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A imagem de Proust 1 Ocrreze otumes de Al recherche du tomps perdu, do Marcel Prout oo resultado J uma sitese impose, ea ual 8 abvoredo do mio, ate do prosaor, vere 00 Sor strc, o saber do erudito «a eoncentragio do mono- maniac se condensam noma ore autoblogrfics. 4x ds, ‘om rain, que fodar a grande obras errat ou aug: fam tm géoero ou 0 ukrspassam, into, consiuem can ceepclonais, Mas eta € uma das menos clsiichvei. A co mega pela estrutura, que conju poesia, « memoria Cocomentiroy até a sintese com uns frases torrencii (am Niloda linguagem, gue ranaborda nes panies da verdade fetes), ado agul exede anorma. Que esse grande iso excepcional de erature constitu 20 mesmo fempo & ‘rai relizapto erin das Gites dGeadas € 8 primeira ‘bseracd, mulonstrutiva, qu se imple ao eco, AS com ‘ies que serra de fundaments a essa obra sb crema mente masts Uma doenea isla, uma rqueraincomum, ‘uma dsposiglo norma Nem tudo ns vida € moder, ‘as fudo 6 exomplar. Ela abut A obra teria mais emi tonte dos nono ass gar no coreg 6 Smponsie, 0 etre ao mesmo tempo no ponte de indferenca de Oda 0 Deron, «caracterisn eta grande “obra de toda uma vida ‘Somo 2 hima, por mato tempo. A imagem de Proust é a Iman ats expreo fronts que a escent dsrepdnca ‘MAGIA E TECNICA ARTEE POLITICA ” entre poese vida poderia assumir. Bis a moral que justifcn oss tentativa de evocar esa imager ‘Stbemos que Proust nio deserevew em sua obra uma vida como ela de fato fo e sim uma vida lembrada por quem a ‘teu. Porém esse comentario ainda € difus, e demasiada- rmente grosseir. Poiso importante, para autor que reme- ‘mora, no éo que ee vveu, mas 6 tecido de sua rememer (io. o trabalho de Penélope da reminiscEncia. Ou seria prefe rel falar do trabalho de Peolope do esquecimento? Ame ‘mira invahuntéra, de Proust, no esth mas proxima do es accimento que daguile que em geal chamamos de reminis ‘incia? No sera ese trabalho de rememorapto espentinea, ‘cn que a recordaedo a trama.co exquecimento a urdidura, 0 ‘posto do tabalho de Penélope, mais que sua cbpia” Pois sui €o dia que desfazo trabalho da note. Cada man, ao ‘Scordarmos, em geal fracos ¢ apenas semiconsientes, sca amos om nossa mdos apenas algumas franjas da tapevaria ‘ds exsténiavivida, tal como o esquecimento a teceu para os. Cada di, com suas ede intenconals , mais ainda, com ‘ua Feminiseénciasintecionas,desfaz os fos, os omamen- ‘os do olvido. Por isso, no final Proust tansformou seus dias fm notes para dedieer todas as suas horas ao trabalho, em Ser perturbado, no quarto escuro, sob uma luz arial, no tin de mo deixar escapar nenhum dos arabescos entrela- sados. ‘Serexto significa, para os romanos, a neahum texto € mais "wecido” que o de Proust, ¢ de forma ‘unis densa, Para ele, nada ea suficientemente densoe dura- ‘douo. Seu editor, Gallimard, narrou como os hibitos de r= visto de Proust leravam os tip6grafos ao desespero. As prowas ‘ram devolvias com as margens completamente esritas. Ox {ros de imprensa nto eram corrigidos: todo espacodisponiel fra preenchido com material novo. Assim, let do esquec- ‘mento se exersi também no interior da cba. Pie m acon {ecimento vivido€ finito, ou pelo menos encerrado nn eslera o vivid, a0 passo que o acontecimentolembrado & sem li mites, porgue € apenas uma chave para tudo o que veto antes © depois. Num outro sentido, € a reminiseénea que preserve, ‘om rigor, o modo de textur. Ou sei, a unidade do texto ext Spenas no actus purus Ga propria recordario,c no na pessoa ‘do auior,e muito menos na agio. Podemos mesmo dizer que ilo que se tee, ‘as intermiténcas da a¢30s20 0 mero rovers do continuum da ‘ecordago, o padrio invertdo da tapegaria_ Assim o queria Proust, © asim Jevemosintrpretio, quando afirmava pre ferir que toda aso obra foseimpressaem um dnico volume, cemcoluna dupla, sem um nico parigrafo. ‘O gue procuraa le to frenetieamenie? O que estava na ‘base dese efor interminivel? Seria icito dizer que todas es vidas, obras e ages importantes nada mais sbo que o desdo- bramentoimpertubivel da hora mais banal e mais efémers, ‘mais sentimental e mais frigil da vida do seu autor? Quando Proust descreve, numa passagem célebre, essa hora suprema- ‘mente significatia, em sua propria vida, ele o fz de tal ma- ‘ei que cada um denésreeacontra ess hora em sua propria. ‘existence. Por pouco, poderamos chamé-la uma hors que s¢ Fenete todas ot dias Ela vem com & noite, com um srrulho perdido, ou com a respiragio na balaustrada de uma janela fberia. Nio podemos prever os encontros que nos esiariam ‘estinados te nos tubmetssemos menos a0 sono. Proust nto Se submetia 20 sono. E, no entanto, ov por isso mesmo, Jean Cocteau pide dizer, num belo ensaio, que a cadéncia de sua ‘or obedeia 8s es da noite edo el. Suabmetendo-se noite, Proust wencia a tristera sem consolo de sua vida interior (que fle uma ver desereven como *Timperection incurable dans essence méme du présent"),e consru, com as colméias da ‘meméria, uma case para © enuame dos seus pensamenos. Cocteau percebeu aqullo que ever preocupar, em alissimo tra, todo letor de Proust ele viv 0 deseo de felicidade — ‘ego, imensato © frenco — que habitara ese homem. Esse Sescjo brithara em seus olhos. Nao eram olhos flzes. Mas a felicidad estava presente nels, no sentido que a palavra tem ‘no jogo ou ne amor. No € dif compreender por que esse ilacerante € explesivo impulso de feiidade que atravesa toda a obra-de Proust pastou em geral dspercebido a seus letores.O proprio Proust estimalow-os, em muitaspassagens, 4 considerar sua obra na vlha e cbmeda perspeciva da pr ‘apo, do herelsmo, do ascetismo. Neda 6 mais evident para ‘salunos-modelo da vida que uma grande realzagto€o futo ‘exclusive do esforgo, do sotrimento eda decepgde. Que a fel ‘dade também pudese participar do Belo sera uma bénglo ‘ees ¢ 0 resentment esas pests uma era con Mas exist um duploimpulso de felicidade, uma dilética «i felichdade- Uma forme da felisidade&hino, outa €eegia. ‘Xtleidade como hino €o que mio tem precedentes, 0 que ‘umes fo aige da beatitude. A felicidade como eles € 0 ‘lero mais una yer, a eterna restaurato da felicidade pri- ‘nei e original & essa iia elegiaca da felicidade, ve tm ‘hom podemos cham de eedties, que para Proust transforma 2 eusténla na loresta eneantada da recordapo. Sacrificon a ‘st idea, em sua vida, amigos e sciedade, ccm sua obra, 4 ‘Sito, « unidade da pessoa, 0 foxo da arrativa, 0 Jogo da ‘Inaginaglo, Max Unold, que no fio plor dos seus letores, {tlerindose ao "tédio”resultante dese procedimento, com ‘parow as narraivas de Proust com “historias de cocteir le conseguia tornarinteressanes as histrias de eocheio. le dis imagine cao letor,ontem eu mergolbel um boinho roma icara de chi eento me lembrei que tina morado no ‘Sampo, quando eranga. Para dizer iso, Proust usa oitenta Pinas, €ofaz de modo to fascinante que delxamos de set Sorintes, © nos identeamos com 0 proprio narrador desse sonko acordado". Nessas historias de cocheiro — "todos 0s ‘onhos habitus se convertom em histrias de cocheio, no Darts noveseriamente do sonho. Portas impercepives » cle Conduzem. Enele que se enralaa o efor frentico de Provst, eu calta apaizonado da semethanga. Os verdadeiros signs tm que se deeobre 0 dominio da somethanga nto esto onde ‘lear descobre, de modo sempre desconcertanteeinesperado, fs obras, nas siooomias ou nas maneiras de falar. A seme: thanga entre dois eres, a que estamos habituados e com que ‘or confrontams em estado de vila, € apenas um reflexo imprecso da semelhanga mais profunda que rena no mondo

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