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BBS ToC EL bat A ELABORAGAO DE NARRATIVAS EM AULAS DE FisICa: a aprendizagem em Ciéncias como manifestagao cultural Iva Gurgel Coordenagao jo Pietroc into de Oliveira Si Paulo (EUSP) ‘A elaboracio de naratvasem aml de Fie: 3 apeendiagern em Giéncas como manifesagio culeral Copysight © na rel, Graciela Wate, 2012 Tadao dren reseragon 8 EDITORA FTD 8. Mati: Rua Ru Barbas, 150 -Bea Vint -SSo Pal ‘CEP 01526010 Telefon (OX-11) S5986000 Caiea Postal 65149-CH a Cana Postal 01590970 Internet fon. be emai ensne neti com.br Diretora editorial Silmara Sapiense Vespasiano Editores Juliane Matsubara Barroso Leonardo Gonealves Lago Assistentes de produgaio ‘Ansa Paula Iazzeto Lita Pines Assistente editorial Cauda Denise da Producio editorial LEDE textos educacionais Coordenador de producao editorial Caio Leandro Rios Edigho de arte, projeto grifico capa Fabiano Matiano Thustragdes de capa Roberto Weigand Teonograt Pesquisa Eliana Almeida Assitincia Cristina Moa Diagramagio Setnp Bureau Editoracio Eletoniea Lda. Tratamento de imagens Ana Isabela Pithan Marasehin Gerente exeeutivo do parque grafico ‘Reginald Soares Damasceno ads nro de alg ma alto C1) (Clie ai oie, SP, ai). A abraded Fi ssprenngen en Ca coe mera aa tht Gone, Graciela Wats ;corteraglo Manco Frond Pn de On. ~~ Sto Palo TD, “Sei Profesor Incas) i Isaviesaeees |. Gnas -Eando ene? Fad eno SP deminer de ies Frac psa as de ase Waal, Gc HE Ober. Moco Perc P ded W eon: Inde yr alge ie: Ta fsodoeeneno 7 Narrativas da cultura e Ensino de Ciéncias 1.1 Apatia, desAnimo e indisciplina como sintomas das diferengas culturais As priticas de ensino e a organizacio da escola yém sendo muito questionadas nos tempos atuais. Mesmo quem nao se dedica diretamente res de alunos, consegue & educacio formal, como os pais ¢ outros famil notar que ha algum problema a ser enfrentado ¢ que a forma como 0 ensino vem sendo organizado nas tiltimas décadas exige mudaneas. Quem s denadores pedagégicos € outros agentes que participam da educacio, dedica diretamente ao ensino, isto é, professores, coor rado. também percebe que 0 trabalho escolar nao funciona como pritica de As pretensdes que eles tinham quando decidiram se dedicat educador parecem dificeis de ser alcancadas. O professor que esti em sala de aula se sente desarmado, pois 0 que cle acreditava ser um bom modelo de aula nao se aplica a essa realidade. © cenario mais comum que encontramos no ambiente escolar 0 a apatia ¢ o desinteresse dos alunos, que parecem n der o que esto fazendo na escola. Por mais que 0 professor se esforce em apre- sentar 0s contetidos de forma simples, que busque fazer atividades com participacdo ativa dos alunos, ou mesmo que trate de conceitos relacio- nados com 0 cotidiano dos estudantes, aparentemente isso nao é sufi- ciente para a melhoria educacional. Apesar de todo o trabalho, muitos, alunos ainda se mantém distantes. Quando as melhores aulas so minis- tradas, as vezes, é produzida uma faisca de interesse, mas raramente cla se mantém como um vinculo permanente. nega de forma alguma, 0 papel do coletivo na constituicdo do pensamento, colocando 0 cultural como din mico, passivel de modificagdes pela cria- 9 um dado a priori. Antony Giddens (2002) chega a um posicionamento muito semelhante quando trata de um problema Ao individual, e ni parecido: a relago dos individuos com as estruturas sociais, Para ¢ individuo nao é um escravo do social, mas um realizador dele. ‘A claboragio de narrativas om aulas de Fisica 28 O posicionamento anterior permite a Bruner questionar o papel das narrativas como meios de comunicacio, pois, para ele, 0 contar his- t6rias é uma forma de transmissio cultural. Ao considerar que o indivi duo intervém e cria sua cultura, as narrati essa cultura se estabelecer € se torr lida com a realidade exterior. passam a ser um meio de uma forma de pensamento que Quando se estabelece esse papel para as narrativas, uma questio que pode ser pertinentemente proposta é: por que elas cumprem esse papel € 0 que as diferencia de outras formas culturais de apreensio do mundo sxterior? Para responder a essa questo, com base nesse autor, € preciso considerar como ele define uma narrativa. Bruner (2002) define uma narrativa, independentemente de sua natureza, como uma dialética entre 0 que produz de fato. Para que haja uma hist6ria, é preciso que algum ev to imprevisto sobrevenha. Uma hist6ria, considera Bruner, é sensivel a tudo que é contririo ao nosso senso de “normalidade”. Sendo esse um padrao geral das narrativas, 0 que define o tipo de historia é a situagao descrita ¢ a solucao dada ao impasse. nds esperamos € 0 que se Essa forma ampla de consider narrativa nos permite afirmar que, a principio, qualquer tema ou questio pode ser tratado levando em cor esse modo de pensar. Além disso, do ponto de sino em geral, € interessante verificar que, se a narrativa envolve a produ- ao do novo em relagio As expectativas, ela pode ser caracterizada como idanca. Se 0 ato de educar é uma forma de promo- ver mudancas no sujeito, entao as narrativas podem fazer parte desse tra- ista dos processos de er um instrumento den balho. Sobre esse aspecto, 0 autor ainda aponta um elemento adicional: Uma grande n A nos convida a expor problemas. Ela nao esta I para simplesmente dizer como resolvé-os. Ela nos fala de uma situa. 10 de crise, de um caminho a percorrer € nao nos leva a um refiigio. BRUNER, J. Pourquoi nous racontonsnows des Histories?: Le Rit au fndoment dela culture de Videntéindividuele Paris: Agora, 2002 p. 83. (Tradugio dos autores.) Com isso, vemos que a narrativa nao é uma forma simples de explorar os acontecimentos, € que nao € a clareza em explorar os fatos que torna uma narrativa boa. Pelo contrario, éa capacidade de lidar com contextos ou situacées adversas, problematicas ¢ até mesmo contraditérias que faz de uma narrativa um bom instrumento para lidar com o desconhecido. Para que esse trabalho seja realizado, os elementos que compdem uma narrativa precisam ser reorganizados. A disposicdo dos “persona- gens”, seu enredo € as formas como o natrador os vé precisam mudar justamente esse proceso de mudanga que permite que elementos sejam reinterpretados para estabelecer a ordem. O que torna o proces- so interessante, de acordo com o autor, € que esse proceso se di no sujeito. Por ele nao ser imparcial ou neutro, pode reconstruir sua forma individual de interpretar a realidade exterior Ointer sante em falar de reconstrucdes € que vemos como 0 novo € 0 ja estabelecido tém uma relacio entre si. Reconstruir nio é nem deixar as coisas como sio, nem claborar algo a partir do nada. Tal pro- cesso reflete bem a dialética entre individual e cultural. Isso leva Bruner (2002) a uma considera © importante para esse trabalho, que se refere a0 processo de construgao de narrativas em relacdo a certas habilidades de pensamento, Podemos caracterizar a elaboracio de urrativas como um processo de criacio, com base na imaginacdo, mas que nao é alheio propria realidade ¢ &s formas de culturas estabelecidas. Esse ponto é particular mente importante para o trabalho educativo, pois se espera que 0 cons- truto do aluno nao seja uma construcao qualquer, mas algo em alguma medida compromissado com a cultura que o aluno apreende dura nte 0 processo de escolarizacio, Essa forma de ent nder as narrativas e © processo educacional yao ao encontro de como © autor entende papel da escola. Para Bruner (2001 [1996]), pensar a educacao € refletir sobre as formas cul- turais de uma sociedade. Isso ocorre porque a maneira como entende- mos nossa prépria cultura € que determina o que se considera o papel da escola ¢ delimita os objetos de ensino. A ola, como qualquer instituicao social, nao é alheia A cultura. Contudo, pelos motivos ja apontados, ela nao deve apenas reproduzir a cultura vigente em algum campo. Essa apropriacio deve considerar que o aluno se apropria de determinadas “ferramentas culturais” para com elas produzir “artefa- tos culturais” (BRUNER, 2001[1996]) © autor afirma ainda que o proceso educative tem a funcao de transmitir ferramentas culturais, fazendo consideragdes muito préxi- A elaboracdo de narrativas em aulas mas do que hoje passamos a chamar de letramento e, no contexto do Ensino de Ciéncias, letramento cientifico. Contudo, como Bruner con- cebe a cultura de uma forma diferente, conside ndo-a nao algo pre- definido, mas sim uma dinamica em que os individuos se apropriam de seus elementos para criar concepgdes prdprias de ver 0 mundo, os tipos de ferramentas as quais ele se refere se tornam um pouco diferentes do mente as correntes de ensino determinam. E isso que per- mite ao autor pensar nas narrativas como parte de diferentes culty inclusive a cientific Ao refletir sobre © ensino das Ciéncias, Bruner reconhece que muitos avancos ocorreram nas suas formas de instrugao. Gontudo, 0 ico desse ensino pode ser um dos motivos para que continue sendo inacessivel aos alunos. Assim, o autor considera pos- sivel que te carter ainda est hamos “err: Jo” ao separar a Ciéncia da narrativa da cul tura. A partir disso, ele d4 indicagées do uso de elementos da historia da Ciéncia como meio de mostrar a Giéncia em construcao, propondo algo muito préximo das propos s de Steven Klassen, apresentadas an- teriormente. No entanto, Bruner (2002; 2001 [1996]) desenvolve mui- to pouco as indicacées especificas ao ensino das Ciéncias. Isso eviden temente acontece por nao ser esse 0 foco do autor nosso trabalho buse Com base nessas propostas, daqui_ por diante, investigar como as narrativas podem, efetivamente, fazer parte das aulas de Ciéncias. Em nosso estudo, levaremos em conta o ensino de ca deste livro. Fisica, visto que essa é a linha espec 1.7 As narrativas como expressdo cultural e fundamento da aprendizagem O desatio aproximar a conhecem como parte de sua identidade. O problema foi coloc: considerando a criagéo de vinculos entre Ciéncia € outras cultu roposto neste livro consiste em encontrar formas de cia de manifestagdes culturais que os sujeitos 1 as. A importincia da criagao desses vinculos vem da necessidade de evit nas aulas de Ciéncias conflitos culturais, que s4o tidos como as raizes de problemas como indisciplina e apatia dos alunos. De acordo com © exposto acima, a criacdo de vinculos com 0 conhecimento cientifico a7 28 permite o engajamento dos alunos nas atividades de ensino, € o resulta- do da aprendizagem pode ser verificado através de suas manifestacoes culturais, elaboradas tomando contetidos, problemas, embates ¢ outros elementos da cultura cientifica como base. n ter diferentes formas de se expressa Os individuos pode: cult ralmente, ¢ cada grupo pode se reconhec ficos de ma- m tipos espe nifestagdo cultural. Por exemplo, alguns elege n © hip-hop © o grafite como expresso de sua cultura, enquanto outros preferem a literatura € a misica popular brasileira. Cada grupo cultural faz determinada com- binacio de formas de se expressar que passam a defini-lo. Apesar da multiplicidade de manifestagées culturais, podemos per guntarse exis delas. Como vimos com Jerome Bruner, as narrativas podem ser ente c algo de comum em todas elas ou, 20 menos, em algumas didas como uma forma quase natural de interpretarmos a realidade que nos rodeia ator, um interessante perceber que, de acordo com esse conjunto de eventos, fendmenos ou ideias passa a fazer sentido quando se insere em uma mesma fativa, Assim, 0 pensamento narrativo & con: siderado uma forma basica de se expressar culturalmente. Apesar de algumas manifestag6es culturais, como as artes plisticas, fugirem a natureza do pensamento narrativo, diferentes formas de se pressar tém como base a narrativa. Um conto, uma peca de teatro, al gumas miisicas € poesias, uma novela, quadrinhos, filmes (mesmo que g ) podem ser considerados exemplos de narrativas Manifestacdes que nao tém um cunho artistico também podem ter o pen- dos no celu nto narrativo como base. Por exemplo, uma carta, 0 relato de uma noticia, uma 1 de blog net so manifestagSes culturais com base em narrativas. ‘por um post no Facebook ou um comentario em uma pagina da inter- gem de jornal, um jogo em formato RPC Como sintese dessa dis ‘do, consideramos que a aprendizagem em Ciencias pode se dar por meio da elaboracao de diferentes manifes- tages culturais pelos alunos; o proprio ato de criar deve ser 0 exercicio principal em sala de aula. Assim, nosso convite consiste em pensar em como criar oportunidades pa que os alunos elaborem narrativas. No préximo capitulo, indicamos alguns obstéculos e dificuldades dessa natureza sio elaboradas. que podem ocorrer quando proposta

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