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David Le Breton Rees eter eon ae tener elas Yeh a Pee ot ieee a ison ela teen ee ane Cuetec tee) eee te ee eee een te eres Ce ee eat tice eee eee enter ee ia B re on. Beenie Coretta eee a gee har] | Ae eee Meee tare ee eed Cael icone edna Nea ae vd) Trace (Sur les blessures de soi), } fe etcetera Been ete eae eV en is heifer enn | fsatons etcultress, da ARIC, «Chocs de cultures, Concepts et enjeux pratiques de | | rete eul ta eget feet toaeeln eters | Colmer Mersin ponerse eerie eca 5 a e Q Feeney acne tele See ae eer tet ctr cree J InalsS (Zs | pl | a (‘a ee et eer ted ree icee ecules een eee ete Yes eee ioe aetee et Coste case Tatuagens, piercings e outras marcas corporais Pees iene tao eec yp Rec ei oe Cece te ura euct cree tele Mec uterert ele tad ere Ween to heeie e hes et eesice hee ec cn ched Freeh eee ane es ee ar Dees rte toi ae ee eel eee repre ec es ee cies eke a ese ee tele eee freee reer Oe ae tm ler BAO onans Tr) | David Le Breton Sinais de identidade Tatuagens, piercings e outras marcas corporais Tradugao de Tereza Frazao MIOSOTIS Mlositis~ Ealgay ¢ DistrHbuigto, Lats. Av Almirante Reis, 131-6:°D" P-1150.015 Lisboa Reservades todos us direitos de acorde com lepislags0 em vigor ‘Tule original: Signs edema ©) Eainons Medal, 2002 2004, Mioséuisaigae e Distnbuig, La ‘radu: Tereza rato Roviste tipngrafiea: Morgaridy Campos Capa: Vitor Brett Foto de autor: Daniel Mantzinski | Medipfor Margo de 2004 Iimpressio oatabamarta: Hurapany, Ls ‘eplsio legal a," 20759504 ISBN: 912-879-178 Distt: ECL —Fpres de Comercio Lively, SA. uns, 0 Zora leds! ua Vazzel-44K091 Arvore Tel 262 6 (52/282 617 RA Fax 259 637 123 *Sentia-me super bem, como se fosse uma pessoa to- talmente nova com um novo nome ¢ até mesmo um novo corpo. A minha vetha identidade de Chappie nao estava morta, mas tinha-se tornado um segredo. Uma tatuagem faz-vos este tipo de coisa: faz-vos pensar no vosso corpo como num fato especial que podem vestir ou despir cada vez que 0 desejarem.» Russell Banks, Sous le regne de Bone Introdugao: 0 corpo inacabado +0 que ha de mais profundo € a pele.» Paul Valery, Ldee fixe Nas nossas sociedades o corpo tende a tornar-se uma matéria-prima a modelar segundo 0 ambiente do momento. E doravante, para um grande numero de contemporaneos, um acessério da presenca, um lugar de encenacao de si proprio. A vontade de transformar © proprio corpo tornou-se um lugar-comum. A verso moderna do dualismo difuso da vida quotidiana opde 0 homem ao seu préprio corpo, ¢ ndo, como antigamen- te, a alma ou o espirito ao corpo. O corpo ja ndo é uma verso irredutivel de si mas uma construdo pessoal, uum object transitério ¢ manipulével susceptivel de va~ riadas metamorfoses segundo os desejos do individuo. Se entigamente encarnava o destino da pessoa, é hoje uma propesta que se pode sempre melhorar e recupe- rar, Entre o homem eo seu corpo, ha um jogo, no duplo sentido do termo. Milhdes de individuos, de maneira 8 ‘Sinais de Identicade artesanal, tornam-se artifices inventivos ¢ incansaveis do seu corpo. A aparéncia alimenta doravante uma in- dustria sem fir. © corpo € submetido a um design por vezes radi- cal que nao deixa nada de fora (body building, regimes alimentares, cosméticos, ingestéo de produtes coro o DHEA, gindsticas de todos os tipos, marcas corporais, cirargia estética, transsexualismo, body art, etc). Con- siderado como representante de si, toma-se afirmacao pessoal, bem visivel, duma estética e duma moral da presenca. Ja nao se trata de se contentar com 0 corpo que se tem, mas de modificar os seus fundamentos para completa ou torna-lo conforme a ideia que se faz dele. Sem 0 suplemento introduzido pelo indivieuo no seu es- tilo de vida ou nas suas accoes deliberadas de metamor- foses fisicas, 0 corpo seria uma forma decepcionante, insuficiente para acolher as suas aspiragées. E preciso acrescentar-the a sua marca prépria para tomar posse dele, Hoje, recurso banalizado a tatuagem (sinal visivel gravado na prépria pele gragas a injeccao duma matée- ria colorida na derme) ¢ ao piercing (furo ne pele para ai colocar um objecto, um anel, uma pequena barra, ete.) ¢ uma forma significativa desta mudanga de rela cao com o corpo. Juntam-se-lhes outras modificagées corporais: 0 stretching {alargamento do piercing para ai colocar uma pega mais volumosa), as escarificages (cieatrizes trabalhadas para desenhar um sinal em profundidade ou em relevo na pele com uma eventual adicao de tinta), 0 cutting (inscricao de figuras geo- métricas ou desenhos a tinta na pele sob a forma de cicatrizes adornadas gracas ao escalpelo ou 2 outros instrumentos cortantes), 0 branding (cicatriz em relevo de um motivo, descnhada na pele através da aplicagao de um ferro em brasa ou laser), o burming (impressao na pele duma queimadura deliberada, realcada com tinta Introdusde: © corpo inacsbado ou pigments)', 0 peeling (retirar a superficie da pele) ou os implantes subcutaneos (incrustacao de formas em relevo sob a pele}. Em alguns anos, estes novos usos lancaram por ter~ ra os antigos valores negativos que Ihes estavam asso- clados. Doravante sao decisdes sobre si que cristalizam uma larga parte do entusiasmo das novas geracdes. In- veste-se no corpo como lugar de prazer do qual € preciso afirmar que é seu realcando-o, assinando-o, tomando-o a seu cargo. Simultaneamente a marca corporal fun- ciona como uma distanciagao em relagao a um mundo que escapa em grande parte. Trata-se de substituir os limites de sentido que desaparecem por um limite sobre si, um estribo identificativo que permite reconhecer-se € reivindicar-se como ele proprio. O que se pretende é ser- se re-marcado, no sentido literal e figurado, é aumentar © seu valor, mostrar o sinal da sua diferenca. Em L’Adiew au corps (1999), analisei aprofundada- mente estes propésitos de modificacdes de si no contex- to de uma despedida simbolica de um corpo percedido como um borrao, uma reliquia, uma matéria inacabada a terminar através de um trabalho sobre si. Este senti- mento de insuficiéncia do corpo culminava na vontade de se libertar dos seus limites, até mesmo de se ver livre deles, Mesmo que partisse de praticas da vida quotidia- na, o nosso ponto de ancoragem essencial cra sobretudo Num artigo (1992), J. Myers descreve, em S. Francisco, ate liers de burning, de cutting, mas também de play piercing (onde se divertem furando a pele mas sem la devarem nenhuma jola), de play burning (onde brincam com o fogo mas sem deixarem vestigios zha pele). Estes jogos fazem parte multas vezes de rituals sadomaso- quistas visanda susiter impressées fortes. Tratando-se do buming, Tembremos que « queimadura de cigarro vem de longe. Ela ocupou Gurante muito tempo este lugar, de maneira solitaria ou perante os outros, potice estétioo, revelando sobretudo 2 determinacao de ca- Facter daquele que sxperimentava a necessidade interior de passar por isso. Hoje oS praticantes recorrem mais a0s paus de incenso ‘para fazer um trabalho corporal mais precico, 10 Sinals de Tdenticade constituido pela tecnaciéncia ¢ pela cibercultura. Nesta obra, debrucar-me-ei com mais atencao e sensibilidace sobre 08 significados ¢ os valores que revestem estas marcas corporais para as jovens geracdes. As modificagdes corporais jA nao sA0, como anti- gamente a tatuagem, uma maneira popular de afirmar uma singularidade radical, tocam em profundidade as jovens gcragées no seu conjunto, confundidas todas as condieSes sociais, atracm tanto os homens como 2s. mulheres. Longe de serem um efeito de moda, mudam 0 ambiente social, encarnam novas formas de sedugao, erguem-se como fenémeno cultural, Se a tatuagem ou o piercing podiam ainda ser associados a uma dissidéncia social nos anos 70 ou 80, hoje j nao é esse 0 caso. © esterestipo do tatuado como hornem, jovem, for- te, proveniente de meio popular (operario, marinheiro, camionista, militar, vagabundo, etc.), mostrando uma virilidade agressiva, esfumou-se nestes wltimos dez anos. Num periodo de tempo igualmente breve, o pier- cing impos-se como um acessério estético tanto para os homens como para as mulheres. Outras formas de mo- dificagées corporais aparecem tal como o queimar, es- carificar, cortar a pele para nela gravar figuras insélitas. Ou ainda inserir na came implantes para lhe modificar @ aparéncia. Estas tltimas praticas ainda estao no scu imicio, mas suscitam yocagées crescentes. Outras vao emergir nos anos que estao para vir. No segundo capitulo pareceu-me necessério voltar a tracar brevemente a histdria ocidental da tatuagem, pelo menos desde a sua descoberta pela expedicdo de Cook nos mares do Sul (embora o piercing tenha apare- cido recentemente, era conhecido como uma forma de adoro «exéticon pelo menos ha tanto tempo como a ta- tuagem) (Bruma, 2002), essencialmente para explicar os preconceitos que durante muito tempo existiram a seu sespeito. Durante mais de um século a tatuagem é sino- Introdugéo: O corpo inacabado u nimo de marginalidade, de dissidencia, de delinquéncia e a sua historia ligada sobretudo aos intersticios da sociedade civil. Esta reputaco duvidosa alimenta as frequentes oposicées parentais contra a vontade dos seus filhos de se tatuar ou de fazer piercing. ote afas- tamento de geragdes mostra bem como os mais velhos continuam influenciados pelas antigas imagens negati- vas associadas as modificacées corporais, enquanto que para 0s jovens elas so, pelo contrario, uma maneira de se integrarem no seu grupo etario, de embelezar 0 seu corpo muito mais do que estigmatiza-lo © sinal tegumentar é doravante uma maneira de escrever na carne os momentos chave da existencia. 0 corpo torna-se simultaneamente arquivo de si e deco- racao. A superficie cutanea acolhe as marcas de uma relacao amorosa, de um aniversério (os vinte, os vinte cinco, os trinta anos, ete.), 0 nascimento duma crianga, © éxito de um projecto, etc. O sinal € meméria de um acontecimento, da abertura pessoal duma passagem na existéncia, do qual o individuo nao quer perder a lembranca. Sob uma forma ostensiva ou discreta, par- ticipa duma estética da vida quotidiana, jogando com 0 segredo segundo o seu lugar eo grau de familiaridade com 0 outro. Muitas vezes, com efeito, o seu significade permanece enigmatico ¢ o lugar mais ou menos aces- sivel ao olhar na vida corrente. Algumas vezes protese identificativa, superficie protectora contra a incerteza do mundo, significa também mais alegria de existir e de- monstracdo de um estilo de presenca. A marca corporal ou 0 objecto do piercing sA0 um modo difuso de filiacao numa comunidade flutuante que nutre uma cumplici- dade relative com aqueles que os trazem igualmente. Mas como veremos, a «tribo: € um mito, uma referéncia combatida por muitos. Fazer sinais identificatives con- duz algumes pessoas a viver uma experiéacia descrita como «espirituals, afastada de qualquer referencia reli- 2 Sinals de Wentidede giosa mas poderosa nas suas consequéncias pessoais. Sentem-se metamorfoseados saindo da loja ou apés eles mesmos tercm gravado os sinais no seu corpo. Vivem 4 sua mancira um ritual pessoal de passagem. Mudando 2 forma do seu corpo, julgam mudar a sua existéncia, ¢ algumas vezes conseguemn-no porque o seu olhar sobre si proprios se modificou radicalmente. Tanto mais que a marca corporal é muitas vezes uum meio de ganhar autonomia, uma maneira simbé. lica de tomar posse de si. O corpo legado pelos pais é para modificar. O jover quer sfirmar a sua diferenca e ser reconhecido a despeito de tudo, Deseja fazer pele nova. © muitos jovens dizem temer a reaccao dos seus pais. Esperam com ansiedade um julgamento a seu respeito do qual pressentem a negatividade. As marcas corporais implicam igualmente uma vontade de atrair 0 olhar, ainda que 0 jogo seja possivel consoante os sitios em que foram gravadas, esiejam elas permanentemente sob 0 olhar dos outros ou apenas daqueles de quem se procura a cumplicidade. Permanecem sob a iniciativa do individuo ¢ encarnam entaéo um espaco de sacra- lidade na tepresentagdo de si. Em vez de exercer um controlo sobre a sua existéncia, 0 corpo é um objecto ao aleance da mao sobre 0 qual a vontade pessoal sc exerce praticamente sem entraves. A profundidade da pele é hospitaleira para todos os significados. A marca cutanea traduz a necessidade de completar através de uma iniciativa propria um corpo ineapaz por si mesmo de encarnar um sentimento de existéncia propicia Se a tatuagem das sociedades tradicionais repete formas ancestrais gravadas numa filiacdo, as marcas contemporaneas, pelo contrario, tem em primeiro lugar um objective de individualizacao ¢ estético; sao, com efeito, algumas vezes formas simbdlicas de entrega ao mundo mas sob uma forma estritamente pessoal, re- correndo mesmo a motives que apenas pertencem a si IntroducSo: O corpo inacabado B proprio. O sinal cutaneo ¢ uma maneira de apaziguar a turbulencia da passagem de um estatuto para outro, de aprisionar simbolicemente 0 acontccimento, ¢ de rituali- zar assim a mudanga. A marca tradicional ¢ vontade de anular a sua diferenca pessoal, nas nossas sociedades contemporaneas revela pelo contririo a individualidade, quer mostrar a diferenga do préprio corpo, separado dos outros e do mundo, mas lugar de sua liberdade no seio de uma sociedade a que apenas esta formalmente ligado. E este caminho inédito das marcas corporais nas nossas sociedades ocidentais que me interessa nesta obra. A antropologia cultural das marcas corporais ¢ rica (Mzertens, 1978; Brain, 1979; Borel, 1992; Ebin, 1979). Com uma aproximacao semelhante, outras obras ofere- ceram um largo panorama dos usos sociais no dominio da decoracao ritual e/ou estética do corpo humano (Thevoz, 1984, Virel, 1979). Nao pretendi debrucar-me mais sobre elas, ainda que me aconteca, aqui ¢ ali, evo- cé-las por analogia, apontando contudo as diferencas. Angulo de aproximagao deste livro é naturalmente 0 fascinio actual das nossas sociedades por estas marcas corporais. Antropologia do contemporaneo ¢ antropolo gia da juventude caminham lado « lado nestas paginas ligadas para perceber os significados destas decisdes de modificacées corporais que arrastam com paixdo uma parte cada vez maior das jovens geracdes. lesta obra quis dar a palavra sos individuos a que ela diz respeito, marcando assim certas partes do tex- to com os seus testemunhos. A minha documentacao era consideravel. Para além da observacao pessoal, dos encontros informais, consistia ainda em mais de qua trocentas entrevistas com pessoas tatuadas, furadas ou escarificadas (cujos nomes proprios foram por vezes al- terados). Estas entrevistas provieram de um inquérito de dois anos conduzido na Faculdade de Ciéncias Sociais 14 Sinais de Identidede da Universidade Mare Bloch de Estrasburgo. Agradeco imenso a colaboracao neste assunto de Nicoletta Diasio ¢ Laurence Pfcffer-Kintz, e dos numerosos estudantes gue se interessaram por este trabalho que muitas vezes lhes dizia respeito de muito perto. Quero igualmente agradecer a Crass, patrao da Tribal Touch em Estras- burgo, que me falou longamente do scu trabalho ¢ que veio varias veres a faculdade para encontros apaixonan- tes com os estudantes de sociologia. Agradego também a Esté que me falou do seu itinerario pessoal ¢ da maneira como via a sua profiss4o, Devo muito a Lukas Zpira, apanhado num processo de transformagao radical de si, patrao da Body Art em Avinhao, cujo contacto apreciei muito e que me falou no set: empenho nao s6 a nivel de trabalho mas tambem de vida no que respeita as marcas corporais. Agradeco muito igualmente a Armand ‘Touati, director da revista Cultures en mouvement, que publicou varios dos meus artigos sobre tatuagem ou piercing ¢ que aceitou 0 principio de um numero consagrado as modificagdes corporais, aparecido no Verao de 2001. Ja- mais teria escrito sobre este tema se ndo tivesse sentido ja desde ha muitos anos a importancia que revestem estas marcas para as jovens geragées, a mancira como elas sao algumas vezes um recureo para apagar um sofrimento pessoal. E paradoxalmente 0 meu trabalho sobre os jogos simbélicos com.a morte, e nomeadamen- te as conduitas de risco dos jovens que me levaram a esta reflexao, Em muitas ocasides creio ter sentido nos jovens em dificuldades a importancia existencial das suas marcas ne construcdo dificil de si. Neste sentido Signes d’identité ¢ uma espécie de longo capitulo suple- mentar de Passions du risque (1991) mas na vertente da preyencao, da tomada em maos pacificada de si. Mas, bem entendido, as modificagdes corporis sdo também alegria de brincar com o seu corpo, de se decorar 4 sug mancira, de inventar pare si identidades versatcis. 1. A fabrica da identidade Num mundo em que nuinerosas vozes falam ao mesmo tempo, wm mundo em que 0 sincretismo e a invencdo parédica se tomam a regra, ndoacxcepedo, um mundomuttinacional e urbano do efémero institucionalizado — em que as roupas americanas, fabricadas na Coreia, sdo vestidas pelos jovens na Russia, em que as “raizes” de cada um sdo de algum modo cortadas =, num mundo assim, torna-se cada vex mais dificil ligar a identidade e 0 significado humano a uma “cultura” ou a uma “linguagem” coerente.» James Clifford, Malaise dans la culture A construcao da identidade do corpo © mundo contemporaneo testemunha o desen- raizamento das antigas matrizes de sentido. Fim dos grandes movimentos ideoldgicos (marxismo, socialismo, ctc.), dispersao das referéncias da vida quotidiana, frag- snentacdo dos valores, Neste context de desorientacao do sentido, o individuo traca ele préprio os seus limites 15 Sinais de Identidade para o melhor e para o pior, ergue de maneira instavel ¢ deliberada as suas proprias fronteiras de identidade, a trama de sentido que orienta o seu caminho e Ihe per- mite reconhecer-se como sujeito. Obviamente, a sobera- nia pessoal é limitada, demarcada pelos pesos sociclogi- cos, 0 ambiente da época, a condigao social ¢ cultural, a propria histéria, mas o individuo tem a impressao de se fazer nascer, de decidir a sua condicéo. «JA nao somes herdeiros. As rupturas sociais, ge racionais ou culturais tomam 0 mundo mais confuso, mais incerto. Hoje, cada actor é levado a uma producao da sua propria identicade através de uma constragéo cuja mundializacéo cultural, ou seja a transformacko em sinais, em estética, da cultura dos outros, multiplica os materiais possiveis. Somos doravante os artesaos das hossas existéncias, com uma margem de manobra mais ou menos grande, Por outras palavras, o individualismo alargou a sua empresa. Nao s¢ trata de egoismo, no sen- tido moral do termo, mas de um individualismo, no sentido seciolégico que liberta o individuo do seu console moral ou social. Nao que o individuo se liberte dele totalmen- te, continua dele tributdrio em varios aspectos, mas a sua margem de criagao amplifica-se, tanto mais que a cultura ambiente ndo tem espessura real ¢ funciona A maneira de um vasto supermercado de bens materiais € simbolicos. A construcio de sentido caracteriza de ora em diante a relagao com 0 mundo. O corpo, lugar de s0- berania do sujeito, ¢ a primeira matéria da sua ligacdo com o mundo, E um limite a rejeitar. Embora lugar da hecesséria encarnacao do sujeito, aparece como primei- re matéria da sua existéncia. J& nos finais dos anos 60 0 corpo impde-se como um sinal de ligacéio unénime: o feminismo, a «revolucdo sexuals, a expressao corporal, a body art, 0 aparecimento de noves terapias proclamando a vontade de s¢ ligar so- mente ao corpo, a experiéncia das droges, cic. Um novo A fébrice da Identdade v imagindrio do corpo ganha agora asas e faz, sem descan- so, uma critica das modalidades sociais da existencia in- dividual. A ofensiva ia alias chegar a um certo nlimero de transformacées nos factos € nas mentalidades (direito contracepeao, ao aborto, mudanca das relacdes homens- -mulheres, accitacao da homossexualidade, etc.) © questionamento acerca do corpo era coerente, inevitavel sem davida nesse momento em que o indi- vidualismo ocidental conhecia uma outra etepa do seu desenvolvimento. O corpo, como encarna o homem, é com efeito a marca do individuo, a sua fronteira, o estri bo que de algum modo o distingue dos outros. E pois 0 lugar de separagao e nao o da alianca como em muitas sociedades tradicionais em que serve de ligagio de um individuo aos outros, 20 mundo, ao cosmos, ao univer- so invisivel. Pelo contrario, nas sociedades ocidentais, desde a Renascenga, 0 corpo implica que 0 homem seja separado dos outros (0 corpo como lugar de demarcacao do individuo}, da natureza (a natureza é diferente do ho- mem, ela ja nao é cosmos mas algo que o rodeia), e sepa- rado de si mesmo (0 dualismo entre a alma ou 0 espirito € 0 corpo, ou nos dias de hoje entre 0 homem por um lado € 0 seu corpo por outro). O corpo da modernidade esta pois sob a égide da separacdo (Le Breton, 1990). Porque a crise do sentido ¢ dos valores torna a rela- céo no mundo mais problematica, o individuo procura as suas marcas de uma forma hesitante, esforca-se por enfrentar 0 seu mal-estar e por fabricar para si préprio uma identidade mais propicia. Presta, desde logo, uma atengao redobrada ao corpo, naquilo em que se distinguie dos outros e do mundo. O corpo é 0 sintoma deste afas- tamento do individuo da sua trama social e o lugar de afirmacao da sua liberdade. Porque ele encarna a ruptu- ra, a diferenciacao individual, atribui-se-Lhe o privilégio da reconciliacao. Procura-se fazer dele néo ja o sinal da exclusdo, mas 0 da incluséo, que ele nao seja o interrup- 8 Sinais de Identidade lor que discrimina 0 individuo, 0 separa, mas o elo que o une aos outros. Ou entdo afronta-se como o lugar da dor, do mal-cstar de ser ele proprio. E todas as formas de arte contemporénea desde Artaud se inscrevem neste dilema quando 0 consideram como objecto de interrogagao. O corpo é hoje um outro ele préprio disponivel para todas as modificagées, prova radical ¢ modular da cxisténcia pessoal ¢ lugar de revelacdo duma identidade proviséria ou duradouramente escolhida (Le Breton, 1999). O investimento sobre o préprio corpo responde a de- sagregacao do laco social, ¢ logo ao sfastamento do ou- tro, a separacao dos antigos laos comunitarios. Perden do este enraizamento social, estas relacbes de sentido e de valores com os outros, 0 indivicuo faz do seu corpo um mundo em miniatura, faz dele um fim em si préprio, uma maneira privilegiada de existir. Atraves dele o indi- yiduo interroga o mundo ¢ procura o seu porto, parte em busca duma identidade provisoriamente aceitavel. A obsoléncia do corpo ja nao esta alojada apenas no mundo da genética, dos arquivos, da robotica ou do virtual, difunde-se em inumerdveis praticas da vida quotidiana onde reina uma empresa artesanal de modi- ficagao da forma corporal, A concorréncia é rude para os artistas. A body art leva ao ctimulo esta légica que faz aber. tamente do corpo o material de um individuo que reivin dica modifica-lo a seu gosto ¢ mostrar formas inéditas de criacao. A cirurgia estética ou plastica modifica as formas corporais ou 0 Sexo, as hormonas ou a dietética aumentam a massa musculer, os regimes alimentares twatam a silhueta, os que fazem piercing ou tatuagem colocam sobre ou na pele sinais identificativos defini- tivos ou provisorios. Todos estes passos isolam o cor- po como uma materia & parte que revela um estado do sujeito, suporte de uma gcometria variavel de ume identidede escolhida ¢ sempre revogavel. Por vezes, a A fabrica da identidade 19 comunicacda entre a arte e a vida quotidiana ¢ estreita, como atesta Orian cujos implantes em relevo no rosto suscitam 2 emulacao. Alguns sonham agir dircctamente sobre a formula genética do sujcito para lhe modificar a forma e mesmo os comportamentos. Se nao sc podem mudar as suas condigdes existenciais, pode-se pelo menos transformar 0 corpo de miltiplas maneiras. A indastria do design corporal expandiu-se, Proclamacao momenténea de si, 0 corpo tornou-se a protese de um eu em busca duma encarnacao proviséria para sobreva- lorizar a sua presenca no mundo, corrida sem fim para aderir a si, a uma identidade efémera mas essencial para sie para um momento do ambiente social. Para se tor- nar notado, multiplicam-se os sinais da sua existencia de maneira visivel no corpo. © corpo dos anos 60 encarnava ainda a verdade do sujeito, 0 seu ser no mundo, hoje nao passa de um artificio submetido ao design permanente da medicina ou da informatica. Outrora suporte da identidade pes- soal, 0 seu estatuto é, as vezes, a partir de agora, o de um acessdrio. Afirmar a sua existéncia aos olhos dos outros Notou-se muitas vezes a partir de G. Simmel que a experiéncia da cidade é essencialmente visual, as infor- macées susceptiveis de ser recolhidas sobre os outros vém da aparéncia. Sob o reinado do olhar, a superficie torna-se © lugar da profundidade. Para se destacar do fundo de indiferenga, convém pois torar-se visivel se se quer escapar ao anonimato. A originalidade do vestu- ario, do penteado, da atitude, etc., ou, bem entendido, a tatuegem, o piercing, as escarificacées, 0 branding, etc., s20 meios de sobrevalorizar o corpo € afirmar a sua presenca pare sie para os outros. Sao sinais para nao se passar despercebido ¢ logo para existir aos olhos dos 20 ‘sials ce Identivade outros, ou pelo menos sc ter disso 0 sentimento. Sao ri tuais intimos de fabricacao do sentido de uma maneira menos brutal que as condutas de risco!, mas resultam da mesma necessidade interior de dar sentido e relevo sua existéncia. Os anes 80 ¢ 90 viram emergir uma preocupacao de dominio do corpo, de gestdo da aparéncia, de controlo dos afectos. O individuo tornou-se 0 produtor da sua propria identidade. Procura construir-se, fazer do seu corpo uma mais-valia, um porta-voz da imagem que entende dar de si mesmo. A tatuagem conhece desde entdo uma difusao social crescente. O sinal na pele tem valor de decoracao, traduz uma vontade estética em re- lacao a si. Proclama a independencia do individuo face ao social, a sua vontade clara de fazer de si o que enten- der. De pratica marginal ¢ estigmatizante, a tatuagem passa pouco a pouco a ser valorizada e reivindicada como artistica. Diz respeito a todas as classes sociais, nao afasta as mulheres que a ela recorrem cada vez mais. As tatuagens ou os piercings transformaram-se em acessérios de beleza que nao se gastam, um adereco definitivo que contribui para a afirmagao do sentimento de identidade, para a encenagio de si. A tatuagem é hoje considerada como sinal de em: belezamento do corpo, ja ndo esté necessariamente associada a marginalidade (a menos que se trate de uma vontade deliberada de revelar figuras agressivas ou obscenas, o que se tornou nitidamente mais raro nos dias de hoje). A excepedio sem duvida da maior parte dos piercings que podem ser facilmente retirados em caso de exrependimento, © paradoxo das gravacées corporais & marcar 0 corpo sem remiss4o: as escarificacées, as quei- maduras, os cortes, as modificacdes eventuais de formas "Cf David Le Breton, Passions du risque, Paris, Métailié, soo. w risque, Paris, Méteil A Fabrica da identidade a (lingua fendida, mesmo até o pénis, por exemplo} e, bem entendido, a tatuagem (tendo em conta as dificuldades da des-tatuagem). S20 metamorfoses da aparéncia gra- vadas de uma vez por todas na carne que contribuem para um sentimento de identidade do individuo. Apenas os piercings ¢ os implantes podem ser retirados. Como vimos, 0 corpo torna-se hoje 0 cmblema do self. A arte contemporanee centrada sobre o corpo toma partido no debate sobre as rupturas antropolégicas que se sucedem nas nossas sociedades. Com os seus meios especificos, os artistas interrogam com ironia e deter- minagao esta vertigem de um dominio de si que faz do corpo um objecto a reconfigurar sem parar. Nas nossas sociedades a interioridade do sujeito é um esforco cons- tante de aparéncia, recuiz-se a sia superficie. Mais do que munca, para retomar Paul Valery, xo mais profundo 6a pele». As declinacdes da obsolencia do corpo consti- tuem um dos terrenos mais activos e mais significativos da arte contemporanea. Do mesmo modo que as artes plasticas (e nomeadamente a body art), 0 teatro ou a danca participam fortemente na interroga¢ao lancinan- te das nossas sociedades sobre o estatuto do corpo portanto, para além disso, sobre 0 estatuto do sujeito num mundo em que ¢ ameacado por todos os lacos. Na sociedade grega antiga, o estigma corporal sim- bolizava a venda @ outrem; hoje, pelo contrario, a marca corporal revela a pertenca a si. Traduza necessidade de completar por uma iniciativa pessoal um corpo insufi- ciente em si mesmo para encarnar a identidade pessoal. A tatuagem, o piercing, as roupas ou as maneiras de se pentear, de se barbear, de pintar os cabelos ou de exibir jéias, tornaram-se hoje maneiras de construir 0 senti- mento de si, de brincar com a sua identidade para se aproximar de uma imagem julgada mais propicia, Re- flectem pois no seu uso uma vontade de mudar de modo duradouro a definicao intima e sobretudo social de si, 2 Sinets ce Edenticade De marginal ou de original, a tatuagem tornou-se, com o piercing, uma referéncia essencial da juventude contemporanea. O seu valor inverteu-sc, ¢ de maneira duravel, porque hoje as jovens geragées, imagem das anteriores, mas ainda com mais empenho, crescem no ambiente intelectual dum corpo inacabado e imperieito que 0 individuo se esforca por melhorar com 0 seu estilo particular. A construgao de si proprio é uma actividade que nunca conhece descanso. As paixdes colectivas pelas marcas corporais ultra- passaim hoje largamente 0 circulo da juventude, mas afectam entretanto fortemente as jovens geracdes. Esta atracgao pelo corpo transformado, decorado, esta ligada ao sobreinvestimento no corpo neste periodo da exis- téncia, a inquietacéo face a um corpo que se tornow no fundamental da relagéo com o outro, nesta preocupa- s40 com a aparéncia que toma conta muitas vezes dos jovens e com a qual as nossas sociedades se tornam obcecadas. Tatuando-se, furando-se cscarificando 0 seu corpo, 0 jovem, simbolicamente, toma posse dele ¢ marea-o com 0 selo do seu controlo. A superficie cuta- nea assim destacada brilha com uma aura especial, Acrescenta um suplemento de sentido e de jogo a vida pessoal. & muitas vezes vivida como a reapropriacao de um corpo e de um mundo que escapam, nela se grava fisicamente @ sua marca de ser, toma-se conta de si, inscreve-se um limite (de sentido e de facto), um sinal que restitui ao sujeito o sentimento da sua soberania pessoal. A marca € um limite simbélica desenhado na pele, fixa um estribo na procura de significado e de identidade. 6 uma espécie de assinature de si pela qual © individuo se afirma nurna identidade escothida.: Desenvolvemos este tema da plasticidade do corpo contempo- rineo @ nomeedamente do progiesso das mareas Corporais No det ‘teizo capitulo de David Le Breton, D'Adiew ox comps, Pans, Metalié A fdrica da Wdentidade 23 Hoje cada um reivindiea ser livre com o seu corpo como 0 é com conducao da sua existéncia, o proposito Teaparece muitas vezes nas nossas entrevistas: «O cor- po € meu, cabe-me decidir 0 que faco com ele.» & tanto mais seu quanto mais se torna «decoracaoy, representa de algum modo o individue mais do que a sua propria existéncia numa sociedade que privilegia a aparéncia. © individuo visita frequentemente a superficie do seu corpo. Para que cla possa falar favoravelmente de si aos outros, € preciso personalizé-la. O valor pessoal confere-se menos pelas obras do que por aquilo que se publicita de si. As formas de demonstracao da postura corporal sao essencialmente juvenis quando passam por uma encena, cao espectacular (dar espectaculo) da cabeleira, da pele, das roupas, das atitudes, etc., ai onde, em principio, os outros grupos etarios respondem a cédigos de conveni- éncia sem a por em questao. Vontade de sobrevalorizar © seu corpo, a sua identidade, a sua pertenca sexual ou jogar com ela segundo os momentos ¢ os publicos. O jovem deseja afirmar a sua existéncia e exagera na sua demonstragao por uma espécie de necessidade interior. Muitos adolescentes vestem assim, paradoxalmente, euniformes: que os desmarcam de repente ao olhar. Maneira de se juntar parecendo-se, de proclamar visivel- mente uma identidade de destino € de classe pensando «desprezar a sociedade» € 0s seus «conformismos». Limite sagrado da pessoa, 0 corpo é protegide do que o rodeia por um espaco de reserva, ndo é afectado para além das relagdes privilegiadas. As formas ritua- lizadas de apagamento do corpo permanecem na vida corrente sobretudo no plano dos contactos fisicos ou dos odores corporais (Le Breton, 1990). Em compensa- cao, uma larga parte da juventude em busca de uma proclamacdo da existéncia, mostra-se de maneira cha- metiva atraves de roupas singulares, tatuagens, pier- 2 Sinais de Hentidade dings, maneira de se pentear, de pintar os cabelos com cores inesperadas out de os rapar total ou parcialmente. A vista é hoje constantemente solicitada por um estilo de vestir, uma maneira de se conduzir em puiblico ou de sublinhar 2 sua aparéncia pelas marcas corporais. A preocupacao reside sobretudo em nao passar des- percebide mantendo cuidadosamente as distancias em relagao aos outros. As formas de exposicao de si esbo- roam-se numa sociedade individualista em que o que realmente importa é sair do conjunto para sentir por fim a existéncia olhar para si. As modificagées corporais afirmam uma singulari- dade individual no anonimato democratico das nossas sociedades, permitem que uma pessoa se julgue tinica ¢ valida num mundo onde os limites se perdem e em que abunda @ inictativa pessoal. Provocam o olhar, agar- ram-se a um looke atraem as atencées. SAo uma forma radical de comunicagao, de se dar valor e evidéncia para escapar a indiferenca. 2. As marcas corporais nas sociedades ocidentais: historia de um mal-entendido ‘Estas tatuagens tinham sido obra dum profeta € vidente fatecido na sua itha natal. Através dos seus hieréglifos, tinha tragado no compo de Queequeg uma teoria completa dos céus ¢ da terra e uma espécie de artificio misterioso sobre a arte de atingir a verdade. © compo de Queequeg era pois um enigma a resolver, uma obra maravithosa num volume, mas ndo podia ler-se a si mesmo, ainda que © seu coragao vivo palpitasse sob a pagina. Estas misteriosas ciéneias estavam pois destinadas a apodrecer finalmen’e com o pergaminho vivo sobre 0 qual figuravam e a apagar-se para sempre. Foi talvez por causa deste pensamento que Achab, uma manhd, exclamou, como louco, ajastande-se do pobre Queequeg: “Oh, diablica tentacdo dos deuses!"» Hermen Melville, Moby Dick 25 Sinais de Identidade Os monoteismos ¢ as marcas corporais Nas seciedades marcadas pelas reli tatuagem ou as outras marcas corporais sao proscritas. Esta proibicdo alimenta, de um modo profundo, 0 csta- tuto durante muito tempo negative da tatuagem c, a0 contrario, a predilecedo do seu recurso por individuos desenquadrados e que desejam, por uma razdo ou por outra, afirmar a sua marginalidade e a sua indiferenca em relacao aos julgamentos dos outros. A Biblia afirma claramente a sua recusa de qualquer intervengao visivel ¢ duradoura no corpo humano. O respeito da sua inte gridade € uma forma essencial de submissao aos desig, nios de Deus, mas também de fidelidade a uma criagao @ que ndo ha nada a acrescentar ou a retirar. Modificar a forma do corpo de uma maneira que nao obedeca aos termos da alianga seria um insulto a obra divina. «ao farcis incisdo no corpo de um morto nem fareis em vés préprios tatuagens», diz 0 Levitico (19-28). © Deuteréni- mo repete a mesma imposicao relativamente as incisoes (14-1), © corpo deve permanecer tal como Deus 0 criou, sem acrescento humano. Apenas Javé dispac do privi légio de modificar 0 corpo dos homens. A circuncisdo é também um traco fundamental de pertenca a uma tri- bo. Quanto aos outros sinais, é ele 0 tinico a decidir. No Genese, ele protege assim Caim, apés 0 assassinato do seu irmao Abel: «Javé colocou um sinal em Caim para que 0 primeiro que viesse nao 0 agredisse (4-15). © selo de Ezequiel levado por um escriba é uma libertag2o dos figis da escravatura da Babilénia, mas marca pelo contrario a obediéncia a Deus: wave disse- -ihe: “Pervorre a cidade, percorre Jerusalém e marca com uma cruz na fronte os homens que gemem ¢ cho- ram por causa de todas as abominacdes que se prati- eam néla”.» (Ezequicl, 9-4). 0 Apocalipse de Joao volta @ pegar na profecia ¢ anuncia a libertagdo do povo de ‘As marcas corporais nas scciedades ocidentais a Deus também ele designado: «Depois vi um outro anjo chegar do Oriente, trazendo 0 selo do Deus vivo; gritou com uma voz potente aos quatro anjos os quais foram encarregados de revolver a terra eo mar: “Esperem para revolver a terra € 0 mar ¢ as arvores, que tenhamos mar- cado na fronte os servidores do nosso Deus’. E fiquei entao a saber quantos tinham recebido 0 sclo: 140 000 de todas as tribos dos filhos de Israel (7-2/4). A marca € de origem divina, arranca 0 fiel A morte que espera os adoradores dos outros deuses. Nao provém dos homens, salvo no caso dos adoradores votados & Besta. Com Pau- lo, a marca transfigura-se em «selo do espirito» (Cor.II, 1-22). Interioridade pura, ela acolhe a alma do homem e nao apenas a sua carne. O baptismo é um sinal sufi- ciente para atestar a {é, nao ha qualquer necessidade de redobra-la através de um sinal na pele. Os primeiros cristaos gravam na stia came os sinais do reconhecimento: a cruz, 0 monograma de Cristo. A bem dizer o cristianismo toca os povos adeptos das mo- dificacdes corporais: 08 Pictes de Inglaterra (cujo nome viria do seu habito de marcar 0 corpo com a ajuda de um puncdo), os Scots (cujo nome significa que tém o corpo pintado), os Bretées (para os quais uma das cti- mologias scria os «pintados»). Segundo Végéce, os legio- nérios romanos tém o nome do Imperador ¢ a data do seu alistamento inscritos no braco direito. Os guerreiros da Antiguidade traziam muitas vezes uma marca de filiacao. A documentagao de Flaubert descreve em por- menor 0 campo de batalha de Antharite: «Reconheciam- -se os mercenirios pelas tatuagens das suas mos: os velhos soldados de Antioquia traziam um gavido, os que tinham servido no Egipto, a cabeca de um cinocéfalo; os principes da Asia, um machado, uma granada, um martelo; nas republicas gregas, o perfil de uma cidadela ou o nome de um arconte; viam-se alguns cujos bracos estavam inteiramente cobertos por estes simbolos mul- 28 Sinals ce Identidade tiplicados que se misturavam com as suas cicatrizes novas feridas» (Flaubert, 1964, 222). Os Godos, os Germanos usam também ornamen- tos corporais. Em 313, Constantino proibiu as marcas efectuadas no resto feito a imagem de Deus. 0 Concilio de Calcuth, em 787, insurge-se contra os costumes tra- dicionais dos Pictes. A Igreja, com efeito, combate as for- mas antigas e sempre vivas do paganismo a menos que as possa recuperar para seu uso. Tatuar-se para Deus é eventualmente licito conquanto nao heja qualquer cono- tacao paga neste recurso. Os Cruzados marcam-se com uma cruz para serem identificados no caso de morrerem e poderem assim beneficiar de uma sepultura crista Mas 0 costume parece perder-se pouco a pouco, subsis- tindo todavia em alguns lugares. Até ao fim do século xx 0s peregrinos de Nossa Senhora do Loreto, em Italia, que © desejassem recebiam na pele um emblema piedoso (a cruz ou 0 monograma de Cristo) ou a data da sua vinda aos lugares santos. Desde longa data, a peregrinagao a Jerusalém esta associada & tatuagem de um emblema religioso que acompanhava a data da estadia, Em 1612, um viajante, W. Lightgow fez-se tatuar, sacrificando-se a um habito bem estabelecido: «De manha cedo um homem veio até nés, um certo Elias Areacheros, um cristao de Belém, que abastece os Irmaos. Ele gravou nos nossos bracos, perto do Santo Sepulcro, o nome de Jesus e a santa cruz.» O peregrino procurava outras pessoas ligadas A religiao mas também ao rei James (Scutt, Gotch, 1974, 27). Em 1658, um outro viajante, Thévenot, descreve © mesmo recurso: ;Passamos toda a terca-feira 29 de Abril a fazer-nos marcar os bracos como fazem habi- tualmente os peregrinos: so 08 cristéos de Belém que fazem isso seguindo 0 rito latino» (Lacassagne, 1881, 10). Em 1881, A. Lacassagne afirma que o uso persiste sinda em Jerusalém. Tatuadores de diferentes naciona- As marcas corporais nas sociedades ocicentais 23 lidades (Gregos, Maronitas, Sirios, etc.) propoem o-seu servico gos seus compatriotas. Nos locais em que séo minoritarios, nomeadamente em terra do Islao, os cristéos, por cxempio na Bésnia- -Herzegovina (Locard, 1932, p. 320 sg.) ou no Egipto (Coptas) usaram durante muito tempo uma tatuagem de filiagdo que remetia para motives religiosos conven- cionais. Pelo contrario, a religiosidade popular desde 0 fim do século xx recorre com deleite acs simbolismos cristaos. Cruz, Cristo, Calvario, Virgem, etc., abundam no corpo dos homens do meio popular como uma manei- ra de nao negligenciar Deus continuando num universo profano. Muitas vezes gravam o seti destino de infelizes ou vagabundos sob a égide da figura de Cristo, conside- rado como uma vitima da injustica social A tradicao catélica, se nunca impediu a tatuagem, limitou contudo 0 seu desenvolvimento 2os othos dos paises de tradicdo protestante como os da Europa do Norte (os paises escandinavos, os Paises-Baixos, a Alemanha, a Inglaterra, etc.) ou os Estados-Unidos! onde 0 facto de se marcar 0 corpo levanta historicamente menos reprovagdes que em Franca, em Itélia, em Espanha ou em Portugal, por exemplo. ‘As culturas islmicas estéo numa posicio ambi- gua. As sociedades anteriores a0 Islio recorrem tradi- Para uma historia da tatuagem nos EUA ¢ na Grd-Bretanha, as primeiras terras de eleigho desta pratica, remetemos de novo para Seutt ¢ Gotch (1974, 51 sg). Estes dois autores evocam ja, desde segunda metade do Século mx, varios grandes nomes da tatuagem: MHildebrand (que se instala em Boston em 1846), S.OReilly, Na Gra-Bretanha, D. Purdy instala-se em 1870 no norte de Londres, nomes como 7. Riley, §. Macdonald e G. Burchett possuem na Gpoca grande notoriedade. Parece todavia que todas as danses dat sociedade britanica foram sempre bastante tolerantes em relacao a tatuagem, co contrério de outros paises. Em 1379, A Lacassagne descreve pormenorizadamente a elegante laja de um tatuador lon- drino chamado Macdonald (Locard, 1932, 313). Para uma histéria cepecifica da tatuagem no Japao, remetemze para Pons (2000), R- chie (1980), Van Gulik (1982). 30 Sinals ce Identicade cionalmente a tatuagem. E a islamizacao € impotente para Ihe retirar o atractivo, nomeadamente no caso dos Berberes © Beduinos. © Cordo nada diz sobre isso mas a alteragéo da criagdo de Deus é uma falta im- perdodvel, assim o respeito da integridade do corpo é uma exigéncia sagrada, Um hadith diz clarament «Maldita seja aquela que se tatua, a que se faz tatuar, a que coloca cabeleiras posticas e aquela que as manda por, Ou ainda: «Deus maldisse aquelas que se tatu- am, aquelas que depilam o rosto e aquelas que limam os dentes por coquetismo porque alteram a obra de Deus», Herber interroga, no principio do século, uma pratica marroquina sobre a origem do seu trabalho. A velha mulher responde-Ihe: «Somos todas tatuadoras, de mae para filha, ~ Mas tera havido uma que comecou, objectou-the o intérprete, e, esta de quem herdou o seu talento? - De um xeque- E de que xeque? A resposta fez-se esperar, mas por fim ela deu-a: Escreve que foi Satanas: (Herber, 1921), A simples mencao duma mar- ca corporal no Corao € negativa. Maomé ameaga com efeito afixar um sinal de infémia no rosto dos infi “A este homem que a leitura dos nossos versiculos di “Sao historias antigas”, imprimir-the-emos uma marca no narize (XVIII), Mas 0 Coro nao declara nenhuma oposicdo de principio a uma pratica largamente difun dida no tempo do Profeta. As decoracdes corporais com hena so correntes. Profilacticas e terapéuticas, visam proteger as zonas do corpo mais frageis, as que estao na interface do homem com 0 mundo, os orificios. «A boca, a vulva ¢ as nari- nas sdo como portas abertas sobre o funda do ser, e tatuagem da piibis desempenha 0 mesmo papel que 2 tatuagem do queixo e do nariz; ele é, como elas, extra~ orificia (Bruno, 1974). O queixo, na proximidade da boca, as témporas, préximas dos olhos, ou os artelhos que ligam a terra séo locais privilegiados para isso. A As marcas corporgs nas sociedaces ocentais 3m sua fungo € rejeitar a doenca, tratar, repor 0 6rgéo lesa- do no seu lugar, proteger a pessoa do mau-olhado, etc. Essencialmente feitas peles mulheres, as tatuagens sao muitas vezes também ornamentais ¢ feitas nas maos ¢ pés gracas hena. Definitivas ou provisérias, so bem entendido geométricas, jamais figurativas, As marcas da infamia Lembramo-nos do texto de Kafka, Na Colénia Penal, em que a punicao de um delito consistia na gravacao da sentenca na pele do culpado: «0 homem decifra-a com © seu sofrimento. £ um trabalho demorado, certamente; precisa de seis horas para o terminar. Nesse momento, a grade espeta-o e lanca-o na fossa» (Kafka, 1948). A mar- ca corporal, como a tatuagem, foi muitas vezes utilizada historicamente como uma maneira de chamar a aten- edo para os homens ou mulheres destituidos dos seus direitos, postos de parte pela sociedade: os escravos, 08 ctiminosos, os prisionciros, etc. Se as marcas corpo- rais acompanham muitas vezes os ritos de passagem, noutras circunstancias traduzem também a exclusao O sinal de infamia no deixa qualquer hipétese, afasta © individuo da sociedade civil e projecta-o nos limbos sociais, entre a vida e a morte, conferindo-Ihe uma exis- téncia sob o olhar permanente dos outros. Fa-lo perma- necer na soleira da porta, definitivamente. A Grécia marca os escravos em fuga recuperados ou os estrangeiros culpados de sacrilégio. Dario marca com um ferro em brasa milhares de prisioneiros grego: Em 440, aquando da guerra entre Atenas e Samos, os prisioneiros dos dois campos sao estigmatizados: os ca- tivos atenienses sao tatuados com um navio de guerra na fronte, os de Samos com uma coruja. Em Roma, os prisioneiros, os desertores ¢ os escravos séo também sicamente marcados pelo oprébrio, 2 ‘ials de Identidade D, Brama obscrva na iconografia medieval que os brincos ou os ancis distinguem as personagens moral- mente perturbadas. No seu Ecce Home, por exemplo, Bosch coloca um pingente na orelha de um amigo de Pilatos. Outras obras associam a argola a infamia, a sua origem medieval vota-a a uma significacdo negativa € demarcacao imediata nomeadamente das personagens exéticas «uma vez que serve de ornamento aos povos te- midos pela cristandade da Idade Média ocidental (Bru- ma, 2001, 69). A argola apenas se liberta da sua aura nefasta no século xv, quando se descobre a cultura da Antiguidade. A inscrigao judiciaria, apondo um sinal de infamia visivel aos olhos de todos no corpo, desapossa o indivi- duo de toda a soberania, torna-o objecto de qualquer um, um mestre e um Estado. Voltamos a encontré-la em Franga, no século xiv, sob a forma de um stigma (a letra Mj impressa na fronte dos mendigos profissionais con- denados a prisdo. O ferrete é uma marca realizada com um ferro em brasa no ombro do condenado, a flor de lis ¢ as letras GAL assinalam a passagem pelas galeras reais conduzindo a um reconhecimento imediato daquele que se acha dever ser rejeitado publicamente pela sociedade. Os ladrdes $40 punidos com uma flor de lis com um V. As prostitutas séo igualmente marcadas. D/Artagnan, esforcando-se para reter Milady, rasga sem querer o seu penteador de tecido fino e «com uma emocao inexpri- mivel, reconhece a flor de lis, esta marca indelével que imprime a mao infamante Go carrasco... © jovem sabia agora 0 seu segredo, segredo terrivel, que toda a gente ignorava, excepto ele» (Dumas, 1994, 415). 0 Codigo ne- gro, que rege as relagdes com os escravos nas coldnias, impOe desde 1685 uma flor de lis na pele dos fugitivos ¢ toda uma séric de mutilagdes em caso de recidiva. O ar- tigo 38 prevé nomeedamente que «o escravo fugitive que tenha estado em fuga durante um més a contar do dia As marces corporsis nas sociedads ocidentals 33 em que o sett dono o tenha denunciado ajustica, tera as orelhas cortadas e sera marcado com uma flor de lis no ombro; ¢ se reincide a contar igualmente do dia da de- mancia, tera o jarrete cortado e sera marcade com uma flor de lis no outro ombro; & terceira vez serd punido com a mortes (Sale-Molins, 1987, 166). Em 1687, um édito do rei autoriza e marcar com um estigma a face dos soldados que tenham abusado da intendéncia militar. Sob o reinado de Luis XV, o ferrete é gravado no ombro. A Constituinte aboliu-oem 1791. Na- poledo restabeleceu-o em 1810: «qualquer um que tenha sido condenado a trabalhos forcados para sempre sera estigmatizado na praca ptiblica, pela aplicagao de uma marca feita com um ferro em brasa no ombro direito. Os condenados a outras penas nao seréo marcados com 0 ferrete salvo nos casos em que a lei os tenha vinculado a pena que thes foi infligida. Esta marca sera formada pelas letras TP para os condenados a trabalhos forca~ dos por tempo ceterminado, até serem estigmatizados. A letra F sera acrescentada ao ferrete se 0 culpado for um falsario». (Bruno, 1974, p. 178-179). M. Madeleine desmascara-se como Jean Valjcan para salvar Champ- mathicu dirigindo-se aos scus antigos cimplices, que n&o © reconhecem, enumerando as suas marcas cor- porais: «Chenildieu |...|, tena todo o ombro direito pro- fundamente queimado, porque um dia te deitaste com © ombro descoberto sobre uma braseira cheia de brasas, para apagar as trés letras TFP, que contudo se continu- am a ver |... Cochepaille, tu tens perto da parte interior do cotovelo esquerdo uma data gravada em letras amis com pé queimado. Esta data, é a do desembarque do Imperador em Cannes: 1° de Margo de 1815». E assim igualmente que Trompe-La-Mort, forcado evadido que se escondia sob a identidade do burgueés Vautrin, é desco- berto: «As duas letras fatais reapareceram em branco no meio do lugar vermelhor (Balzac, 1981, 217). a Sinais de Tdantidade Em 1852, um decreto abolitt para sempre a estigma- tizacao em Franca. A mesma pratica na armada britani- ca, que marca a letra D com um ferro em brasa na fronte ou nas maos de um desertor. Os ladrées, as prostitutas, os rebeldes, os addlteros s8o igualmente punidos com uma Ictra indicando 0 seu crime (Scutt, Gotch, 1974. 162). Apenas cm 1892 este costume € abolido. Mas tentagao de marcar fisicamente o outro para o distinguir permanentemente aos olhos da multidao nao cessa de renascer das cinzas. Em 1911, Aicard, em Marselha, propée «injectar sob a pele uma certa quantidade de parafina, de maneira a criar uma pequena nodosidade. Esta nodosidade nao alterando muito sensivelmente o aspecto da pele permanecera ignorada pelos néo-ini ciados ©, no caso de ser descoberta por uma terceira pessoa, poderia passar por um pequeno quisto, uma ci losidade. um qualquer tumor cuyja origem judiciiria nao seria suspeitar, Aicard propoe mesmo uma subtil hierar- quia de nodosidades, segundo a natureza ou o local do corpo, permitindo logo & policia saber com que tipo de scriminosor tinha de lidar (Locard, 1932, 293). O bidlogo Pauling sugeriu outrora a tatuagem frontal dos portado- reg de genes sdefeituosos» a fim de pereeber ao primeizo olhar o perigo potencial cm caso de acasalamento, Sabe- mos qual 0 uso que a Alemanha nazi fez das tatuagens infamantes nos campos de morte. Mais recentemente, politicos de extrema-direita ou de sensibilidade proxima propuseram marcar, melhor ainda estigmatizar, com um sinal identificativo na fronte as pessoas atingidas pelo HIV ou pela sida, s fim de provocar desconfianca em telacao a elas, ¢ sobretude mostra-las como «perigo- 88S» Para os seus eventuais patceiros! A ideia da tatuagem de identificagao volta come uma Urania na boca de politicos out de medicos ern nome das suas «wantagen: pars a indicaczo imediata dos individuos, Na Chicago dos anc: um médico langa ula Campanha para que cada americano tare ‘As marca corporat nas ceciedadss ccidantais 5 Os «selvagens do interior» Em Moby Dick, lembramo-nos do horror experi- mentado pelo jovern Ismael na sua paragem em New Bradford, antes de chegar a Nantucket, capital america- na da pesca da baleia. O estalajadeiro a quem se dirige apenas encontra uma cama para ele partilhar com um outro locatario. Ismael aceita sem ver 0 sorriso irénico do patrao. Durante a noite, quando ja esta deitado, 0 companheiro chega finalmente, ¢ para grande horror do jovem marinheiro: «Ele continuava @ despir-se. O seu peito € 08 sets bracos apareceram. & tao verdade como eu estar vivo! Essas partes do corpo estavam riscadas com os mesmos quadrados sombrios que o seu rosto. As suas costas também, as suas pernas |...|. Via-se mesmo que era um abominavel selvagem embarcado por um qualquer baleeiro nos mares do Sul e chegado por acaso a este pais crist4o. Eu tremia sé de pensar nisso» (Melville, 1941, 51), Encontro inaugural com a tatuagem sob o signo do terror. Ismael aprendera a ul- trapassar os seus preconceitos ¢ tornar-se-a amigo do arpoador Queequeg com 0 qual embarcaré no Pequod em busca da baleia branca. Durante muito tempo para as nossas sociedades ocidentais a tatuagem foi associada ao «primitivismor daqueles que a ela recorriam. Para Lombroso ou Lacas- sagne, criminalistas um ¢ outro da viragem do século, nao ha davida de que os individuos tatuados sao +selva- gens+, quer dizer homens menores, pouco civilizados, ¢ inclinados a todas as formas de delinquéncia, Barbaro daqui ou dali, eles préprios escolheriam revelar a sua © seu grupo sanguineo © 0 seu niimero de seguranca social para 9 caso em que a explosaa de uma bomba stémica tornasze muito dif Gila identcacac dos cadaveres. Sugerie uma marca no tronco (um Gos pontes mate delorosos) para o caso Ga explosaa arrancar bracos, e pernas as vitimas (Steward, 1990,

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