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... umt homem organizado e met6dico, que queria classificar os conceitos humanos... Sofia aproveitou para dar uma escapada até o esconderijoer- quanto sua mae tirava uma soneca depois do almoco. Ela ps um torrdo de acticar no envelope rosa e escreveu “Para Alberto” no lugar reservado ao destinatério. Nao havia nova correspondéncia, mas bastaram apenas al guns minutos para que ela ouvisse o cachorro se aproximando. — Hermes! — gritou Sofia. Logo ele jé estava 14 dentro, com um grande envelope ama- elo entre os dentes. —Menino bom! Sofia passou um braco em volta de Hermes enquanto ee of gava de alegria, Depois ela apanhou o envelope rosa e posna boc do cachorro, que imediatamente se arrastou para fora do esconde- tijo e desapareceu por onde tinha vindo. 4 Ela estava um tanto nervosa quando abriu o envelope. S que haveria alguma coisa sobre a cabana e 0 bote? 7 Seu contetido eram as mesmas paginas presas por um IPP Mas também havia um bilhete, que dizia: i Querida senhorita detetive! Ow senhoritaimasora, pat "8 exato. 120 Jédei parte na policia.. Estou brincando. Nao fiquei assim to bravo. Se voc for tio curiasa assim para resolver os enigmas da flosofa, terd um futuro promissor. O chato disso tudo & que ew vou ter que mudar de casa, narratives 62 um total @ setenta ttulos, 0 trata de obras comple poca de Aristleles # igs0, até 05 mais recent Antigua 2 que qarets as, mas de floss NAO HA IDEIAS INATAS Como 05 fildsofos que vieram antes dele, Plato queria desco- algo eterno e imutével num mundo cheio de transformacées, Entdo ele chegou as ideias perfeitas pairando sobre 0 mundo dos sentidos. Platdo dizia também que as ideias eram mais reais que to- dos os fenémenos da natureza. Primeiro vinha a ideia de “cavalo”, e s6 depois surgiram todos os cavalos desfilando como sombras na parede de uma caverna. A ideia de “galinha” também vinha antes da prépria galinha ¢ do ovo. Aristételes achava que Plato tinha virado tudo de cabeca para baixo. Ele concordava com seu mestre quando este dizia que um cavalo “flui” e que nenhum cavalo viveria para sempre. Concordava também que a forma do cavalo é etema e imutavel. Mas a “ideia” de, cavalo no passava de um conceito criado pelos homens depois de terem visto uma certa quantidade de cavalos. A "ideia" ou a "forma de cavalo nao existe por si s6. A “formal” de cavalo consiste, para Arist6teles, nas caracteristicas do cavalo — ou naquilo que hoje em dia chamamos de espécie, Serei mais preciso: com a “forma” de cavalo Aristoteles se re- feria aquilo que €comum a todos 08 cavalos. E aqui ndo estou me referindo mais as formas de biscoitos, pois elas existem indepen- dentemente da existéncia dos biscoitos. Aristételes nao acreditava “na existencia de tais formas, por assim dizer, guardadas num arma- Fio na natureza. Para ele, as “fOrmas"esto dentro das coisas: elas ‘sdo as suas caracteristicas que as tornam tinicas. Aist6teles discorda de Plato quanto a ideia de “galinha” vir antes da prépria galinha. Aquilo que Aristételes chama de “forma”? 4 jlar de galinhana Terra, como as ca- racteristicas que distinguem as galinhas das demais coisas — a ca- pacidade de botar ovos, por exemplo. Assim, a propria galinha @ a E, assim, na verdade resumi teoria das ideias de Platio. Mas vocé deve ter notado que nds esta- mos falando de uma mudanca dramética na forma de pensar. Para Platdo, 0 mais alto grau de realidade esté naquilo que pensamos com a razio, 123 = _dade esté naquilo que sentimos com 0s sentidos, Pato dg, que vemos a0 nosso redor na natureza S50 apenas refleyeg yi” que existe de forma mais real no mundo das ideias — opty? também junto da alma humana. Aristételes achava examen, posto: aquilo que existe na alma humana nao é senao . objetos na natureza. E é justamente a natureza que é 0 mund rs, Segundo Arist6teles, Platao estaria confinado a uma moldura mies de mundo, na qual a realidade era substitufda por uma representa ‘cao criada pelos homens. ‘Aristételes achava que ndo existe consciéncia nenhuma que antes nao tenha passado pelos sentidos. Plato poderia ter afima- do que nada na natureza existe sem que antes tenha passado pelo mundo das ideias. Dessa maneira, Arist6teles acredit ‘“duplicava a quantidade das coisas” que existiam. Ele descrevia um Ginico cavalo demonstrando a ideia de “cavalo”, Mas que tipo de descricao € essa, Sofia? De onde ven a “ideia de cavalo", eu per- ‘gunto. Existiia também um terceiro cavalo — do qual aideia de cavalo seria apenas uma imitagao? ‘Arist6teles dizia que tudo que pensamos, tudo que temos den: tro da cabega, s40 coisas com as quais travamos contato através do que vimos e ouvimos. Mas também teriamos uma razio inala. Temos uma capacidade inata de ordenar todas as impresses per cebidas pelos nossos sentidos em diferentes grupos e classes. Foi assim que surgiram os conccitos de “pedra”, “planta’, “animal” € “ser humano”. Foi assim que surgiram conceitos como "cavalo", “lagosta” e “canario”. Aristételes nao negava que nascéssemos dotados de ra20. Ao contrdrio, a razao € justamente a mais perceptivel caracteristica do ser ‘humano. Mas nossa razao é inteiramente “vazia” antes que ten sentido algo. As pessoas, por conseguinte, nao possuem ideias nates: AS FORMAS SAO AS CARACTERISTICAS DAS COISAS deb de esctareer sum posigfoem reac ern eis le Platéo, Aristételes constatou que a realidade consist “tes coisas individuals que integram um conjunto de formes 1 88° me _—atf enquanto 2 Imagine que, na sua frente, ura galinha bata as asa, Sofia. A sua forma é exatamente o bater das asas — e também o cacarejar ¢ o botar ovos. Quando a galinha morre — e assim deixa de bater as asas —, sua forma também deixa de existir. Tudo que resta é a “substancia” da galinha (que coisa triste, Sofia!), mas ela nao é m: uma “galinha". Como eu disse antes, Aristételes interessava-se pelas transfor: a mM na naturezai Na “substancia” sempre hd ay -possiblidade de surg uma determinada “format. Podemos dizer i se esforca para materializar uma possibilidade » de si. Cada mudanga ocorrida na natureza, segundo Arist6teles, 6 a transformagao de uma substancia— de uma “possi- bilidade” para uma “realidade”. O.k,, explico melhor, Sofia. Vou tentar recorrendo a uma hist6- ria engracada: era uma vez um escultor que vivia debrucado sobre um bloco de granito. Todo dia ele martelava e lixava aquela pedra disforme, até que um dia recebeu a visita de um garotinho. “O que vocé esté tentando encontrar?", perguntou o garoto. “Espere e vera”, respondeu 0 escultor. Depois de alguns dias o garoto voltou e 0 es- cultor tinha transformado aquele bloco de granito num lindo cava- lo. Surpreso, o garoto ficou um bom tempo paralisado observando ‘© cavalo. Entao, virou-se para o escultor e disse: “Como vocé sabia que ele estava ali?”. Pois 6, como é que ele sabia? O escultor, de alguma maneira, havia enxergado a forma do cavalo dentro do bloco de granito. Pois aquela pedra tinha em si uma possibilidade de se transformar em cavalo. Era assim que Aristételes dizia que todas as coisas na natu) | uma possibilidade de nsformar ou de se tornar fa “forma” ‘Vamos voltar 8 galinha e ao ovo. Um ovo de galinha traz em sia possibilidade de se tornar uma galinha. Isso nao significa que todos os ovos vao se transformar em galinhas, alguns vao parar na mesa da cozinha — fritos, cozidos ou mexidos numa omelete — sem que a forma inerente ao ovo se materialize. Mas fica claro tam- bm que um ovo de galnha nao vai se ransformar num ganso: Ess) 125 _ possibilidade ele nao traz em si. A “forma” de uma coi apenas sobre a possibilidade dessa coisa, mas também s. -limitagées.: Quando Aristételes fala das “formas e “substancias di sas, ele ndo se refere somente a organisms vivos. Asim comp ¢ proprio da “forma” da galinha cacarejar, baterasas ebotr ove ¢ pr6prio da forma de uma pedra cair no chao. Assim como a alin “no consegue deixar de bater asas, “de cair no chao: Voce pode apanhar uma pedrae atié-a bem a mas, como é da natureza da pedra cair no chao, voc8 jamais con seguird arremessé-la até a Lua. (Tome muito cuidado se for realizar esse experimento, porque a pedra pode querer se vingar. Ela volta para o chao da maneira mais répida possivel — e nao quer nem saber do que estiver no meio do caminhol) sa di ig Pobre assay OS PROPOSITOS DAS CAUSAS Antes de deixarmos de lado o fato de que todas as coisas, vives ‘ou mortas, tém uma “forma” que indicaria algo sobre suas possives “realidades", devo acrescentar que Aristteles tinha uma visdo bem -definida das relagées de causa e efel No nosso dia a dia, quando falamos em “causa” disso ou daqui- Jo, estamos nos referindo a comoas coisas acontecem. A vidraga que- brou porque Petter atirou nela uma pedra, um sapato surge porque um sapateiro costurou alguns pedacos de couro, Mas Arsttles dia que ‘Ao todo ele mencior nou quatro tipos diferentes. O mais importante é compreender 0 qe ele quis dizer com 0 que chamou de “propésitos das causas". Quanto a vidraga estilhacada, naturalmente é razodvel ergy tar por que Petter arremessou a pedra. Nos queremos saber qual teria sido a sua intengdo. Que a intengao ou “propésito" desempe ‘sha um papel importante também na feitura do sapato, disso ni ‘guém tem daivida, Mas Aristételes contava com um |28.causas” também para explicar processos naturais inanimados, seja, sem vida, Por que chove, Sofia? Na escola certamente voce aprende! 126 que chove porque © vapor d'égua nas nuvens se resfria e se con- densa na forma de gotas, que se precipitam na Terra por aco da gravidade. Arist6teles ndo iria negar essa explicagdo, Mas ele acres- centaria que até aqui vocé mencionou apenas trés causas. A “causa! sarc 6 que a umidade (as nuvens) estavam ali quando 0 ar esfriou. A “causa’atuante” é o resfriamento do vapor dagua, e a ““equsa formal!”€ 0 fato de a agua se precipitar no chio devido a isso ser inerente a sua forma. Se vocé ndo conseguiu ver nada além dis- s0, Arist6teles iria acrescentar que chove porque animais e plantas precisam de agua para viver. A isso ele chamava de “propésito da) " causa”Como vocé pede ver, Aristételes atribuiu as gotas de chuva -_uma tarefa vital,/ou uma “intengdo”. Nés provavelmente irfamos inverter as coisas e dizer que as plantas crescem porque ha umidade. Percebe a diferenca, Sofia? Arist6teles dizia que existe uma inteng&o por trés de tudo na natu- reza. Chove para que as plantas crescam,e laranjas e uvas brotam para que nds possamos comé-las. ia pensa hoje em dia. Dizemos que comida e umidade so precondicdes para que animais e homens possam viver. Se ndo fosse por essas precondigdes, nés simplesmen- {endo existirfamos. Mas no 6 inteng3o da Sgua ou das laranjas nos sustentar. No que se refere & sua visdo das causas, ficamos tentados a achar que Aristételes estava errado. Mas no vamos apressar as con- clusdes. Muitas pessoas acreditam que Deus criou 0 mundo exa- tamente assim para que homens e animais possam viver aqui. Se pensarmos desse modo, podemos dizer que a agua corre nos rios porque homens e animais precisam dela para viver. Mas af afirma- Temos 0 propésito ou a intengo de Deus, e no que as 4guas da chuva ou dos rios desejem 0 nosso bem. LOGICA A separagio entre “forma” e “substancia” tem um papel impor- tante quando Aristételes vai descrever como o homem reconhece as 17 Eu vejo um cavalo, dep Outro, € um terceira, og cavalos nao so iguais, mas hd E assim nés vamos pelo mundo, organizando as coisas com rotulos diferentes. Colocamos as vacas no curral, 0s cavalos ng testébulo, 0s porcos na pocilga e as galinhas na granja. © mesmy ‘corre quando Sofia Amundsen vai arrumar 0 seu quarto, Ea pde ‘0s “livros” na estante, os “livros escolares” na mochila e as tevis. tas na cémoda. As roupas so dobradas tho e colocadas no ‘guarda-roupa — calcinhas numa gaveta, blusas em outra,e meias hum compartimento prdprio para elas. Preste atengdo como faze- mos a mesma coisa dentro da nossa cabega: a \Vocé est acompanhando, Sofia? Aristételes queria dar uma bela arrumada no quarto da jovem natureza. Ele tentou demonstrar que ‘ha natureza pertencem a diferentes grupos e (Hermes 6 um ser vivo, mais precisamente um animal, mais precisamente um vertebrado, mais precisamente um mamife- +0, mais precisamente um cachorro, mais precisamente um labra- dor, mais precisamente um labrador macho.) \Vé até 0 seu quarto, Sofia. Apanhe qualquer objeto do chic. Nao importa 0 que vocé tenha escolhido, voce vai descobrir que Se algum dia voc® visse algo ‘que no conseguisse classificar, iria ter um choque. Se vocé, pot exemplo, depara com um pedacinho de algo e nao consegue dize com preciso se aquilo pertence ao reino vegetal, animal ou mine ral, tenho cetteza de que vocé nao ousaria nem tocar nele. Reino vegetal, animal ou mineral, eu disse. Estou pensando agora naquela brincadeira em que um pobre coitado tem que sal Por um instante enquanto os outros pensam numa coisa qualquet ‘que ele deverd adivinhar quando voltar. Imagine que tenhamos pensado num gato chamado Mons, ave neste exato instante esté passeando pelo jardim do vizinho. N& 8 podemos responder “sim” ou “no” 3s perguntas que o pobre Ztitado fizer. Se ele for um bom aristotélico — e af nio seré ne- sihum pobre coitado —, nosso dislogo provavelmente seria assim: E-concreto? (Sim!) Pertence ao reino mineral? (Nao!) E um ser vivo? (Giml) Pertence ao reino vegetal? (Nao!) E um animal? (Sim!) £ um jssar0? (Nao!) E um mamffero? (Sim!) E de estimacao? (Sim!) € um gato? (Sim!) £0 Mons? (Sililimmmm! Gargalhadas...) Plato teve a honra de ter inventado a brincadeira de esconde-esconde, Demé- ciito teve a honra de ter inventado as pegas de Lego. -metédico, que queria _Arist6teles foi um homem organizado ¢ | Desse modo ele fundou a ldgica Ele apontou vérias regras rigidas para que cada con: logicamenterélld® Um dinico exemplo € suficiente: se eu afirmo que “todos os seres vivos sio mortais” (premissa 1) e digo também que “Hermes é um ser vivo" (premissa 2), logo posso chegar a elegante conclusio de que “Hermes é mortal” O exemplo demonstra que a ldgica de Aristételes trata da re- “lagGo entre conceitos, nesse caso “ser vivo" e “mortal”. Embora de- vamos concordar com Arist6teles em que a conclusio acima & cem por cento correta, talvez devéssemos admitir também que ele nao diz nada de novo. Sabfamos de antemao que Hermes é “mortal” (€ claro que ele & “um cachorro", ¢ todos os cachorros so “seres vivos’— logo, so mortais, a0 contrério das rochas do Galdhopig- igen.) Certo, Sofia, disso tudo nés ja sabfamos muito bem. Mas nao é sempre que se pode apontar a relacao entre grupos de coisas de r ‘vez em quando pode ser necessério dar ‘uma boa arrumada nos nossos conceitos.. Vou dar um exemplo para ser mais preciso: sera mesmo ver- dade que um minésculo filhote de camundongo é capaz de mamar © leite da sua mae do mesmo modo que cabritos e porquinhos? A pergunta nos soa inegavelmente tola, mas vamos pensar adiante: camundongos néo pdem ovos, claro. (Quando foi a iltima vex que eu vi um ovo de camundongo?) E também dio a luz filhotes vivos — ‘exatamente como cabras e porcas. E animais que dio a luz filhotes vivos so chamados de mamiferos — e mamiferos sao justamente 129 = animais que sugam o leite das tetas das suas mies. E asim al ‘amos nosso objetivo. J tinhamos a resposia dento de nan foi preciso efletir um pouco. Na press tnhamosexqucido gg camundongos realmente sugar olete da suas mle, Teese ue jamais tenhamos visto um fihote de camundongo mamanie A razio disso & que camundongos so muito timidos em rin, hhumanos, sobretudo quando estao amamentando. OS DEGRAUS DA NATUREZA Quando Aristételes quer “organizar” a existéncia, primeira. ‘mente aponta para as coisas na natureza e sua classificagio em dois grandes grupos. De um lado temos as coisas inanimadas — como rochas, gotas d’égua e torrdes de terra, Estas no trazem em sine) _nhuma possibilidade de transformaco. As coisas inanimadas s- gundo Arist6teles, 86 podem se transformar em outras pela influén- “cia de fatores externos. Do outro lado temos as coisas vivas, quetém » possibilidades inerentes de transformagao,, No que se refere as “coisas vivas’, Arist6teles também dizque elas podem ser divididas em dois grupos principais. De um lado temos os vegetais (ou plantas); do outro os seres vivos. Finalmente, 0 “seres vivos" também podem ser divididos em dois subgrupos— evorinacos CPt Nao podemos deixar de reconhecer que a divisio fia por Atistételes é autoexplicativa. Existe uma diferenca eloquente e- ‘tre coisas vivas e inanimadas, como uma rosa € uma pedra. Assim ‘como ha uma diferenca enorme entre vegetais e animais — um rosa e um cavalo, por exemplo. Eu acrescentaria que hii uma grande diferenca entre um cavalo e um homem. Mas essas diferencas sistem exatamente em qué? Vocé pode me dizer? Infelizmente nao disponho de tempo para esperar que mee vie sua resposta num envelope cor-de-rosa com um torrao deagtcat dentro, entio eu mesmo vou responder: quando Aritseles die 108 fendmenos naturais em diversos grupos, ele parte das caractei= ticas das coisas, isto 6, do que elas so capazes de fazer € 40.9% clas realmente fazem, 130 = ‘Todas as “coisas vivas" (vegetais, animais e homens) tm a cae pacidade de se alimentar,crescer se multiplica. Todos os “seres fivos”(animais e homens) também possuem a capacidade de per. ‘ober o mundo que os cerca e nele se locomover. _possuem, além disso, a capacidade de pensar — ou seja, de organi- zaras impresses dos sentidos em diferentes grupos e classes. Segundo esse raciocinio, néo hd na natureza limites rigidos. Podemos perceber uma transi¢o gradual de vegetais mais simples para plantas mais complexas, de animais mais simples para animais ccomplexos. No topo dessa escada esté 0 homem — que, segun- do Aristoteles, vive a plenitude da vida na natureza..Os homens ‘rescem, se alimentam como as plantas, possuem sentimentos e se Jocomovem como os animais, mas também possuem uma caracte- ristica especifica que os torna humanos ¢ inteiramente sozinhos na natureza: a capacidade de pensar racionalme ‘Assim os homens conservam uma centelha da razio divina, Sofia. Sim, eu disse divina. Em alguns trechos dos seus escritos Aris- tételes diz que deve haver um Deus que tenha posto a natureza | em movimento, Esse Deus ocupa o iiltimo degrau na escada da natureza, Arist6teles achava que os ‘movimentos das estrelas e planetas controlava o movimento da Terra. Mas deveria também haver algo que fizesse todo o firmamento se mover. A isso ele chamou de "o. "motor primeiro” ou “Deus". “O motor primeiro” ndo se move, mas 6 ele que é a “causa inicial” do movimento do firmamento e, em decorréncia disso, de todos os movimentos na natureza., ETICA Vamos voltar aos homens, Sofia A "forma" humana, segundo Arist6teles, & definida por possuir uma “alma vegetal” junto a uma a uma "alma racional’. E af ele pergunta: como 0 homer deve viver? © que é preciso para que tenha uma vida boat Posso responder resumidamente: 0 homem s6 € feliz se utilizar to lds as suns capacidadeseposibildaes, ; Aristételes achava que existem trés formas de felicidade. A pri- BL = © satisfagdes. A segunda forma jadi Ea terceira 6 viver como um ador € fildsofo! “Arsttelesenfatiza queas trés defi 2p “qus.os homens tenham wna vida feliz Por isso ele recuta oa ma de isolar mento. Se vivesse nos dias de hoje, talvez dissesse que alguém que apenas exercita 0 corpo leva uma vida tio isolada —e carente — quanto alguém que apenas usa a cabeca. Os dois extre. 'mos so a expresso de uma conduta de vida equivocada. Também no que se refere & Convivencia e as relagGes interpes- _ soais, Aristételes menciona um “meic 1 de Ouro”: nao devemos, ad (Pouca coragem & co- \vardia, coragem de Do mesmo modo, nao deve- mos ser avarentos nem esbanjadores, mas generosos. (Ser pouco ge- “netoso @ ser avarento, ser generoso de ‘O mesmo vale para a alimentacao. E perigoso comer de me- ‘nos, mas também é perigoso comer demais. Tanto a ética de Pla- to como a de Aristételes evocam a cineia médica grega: Jo equilibrio e da moderagao Cau pose an | individuos felizes ou *harmnicos"s POLITICA A visdo de sociedade de A a “tivo da modera¢a0. Ele disse que o homem. ee ie ‘no nos tornamos verda a acreditava. Ele achava que a familia e a cidade satisfazem nossas necessidades basicas, como alimento e at ), casamento e Criagao- de filhos. Mas a forma mais elevada de convivio humano somente ‘pode ser alcangada através do Estado. Entéo surge a pergunta: como deve se organizaro Estado? (Voce deve se lembrar do “Estado filoséfico” de Plato, nao?) Avstoteles) A primeira é 7 / quia— na qual existe apenas uma autoridade maior. Para que ess@ forma seja boa, ela ndo pode resvalar na “tirania”, em que o mona ‘ca passa a governar visando os proprios interesses. Outra boa forma 132 de Estado 6 a aristocracia, Nela, governa um grupo maior ou menor de uma elite. Deve-se estar atento para que essa forma nao degenere numa “oligarquia”, em que o interesse comum também é deixado de lado, em favor do interesse de uns poucos. Aristételes chamou a terceira boa forma de politica, que significa/democracia. Mas essa forma também tem um lado perigoso. Uma democracia pode se tor=) “snarum governo dominado pela plebe: (Mesmo se o tirano Hitler nfo tivesse chegado ao poder na Alemanha, uma multidéo de nazistas menores teria insttuido um terrivel governo dominado pela plebe.) A VISAO FEMININA Para terminar, algumas linhas sobre a visio que Aristételes nha das mulheres. Que, infelizmente, nao era to favorvel quanto aquela de Platio. Para ser mais exato, Aristételes chegou a afirmar que faltava algo as mulheres, Elas seriam “homens incompletos", Na reproducao as mulheres so passivas e receptoras, enquanto os. homens so ativos e provedores. As criangas herdavam somente as © -caracteristicas masculinas, segundo Aristételes, para quem as carac- teristicas infantis estariam contidas no sémen paterno. As mulheres seriam como a terra fértil que apenas recebia a semeadura e provia a germinagZo, enquanto os homens seriam os “semeadores”. Ou, dito a maneira de Arist6teles, os homens contribuem com a “forma” eas mulheres entram com a "substancia"s Que um homem esclarecido como Aristételes tenha se equivo- «ado desse modo em relagio as mulheres é surpreendente e, mais que isso, lamentAvel. Mas serve para demonstrar duas coisas: Aris- {6teles nao deve ter tido tanto contato nem experiéncia prética com mulheres e criangas. Por outro lado, mostra como as coisas podem _ sain erradas sea filosofia e a ciéncia derem ouvidos apenas a voz ~ masculina. | A piniio enviesada que Aristoteles tinha sobre o feminino foi Particularmente danosa, pois foi ela —e nao a de Plato — que pre- valeceu durante a idade Médi sommes ‘ndo era nenhum inimigo das mulheres! 133

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