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6661 9p 05 anbiquiesop] ura owstferuooo-sod 3 OUISTPeTUOTOS ‘oyTequs], Loymides odeqeg 261 2D OW 2p TE Ep histradores coloniais, Esses chefes trad lonais, por sua veg, cram a dos, nas viriasaldeias, por ‘ndunas ou «cabos de temmasn ‘Quando, por motivos escolares, i resi, em fins dos anos 40, com | ares em Lourenco Marques, como entiosechamava a cidade capt figuci a vives, por ironia do destino, 20 lado do posto da Munhuann ap Reneria do cimentor, cenério pouco se alterou: wes das de resolu de milandos e 0 castigos corporas mantiveram a sua reguladade aan nal, asim como as filas de trabalhadores forcados escoltadee or polls ‘A sociedade colonial proporcionou-me outra experéncia, cuja dimen. eae trigica s6 alguns anos mais tarde pude apreender: a servidio dy {apalho doméstco. Homens adultos, muitos dees chefs de fata ae balhavam na realizagdo das tarefas da casa, sob as ordens severe dist "poten 4 mulher do «parios, dos primeios alvores da madrugade ag alas horas da noite quando, apésservidoojantar,alouga limpe saa {fais ma vez arumadas,lhes era permitido recolheremse 3s suas extent de patha nas sdependéncias dos criados» no fund do quimal fect itomético é que cu, scusivel aos maustratos da administacdo ou do trabalho forcado, nio me apercebiaentio da cruel condi denny trabalhadores,residindo em instalagbes desprovidas dos mais element Teqhisitos de conforto¢ higiene,afastados das familias, com salirios mi Serves, mal alimentados, pobremente vests, humilhados 4 mais pe Tiszefalha ou suspeita ea quem era concedids a tarde de dominge, tnt 0 fim do almoco ea preparaio do jatar, como tinco tempore, rmanal de que podiam dispor. A sua presenga na casa faa pate da quo- Lian, como as mobilias, o$ objects, os animais doméstices Coy conscientizacio social e politica Nos anos vividos no interior da colénia, Norte de Mocambique, notava que, quando um duzida por um branco pasava na estrada, os camponeses persona para re ea re as crud da deminer porous. Ti iiia cle, de um sduplo crime>, Por um lado, 3 fi am 3 ender nos mraos nas un gti de ao eb ag 0 lado, aquele a : Bee reap prs aimentar nds da meuopol en i 1 Mogambique sob a ida, importado novamente por de produtos manufzcuados, a muito dos quis a maioria dos stinks spade made algodio era, portanto, uma cultura obrigat6ria,u : fomeo fara, Com efit. nela patcipavam todos os membros omen abr a nov Lvs 26 mulheres prepara 4 a semente e todos, incluindo as criangas, semeatam, Todos findos «pés de algodioe, todos patcipavam a dada clin ; \sacamento para o mercado. O ps SS comerciante local (mais tarde, drectamente 0 Estado) em merca feito. : Bee Persie ia dicada de 60, a um dees mercado a fe s produtoras percorriam distincias longas, com spent de cs de uilos as costas, esperavam horas ~ por vezes de Be aba vio o Senge ser cascade pesado pel propio jprador, sob o olhar ciimplice do fancinino do Instto to lg ria de regra, com critérios viciados. Os mercados a d sno etamo de espoliaio do bao do campontsOs ma 3 proventos da venda destinavam-se, proritariamente, a0 paga ais nao eram remiveis em espécie. : (Quester economic, ioe juridicaprsidia a eta craic ' colin é ? Que «cul- p trabalho nas colénias, ina segunda meade do séeulo 2? Que = do wablor esta filosfin colonial crow no mosambiane coe quéncias decorrem deste colonialismo feroz e tardio pat de Mogambique de hoje? A centralidade do trabalho Nas sociedadestradicionais em Mocambique, a esséncia do poder racteriza-se ~ ressalve-se a generalizacio ~ pelo controlo dos melos de ie roducio humana: a familia (0 parentesco) e a economia de subsisténct Conceitos como vantagem econémica eacumulagio, quando existam, no estavam associados ao trabalho, mas ao sistema de trocas ede seq ranea da comunidade e fiandamentadas no valur de uso, Pritico ou sim. bilico. Os excedentes de producio eram, habitualmente, entregues ao hele a0 qual competia prover is necessidades da comunidade nos pe todos de escassez ou de calamidades. A utilizagao sistemtica do trabalho escravo, em especial nas grandes Plantacdes agricolas de ocupacio intensiva de mio-de-obra extispava at comunidades as familias de homens ¢ mulheres, fandamentas para gr rantir os processos de produsio e reproducao das sociedades tradiciona, 58 com o dectinio da economia escravagista se inicia, em Mocambi {lie introducio de valores decomentes do modo de produgao capita fista embora contaminados por relagdes sociais de producio pré-capite, listas, Nos fins do século xtx, Portugal ~ ainda governado por uma aristo- cracia decadent e perduliia~ dispunha de uma economia atrsada que tinha, na actividade mercantil e na renda, as principais fontes de acunt lasio. Embora obrigada, pela pressio da Inglatera, a aceitarailegalizacio da escravatura, o colonialismo portugués em Mocambique continues « assentara sua base econémica na exploracio intensiva de mio-de-obra, retocando o ordenamento juridico que regulava a sua utiliza, A pres- {acdo compulséria de trabalho individual passou a fazerse através deta, balho obsigatério assim como do trabalho correccional, forma penal de emir em prestagio de servico puiblico infracgdes menores ou dividas Para com o Estado (multas, impostos, etc, Sob a etiqueta do «trabalho livre», camponeses continuaram a ser wexportados» para os tenitérios v-. ~2inhos através de contratos colectivos entre o utilizador eo «recrutador, © angariador ca mo-de-obra. O srecrutamento» fazia-se, com muita fie guéncia, através de acordos com as autoridades administrativa ou, di. Fectamente, com os chefes tradicionais, a quem o «recrutadot» pagaa tum prémio por individuo sem se preocupar como a sua selecgdo fora efectuada. Em todo este circuito, entre a sua seleccio ¢ o benefiddrio final do seu trabalho, o camponés estava mercé do sistema, sem qual, quer possibilidade de acesso a mecanismos onde pudesse declatar e ca. ‘écter endo-voluntirio» da sua participagio, Qualquer manifestagio de 158 ia fio incor ig abi das al ai com ibilidade de ser exilado, como etiminoso, cca Bisse ctasripec vere oo frfia pide plo poder dona “a esa. Existia ut tal cumplicidade da administragao portugu a fori dos Nepécios Indigenas aquem competi, por leat do impossivel intervi, dor nio-asimilados, Conrado, er quse impose inte do que alguém o quiese fazer, porque a Carn sem de 9 funcioniivn do proprio Quadro de Adminisasso Cv tcomissio de servigor, nio dspunha de uma coberuraefectva de i t 6 ‘ionario ad- iri, send representa lament pel proprio funcionso a istrativo envolvido no sistema A superestruturajuridica servia, afin L Gar cobertura uma nefnds pica de semiescravatra os as eas de uncionis hones eam tes porque a sua excepcionl .cia mascarava, com a fantasia da «missio civilizadora», a perve tema, ; / EGtabalnocompusbio, no inter do eritéro,er vil pico sn onnagdo da etatrn de pregos para o mercado, 2 eat ios de investimento. o araso cientfico, tecnol6gico e organizativo Zo do sector empresaial na col6nia ara o «trabalho livre» e nos argumentos usados para jutificar Fmediagbesjrdias que o legisladres no puderam evita refere a pressio britinica em termos inequivocos Alngatena valine da situa cm que Port smo fa invasesnapoleéncs, paahearancaraadesi i campanh antec Grits qucacabavs dence embora ease conta or interes ais imediatos [Cunha 1949, 33] Logo adiante, no mesmo estudo, reconhece que {em tba sca bao bia ext uma zon de transicio por vezes tio ténue que s6 porexclusio de partes se p [Cunha 1949, 73] E esclarece em nota de pé de pagina: A disingo coneiual ene wabulo euro ¢uabalho obits facil, as suas manifestagBes concretas por vezes é que se confundem [Cun] 1949, 73]. Silva Cunha tanscrve, depois, 0 Rlatrio da Comisio, de 1899, fho qual, nas suas palavras, «ustifica-se magistralmente o principio 159 trabalho obrigatério» e em que, a modo de cone reve: a Comissio es: Portugal precisa, precisa absolutamente prsperars herds de Afene spencers ae Produtvidade | Precisamos do trabalho do indigenas,até fara elle 2 condcio deve wabahadores[u] A nasa Acs topical ios cali © com africanos. O capital que se prestara explora, e que tio theséhbde pedi ahatho pan weaplongoen toheleo hata pee resitente; eee trabalho, em tis condi, nunca logerio Fomecertho a smigragBes europeas, que o impaludismo dizima [Cunha 1949, 158] Do ponto de vista conceptual, a obrigatoriedade do trabalho funda “se no conccito de vadiagem, na época também aplicado nos paises euro. peus onde o desenvolvimento industrial, carecendo de mio-de-obra nie 5 compadeca com a ociosidad dos pobres.Todavia, a condicto de station et iad na cola, exclusvament aos interes dositma de plo olin guem tbs pro colon, ae pro idade para trabalhar (notese que, por fade restos econ agin tinha de ser esmadao que daa, autoridades Inert soe ncn Ae sonia na ara dos limits sabceclo) Anes bens ua das fomasies cconémics da sociedad waco io cram, ne » i como trabalho, mas sim c¢ fo id No preimblo do Cdigo do tabalho dor ingen nes cng portuguesas de Aftica, publicado em 1928 pelo Estado Novo, afemava, + explictamente que o seu sobjctvo ni ea aterar mas ‘do-somente a emai, aralizar € aperfeigoar as disposigdes reguladoras de mio- = vigor nas colénias. E neste quadro que se vai desen- volver o trabalho nas culturas obrigatérias ¢ a Contribuigio Bracal, pel: gual os indigenas entre 18 e 55 anos eram obrigados a tabalhos ‘de in. teresse piblico’ num minimo de 5 dias por ano» (Moutinho 2000, 210) © Diploma Legsltivo n° 2267 de 5 de Julho de 1950 deminay a em tines diese sb propst da autoridae administra 0 govemaor provincial pia autriza vo emprego dos indigenas no tanpore de peat (s tos o meds) Exe Diploma ace anterior legislasau sobre o direito a tensvoa sodos os funiontios militares cdeistco sev bom con suas mulheres, ilhos menores,legitimos ou perflhados ¢ enteados me. nores, a mie do funcionério, irmaos, flhos legitimos ou perfilhedos « enteados, etc, ete» (Moutinho 2000, 211). nos 160 balho ¢ assimilacionismo na génese do do colonial ‘© sector econémico de subsisténcia, como bem explica Claude Mei Jassoux (Meillassoux 1982, 21), pertence a «esfera da circulacao do capi falismo», porque nele se concentra forga de trabalho ¢ renda, mas esti da cesfera de produgio capitalista», uma vez que nao implica inves rento de capital e as suas relagdes de produciv siv pré-capitalistas. ‘Aeconomia colonial em Mocambique, nao tendo climinado 0 acesso ‘aativo» terrae nio tendo interferido na concepgio de trabalho den- ‘da economia tradicional, beneficia de um processo combinado de riagio tanto da mais-valia do «trabalho livre» a baixo custo, como renda proveniente da economia de subsisténcia, do trabalho correccio- ‘edo trabalho obrigatério, individual ou familiar. Célia Nunes chama atencio para a natureza contradit6ria da articulacio dos dois modos produgio que, se por um lado «preserva a economia doméstica», com |, por outro, «0s elementos da sua destruigso a longo prazo» (Nunes ), 190). Esta organizacao econémica das colénias (aqui concentrorme no caso ‘mocambicano) faz surgir um conflito, na passagem do século XIX para 0 ‘século Xx, entre legisladores metropolitanos inebriados pelos ideais do Tiberalismo triunfante na Europa ¢ os militares da conquista colonial, conservadores, fundamentando os seus pontos de vista na experiéncia idecorrente das responsabilidades de governagio assumidas apés a vitéria sobre 0s ordenamentos politicos locais. ‘Os legisladores metropolitanos, evolucionistas, preconizavam, como ‘vocacio humanista da colonizagio, a politica de assimilaglo, através da gual se deveriam «iluminar as trevas> que envolviam 0s «povos atrasados» Tevandothes a «luz da civlizacio»; os militares insurgiam-se contra tal ideia preconizando um processo assimilacionista a muito longo prazo de forma a permitir que o dominio portugués sobre a col6nia se consolidasse «Portugal tivesse tempo para ganhar uma pujanca econémica e um do- minio sobre o territério que lhe permitissem ombrear com os restantes jimpérios. A geragdo de 95 tinha intuido, a partir da propria experiéncia pté- tica, a incompatibilidade dos dois modos de producio ¢ que «a longo prazo», quando a ordem capitalista destrusse a base sociocultural do sec- tor doméstico, a «assimilagio» seria inevitivel...e, entio, desejavel. Lorenzo Macagno cita Mamoco e Sousa, professor de Administragio Colonial e, mais tarde, ministro da Marinha e Ultramar que, em «Regime 161 Jost Luis Cabao Juridico das Populagdes Indl ago s Indigenas» publicado em Ad a em 1946, pela Secretaria Geral das Colénias, cca a A manutengio dos usos e costumes indi mit : imes indigenas deve-se considerar como uma stat ovr gpd logs or mau meno ep lestinada a desaparecer [Macagno 2001, 74]. * Confluiam, na elaboragao da gerago de hon lisada humlhaca pelo culsmatambriinico de onere ec 1990 a compreensio pragmitia de que, para uma potenca inanceiram gruina o wand cpa sponte a caro prazo eso bai a le trabalho submetida e, portanto, de custo este frame oan ete los paises do hinterland representavam capitais compli : dos pats do jplementares a serem O trabalho assume, deste modo, uma posigio ce f lil em Mogambign,Ateoniagio devina sina slong ene procutva ir ao enconto dos ides iuminisas que ferilzavam 0 = Blcanismo floecente em Lisboa eno Fort, os andes ets wibanos do império.Negoas asin uma borage inspad no efit brsgmatsmo bitnico nm context contagido pels elboragdes te "eas do imperialism gaulés por forma a asseura os indspensiveis 1poios politicos nacionais e intemacionais. A geracdo de 95 arquitect as propos ola present mtr do mito da cultura do te batho numa concesio 2 var cardea da burgusia em atensio, mas asentando aston m ns pos concepts: au fg co lead a espns imperial ace deci dos Anténio Ent cu O sno Eanes nose Famoso reat de 1893 sobre Mogambigus, O trabalho ¢ a missio mais moral a ssio mais moralizadora, a escola mais instrutiva, a au- dae ma dcpiadon congas mens eas eee, eo as ode cepa senis ovo a is pola qu i de epiniroexre >, eligido que rebaterd 0 maometanismo, a educagdo que consegui metamorfoear brit em homens [Eanes 1946,73). eu ince? Pos ants d pica labor! que o colonizado ia palatine mente aprenden 0 rncpios «ox preets da ciao ocidetal nasua vero rt sada, As mists cata se peda esencalment ativor fosse ensinado a ler, a escrever, a contar € a temer e servir Teabalo, colonialsmoe piscolonilismo om Mogambignt Deus Universal e aos seus representantes na terra, 0s colonos. Ao es ‘olonial competia a responsabilidade moral de tuelar este processo ador. No texto de Marnoco ¢ Sousa jé mencionado pode ler-se: ‘A mie-pitriaincumbe o dever da tutela para com eles (os colonizados}, guiando 05 seus passos no sentido da civilizagdo [Macagno 2001, 74). " Orconceito de twelaé 9 instrumento teérico através do qual se justifica 9 dos «tempos» da assimilacio. Macagno explica como ele se arti- harmoniza com o de fimgdo cvilizadora na politica colonial de e seus companheiros: «Se 0 assimilacionismo unificador (dos ilt- ‘metropolitanas) pretendia queimar etapas ¢ outorgar diteitos po ‘de forma imediata, o asimilacionismo descentralizador, em troca, endrou um modo de adiar, em nome de uma ‘tutela justa, humani € civilizadora’, a outorga desses direitos» (Macagno 2001, 74). tA descentralizasao preconizada pela geracao de 95 visava precisamente pelo tempo que a «responsabilidade de tutela» achasse neces- pe conveniente, a dualidade socioeconémica colonial mantendo dois tos juridicos:wivilizados»e «indigenas», Um cédigo dejustica para lizados e um cOdigo «descentralizado» para os indigenas; um codigo o para os cvlizador e outro «escentralizado» para os indigenas {tes aos primeiros inseriam-se nos principios «univer- {que norteavam a ecvilizacdo» ocidental; 0s codigos «descentraliz com a justificacio do respeito» pelo grau «mais atrasado» dos in- yas, nao se identificavam com esses valores «universais» ¢ postergavam aplicacio, para quando a assimilago «fosse possivel» Sendo a sociedade colonial, por natureza, uma formacio sociopolitica dda numa relacio de dominagio e, portanto, de desigualdade, (na ploracio econémica em beneficio da Metr6pole) ¢ evidente que os luministas que inspiravam os legisladores republicanos do inicio ‘séeiilo nao podiam ter triunfado. A gerapdo de 95 era a verdadeira in rete das forcas predominantes em Portugal nesta fase de expanssiv car td escala planetiriae, portanto, impos naturalmente os conceitos jue defendia. ‘A politica colonial do regime comporativsta de Salazar que se implan- ‘com o golpe de Estado de 28 de Maio de 1926, continuow, com adap- Imenotes, a elaboracio formulada no principio do século. O Acto Honial, publicado em 1930 e que constituiria o documento orginico ypério por trés décadas, & a demonstragio dessa continuidade, igos referent José Luis Cabago Durante 0 apogeu do colonialismo em Mogambique que esses trinta anos epresentaram, mantevese eats acentuouo carter servi dasre- lagdes sociais impostas aos colonizados pelos dominadores Do trabalho escravo ao trabalho Ori raba compulsério: continuidades P 7 __ Ocorre tuma pausa de reflexdo sobre como este colonialismo brutal ¢ cinico se casa com a tio propagandeada «maneira portuguesa de estar no mundo», com a imagem dos «brandos costumes», com a «integragao har- ménica» do «luso-topicalismo» de Gilberto Freyre, com a sbondade in- tuinseca» que Jorge Dias via na identidade do portugués, movido por «uma visio mesinca que tomava frente das demas gest imperl tana ae pritica colonial eax Moyainbique ¢, principalmente na mentali- lade da maioria dos colonos, nao houve, de facto, uma ruptura com a estrutura de pensamento dominante na época da escravatura. Algumas ‘manifestagdes se prolongaram muito para além da aboligio oficial da condigao de escravo, reforgando as concepgdes, as atitudes e os compor- tamentos que estavam na sua origem. ‘Atentemos nas passagens do texto de Lyons McLeod, um britinico que, em meados do século xIx foi viver para a Ilha de Mocambique (entio capital da colénia e importante centro de trifico de escravos) € que, em 1860, publicou em Londres as suas Tiwvels in Eastern Africa with the narrative of a residence in Mozambique: ‘Quando ficémos com a casa, os escravos,exceptuando um que era car pinto e pti serum proteido da portuguesa Rena, ram, em exeepaa ‘os negros mais miseriveis e de aspectoinfeliz que me fora dado ver. Parecam terestado semiesfomeados durante um longo periodo e encontravam-se co bertos de cicatrze eferidas, resultados evidentes de um tratamento brutal [..] Observei, quando ele apareccu no meio deles, que batiam as palmas, ome ss alesse com a sua presenga, mas no qualquer expresso lesca magia not seus semblanter © em breve fquel a saber que bata ab palmas quando me viam, ou a minha mulher, na verdade ou, de facto, a «qualquer pessoa de cara branca ~e que nio era apenas um glorioso privilégio seu serem eseravos, como tinham de exprimira sua alegria deste modo 20 contemplarem os seus oprssores [Sattee Sopa 1992, 1947-1948] E, mais adiante: A ragio alimentar [que] nio era, na verdade, suficient ; , na verdade, suficente para manter a vid, [Tera did mai ov menos uma vez or semana; um da ait Trababo, colonialismo ¢ pés-colonialismo em Mogambigue ‘ou a menos nio parecia preocupar ninguém [e} era, € claro, ingerida com Grider e o que era, presumivelmente a ragao de uma semana raras vezes du- Tava mais do que dois ou trés dias e, a0 quarto, estavam todos a gritar por omida. Até 20 final da semana nao tinham qualquer hipétese de receber Imai [.] por isso, tinham de os [os seus amos] roubar[..]; caso fossem apa Inhados eram chicoteados.[..] Caso sejam encontrados a roubar cacas das coqueitos, € costume em Mocambique autorizaro dono ou o guarda do pal Imar a abaté-los a tiro. Nao se faz qualquer inquérito & forma como ocorreu Tpinorte do escravo ~ e 0 corpo ¢ atirado ao mar. A razo para thes darem to pouca comida [é por] provirem de uma raca temida e ser necessirio “qnanté-Jos subjugados. Os portugueses vivem em continuo terror de que seus “tscravos se levantem contra cles e, por isso, empregam todo o seu engenho Tatiagio de meios para os controlarem e dio provas de um alto grau de “dade que julgo nao existir noutras comunidades escravagistas [Satite © 1992, 149-150]. aque a narrativa de McLeod decorre no periodo do debate 4 abolicio da escravatura por Portugal. Esse periodo decorre de quando «Portugal assume a primeira obrigagio internacional para do trifico de escravos» (Cunha 1949, 129), até Abril de 1878 por forca do decreto de 29 de Abril de 1858, a escravatura é de- te abolida texto fala por sie explica a importancia fulcral concedida pelo co- portugués & pritica dos castigos corporis, até meados da dé- de 60. Fle suscita analogias impressionantes com a minha experién- ‘vida, um século mais tarde (0 nio recordar as historias ouvidas sobre os trabalhadores das ‘mandados pelos patrdes & autoridade administrativa local para Dpunidos fisicamente por pequenas faltas ou mesmo por baixa pro- lade e que, nestes desventurados, as palmatoadas deviam ser apli- has nddegas, e ndo nas mios ou pés, como era tradicional, para pudessem continuar a trabalhar apés a punigio? 10 nao reconhecer, nas situacdes subumanas relatadas, a hu- do chefe de familia, «empregado doméstico», esbofeteado fesposa do «patrio» por uma insignificancia ou mandado 3 auto~ ‘corn um bilhete escrito por ela, pedindo (por vezes sem qual- sexplicacio) que fosse aplicado ao portador este ou aquele castigo al? fesquecer as conversas ouvidas relatando 05 abusos ¢ a brutali- deste comerciante ou daquele fazendeiro, ¢ dos seus capatazes ¢ a cumplicidade da administragio colonial, garantindo a im- ide pr tas priticas? a ddos gentis macuas na orla das estradas estava a ane et 40 pobrescamponess~ parafaseando McLeod Saapene prio. Stem caries, como inham de exprimir a 10 a0 contemplarem os seus opressorese? pena tio Nex enfim, na essénca do modo de producio esravagsta ‘osambique no século x1x, 0 perfil do modo de pred G0 colonialista que imper é Secale sect St? Ue imperou no terrtério até meadas dos anos 60 de Prepoténcia colonial = «que ni A ideologia do trabalho como legado colonial © trabalho produtivo, que Anténio Ennes aprese tava como «a mi pre que Antér innes apresent S20 mais moralizadora», nao foi, afinal, outra coisa d Buesia colonial portuguesa, Adelino Tomes, a este propdsito, cerca > escreve: A miorde-obra «indigenae é, enti vst indigena» é, entio, subtil mas violentamente ws rede isd trabalho frgadow, compelidon, contrtadon Re eos -sc, em tltima anise, a legalizagio = 4 legalizacdo legitimadora de velhas prticas tho escravo,semiescravo ou sevl [Tome 1991, 38, Panic Accaltu é pois ut 2o tabalho» que ¢ legac da experéncia colonial nao & Pen gc ciilizagio das luzes», da revolugio industrial on da pen, a to da ma, mas sim uma sobrevives dc en =m ; cia dos model . sam arevolusio civilizacional que, no mundo tstio, aoe © aanil€nio das trevas». O «enobrecime a bre ( opeSsjau “feua eroupaLsziqos efad emny ap eure WUD OpeULIO}sUEN ‘OlfeqeN Op «-Z21GOU» ep OsIND UI OFSASUODSap e > P1009 apepardos ep sopeztfeurrew sop o13s OU “«oUfeqen Op esNIN>: Bun 9p exfey B annua seumn!Za] OBS sv anb seSnsaaut aueyodusr 5 eru]O9 oeSnpord ap oj >peyn pf soyurute> “exaueU ens & ‘opuztiosiadas paso — sazoyea ap 2 seonp stalaueg ap eplaoidsop ‘sopmnppx> Sop apepiuewiny v wos vpednooaid souau > rurLOMe s ovdeztjeqof? ep asey aquasaid e eprpau aonb wro 19puca: 2 apeprusapout-sod ep jeurpiqy :2pod oped opmuansqns 9 ewispoui apep 1 ep seuyjdiostp s9pod o anb wa ‘ouinsuod ov yenu20 Jack pao oyfeqen o anb wo yerpunur eoru > wapio ew sonyi3 nsuop soe eioupiade p seuayuod se ezipiquiauna 2 orSefnumoe ep [EMA 20009 Op asaup8 v emEysap ‘OnIUIOUOD ODFDxax9 Op exodku>} ORSUaLY p euin ap or’ 2 sodsaqur as «epeustisau eSuesD4> ES 2 os saqaouod ayuessaiaqu g “apepriuopoul eped sorsod soyesap 80 2 tua} Goud so wo> ‘sopinppxo 9 sopezijeurfieux sourorqureSou! sop 080] P op epi coannpoid ogjeqen op [ei20s eraugiosuos eprz03sip Pssap SOMIa}9 So od aiuersie ayuausjersadso awi-2oared ‘ara8ns 10}09 OYfeqen Op eanpUIE|Goxd v an sagisanb sexu se a1 9] sopezitiojoo so anus !P FIMy]No» eum Opextap ‘sqrSWISDIduNS “eIAEY BY CUISITETHOIOD [uusse ep ossz00ud ojad epeidooo aura ep opSd2oxa wor) “oe >» OF a wopeuriador oP ‘1/6 ] WH 08831840 []] 0 sode an > PHY Opnivy ofad opuasuo> ex anb owstuoReoxd oF erpuod eaeZojerp esugpusd>pur v anb woo je1oqe] apepyeay Vy Douse opdnpord ep eanezruesio 9 vor -pjousar opSeugysuen & o> «ay-opuezuEra|ords ‘oxsoloxd ays0 smBas 9 re1ode ap eougisty wjares v eusy “eeupsodo assepo» ep Opelfe OWIOD ‘0% ysadure>» Q “euesIqUIeSoU! apepaioos ep oBSezmusspour af eIsodoxd v 1) 90 380 orp.re} oulsiyeruo[oo o 21qos soresuyy O“sezIUO]OZD ep SO1INCD SEC

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