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ENSINO DE HISTORIA SOTO Mn) mL a OO el MCU Me OOM COCA ORC POCO CWC mC OOM CCC om Ly OURO RCUME ORO UCR oe Pea erent Pere | eer oe HISTORIA SIUC eoe rer e praticas X ENSINO DE HISTORIA Suicitos, saberes © préticas Copyright by ‘Ana Maria F.C. Monteiro, Arlette Medel ‘Marcelo de Souza Magalhies (ores) et 2 edigao: 2009 ¥ edigto: 2012 Gasparllo, 2007 Direitos desta edigio reservados MAUAD Eeitora Lid, 98, S andar [Lapa — Rio de Janoiro — RJ — CEP: 20241 ‘el. (21) 3479.7422 — Fax: (21) 3479.74 ‘wwwmauad.com! Rua Joagui Feigao publicada com 0 apc da o Estado do Rio de Sanco Incluibibliograti ISBN 978-85.7478-231-7 lira Estado eensino- Congresos. 2 Histria Du: 930, Sumario APRESENTACKO PARTE | - HISTORIA, MEMORIA E ESCOLA. ‘*Historia © ensino de historia: meméria e identidades sociais Isménia de Lima Mart ‘*Elza Nadai e 0 ensino de qualidade Joana Neves luando a casa vira escola: a modemnidade pedagdgica no Brasil Clarice Nunes I! ENSINO DE HISTORIA E HISTORIA DA EDUCAGAO. ‘Uma proposta de mapa do tempo para artestios de mapas do tempo: historia do ensino de histéria e didatica da histéria Cerri ‘0s de saberes: linas escolares, 0 historiador da educagao eo professor Arlette Medeiros Gasparelio. PARTE Ill - PROFESSORES E A HISTORIA ENSINADA: DIFERENTES APROPRIACOES, A historia nossa de cada dia: Saber escolar e saber académico na sala de aula Katia Maria Abud ‘+Narrativa e narradores no ensino de historia Ana Maria Monteiro +0 livro diditico ¢ o professor: entre a ortodoxia e a apropriagdo Kazumi Munakata constituigdo de saberes pedagégicos na formagao ini 4do professor para o ensino de histéria na educagao bisica Selva Guimaraes Fonseca 3 1 105 107 19 137 149 Secretaria de Educago Superior. Diretrizes curriculares nacionais: Historia. MEC, 1998, Diretrizes para a formacao de professores da educaco béisica, em cursos de nnivel superior. Bras i www.mec.gov.br) CABRINI, CARRETERO, M, POZO, ‘Sociales. 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Quanto a0 Hachette Education, 1990, formacao: universidade, institutos superiores de educagdo, centros de ensino 5 : PEREIRA, 1 ED. ZEICHNER, K.M. (orgs). A pesquisa naformagdce notrabeth ror, faculdades isoladas..? Quanto ao cardter das instituigdes de formagao: peste ieee areata icas, privadas ou comunitérias? Quanto as atividades formativas: com pes- isa, sem pesquisa, envolvem-se com as comunidades...” Quanto as po SILVA, Marcos A. (org.). Repensando a Histéria, Sao Paulo: Anpuh/Marco Zero, 1984, Scio? Guano forma 65 orgabtenean 60, outs a pare ZAMBON B: O'en t6ria ¢ a construgdo da identidade. In: Hi .? Quanto as relagdes estabelecidas entre teorias ¢ praticas: 10; 580 Paulo: SEE /Ceny issociadas? Quais tcorias ¢ priticas estdo estabelecidas? Quais Desarroto de las Habilidades en ta Ensenanza de la Historia compromissos das universidades ¢ os nossos como formadores? Quanto as Pueblo y Educacion, 1990, sda universidade com as escolas de ensino fundamental e médio: convi- ignoram-se, colaboram, tém projetos conjuntos? Quanto ais relagdes inter tracursos de licenciaturas? Merecem relevincia em nossos questionamentos as concep¢des tek todologicas que esto embasando 0s cursos de formacio de professores e qual ‘métier qui s’aprend. Pasi: ico- Notas ' AVALOS, B.; NORDENFLYCHT, M. E. (coord.). La formacién de professores. ‘Santillana del Pacifico S. A. de Ediciones, 1999. cae Prética de Ensino de Historia, Campinas: Papirus, 2003, fessor da Universidade de Chapecé (Unochapecs), Doutor em Educagio pela camp. * FONSECA, SelvaG. Di ai = ana lades, compreendendo-os como possuidores de saberes que precisam respeitados. Tenho presente que as difereneas na forma de olhar para os professores esto tadas em modos de perceber a fungdo docente, que pode ser numa perspectiva inutengio do status quo ou para a construgdo de um mundo mais humano € ario. € trabalho com a formagao inicial numa perspe idoras, e, num segundo movimento, trago iva que leva em consideragio o pensamento auténomo e condutor do seu fazer. algumas contribuigdes numa do professor como A perspectiva de Formagio de Professo ada no pressuposto de que professor da escola deve ensinar ou transmitir conhecimentos. Ocorre, portanto, ama divisdo de papéis na produgdio de conhecimentos. A academia cabe a produgao conhecimento ¢ a escola, 0 ensino, a transmissio. Esta visto esti ealeada na da, Poderiamos usar a metifora da linha de produg3o: a matéria-prima (aluno visto racional do trabalho adotada no sistema fabril, pela qual alguns pensam, ingressante numa licenciatura) entrou sem saber e deverd sait 0 produto final jam, elaboram, tragam metas, € os demais executam o que foi pensado. Este (© professor formado). Vém de longe, nos cursos de formagio de professores, elo foi transposto para o sistema educacional, no qual a separago ocorre estas formas de pensar e agir. Os cursos estruturados para formar: ensinam de- (08 t&enicos, administradores, pesquisadores e o professor. Separaglo entre terminadas regras, procedimentos, metodologias, conteiidos... e 0s professores am pensa 0 curticulo, os técnicos, administradores, governos... € 0 professor estardo formados dentro do perfil desejado, Neste modelo nflo hé espaco para execulard o que os outros definiram como conhecimento vilido. Cria-se uma a autonomia, produgio, diferenciag2o, os imponderiveis que estes professores sequia entre os que pensam e os que execulam, produzindo-se uma progres- iro encontrar nas escolas, como alunos cansados, com fome, com uma sobre- iva racionalizagio teenologizagao do ensino, ransformando os professores em carga de trabalh mo livros, mapas, icadores de programas e pacotes curricular. Muitos desses prof res, no desespero, acabam cain 1a simples reproducdo daquilo que o livro didético traz, com um ensino meramente informativo, sem construgio, produgdo. Como parte da mesma moeda, explicita-se a divisio de saberes: a academia produz.e o professor na escola consome; nega-se qualquer do processo, ter autonomi, Este perfil de formago, como veremos a seguir, est presente em boa parte dos cursos de licenciaturas. Formagao de professores, geralmente, nos remete a ideia de que formar la, convene Se nao bastasse a diferenciagdo entre técnicos e professores, ela ocorre também r€ 0s professores. O professor universitério, com todo o aparato que tem por tris i, constituiu-se em pesquisador, construtor do conhecimento, enquanto que a0 fessor da escola definiu-se que sua fungao é ensinar o conhecimento produzido juniversidade. Desta forma os professores da escola desempenham um papel de sumidores, nao de eriadores. No Brasil, consolidou-se esta perspectiva com as Licenciaturas Curtas: a forma- aligeirada, com objetivos explicitos de formar o professor transmissor, expressa Ppensamento daqueles que pensam ¢ defendem que “os docentes so ineapazes executar corretamente por si mesmos a complexidade de seu trabalho. Por esta 1, 0 trabalho do professor é submetido a grandes processos de racionalizagao € de sua incapacidade, ou em termos Fazer-se professor implica ruptura com muito do que esté instalado e vem sen- do praticado ao longo da historia da formago de professores. Apfesenta-se numa perspectiva de negar a estrutura vigente, propde que pensemos a partir das ruinas endo de forma determinista; assim, a formagiio de professores descortina-se como um imenso campo de possibilidades. Quando trazemos para a formagio categorias benjaminianas ¢ thompsonianas, como experiéncia, experiéncia vivida, meméria, histéria aberta, escovar a histéria a contrapelo, tempo saturado de agoras, fazer-se Sujeito, verificamos que é possivel sairmos do estigma de formagio no sentido ‘acima exposto e pensarmos outra formagdo que dé possibilidades de o professor se fazer, ou seja, de o profissional sair das universidades com autonomia suficiente para que possa ser sujeito do processo educacional, auténomo, percebendo-se pro- dutor de conhecimentos em conjunto com seus alunos, respeitando as diferengas, A formagio foi sendo utilizada para igualar, homogeneizar, padronizar as iticas e comportamentos, desvinculando assim os aspectos profissionais dos © professor-profissional da educagao foi sendo transformado em um ser 122 Ce i que esti embutido no contetido que iré ensinar e luzido, Toda a formagdo de professores 10s a de Giroux", que s, como uma “forma de racional 1S que promovem certeza e cont importantes dos fi Durante a vi incia dos Estudos Sociais e, posterior: formagio de professores esteve volt la para formas de ens {que os futuros professores aplicasser fazer. Bastava seguir 0s modelos prescritos na faculdade ou pelos livros di Embora parega distante ¢ irreal, esta perspectiva de formagio de professores niio esté morta. Atualmente, ressurge com muita forea através de ini mentais como os PCNS, Dit espalhado em virios pai lusive no Brasil. Os documentos oficia Referéncias Para Formagio de Professores do define um professor calcado no profissionalismo e na competéncia. Ve} Profissionalismo exige compreenstio das questdes envolvidas no traba- Iho, competéncia para id decisdes, responsabili professor saiba av: icamente a propria atuagao e o con que atua e interagir cooperativamente com a comunidade profissional que pertence. Além disso ele precisa ter competéncia para claborar coletivamente 0 projeto educativo e curricular para a escola, identificar diferentes opgdes ¢ adotar as que considere melhor do ponto de vista pedagogico. Essa perspectiva traz para a formagao a concepgiio de com- ia profissional, segundo a qual a referéncia prin« partida ¢ de chegada da formagio é a atuagao profissional do professor’, 160 il ll Portanto, um professor sem aprofundamento te6rico nfo previsara entender 0 {0 menos saber como este fase na eficiéncia e técnicas de ‘como-fazer” que ignoram questdes ante, em muitos cursos ar A &nfase maior foi dada is metodologias de ensino: ensinavam-se os modelos para. é,ndo se levavam em consideracdoas diferentes realidades nas quais esses professores iriam trabalhar. O importante para ser um bom professor era dominar 0 como fazer e no o que ou para que vas governa- Curriculares e Propostas Curriculares que tém se istério da Educagio, de 1999, 10s: Assim, em educagio, ao se empregar a terminologia da eficacia, Estas “mudangas” vém numa perspectiva de reforgar a separagaio entre os que jue fazem. Todas essas propostas vém pautadas em categorias comuns 10 habilidade, competéncias, autonomia da escola e do professor, voltar-se para realidades locais", mas o que temos percebido é que elas so ‘uma tentativa de regulamentagao cada vez mais controlada pelo Estado em relagdo as qualificagdes que a-educacao pode oferecer, junto com uma devolugio de responsabilidades as escolas e professores para que se tomem adequados as necessidades do context (...) Anecessidade de fazer as escolas ¢ 0 curriculo mais sensiveis ¢ adaptiveis aos contextos € necessidades locais, como uma das justficativas oficiais das atuais reformas educacionais, pode conseguir também desviar 0 interesse do conteiido do curriculo nacional para a sua adaptabilidade, e apresentar as desigualdades sociais, que podem ser observadas nas desigualdades a escolar, como uma questio de pluratidade e diversi- dade social, ou como um assunto de boas € més escolas que se resolve por meio da escolha correta'*, ‘Quanto a suposta autonomia que teriam os professores e as escolas, percebe-se hh um mascaramento das reais intengdes ao ser usada esta denominagiio; 0 se evidencia na pritica é uma delegagao de responsabilidades antes do Estado, , agora, passam ao professor; ocorre uma “pseudoparticipagao”. Ou, ainda, sunstancias nas quais se desenvolve seu trabalho, oriunda do slocamento do olhar “do trabalhador para o local de trat (...), ficando este incravel a avaliagdo ¢ controle de suas competéncias, definidas pelo posto de iIho. Se estas nao se ajustam ao esperado, facilmente podera ser descartado”” ‘ avaliagdo, ou conferéncia do produto ~ aluno -, criaram-se formas de con- jle, como as provas do Enem para 0 ensino médio e os Provées para os cursos: graduagdo. Portanto: “O eixo fundamental da fungao docente neste novo marco ‘0 seu componente de gestdio (...) 0 docente se transforma num gestor de politicas, tégias ¢ tdticas orientadas ndo apenas no sentido de acomodar os processos de ino e aprendizagem as exigéncias mutaveis do mercado”. lila aM aaa) To a 161 Como vimos, o ensino tecnicista que faz do professor “um mero executor de tarefas mecinicas”” esta bem presente, embora com uma nova roupagem em que odiscurso mudot ive com apropriagdo de falas de setores progressistas, nas uais vemos virias categorias ¢ expresses muito caras para nés serem destituidas de seus significados originais. Mudou-se 0 discurso, mas as priticas continuam as 'mesmas: a formacao de professores continua sendo olhada, quer pelos governos ou por setores da universidade, como algo menor, inferior. Para estes, o professor deve ensinar 0 que foi produzido pelos pesquisadores, aqueles que possuem discurso da competéncia — este ‘confuunde-se com a linguagem institucionalmente permitida ou autorizada, isto é, com um discurso no qual os interlocutores jé foram previamente reconhecidos como tendo o direito de falar e ouvir, no qual os lugares € as circunstancias ja foram predeterminados para que seja permitido falar e ouvir e, enfim, no qual o contetido e a forma jé foram autorizados segundo (0 cfinones da esfera de sua propria competéncia®. Assim, verifica-se que por detris do discurso da competéncia jé esta pressuposta 4 incompeténcia, ou seja,jé esta dado que os professores, como os incompetentes que sfo, devem apenas reproduzir aquilo que ¢ produzido por aqueles que possuem competéncia para tal, Criam-se discursos para ou sobre os professores, ou seja, sio criados novas metodologias, novas técnicas ¢ novos conhecimentos que 0 professor deve repassar. Por outro lado, sio inexistentes as condiges para que os professores assimilem os novos discursos, pois ‘no podemos vender uma inovagaio, vender uma reforma aos professores, se mio podemos vender, ao mesmo tempo, uma estratégia de sobreviven- cia que acompanhe essa mudanga, Se quisermos mudar verdadeiramente © ensino, temos que trabalhar junto com os professores para pensarmos em tudo isso, porque existem também as estratégias de sobrevivéncia dos alunos, ndo 622" Na perspectiva do Fazer-se Professor, entendemos formagao como processo continuo, que ocorre ao longo de toda uma vida e nao apenas num dado momento, ‘ou lugar, Possibilita-nos pensar na incompletude do ser humano e no seu eterno fazer-se. Para entendermos esta perspectiva, ¢ preciso considerar a obra A Forma: ‘940 da Classe Opersiria Inglesa, de Edward P. Thompson’, que nos mostra como a classe operiria no nasceu pronta, foi se construindo, fazendo-se, tornando-se sujeito, nascendo como categoria histérica. Neste sentido proponho pensarmos também o fazer-se dos professores em sua totalidade. Em complementaridade ds ideias de Thompson, so importantes as do fil6sofo Walter Benjamim, que nos di ferramentas para percebemos que a formagaio é um eampo de lutas, no qual diferentes concepgdes esto disputando espagos. Esta per- {eepeio nos di esperanga de mudanca, nos dé instrumentos para novas lutas. Assim, at vazio e homogéneo, mas através verso de tempo, entendemos 0 presente e projetamos o futuro. Partimos dos nossos problemas, buscando as respostas no passado. Entdo, conhecendo as utas, as experiéncias do passado, nos instrumentalizamos, passamos a ter esperanga tna mudanga, na utopia como algo que esté se fazendo e nado que vira de qualquer forma. Neste sentido, os professores, ao buscarem suas memiérias e experiéncias Vividas, passam a ser sujeito do processo, se sentem construtores, participantes, Numa perspectiva benjaminiana passariamos do formar ao fazer-se professor. ovorrer esta passagem, faz-se necessério pensar 0 ato educacional como um 3pO de possibilidades, com uma historia que esté aberta, porse fazer, eniio como pronto, fechado, determinado, em que o professor fala, expe ¢ os alunos ouvem epetem. Assim, ocorreria 0 didlogo entre diferentes saberes e conhecimentos: icabado (...) no seu processo, sempre em vias de se fazerem”™. Sao igualmente importantes as contribuigdes de Contreras™ ao defender a 1agdo de um professor autGnomo no seu pensar e agir educacional, um sujeito iativa, que pense a educagao tedrica e metodologicamente por si Ao defender a formagao de professores auténomos, Contreras propde uma fersio no papel da pritica de ensino e na hierarquia dos saberes; pressupde a 10 entre pensar ¢ fazer 0 ensino. O professor pensa, planeja, define ¢ executa idades de ensino, Dessa forma, tora-se “impossivel separar por prin ‘concepeiio da execugdo do ensino, Necessari © professor detém um nivel ‘autonomia ¢ de planejamento de seu trabalho ressupde que sejam levadas em conta as condigdes sociais, politicas, turais, econdmicas de cada grupo social no qual a escola esté inserida; trabalhar- les locais, regionais, enfim, 0 wando com as diferengas ¢ divergéncias que permeiam o ig0 escolar, as contradi¢des sociais vao sendo explicitadas e com isso torna-se sivel pensar um professor que desempenhe um papel de agente de transformagio Sociedade dominante e injusta, Ao propor a interpretacdo do papel do professor como sujeito auténomo, Con- {eras nos desafia a olharmos o professor com outros que vejam para além de professores vitimas de um sistema perverso e excludente: Os professores niio podem ser apenas interpretados co em suas capacidades ou po lades reffexivas, como contradigdes das quais devem ser libertados ou como se confundisse 0 ensino e sua trama com o que vive entre as quatro paredes em uma sala de aula. (..) As contradigdes dos professores nfo sto apenas produto de demandas ¢ pretensdes contradit6rias na instituigdo escolar. O que permite compreender que as experiéncias ¢ 0 conhecimento niio sto homogéneos nem idénticos*, imada, caminha o pensamento de Pimenta, ao defender que a de formagio, levando-se em conta que os professores so trucaio e na proposigao das transformagdes necessérias is priticas esco- lares e as formas de organizaglo dos espacos de ensinar ¢ de aprender, compromissados com um ensino de qualidade social para todas as criangas ¢ jovens” Para que se efetive a possibilidade de autonomia dos professores como sujeitos que consigam agir por conta prépria ao exercer suas atividades profissionais, & fundamental rompermos com a hierarquia dos saberes, mediante a qual o professor fica profissionalmente inerte frente a este componente de sua profis- sionalidade: tendo como fungo biisica a reprodugao do saber, no pode participar na elaboragao pedagégica do mesmo, pelo que se limita a dependéncia em relagdo a agentes exteriores, que Ihe dio modelado o curriculo (livros-texto), ou a reproduzir 0 conhecimento adquirido. Para se romper a tradicional dicotomia entre os que pensam ¢ os que execu tam a educacdo, portanto, dar autonomia para que o professor, além de executor, também passe a pensar o que deve ser ensinado, é preciso que 0 debate se torne Piiblico, se explicitem as posigdes, as divergéncias. Para que este se tome um, elemento constitutivo da autonomia profissional de professores, rompendo assim com 0 autoritarismo impositivo que muitas vezes permeia as relagbes dos setores politico ¢ administrativo para com os professores. il ee além de ocorrer no debate piiblico com os setores ibém deve ter a dimenso da sala de aula, nas relagdes que 14 se que as relagSes entre professores e alunos se desenvolvam no explicitando-se as posigdes, que se construam relagdes mais democriticas, S.. pois, como 0 ato de ensinar e aprender é uma via de mio dupla, ¢ ‘Preciso construir formas para que a autonomia do professor seja exercida, Partindo do pressuposto de que 0 conhecimento nao esti dado, nao é fechado, Sacristin prope que “a pratica deve ser inventada pelos priticos. Quer dizer, a pritica nao pode ser inventada pela teoria, a pritica é inventada pelos pri- ticos. O problema ¢ saber o papel que cumpre a teoria na invengao da pritica™®, Particularmente, penso que a teoria deve se constituir como ferramenta endo como ‘camisa de forga que amarre ou apr realidade, portanto, ela deve servit mento que contribua para analisarmos a realidade pelo olhar aos saberes através dos quais 0 professor, munido de referencial teérico, Procura articular 0 saber pesquisado com a sua pritica, interiorizando e avaliando as teorias a partir de sua ado, na experigncia cotidiana, Deste modo, a pritica se torna 0 niicleo vital da produg&o de um novo saber (--) Os saberes da experiéneia nao slo saberes como ‘os demais, eles so formadores de todos os demais. (..) A experiéncia docente é espago gerador ¢ produtor de conhecimento, mas i izagio que passa por uma postura ci educador sobre as préprias experiéncias” Ao trabalhar numa perspectiva que considera os professores como sujeitos Processo de seu fazer-se, sou levado a pensar a partir das reflexdes de Walter ajamim™” sobre 0 que a modemidade capi para ele, sabia-se exatamente o significado da experiéneia: ela sempre i comunicada aos jovens: De forma concisa, com a autoridade da velhice, em vérbios, de forma prolixa, com a loquacidade, em histérias; muitas vezes com \quos, diante da lareira, contadas a pais ¢ netos. O que © de tudo isso? Quem encontia ainda pessoas que saibam contar historias mo elas devem ser contadas? Que moribundos dizem hoje palavras durdveis que am ser transmitidas como um anel, de gerago a gerago? Quem é ajudado hoje ‘um objeto oportuno? Quem tentaré sequer lidar com a juventude invocando experiéneia? __ Thompson®, ao polemizar com Althusser ¢ os estruturalistas, nos propde a nsar.a Sociedade através das experiéncias que, conforme afirma, nfo so apenas ‘Superestrutura da sociedade: “Homens e mulheres experimentam sua experiéncia imento ¢ lidam com esses sentimentos na cul ‘Gdes familiares ¢ de parentesco, ¢ reciprocidades”. ra, como normas, obriga~ As questdes levantadas por Benjamim e Thompson so fundamentais para que possamos discutir a formagio de professores junto com professores, junto com a experiéncia, levando-se em considerago 0 que o professor pensa, como vive, uais experiéncias tem para contar, que metodologias desenvolve, qual a relaglo que faz entre teorias € priticas cotidianas, enfim, precisamos deixar de pensar @ formagao para ou sobre 0 professor. E preciso romper com a ideia de formar professores, pensando que nos tornamos 1nés mesmos através dos outros. Assim, a construedo, 0 fazer-se do professor, se dt ‘num processo relacional, ou seja, constrdi-se na interago com o outro, que pode ser um professor universitrio, um colega de trabalho; na troca de experiéncias, informagdes... com os alunos que, no didlogo constante, promovem ocrescimento profissional do professor. Faz-se necessério pensar que este processo ocorre de ‘maneira social ¢ nfo individual, ¢ que, mesmo sendo social, néo é homogéneo. ‘Também se pensarmos numa perspectiva desses professores como produtores de cconhecimento, este sendo produto de ago compartilhada, em que, através do ou- tro, as relagdes entre sujeito-professor e objeto de conhecimento se estabelecem. E necessério pensar a experigncia na sua dimensio de totalidade, para al cientifico e racional, pois, como Benjamim defende, é preciso “escovar ah a contrapelo” e assim trazer o insignificante, 0 miuido, o relegado para a Estas quest®es nos remetem a Sonia Kramer quando, em didlogo com Benjamin, aponta as contribuigdes do seu pensamento para falar em educagio: O pr teve sua experiéncia empobrecida: seu conhecimento nao € visto como “verdade aurética” e ele nao é narrador, por no ter uma le? Professor e alunos sio cada ) Tornaram-se, professor € vez mais impedidos de deixar rastros. alunos, meras mercadorias? (..) Como operirio (na linha de montagem), ‘© jogador (sempre comegando), o passante (vagando na multidzo), pro- fessores ¢ alunos estio também condenados ao eterno recomego? Hai relago que ¢ construida por professores ¢ alunos, com o conhecimento produzido na pratica social viva, para que deixem de se destocar como autématos... (..) Como recuperar a capacidade de deixar rastros? Ou sr marcas? Ou ainda, de ser autor? Como ler em cada objeto a sua historia?” Além de todas as questoes levantadas por Kramer, ao trabalhar com memérias, Benjamin nos instiga a pensar: como as memérias dos professores podem contribuir para o seu fazer-se? Em que medida as memérias de formagio escolar, de suas ‘Vidas, de sua construgo como cidadiios, como profissionais podem contribuir para ‘que a academia passe a conhecer e respeitar os professores? Bibliografia 1994, (obras escolhidas vol. 1). Rua de mao tinica, §*ed., Sto Paulo: Bi lismo. 3* ed, Sa0 Paulo: Bra- (org). Profissdo professor: 0 itinerdirio profissional e a construgao da escola. Bauru: Eduse, 2002 Barbara et ali. (orgs). A vida e 0 oficio dos professores: formagdo i.e pesquisa em colaboracdo. 4 ed. Sao Paulo: Fscrituras, 2003. |ARLOT, Bemard. Formagio de professores: a pesquisa © a PIMENTA, Selma Garrido & GHEDIN, Evandro. Professor refleivo no Brasil: -a de um conceito. Sdo Paulo: Cortez, 2002 ra ¢ democracia. 6 ed. 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