DN n.° 19/87, de 19/02, e DN n.° 51/89, de 16/06), assim como se permitiu a dispensa de contribuicdes as empresas que admitissem novos trabalhadores (DL n.° 17-D/86, de 6/02). Em todos estes casos os destinatarios foram os jovens a procura de primeiro emprego e os desempregados de longa duragao, pelo que se verifica uma centrali- dade destas duas situagées relacionadas com o desemprego ~ por um lado, as difi- culdades de insercao na vida activa por parte dos jovens e, por outro, as dificuldades de superagdo do desemprego por parte de uma fracgao da mao-de-obra que, por motivo de idade avancada, precariedade de emprego, ina- daptacdo a evolucao das empresas promovida pela pressao competitiva ou por ob- solescéncia de qualificagdes (estas tltimas derivadas das reestruturacdes das actividades econémicas) nao consegue reinserir-se no mercado de emprego.”” Num outro nivel de andlise verifica-se a tentativa de envolver as entidades, no sentido de também estas participarem na promocéo do emprego, sobretudo através de: — apoios aactividade socioeconémica local (DN n.° 46/86, de 29/4), com vista a espoletar projectos geradores de emprego (as iniciativas locais de emprego, cujo regime juridico foi definido no DL n.° 189/96, de 8/10); — _ apoios & formacdo profissional; — apoios a criagdo e difusao dos clubes de emprego ou unidades de insergao na vida activa (cuja criag&o foi regulamentada no DN 179/96, de 3/8). Em termos de politica activa de emprego destaque-se, nao apenas as iniciativas lo- cais de emprego e as acces no ambito do Regime de Incentivos as Microempresas (RIME), mas também a elaboracdo de mecanismos para gerar a base de capital fun- damental para espoletar as iniciativas de auto-emprego. E 0 caso da Portaria n° 264/85, de 9/5 e da Portaria n° 476/94, de 1/7, que permitiram a transformacao dos subsfdios de desemprego a que o trabalhador tem direitonum unico pagamen- to, constituido pelo valor acumulado dos subsidios, destinado a prover o necessé- rio capital inicial. De referir ainda que os projectos enquadrados no Ambito do SIJEe do SAJE se traduziram no surgimento de novas empresas e na criacdo de auto-emprego. O combate ao desemprego assumiu também particular importancia no regi- me de proteccao as pessoas nesta situacdo (DLn.°79-A/89, de 13/05), coma formu- lag&o de medidas de prevenc&o e combate ao flagelo (Portaria n.° 1324/93, de 6/12) ecom a atribuicao de incentivos especiais aos trabalhadores desempregados, para além do subsidio instituido, designadamente com 0 objectivo de fomentar a mobi- lidade e a iniciativa. Parece, desde logo, patente a centralidade de algumas formas especfficas de desemprego, coma generalidade dos diplomas a direccionar-se para o dos jovens e para o de longa durac4o (incluindo neste caso o atrds referido dos jovens e odesem- prego envelhecido). Assim, regista-se 0 aumento dos periodos de concessdo dos subsidios, uma evolucdo resultante da constatagao de que as situagdes de desem- prego podem durar mais tempo do que 0 previsto. POLITICAS SOCIAIS E EXCLUSAO EM PORTUGAL, 57 Foi prestada especial atengiio As zonas de maior volume de desemprego, sur- gindo incentivos especificos destinados a promover a criacao de postos de trabalho ea fomentar a mobilidade de desempregados para zonas de menor incidéncia do fendémeno, através de apoios a trabalhadores nesta situacao, que conseguissem em- prego permanente em areas menos afectadas (DL n.° 225/87, de 05/06). De realcar ainda o langamento dos programas ocupacionais (Portaria n.° 145/93, de 8/2, e Portarian.° 413/94, de 27/6), destinados a criar ocupag6es soci- almente titeis, para serem desempenhadas por individuos em situacgao de desempre- go (estes programas foram também utilizados para o combate ao desemprego sazonal), cujas vantagens passam pelo provimento de m&o-de-obra afecta ao desem- penho de trabalhos necessdrios & comunidade e o provimento de um rendimento aos desempregados, permitindo adicionalmente contribuir para a atenuagao das conse- quéncias pessoais derivadas da falta de emprego (Chen et al, 1994). Ainda incluida nesta area de andlise resta efectuar uma breve alusdo 4 RCM n.° 104/96, de 9 de Julho, na qual se propée desenvolver o mercado social de em- prego. Neste diploma pretende-se definir um quadro de acco que permita impul- sionar e formalizar o mercado social de emprego, através de um conjunto de solugées diversificadas para a integragao e reintegracdo socioprofissional de pes- s0as desempregadas, com base em actividades dirigidas a necessidades sociais nao satisfeitas pelo normal funcionamento do mercado. Igualmente, foi desenvolvida legislacao destinada a controlar a libertagao de pessoal excedente e/ou considerado subutilizado (DL n.° 206/87, de 16/5, Lei n° 114/88, de 30/12, e RCM n.° 26/89, de 28/7), tentando travar as consequéncias sociais negativas que podem surgir com os processos de reestruturagaéo e moderni- zacao empresarial.” A expressividade destes processos aumentou consideravel- mente devido as transformagées registadas no campo econémico (das quais destacamos as que esto relacionadas com a competitividade empresarial) e a pro- pria adesdo de Portugal a CEE, que contribuiu para reforcar a necessidade de mo- dernizacao dos sectores econémicos nacionais. Para minorar os efeitos sociais em caso de dispensa de consideraveis volumes de trabaihadores, foram ainda definidas medidas complementares de proteccao social, no ambito de actividades em reestruturacaio, com o objectivo de minorar os custos sociais destes processos (DL.n.° 291/91, de 10/8). Um exemplo claro encon- tra-se na promulgacao de legislacao sobre as situag6es de pré-reforma, que consti- tui uma das solucdes encontradas para desviar do desemprego uma parte dos recursos humanos excedentes com idade mais avancada (DLn.°261/91, de 25/10). A formacao profissional constitui outra area tematica onde a produco legis- lativa tem sido frequente, passando, partir de 1990, a ser nitidamente considerada como uma importante componente da politica social, enquanto resposta a necessi- dade de desenvolver a denominada qualificagac inicial e promover a requalifica- 40 (que afecta particularmentea camada jovem e demais grupos com dificuldades em encontrar empregos). Torna-se fundamental promover a convergéncia entre a politica de educacao, os objectivos da formacao profissional e as medidas orientadas para a insercdo no mercado de trabalho. 5B Eduardo Vitor Rodrigues, Florbela Semagaio, Hélder Ferreira, Maria Manuela Mendes e Susan Janudcio Em 1991, o Acordo Social sobre a Politica de Formag&o Profissional aponta para uma maior participacao activa por parte dos parceiros sociais e organizagdes nao-governamentais (ONG) nesta area e evidencia o papel da formacao profissio- nal como meio de requalificagao. No ambito da formacio profissional, éimperativo assinalar a definic&o do re- gime juridico da aprendizagem, feita no DL n.° 102/84, de 29/03, posteriormente revisto em 1988 e em 1996 (DLn.° 205/96, de 25/10), bem como a definicao do qua- dro legal da formagao profissional, (estabelecida no DLn.° 401/91, de 16/10). Essa formacao profissional processa-se principalmente em condigdes controladas pelo organismo tutelar desta drea, o Instituto do Emprego e Formagio Profissional (IEFP), e grande parte dos diplomas definem o papel, competéncia (em matéria de formacdo profissional e emprego) e Ambito de actuagao desta instituig&o, e regula- mentam as condigGes de atribuic&o dos apoios técnicos e financeiros 4s empresas que cooperem com 0 IEFP na formacao profissional (DN n.° 112/89, de 28/12, DN n.° 19/90, de 10/3, DN n.°67/91, de 25/3, DN n." 52/93, de 8/4, DN n.° 624/94, de 31/8, entre outros). Uma outra parte da legislacao estabelece disposigGes relativas as prestagdes inerentes a formacao profissional, como as bolsas de formac&o (DN n.° 86/92, de 5/6) e os subsidios complementares de formaco, bem como define juridicamente 0s papéis dos respectivos intervenientes (0s direitos e deveres no caso dos forman- dos — DL n.° 242/88, de 7/7, e regulamentagao da actividade formadora, no caso dos formadores — DR n.° 66/94, de 18/11, ¢e DR n.° 26/97, de 18/6). De referir ainda a producao de legislacao relativa ao Programa Leonarde da Vinci e ao PEDIP — Programa 2 (directamente relacionado com a formagaéo profissional). Por ultimo, destacam-se trés importantes medidas estratégicas: o estabeleci- mento do regime juridico da certificacio profissional, enquanio claro investimento na criaggo de um mecanismo comprovativo de competéncia profissional (DL .° 95/92, de 23/5), o langamento do programa das escolas-oficinas (normalizado pela Portarian.° *414/96, de 24/8) ea criac3o do Instituto para a Inovacdo na Forina- ¢40 — Inofor (DL n° 115/97, de 12/5), cujos objectives de promover e difundir a inovagaona femme profissional poderao traduzir uma estratégia mais global de aperfeigoamento desta importante ferramenta para a requa 40, no sentido de uma maior qualidade e adequacao aos objectivos. A finalizar, imp6e-se uma breve referéncia as prestagSes de ambito social em vigor na drea do emprego. A legislacdo a este nivel destinou-se, em grande parte dos casos, 4 actualizar o valor de referéncia do salario mimo. Alguma da iegislacao relacionada com o emprego pretendeut actualizar e im- plemeniar prestagdes destinadas & proteccao no tempo de nao trabalho, que inte~ gram © conjunto das prestagdes concedidas pela Seguranca Social. Refere-se concretamente o subsidio de desemprego e o subsidio social de desemprego, cujas condigdes de requerimento e atribuigao foram objecto de regulamentagao eactuali- zacao, bem comoas prestacdes pecuniérias por acidentes de trabaihoe os subsidios de insercaona vida activa. Foram ainda instituidas as bolsas ¢ os subsidios comple- mentares de formagao (na area da formagao profissional) e assistiu-se & POLITICAS SOCIAIS B EXCLUSAO EM PORTUGAL 59 generalizacdo, extensiva a todas as categorias profissionais, dos subsidios de Natal ede férias, Finalmente, podem sistematizar-se os aspectos mais importantes desta evo- lugao legislativa: — a tendéncia de transformagao do conceito juridico de trabalho, a qual tera provavelmente induzido algumas mudangas no significado social e no con- ceito de trabalho (ligada a uma diferenciagao crescente dos tipos de trabalho), provocando alterages ao nivel do tempo e condi¢ées de trabalho; — acentralidade do tema do desemprego (patente na prépria frequéncia com que é abordado a todos os niveis, particularmente no discurso politico), que traduz o aumento das preocupacées e origina medidas destinadas ao seu combate, nomeadamente pela criagdo e manutengao de postos de trabalho, pelas iniciativas de auto-emprego, pelos incentivos a mobilidade e pela cons- tituicao do mercado social de emprego; — aarticulagéo do desemprego com o mercado social de emprego, onde se des- tacaanecessidade de integrar a accao de todos os parceiros sociais, de formaa promover uma estratégia concertada de fomento do emprego e diminuicgao do desemprego; — opapel da formacio profissional como meio de qualificacaio e requalificagao, que se pretende inovadora, eficiente e em ligacao com as necessidades do mercado de trabalho; — a territorialidade de algumas medidas ao nivel do emprego, visando situa- Ges especificas de reestruturacdo das actividades produtivas (o caso do vale do Ave) ea dinamizacao da actividade socioeconémica local, subjacente em medidas como as UNIVA e as ILE. Educagao Relativamente as politicas sociais na drea da educac&o, podem distinguir-se trés fases. A primeira fase corresponde ao perfodo 1974-1976, caracterizada pela vigén- cia dos governos provisérios e pela instabilidade politica. Este perfodo é considera- io como um dos mais conturbados em toda a historia do sistema educativo (Grilo, 7996). Contudo, acrescente-se que, apesar do clima conturbado, este perfodo co- sheceu alguns projectos interessantes, como, por exemplo, a criacdo do Instituto Nacional de Investigagao Pedagogica e o langamento dos centros regionais de apo- > pedagégico, onde o vector da descentralizagao, ainda que embriondrio, surge smt&o ja como preocupagao. Asegunda fase corresponde ao perfodo compreendido entre 1976 e 1986 (que nicia com a entrada em fungées do I Governo Constitucional), durante a qual se iste ao aparecimento de medidas igualmente pertinentes para o

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