You are on page 1of 9

Ferreira Filho, S. S. & Sakaguti, M.

Artigo Técnico
Comportamento cinético do cloro livre em meio aquoso
e formação de subprodutos da desinfecção

Kinetic behavior of free chlorine in the liquid phase and


disinfection by-product (DBP) formation
Sidney Seckler Ferreira Filho
Engenheiro Civil pela EPUSP. Professor Associado do Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo

Mariane Sakaguti
Bacharel em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista (2006)

Recebido: 23/08/07 Aceito: 27/04/08

RESUMO ABSTRACT

Uma das formas indiretas de previsão da potencialidade One indirect approach to predict the disinfection by-product
de uma determinada água natural formar subprodutos da (DBP) formation potential for a given water source is
desinfecção é mediante a avaliação do comportamento by evaluation of the kinetic behavior of free chlorine in
cinético do cloro livre na fase líquida e determinação de sua the liquid phase and chlorine demand determination
demanda para diferentes condições de operação do processo for different operation conditions of the chlorination
de cloração. Desta forma, o objetivo deste trabalho foi avaliar process. The objective of this work was to evaluate the kinetic
o comportamento cinético do cloro livre em meio aquoso para behavior of free chlorine in water or a number of different raw
diferentes tipos de água bruta, bem como investigar o impacto water sources, as well as to investigate the impact of the coagulation
do processo de coagulação na redução da demanda de cloro e process on chlorine demand reduction and DBP formation. It was
na formação de subprodutos da desinfecção. Observou-se que, observed that the higher the total organic carbon (TOC) removal
quanto maior for à remoção de carbono orgânico total (COT) efficiency through coagulation, the lower the liquid phase chlorine
pelo processo de coagulação menor será a demanda de cloro na demand. Regarding trihalomethane (THM) formation, a ratio
fase líquida. A formação de THMs apresentou relação com a of 28 ug/L formed per mg/L of applied chlorine was observed for
demanda de cloro, tendo sido esta da ordem de 28 µg/L para the waters employed in the experimental investigation.
cada 1 mg Cl2/L de demanda de cloro observada.

PALAVRAS-CHAVE: Cloro, subprodutos da desinfecção, KEYWORDS: Chlorine, disinfection byproducts, water


tratamento de água, cinética química. treatment, chemical kinetics.

INTRODUÇÃO do crescimento e desenvolvimento de relativo à utilização do cloro livre como


biofilmes nas unidades componentes agente desinfetante diz respeito ao seu
Durante o processo de tratamento do processo de tratamento, entre outras emprego em sistemas de abastecimento
de água, podem ser utilizados diferentes (Montgomery, 2005). Historicamente, compostos por redes de distribuição
agentes oxidantes, tendo diferentes o agente oxidante mais empregado em com tempos de detenção hidráulicos
propósitos. Dentre os mais utilizados processos de tratamento de água tem muito elevados. Em função do con-
pode-se citar o cloro, cloraminas, dióxi- sido o cloro, na forma de cloro gasoso sumo de cloro livre e decaimento da
do de cloro, permanganato de potássio, (Cl2), hipoclorito de sódio (NaOCl) e sua concentração ao longo do tempo,
peróxido de hidrogênio, ozônio, entre hipoclorito de cálcio (Ca(OCl)2). muitas vezes, a estação de tratamento
outros. As principais aplicações resul- O cloro como agente oxidante de água (ETA) efetua a aplicação de
tantes da utilização de agentes oxidantes e desinfetante apresenta uma relativa uma dosagem de cloro relativamente
no tratamento de água objetivam a estabilidade na fase líquida e, após um alta a fim de que seja mantida ao longo
oxidação de ferro e manganês e sua pos- determinado tempo de contato com de toda a rede de distribuição uma
terior remoção por processos de sepa- a fase líquida, as suas concentrações concentração de cloro residual livre
ração sólido-líquido, controle de odor tendem a zero ou a valores aproxima- superior a 0,2 mg Cl2/L.
e sabor, remoção de cor, desinfecção, damente constantes, dependendo das Por ser um agente oxidante, o
oxidação de compostos orgânicos sin- dosagens aplicadas na fase líquida e do cloro livre pode reagir com compos-
téticos específicos, redução da formação seu potencial de demanda. Em função tos orgânicos sintéticos e naturais,
potencial de trihalometanos, controle disto, sabe-se que um dos problemas participando de reações de oxidação

Eng. sanit. ambient. 198 Vol.13 - Nº 2 - abr/jun 2008, 198-206


Comportamento cinético do cloro em meio aquoso

Artigo Técnico
e substituição, em que moléculas de cinético na fase líquida e determinação produtos da desinfecção e demanda de
cloro são adicionadas às moléculas de sua demanda de cloro para diferen- cloro (ML-3)/(ML-3)
denominadas precursoras. As reações tes condições de operação do processo A aplicabilidade das equações 3 e
que envolvem o cloro residual livre e os de cloração, podendo esta se dar na 4 para fins de previsão da formação de
compostos orgânicos naturais (CONs) forma de pré, inter ou pós-cloração, subprodutos da desinfecção dependem
são extremamente complexas, uma sob diferentes dosagens aplicadas na da sua adequação a realidade física e,
vez que estes apresentam uma elevada fase líquida. Recentemente, Clark et al portanto, da aderência de resultados
diversidade de grupos funcionais aro- (2001) e Boccelli et al (2003) propu- experimentais de ensaios de demanda
máticos, carboxílicos, fenólicos, bem seram modelos de formação de THMs de cloro a resultados calculados. Desta
como grandes quantidades de duplas sendo esta diretamente proporcional a forma, se faz necessária estudar a sua
e triplas ligações e que são passíveis de demanda de cloro observada. A reação viabilidade de uso para diferentes
serem atacadas pelo agente oxidante. do cloro com os CONs foi proposta condições de dosagem e forma de
As típicas reações do cloro livre com os como sendo uma reação química de aplicação do cloro em águas naturais
CONs presentes em águas naturais são segunda ordem, podendo a mesma ser (pré-cloração e pós-cloração), podendo
as que permitem a formação dos sub- escrita da seguinte forma: as mesmas ser águas brutas submetidas
produtos da desinfecção, uma vez que a c.C + p.P " s.S (1) ou não a processos de coagulação e flo-
grande maioria destas reações químicas C= concentração de cloro residual livre culação para a remoção de compostos
envolvem a quebras de determinadas (ML-3) orgânicos precursores.
moléculas orgânicas e a substituição P= concentração de compostos orgâ-
ou introdução do halogênio em sua nicos precursores de subprodutos da OBJETIVOS
estrutura molecular. desinfecção (ML-3)
Uma vez que o cloro, ao reagir S= concentração de subprodutos da Considerando-se a importân-
com determinados CONs, tenderá a desinfecção (ML-3) cia de uma adequada avaliação do
participar de reações de oxidação quími- c, p e s= coeficientes estequiométricos comportamento cinético do cloro em
ca e substituição, as suas concentrações A taxa de decaimento de cloro meio aquoso para fins de previsão da
na fase líquida tenderão a diminuir, livre na fase líquida, por ter sido formação de subprodutos da desinfec-
caracterizando, desta forma, o apare- admitida como uma reação química ção, este trabalho tem como objetivos
cimento de uma demanda que deverá de segunda ordem, apresenta-se como principais:
ser satisfeita a fim de que seja possível o sendo igual a: • Avaliar o comportamento cinéti-
estabelecimento de concentrações rela- dC = - k.C.P. co do cloro em meio aquoso para dife-
(2)
tivamente estáveis de cloro residual livre dt rentes tipos de água bruta e verificação
na fase líquida. Como a caracterização k= constante de reação (T-1) da adequação de modelos matemáticos
dos CONs presentes em águas naturais A integração da equação (2), assu- que permitam a sua descrição de forma
é bastante complexa, é muito difícil a mindo que seja respeitada a estequiome- adequada.
previsão do comportamento cinético tria apresentada na equação (1), permite • Estudar o efeito da concentração
do cloro em meio aquoso, bem como a que seja avaliada a concentração de clo- de material particulado e da combina-
previsão da formação de subprodutos da ro residual livre com o tempo, podendo ção dos processos de coagulação e pré-
desinfecção sem que sejam conduzidos a mesma ser apresentada da seguinte cloração no comportamento cinético
ensaios experimentais específicos. forma (Boccelli et al, 2003): do cloro em meio aquoso.
Conforme relatado por alguns C0 - a • Investigar o impacto do proces-
C (t) = 6 (C 1) .b.t@
(3)
1 - (a/C0) .e - 0/a-
pesquisadores (Clark et al, 2001; so de coagulação no comportamento
Boccelli et al, 2003), se tem observado c.P cinético do cloro em meio aquoso e
a = p 0 e b = k.P0
que a formação e concentração de sub- na formação de subprodutos da de-
produtos da desinfecção na fase líquida C0 e P0= concentrações iniciais de cloro sinfecção.
resultantes da reação do cloro residual residual livre e CONs, respectivamente
livre com CONs está diretamente re- (ML-3) MATERIAIS E MÉTODOS
lacionada com a sua demanda em fase α e β= constantes, (ML-3) e (T-1), res-
aquosa. Assim sendo, quanto maiores pectivamente. A pesquisa foi desenvolvida ten-
forem os valores de demanda de cloro Portanto, uma vez avaliada a do-se empregado três diferentes águas
observados para uma determinada água demanda de cloro para um certo tem- brutas provenientes de mananciais
bruta ou tratada submetida ao processo po específico mediante a equação 3, superficiais localizados na Região
de cloração, também maiores tenderão as concentrações de subprodutos de Metropolitana de São Paulo (RMSP),
a ser as suas concentrações de sub- desinfecção podem ser estimadas da doravante denominadas de Águas 1, 2
produtos da desinfecção, tipicamente seguinte forma: e 3. As Águas 1, 2 e 3 pertencem aos
quantificadas pelas concentrações de S (t) = z. (C0 - C (t)) (4) Sistemas Produtores do Cantareira, Alto
trihalometanos (THMs) na fase líquida. S(t)= concentração de subprodutos da Tietê e Rio Claro, respectivamente,
Desta forma, uma das formas indiretas desinfecção no tempo t (ML-3) tendo sido as mesmas selecionadas por
de previsão da potencialidade de uma C0= concentração inicial de cloro resi- apresentarem diferentes características
determinada água natural formar dual livre (ML-3) físico-químicas entre si e também por
subprodutos da desinfecção quando C(t)= concentração de cloro residual ser águas superficiais típicas empregadas
submetidas ao processo de cloração livre no tempo t (ML-3) para abastecimento público na Região
é a avaliação de seu comportamento φ= relação entre a formação de sub- Sudeste do Brasil. Com relação ao seu

Eng. sanit. ambient. 199 Vol.13 - Nº 2 - abr/jun 2008, 198-206


Ferreira Filho, S. S. & Sakaguti, M.

Artigo Técnico
estado trófico, as mesmas podem ser
consideradas do tipo mesotrófica (Água Tabela 1- Características das águas brutas empregadas na investigação
1), eutrófica (Água 2) e oligotrófica experimental. Valores médios e desvio padrão (DP) – Período de amostragem
(Água 3). As mesmas foram coletadas de março a agosto de 2006
durante o período de março a agosto Parâmetro Unidade Água 1 Água 2 Água 3
de 2006, sendo que suas principais
pH - 6,2±0,2 6,1±0,4 5,2±0,4
características físico-químicas estão
apresentadas na Tabela 1. Todas as aná- Turbidez UT 1,3±0,4 8,7±1,5 1,5±0,2
lises e determinações foram realizadas Cor real UC N.D N.D 2,5±0,5
de acordo com APHA (1998).
Uma vez tendo sido coletadas, Cor aparente UC 2,5±0,50 30,0±5,0 10,0±2,5
as mesmas foram acondicionadas em Alcalinidade mg CaCO3/L 11,1±0,9 7,7±3,5 1,8±0,5
bombonas de 20 litros de capacidade
e imediatamente transportadas ao La- Dureza mg CaCO3/L 12,0±2,0 13,3±4,4 4,2±1,8
boratório de Saneamento “Prof. Lucas Ferro solúvel mg/L 0,05±0,01 0,39±0,10 0,4±0,1
Nogueira Garcez” para a execução dos
ensaios experimentais. Os ensaios con- Manganês solúvel mg/L N.D N.D N.D
duzidos tendo por finalidade investigar Sólidos em suspensão mg/L 2,0±0,4 35,0±12,0 3,3±1,0
o comportamento cinético do cloro totais (SST)
em meio aquoso foram executados em Carbono orgânico mg/L 2,1±0,3 5,0±0,9 3,3±0,6
escala de “jar-test”, tendo-se preparado total
quatro diferentes tipos de matrizes
aquosas para cada água bruta consi- UV 254 nm cm-1 0,05±0,02 0,15±0,03 0,13±0,05
derada, a saber: água bruta (AB), água N.D: Abaixo do limite de detecção
bruta filtrada (ABF), água coagulada
pré-clorada (ACP) e água coagulada e mente a transferência de um volume de a remoção de compostos orgânicos
filtrada (ACF). 2 litros de amostra para cada um dos precursores por processo de coagulação,
Desta forma, para cada respectiva jarros do equipamento de “jar-test”. A sendo esta dosagem justificada em fun-
água bruta coletada, uma alíquota da seguir, a rotação do sistema de agitação ção de resultados experimentais obtidos
mesma era submetida à filtração em era acertada para cerca de 200 rpm, o por Frederico et al (1999).
papel de filtro Whatman 40 e poste- que corresponde a um gradiente médio A escolha pelo sal de ferro como
riormente em papel de filtro GF/C a de velocidade de aproximadamente coagulante e a faixa de pH de coagula-
fim de que fosse possível a retirada de 500 s-1 e, imediatamente o seu ajuste, era ção situado entre 5,8 a 6,2 justifica-se
material particulado e parcela do ma- efetuada a adição do coagulante e base por ser esta considerada adequada para a
terial coloidal e, assim sendo, pudesse para a correção do seu pH de coagula- remoção de CONs por mecanismos de
ser preparada à amostra denominada ção. A correção do pH de coagulação foi coprecipitação (Semmens et al, 1980;
água bruta filtrada (ABF). A execu- efetuada mediante a adição de volumes Jacangelo et al, 1995) e por ser o sal de
ção dos ensaios cinéticos de cloração pré-determinados de NaOH 0,1 M ferro mais efetivo quando compara-se
tendo-se empregado a amostra ABF com base na execução de curvas de ti- com sais de alumínio como agente
teve por finalidade avaliar o efeito da tulação específicas para cada água bruta coagulante com vistas à remoção de
concentração de material particulado na em questão. Após 60 segundos de mis- compostos orgânicos precursores de
demanda de cloro quando comparado tura rápida, a rotação era reduzida para subprodutos da desinfecção (Garzuzi
com a água bruta. 40 rpm (gradiente médio de velocidade et al, 1991; Frederico et al, 1999).
A partir da água bruta, também igual a 30 s-1) e procedia-se a etapa de Para todas as águas denominadas
foi produzida uma alíquota de água de- floculação considerando-se um tempo AB, ABF e ACF, foram efetuadas as
nominada coagulada e filtrada (ACF), de mistura lenta igual à 15 minutos. determinações de carbono orgânico
mediante a execução de ensaios de Após este tempo, o equipamento era total (COT) em equipamento TOC
“jar-test” tendo-se empregado cloreto desligado e permitia-se a sedimentação 5050 Shimadzu e absorbância em ra-
férrico como coagulante com uma dos flocos previamente formados por, diação ultravioleta no comprimento de
dosagem igual a 50 mg FeCl3/L e pH no mínimo, 30 minutos. Efetuava-se a onda igual a 254 nm (UV-254 nm) de
de coagulação em torno de 5,8 a 6,2. coleta de 1 litro de amostra em cada jar- acordo com metodologia apresentada
A produção de uma água coagulada ro e procedia-se a sua filtração em papel por Garzuzi et al (1999).
e filtrada para a execução dos ensaios de filtro Whatman 40 e posteriormente Os ensaios cinéticos de demanda
cinéticos de cloração foi permitir avaliar em papel de filtro GF/C a fim de que de cloro foram efetuados em escala
o impacto dos processos de coagulação fosse possível a produção de um volume de “jar-test”, tendo-se disposto um volu-
e floculação da remoção de CONs e, de amostra coagulada e filtrada. me de amostra igual a 2 litros em cada
conseqüentemente, qual a sua interfe- Por não ser um dos objetivos do jarro. Após a adição da amostra, a rota-
rência na demanda de agente oxidante trabalho a otimização do ensaio de ção era ajustada para aproximadamente
e na formação de subprodutos da “jar-test” visando a produção de água 200 rpm e efetuada a aplicação de di-
desinfecção. decantada, definiu-se uma dosagem de ferentes dosagens de cloro por meio da
Os procedimentos adotados para cloreto férrico igual a 50 mg FeCl3/L adição de volumes pré-determinados de
a produção da água ACF foram inicial- por ser esta considerada adequada para solução de NaOCl com concentração

Eng. sanit. ambient. 200 Vol.13 - Nº 2 - abr/jun 2008, 198-206


Comportamento cinético do cloro em meio aquoso

Artigo Técnico
igual a 10 g/L, sendo que as dosagens culo dos valores de demanda de cloro APRESENTAÇÃO
variaram de 2,0 mg Cl2/L a 6,0 mg Cl2/L observados, a parcela referente a reação E ANÁLISE DOS
para cada jarro individualmente. Após com ambos compostos inorgânicos foi RESULTADOS
a adição da solução do agente oxidante, descontada dos valores de demanda de
eram efetuadas coletas de amostras em cloro observados, tendo-se considerado Influência da concentração
intervalos de tempo iguais a 5, 10, 15, o consumo de 0,64 mg Cl2 por mg Fe+2 de sólidos em suspensão
20, 30, 60, 90 e 120 minutos, sendo e 1,29 mg Cl2 por mg Mn+2. totais no comportamento
que para cada uma destas eram efetu- Para alguns ensaios específicos, cinético do cloro em meio
adas as análises de cloro residual livre uma vez tendo-se encerrado o ensaio aquoso
pelo método DPD mediante titulação cinético de demanda de cloro, eram
da amostra com sulfato ferroso amonia- dispostas amostras de água clorada em As Figuras 1, 2 e 3 apresentam os
cal (APHA, 1998). frascos de DBO de cor âmbar, sendo es- valores típicos de concentração residual
Tendo por objetivo avaliar o tes incubados a 20oC por 24 horas. Após de cloro livre na fase líquida obtidos
impacto da operação conjunta dos este intervalo de tempo, eram efetuadas para as Águas 1,2 e 3 respectivamen-
processos de coagulação e pré-cloração as análises de cloro residual livre na fase te, considerando a dosagem de cloro
no comportamento cinético do cloro líquida, procedia-se a sua decloração aplicada para as águas do tipo AB e
em meio aquoso, foram executados en- por meio da adição de ácido ascórbico ABF. Tendo por base os valores expe-
saios específicos de demanda de cloro, e coletadas alíquotas para a determina- rimentais obtidos de concentração de
sendo que, 60 segundos após a adição ção da concentração de THMs na fase cloro residual livre na fase líquida em
do coagulante e pré-alcalinizante, era líquida. As análises de THMs foram função do tempo e assumindo que estas
efetuada a aplicação de diferentes do- efetuadas por cromatografia gasosa possam ser descritas matematicamente
sagens de cloro e coletadas alíquotas associado a espectrômetro de massa por meio da equação 3, foram obtidas
de água coagulada e pré-clorada em pelo laboratório de Química Orgânica as constantes α e β para cada ensaio
intervalos de tempo iguais a 5, 10, 15, da Companhia de Saneamento Básico específico utilizando técnicas de oti-
20, 30, 60, 90 e 120 minutos para a do Estado de São Paulo tendo-se em- mização numérica (Solver – Excel). De
determinação de suas concentrações pregada a técnica de “purge and trap” posse de ambas as grandezas (α e β), são
residuais de cloro livre. como técnica de pré-concentração das apresentados os valores experimentais
Como as Águas 1, 2 e 3 apresen- amostras (GC-MS-PAT), seguindo as observados juntamente com os valores
tam concentrações de ferro e manganês recomendações da APHA (1998). calculados por meio da equação 3.
solúvel que poderiam interferir no cál-

Figura 1 – Concentração de cloro residual livre em Figura 2 – Concentração de cloro residual livre em
função do tempo para Água 1. Dosagem de cloro: função do tempo para Água 2. Dosagem de cloro:
6,0 mg Cl2/L - COT: 1,87 mg/L 4,0 mg Cl2/L -COT: 5,76 mg/L

Figura 3 – Concentração de cloro residual livre em


função do tempo para Água 3. Dosagem de cloro:
6,0 mg Cl2/L - COT: 5,73 mg/L

Eng. sanit. ambient. 201 Vol.13 - Nº 2 - abr/jun 2008, 198-206


Ferreira Filho, S. S. & Sakaguti, M.

Artigo Técnico
Analisando-se as Figuras 1, 2 e com o cloro livre e que este esteja em Por sua vez, nota-se que para as
3, pode-se notar que a aderência do excesso em relação a fração reativa dos Águas 2 e 3, os seus valores de COT
modelo matemático representado pela CONs, a concentração de cloro livre na para a água AB foram de 4,01 mg/L
equação 3 e descrito para representar a fase líquida tenderá a um valor aproxi- e 5,73 mg/L, respectivamente e, uma
cinética de decaimento das concentra- madamente constante. vez tendo sido submetidas a coagula-
ções de cloro livre na fase líquida é bas- Com respeito a eventual influência ção e filtração, os seus valores de COT
tante razoável, uma vez que se observa da concentração de sólidos em suspen- foram reduzidos para 3,38 mg/L e
que os valores calculados são bastante são totais (SST) e material particulado 2,27 mg/L. Nota-se que a remoção de
próximos dos valores observados. Um na demanda de cloro, os valores de COT observada para as Águas 2 e 3
dos aspectos mais interessantes quando concentração de cloro residual livre ob- foram superiores quando comparada
se analisa a equação 3 é que o valor servados para as águas AB e ABF foram com a Água 1 e esta maior remoção tra-
limite para a concentração de cloro bastante semelhantes entre si, não se duz-se diretamente em uma diminuição
residual livre para tempo tendendo tendo notado diferenças significativas significativa na demanda de cloro para
a infinito é numericamente igual a entre si. Assim sendo, como era de se a água ACF quando comparada com a
C0-α. Desta forma, o valor de α pode esperar, a demanda de cloro tende a água AB (Figuras 5 e 6). Deve ser ob-
ser entendido como sendo uma parcela ser mais influenciada pela presença de servado, no entanto, que este compor-
da dosagem de cloro aplicada que é compostos orgânicos naturais (CONs) tamento das Águas 1, 2 e 3 com respeito
passível de ser consumida por reações na forma dissolvida do que na forma ao impacto do processo de coagulação
de oxidação e substituição, sendo que particulada. na remoção de COT e na demanda
quando esta é totalmente utilizada, de cloro é bastante específico, não se
o valor de cloro residual livre tende a IMPACTO DO PROCESSO podendo generalizar para diferentes
C0-α. Por sua vez, a constante β deve DE COAGULAÇÃO E DA tipos de água bruta. Da mesma forma,
ser vista como uma constante de rea- REMOÇÃO DE COT NA o comportamento de cada água bruta
ção, isto é, tende a descrever com que DEMANDA DE CLORO com respeito a sua concentração de
velocidade a concentração final de cloro COT e respectiva capacidade de remo-
residual livre tende a C0-α. As Figuras 4, 5 e 6 apresentam os ção por processos de coagulação tende
Comparando-se as Figuras 1, 2 valores típicos de concentração residual a ser variável no tempo e suscetível de
e 3 entre si, observa-se que as águas 2 de cloro livre na fase líquida obtido influencia de inúmeros fatores, poden-
e 3 apresentaram maiores valores de para as Águas 1,2 e 3 respectivamente, do-se citar os aspectos hidrológicos da
demanda de cloro quando comparado considerando a dosagem de cloro para bacia hidrográfica.
com a água 1, uma vez que a sua con- as águas do tipo AB e ACF. Da mesma Observa-se que a Água 1 apre-
centração de COT foi de aproximada- forma que para as Figuras 1, 2 e 3, senta menores valores de COT para a
mente 2,0 mg/L, enquanto as águas 2 também são apresentados os valores água bruta do que quando comparado
e 3 apresentaram valores de COT em experimentais observados juntamente com as Águas 2 e 3 (Tabela 1) e, uma
torno de 6,0 mg/L. Desta forma, como com os valores calculados por meio da vez que a sua capacidade de remoção
era de se esperar, quanto maiores foram equação 3. de COT por processos de coagulação
às concentrações de COT na fase líqui- Os resultados experimentais apre- foi também menor, postula-se que as
da, maiores também tenderam a ser os sentados nas Figuras 4, 5 e 6 para as características dos seus CONs presentes
seus valores de demanda de cloro. Águas 1, 2 e 3 respectivamente, ofe- na água bruta seja mais hidrofílica do
Como as características físico-quí- recem aspectos bastante interessantes que quando comparado com os CONs
micas dos CONs tendem a ser bastante com respeito ao impacto do processo das Águas 2 e 3. Desta forma, como a
diversa entre si, a sua capacidade de de coagulação na demanda de cloro ao sua afinidade pelas moléculas da água
participarem de reações de oxidação e longo do tempo. A Água 1 apresentou tendem a ser maiores, menor será a sua
substituição com o cloro livre é bastante um valor de COT para a AB igual a capacidade de remoção por processos
seletiva. Desta forma, os compostos que 1,94 mg/L e, após a sua coagulação e de coagulação.
porventura apresentarem maior capa- filtração (ACF), o seu valor de COT É também interessante notar a di-
cidade de reagirem com o cloro livre foi reduzido para 1,77 mg/L. Uma vez versidade de comportamento das águas
tenderão a fazê-lo com uma maior ve- que os valores de COT da água AB e AB e ACF quando submetidas a ensaios
locidade de reação e a fração dos CONs ACF são bastante próximos entre si, de demanda de cloro. Observando-se
com menor reatividade apresentarão tem-se que o impacto da coagulação os valores de β, tem-se que os valores
menor taxa de reação. Esta diversidade na remoção dos CONs foi relativa- obtidos para as águas do tipo AB foram
de capacidade de reação dos CONs com mente pequeno e, por sua vez, este de 0,53 h-1, 5,88 h-1 e 4,69 h-1 para as
o cloro livre pode ser observada nas Fi- comportamento tende-se a se refletir no Águas 1, 2 e 3 respectivamente. Os
guras 1, 2 e 3, uma vez que nos instantes comportamento cinético da demanda maiores valores de β obtidos para as
iniciais dos ensaios de cloração, a taxa de cloro. Observando-se os resultados Águas 2 e 3 quando comparado com
de consumo de cloro livre em função experimentais apresentados para a Água o valor de β para a Água 1 evidencia a
do tempo tende a ser máxima, sendo 1 e dispostos na Figura 4, tem-se que os maior reatividade dos CONs presentes
que esta diminui ao longo do tempo, valores de concentração de cloro livre nas águas brutas 2 e 3. Por sua vez,
evidenciando a redução da reatividade ao longo do tempo para a AB e ACF tendo sido submetidas a coagulação e
dos CONs pelo cloro livre. Para tempo são bastante semelhantes entre si, não filtração, os valores de β obtidos para
tendendo a infinito, dado que não haja se tendo notado diferenças significativas as águas do tipo ACF foram de 0,63 h-1,
mais capacidade de reação dos CONs entre ambas às águas. 3,22 h-1 e 0,56 h-1 para as Águas 1, 2

Eng. sanit. ambient. 202 Vol.13 - Nº 2 - abr/jun 2008, 198-206


Comportamento cinético do cloro em meio aquoso

Artigo Técnico
Figura 4 – Concentração de cloro livre em função Figura 5 – Concentração de cloro livre em função
do tempo para Água 1. Dosagem de cloro: 4,0 do tempo para Água 2. Dosagem de cloro:
mg Cl2/L – COT Água bruta: 1,94 mg/L - COT 4,0 mg Cl2/L – COT Água bruta: 4,01 mg/L - COT
Água coagulada e filtrada: 1,77 mg/L Água coagulada e filtrada: 3,38 mg/L

Figura 6 – Concentração de cloro livre em função


do tempo para Água 3. Dosagem de cloro:
4,0 mg Cl2/L – COT Água bruta: 5,73 mg/L - COT
Água coagulada e filtrada: 2,27 mg/L

e 3 respectivamente. Nota-se que os são específicos, não podendo os mesmos capacidade de redução na demanda de
valores de β para as águas AB-Água 1 e ser generalizados. cloro em função da remoção dos CONs
ACF-Água 1 foram bastante semelhan- presentes na água bruta por processos
tes entre si, enquanto para as Águas 2 e EFEITO DA de coprecipitação pela coagulação. Os
3, observou-se uma significativa redu- COMBINAÇÃO DOS resultados experimentais apresentados
ção, sendo esta proporcional a remoção PROCESSOS DE nas Figuras 7, 8 e 9 indicam que, de
de COT da fase líquida. COAGULAÇÃO E um modo geral, para as Águas 1, 2 e
O emprego do processo de coa- PRÉ-CLORAÇÃO NO 3, quando foi efetuada a pré-cloração
gulação como técnica de maximização COMPORTAMENTO da água coagulada observou-se que a
da remoção de compostos orgânicos CINÉTICO DO CLORO demanda de cloro foi superior quando
naturais e precursores da formação de NA FASE LÍQUIDA comparada com as águas ACF.
subprodutos da desinfecção é relativa- Tradicionalmente, algumas ETAs
mente bem conhecida e documentada As Figuras 7, 8 e 9 apresentam os são operadas considerando o uso da pré-
na literatura, tendo sido extensivamente valores típicos de concentração residual cloração para fins de oxidação de ferro e
estudada e proposta como técnica de de cloro livre na fase líquida obtido manganês e para evitar o crescimento e
tratamento de água objetivando a mi- para as Águas 1,2 e 3 respectivamente, desenvolvimento de biofilmes ao longo
nimização da formação de subprodutos considerando a dosagem de cloro para das unidades componentes do processo
da desinfecção (Chadik & Amy, 1983; as águas coagulada e pré-clorada (ACP) de tratamento, especialmente nos flo-
Cheng et al, 1995; Crozes et al, 1995; e ACF. Da mesma forma que para as culadores, decantadores e unidades de
Krasner & Amy, 1995). No entanto, em demais Figuras já apresentadas, também filtração. As opções para a prática da
função da diversidade das águas naturais são dispostos os valores experimentais pré-cloração tem sido a sua aplicação a
empregadas para abastecimento público observados juntamente com os valores montante ou a jusante da mistura rápi-
com respeito à concentração e carac- calculados por meio da equação 3. da e, considerando a sua aplicação desta
terísticas físico-químicas dos CONs, O objetivo de terem sido exe- ultima forma, postula-se que a remoção
o comportamento com respeito aos cutados ensaios de cloração tendo-se de parte dos CONs presentes na água
ensaios de demanda de cloro e remoção considerado a sua aplicação na forma bruta por processos de coprecipitação
de COT por processos de coagulação de pré-cloração foi avaliar a eventual quando da formação do hidróxido

Eng. sanit. ambient. 203 Vol.13 - Nº 2 - abr/jun 2008, 198-206


Ferreira Filho, S. S. & Sakaguti, M.

Artigo Técnico

Figura 7 – Concentração de cloro livre em função Figura 8 – Concentração de cloro livre em função
do tempo para Água 1. Dosagem de cloro: do tempo para Água 2. Dosagem de cloro:
2,0 mg Cl2/L – COT Água bruta: 2,39 mg/L - COT 4,0 mg Cl2/L – COT Água bruta: 5,95 mg/L - COT
Água coagulada e filtrada: 1,10 mg/L Água coagulada e filtrada: 2,99 mg/L

Figura 9 – Concentração de cloro livre em função


do tempo para Água 3. Dosagem de cloro:
4,0 mg Cl2/L – COT Água bruta: 2,29 mg/L - COT
Água coagulada e filtrada: 1,20 mg/L

metálico (coagulação) pode torná-los presentes na fase líquida não impediu- ensaios de formação de THMs para as
não disponíveis para reagirem com o os de reagirem com o cloro livre. Águas 1, 2 e 3, estando os resultados
cloro livre. No entanto, os resultados Para a Água 2, a diferença entre experimentais apresentados na Figura
experimentais apresentados nas Figu- os valores de α para as águas ACP e 10 em função da demanda de cloro.
ras 7, 8 e 9 indicam que a remoção de ACF foram mais significativas, tendo- Os resultados experimentais de
parte do COT por coagulação não os se obtidos valores iguais a 3,65 mg/L e formação de THMs em função da de-
torna indisponíveis para reagirem com 1,59 mg/L, respectivamente. A menor manda de cloro apresentados na Figura
o cloro livre, uma vez que para a maior diferença observada entre os valores de 10 indicam uma correlação razoável
parte dos ensaios de demanda de cloro α para as águas ACP e ACF foi notada entre ambas as grandezas, reforçando o
executados observou-se maiores valores para a Água 3, tendo sido estes iguais a conceito de que, quanto maiores forem
de demanda de cloro para as águas 1,38 mg/L e 0,61 mg/L respectivamente. as demandas de cloro observadas, tam-
coagulada e pré-clorada (ACP) quan- De qualquer forma, nota-se que bém maiores tenderão a ser a formação
do comparado com as mesmas águas a pré-cloração precedida da etapa de de THMs na fase líquida. A equação
coaguladas e filtradas (ACF). coagulação não permitiu uma redução de regressão linear obtida apresenta um
Uma forma de se interpretar os dos valores de demanda de cloro e, potencial de formação de THMs em
resultados experimentais apresentados desta forma, ainda que parte dos CONs torno de 28 µg/L para cada 1 mg Cl2/L
nas Figuras 7, 8 e 9 é a comparação tenham sido adsorvidos no hidróxido de demanda de cloro observada. Desta
dos valores da grandeza α obtidos para metálico formado pela adição do coagu- forma, a existência de uma relação line-
cada ensaio e água bruta específica. Para lante, estes exerceram uma significativa ar proposta entre os valores de demanda
a Água 1, foram obtidos valores de α demanda pelo agente oxidante. de cloro e formação de THMs justifica
iguais a 1,53 mg/L e 0,32 mg/L para e valida o emprego da equação 4 para a
as respectivas águas ACP e ACF. Desta FORMAÇÃO DE previsão da formação de subprodutos da
forma, a fração potencial do cloro livre SUBPRODUTOS DA desinfecção, oferecendo uma alternativa
passível de reagir na fase líquida para DESINFECÇÃO EM para fins de gerenciamento das dosagens
a água ACP foi maior do que quando FUNÇÃO DA DEMANDA de cloro aplicados em processos de
comparada com a água ACF e, assim DE CLORO tratamento de água.
sendo, mesmo quando submetida à co- Os resultados experimentais de
agulação e imediatamente pré-clorada, Para alguns estudos específicos de formação de THMs em função da de-
a eventual remoção de parte dos CONs demanda de cloro, foram executados manda de cloro apresentados na Figura

Eng. sanit. ambient. 204 Vol.13 - Nº 2 - abr/jun 2008, 198-206


Comportamento cinético do cloro em meio aquoso

Artigo Técnico
10 indicam uma correlação razoável experimentais que possibilitem validar experimentais, foram obtidas equações
entre ambas as grandezas, reforçando o a relação acima apresentada e expandir de regressão entre as concentrações de
conceito de que quanto maiores forem os limites de sua aplicação. Embora de THMs observadas em função dos parâ-
as demandas de cloro observadas, tam- forma extremamente simples, estudos metros demanda de cloro, concentração
bém maiores tenderão a ser a formação semelhantes comprovam a relação de COT e UV-254 nm na fase líquida,
de THMs na fase líquida. A equação entre demanda de cloro e formação de estando as mesmas apresentadas nas
de regressão linear obtida apresenta um subprodutos da desinfecção e, assim Figuras 11 e 12.
potencial de formação de THMs em sendo, uma vez conhecida, a mesma Observando-se os valores calcu-
torno de 28 µg/L para cada 1 mg Cl2/L pode ser empregada para otimização lados em função dos resultados expe-
de demanda de cloro observada. Desta de processos de tratamento de água a rimentais, nota-se que as equações de
forma, a existência de uma relação line- fim de possibilitar a minimização da regressão linear múltipla propostas a
ar proposta entre os valores de demanda formação de THMs, seja por meio fim de que seja possível a previsão da
de cloro e formação de THMs justifica de redução das dosagens aplicadas de formação de THMs em função dos
e valida o emprego da equação 4 para a cloro ou pela otimização da remoção parâmetros demanda de cloro, COT e
previsão da formação de subprodutos da de compostos orgânicos precursores de UV-254 nm para a fase líquida apresen-
desinfecção, oferecendo uma alternativa subprodutos da desinfecção (Clark et al, taram altos coeficientes de correlação,
para fins de gerenciamento das dosagens 2001; Boccelli et al, 2003). sendo estes 0,94 e 0,95 respectivamente
de cloro aplicados em processos de Algumas correlações têm sido para a Figura 11 e 12. Desta forma, de
tratamento de água. propostas na literatura para a previsão posse de alguns parâmetros de quali-
No entanto, é importante observar da formação de THMs em função de dade de água que podem ser obtidos
que a regressão obtida e apresentada parâmetros de qualidade da água e das com certa facilidade, torna-se possível
na Figura 10 é válida para as águas condições de operação dos processos estimar a formação de THMs para
brutas empregadas na investigação ex- de cloração no tratamento de água águas naturais submetidas a processos
perimental, não podendo a mesma ser (Harrington et al, 1992; Black et al, de cloração de forma relativamen-
extrapolada para demais águas. Desta 1996). No entanto, as mesmas têm te simples, sem que seja necessário o
forma, recomenda-se que estudos se- sido caracterizadas por apresentarem desenvolvimento de complexas equa-
melhantes sejam conduzidos com águas elevada complexidade e uma grande ções de regressão que necessitem de
brutas com diferentes características a quantidade de parâmetros de entrada. elevado número de parâmetros de
fim de que possam ser gerados dados Assim sendo, com base nos resultados entrada.

Figura 10 – Formação de THMs para as águas 1, 2 e


3 em função da demanda de cloro na fase líquida

Figura 11 – Formação de THMs para as águas 1, 2 Figura 12 – Formação de THMs para as águas 1, 2
e 3 em função da demanda de cloro na fase líquida, e 3 em função da demanda de cloro na fase líquida
COT e UV-254 nm e UV-254 nm

Eng. sanit. ambient. 205 Vol.13 - Nº 2 - abr/jun 2008, 198-206


Ferreira Filho, S. S. & Sakaguti, M.

Artigo Técnico
THMs = 7,39.DC + 676.UV – 7,09.COT remoção de compostos orgânicos natu- águas de abastecimento. Revista Engenharia Sani-
(Figura 11) rais, isto é, quanto maior for a remoção tária e Ambiental, v.6, n.1 e 2, 2001.
(5)
THMs = 1,99.DC + 518.UV de COT por processos de coagulação, FREDERICO, E.A. et al. Remoção de compostos
tanto menores tenderão a ser os valores orgânicos naturais no processso convencional de
(Figura 12) (6) tratamento de água: influência do pH e da dosagem
de demanda de cloro.
THMs= concentração de THMs na de coagulante na eficiência do processo. In: 200
• A pré-cloração precedida da CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHA-
fase líquida para 24 horas de tempo de
etapa de coagulação não permitiu uma RIA SANITÁRIA E AMBIENTAL, 1., RIO DE
contato (µg/L) JANEIRO, 1999.
redução dos valores de demanda de
DC= demanda de cloro (mg Cl2/L)
cloro e, ainda que parte dos CONs GARZUZI, M.P. et al. Remoção de compostos
UV= absorbância em 254 nm da fase
tenham sido adsorvidos no hidróxido orgânicos naturais no processso convencional de
líquida (cm-1) tratamento de água: monitoramento da Estação
Sabe-se, no entanto, que a maior metálico formado pela adição do coagu-
de Tratamento de Água do Alto da Boa Vista
parte das Companhias de Saneamento lante, estes exerceram uma significativa (ETA-ABV). In: 200 CONGRESSO BRASI-
não possui a sua disposição de equipa- demanda pelo agente oxidante. LEIRO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E
mentos que permitam a obtenção de • Observou-se a existência de AMBIENTAL, 1., RIO DE JANEIRO, 1999.
valores de concentração de COT para uma relação praticamente linear entre HARRINGTON, G.W., CHOWDHURY, Z.K.,
as suas águas brutas e tratadas e, desta a formação de THMs e valores de de- OWEN, D.M. Developing a computer model to
manda de cloro, sendo esta da ordem simulate DPB formation during water treatment.
forma, como alternativa, procurou-se Jounal of American Water Works Association,
eliminar esta variável tendo-se conside- de 28 µg/L para cada 1 mg Cl2/L de pág 78-87, November, 1992.
rado tão somente os parâmetros deman- demanda de cloro, o que oferece uma
alternativa para fins de gerenciamento JACANGELO, J.G., et al. Select processes for
da de cloro e UV-254 nm (Figura 12). removing NOM: an overview. Journal American
Uma vez que o parâmetro UV-254 nm das dosagens de cloro aplicados em Water Works Association, pág 64-77, January,
é de mais fácil obtenção do que quando processos de tratamento de água obje- 1995.
comparado com o COT e dado que é tivando a minimização da formação de KRASNER, S.W., AMY, G. Jar-test evaluations
possível estabelecer uma correlação en- subprodutos da desinfecção. of enhanced coagulation. Jounal of American
tre ambos os parâmetros (Ferreira Filho, • Recomenda-se que estudos se- Water Works Association, pag 93-107, October,
melhantes sejam conduzidos com águas 1995.
2001), o uso alternativo de equações de
regressão linear múltipla explicitada em brutas com diferentes características a MONTGOMERY, J. Water treatment: principles
(5) e (6) revelam-se bastante promisso- fim de que possam ser gerados dados and design. New York, John Wiley & Sons,
experimentais que possibilitem validar 2a Edição, 1.948 p., 2005.
ras como formas de previsão da forma-
ção de subprodutos da desinfecção em o uso das equações 3 e 4 e expandir os Semmens, M.J.; Field, T.K. Coagulation:
função dos parâmetros de qualidade da limites de sua aplicação. experiences in organic removal. Journal American
Water Works Association, pág 476-483, August,
água bruta ou coagulada. 1980.
REFERÊNCIAS
CONCLUSÕES E
RECOMENDAÇÕES APHA, AWWA, WEF. Standard Methods for
the Examination of Water and Wastewater. EUA:
1998.
Endereço para correspondência:
Com base no exposto, pode con-
cluir-se que: BLACK, B.D., HARRINGTON, G.W., Sidney Seckler Ferreira Filho
SINGER, P.C. Reducing cancer risks by improving
• Em face dos resultados experi- organic carbon removal. Journal American Water Departamento de Engenharia
mentais e calculados obtidos, o modelo Works Association, pág 40-52, June, 1996. Hidráulica e Sanitária
matemático proposto por Boccelli et al
BOCCELLI, D.L. et al. A reactive species
Escola Politécnica da
(2003) apresentou-se bastante adequa- model for chlorine decay and THM formation Universidade de São Paulo
do a fim de descrever o comportamento under rechlorination conditions. Water Research, Av. Prof. Almeida Prado, travessa
do cloro livre e seu decaimento na fase pag 2654-2666, vol 37, 2003. 2, nº 271
líquida para diferentes tipos de águas Chadik, P.A.; Amy, G.L. Removing Prédio de Engenharia Civil
submetidas a diferentes condições de trihalomethane precursors from various Cidade Universitária
cloração, podendo a mesma ser empre- natural waters by metal coagulants. Journal 05508-900 São Paulo - SP - Brasil
American Water Works Association, pág 532-536,
gada para fins de modelação matemática October, 1983. Tel.: (11) 3091-5220
de processos de oxidação química e E-mail: ssffilho@usp.br
desinfecção. CHENG, R.C., et al. Enhanced coagulation: a
preliminary evaluation. Jounal of American Water
• Não foram observadas diferenças Works Association, pag 91-103, February, 1995.
significativas nos valores de demanda de
CLARK, R.R. et al. Predicting the formation of
cloro para as águas bruta e bruta filtra- chlorinated and brominated by-products. Journal
da. Desta forma, tem-se que a demanda of Environmental Engineering, pag 493-501,
de cloro tende a ser mais influenciado June, 2001
pela presença de compostos orgânicos CROZES, G., WHITE, P., MARSHALL, M.
dissolvidos na fase líquida do que na Enhanced coagulation: its effect on NOM removal
forma particulada. and chemical costs. Jounal of American Water
• O impacto do processo de coa- Works Association, pag 79-89, January, 1995.
gulação na cinética de decaimento do FERREIRA FILHO, S.S. Remoção de compostos
cloro na fase líquida tende a ser maior orgânicos precursores de sub-produtos da desinfecção
e seu impacto na formação de trihalometanos em
quanto maior for a sua capacidade de

Eng. sanit. ambient. 206 Vol.13 - Nº 2 - abr/jun 2008, 198-206

You might also like