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Universidade Federal de Uberlândia

Instituto de Economia e Relações Internacionais


Graduação em Relações Internacionais
Tópicos em Política Internacional

OLIVEIRA, Laura Stefanoni (11721RIT018)

A IMPORTÂNCIA DO DISCURSO DISCRIMINATÓRIO PARA A ASCENSÃO E


PERPETUAÇÃO DE GOVERNOS POPULISTAS

Introdução

Ao longo dos últimos anos, é possível identificar que algo de diferente está acontecendo
com as democracias ao redor do mundo. Cada vez mais, governos conservadores e populistas têm
alcançado o poder. Na América, isso ficou evidente com a eleição de Donald Trump em 2016 e
mais tarde de Jair Bolsonaro em 2018. No entanto, esse movimento já vinha ocorrendo
gradualmente em diversos outros países, como a Hungria, Itália, Rússia, entre outros.
O que todos esses governos têm em comum é o seu caráter populista, que Segundo Jan-
Werner Müller (2016) é uma maneira imaginária de se observar a política e considera que a
sociedade está dividia em dois campos homogêneos e antagônicos: o povo e a elite. O povo, é
uma construção discursiva imaginária que pressupõe que existe uma massa de cidadãos que não
são representados politicamente. Eles são detentores da moral e, com o líder populista no poder,
passarão a governar efetivamente o país. A elite por outro lado, é corrupta e trabalha contra os
interesses nacionais. Essa distinção não é feita a partir de pressupostos econômicos ou sociais, ela
é puramente moral.
Considerando que “o povo” é somente uma parcela da população, diversos grupos são
excluídos não só da política, como até mesmo podem ser privados de ter seus direitos de
cidadania reconhecidos como legítimos. Frequentemente e, como podemos observar no Brasil,
Estados Unidos e na Rússia, esses grupos são as mulheres, imigrantes e as comunidades
LBGTQI+. Apesar da articulação discursiva populista se valer de diversos componentes para
alcançar e se manter no poder, destaca-se entre as demais as articulações antigênero, misóginas e
contra a chamada “ideologia de gênero.

O presente artigo procura explorar como os governos populistas, em especial o caso


brasileiro e o estadunidense, constroem seus discursos a fim de excluir as minorias citadas da
concepção de povo para se elegerem e perpetuar seus governos. Como já mencionado, todo esse
quadro compõe uma crise da democracia atual. Também será discutido como essa crise pode ser
superada a partir de uma noção populista de esquerda, que propõe a construção de uma
democracia agonística com a adesão de um conceito povo pluralista e inclusivo.

Parte I: Causas:
Chantal Mouffe (2018), considera que estamos vivendo uma crise da democracia liberal.
Isso se deve ao fato de o consenso neoliberal instaurado a partir do governo de Margareth
Thatcher ter se desgastado. Esse consenso teve como consequência o que a autora chama de pós-
política: a alternância entre governos de direita e de esquerda sem que haja de fato uma diferença
política-ideológica real entre eles. Ademais, os conceitos de igualdade e soberania popular
prometidos pela democracia foram esvaziados. A clara superioridade econômica de alguns
grupos deixa claro que estamos longe de uma igualdade econômica assim como a predominância
política de uns sobre os outros também nos afasta da soberania popular.
Yascha Mounk (2018) por sua vez, concorda com Mouffe (2018) quanto a crise
democrática que estamos vivendo, mas afirma que as causas são mais diversas. Entre elas,
destacam-se o aprimoramento tecnológico que por um lado, democratizou as informações, mas,
por outro, deu voz à políticos mal-intencionados que espalham fake News e compartilham
discursos absurdos. Ademais, Mounk (2018) dá especial atenção a queda do padrão de vida no
mundo, consequência da desaceleração do crescimento econômico. Muitas das pessoas seduzidas
pelos populistas, ainda tem boas condições financeiras, mas não tem boas perspectivas sobre os
seus futuros e já presenciam familiares e amigos perderem suas casas ou serem demitidos.
Capitalizando essas insurgências, os partidos de extrema direita têm se aproveitado dessas
insatisfações para construir um discurso político que atrai o povo. Eles prometem devolver a
soberania popular, devolver a glória ao país, lutar pelas “famílias”, combater a “ideologia de
gênero” e, sobretudo, seguir à Deus.
Spivack (2010) comenta sobre como as angústias econômicas geradas por um capitalismo
desigual e predatório, são capitalizados e transferidos para a esfera simbólica. Isso significa que
grande parte das angústias da sociedade são geradas pela enorme e crescente desigualdade
econômica e, ao invés dessa angústia ser identificada e combatida, ela é apropriada pelas elites
econômicas e políticas e apontada como sendo advinda de uma esfera simbólica, representada
pelas minorias e população LGBTQI+. Assim surgem os diversos discursos que dizem que “as
famílias não são mais as mesmas”, que é preciso “lutar pela família” entre outras afirmações e
ideias que defendem uma visão ortodoxa patriarcal e machista da constituição da sociedade. Esse
discurso é especialmente interessante para as elites econômicas que procuram manter o status
quo, assim como para os políticos que o utilizam para cooptar eleitores e mobilizar afetos.
Como já mencionado, a consequência é a exclusão política de diversos grupos assim
como a crescente mobilização de desafetos contra eles. Apoiados em um conservadorismo e
praticando discriminação abertamente, os resultados já podem ser vistos: o ano de 2020 foi o
mais violento da história para as pessoas transsexuais, quando uma vítima era feita a cada
48horas. Outro dado chocante é o aumento da violência de gênero no governo vigente. (Câmara
dos deputados, 2020)
Em suma, os governos populistas e as elites econômicas apoiam seus discursos na
construção política-imaginária que coloca os grupos minoritários como inimigos e imorais e, por
outro lado, coloca a família patriarcal como moralmente correta e modelo a ser seguido.
Em meio a uma crise da democracia liberal, o discurso antigênero faz parte da artimanha
da extrema direita que, em última instância ludibria os cidadãos. Como já mencionado, é
prometido que eles voltarão a exercer sua soberania, que o país voltará aos seus tempos de glória,
que a voz do povo será ouvida, que os politicamente excluídos terão sua vez. Essas promessas
seduzentes apenas fazem parte de um arcabouço de manipulação que, no final das contas,
continua a perpetuar as causas do problema e cria uma sociedade tão excludente quanto a que
eles prometeram extinguir. Para Müller (2016), lentamente os populistas trabalharão de forma a
minar a democracia e suas instituições, o que além de minar os direitos das minorias, pode
terminar com a própria derrocada da democracia.

O discurso antigênero e discriminatório no governo Bolsonaro


Durante sua campanha eleitoral, Jair Bolsonaro se valeu de diversos discursos
discriminatórios, misóginos e antigênero, além de até mesmo espalhar fake News com o fim de
alavancar sua campanha política e cooptar eleitores. Frequentemente, Bolsonaro afirmava ser
necessário combater a “ideologia de gênero”, um conceito de significado vazio que pode incluir a
educação sexual nas escolas, o feminismo, casamento entre pessoas do mesmo sexo e o direito de
pessoas trans. A mobilização desse conceito no discurso político tomou proporções enormes, e
apesar de ser especialmente mencionado no Brasil em 2018, ele já vem sendo mobilizado no
mundo muito antes disso.
Ademais, o chamado “kit gay” foi uma fake News amplamente disseminada pelos grupos
de WhatsApp e pelas redes sociais, cujo conteúdo afirmava que Fernando Haddad era o
responsável por ter distribuídos nas escolas de São Paulo uma cartilha com teor altamente sexual.
Apesar de ser inverídico, esse ocorrido alavancou Jair Bolsonaro durante a corrida presidencial.
Segundo uma pesquisa feita pelo IDEIA Big Data em parceria com a Avaaz, foi constatado que
84% das pessoas expostas a fake News do “kit gay” acreditava que se tratava de um fato verídico.
Outro conteúdo inverídico amplamente compartilhado pelos eleitores conservadores de
Bolsonaro, foi a distribuição de mamadeiras com o bico em formato de pênis em diversas creches
no Brasil. A distribuição era atribuída a políticos do partido adversário na corrida presidencial, o
Partido dos Trabalhadores. (Folha de São Paulo, 2021)
Como era de se esperar, os absurdos não pararam depois de sua eleição e diversas
medidas retrógradas foram tomadas pelo governo não só domesticamente como
internacionalmente. Domesticamente, destaca-se a nomeação de Damares Alves como Ministra
da Mulher, Família e dos Direitos Humanos. Figura polêmica, Damares está diretamente
relacionada com o conservadorismo religioso e protagonizou falas em que defendia a família
tradicional brasileira – constituída por um casal cis heterossexual- ou ainda relacionadas à
atribuição da cor rosa às meninas e da cor azul aos meninos. Apesar de banal, isso demonstra o
conservadorismo intrínseco que move as ideias e as ideologias do governo.
Em adição, a comunidade LGBTQI+ foi retirada da carta de diretrizes de Direitos
humanos do governo. O comitê de Gênero e de Diversidade e Inclusão foram extintos. Cada vez
mais o governo se tornou ferrenho contra o aborto mesmo em casos em que ele poderia ser feito
legalmente. Os hospitais referência em abortos em caso de violência sexual, por exemplo,
testemunharam diversos protestos de grupos antiaborto. Em 2020, uma vítima de violência sexual
declarou ter sido xingada e agredida por um grupo de vigília instalado em frente a um desses
hospitais. Outro emblemático caso, ocorreu no interior do Espírito Santo, quando uma criança de
10 anos que havia sido estrupada e que teve sua intervenção autorizada pela justiça enfrentou
resistência de um grupo religioso de extrema direita que fez uma “corrente” em volta do hospital
e da própria equipe de médicos, que mesmo com autorização legal, se recusaram a realizar o
procedimento. (Metrópoles 2020).
Considerado um mentor do Governo Bolsonaro, Olavo de Carvalho (2018) afirma que o
movimento LGBTQI+ tenta impor uma “ideologia gayzista” como uma moralidade aceitável.
Outros setores apoiadores do governo falam em “ditadura gay”. Isso demonstra que o governo é
composto e rodeado por pessoas que travam uma guerra ideológica a todos os avanços
progressistas e liberais.
É importante destacar que a violência de gênero, a existência de grupos antiaborto e a
discriminação da comunidade LBGTQI+ o sempre existiram, no entanto, eles ganham força com
a ascensão de um governo que legitima suas violências e mina os direitos e as proteções as
minorias. Os grupos minoritários se tornam mais frágeis enquanto os outros se tornam mais fortes
e propensos a praticar violências explícitas ou implícitas.
Por fim, vale a pena ressaltar que até mesmo a educação sexual nas escolas, que ajuda a
prevenir e a denunciar a violência sexual contra as crianças, as prepara para a vida sexual,
evitando gravidez indesejada e disseminação de doenças sexualmente transmissíveis foi alvo de
polêmica e sanções. Os conservadores afirmam que se trata de uma sexualização precoce ou de
uma lavagem cerebral em prol da ideologia de gênero. Isso demonstra uma forte contradição do
discurso conservador, que ao mesmo tempo que afirma que as crianças devem ser protegidas, as
priva da educação que justamente é feita para esse fim.
Todos esses discursos, fake News e afirmações, apesar de parecerem absurdos tem um
enorme propósito político e repercussão nacional. Como já mencionado, fazem parte de um
estratagema bem pensado que tem duas funções principais: a primeira é deslocar as angústias
para uma esfera simbólica e a segunda é criar constantemente um ambiente de crise, perigo e
medo que serve muito bem às causas populistas.
As crises, sejam elas reais ou criadas, criam um ambiente de medo e pânico que tornam as
pessoas muito mais suscetíveis a medidas autoritárias. O medo de terem suas famílias destruídas,
subvertidas ou que seus filhos sejam submetidos a uma ditadura gay, ou que a eles sejam dadas
mamadeiras com o bico em forma de pênis, faz com que os eleitores se tornam mais propensos a
apoiar discursos de ódio e medidas retrógradas. Em última instância, esse estratagema ajuda a
perpetuar e legitimar os governos populistas, como o de Bolsonaro.

O discurso antigênero e discriminatório no governo Trump

Assim como Bolsonaro, Trump é um político populista que exacerbou clivagem social
entre “eles” e “nós”. Apoiado em um forte discurso anti migratório, Trump também criou a
fronteira política do povo e da elite excluindo grupos minoritários, sendo amplamente apoiado
pelas fake News e teorias conspiratórias.
Somente para se ter uma dimensão do contexto estapafúrdio em que Trump se elegeu,
vale dizer que ele era integrante de um movimento chamado Birther, cujas ideias estavam
atreladas ao fato de Barack Obama não ser americano, o que o desqualifica como apto a ser
presidente. Os absurdos eram inúmeros, e a comunidade LGBTQI+ não ficou de fora.
Durante seu governo, os retrocessos foram muitos e em muitos momentos o Brasil e os
Estados Unidos estiveram unidos para defender uma cartilha conservadora, contra a “ideologia de
gênero” e contra o aborto. Alguns dos retrocessos apontados pelo site Observatório g (2019) são
a negativa de vistos para parceiros de diplomatas gays, a aprovação de um projeto de lei que
inviabiliza os transgêneros de atuarem livremente dentro das redes públicas americanas, o
banimento de pessoas transgêneros das forças armadas, a retirada de menções aos LBGTQI+ do
site oficial da casa branca entre outras mais simbólicas como ignorar o mês do orgulho
LGBTQI+.
Em 2020, Trump chegou até mesmo a modificar a definição da palavra gênero, que
segundo ele deveria ser feita a partir da biologia de cada indivíduo. Essa medida deixou centenas
de pessoas desamparadas e vulneráveis não só a violência como a discriminação na busca de
atendimento médico, registros além de dificultar o acesso ao aborto de pessoas transgêneros.
Em um outro caso emblemático, Trump chefiou a substituição do termo “saúde sexual e
reprodutiva” para “saúde materna e da criança” em diversas resoluções da ONU e no documento
sobre prioridades da saúde global, negociado com o G7, em Milão. A troca de termos, enfraquece
a histórica luta feminista contra o aborto. (G1, 2017)
O problema gerado pelas ações do governo Trump são problemáticas porque não se
restringem somente a maior democracia do mundo. Os Estados Unidos têm um grande poder de
influência em todo o globo e essas medidas repercutem de modo a endossar a onda de
conservadorismo mundial e legitimar ações parecidas que ocorrem em outros países.

Análise e possível solução


Em ambos os casos, observa-se que a discriminação e o discurso contra a ideologia de
gênero, são partes constituintes dos governos populistas. Esses discursos não só ajudaram esses
políticos a se elegerem, como os mantém no poder. Recuperando a crise democrática que
vivemos hoje, pode-se afirmar que os diversos problemas e angústias enfrentados pelo mundo
hoje, são capitalizados e transferidos a esfera simbólica.
Ao invés de identificarmos o verdadeiro locus das dores, elas são simplesmente
capitalizadas e dirigidas a grupos minoritários, que cada vez mais se tornam mais vulneráveis e
são deslegitimados. O discurso feminista é distorcido e as pessoas são levadas a crer que existe
uma “gayzação”, uma sexualização das crianças ou ainda que os valores familiares estão
invertidos.
Ocorre que as verdadeiras angústias estão relacionadas ao consenso neoliberal em que
vivemos e, para Chantal Mouffe (2018), para superarmos esse momento, seria necessário a
construção de um novo terreno hegemônico. Para tal, nos validaríamos também de um
populismo, mas não o de direita, considerado autoritário e excludente, mas sim o de esquerda.
Nessa proposta, o conceito de povo seria inclusivo e plural. Todos seriam incluídos e a
construção da fronteira política seria estabelecida contra o verdadeiro inimigo: o neoliberalismo.
Para isso, a despeito das diferentes ideologias e visões de mundo seria estabelecido uma demanda
em comum: o aprofundamento dos valores democráticos mais caros: a soberania popular e a
igualdade.
Nesse contexto, Mouffe (2018) propõe o aprofundamento do conceito de cidadania que
serviria como a amálgama do povo. Mesmo que eles tivessem suas diversas lutas, todos estariam
comprometidos em aprofundar seus direitos de cidadania, o que em última instância inclui
valores como a justiça, liberdade e igualdade. Essa construção é claro, dependeria da mobilização
de afetos, que poderia ser feito através de um líder bem articulado que efetivamente ouve e ajuda
a mobilizar o povo.
Mouffe (2018), comenta que uma dimensão anticapitalista seria intrínseca e necessária,
uma vez que o padrão de reprodução do capital que vivemos hoje é ecologicamente insustentável
e excludente. Em última instância, isso implicaria que a mobilização dos discursos contra esferas
simbólicas retornaria ao seu verdadeiro locus: a desigualdade social. Como consequência,
teríamos plena liberdade em uma democracia considera agonística. Esse termo caracteriza uma
democracia que ao invés de ser caracterizada por conflitos gerados entre inimigos, os conflitos
seriam gerados entre adversários. Apesar da modificação da palavra parecer insignificante, ela
tem uma enorme simbologia e resultado prático. Enquanto os inimigos são vistos como
maniqueístas e a existência de um anula a do outro, os adversários, por sua vez, se entendem
como legítimos, com opiniões e políticas válidas.
A democracia agonística portanto, não só reconheceria as diversas demandas e visões de
mundo como legítimas como também as valorizaria como parte de um regime político plural e
que necessita de seus debates e diferenças para existir e se perpetuar. A reafirmação de uma
democracia agonística é de extrema importância minimizarmos a extrema polarização social que
corrói o tecido social e ameaça a democracia.

Conclusão

Para diversos autores, a crise da democracia liberal é entendida como um processo que
tem suas causas ligadas a evolução tecnológica, a apreensão econômica e demográfica, entre
outros. O esvaziamento dos conceitos democráticos e o não atendimento das demandas populares
criou uma massa de cidadãos extremamente insatisfeitos com o status quo vigente. Políticos
populistas de direita, se aperceberam dessa situação e aproveitam para cooptar eleitores através
de discursos que falam exatamente o que o povo quer ouvir.
Se por um lado o populismo de fato, tem um caráter democrático pois é inegável que
existem setores sociais excluídos da política, de outro, ele exacerba a polarização política e cria
uma fronteira entre o povo e a elite que exclui diversos grupos minoritários. Esses grupos, em
geral são os imigrantes, as mulheres e a comunidade LGBTQI+.
Essa exclusão não é aleatória e faz parte de uma estratégia bem pensada que visa fazer
manutenção do status quo vigente e trabalha a favor das elites políticas e econômicas vigentes.
As angústias geradas pela desigualdade econômica gritante, são atribuídas como advindas do
modo de ser e de viver da comunidade LBGTQI+. Afirma-se que a ideologia de gênero tenta
modificar os valores sociais, sexualizar as crianças, e implementar uma ditadura gay. Para
disseminar esse discurso, os populistas de direita distorcem informações e criam informações
falsas. O pânico e o medo se espalham e faz com que as pessoas se tornem mais suscetíveis a
aceitarem medidas autoritárias, incitações à violência e discursos de ódio.
O discurso discriminatório, portanto, ajuda a compor a conjuntura de crise tão necessária
para a existência e perpetuação dos governos populistas, que não se sustentam sem que algo
genuinamente forte, como uma crise, ancore a sua legitimidade. Nesse ínterim, as minorias se
tornam cada vez mais vulneráveis e são o bode expiatório para todos os problemas sociais
existentes. Como consequência, as desigualdades econômicas, que são a verdadeira origem das
angústias humanas atuais, se tornam esquecidas e não podem ser combatidas.
Como exemplo, cita-se o governo Trump e Bolsonaro que durante suas campanhas
utilizaram das fake News para alavancar seus números e, mesmo durante seus governos
continuam a construir um cenário de crise além de retrocederem as diversas conquistas feitas
pelos governos progressistas.
Para combater o populismo de direita, Chantal Mouffe (2018) propõe a composição de um
novo terreno hegemônico e a criação de uma fronteia política que enfrente o verdadeiro inimigo:
as forças que compõe o neoliberalismo. Para isso, seria necessária a articulação de um povo
plural, que entre as suas diversas demandas e visão de mundo, tenham em comum o desejo de
aprofundar o seu papel como cidadão e reestabelecer os valores democráticos intrínsecos: a
soberania popular e a igualdade.
Para concluir, é muito difícil dizer se a democracia agonística aspirada por Chantal
Mouffe (2018) poderá ser alcançada, mas independentemente disso, é preciso reestabelecer a
tolerância mútua da sociedade como um todo. Isso significa entender os adversários políticos
como legítimos e estabelecer um diálogo com os populistas. O combate aos populistas não pode
ser feito ignorando-os ou tentando apontar os absurdos que eles dizem. Seus eleitores sabem que
muitos dos seus discursos são exagerados ou falaciosos, mas é justamente isso que eles procuram:
qualquer coisa que não faça parte da velha política, que por tantos anos negligenciou suas
demandas. Por isso, é preciso estabelecer um diálogo entre as demandas do povo e as possíveis
soluções.
Ademais é de extrema importância que as angústias retornem para o seu verdadeiro lugar
e que fique claro que os populistas de direita, ao invés de ajudarem, na verdade estão ludibriando
o povo. Para que isso seja feito é preciso que a esquerda se articule e o debate político seja
reestabelecido, no sentido de superar a pós-política. Finalmente, mas não menos importante, a
proteção das instituições independentes deve ocupar o primeiro lugar da pauta da luta contra o
populismo de direita, uma vez que elas são responsáveis por garantir o direito das minorias e,
portanto, ajuda a sustentar a democracia.
Referências

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