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STATI L 3 STATIC edi} cen TWAT AA) PHILIP BESS « COMUNITARISMO E EMOTIVISMO: DUAS VISOES ANTAGONICAS SOBRE ETICA E ARQUITETURA : Uma das caracteristicas do periodo pés-moderno 6 0 ressurgimento do interesse pelas quest6es étices da arquitetura. Os cinco ensaios que compdem este ca- pitulo abrangem quase vinte anos de teoria e representam diferentes enfoques, mas todos partilham da mesma postura ética. O primeiro artigo, escrito pelo ar- quiteto Philip Bess, antigo editor e colaborador de /nand Architect, contribui para @ discussao critica do urbanismo moderno. O enfoque filoséfico de Philip Bess segue Aristoteles pela insisténcia na virtude moral como condigao necesséria a realizagao das potencialidades do individuo e da comunidade. Bess confronta essas ideias com 9 “individualismo nietzschiano”, que considera ser a ori- gem de todos os males da sociedade moderna. A nogao de que s construgdes e as cida- des materializam uma ética de ordem comunitéria ou individualista 6 um tema de especial interesse para Bess em suas atividades como arquiteto e como critico. As manifestagdes do individualismo nas éreas construidas da cidade e do subtirbio sdo cada vez mais des- comedidas. Nota-se no meio urbano regulado por medidas proscritivas, como as leis de zoneamento e os cédigos de edificagéo, que tém por objetivo prevenir danos ao publico, uma espantosa auséncia da afirmagdo de valores positivos ou virtudes. A comunidade dos individualistas exige a limitacdo das regres, a0 passo que a paisagem aristotélica depende da conduta virtuosa dos membros da comunidade na busca de fins consentidos, Bess defende a reativagao dessa ultima ideia de civismo e @ associa ao estilo da cidade tradi- Cional, que era um simbolo da autoridade legitima e das virtudes civicas. (A influéncia da sua formagao profissional na Universidade da Virginia me parece evidente nesse aspecto.) Bess mostra que @ hierarquia e a clareza das relacdes encontradas na cidade tradicional entre os edificios, os espacos puiblicos figurativos,' os monumentos e as instituigses es- ‘téo faltando na alienante cidade contemporanea. Ateoria contemporanea da arquitetura néo ajuda, afirma Bess. De fato, ele acusa 8 teoria contemporanea de uma fuga pluralista ao julgamento e & responsabilidade, Ge negar a possibilidade de autoridade. Em vez de elaborar critérios objetivos aplicé- Weis, 8 teoria recente oferece apenas o gosto individual, ou 0 "emotivismo". Muitos argumentos de Bess fazem sentido e se comparam as propostas nectradicionalistas de Jemes Howard Kunstler (The Geography of Nowhere) e do Congresso para 0 Novo Urbanismo, Contudo, a prescri¢éo estillstica neotradicionalista de Bess ©, de modo ge- ‘2l, @ viablidade dessa solugao s2o bastante questionéveis, O Proprio Bess pergunta tendéncia individualista que cada vez mais se fortalece impe, sem duvida, uma mu- danga fundamental de valores. 1. Ver apresentagdo de "Contextualismo: ideais urbanos e deformagées”, p. 922 desta colets- nea. NEI PHILIP BESS Comunitarismo e emotivismo: duas visdes antagonicas : sobre ética e arquitetura <= seo que cam alge A filosofia moral de Nietzsche contrapde-se especificamente d de Aristételes devido ao papel historico de cada uma. Foi por causa do repiidio a wma tradicdo moral cujo cerne intelectual provinha vss dal de Aristételes, durante as transigdes dos séculos xv e xvit, que teve de ser empreendido o projeto Iluminista de descoberta de no- vos fundamentos racionais seculares para a moral. E foi porque esse projeto [iluminista} fracassou, porque [..] no conseguiu se manter de pé em face da critica racional, que Nietzsche e [seus] sucessores conseguiram engendrar sua andlise critica apa~ rentemente bem-sucedida sobre toda a moral pregressa. Daf que «a defensabilidade da posigao nietzschiana acaba dependendo da resposta a seguinte pergunta: serd que estava certo, antes de tudo, rejeitar Aristételes? A verdade & que, se a posigao de Aristoeles nna ética e na politica - ou algo muito semelhante - fossesusten- tdvel, todo esforco nietzschiano teria sido inti ..] E um eu ‘mismo chamar essa questdo de vasta ¢ complex. [ALASDAIR MACINTYRE, After Virtue “fftica € dinheiro. Moralidade é sexo.” Foi esta a ligdo de sabedoria do mundo que um advogado de Chicago deu ao romancista vencedor do Prémio Nobel Saul Bellow. Esses provérbios resumem muito bem o que geralmente pretendem dizer os jornais quando escrevem que alguém foi acusado de comportamentos antiéticos ou foi preso por ra- ies morais, Sao esses também os temas de que se ocupam os varios cédigos de ética profissional, inclusive os da Ata. 0 advogado amigo de Bellow certamente nao achou necessario acrescentar que, tirante essa acep¢ao muito restrita da ética profissional, nem a ética nem a moral tém coisa alguma a ver com a arquitetura e 0 projeto urbano. E, tivesse ele realmente feito essa afirmago, decerto nao estaria mais que exprimindo uma opiniao bastante co- ‘mum, Mesmo assim, parece haver entre os arquitetos e os professores de arquitetura interesse suficiente pelo assunto da ética nessa disciplina, de modo que as opinides sobre o tema estao longe de ser unanimes. Por um lado, as faculdades de arquitetura de universidades como as da Virginia, Miami (Flérida), Notre Dame ¢ Maryland promovem com grande entusiasmo uma arquitetura ou urbanismo tradicionais, definidos de modo mais ou menos estrito, como emblematicos de ~ e conducentes a - uma espécie de moral chamada de vir- tude civica. Por outro lado, em universidades como as de Columbia, Princeton e Ohio State, ena Cranbrook Educational Community, divulga-se uma outra arquitetura nao tradicional, deliberadamente dissociada de nogdes convencionais de moral, ainda que hem sempre esteja claro se © que desejam ¢ estabelecer uma nova associagao da ar- quitetura e do urbanismo com novos e melhores princfpios morais ou sua completa dissociagao de toda e qualquer moral. Pensadores e arquitetos da Universidade de Illinois, em Chicago (vic), recen- temente travaram um debate de opinides, nem sempre coincidentes, sobre o assunto. ‘No ano passado, nas paginas desta revista, Stanley Tigerman criticou pesadamente a nova Biblioteca Publica de Chicago e clamou por uma revisdo do conceito da arqui- tetura como “empreendimento moral baseado nos problemas do momento”, nao ma- culado pela nostalgia ¢ pelas formas tradicionais “falsamente revividas com um tom Pitoresco debilitado por lembrancas nostélgicas”. Roberta Feldman e Martin Jaffe, da vic, batendo na mesma tecla, acusaram solenemente os arquitetos neotradicionalistas © 08 urbanistas de praticar um estetismo vulgar que desvia a atengio da recuperacio das nossas cidades e dos custos sociais e ecolégicos do espraiamento dos subtirbios Iver nota 1, p. 416 desta edicdo]. O historiador Robert Bruegmann, por outro lado, usa tum tom populista e alfineta os moralistas que criticam as Strips e os shopping centers Tegionais. Sugere que esses criticos, de qualquer inclinagao ideol6gica, so antidemo-

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