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CULTURA CORPORAL E ENSINO NA PERPSECTIVA DO CURRÍCULO

CULTURAL DA EDUCAÇÃO FÍSICA: reflexões a partir da disciplina EDM 5201


Dayse Alisson Camara Cauper
Resumo
Este texto tem o propósito de apresentar o conceito de cultura corporal, bem como os
encaminhamentos metodológicos subjacentes a ele para um ensino culturalmente
orientado da Educação Física na educação básica. Trata-se de uma síntese da disciplina
EDM 5201 - Currículo Cultural da Educação Física: perspectivas política,
epistemológica e pedagógica, ofertada, concomitantemente, pelos Programas de Pós-
Graduação em Educação da Universidade de São Paulo, Universidade de Campinas e
Universidade Federal de Juiz de Fora, no formato remoto em 2022-2.

Introdução
O contexto de abertura democrática do país na década de 1980 favoreceu um
movimento de crítica, reflexão e elaboração de novas teorias no campo da educação e,
consequentemente, também da Educação Física onde foi denominado de Movimento
Renovador. Este, em específico, reuniu um conjunto de intelectuais, de filiação
epistemológica diversa, que se ocupou de elaborar e propor novos paradigmas para a
área em substituição aos modelos esportivista e da aptidão física, que predominavam até
então. Embora distintas, essas teorias tinham em comum o uso do termo “cultura”,
seguido de complementos como, “corporal”, “do movimento”, “corporal de
movimento”, “motora”, “física”, a fim de enunciar seus objetos de estudo (DAOLIO,
2010). Foge ao escopo deste trabalho aprofundar em cada um destes objetos, portanto,
em consonância com o objetivo do ensaio de apresentar o conceito de cultura corporal,
bem como os encaminhamentos metodológicos subjacentes a ele para um ensino
culturalmente orientado da Educação Física na educação básica, vamos nos ater à esta
expressão.
Um recuo na história da Educação Física nos permite acompanhar a trajetória da
“cultura corporal”, em meio a continuidades e descontinuidades, até o presente
momento. Em 1985, o alemão Jürguen Dieckert, professor da Escola de Oldenburg e
visitante na Universidade de Santa Maria, propalou uma crítica à campanha “Esporte
para Todos” em que propunha acesso amplo e irrestrito ao esporte, além de sugerir uma
“cultura corporal” própria do povo brasileiro, definida por Dieckert como práticas
corporais construídas e reconstruídas no país, a exemplo da Capoeira, dos jogos
regionais e das danças nacionais (SOUZA JÚNIOR et al., 2011).
Sob a influência das ideias de Dieckert, dentre outras, um grupo de seis docentes
imbuídos na tarefa de apresentar uma nova possibilidade para o ensino da Educação
Física (re)configurou o conceito de cultura corporal e o (re)posicionou como objeto de
estudo na abordagem crítico-superadora, colocada em circulação no ano de 1992 com a
publicação da obra Metodologia do Ensino de Educação Física.
Este livro expõe e discute questões teórico-metodológicas da
Educação Física, tomando-a como matéria escolar que trata,
pedagogicamente, temas da cultura corporal, ou seja, os jogos, a
ginástica, as lutas, as acrobacias, a mímica, o esporte e outros. Este é o
conhecimento que constitui o conteúdo da Educação Física (SOARES
et al., 1992, p.10).

Inspirado no materialismo histórico-dialético, o conceito de cultura corporal


passou, então, a representar as danças, as lutas, os jogos e as brincadeiras, os esportes,
as ginásticas, como produções sócio-históricas e culturais. Concepção que pressupõe um
rompimento com a ideia de conteúdos estanques ou meios para o desenvolvimento de
habilidades motoras, em prol de uma compreensão alargada desses elementos da
cultura, que passam a ser tratados pedagogicamente como fenômenos (DAOLIO, 2010).
A despeito das críticas que são feitas, a obra escrita por Soares e colaboradores
(1992), ainda, é uma referência importante no campo, tendo sido indicação de leitura em
muitos concursos para docente da educação básica, orientação para a elaboração de
propostas curriculares nas escolas, nas redes municipais e nos cursos de formação de
professores, objeto de pesquisa em dissertações e teses, além de bibliografia em boa
parte das produções críticas da área. Entretanto, é possível que ela esteja perdendo força
e espaço devido à descontinuidade do grupo de autores, que inviabilizou o mesmo
esforço coletivo na avaliação, aperfeiçoamento e aprofundamento das ideias, ainda
incipientes, apresentadas em 92. Há indícios de que esta tarefa vem sendo assumida por
alguns pesquisadores, sobretudo, aqueles vinculados à Linha de Estudo e Pesquisa em
Educação Física, Esporte e Lazer da Faculdade de Educação da Universidade Federal da
Bahia (LEPEL/FE/UFBA). Mas, provavelmente, a forma de comunicar essa produção
não esteja alcançando seu principal destinatário, as professoras e os professores da
educação básica, ou estes não reconheçam o vínculo desta produção com a obra, quiçá
com a escola.
Para Neira e Gramorelli (2017) três fatores levaram o conceito de cultura
corporal da abordagem crítico-superadora ao esgotamento. O primeiro deles está
relacionado à ligação da Educação Física com a Antropologia, que contribuiu para a
compreensão e materialização desse conceito, mas, ao mesmo tempo, teria reduzido seu
caráter crítico de origem. Outro ponto, diz respeito ao completo esvaziamento desse
caráter crítico, promovido por parte das políticas curriculares da década de 1990, que,
ao adotar a cultura corporal em meio a um ecletismo conceitual e epistemológico nos
Parâmetros Curriculares Nacionais, neutralizou seu potencial político. E, por último, a
identificação dos limites desta teoria frente à novas demandas sociais, colocadas à
educação e à educação física, com a chegada do séc. XXI. Estes argumentos, aqui
brevemente apresentados, são utilizados pela dupla de autores supracitada para justificar
a desterritorialização da cultura corporal e a (re)edição deste conceito, alicerçada no
arcabouço pós-crítico, resultando na teorização denominada de currículo cultural da
Educação Física.
Mediante a exposição feita até aqui, é presumível que temos uma disputa pelo
conceito de cultura corporal. Por um lado, reivindicado por professores-pesquisadores
que acreditam na vitalidade, frescor e potência das ideias, e direcionam seus esforços,
estudos e produções a desenvolver os complexos fundamentos teóricos presentes na
obra de 1992.
Destacou-se a importância de se reconhecer e estudar os princípios
teóricos e metodológicos que fundamentaram a produção da obra,
notadamente as categorias atividade, significado e historicidade, posto
que elas seguem permitindo, na atualidade, identificar e formular
proposições sobre o que ensinar, como ensinar e por que ensinar em
Educação Física em uma perspectiva pedagógica crítica
(NASCIMENTO, 2022).

E outro grupo de professores-pesquisadores que, em contrapartida, entende os


desígnios da modernidade como insuficientes para abarcar a complexidade das
demandas impostas pela sociedade contemporânea. E que, organizados num coletivo
concentram esforços na (re)escrita de uma metodologia do ensino de Educação Física e
na (re)elaboração do conceito de cultura corporal, a partir de um ferramental teórico
pós-crítico.
Considerando este cenário, entendo que é relevante compreender não apenas o
deslocamento do conceito mas, também, os respectivos desdobramentos na atuação de
professoras e professores na educação básica. Trata-se de uma síntese elaborada a partir
da disciplina EDM 5201, que colocou em circulação tanto as referências quanto os
conceitos que consubstanciam as dimensões política, epistemológica e pedagógica do
currículo cultural, além das experiências pedagógicas desenvolvidas e relatadas por
docentes que afirmam colocar em ação esta perspectiva teórica.

Currículo cultural da Educação Física e cultura corporal

O Grupo de Pesquisas em Educação Física Escolar da Faculdade de Educação da


Universidade de São Paulo (GPEF/FEUSP) é constituído majoritariamente por
professoras e professores da educação básica que, junto com os professores Neira e
Nunes, labutam na produção de uma teoria que atenda as demandas do sujeito múltiplo,
complexo e multicultural que compõe a heterogeneidade da sala de aula contemporânea.
Uma parceria profícua que além de dar organicidade ao tripé ensino, pesquisa e
extensão, mobilizado em torno de uma proposta de currículo, também estreita o diálogo
e aproxima os campos acadêmico, científico e profissional da área.
O acúmulo de aproximadamente 19 anos de estudo e produção do GPEF se
materializa nas publicações em formato de livro, capítulo de livro, artigo, comunicação
em congresso, dissertação, tese, além de relato de experiência, que o grupo disponibiliza
em seu site institucional. O canal do grupo no youtube também disponibiliza material,
no formato de vídeo aulas. Ademais, o grupo tem oferecido cursos de extensão e
seminários que colocam em circulação essa produção e apresentam, aos docentes
interessados, a metodologia do ensino de Educação Física na perspectiva do currículo
cultural, reafirmando assim, o compromisso político da universidade com a sociedade.
Sobre a teoria em questão, é relevante salientar que não se trata de uma proposta
pronta. Alicerçada nas teorias pós-críticas, encontra-se em constante processo de
elaboração, sendo tensionada pela docência, pela pesquisa, pela crítica e aperfeiçoada
pelo grupo, sempre que necessário. É, portanto, objeto de reflexão, na educação básica,
na graduação e pós-graduação, fruto de engajamento e esforço coletivo em prol da
formação de sujeitos solidários na educação básica, que lutem em favor da justiça
social.
Em observação às questões postas pela atual conjuntura, marcada pelos
desdobramentos advindos do Neoliberalismo, como mostraram Dardot e Laval (2016),
dos efeitos da Globalização em Santos (2012) e da ideia de Necroestado desenvolvida
por Safatle (2020), define-se o contexto de emergência do currículo cultural da
Educação Física. Um cenário de extrema desigualdade, em que os governos eleitos não
representam os interesses dos seus eleitores, se curvam aos ditames dos organismos
internacionais e negam direitos fundamentais à parcela majoritária da população. O
povo, condenado à uma luta incessante pela garantia da sobrevivência, convive com a
ameaça permanente da miséria e da fome e encontra dificuldades para insurgir. O
resultado é a submissão a uma violência institucionalizada, manifesta nas mais variadas
formas e dimensões, que atingem, sobretudo, as minorias sociais historicamente
silenciadas.
Essas contingências históricas demandaram um reposicionamento do
significante “Cultura Corporal”, à luz do referencial pós-crítico. Consoante ao debate
curricular acumulado nesta perspectiva epistemológica, elementos foram deslocados
para que outros fossem incorporados ao discurso da Educação Física que, nas palavras
de Neira e Gramorelli (2017), começa a valorizar a cultura popular, o senso comum, em
detrimento do conhecimento científico, bem como as múltiplas identidades presentes na
sociedade. Passa-se a operar com uma outra noção de cultura, que ganha centralidade no
processo e se desdobra em um “conjunto de práticas discursivas e não discursivas
atribuídas às brincadeiras, danças, lutas, esportes e ginásticas e às pessoas que delas
participam” (NEIRA, 2022, s/p). Em suma, a concepção de cultura corporal, de
inspiração pós crítica, acena para a diversidade de significados em relação às práticas
corporais e às pessoas que delas participam.

Cultura corporal e o fazer pedagógico culturalmente orientado na Educação Física

O currículo culturalmente orientado está longe de ser comparado a uma


prescrição que deve ser materializada por docentes, a despeito do contexto da escola, do
grupo de estudantes que compõem a turma ou da ocorrência social das práticas
corporais. Metaforicamente falando, trata-se de uma caixa de ferramentas que oferece à
professora e ao professor um instrumental teórico para protagonizar a sua escrita-
currículo, como pretendemos evidenciar a seguir.
Entendo que é relevante iniciar, pontuando como o currículo cultural pensa a
relação teoria e prática nas aulas de Educação Física. Este esclarecimento se faz
necessário tendo em vista o equívoco, resultante da compreensão limitada e, por vezes,
mal intencionada, de pessoas que seguem afirmando que as perspectivas (pós)críticas
reduzem a intervenção pedagógica a um “falar” sobre a cultura corporal em detrimento
do “fazer”. Agem dessa forma, ao que tudo indica, com a intenção de desqualificá-las,
em razão da permanente disputa por concepções no campo. Obviamente que essa
interpretação traz, implícita, uma comparação com as perspectivas acríticas, que tinham
o “fazer” como única finalidade das aulas, levando a supor que a vara teria envergado
para o outro lado. Mas, felizmente, não é bem assim, e entre o oito e o oitenta há muitas
possibilidades de dosar o par teoria e prática, sem descaracterizar este componente
curricular.
Dito isso, destaco o excerto abaixo, que explica com muita objetividade o
encaminhamento pedagógico denominado de vivência.
"O currículo cultural da Educação Física não abre mão das vivências
das práticas corporais. Reafirma a importância de brincar a
brincadeira, dançar a dança, lutar a luta, praticar o esporte ou a
ginástica, tendo como ponto de partida a ocorrência social. Escapando
da armadilha da racionalização escolar, os momentos de vivência são
pura expressão da gestualidade a partir das referências que os
estudantes possuem. Seria contraditório um “ensinar a fazer”. O foco
reside muito mais no fazer como já fez ou como acha que deve fazer.
É esse brincar, dançar, lutar, praticar o esporte ou a ginástica que
potencializa a dimensão estética, o sentir na pele. Apesar dos contatos
com discursos variados sobre as práticas corporais – assistir a um
filme, ler um texto, ouvir uma explicação do professor ou do colega,
realizar uma visita ao local onde a manifestação acontece, entre tantas
outras possibilidades – no entender de Nietzsche, ousamos dizer,
também configurarem vivências, pois se constituem em portas de
entrada para novas e inusitadas formas de ver e sentir as brincadeiras,
danças, lutas, esportes ou ginásticas, que modificam, questionam ou
desestabilizam os primeiros olhares e as sensações anteriores; não são
tomadas como encaminhamentos pedagógicos aos quais se
denominam vivências. Na teoria curricular cultural da Educação
Física, as vivências dizem respeito exclusivamente à experimentação
da gestualidade para novas e inusitadas formas de ver, sentir e
experimentar as práticas corporais." (NUNES et al. 2022, p. 135-136).

Assim, entendemos com Nunes e colaboradores que a vivência é um momento


para a turma desfrutar livremente a prática corporal tematizada, sem pretensões,
interferência ou qualquer outro tipo de intencionalidade, por parte da professora ou do
professor que conduz o processo. Arriscaria afirmar que, a finalidade da vivência se
encerra nela mesma.
Outra questão que deve ser colocada em relevo é a forma que esta perspectiva
concebe os conhecimentos da cultura corporal postos em circulação nas aulas. Não
existe uma lista de conteúdos, à priori, pois, o currículo é artistado conforme a
singularidade dos encontros, entendido como tempo/espaço que reúne professoras,
professores, estudantes e as práticas corporais. A partir das questões que emergem
destes e nestes encontros são estabelecidos o fio condutor, e também os conteúdos das
intervenções, encaminhamento comprometido com a formação de sujeitos solidários,
especialmente, quando se trata de conhecimentos invisibilizados nos currículos pelas
relações de poder.
Apoiado principalmente nas elaborações de Derrida, o currículo cultural entende
a diferença como uma produção discursiva, um jogo de linguagem, e não como
oposição à identidade, como explicou Nunes (2016). Trata-se de uma disputa travada
entre significado e significante que caracteriza o signo como híbrido, incompleto,
provisório e que permite, a cada experiência pedagógica, conforme o grupo, o contexto,
a aula, as interações, uma redefinição, por exemplo, dos significantes das práticas
corporais. A intenção pedagógica que mobiliza o currículo cultural é a problematização
de como as formas de produção das diferenças acontecem, criando espaços e dando
visibilidade aos subalternizados e suas respectivas produções, num esforço de luta por
uma sociedade menos desigual e mais fraterna.
A expectativa é de que agenciados por princípios ético-políticos do currículo
cultural, professoras e professoras organizem suas experiências didáticas em sintonia
com o projeto político pedagógico da escola, reconhecendo e valorizando o patrimônio
cultural do entorno e atuando para que todos os grupos sociais tenham suas práticas
corporais representadas no currículo. Docentes afetados pelos princípios estão atentos à
necessidade de descolonizar a matriz curricular da Educação Física, compreendem que
cada estudante interage de forma particular com as experiências oportunizadas à turma,
preocupam-se em situar sócio-histórica e politicamente a prática corporal tematizada e
favorecem a enunciação discente nas aulas. Cabe ressaltar que alguns desses princípios
podem incidir mais sobre o tema enquanto outros mais sobre os conteúdos.
É relevante salientar que nem toda professora ou professor é agenciado por estes
princípios ético-políticos, tendo em vista a racionalidade em que foi formado e,
consequentemente as concepções de mundo, sociedade, sujeito, escola, Educação Física,
dentre outras, em que ela ou ele acredita. E quando são afetados isso pode ocorrer de
forma diversa, por um ou mais princípios durante a tematização.
No que tange aos encaminhamentos pedagógicos, além da vivência já
apresentada neste texto, são previstos no ensino culturalmente orientado também, o
mapeamento, a leitura das práticas corporais, a ressignificação, o aprofundamento, a
ampliação, o registro e a avaliação. Sem uma ordem pré-estabelecida entre eles ou um
momento determinado da tematização para realizar cada um. O mapeamento, por
exemplo, consiste no exercício constante de “ler” a comunidade em que a escola está
inserida, bem como os e as estudantes e suas famílias, que habitam e fazem desse local
um espaço singular, a fim de produzir os dados imprescindíveis que vão consubstanciar
a artistagem docente na Educação Física. Uma ação pedagógica que se materializa em
diálogo com os documentos e se retroalimenta dos registros e desdobramentos das aulas
no contexto mais amplo, fruto do olhar sensível dos sujeitos que participam deste
processo – uma cartografia.
A partir desses encaminhamentos pedagógicos devem ser pensadas as estratégias
didáticas que visam provocar o confronto dos significados, em relação às práticas
corporais e às pessoas que delas participam, partilhados pela turma e, também, pelos
vídeos, pelas pessoas convidadas e por aquilo que acontece nas saídas pedagógicas,
organizadas pela professora ou professor. Experiências que, possivelmente, geram
problematização das representações por parte do e da estudante, podendo levar à
desconstrução dos discursos preconceituosos, reducionistas e equivocados em benefício
de identidades mais solidárias.
Os encaminhamentos didático-metodológicos de ampliação e
aprofundamento são cruciais para que a tematização no currículo
cultural de Educação Física disponibilize aos estudantes uma melhor
chave de leitura da prática corporal e, com isso, promova mudanças
no modo de perceberem as brincadeiras, danças, lutas, esportes e
ginásticas, seus participantes, a si mesmos e a relação que
estabelecem com a cultura, a fim de que novas formas de ser, pensar,
fazer, dizer sejam produzidas (NEIRA; NUNES, 2022, p.147).

Comprometido com a formação de sujeitos mais solidários o currículo cultural


da Educação Física entende que alcançar este objetivo depende, em larga medida, da
justiça curricular. Logo, defende que os diversos povos e culturas sejam representados
na escola, tendo em vista que também contribuíram para a constituição da cultura
brasileira e têm direito a este reconhecimento. Nesta perspectiva, o currículo da
educação básica além de contemplar, precisa legitimar, outros tipos de conhecimento
para além dos científicos. Inserir a história dos “vencidos” no currículo é dar
visibilidade e voz aos subalternizados, o que em si já é importante, mas, se torna ainda
mais, quando as práticas pedagógicas potencializam essas vozes e possibilitam que
todos e todas as escutem.

Considerações Provisórias
Este texto é um primeiro exercício de síntese da disciplina cursada e enfatizou a
dimensão pedagógica do currículo cultural. Ele não teve a pretensão de expressar o
nível de conhecimento adquirido no curso, esforço que julgo prematuro de ser assumido
neste momento. Contudo, posso afirmar, com muita segurança, que há uma distância
significativa entre este ponto de chegada e aquele de onde parti no dia 19 de agosto,
ainda que eu não tenha conseguido demonstrar este avanço nesta produção.
O recorte selecionado aqui, contempla pontos que considero fundamentais em
uma teoria pedagógica para o ensino da Educação Física. Honestamente, ainda me sinto
representada pela perspectiva crítica, embora reconheça que ela, de fato, ainda apresenta
lacunas. Entretanto, isso não me impede de realizar movimentos como este de buscar
compreender outras propostas para, enfim, optar por aquela que convirja com minhas
concepções. O que em hipótese alguma deve ser confundido com um negacionismo
científico da minha parte.
Cursar a disciplina EDM 5201 foi uma rica experiência formativa, com
contribuições que extrapolaram as esferas acadêmica e profissional. O nível de
organização, compromisso e, obviamente, de seriedade com que os professores
conduziram o processo foi um aprendizado à parte. O zelo na seleção e produção do
material didático, a objetividade nas devolutivas das atividades e a leveza na condução
dos encontros síncronos, contribuíram sobremaneira para um rico processo de
aprendizagem. Na minha avaliação, todas as estratégias adotadas para possibilitar o
acesso, a permanência e a conclusão dos alunos na disciplina foram exitosas.
Do ponto de vista teórico, o currículo cultural da Educação Física tem suas
perspectivas política, epistemológica e pedagógica alicerçadas em um referencial denso
que demanda um esforço por parte do aprendente, mas, também a mediação de pessoas
que já tenham um certo acúmulo nessa discussão. Dessa forma, tanto a presença dos três
professores, quanto dos membros mais experientes do GPEF, foi absolutamente
necessária para que os iniciantes neste debate, matriculados na disciplina, não se
sentissem perdidos e desmotivados.
Naturalmente, nem tudo que foi lido, assistido e discutido no curso dessa
disciplina pôde ser totalmente compreendido. A questão da aprendizagem, por exemplo,
objeto da exposição realizada pelo prof. Rubens no último encontro, presumo que
demandará além de esforço, condições objetivas mais favoráveis que as atuais para que
eu possa me dedicar a compreendê-la. Considerando que, no meu entendimento, a
aprendizagem é central no processo de ensino da Educação Física, independente da
teoria curricular que o consubstancia, pretendo assim que possível retornar à plataforma
e revisitar os materiais disponibilizados, bem como a gravação das aulas.
Para encerrar essas considerações provisórias reitero uma frase dita em um dos
encontros. O currículo cultural da Educação Física não é melhor e nem pior que outras
teorias elaboradas no campo, ele é diferente. Usa uma lente que ainda não havia sido
utilizada e propõe encaminhamentos coerentes com essa nova forma de interpretar a
realidade, a escola e a Educação Física.

REFERÊNCIAS
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2010.

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