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Série C GEOGRAFIA PAU CE PiU Poe GLa Traducdo, notas e prefacio pelo De. Fernanpes Marrixs) Antigo assistente da Faculdade de Letras de Coimbra ‘RUA DA EMENDA, 100-22 Digitalizado com CarnScanner ADVERTENCIA P. Vidal de La Blache, morto siibitamente em 5 de Abril ge 1918—quando em pleno vigor intelectual —, nto pide infeliz- mente dar os ultimos retoques na obra que apresentamos ao tiblico. ‘Apesar disso, reconheceu-se que seria realmente lamentivel negar fos gedgrafos 0 proveito dos estorgos que, durante longos anos, foram dispendidos pelo autor no intuito de esclarecer € precisar os principios da Geografia humana. Nés conheciamos o plano do livro, nio sé por conversas com o autor, mas também por uma nota que, desde 1905, estava em poder do editor Max Leclerc. Ora, as paginas manuscritas que foram encontra- das nio representam a sua realizagao total. A primeira parte, cons grade 4 distribuigio dos homens, era a mais acabada e até alguns dos deus capitulos haviam sido jd publicados nos Annales de Geographic (!). A segunda e terceira partes, inteiramente manuscritas, no consta- wee parte dois ou trés capitulos redigidos em definitivo, senio de Sderuveis dossiers de notas e de rascunhos. Para aproveitar con- Venientemente esses dossiers, foi necessirio um paciente trabalho: aprosimaram-se os fragments que pareciam destinados a segui climinaram-se as paginas repetidas, confrontaram-se por vezes redac- bes diferentes sobre um mesmo assunto tratado com anos de inter- Yulo—utilizando sempre como guia as indicagdes sumirias que, (1) La répartition des hommes sur le globe (premier articl XXVI, 1417, pags. 81-93, constitui o Capitulo 17 Vista de conjunto tion des hommes sur te globe (second article), em, yrigs. BML-24, ¢ 0 Cap tulo Il: Furmagéo de densidade. — Les grandes agglomerations humaines ( ui Capituts WL: ter article), Afrique eb Avie, Mem, pags. ALAR, cous! As grandes aglomeragoes humanas: Afiica ¢ Asia — Ler grandes agglomera~ diong humnaines (deuniemne aiticte), Europe, Remargucs Generalen Ad. Gy NXVL, 91s, pars 92-401, forma o Capitulo IVs A aglomeraydo cucopsia — Les grandes agglomerations bumaues (Wroisteme asuicte), Wem, pagr TALST, comstivui o Capitulo Ve KegiGes meditertanicas. Digitalizado com CarnScanner 20 MARCHA DA HUMANIDADE sobre o encadeamento das ideias, estavam apostas no verso ou no canto de uma pagina. Abstivemo-nos rigorosamente de qualquer arranjo que pudesse destoar do estilo td pessoal do autor; limitémo- -nos a escolher entre as variantes, por vezes emaranhadas de maneira desconcertante, ea corrigir as imperfeigdes evidentes que o préprio autor haveria emendado quando passasse a limpo 0 manuscrito. No decorrer deste delicado trabalho, sentimo-nos amparados pelo prazer de ver desabrochar, nas paginas manuscritas de mais dificil destringa, as ideias mais originais e fecundas. Se nao estamos iludi- dos, a maior parte dos capitulos apresenta-se como um todo homo- géneo; e certo é também que muito poucos sido os incompletos. Todavia, falta, pelo menos, um capitulo sobre a aglomeragio americana, na primeira parte; e, na terceira, o autor teria certamente tratado com-maior desenvolvimento das cidades. Sobre estas nao foi possivel ordenar seniio algumas paginas, que constituem uma espécie de introdugio ou de sumério. Essas paginas sio dadas como frag: mentos no fim da obra, bem como o desenvolvimento de outros assuntos, cujo lugar, apesar de todas as buscas, nfo houve possibi- lidade de encontrar nos capitulos quase completos. Tal como nos abstivemos de qualquer arranjo no texto, assim renuncidmos também a executar ou terminar as figuras, assaz nume- rosas, ja que o autor nao fizera mais do que indicar a ideia ou comegar a preparagio. Por isso, sem divida, a ilustracéo ¢ mais pobre do que a-teria querido Vidal de La Blache, mas, ainda assim, pudemos Teproduzir os quatro grandes planisférios que ele proprio avia estudado até aos ultimos pormenores (!). , Em suma, do essencial nada falta. Reconhece-se a obra do Mestre, rica de vida e de pensamento. O que nos pareceu mais original nestas paginas, quando com- paradas as de maior reputagio que tenham sido publicadas sobre Antropogeografia, ou Geografia humana, foi menos a espantosa eru- digao, a enorme quantidade de exemplos arrancados aos paises mais variados, do que a maneira pela qual o ponto de vista histérico penetra, domina, inspira o exame, a classificagio, a explicagao de todos os factos. Nao cremos que ninguém haja mostrado no mesmo grau a preocupacio de encarar os fenémenos de Geografia humana actuais como estadios de uma longa evolucdo. Vidal de La Blache procura vé-los, simultneamente, no passado ¢ no futuro. E o seu olhar mergulha até ao passado mais longinquo; ¢ nio foi sé & His- ‘0 de discordancia foi aumentada com (2) Nesta edigdo, portuguese, embora correndo oi cam o plang de ilustragio do autor, documentagio graf mais alguns mapas, varios desenhios ¢ fotografias, Nao teriam sido esses os documentos escalhidos por La Blache? Ainda assim atigura-se-me conveniente dé-los & estampa, pois sublinham passagens do texto, completando-as pela imagem, permitem yer paisagens ¢ {actos evocados pelo autor. (N. T:) Digtalizado com CamScanner PRINCIPIOS DE GBOGRAFIA HUMANA 21 téria propriamente dita que ele constantemente recorreu, mas também 4 Préhistéria. Debruga-se atentamente sobre esses povos primitivos que so como testemunhos de tempos hii muito acabados para nds, € nessas civilizagdes que nos parecem radimentares, La Blache o& tudo 0 que nelas representa progresso em relagio As primeiras idades da humanidade. O proprio homem nio deixa de ser considerado como 0 termo de uma evolugiio de certas espécies, libertado, a custa de esforcos prolongados, da sua ganga de animalidade. A mancira de explicar, de comentar os fendmenos mais correntes que formam a trama da nossa vida: habitagio e coabitagio, meios de alimen- tagio, de transporte, de troca, da a impressio de que um espirito conseguiu colocar-se, de qualquer modo, fora da hunvanidede para a julgar e apreciar-lhe as obras. Estas elevadas preocupagées histéricas nao impediram que 0 onto de vista geografico dominasse o estudo de todos os problemas, Na verdade, € sempre a localizacio dos tipos e a verificagio das relagdes locais que as andlises nos conduzem. Os gedgrafos, ¢ com estes os: historiadores e os socidlogos, lerdo e releréo com proveito estas paginas, as quats Vidal de La Blache deu o melhor do seu pensamento, fruto de uma vida inteira de estudos e meditagdes, que se concentraram cada vez mais na Geo- grafia humana. EmmanueL pe Martonye Outubro — 1921. Digitalizado com CarnScanner ease aates® ~e INTRODUGAO Signifieado ¢ objecto da Geografia Humana I—Exame critico da concep¢ao de Geografia Humana O velho tronco da Geografia brotaram recentemente alguns ramos; um desses foi a Geografia humana. Quanto a esta, se_niio passasse de mais um titulo, nada seria menos novo. pois © elemento humano ¢ essencial em toda a Geograiia. D ~ homem interessa-se principalmente pelo seu semelhante, e, des. abriu a era das peregrinagdes e das viagen e facto, 0 je que se © especticulo das diferensas de organizagio social, associado 4 diversidade dos lugares, snunca deixou de despertar a atengio. O que Ulisses reteve viagens foi +o conhecimento das cidades e dos costumes d homens»; € para a maioria dos autores antigos, a deve os ‘primeiros pergaminhos, a ideia de regiio € inseps ideia dos seus habitantes ; 0 exotismo tanto se traduz pel de nutrigio e aspecto fisico dos indigenas, como pelos desertos ou rios que formam o cenirio. ‘A Geogral que no se preocupe com o elemento humano alids, tal idei ter germinado no espirito de alguns especialistas intoleran ‘raz uma nova concepgio das relagdes entre a Terra ¢ o concepsao sugerida por um conhecimento mais sintético fisicas que regem a nossa esfera e das relaydes entee os se que a povoam. 2” @ expressiio de um desenvolvimento de ideias © nik tado directo, & por assim dizer material, da extensio dos mentos ¢ dos conhecimentos geogrificos. das suas de muitos 03 quais a Geogratia ardvel da los. meios montes, ia humana nao se opoe, portanto, a uma Geografia n 1 50 pode ates. Mas Homem, das leis ees vivos Oo resul- descabri Digitalizado com CarScanner 24 MARCHA oh vinavs Nio seria surpreendente que a grande luz projectada no sécul XVI sobre a terra desse lugar a uma verdadeira Geografia humana, EE, todavia, nfo aconteceu assim. Sem diivida, os costumes dos hake tantes mereceram especial relevo nas narrativas ¢ compilagdes legadas pelos quinhentistas; porém, quando nao ¢ o maravilhoso, é 0 anedé. tico que nelas predomina—e por isso, ¢ apesar dos diversos tipos de sociedades que nos apresentam, nao se vislumbra qualquer prin- cipio de classificagio geogrifica. E os que, senhores destes dados, tentam tragar de novo quadros ou espellios do mundo, nao se mos- tram de modo nenhum superiores a Estrabio. Dai, Bernardo Va- rerius, quando em 1650 escreve a Geografia geral('), a obra mais notivel que apareceu antes de Ritter, (2) utilizar com uma condescen- déncia quase desdenhosa os factos humanos que devem figurar na descrigio das regides. Quer dizer: dois séculos de descobrimentos acumularam nogoes sobre os povos mais diversos, sem que surgisse nada de satisfatério e preciso para um espirito preocupado com a classificagao cientifica! N&o obstante, havia muito tempo jad que o pensamento cien- tifico se precupava com as! influéncias do meio fisico e respectiva acco sobre as sociedades humanas. Na verdade, seria menosprezar toda uma linhagem de pensadores—que vai desde os primeiros fildsofos gregos a Tucidides, Aristételes, Hipécrates e Eratdstenes — nado ter em conta os pontos de vista engenhosos, e algumas vezes profundos, que estio disseminados nas suas obras(8). Nem pode- (), Gragas a esta obra, Varenius & justamente considerado como 0 fundador da Geografia moderna. (N. T) : (2) Karl Ritter (1779-1859) escreveu a obra Die Erdkunde im Verhilinis qur Natur und Geschichte des Menschen oder allgemeine und vergleichende Erd- hunde als sickere Grundlage des Studiums und Unterriclts in phy sikalischen und historichen Wissenschaften, cujo primeiro volume apareceu em 1817, E’ um tra- balho extenso (19 tomos) 'no qual—embora sem abandonar os problemas da Geogratia fisica, antes pelo contrério—o autor mostra contudo mais pendor, natural consequéncia da sua formagio historica ¢ filosdfica, para o estudo das relagdes entre'a Terra eo Homeme da actuagdo das sociedades humants 0 espago € no tempo, isto é, neste ou naquele lugar e no curso da Llistoria. bora’ tenba exagerado, forgando conclusdes, e haja insinuado o determinismo geografico, nem por isso devemos deixar de saudar Ritter, como um daqueles ue, no dizer de Brunhes, ajudaram a definir metodo da investigayito Reo ica. (N. T, [ rh Hipocrates no tratado Dos Ares, Aguas ¢ Lugares abordou 0 pro- blema das conexdes entre o clima e as caracteristicas somat psigquicas dos indigenus. E. também Aristételes, na Politica, livros IV e Vil — como jt 0 fizera Plato no livro V das Leis —alude as relagées entre a Terra e Homem, me ainda, was influéncias do meio fisico sobre u vida politica dos homens» (Lucien Febvre)—e tanto, importa dizer, ja ndo & propriamente do dominio da Ge rafia, pois esta &, © 90, «a ciéncia dos lugares ¢ ndo dos homens (V, de Lat Blache). Contudo, ‘¢ isso devemos sublinhi-lo, o problema estava, realment ost pelos Gregos: apenas o ponto de vista'ndo era exactamente 0 geogt ico. (N; T') Digitalizado com CarnScanner : PRINCIPIOS DE GHOGRAFIA HUMANA 25 riamos, alids, compreender que, nessas escolas {i nas costas da Idnia, o especticulo vari: exterior nio tivesse despertado um éco consequente duma justa visio . da marcha das sociedades humanas. Nessas escolas havia pensa- E dores que, tal como Heraclito— verdadeiro precursor de Bacon = f julgaram ser preferivel que o homem, em vez de buscar a verdade na contemplagiio do seu microcosmos, deveria alargar os seus hori- zontes € procurar luzes no mundo maior de que faz parte (1). : Primeiro, tentaram encontrar no meio fisico a explicacaio do gue mais os impressionava no temperamento dos habitantes. Depois, } & medida que as observagées sobre a marcha dos acontecimentos ¢ z das sociedades se acumularam no tempo eno espago, compreendeu-se melhor qual a parte que devia atribuir-se as causas geogrificas. . Ass consideragées de Tucidides sobre a Grécia arcaica, as de Estrabao acerca da posigio da Itilia, so consequéncia das mesmas exigen- cias de espirito que ditaram certos capitulos do Fsprit des Lois (2) ou da Histéria da Civilizacao em Inglaterra, de Thomas Buckle. Ritter inspira-se também nestas ideias no seu Erdkund, mas félo mais como gedgrafo. Se, por uns restos de prevengio histérica, ‘ atribui uma acgdo especial a cada grande individualidade continental, a interpretagiéo da natureza continua a ser para Ritter o tema Be prumordial: Pelo contrario, 4 maioria dos historiadores e dos socié- % logos a Geografia nao interessa senao a titulo consultivo. Parte-se do homem para chegar ao homem; representa-se a Terra como «a cena em que se desenrola a actividade do homem», sem reflectir que a propria cena tem vida. O problema consiste em dosear as influéncias sofridas pelo homem, em aceitar que um certo género de determinismo actuou no decurso dos acontecimentos da Histéria. Assuntos sem divida sérios e interessantes, mas que para serem resolvidos exigem um conhecimento simultineamente geral e profundo do mundo ter- restre, conhecimento que nio foi possivel obter seniio recentemente. loséficas nascidas ado e grandioso do mundo II—O principio da unidade terrestre e a nocéo de meio A ideia que domina todo o progresso da Geografia é a da unidade terrestre. A concepgiio da Terra como um todo, cujas partes estio coordenadas € no qual os fendmenos se encadeiam ¢ obedecem as leis gerais de que derivam os casos particulares, desde a anti- guidade que entrara na ciéncia, por intermédio da Astronomia. Con- De augmentis seientiarum, 1, § 43. a . @ Pac i ott de Moneesquieu——na qual um dletetminismo rigo- roso & joltcls do problema das influéncias do meio fisico. (N. Digtalizado com CarnScanner MARCHA DA HUMANITDADE forme a expressiio de Ptolemen, a Googe fia éaa ciéncia sublime que 1@ no ee a imagem da ‘Terray, Vod via, a concepgiio da unidade terrestre ficou por longo tempo confinada no dominio da Matemitica, ¢ sd nos nossos dias ganharia importancia nos outros capitulos da Geografia, gragas, sobretudo, ao conhecimento da circulagao atmos- ferica que rege as leis do clima, Cada vez mais se reforgou a nogio de factos gerais ligados ao organismo terrestre e, com justificada razio, F. Ratzel insiste nesta concepgiio, que the serviu de pedra angular na sua Antropogeografia(!). Os factos de Geografia humana ligam-se a um conjunto terrestre © apenas por este sao explicdveis; relacionam-se com o meio que, em cada lugar da Terra, resulta da combinacio das condigées fisicas. Foi sobretudo a Geografia botanica que contribuiu para que a nogio de meio fosse posta em foco, e esta luz projectou-se sobre toda a Geografia dos seres vivos Alexandre de Humboldt (2) assinalara, com ‘a perspicicia habitual, a importincia da fisionomia da vegetacio aracteristicas de uma paisagem; e quando, em 1836, H. Berghaus, irado por aquele, publicou a primeira edigio do seu Atlas Fistco (3), 0 clima ¢ a vegetagdo la apareciam nitidamente relacionados. Esta visio fecunda_desbravava o caminho a uma nova série de investiga- goes. Com efeito, no se tratava de uma classiticagdo segundo as espécies, mas da vista de conjunto de todo o povoamento vegetal de uma regifo, de maneira a vincar as caracteristicas pelas quais se exprime a influéncia das condigdes ambientes: solo, temperatura, humidade. A fisionomia da vegetagio & tanto a marca mais expressiva de uma regio, como a sua auséncia é um dos factos que mais nos ampressiona. Quando tentamos evocar uma Paisagem, ja esftumada nas nossus recordagdes, nfio € a imagem de uma planta em particular, de ums palmeira ou de uma oliveira, que se nos apresenta na memria; € antes 0 Conjunto dos diversos vegetais que revestem 0 solo, que the sublinham as ondulagdes € os contornos, Imprimindo-lhe pelo desenho des formas, cores, espagamentos ou massas, um cardcter comum de individualidade. A estepe, a savana, a selva, a paisagem de parque, # floresta-clareira, a floresta-galeria — siio expressdes colectivas que fesumem para nos este conjunto. Nao se trata de uma imples mpressao pitoresca, mas de uma fisionomia determinada pelas pro- prias fungoes das plantas ¢ pelas necessidades fisiolgicas da sua existéncia 4) Friedrich Rateel, Antropogéographie, 24 Jo sAuche Bedansicht Sattgarl, tele oot aPhie, 2 parte, Inteoduydo, Die Hole ’ @) Alexandre de Humboldt (1769-1859 ; alembu, auiur de Cosnray 9), famoso naturalista ¢ viajante Wy Cormuy © un dos fundadores, « par com Ritter, da Geogratia snoderna (NT) (0 Be edigio, courigids © modificada, em 1993, Digitalizado com CamScanner seapuny—g "equriuom mpy 9p opdedo4—L “voqurstoyspou oySeiaSa, —9 “ops9s0cr—§ “odaysq—b-eavang —E ‘epesodiaay wysai0[4—e “TeHFOFENbS NEILL — (sepy ou epeoyqnd ‘ayvig. v auuojuos ‘ried wy) jour op sagsipuos sy —7 “Sur Digtalizado com CamScanner 28 MARCHA DA HUMANIDADE Isso & 0 que as observagé experimen: grafia botdnica demonstraram pela andlise ¢ pela compar: mente desde que essas investigagdes puderam estender-se regioes tropicais ¢ temperadas e a todas as altitudes. A concorréncia dag plantas entre si ¢ tao activa que sé as melhores adaptadas a0 meio is da Geo. ‘agiio, mor. — As condiges do meio Il —Tipos de clima. (Segundo de Martone, modificado e simplificado.) equator mid superior em cata més a 25° Cui ‘ mae distribuida por todos os meses) Yemp. iméd. domes Pluviosidade anuat: om recra, Stb.equatorlal (éemp. mets ansests cores roi liairumonts infariors Piuciosstade ima tropical (toomp. mid, Unter tie om? an cates a Got thea 7 shaved peritss, ysa se manos tongon, danse 0" che eddias conforme se trate ite regimes descrticos pase 196 allo: 20%, no Sdara ar geting, com 32°,} names mats qucntcre ate” fora’ 1285, mo" Turguedtig tom 188.3 na. ince aie quanto ea mess fa eevee medi Clamp nd Be mea mais. quente, 20 0 47%. Precipitapt do" (tempa mcd. unisal’ cerca dete Ca 4 a 6 wieses det Fracipiorhs: so a tou tm: thuvas fotos os mares). 4. Clits te doa, ga @ mason de temp madd, negli BA Clsm polar (temp: mad, aakat Posttiva, Pbuthostdade bape js guentes ‘auual inferior a 35 ecipit werante ot quant Yoice, f omatl ou Pte 12a 189 C2 tampa mis twats goa 409 toms vendo se in tome: ira fori med mad funioeitady: do af stone sferiara'0® Cai df mesa come ir a5 tome) ambiente conseguem manter-se—e, ainda assim, so em equilibrio instivel. A adaptasao exprime-se de diversas maneiras: pelo porte, clas dimensies € posigio das folhas, pelo revestimento piloso, ibras dos tecidos e desenvolvimento das raizes, etc, Nao so cada planta prove, pelos seus proprios meios, a satistagdo das suas tunydes Digitalizado com CarnScanner PRINCIPIOS DR GROGRAFIA HUMANA 29 vitais, como entre vegetais diferentes ge fo cada am he tira Proveito dos outros ee oe especies que coabitem, quaisquer que sejam mesmo sd gas exteriores dos processos de adaptagio de que se se ha todavia _em toda esta populagio vegetal tn shetigth tenner niio “a um olhar exercitado, Z So al ¢ a ligio da eeolo, Geografia botinica: Ecologia, TMAM Associagdes tais que Quaisquer que sejam as lay que devemos As investigagces da quer dizer, segundo as proprias pala- —As condigées do meio. Ill — Pluviosidade anual. (Segundo S. Gua Notar como as regises fite-geogriticas (Fig. 1) ve adaptam As diferentes consinses Plaviveidade ais vras do autor deste nome(!), a cigncia que estuda «as relages miutuas de todos os organismos que vivem num Unico ¢ mesmo lugary € a sua adaptagao ao meio que os rodeiay. Ora, € evidente que ¢ relagies nio abrangem somente as plantas. Sem diivida, os animais dutadus de Jocomosao € o homem com a sua inteligencia estio melhor apetrechados para reagir contra os meios ambientes. Mas s¢ re timos em tudo aquilo que implica esta palavra meio ou exverunnent, segundo a expresso inglesa, se cogitumos nos five ignorados de que () Haeckel, Histoire de la eréation des dares organisds, wasugio francesa, Paris, Reinw ald, 1864, pag. S51, Digitalizado com CarnScanner E donde lhe vém eles ? Serao assim tao numerosos pal 30 MARCHA DA HUMANIDADE é tecida a teia que nos envolve, qual o organismo vivo capaz de subtrair-se-lhe? Em suma, 0 que ressalta nitidamente destas investigagoes ¢ uma ideia essencialmente geografica: a de um meio compésito, dotado de uma poténcia tal que pode agrupar e manter juntamente seres hete- rogéneos em coabitagio ¢ correlacdo reciproca. Esta nogio parece ser a propria lei que rege # Geografia dos seres vivos. Cada regido representa um dominio, onde se reuniram artificialmente seres dis- pares, que ai se adaptaram a uma vida em comur. Se consideramos os elementos zooldgicos que entram na composic¢éo de uma fauna regional, verifica-se que cla é das ‘mais heterogéneas; compée-se de Fenresentantes das mais diversas espécies, que circunstincias, sempre Gificeis de precisar, mas ligadas & concorréncia vital, trouxeram para essa regido. Todavia, acomodaram-se ai; e se as relages que mantém entre si sao mais ou menos hostis, sfio também tais que as suas existén- Gas, no entanto, parecem solidarias. As proprias ilhas, desde que tenkam certa extensio, ndo fazem excepeao Aquela diversidade. Nos colhemos nos naturalistas zoo-gedgrafos expressoes tais como «comuni- dade de vida», ou ainda cassociagao faunistica», formulas significativas, pois mostram que, tanto no povoamento animal como no povoamento Pomtak, toda a extensio de superficie, em andlogas condigées de relevo, de posic¢ao e de clima, é um meio compésito, concentrando resoclagaes formadas por elementos diversos, indigenas, transfugas, invasores, sobreviventes de periodos anteriores, mas unidos pelos lacos duma adaptagao comum. Qual. a ‘utilidade destes dados para a Geografia humana? k isso que vamos ver. II—O Homem e 0 meio e, surge uma pergunta a que é preciso r eogralia botanica apoia-se ja sobre um grande numero de observacdes e pesquisas; a Geografia zooldgica, s¢ bem que muito menos adiantada, conta jd frutuosas exploragées no seu activo: mas, quais sio os dados de que disp6e a Geografia humana? ra autorizat as Antes de ir mais lon| responder com. brevidade. A conclusées que j4 deixdmos entrever ? No estudo das relagdes da Terra e do home: mudou; rasgaram-se mais largos horizontes.. _,.. Antes nfo se atentava senio no periodo histé ultimo acto do drama humano, lapso de tempo muito curto em relagio & presenga ¢ acco do homem sobre a ‘Terra. A investigas0 pré-histérica velo mostrar-nos 0 homem espalhado, desde tempos Imemoriais) nas amais diversas partes do. mundo munido do fogo ¢ ‘azendo instrumentos; ¢ por mais rudimentares que nos paregam aS m a perspective rico, isto é, 20 Digitalizado com CarScanner ce PRINCIPIOS DE GEOGRAFIA HUMANA BL suas indistrias, nio podemos considerar de somenos as modificagdes que, por via delas, sofreu a fisionomia da Terra. Quer o cagador paleolitico, quer os primeiros cultivadores neoliticos abriram brechas ¢ criaram também associagées no mundo dos animais ¢ das plantas. Actuavam em pontos diversos, independentemente uns dos outros, como 0 provam os diferentes pro- cessos ainda em uso na produgiio do fogo(!). Em suma, mais remota € universalmente do que se supu- nha, o homem teve influéncia so- bre o mundo vivo. Dado que desde tio cedo a espécie humana se expandiu pelas regies mais diversas, teve necessariamente de submeter-se a casos de adaptagées miultiplas. E Cada_grupo ‘encontrou, no meio especial onde deveria ‘assegurar a sua vida, tanto auxiliares como obstaculos: os processos a que recorreu por via desses repre- sentam outras tantas solugdes locais do problema da existéncia. Ora— até ao momento em que, devassado 0 interior dos conti- : i YO eet A 2 ig. 4 — Cagador paleolitico nentes, foi possivel as exploragées eines ea Platura rupestre do barranco de. Valltorte cientificas observar sistematica- fuspanhay Feaurida’s aite'do tamsaho natorat mente as populagdes—, uma (Segundo Obermaier e Wernert). espessa cortina ocultava-nos os desenvolvimentos variados da humanidade. As influéncias do meio tinicamente se nos denunciavam através de um amontoado de contingéncias hist6ricas que as velava. A visio directa de modos de existéncia estreitamente relacio- nados com o meio, eis a novidade que devemos a observagio sistema- tica das familias mais isoladas, mais atrasadas da espécie humana. Os servigos que ha pouco assinalamos terem sido prestados a Geografia botanica pela andlise de floras extra-europeias, sio precisamente os mesmos que a Geografia humana deve ao conhecimento de povos que (1) Por mais primitivo que seja, no ha povo no mundo que niio saiba produzir 0 fogo. Os processos mais em uso soz a) 0 airito de dots pedacos de vradeira de dureza diferente (ha diversas maneiras de proceder); 8) a percussdo de duas pedras de pirite, ou de uma de pirite com uma lasea de silexs ¢) a com- pressio de ar. Vet: Deniker, Les Peuples et les Races de la Terre, Batis, 1926, vag, 173 ¢ segis. ¢ Haberlandt, Emografia— Estudio general de las razas, Colecgao Labor, 23/24, pig. 102 ¢ segts. (N. 1) Digtalizado com CarnScanner 5, a2 MARCHA DA HUMANIDADE ficaram proximos da natureza, os Naturvalker. Ainda que Se observern mudangas, & impossivel nio. reconhecer neles um cardcter vin- cado de autonomia, de endemismo. Sé por este podemos compreender como certos homens, colocados em certas ¢ determinadas condigties de meio ¢ agindo conforme a pré. pria inspiragio, procederam pars organizar a sua extsténcia. E, afinal, nao foi sobre estas bases ‘que se ergucram as civilizagdes, que nio Apathy Passam de acumulagdes’ de expe. Ti¢ncias? Crescendo, e complicin. Fig.6—Lavrador do bronze antigo 49°S¢_ por isso mesmo, nem assim Gravers rupeste de Bolus puderam desligar-se completamente Segundo A: Mentett Junta debois wa: — dessas origens. Sisto reds primiuve "dessa origens Algumas destas formas primi- ate tivas de ‘existéncia so pereciveis: varias extinguiram-se ja ou esto ‘prestes a acabar, reconhesamo-lo. Mas deixam-nos, como testemunhos ou como reliquias, os produtos da sua industria local — armas, instrumentos, vestuirio, etc., todos esses objectos nos quais se materializa, por assim dizer, a sua afin dade com o meio ambiente, Razio teve, pois, quem os recolhan, quem formou os museus especiais onde estio agrupados e geouril camente coordenados, Um objecto isolado pouco nos diz; mas js colecsdes da mesma provenigncia nos permitem discernir uma sigla comum, ¢ dao, viva ¢ directa, a sensagio do meio. Do mesmo modo, 98 museus etnogriificos, como aquele que foi fundado em Berlim pela infatigdvel_actividade de Bastian, ou como o de Leipzig ¢ os doutras cidades, sio verdadeiros arquivos onde 0 homem pode estudar-se a si proprio, nio in abstracto, may sobre realidades. Outro progresso: nés estamos melhor informados sobre a distribuisso da nossa espécie, sabemos melhor em que proporgia numérica o homem ocupa as ersas partes da ‘Terra. Nio afirmarei jue tenhamos um inventirio exacto da humanidade & que o nimero de 1.100. milhves Fepresenta exactamente 0 dos nossos seme. Ihantes(!); todavia, nem por isso deixa de ser certo que, geagas a sondagens feitas um pouco por toda a parte no mar human, a Fecenseamentos repetidos, a calculos plausiveis, dispomos de nameros ja bastante precisos para nos permitirmos estabelecer relagoes, Na mobilidade que preside as relaydes de todos os seres vives, © estado numérico ¢ territorial de cada especie € uma nocd cieate fica de alto valor. Ela projecta luz sobre a evolugio do fendmeno. () Antes da Ultima guetsa, calculava-se em 204 milhdes o total da por pulagéo do globo. Val citia estuva aysun repartida pelos continentess Abviee ce Sat tales; America — 259 mulhoess Asia (compreendenda a. lasulindia) — 1418 miles; Europa — 815 miliioes; Oceania — limilludcy, (N. Ed Digitalizado com CarnScanner PRINCIPIOS pK GHOGRAFIA HUMANA Ms Oray a populagio humana & um fendmeno em march facto que fica inteiramente em evidencia estatisticas particulares dos. Ustados, consideramos 0 conjunto da dis- tribuigio no globo. Thi repides que a populagio ocupa poderosamente © onde parece ter utilizado, mesmo com excesso, todas as possibili- dades de espago. Koutras ha onde é diminuta ¢ disseminada, sem es aids, razdes de solo ou de clima justifiquem’ tal anomali Como explicar estas desigualdades senio por correntes de imige originadas em tempos anteriores & Histéria ¢ cujos rastos $64 Geen gratia pode ajudar-nos a encontrar? [i hoje, naturalmente,, esas regides abandonadas transformam-se em centros de atracgao para os Movimentos que agitam a humanidade actual. Uma das relagdes mais sugestivas € a que mimero de habitantes e um: a; esse 6 o logo que, para’ além ‘das iste entre o ¢ a certa porgio de superficie, ou seja, a densidade de populagio, Se pusermos a par estatisticas pormenori- zadas da populagdo com cartas igualmente pormenorizadas, como as possuem hoje quase todos 0s principais paises do mundo, ¢ possivel, por um trabalho de andlise, discernir correspondencias entre as aglomeragdes humanas ¢ as’ condiges fisicas. Tocamos assim um dos problemas essenciais que levanta a ocupagio da terra; porque a existéncia de um denso agrupamento de populagio, de uma coabi- tacdo numerosa de seres humanos num minimo de espago, garantindo a colectividade meios seguros para viver, & se bem reflectirmos, uma conquista que sé pode ser realizada 'gracas a raras e preciosas circunstincias. Hoje, as facilidades do comércio mascaram-nos as dificuldades que encontraram os homens de antanho para estabelecer grupos compactos. Entretanto, a maior parte dos agrupamentos actuais sio formagées que remontam longe no passado; 0 seu estudo analitico permite compreender-Ihes a génese. Na realidade, a populagio de um pais decompée-se, como muito bem o mostrou Levasseur (!), num certo numero de nticleos, cercados de auréolas de intensidade decres- cente. Ela agrupa-se segundo pontos ou linhas de atracgio; que os homens nioalastraram’ 4 maneira de uma nédoa de azeite, mas reuniram-se primitivamente 4 maneira dos corais. Uma espécie de cristalizagio aglomerou, em certos pone eau de popula: humanas} ai, estas aumentaram, pela sua inteligéncia, os recursos naturais ¢ o valor dos lugares, de tal sorte que outras vieram para, a bem ou a mal, participar nos beneficios deste patriménio, ¢ camadas sucessivas se acumularam nestes terrenos de eleig’o. Possuimos hoje dados antropoligicos sobre algumas_ dlestas regioes onde se sobrepuseram assim aluvides humanas, A Europa () E. Levasseur — La repartition de ta race humaine (Bulletin intern. de statistique, XVM, 2 liv., pop. 66). Geo. Ham. — Pot. 3 Digitalizado com CarnScanner 34 MARCHA DA HUMANIDADE Central, a bacia mediterranica, a India Inglesa (!) apresentam-nos, a titulos diversos, exemplares segundo os quais € possivel certificarmo. -nos da composi¢iio dos povoamentos humanos. A. complexidade destes povoamentos é, duma maneira geral, 0 que nos impressiona, Quando tentamos distinguir, segundo os indices antropoldgicos repu- tados como os mais persistentes, os elementos que entram na popu- lagio no sé duma grande regido, mas até na duma circunscrisio regional menos extensa, verificamos que, com poucas excepges, a falta de homogencidade € a regra. Em Franga, a antropologia dis- tingue tipos muito antigos, que remontam aos tempos pré-histéricos, a0 lado de elementos vindos ulteriormente, tantas vezes quer de ums regiio ou de um departamento mesmo. Nesta diversidade ha graus que explicam suficientemente a natureza e a posigiio das regides; mas, no estado actual da evolugdo do povoamento humano, bem raras sao as partes que parecem ter escapado inteiramente as vagas das invasdes que rolaram a superficie da Terra: alguns arquipélagos longinquos, alguns Tecantos montanhosos, quando muito. Mesmo na regio das selvas africanas, os Pretos de grande estatura e os Pigmeus de cor mais clara coexistem, nfantendo relagées reciprocas. Podemos, desde ja, considerar como adquirida a distingio fundamental entre povo e raga, contrariamente aos habitos da linguagem corrente que os confunde sem cessar (2). Sob as analogias de lingua, de religiio e de nacionalidade persistem, ¢ nao deixam de actuar as’ diferengas espe- cificas implantadas em nés por um longo atavismo. Entretanto, estes grupos heterogéneos combinam-se numa organizagio social que faz da populagao de um pais, considerada no seu conjunto, um corpo. Acontece, por vezes, que cada um dos ele- mentos que entra nesta composicdo adoptou um modo de vida (3) “() Le peuple de V'Inde d'aprés la série des recensements (Annales de Géographie, XY, 1908, pags, 358-313 ¢ 419-42), : () La Blache nao deixa explicita a disting%o fundamental entre povo ¢ raga. Mas, tendo sido abordado o assunto, parece-me conveniente deixi-lo escla- recido, tanto-quanto ¢ possivel numa curta nota. Raga é um grupo de homens (no caso particular que focamos) com idénticas caracteristicas Somaticas e cuja evolugdo estd sujeita as leis da biologia; povo é um conjunto de individuos, de uma ou mais ragas, falando a mesma lingua, ocupando um mesmo territorio, tendo os mesmos tsos ¢ costumes e, frequentemente, a mesma religido, Pode uma destas caracteristicas falhar : os ciganos andam espalhados pelos territorios de outros povos ¢ néio tém um que seja seu; nem sempre o mesmo credo reli- gioso ¢ seguido pela totalidade dos individuos. Entretanto, aqueles caracteres, no todo ou em parte, podem servir de base a um determinado povo, mas, como diz Haberlandt, 9 « propria consciéncia disso converte num poyo os individuos de um grupo humano. Acrescentess gue as leis que regem a evolugéo dos povos no so biologicas mas sociais. (N. T.). : (8) O autor diz exactamente — «genres de view, Demangeon, porém, escreve — amodes de view (Problemes de Géographie Humaine, Paris, 1913). \ tea dugo modos de vida pareceu-me mais conforme com o genio da lingua e. por isso, optei por ela, Nao perguntamos a algum t— Que género de vida & 0 seu? —mas sim: — Qual o seu modo de vida ¥ (N.'T.) Digitalizado com CamScanner (per eT “aR TEy PRINCIPIOS DE GEOGRAFIA HUMANA uns, cagadores ; outros, agricultores; ¢ ainda outros, pas- tores. Vemo-los, neste caso, cooperar, unidos uns aos outros, pela solidariedade de necessidades. A maior parte das vez es — excepciio feita a algumas moléculas obstinadamente refractarias, tais como boémios ¢ ciganos, ete. —a influéncia soberana do meio, nas socie- dades da Europa, tudo ligou a ocupagies ¢ costumes anilogos; ¢ marcas materiais assinalam essas analogias. Tal é¢ a forca moldadora que prevaleceu sobre as diferengas originais e as combina numa adaptagio comum. As associagdes humanas, do mesmo modo. que ‘AS associagdes vegetais ¢ animais, compdem-se de elementos diversos submetidos 4 influéncia do meio: nao se sabe que ventos os trouxeram, nem donde, nem em que .época; mas coexistem numa e mesma regifio que, pouco a pouco, os marcou com seu cunho. Ha sociedades incorporadas no meio desde recuados tem- pos, mas ha outras ainda em formagio, aumentando e modifi- cando-se dia a dia. Sobre estas, apesar de tudo, as condigdes ambien- tes exercem pressio e, por isso, na Australia, no Cabo ou na América, vemo-las impregnarem-se dos lugares onde se desenrolam os seus destinos. Nao serio os Boers exemplo de um dos mais notaveis tipos de adaptagao ? (1) IV—O homem, factor geografico Acima do localismo em que se inspiravam as concepgses anteriores, esclarecem-se as relagées entre.a terra e o homem. A dis- tribuigio dos homens foi guiada na sua marcha pela aproximagio e () La Blache, escrevendo que os Boers séo exemplo de uma notivel adaptagao, exprime a realidade com maior vigor do que os autores que falam de regressio. : Na verdade, em 1651,0 governador van Riebeck iniciou a colonizagéo agricola do Cabo; muitos Holandeses de ambos os sexos — circunstancia a as: nalar —vieram estabelecer-se no territério, recebendo cada colono um lote de terra, sementes, instrumentos agricolas e’ gado. O caudal dos que chegavam aumentou quando—e em consequéncia do fanatismo dos calvinistas que assolava as Provincias Unidas — muitos luteranos procuraram refiigio na nova colonia. Oriundos de um pais de marinheiros ¢ mercadores, os colonos ndo o foram, mas sim agricultores e pastores. Logo, regressdo, Mas, tal nfo sera con= cluir um tanto precipitadamente ? Pois nao tinham’as Provincias Unidas nesse século XVII uma larga tradigo pastoril ¢ agricola? Disso sio os polders um cloquente testemunho ! Até ao comércio metropolitan conviria que na colonia a actividade econdmica fosse de molde a servi-lo—e os que foram e la se dedi- caram a agricultura ou a pastoricia estavam a altura da tarefa: «no Cabo. da Boa Esperanga demonstraram os Holandeses dotes completos de colonizadores», diz Gonzalo de Reparaz (Historia de la Colonizacion, Vol. 1, Colecgto Labor, ig. 407), 1 haveria sido assim se tivessem feito regresssio ? io mantiveram a lingua, ainda que enriqueeida por termos dos povos vizinhos? No guardaram os preceitos do seu credo religioso, instituigdes e habitos morais ? Néo mantiveram até os scus prejuizos de raga? . * E se acaso tivesse havido regressdo, nio seria o meio que poderia expli- Digitalizado com CarnScanner 26 MARCHA DA HUMANTDADH convergéncia das unidades continentais ; a solidio das bac nicas separou eetimenas longo tempo ignorantes umas idiis aoe Os grupos que, na vastiddo dos continentes, se fi iui tras, ‘aram entre si com obsticulos fisicos que nio ultrapyee’ lh depai =AG com o decorrer dos séculos: montanhas, florestas regides sem agua, ete, A civ! igo resume na luta contra Cste obstictlos, Os povos que dela sairam vencedores puderam, aproveitan em comum os resultados duma experiencia colectiva, adquirida ex tl versos meios, Outras comunidades, como consequencia de prolongad, isolamento, perderam a faculdade de iniciativa 4 qual deviam os vane primeiros progressos ; incapazes de, pelas prdprias forgas, irem além de um certo -estidio, lembram-nos aquelas sociedades anim, 5 que arecem ter esgotado a soma de progresso de que cram susceptives.. Fioje, todas as partes da terra esto em comunicagio; o isolamento é 1 anomalia que lembra um desafio, ¢ nio é sé entre as regides cont ¢ vizinhas, mas também entre as longinquas, que existe contacto, As causas fisicas, cujo valor os gedgrafos se tinham anteron. mente esforgado por encontrar, niio devem por isso ser desprezadas importa sempre marcar a influéncia do relevo, do clima, da posi: continental ou insular sobre as sociedades humanas; mas dev: encarar os seus efeitos no homem e no conjunto dos seres vivos, Mineamente. E’ assim que melhor poderemos apreciar a parte que convém atribuir ao homem como factor geografico. Ele ¢, ao mesmo tempo. activo e passivo(!)— pois, segundo a sentenga bem conhecida, «na- tura non vincitur nisi parendo», °s Pantano, car totalmente o facto, antes haveriam de buscar-se as causas essenciais de comércio imposto. logo no inicio da colonizagio, pela Companhia das Indias Oriemtais ¢ na atitude politica (?) adoptada pela Metropole. Essas causas /uns- nas contribuiram mais do que as influéncias do meio fisico para o lento pro- gresso da comunidade boer. Particularistas — «o Boer nfo gosta de ver 0 fumo do seu vizi tradicionalistas, agricultores e pastores, os Boers mantiveram noutco meio & caracteristicas peculiares do Holandés, esse também particularista, ‘ad lista ¢, a par de marinheiro e comerciante, agricultor ¢ pastor (algumas pase nas de Ramalho Ortigéo, n'A Holanda, dizem-no exuberantemente). ‘Quando uma poténcia (a Inglaterra) se Ihes opds, esses agricultor pastores — robustos, valentes © laboriosos — agiram da forma yalorosa. século XIX testemunhou — lembrando ainda ay tradigdes da pateiaem da liberdade, o Holan bate-se desesperadamente, rebenta o dique, inundugdo armas € bagagens immigas; os Boers lutaram valorosamente tentes, néo obstante, recusaram render-se ; iniciaram 0 0 o éxodo em massa =e foram fundar as Republicas de Orange ¢ do Transval, Apos vicissitudes Yérius, foram incorporados na Unido Sul-Alricana, mas iio perderam nada as suas caracteristicas, nem desataram os lacos coma patria de orig . Kegressdv ou exemplo notavel de adaptagio ? A. resposta parece anequivoca. (N, 7.) Ses que () Assim é na realidade, Veja oa que se die nas conside servem de preficio. (N. T,) Digitalizado com CarnScanner PRINCIPIOS DE GEOGRAFIA HUMANA 37 ___ Um eminente gedgrafo russo, M. Wocikof, fez notar que os objectos submetidos 4 forga do homem sio sobretudo os que ele ape- lidou de «corpos moveis» (I). Ha, com cfeito, na parte da superficie terrestre que esti directamente submetida a acgio mecinica das Aguas correntes, dos gelos, dos ventos, das raizes das plantas e ainda dos animais—estes, pelo transporte de moléculas ¢ pelo espe- sinhar — um residuo de desagregacio renovado continuamente, dispo- nivel e susceptivel de se modificar e de adoptar formas diversas. Nas zonas mais ingratas do Saara, as dunas sito o Ultimo reduto da vegetagio e da vida. E? mais ficil ao homem exercer a sua actividade A Fig, 0—O homem, factor, geografico; o dominio das dunas ¢ das_aluvides. ‘A'Gelandia no fim do stculo XIV (A) e na actualidade (B), segundo elementos recolhidos em Blink. (Cartograma do tradutor.) «Deus fez os mares, o Holandés (neste caso, o Zelande Sezes, 0 mar abre brecha, teade a submergir as terras —hd exemplos historicos disso; mas 0 Zelandés ~ Luctor et emer go, diz a sua divisa— opde-Ihe teaazmente o dique, perde uns pal de terra agui, val ganhar uns metros mais além: repare-se nas duas conflgaracbes de Z Beveland (6); ou conquista deliberadamente: veja-se 0 caso de Goedereede-Overilackee (2), ‘que pertence ji a Hlolanda meridional, as costas», diz o provérbio, Por nas regides onde os materiais méveis estio distribuidos com abun- dancia do que naqueles onde uma carapasa ealcdrea ou uma crosta lateritica, por exemplo, endureceram e esterilizaram a_ superficie. Mas € preciso acrescentar que a propria ‘Terra, segundo a expressiio de Berthelot, ¢ algo de vivo. Sob a influéncia da luz e de energias cujo mecanismo nos escapa, as plantas absorvem e decom- poem os corpos quimicos bactérias fixam, em certos vegetais, 0 () De Cinfluence de Uhomme sur la t 1. X, 1908, pag, 98), e, (Annales de Géographie, Digitalizado com CarnScanner MARCHA DA HUMANIDADR 38 ida, transformada na Passagem de azote da ation de uma multidao de seres: uns ef! em organismo, cir i se alimentam os outros 3 alguns transportam ferme a substincia de Ader destruir outras espécies. Nao & exclusivamens See anit dos agentes. inorgdnicos que se Verifica a ag, gragas a0 dow do homem; este nao se contenta em tire pro. ceaplorom 0. arado, dos materials em decomposigio do eal %, yeito, a A j ‘m lizar as quedas de agua, devidas a forga da gravidade em fungi utilizar a a OTBAniste oram, ovens uannes i il -Overflak! ig. 7— 3 di ista da ilha de Goedereede-Over! Fig. 7—Luta com 0 mar: fases da conqui He bade Goeier i nos conguistados ate marcada com £ no cartto A da fig. 6); 2—terrenos congulsiades nig acrdsciaceae aan xv4; 4—no seculo'xyxij 20 ‘6—no século x1x; 7—indeterminado, 1—Aotes de 106s, durante 0 século 3 i E | s energias das desigualdades do relevo. Ele colabora com todas estas ¢ ac : omen agrupadas ¢ associadas. segundo as condigées do meio. O hi entra no jogo da natureza E‘a_ partida nao €m_muitas partes da Ter meio determinadas pelo é ii r que isenta de peripécias! I’ preciso notar gee Ta, seniio na sua totalidade, a condisors clima nio tam a rigidez que costuman buir-thes as médias registadas pelas nossas eartas. O clima ¢ 1 uma resultante oscilando 4 volta de uma média, do que a ‘ainda, Be, dados que possuimos, embora denmsiade per feito. an Holar que essas oscilagdes parecem ter, Ul ee Periddicos por outras palavras, ersistem, durante varios 20%) °° nm Sentide, ora noutro, Series pliwiosas alternam com Seti Digitalizado com CamScanner aera , y ROA Mgeeg PRINCIPIOS DE GEOGRAFIA HUMANA = — 80 e se estas variagdes no acarretam grandes perturbagdes na: que tém chuvas abundantes, outro tanto nao acontece naquel sé recebem o minimo necessirio, Compreende-se bem 0 alcance desta observagio, Porque a intervengiio do homem pode consolidar © momento positivo, firmar sobre um estado tempordrio um estado fixo, isto pelo menos até nova ordem Por exemplo: do Norte de Africa ao Centro da Asia, 0s obser- vadores sentem-se impressionados com os especticulos de desolagao que contrastam com os vestigios de cultura © as ruinas, testemunhos de uma antiga prosperidade (1), = Esta assentava sobre o fragil alicerce de trabalhos de irrigagio, mercé dos quais o homem conseguia estender aos periodos secos 0 beneficio dos periodos himidos. Mas... que se interrompa a fungao ¥ benfazeja durante algum tempo, e logo todos os inimigos, que a irrigagio combatia, levantardo a cabeca. E sobretudo, 0 que é mais 3 grave, a adaptacio tera tomado outro rumo. Outros habitos terdo == prevalecido nos homens; a sua existéncia ligar-se-4 a outros meios, a * outros seres, exigindo outras disponibilidades de espaco. A floresta nio tem maior inimigo do que o pastor; os diques e os canais tém encar- nigado adversdrio no Beduino, a quem perturbam nas peregrinagoes. A_ac¢ao do homem tira o seu principal poderio dos auxiliares que mobiliza no mundo vivo: plantas de cultura ¢ animais domés- E. ticos, porque dé assim impulso a forgas em poténcia que, gracas a ele, encontram o oote livre e agem. A maior parte das associagdes vegetais formadas pela cultura compéem-se de elementos primitiva- egies as que () Ellsworth Huntington foi um desses observadores e no livro The Pulse f of Asia—A Journey in Central Asia illustrating the Geographic Basis of His. tory, Boston-New-York, 1907, defendeu a tese da relacionagio das oscilagdes climéticas com as migracées histéricas dos povos da Asia Central, explicando estas por aquelas. Em 1914, o principe Kropetkin, no artigo The Dissecation of Eurasia, in Geographical Journal, XXIII, buscando as causas geogrificas dessas migragdes, conclui, nao. pelas.oscilagGes climaticas, mas por uma progressiva aridez, Jean Brunhes ¢ Camille Vallaux (La Géographie de Histoire, Paris, 1921, pag. 227 e segs.) poem em duvida a legitimidade das hipoteses de Huntington e de Kropotkin, nfo quanto a maior ou menor humidade que no decorrer dos tempos haja tido a Asia Central, mas a respeito das consequéncias historicas— as refe- ridas migragées: «Enquanto os modos de vida podem ser os mesmos, néio ha nhuma razdo natural para o éxodo em massa. E parece certo que, apesar das oscilagGes de mediocre amplitude, a Asia Central permaneceu, no decurso dos : tempos historicos, idéntica a si propria: niio deixou de ser uma imensa estepe : de gramineas, atravessada por grandes formagdes de areias, com alguns oasis, agui ¢ além, © cujos avangos ou recuos se explicam suficientemente por pe riodos de paz ou de guerra» (pag. 228). | 2 Quanto. ao Norte de Airica, as estagdes paleoliticas do Sdara, bem assim as neoliticas € até o facto de amuitas ruinas das florescentes colonias romanas da Argélia se encontrarem actualmente ja dentro da zona sub-desértica» Mitudo isso parece testemunhar, sendo oscilagdes climaticas, ao menos varingdo de um clima mais hamido para condig6es progressivamente mais aridas, Claro que estou a referir-me aos tempos historicos © pré-historicos, porque relat Digitalizado com CarScanner . MARCHA DA HUMANIDADE 40 A E Jantas anichadas nas encostas exp, nemie dsprs, rm plantas aihades nas enone ep sol ou fh de espécies agrupadas em grandes massas e consti concorténcia, ot Tbe. Do alojamento propicio onde se tinh td a etis plantas, que a gratidio dos homens devia um ahenco *, espreitavam 0 momento em que circunstiincias novas jhe, facultariam mais espago. O homem, adoptando-as na sua clientela, restou-lhes este servico: libertou-as. Ao mesmo tempo, franqueou ¢ caminho a todo um cortejo de vegetais ou de animais nao desejados substituiu por associagdes novas as que, antes dele, se tinham ase. nhoreado do espago. Sem o homem, nunca as plantas de cultura, que cobrem hoje uma parte da terra, teriam conquistado as associagées rivais o espago que ocupam. Mas, porque assim é, pode julgar-se que, seo homem deixasse de intervir, as associagdes por elas espoliadas reto. mariam os seus direitos? Nada menos certo. Uma nova economia natural pode ja ter tido tempo de substituir a antiga. A floresta tropical, desaparecendo, deu lugar a savana(1); e esta troca, modii- cando as condiges de luz, eliminou em parte os seres que essa fio resta abrigava, nomeadamente as terriveis glossinas que afastavam outras espécies. Algures foi o sub-bosque, sob a forma de maguis ou de garrigue(?), que sucedeu a floresta; e outros encadeamentos se verificaram, transformando tanto o meio ambiente, quanto as condicé econdmicas (8). Um campo novo, quase ilimitado, abre-se as obser- in. ia yamente aos tempos geolégicos & verdade incontrovertida que se verificaram oscilagdes do clima, : Hoje a Africa do Norte, excluido pela forga das circunstancias 0 Séar’. &, no ponto de vista agricola, o pais das.vacas gordas e das vacas magras. «Como esta na zona limite das chuvas suficientes para a agricultura, alguns centimet" a mais ou a menos na quantidade de chuva podem ter consequéncias econ’ muito graves; uma série de anos secos conduz geralmente a fome>. Origenes’ ot: Hs Obermaier ¢ A. Garcia y Belido, El Hombre Prehistérico | Srigenes ’ Ja Humanidad, Madrid, 1941, pigs. 111-120 ¢ 205-208; August ae ee ue Septentrionale e Occidentale, in Géographie Unis ‘Alnka spsbecialmente 0 § IV—Les changements de climat). f pretenda dizer cone 2yeSSUM quando encarado duma maneira geral (sem sue Sutro livro de Hen ite WEB Obra trate de generalidades), ¢ duil a leit" 2 edigao ha : deen 8t0n, Civilization and Climate. New-Heven, 1915, de °v) © SESS HE wraducio espanhola:' Civiligacién y- Clyma, Madrid, 102. (N. 1 (1) La Bla - 1 wand na rit eee Gy textualmence «brousse», ou seja o nome dado & sava {9 Maquis & a Nloresia degradada dos solos siliciosos cujas arvores carae- teristicas forar lo brenhas por vez D rasteitOs Impenctravels, Gaeatituldas por especies arbustivas, fornia disperso em pequenoe afer Hssociagio vegetal constituida por mat oF terran ens e286 também por manchas herbiiceas, pobre revestit. ¥) Sobre o ussinte e sole caledreo, na regio mediterranica. ( sur la végdtation of anu? E conveniente a leitura do cap. V—clction de lo” Traité de Géograrn ccitions végétales dues a son intervention, no como Ul! Braphie Physique, del. de Martonne, 5.* edigdo, Paris, 1982. Digitalizado com CarnScanner

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