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R MeR numero 33 | volume 17 | janeiro - junho 2023 U eS Da 10 1606isn. 1982-677 20082108 Imagens, inteligéncia artificial e a incontornabilidade da metacritica Images, artificial intelligence, and the inescapability of metacriticism Felipe Muanis' aster em comunicacea pala Universidade Feder de Nines Gerais [UFMG) E professor da Universidade ce Tras. Warts @ Alto Bouto (UTAD}, em Portugal, do Prograra de Pos grauacdo em Artes, Culture © Unguagens cs Universidad Federal d= hu {2 Fora |URF} eo Programa ce os. raduacad em Comynica¢2a a Urvetscace Federal do Cear3 UFC E mal ansainakcon. RuMPRes Resumo, Palavras-chave Abstract Keywords ‘Imagens, Intllgénclaarlila aIncontommabliidade da metacrciea Este texto discute a imagem digital ¢ evidencia como a intelig€ncia artificial contemporénea, a0 quebrar 0 referente real da imagem técnica, oferece uma mudanga de paradigma para a representagéo imagética. Essa ruptura cria um receio e uma desconfianga do real no espectador de toda e qualquer imagem, seja analdgica ou digital, o que cria uma pergunta impitcita para esse sujelto: “serd isto realt". A proposta deste artigo ¢ mostrar que essa duvida tende a se tornar indissociave! das imagens e do observador contemporaneo, 0 que favorece 0 desenvolvimento de uma postura mais analltica ¢ critica, em que © observador abandona uma postura exclusivamente diegética para assumir também umaleiturametzcritica. autores como Bernardstiegler, Thomas Mitchell ¢ Hans Belling serao analisados. Imagem digital, referente, inteligéncia artificial, rnundo virtual, metacritica, This text discusses the digital image and shows how contemporary artificial intelligence offers a paradigm turn for the imagetic representation by breaking the real referent of the technical image. This rupture creates in the viewer a fear and distrust of the reality of all and every image, be it analogic or digital, which creates an implicit question for this subject: "Is this real". This article aims to show that this doubt tends to become inseparable from the images and the contemporary observer, which favors the development of a more analytical and critical posture, in which the observer abandons an exclusively diegetic posture to assume a metacritical reading. Authors such as Bernard Stiegler, Thomas Mitchell, and Hans Belting will be analyzed. Digital image, referent, artificial inteligence, virtual world, metacriticism, oossié npessoa aif mente a! mesma. (STIEGLER, 20 Em 31 de janeiro de 1981, 0 diretor Richard Attenborough realizou a famosa cena do funeral de Gandhi, que estabeleceu 0 recorde de figurantes em cena, equivalente a 300 mil pessoas, e integrou o filme Gandhi, ganhador de & Oscars. Um pouca mais de 10 anos depois, em 1993, estreava jurassic Park, que criou digitalmente dinossauros realistas, que contracenavam com pessoas reais, O filme de Steven Spielberg quebrou uma barreira a partir da qual tudo poderia ser representado em imagens com grande realismo, mesmo que seu referente nao existisse hd 65 milhdes de anos, Esses dois filmes so emblematicos, vistoshoje, para se pensar sobre o atual momento das imagensea quebra de seu referencial Imagens como as de funeral de Gandhi, vistas por um jovem espectador da atualidade, acostumado com a profusdo de imagens digitais, podem levar 4 uma conclusdo hoje mais habitual, porém equivocada, de que aquela multidao ali representada ndo passaria de uma inser digital, ou seja, de que aquelas pessoas ndo estavam |d, O recorde de figurantes no filme Gandhi nao foi batide e dificilmente o sera, uma vez que hoje as tecnologias digitais de imagem inserem facilmente pessoas em cena, o que facilita e barateia a produgio de filmes que demandam grandes multides - ou dinossauros. As novas possibilidades digitais de manipulacoo da imagem -no sentido de manuseio, mas que também resultam em adulteracéo - inauguram um momento determinante para a histéria das imagens, bem como para sua teoria, Eum nove momento de desconfianca das imagens, mas que nao se pode confundir com questées relativas ao habitual e prejudicial iconoclasmo “maniqueista ¢ muito preso a um édio da cultura de massa e da midia”, como lembra Mitchell (apud PORTUGAL; ROCHA, 2009, p. 3), presentes em escritos de autores como Baudrillard (1970), Débord (1997) e Bourdieu (1997). O que se verifica hoje é uma nova realidade das imagens trazida, sobretudo, pelas novas possibilidades da inteligéncia articial, am que a quebra do referencial do objeto fisico representado em uma imagem técnica 2 Nerina "Technolngy sing us te chanceto malty ration, ina eectonthat wou xing closer totheraton ofthe iterate sso Rerun ts¥x poste co synei2ea book xk raury ana erly anes Imagens, tlt ail anconomabdade da mace RuMPRes oa “a passa a no ser mais uma condi¢So determinante para a existéncia da imagem como ela se apresenta, Tomando de empréstimo a ideia de Bernard Stiegler (2002), a imagem perde olastro do objeto que deveria estar ali, diante da camera no mamento de sua apreensdo. Por outro lado, a sociedade contempordnea continua a viver 0 fascinio pelo real, frequentemente acompanhando reality-shows, documentarios, escritas de si, ¢, por vezes, parece ndo entender que a cada dia éa llusdio de algo que ndo estava Id que se apresenta como uma nova reatidiode das imagens mediadas. Teremos chegado ao ponto de, entim, percebera compreensio que temos da realidade e especialmente da imagem. na pratica, como inveng3o @ mimesis, como defendia Plato? Serd ento, mais do que nunca, necessario desconfiar das imagens para desacreditar do mundo? Voltar-se-ia, dessa maneira, ao simplismo iconoclasta, ou seiria muito além dele, para perceber que ja se vive em um novo momento das imagens, sobre a qual é necessaria uma readaptagio do seu observador, uma nova postura dele em relagio as imagens e ao mundo? Figura 1: Fotograma do funeral de Gandhi, do filme Gandhi (EUA, 1982), direcdo de Richard Attenborough Nesse sentido, cabe retomar otexto Discrete image, ainda de 1995, de Bernard Stiegler. Nele, 0 filésofo francés antevé uma nova desconfianga das imagens, que hoje se poderia associar &s cada vez mais elaboradas imagens de inteligéncia artificial, o que geraria um outro tipo de espectador/leitor delas. Este, apesar de continuar fazendo a transposigio da imagem bidimensional para um espago em profundidade dado pela perspectiva do quatroccento, RuMPRes sou consegue, também, fazer, simultaneamente, o movimento para a superficie da imagem, permitindo uma metaleitura. Consequentemente, este leitor se capacita para uma andlise mais apurada, uma metacritica que no se limita ao contetido da imagem, mas também & imagem em si,em sua superficie, o que envolve também suas praticas ¢ contextos de producio*. Portanto, o que se pretende demonstrar com este texto, a partir de reflexdes de Bernard Stiegler (2002), Hans Belting (2014) e Thomas Mitchell (1954), é a maneira como a quebra do referente das imagens igitais, mas sobretudo das recentes produgées oriundas da inteligéncia artificial, tem mudado a imagem na contemporaneidade. Mas, mais do que isso, essas novasimagens, bern comeas novas possibilidades e relagSesde leitura que elas oferecem, transformam aos poucos o observador, de alguém que antes apenas priorizava 0 contetido, para alguém que agora também reflete sobre a constituigo da prépria imagem, favorecendo um discernimento cada vez mais critico sobre elas, desenvolvendo um olhar metacritico, O referente das imagens Todas as imagens figurativas existem a partir de um referente’, ou seja, elas se baseiam em algo que existe ou existiu. Se essa constatagdo é um tanto ébvia ao se falar da Imagem técnica analogica, em que, para se fazer uma fotografia ou um filme, algo fisico tem que estar materialmente diante da cdmera para que depois sua presenca se imprima na imagem, por outro lado, na imagem artesanal e na imagem digital, muitas vezes isso ndo se percebe de forma to clara, porque a presenga do referente nao se faz necesséria, Contudo, uma imagem artesanal, um desenho figurativo, por exemplo, sempre se baseard em um referente, mesmo que ndo se trate da representacdo de uma natureza morta ou de um modelo vivo, em que 0 objeto esta diante do pintor que o representa na tela ou no papel. Desenhar de meméria implica criar uma imagem mental, interna, que atua como 0 referente do signo ic6nico concretizado pelaimagem artesanal. Aimagem mental, por sua vez, origina-se da experiéncia fenomenolégica do homem, a partir de seu contato com a propria 3 imprtrs nbrar que sso ce ce err esimegss ria comes pets sntcen.ms, me aren, comes argv © aa moderna, em queas atstassaem a unc da magem para 2 spare datas iberacos elm doveal sma pes spares cepredgz0 daimagemtéenea-afxagatiaeocinema, 4 ssimagors deste cunde fgutvas nis pecesararentepartem de un referent, uma vez que, rita veces, © pps proresn do sua corfacgia ia eam o cere =a emelgoesdocontetn ce pads,

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