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TERRITORIOS DA DOCENCIA NO ENSINO SUPERIOR Maria Auxiliadora Fidelis Barboza Inés Assunciio de Castro Teixeira Maria do Perpétuo Socorro de Lima Costa (organizadoras) Scanned with CamScanner Copyright © da Editora CRV Ltda. Editor-chefe: Railson Moura Diagramagio e Capa: Editora CRV Imagem da Capa: Jodo Castitho Revisio: Os Autores DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAGAO NA PUBLICACAO (CIP) CATALOGAGAO NA FONTE ee eee eee T3Is Terrtérios da docéncia no ensino superior. / Maria A. F. Barboza, Inés A. de C. Teixein, Maria do P.S. de L. Costa, (organizadoras).~ Curitiba: CRV, 2017, 234. Bibliografia ISBN: 978-85-444-1646-4 DOL: 10.24824/978854441646.4 |. Docéncia universitiria 2. Desenvolvimento profissional 3 Ensino superior I. Barboza, Maia AE ong. Il Teixeira, Inés A. de C. org. Ill. Costa, Maria do PS. de Lima. org. LV Titulo V. Série. CDD 378.124 indice para catilogo sistematico 1. Ensino superior -docéncia 378 ESTA OBRA TAMBEM ENCONTRA-SE DISPONIVEL EM FORMATO DIGITAL. CONHEGA E BAIXE NOSSO APLICATIVO! 2017 Foi feito o depdsito legal cont. Lei 10.994 de 14/12/2004 Proibida a reprodugdo parcial ou total desta obra sem autorizaeho da Eaitora CRV Todos os direitos desta edigdo reservados pela: Editora CRV Tel: (41) 3039-6418 - E-mail: sac@editoracrv.com.br Conhega os noss0s langamentos: www.editoracrv.com.br Scanned with CamScanner SUMARIO APRESENTAGAO. PREFACIO.... Miguel G. Arroyo B Coup dy QUESTOES PARA A DOCENCIA UNIVERSITARIA CAPITULO 4 O[ENSINO SUPERIOR E SUAS RELAGOES COM A CULTURA... Lilian Anna Wachowicz TRABALHO DOCENTE E PROFISSIONALIDADE NA UNIVERSIDADE. Maria Isabel da Cunha CAPITULO 3 ARTICULAR E INTEGRAR PESQUISA, DOCENCIA E EXTENSAO: como? Manuela Esteves iB CAPITULO 4 DOCENCIA E EXTENSAO UNIVERSITARIA: pratica pedagégica para além da sala de aula...... Maria do Perpétuo Socorro de Lima Costa Jodo Valdir Alves de Souza Inés Assungdo de Castro Teixeira CAPITULO 5 ARTICULAGAO EDUCAGAO BASICA E SUPERIOR NA FORMACAO DE PROFESSORES. cine Samira Zaidan Diogo Alves de Faria Reis Alirton Carrio Scanned with CamScanner PARTE Il EXPERIENCIAS NA DOCENCIA UNIVERSITARIA CAPITULO 6 POR UMA EPISTEMOLOGIA DA APRENDIZAGEM DA DOCENCIA: dilogos sobre iniciago e formagao no PIBID.. Eiizeu Clementino de Souza Maria do Socorro da Costa e Almeida CAPITULO 7 0 DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE NA UNIVERSIDADE: relato do programa institucional "Sala Aberta’.... liana Santos da Conceigéo Célia Maria Fernandes Nunes 127 CAPITULO 8 DOCENCIA UNIVERSITARIA: uma experiéncla formativa lidica com professores iniciantes... Cristina Avila Lucia Gracia Ferra 143 CAPITULO 9 DENTRE NARRATIVAS E DISPOSITIVOS DE FORMAGAO DOCENTE: reflexdes a partir do fazer docente daina pos-graduacao.........157 Vantoir Roberto Brancher Valeska Fortes de Oliveira PARTE Ill ADOCENCIA UNIVERSITARIA SOB OUTROS OLHARES CAPITULO 10 DOCENCIA UNIVERSITARIA: uma experiéncia argentina... 175 ‘Ana Maria Sagrario Tello Scanned with CamScanner CAPITULO 11 “E TANTO TEMPO PARA VOCES E TANTO TEMPO PARA MIM": figuragdes do tempo na aula universitaria... Maria das Gragas Auxiliadora Fidelis Barboza Inés Assungao de Castro Teixeira 189 CAPITULO 12 O CINEMA NA DOCENCIA UNIVERSITARIA. José de Sousa Miguel Lopes oo201 CAPITULO 13 DOCENCIA UNIVERSITARIA: o cinema interroga a pratica pedagdgica...... Josaniel Vieira da Silva Haydenée Gomes Soares Manso 215 POSFACIO... 1225 Dalila Andrade Oliveira SOBRE OS AUTORES.. Scanned with CamScanner CAPITULO 2 TRABALHO DOCENTE E PROFISSIONALIDADE NA” UNIVERSIDADE 1 Maria Isabel da Cunha? As caracteristicas do trabalho docente tém sido amplamente discutidas a partir de distintos olhares e miltiplas posigées. Em diferentes estudos encontram-se andlises que vao da perspectiva sociolégica ao delineamento metodol6gico, passando por apropriagées da filosofia, da politica, da historia ~ NCNM. SDE ceparar anélises que enfocam o trabalho docente daquelas que centram a atengdo nas questdes do professor. O trabalho do professor € 0 professor em situagao de trabalho podem ser tomados como duas facetas de uma mesma temitica, pela intrincada trama tecida num jogo de influéncias. O trabalho, nesta perspectiva, é, a mesmo tempo, produto e produtor do pro- fessor, assim como este age igualmente nas definigdes de seu préprio trabalho. E bastante recente a ideia do trabalho do professor ancorada numa — perspectiva sociopolitica, parte integrante da estrutura de poder explicitada pela organizagdo da sociedade. Provavelmente estd construgao it iria ver da origem historica do magistério, ligada catequese, onde o valor maior estava na “vocagao”, entendida como um chamamento divino, uma legitimagdo por um dom intrinseco. Nesta perspec tiva 0 trabalho docente talvez nem merecesse este nome, em se entendendo 6 termo trabalho numa perspectiva de mais valia. Tratava-se de uma nobre atividade iluminadora das novas geragdes. O professor era visto como um guardiao dos bons costumes, alguém que assinalava o caminho do bem e da azo. Obviamente esta profecia nem sempre se concretizava uma vez que seu espaco de ago era tio contraditério como a sociedade que o albergava. Ao 3° Doutora em Educapéo. Professora dos Programas de Pbs-Graduagdo em Educagao da Universidade do, \ale do Rio dos Sinos (Unisinos)¢ da Universidade Federal de Peolas (UFPel) Versdo orginal publcada ‘em primeira méo no n, 01 da Revisla de Estudos Curiculares da Sociedade Portuguesa de Estudos CCurrcuiares, em fevereio de 2008, Scanned with CamScanner a contrario, na pritica, a agao do professor serviu, muitas vezes, para reforgar © poder dominante, mantendo as diferengas ¢ discriminagdes sociais, Mas esta nao era uma perspectiva muito visivel, mascarada pelo forte componente moralista e autoritario que acompanhava a profissao, pratica, porém, muito semelhante a anterior, apenas substituindo: 1 dogma religioso pela légica da ciéncia da natureza, Como a neutralidade & um valor para esta compreensdo de mundo, os professores reproduziram esta referéncia, toriando-se paladinos do conhecimento que imaginavam de- sinteressado, capazes de muitos sacrificios para ver iluminar os caminhos da liberdade, da democracia e de quase todas as bandeiras da ideologia liberal. Nessa diregio, c ; Em que pese os baixos saléris, a profissio de professor se aproximava das chamadas profiss6es liberais pela autonomiae pelo reconhecimento sociale, em alguns casos, substitu profissionas desta condigéo, quando nao dispo- niveis na comunidade. Provavelmente o sistema de cétedras na universidade Gla chamada— , se originam da Tiberdade de expressio que acompanhava sua concepso, perspectiva positivsta liberal. © professor estaria protegido ideologicamente Mais recentemente, o entendimento do magistério como semiprofissaio, he pte 0 rmagistério, embora sua tentativa de aproxi- ‘magdo das profissdes liberais, esta longe de garantir as condigdes e status que as caracterizam, especialmente pela proletarizacio de seus quadros, ocorridas ‘como consequéncia da universalizagao do ensino e da deslegitimagao da escola/universidade como depositiria do saber sistematizado, Oolhar sobre essa proletarizagdo toma possivel entender a perversidade do sistema social nas sua capacidade de exclusio, A medida que as camadas populares, por forga de pressao, alcangam o direito & escolarizagao univer- sal, tomam-se necessirios outros mecanismos diferenciadores de classe, que mantenham as diferengas. Se a escola € para todos, sua qualidade pode ser Scanned with CamScanner TERRITORIOS DA DOCENCIANO ENSINO SUPERIOR 43 discutivel e ela se diferenciaré nao pelo acesso, mas pelos mecanismos de ingresso em novas formas de conhecimento (linguas estrangeiras, informatica fe.) O trabalho de docente que era distinguido e prestigiado socialmente enquanto servia a pequenos contingentes dos segmentos médios e altos comeca ase lar pelos baixos indices de remuneragiio e pelos fortes mecanismos de controle sobre o seu exercicio (adogao obrigatéria de livros didaticos, programas decididos por agentes externos, obrigatoriedade de treinamentos generalizadores e compulsérios, aplicagao de avaliagées externas etc.). Como analisa Gimeno Sacristan (1998) os professores so depositdrios de idéias e linguagens, mas s6 as podem desenvolver ~ quando é possivel fazé-lo - de maneira subordinada (p. 172). He ‘agussantreernlatsioeliaetpavoseaunadacdltin Imente esta foi uma bandeira ~~ dos movimentos e de representagdo docente ligada, especialmente A defesa dos planos de carreira e da valorizagaio meritocratica para a progres- so funcional. Alcangado este patamar, a possibilidade de profissionalizagao passou a ser discutida no ambito da formagao e da recuperagao do status social, defendendo a necessidade de investir na qualidade da educagao. Ao ‘mesmo tempo houve uma crescente produgdo de pesquisas etno-sociolégicas sobre a condicao do professor e de seu trabalho, procurando a construgao de referenciais que favorecessem uma nova possibilidade de atuagao. Como é bastante usual, nfo demorou muito para que a légica liberal -mereadotpioa S€apropriasse deste disclis0 ¢consirulsse a contraproposta,_ O exemplo mais enfitico dessa investida é a chamada metodologia da Quali-_ dade Total que, usando processos de participagao, aplica principios de geréncia eimpresarial na manutengao/aumento da prc idade, fazendo com que O discurso da profissionalizacao seja presa facil de um ne0-tecnicismo. Appel (1986) tem nos alertado a respeito dizendo que esta Terortcpodte Cometuzir a um processo paulatino de tecnificago do ensino, favorecendo ainda mais a proletarizagio do magistério pela iriterferéncia extea, em nome da profis- sionalizagio. O mesmo pensa Fernandez Enguita (1991) quando alerta para, inclusive, a mudanga de nome dosiprofe Burbules e Desmore (1992) também dao importante confribuigao chamando aatengdo para o fato de que o créscente debate sobre o profissionalismo pode estar servindo para promover a burocratizagao e uma trivializagao do ensino. Entre nés, no Brasil, j4 é visivel o retomno de algumas alternativas ¢ linguagens Scanned with CamScanner que vao nesta diregio. Entre elas a ideia de competéncias profissionais oy ensino para a competéncia acabam restringidas aos aspectos técnicos, incly. sive pela dificuldade de operacionalizagao daquilo que foge a este ambito, Facil é perceber, entretanto, que niio basta a critica a estes movimentos, para tomar o trabalho docente algo de valor, na perspectiva de ganhar em, democracia, autonomia, efetividade e responsabilidade. O significativo aci. mulo de experiéncia e investigagao que temos sobre o tema parecem ainday insuficientes para construir indicadores com alguma seguranga sobre a base epistemolégica da profissio. Talvez porque, em que pese ser fundamental reconhecé-la neste sentido, ela extrapole esta dimensio. Volta-se hoje a procurar algo mais que, em nao sendo puramente intuitivo, nao descarte formas sensi. tivas de construgao da docéncia. E preci je A procura da profissionalidade - termo profissionalidade tem sido introduzido nas tltimas reflexdes sobre a formagao profissional ese traduz:na ideia de sera profissao em aco, _-em proceso, em movimento. Gimeno Sacristan fala da. 3, p. 54).\Talvez, ~ Esta concepeao, porém, contraria a histérica premissa construida para 0 trabalho do professor, materializada na ideia de que a fungdo docente resume-se em ensinar um corpo de conhecimentos estabelecidos ¢ legitimados pela a cién- cia e cultura, especialmente pelo valor intrinseco que os mesmos representam. Para esta perspectiva a erudigdio seria a qualidade mais reconhecida no docente Scanned with CamScanner TERRITORIOS DA DOCENCIANO ENSINO SUPERIOR 45 que representaria um depositério do saber cuja a palavra estaria pré-ungida de legitimagao. O elemento fundante do ensino, nesta perspectiva, ¢ a logica organizacional do conteiido a ser ensinado, suas partes e pré-requisitos, sem maiores preocupagdes com os sujeitos da aprendizagem eo contexto em que deveria acontecer. O conhecimento, tido como puro reflexo dos objetos, se organiza sem a mediagao dos sujeitos. Para tal profissionalidade, as caracte- risticas do trabalho docente, também advinham da légica e da neutralidade: seguranca, erudiedo, metodologia da demonstraglo, parimetros tinicos de avaliagao, disciplina silenciadora dos estudantes etc. Na perspectiva de encontrar alternativas que se oponham a esta condig, muitos educadores contemporaneos tém realizado estudos e feito suas pro- posigdes. Nossas pesquisas e nossas aulas ¢ nossas prateleiras cada vez mais refletem estas idei de Schén, Zeichner, Novoa, Ellio TOUX; O artista/artestio de Eisner e Pérez Gomes; Stenhause; 0 i Carte Kemmis; de Smyth e Clark ° do nosso Paulo Freire. Todas estas propostas tém o mérito de ser fruto de uma reflexo sistematizada e de um intenso compro- misso com a procura de altemnativas, Cada uma delas tém nuances proprias € caracteristicas especificas, mas contam com mais pontos convergentes do que divergentes. Outro elemento comum a estas teorias ¢ outras que as compl 6a valorizagao do sujeitos da educagdio. Nao de um sujeito imagindrio, me- tafisico, mas sim real, contextualizado, envolvido com sua existéncia, suas escolhas e suas responsabilidades, Em recente estudo Ferrer Cerverd (1997) apresentou algumas propostas que provém de geografias e contextos distintos e que apontam para esta direcao: G. Barret (Franga/Canada), M. Streibel (E.E.U.U.) Marta Souto (Argentit Lipman (E.E.U.U.) e K. Egan. Todas elas adotam o que chamam de uma dic tica situacional, que poderia ser entendida como uma didatica contextualizada. Scanned with CamScanner Nela, a situagdo é 0 cendrio global onde se produz a aprendizagem e que ni, admite cortes, fragmentagdes ou rupturas, mas que mantém a unidade dic de significado e semtido, de teoria e pratica (p. 263). O importante parece se pensar em situagdes em que o aluno atue como protagonista de sua propria formacao, como um principio. Neste caso a sequéncia de aprendizagem nic pode ter rigidez na ordem epistemolégica ou cronolégica, mas adaptar-se ordem dos acontecimentos que tem sentido espago-temporal para os educandos. Essas alternativas teéricas requerem uma consequente profissionalidade, que exige rupturas com o que se pés tradicionalmente para 0 professor e exige del ‘uma reflexdo rigorosa que pode colocar a profissao docente em outros patamares. Parece importante reconhecer que o professor, para construir a sua pro- fissionalidade, recorre a saberes da pratica ¢ da teoria. A pratica cada vez mais vem sendo valorizada como espago de construgdo de saberes, quer na formagao dos professores, quer na aprendizagem dos alunos. Entretanto a pratica que é fonte de sabedoria é a que torna a experiéncia ponto de reflexdo. Novamente tomamos emprestadas as palavras de Gimeno Sacristan (1998) quando diz: importa mais ter esquemas diversos ou conglomerados complexos dos mesmos que possuir esquemas demasiados trilhados como conseqiiéncia de realizar as mesmas agdes constantemente (p. 85).. \ Por outro lado é importante, também, encontrar novas formas de contra cenar com a teoria. O pensamento teérico, fruto de indimeras formulagies, sé adquire sentido quando o presente ¢ 0 passado sao estimulos para 0 didloge de significados entre 0 que 0 texto quer expressar ¢ 0 que 0 leitor percebe. A teoria, como contribuigao da pesquisa e da reflexio, & sempre potencialmente itil quando no seja entendida como fonte direta da pritica, como queria a _ perspectiva positivista, mas sim como possibilidade de iluminar o leitor, desde que este tenha possibilidade de fazer um jogo com a sua propria luz. A rele do entre a teoria acumulada é o aprendiz é atravessada pela cultura, como um elemento fundamental, nem sempre facilmente percebido pelo professor Para melhor explicitar a conceituagao de cultura como integrante dos esque- mas de formagao/informacao, uso aqui as palavras de Geertz (1996), quando diz Crendo como Max Weber que'@ HORiGH iinaRil Seti dovern rans) Scanned with CamScanner TERRITORIOS DA DOCENCIA NO ENSINO SUPERIOR a Nesta perspectiva, cultura extrapola a ideia de costumes ¢ tradigdes € incorpora os chamados mecanismos de controle, tais como planos, regras ¢ instrugdes que regem a conduta que, de alguma forma, desenha a pritica educativa como campo de lutas concorréncias e espagos de poder, tal como nos ensina Bourdieu e Bernstein, azido sua palavra para nos dizer que a mudanga é provocada pela luta histérica (1995, p. 9) e que ¢ a curiosidade frente a0 mundo que leva & curiosidade epistemoldgica. Talvez esteja af a raiz. de uma emergente profissionalidade docente que precisamos construit. O caso do ensino superior ' Asreflexées até aqui apresentadas, repetem, de algum modo, tendéncias. presentes no discurso pedagégico mais recente, Nao trazem em si especial novidade, e nem tém claro de alvorada, mas continuam atuais e necessarias pois a sua formulagao pode tomar possivel a transformagao do trabalho do- cente. Assumindo outros jeitos, em outras geografias, com germes em outros tempos, procura que se instale, entre nds, a expectativa da mudanga. Em que pese a urgéncia da reconfigurago da pratica educativa com 0 evidente esgotamento da alternativa tradicional de ensinar e aprender, as necessarias rupturas sao processos complexos que necessitam compromisso &tico-politico e reorganizagdo de saberes e conhecimentos do professor. Nesse espaco no ha lugar para o espontaneismo e nem para a acomodagao. E preciso Scanned with CamScanner recuperar no professor a dimensio do desejo, a firmeza de que seu trabalho vale a pena, que é preciso mudar. Cunha (1998) estudando a trajetoria de professores que vivenciaram processos de ruptura epistemo-metodologica com seus alunos, destaca que as, experiéncias de vida e 0 ambiente sociocultural sio dois componentes-chave ‘ha explicagio do desempenho dos docentes e que, de certa forma, eles vivem ‘0 que creem ou o que necessitam crer para sustentar a sua pritica cotidiana, ‘A mudanga, que pode ser vivida pelo professor, ¢ fruto de um processo que acontece como resultado de miltipls fatores. Guerrero (1996) tem chamado a atengdo para o fato de que ha uma sig- nificativa diferenga na formagio e na autonomia do professorado, diretamente dopendente do grau de ensino onde atua, Para ele Aceitando as afirmativas de Guerrero numa perspectiva ampla, importa _negyassim como ha de fato o contingente que produz a ciéneia e cultiva ae io, também ha muitos docentes que se aproximam mais do perfil dos professores secundirios, isto é, os que interagem na interpretagdo do conhecimento jé produzido, Além disso, numa andlise critica das condigdes do ensino universitério, é possivel afirmar que, para responder aos desafios E absolutamente evidente que o acesso & informagio cada vez mais prescinde da insttugdo escolarfuniversitria para sua circulagao, Manter este paradigma ¢ decretar 4 extingdo desta profisslo que, facilmente e com vantagem, se vé substituida pelos meios de comunicagio e midi. | = Scanned with CamScanner TERRITORIOS DA DOCENCIA NO ENSINO SUPERIOR 49 Venho defendendo que € nesta direcao que precisamos reconstruir a fungao docente, aceitando 0 desafio de uma nova perspectiva para a profissionalizagao. Esta posigao coincide com as teorias ja citadas neste texto que procuram resignificar o saber_ docente, tanto no campo dos conhecimentos como no campo da subjetividade. com e for analisada a carreira docente, facilmente pode-se detectaro privilégio Os degraus e niveis so galgados pelos estigios de pos-graduagao e é dado um privilégio significativo as atividades de Hesquisa sobre as de ensino e extensio ghagubligaeieasiaeemimeeRen | graduagdo, A carreira do professor é um caminho individual, muitas vezes até concorrencial, que favorece o isolamento e a solidao. Ora, qualquer proposta curricular que pretenda articulago em tomo de um projeto de curso, exige a condigao do trabalho coletivo. Requer um pro fessor que dialogue com seus pares, que planeje em conjunto, que exponha as suas condigdes de ensino, discuta a aprendizagem dos alunos e a sua propria formagdo. Transgrida as fronteiras de sua disciplina, interprete a cultura € reconhesa o contexto em que se dé seu ensino e onde sua produgao acontece, “Se estas so algumas condigdes basicas para a construgao de uma nova profissionalidade docente, rupturante com a ordem tradicional, vale, entéo, ‘perguntar: com que incentivo? Com que reconhecimento? ae sca Para aumentar o indice de preocupago, atualmente, além do peso da carreira docente, hé 0 impacto dos programas avaliadores. Estes, que pode- riam constituir-se em forgas de equilibrio e transgressao da logica dominante, tomaram-se poderosas pressdes ratificadoras do que jé existe, até ampliando ‘oempenho regulador do espaco universitirio. Scanned with CamScanner Universidade para qué? Para quem? Qual sua finalidade? O pardmetro de «qualndade no se delineou com clareza, favorecendo a tendéncia tradicional, tingid pela forte onda de privilegio do mercado, propria dos tempos atuais, 0 que se percebe, entio, i 0 que poderia ser uma medida festejada, se se tse de produ ma rapt paradigmstica emancipatéra, vem trazer ins amaras e, em vez de avangos, representa um significativo retrocesso, | Percebe-se uma nova perceppo de profissionalidade, presidida pela raciona. Jidade tenica, baseada na produtividade e competicao. Em que pese o fato demaniestagdes de resstncia, tanto individuais como grupais, estas forgas | tém sido suficientes para deter a racionalidade dominante, (que ser professor de sucesso para os pardmetros avaliativos? Que mento, habilidades, valores, compromissos se requer deste profes- ? Qual a sua principal tare para ser bem avaliado? Que légica preside 4 sua formagio? Que racionalidade esté conformando o seu fazer? Como ‘le mesmo esté construindo seu imaginério docente? Como configura o seu lho académico? Estas nio sio questdes discutidas e suficientes explicitadas da mesma fonma como nio 060 projto poitco-pedagégico para a universidade bra- silera, A teiaem que nos vimos envolvidos leva de roldao toda a reflexo ‘ica e valorativa, fazendo valer os interesses da produtividade, fortemente marcados pel intersse de mercado, De cidadios passamos a ser vistos como consumidores ¢ para isto estamos sendo conformados, inclusive na 0ssa ee Lao hd TT esforgo na | segutennnansin SS COS de) Sacristan, Novoa, | vem se somando aos estudos nacionais de Ludke, André, Penin, Fa- tos outros autores es com | uma julora de uma profisionalidade docente | a, dis da aconalidade técnica. Noespugo das Faculdades de Educagio entdo, a contradigdo ¢ evidente. Enguanto estamos envolvidos com nossas pesquisas e tentando projetos de fonmagio que contribuam para a quebra da racionalidade técnica, nos submetemos, sob a batuta dos programas avaliadores, a ldgica desta mesma i Scanned with CamScanner TERRITORIOS DA DOCENCIA NO ENSINO SUPERIOR 51 racionalidade, E 0 mais grave ¢ o fato deste processo ser subliminar, instalando- -se nas consciéncias e definindo estruturas de pensamento e aga, reforgadas pelas competitivas estruturas de poder. Com certeza muito mais fortes do que as teorias e experiéncias topicas que podemos construir. } fi i oo ang censfingssanhecimenta, * arece importante investigar e aprofundar estudos sobre a contraditéria situagao que estamos vivendo, enquanto professores universitdrios, e ajudar a explicitagao das demandas dos processos conformadores da professoralidade ¢ do trabalho no ensino superior. A constatacao das forcas que contradizem as utopias que alimentamos nao pode ser barreira para o empenho de mudanga. Apenas nos ajudam a perder a ingenuidade que entende que o trabalho docente pode ser definido apenas no ambito das teorias pedagégicas. A compreensdo da macroestrutura de poder, definidora das politicas publicas para o pais deve, acima de tudo, nos instrumentalizar para a resisténcia e para preencher os espagos de contradigao. Esta esté a exigir muito mais do que a competéncia instrumental, pois requer ‘© compromisso e a vontade, Sem pieguices, 0 que nos estimula ¢ 0 semblante de nossos alunos, vidos por um mundo melhor, provocando a nossa reagdo, desinstalando o nosso ceticismo, precisando acreditar no poder de sua geragdo, querendo ser parceiros de uma nova ordem social. Serd esta a esperanca de uma nova ética ‘que possa presidir o trabalho docente na universidade? OW Scanned with CamScanner REFERENCIAS _ ANDRE, Marl, Etnografia da pritiea escolar. Campinas, SP: Papirus, 1995, . 4 APPLE, Michael. “Trabajo, ensefanza y diseriminacion sexual”. In; POPKEWITZ, T, (ed). 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