You are on page 1of 7
13 0 TEATRO CLASSICO FRANCES Os gregos da Antiguidade lancaram 20 mundo nfo 86 as primei — ras grandes pegas teatrais do Ocidente, como também os principios da critica dramética, estudando as obras teatrais em seu aspecto técnico, estético e filoséfico. Ne obra de Aristételes "Da Poéti- " estdo sistematizados os elementos bdsicos da estrutura dramé- tica, destacando-se, sobretudo, o principio da lei das trés unida _ des na qual reza que a pega deva apresentar uma unidade dete: (@ agdo concentrada num tinico dia), uma unidade de espaco (a acdc mentos s&o apresentados numa série encadeada, como causa e efei- to, possuindo um comego, um meio ¢ um fim). * Durante a Idade Média, cujo teatro tendeu a formar pegas que mais se aproximavam de atos variedos, foram esquecidos os mecanis mos estruturais do teatro cldssico da antiguidade./Com o Renasci~ mento, porém, os valores greco-romanos foram reativados na busca do antropocentrismo e do racionalismo; acontece que Aristételes e laborou seus princ{pios “de acordo com as condigées do teatro de Atenas em sua época" e, diferente de outras manifestagées artisti cas, o teatro nao conseguiu ser fiel acs valores aristotélicos, jd que, nas condigdes renascentistas, ou manciristas, tais normas im primiriam ao drama do século XVI um forte sentido artificial. Es- sas condigées particulares do século XVI se prolongaram pelo _séou— lo XVII, especialmente na Inglaterra, na Espanha e na Italia, Na range, entretanto, durante o perfodo Barroco, houve uma modifica g@o redical em fungao do tipo de casa teatral que surgiu.em Pa- risy o primeiro teatro permanente foi adaptado no patio retdngu — ler, estreito e alongado, do "Hotel de Borgonha", e os novos tea- 14 tros que se seguiram - como o do Le Marais ~ imitaram essa dispo~ sigdo. 0 palco francés foi langado para o fundo do espago, fican- do, desta forma, fechado por trés lados e sd podia ser visto pe~ los espectadores de um Ynico lado. Havia falta de visibilidade e de espago para grandes movimentagdes cénicas, proibindo, assim,ve rios tipos de espetdculos, como por exemplo os “capa-e-espada" co muns no teatro espanhol; duelos, perseguicoes, cataclismas, gran- des batalhas ou diversidade de ambientacdo ~ como no shakespearia no ~ tiveram de ser substitufdos por uma simples narragéo esclere cedora na boca de cena, A concepgdo arquitetonica do teatro fran— cés decretou a concentragio da acio e do lugary ademais, premidos por tais circinstancias, os autores passaram a se desinteressar,a medida que tomavam consciéncia das imposicoes do palco, pelo de~ senvolvimento de agdes secunddrias ou paralelas, o que resultou na concentragaéo de tempo da agdo basica, Desta maneira, o teatro francés se volta aos princ{pios aristotélicos, ganhando uma gran~ de forcga’ dois elementos: o entrecho, que se fez, mais do que nun— ca, “conflito e intriga"; © o homem, que se fez, mais do que mun~ ca, “interioridade e alma". “Além desses circunstancias extr{nsecas que sofreu o drama em Franga, n&o podemos esquecer também as condigdes sociais e politi cas do pais, Ao contraério da Inglaterra que, no século XVII, so- freria varias crises socisis e politicas, a Franga avanga do caos social & estabilizagdo da ordem; a frie avassaladora das guer- ras religiosas se extinguiu e, sob as maos astutas do Cardeal Ri- cheliew, primeiro ministro de Iuis XIII, de 1624 a 1642, 0 poder turbulento dos nobres foi reduzido e, neste momento, sedimentou ~ se 0 alicerce para um forte governo monérquico, Apés a morte de Iufs XIII (1643), deixando como herdeiro do trono um menino de a~ penas cinco anos, o Cardeal Mazarino, seguidor fiel de Richelieu, ocupa o governo, mantendo a continuidade de fortalecimento do po~ der e da cultura em Franga, até que o jovem Luis XIV fosse capaz de assumir o mandato para fazer o “glorioso reinado" que lhe va~ leu o titulo de “Le Roi Soleil". 15 Somadas umas e outras coisas, foi possivel a literatura fran- cesa dramdtica adotar as ceracteristicas de um “classicismo": "0 classicismo traduz, em literatura, o ideal de uma sociedade esta ,bilizada, e, acima de tudo, prega a "ordem", levando as formas 1i terérias ao ponto de acabamento, haniiesta-se numa arte onde a ra 2&0 predomine, visando mais & justeza do que & intensidade de e~ feito, sempre com uma exata economia de meios, Tal arte, alids, a bem da verdade, nao pode Ser dirigida A massa popular, pois que pressupoe um piblico altamente educado”. Neste quadro histérico-cultural, o drama francés se transfor- mou na mais alta expressao poética do conuecimento do homem, re~ jeitendo a exuberéncia e o romanesco para concentrar a agéo ao re dor das paixoes e da crise moral. # transformou-se justamente no perfodo em que toda a cultura francesa se unificava, solidamente, sob o influxo da lingua depurada pela “Academia Francesa", da so- ciedade marcada pelos requintes de elegancia e da arte controlada pelo academicismo. Devemos ainda dizer, a esta altura, que @ marca do pensamento cartesiano se mostrou nitida nessa etapa do teatro francés (ver a note ao final), Ow Descartes influenciou aos autores teatrais, ou os autores teatrais influenciaram a Descartes desde que passaram, sistematicamente, a se concentrar no Homem, penetrando no estudo das paixoes; de qualquer maneira, o teatro cldssico francés veio @ se caracterizar como uma andlise de Vontade, tal como,na filoso fia, o cartesianismo. Trés autores draméticos foram suficientes para sfirmar esse momento privilegiado do teatro francés: Corneille e Racine,na tra gédia, © Moliére, na comédia. ‘) NOTA, Chamou-se Cartesianismo a filosofia de Descartes, tide como a "filosofia da Vontade", e cujo merecimento principal foi ter restaurado a "duvide" no terreno dés idéias e ter proposto a "evidéncia" como critério da verdade, Km seu métedo para procurar a verdade, Descar— tes comeca por “duvidar de tudo"; & unica verdade de 16 que o homem n@o pode duvidar é a existéncia de si pro- prio; dessa verdade é que se deve partir para o restabe lecimento da ciéncia; e, de grau em grau, 86 se pode e~ ceitar alguma coisa como verdadeira depois de reconheci da com evidéncia como tal. Eis o sistema de Descartes: "N&o creio em nada, Du- vido de tudo. Mas nao posso duvidar de que duvido. Ora, se duvido, penso; e, se penso, existe. Aqui tenho uma certezet existo”., - "Existo, lias, quem me fez?. iu? Ndo, pois em tal caso, eu teria me feito com todas as perfei g6es de que tenho idéia, Entdo, meus pais? Mas, e os. pais de meus pais, quem os fez?... Ora, nao se pode re- montar de causa em causa indefinidamente, Deve haver u- ma ceusa priméria, Essa causa é Deus, 0 mundo todo 96 é explicéivel por um Criador". 8, assim, ele parte para ou tras e outras revelagoes, © homem, para Descartes, ¢ composto de corpo e al ~ ma. 0 corpo é uma mdquina, encarregada das fungées vi- tais inconscientes ¢ sujeita as leis da mecanica; a al- mea € puro espirito, sede de todos os fenémenos conscien tes, Corpo e¢ alma, porém, est@o substancialmente uni- dos + o que se prova pelas dores fisicas que deprimem a alma e pelas dores morais que deprimem 0 corpo. Descartes, a0 promover o estudo das paixdes,veio a ligar-se mais intimamente ao teatro: ele afirma que to- das as paixdes ~ nasgam donde nascer,~ se reduzemn ao de sejo do prazer (as expansivas) e a0 receio da dor (as compressivas). Hd seis principais (as demais séo meras variantes dessas): a admiracéio, o amor, o desejo, o con tentamento (ligadas ao anseio de felicidade), 0 ddio e a tristeza (ligadas ao receio da dor), Por causa___das baixdes ¢ que o homew age; se fosse dirigido apenas pe- io_pensamento, o nomem néo agiria nunca, Todas as pai — xdes sao boas, was, pelo excesso, aberrag&o ou corrup - 17 . g&o, qualquer das seis paixdes pode tornar-se m&. 0 pa- pel da alma (ow Vontade), no que se refere as paixdes,é preservar o que as paixdes tém de bom e impedi-las de se excederem, contendo-as, assim, numa justa medida, 2, 0 DRAMA CLASSICO DE CORWEILLE Corneille (1606 ~ 1684) ¢ 0 fundador do teatro francés cldssi co. Criador de modelos herdicos, segundo o cartesianismo, pintou 08 homens como deveriam ser: valentes, nobres, virtuoso » triun - fando, pela forca de vontade, sobre suas paixdes. Sua maior pega teatral - EL CID, baseada em AS MOCIDADES DO CID, de Guillén de Castro, um cldssico do teatro espankol ~ mostra a Iuta entre o “a mor" ¢ a “honra”, fazendo a vontade operar sobre essas duas pai xdes. © entrecho narra a histéria de Rodrigo que iria se casar com Chimena, @ filha de Dom Gormaz, a quem ama apaixonadamente e tem seu amor correspondido. Um dia, numa reunido. do Conselho Real, po rém, Dom Gormaz discute com o velho Dom Diogo, pai de Rodrigo, e Ihe dé uma bofetada; para vingar a honra do pai, Rodrigo provoca © futuro sogro a um duelo e o abate; com isso, eria para sua noi-~ va o dever de tembém vingar-se e ela vai pedir ao Rei que faca a justica matando o seu bem-amado, No entanto, a Espanha fora inva~ dida pelos mouros e Rodrigo deve partir para a guerra e fim de au xiliar sua terra.Mortificadaentre o dever e o amor, Chimena reti- ra-se para um convento, Ao final, o encontro de Rodrigo e Chimena consagre a vitoria da paixao, pelo sentido da vontade, que elimi- na os excessos nocivos & concretizagao do Homem, Diferente da tragédia tradicional onde o homem é um joguete / do destino ou da Fatelidade, o herdi de Corneille determina seu proprio destino; sua vontade é soberana para dirigir suas agbesze le n&o se sente vitima: é um dever que tem, o honrer a si mesmo,e ao se sacrificar & como se impusesse a si-préprio uma prova de va lor, Ao bradar soberanamente o poder da Vontade como controle das 18 paixoes e o poder do individuo como forjador de seu proprio desti no, Corneille deixa marcas profundas na literatura e na psicolo - gia francesa, Algumas tragédias de Corneille: #1 Cid; Horécio; Pompéia; He- raclito; Nicomedes; Mdipo; Sertérius, © DRAMA CLASSICO DE RACINE Racine (1639 - 1699), embora partindo do cartesianismo, ins ~ taurou novamente no teatro aquele idole que caracterizavea a tragé dia antiga: a Fatalidade, No entanto, n&o a reconhecia mais como algo césmico, acima do homem: punha-a, 20 contrério, no proprio coragao do homem. 0 gra de Racine é a paixfo do Amor, po- rém, em suas obras, o) Amor nada possue daquela amabilidade e docu ra com que surgia nos “ballets" e nas "dperas" de seu contempora~ neo Giovanni Iulli que tanto sucesso fazia entéo; é, pelo contrd- rio, um deus mau que, para reelizar seu maleficio, se serve da in ‘Beligéncia e da delicadeza como armas cruentas. Ao instalar a Fatalidade no corac&o do homem, Racine introdu- ziu na literatura francesa o "realismo psicoldgico", criando, as- sim, o proprio conceito de drama psicolégico. A agéo da peca tor— nou-se reduzida a uma crise moral que se define pelas hesitagoes, pela busca do descobrir-se e pelas contradigdes da paixfo. As tra gédias de Racine apresentam=-se como um “silencioso" combate entre “a razdo e a paixdo, sem grandes convulsdes emocionais ou exacerba goes fisicas. Algumas tragédias de Racine: Andromaca; Britanicus; Berenice; Ifigénia; Fedras.Athalie. A COMMDIA DB MOLTERE Depois de algumas experiéncias malogradas na tragédia cldssi- ca, Moliére abandonou o género para dedicar-se exclusivamente comédia que lhe treria o reconhecimento e a fama, Na condigéo de “afilhado" do irmao de iuiz XIV, Moliere fre~ 19 Gtlentou os entao populares "saldes literdrios", Ali se discutia a arte, a filosofia e a politica, mas o que realmente interessava ¢ ra @ oportunidade das mlheres serem vistas em suaa viquezas, num ambiente de romances proibidos, intrigas, exibigdes, afetagio Preciosismos, o que inspirou a Moliére sua primeira comédia ver ~ Sando sobre o pedantismo das reunides da alta sociedade parisina, AS PRECIOSAS RIDfCULAS foi um verdadeiro sucesso de publico, mas ihe valeu mitos ataques por parte dos intelectuais, A eles, Mo- Liére dedicou 03 ABORRECIDOS que agradou vustante ao dei. A won guir,vieram ESCOLA DOS MARIDOS e ESCOLRA DAS MULHERES. A essa al- ‘ura, seu nome estava popularissine em toda Paris: o publico acor ria aos teatros para ver suas pecas em temporadas regulares;0 Rei se divertia com as irreveréncias do autor para com a corte;e os intelectuais mais se revoltavan, Bm 1664, em Versailles, € langada a peca TARTUPO que provocou & maior resco contra Noliére; o clero, atecado pelo autor, soli- citou ao Rei que o mandasse queimar vivo, pois tratava-se de "um deménio m_envoltura corporal", Lu{fs XIV nfo -concordou, mas proi- biu a representagio ew todo o territério francés, Woliere esereve entdo uma carta ao Rei, onde expressa sua ideologia teatral: "Eu creio que o dever ¢ finalidade da comédia ¢ divertir aos homens . corrigindo-os. Acreditei que, como autor, devie atecar os vicios/ de meu século. E como a hipocrisia é um dos vicios mais usuais e¢ Perigosos, pensei que pudesse prestar um servigo As pessoas hon tas do vosso reino se escrevesse uma comédia tendo por tema os hi Pécritas que querem pilhar os homens com um zelo contrafeito e u- ma caridade sof{stica", A comédia de costumes de Holitre, de qual foi 0 introdutor.na _Franca, evoluiu para uma comédia de cardter. Suas pegas, entdo,na nova linha, deixaram de ter o simples aspecto de uma erénica do Quotidiano social, para pintar com mais fidelidade os vicios ¢ ri afeulos de sua época, Penetrando, como um verdadeiro cléssico, no estudo das grandes paixdes da humanidade, Algumas outras pecas: 0 Avarento; 0 Burgués Fidalgo; 0 Doente Imaginério; 0 Cornudo Imaginéri As hulheres Sébias; etc,

You might also like