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14 NEGAGAO 1 Aspetos gerais da negagso 14.1.1 Sobre o conceito de negacto 141.2 Grandes tipos de negaga0 14.12 Negagiio sintatica e seus subtipos isa Negagto oracional 141341 Subtipos da negagio oracional ‘41212 Estatuto do operador de negagio oracional simples v41a2 Negagtio de constituintes 142 Aspetos particulares da negagio oraclonal 14.21 Variantes das construgdes de negagao oracional simples ‘4213 Relacio semantica entre oragOes afrmativas e negativas 1212 Escopo largo eescopo estreto da negacio oracional simples 1422 Negagao oracional de subordinagio e de coordenagio 1423. Construgdes especiais de negacao oracional 4237 Dupla negagio 4232 Negagtoreforgada 4232 Negagio expletiva 143. Aspetos particulares da negacéo quantificacional 43.1 Negagio da universalidade 143.2 Negacao existencial asi Negagio existenclal de classe 4222 Negagio existencial paticularizada 4222 Negacio existencial enumerativa 1433. Negacao de cardinalidade 143.4 Negacao da inferioridade e negagio da superioridade Construgées associadas & negacio 1441 Concordancla negativa 1442 Polaridade negativa e positiva 1443. Apendices discursivos interrogativos e entaticos 1444 Coordenagto e elipse Pistas para uma perspetiva unificada do Fontes das abonagSes rema da negasao 461 461 462 463 464 464 368 an an an 473 477 479 479 480 481 482 483 a8 487 487 488 489 489 492 494 495 ay ana NEGACAO Aspetos gerais da negagéo [Nesta primeira seccio, delimita-se o conceito de negagao linguistica, em 14.1.1, € iddentificam-se 0s tipos de negasao, nas subsecgdes seguintes. A primeira tipologia apresentada, em 14.1.2, é de cardter bastante geral, abrangendo todos os nivels de estrutura linguistica, da palavra a frase. Em 14.1.3, € apresentada uma classificagao confinada {é 20s subtipos sintaticas de negacao, isto €, aos que envolvem processos _gramaticais de combinagdo de palavras. Pela sua preponderdncia no uso linguistico e pela amplitude das suas interagbes sintticas e semanticas, dois destes subtipos virdo a ser objeto das secyes subsequentes a esta: a negacao oracional, na secgio 14.2, €@ negagaio de constituintes quantificacional, na seceao 14.3, Seguidamente, em 14.4, so tratadas varlas construgoes associadas & negagdo. Na tiltima secca0, 14.5, € esbocada uma perspetiva global sobre as construgoes de negacéo em portugues. Sobre o conceito de negacao © conhecimento humano em geral e a faculdade da linguagem em particular Incorporam como elemento fundamental a capacidade que consiste em, perante tuma dada propriedade conhecida, verificar (¢ eventualmente declara) se uma tentidade possui ou nio essa propriedade (ou, em termos da Teoria dos Conjun- tos, se pertence ou nio a um determinado conjunto de entidades). Quando, por exemplo, uma pessoa reconhece ou declara que um dado cio € castanio (ou que tem a propriedade de ser castanho), pode-se dizer que tl pessoa dsp da infor- magaio de que o dito cdo é membro do conjunto das entidades que tém essa cor fe que, por Isso mesmo, no 0 considera membro do conjunto complementat deste isto 6, do conjunto das entidades que tém qualquer outra cor ou que no tm coralguma, Paralelamente, se a mesma pessoa reconhecer que um outro cio { branco, diremos que o inclu no conjunto das entidades brancas eo exclul do Na inguagem matemitica da Teoria dos Conjunto dase que uma entidade& membro dem conjunto {uno membro de um conjunto) ou pertence # wm conjunto (ou ni pertence a um conjunto)~ ‘eservando-se os teros d faal de cu para elades ere conuntos,Porexempl, case que Portugal {a Eopanha sto membros do conjunte dos paises da Unto Buropela, mas di-se que oconjunto formad por ests dols pases benos ets incuido no conjunto Unido Buropela e que, Inversarente, 0 eonjunto Unit Europea inclu o conjunto fonmado por Portugal eEspanha (ou, equvalentemente, que 0 co Justo format por Portugal Espana € um subconjunto do conjunto Unto Faroplae que este € wm 1442 1412 Necagho conjunto complementar deste (a0 qual pertencem, entre outras, as entidades ‘castanhas). De algum modo, pode-se dizer, ainda que simplificando muito, que ‘conhecer uma entidade € saber a que conjuntos ela pertence (e, decorrentemente, a quals ndo pertence), ‘Aatividade mental de inclusdo ¢ exclusio (no sentido comum destes termos) de entidades em relacZo a conjuntos exprime-se nas linguas naturais por meio, de um sistema de dois valores opostos, cada um deles associado a construgoes prdprias: 0 valor positivo, que corresponde a pertenga a um conjunto, ¢ 0 valor negativo (ou negagdo), que corresponde a nao pertenga a um conjunto (ou, 0 que vale o mesmo, a pertenca a um conjunto complementar de outro). Pensemos, num qualquer individuo de nome Pedro. Relativamente a sua nacionalidade, ou se reconhece que ele pertence ao conjunto dos portugueses ou, alternativamente, que pertence ao conjunto complementar deste conjunto (constituido por todas, as entidades que nao tém o atributo de serem portuguesas, nas quais se incluem espanhdis, ucranianos, marcianos, os tigres da Maldsia, as ilhas Fiji, etc.). Em lin- gua portuguesa, a pertenga ou valor positivo pode neste caso ser expressa por meio da frase 0 Pedro & portugues, que é uma frase positiva (ou frase afirmativa ou, simplesmente, afirmaco), ao passo que a nao pertenca pode ser descrita pela frase o Pedro nao é portugués, que & uma frase negativa (ou, simplesmente, ‘uma negagio). Adiante se ver que as nogbes de pertenca e de nao pertenca e os cortelativos valores positivo e negativo também se assoclam a expresses nio fr sicas ou oracionals. Por exemplo, nas frases afirmativas estavam na sala ndo.mais de.cem pessoas eo piloto fez ndlo poucas tentativas para aterrar aparecem dois quan- tificadores de forma e valor negativos (no mais de cem e no poucas), cujos corres- Pondentes positivos aparecem nas frases igualmente afirmativas estavam na sala mais de cem pessoas € o pilot fez poucas tentativas para aterrar. Nestes casos, fala-se de “valor positivo" das expressdes, mas nao de “valor afirmativo", que apenas se usa para designar o valor positivo de estruturas oracionais, Grandes tipos de negacio Sendo a negaio uma operago que se aplica em praticamente todos os niveis de estrutura lingufstica, da palavra a frase, e sendo em geral o valor negativo o valor ‘marcado, as linguas dispOem de varlas formas de o contrastar com o valor positivo. O presente capitulo trata de uma dessas formas, a negacao sintatica, em que o valor negativo é realizado por uma combinagao de elementos morfologicamente auté- rnomos, isto é, por meio de uma construgdo negativa. Além da nega¢ao sintatica, existe um sistema de negagdo morfol6gica, obtido a partir de morfemas negati- ‘vos que podem ocorrer numa palavra (como nos nomes infélicidade ou desconforto, nos adjetivos incapaz ou desleal, nos advérbios atipicamente ou infelizmente ot em vverbos como descanhecer ou desobedecer), Pode-se ainda considerar que existe um sistema de negagio lexical, constituido pelos grupos de elementos do léxico que exprimem conceitos complementares sem recurso a meios morfoldgicos, como & 0 caso dos pares de tipo antonimico bom/mau ou aceitar/rejeitar sobreconjunto daguele). Neste ext, no respearemos Sempre este rgorterminlogia,podenda ue os termos da fafa de incr (de que fz parte ex no se Sentido rai commen Que bc sind imo de er como membre star ld am & sii de partner ao ser meno de fossin prop ques ASPETOS GERAIS 04 NECAGO 1413 ‘Ha construgoes negativas que alguns autores classificam como negago mor {fossintatica, dado que se podem analisar numa perspetiva tanto lexical como sin- titica, Trata-se de construgdes em que uma das particulas ndo ou sem esta diteta- ‘mente aplicada a uma unidade lexical, dando origem a uma expressao da mesma ‘ou de diferente classe sintatica. Sem mudanga de classe, temos, pelo menos, exem- pplos nominats (como mio violencia, sem-abrigo, sem-fim, sem-vergonha), adjetivals (como nao nuclear, nao contagiosa ou ndo urgente), adverbiais (como nao oficial- ‘mente ou ndo surpreendentemente) e preposicionais (como nao por necessidaile ow ‘do com entusiasmo). Exemplos em que ha mudanga de classe e de tipo de valor semantico sao os sintagmas preposicionais sem graca ou sem pressa, formados @ partir dos nomes graca e pressa, respetivamente, Note-se que o cardter lexical de uma construcdo deste tipo é tanto mais forte quanto mais a expresso negada adquire propriedades combinat6rias de uma unidade lexical simples (cf, Cap. 9), ‘como, por exemplo, a de admitir a aplicagio de determinantes ou quantificadores (como em a nido violencia ou em todos as sem-abrigo) ou a de desempenhar funcio predicativa (como em o assunto foi classficado como nao urgente ou esta doenga & ‘udo-contagiosa). Inversamente, a estranheza do marcador de grau em ?muito nao surpreendentemente parece indiclar um estatuto menos lexical da sequéncia nao ‘surpreendentemente. Negacdo sintatica e seus subtipos Embora diversas na forma, as construgdes negativa (sto é que envolvem nega- {0 sintticae pelo menos parte da morfossinttica)tém em comum a ocorréncia dle um operador préprio, chamado operador negativo ou operador de negacéo, que em portugues pode ter as formas nao, nem ou sem, consoante os contextos € 0s valores em causa. £ corrente na literatura linguistic distingulr-se primariamente entre construgdes de negagio oracional e construgdes de negacdo de constituin- tes ¢, em seguida, entre varios subtipos destas duas classes Apesar de a distingdo entre uma negacio oracional e uma negacao de cons- titwintes ser bem aceite no plano intuitivo, parecendo impor-se como Sbvia, 0 deixa de suscitar problemas, jé que uma graride parte do que se trata como “nega- ‘20 oracional” (como em o Pedro nao fez0 trabalho) pode ser adequadamente enten- «ido como uma negagao de sintagma verbal e, nversamente,algumas construgdes lassificadas como negacio de constituintes (por exemplo} aquelas em que expres- ss como ninguém ou nada ocorrem em posio pré-verbal, como em nnguém flo ‘ou nada se sabe sobre o caso) podem justificar que se considere a presenga de uma negagdo oracional, De qualquer modo, ¢independentemente de uma cassificacao ‘mais fina que tenha em conta todas as propriedades relacionadas com a negacio, € ncontestavel, por um lado, que uma negagao de sintagma verbal e uma negacto propriamente oracional quase ndo se distinguem e, por outro, que as construgbes de nnegagdo geralmente classifcadas como nao oracionals apresentam algumas carac- teristicastiplcas de constituintes sintticos. Assim, a fim de realgar as diferencas que de facto existem entre subtipos de negacao, adotaremos aqui a clasifcacao em causa, procurando esclarecer algumas das quest6es que coloca, conforme formos, descrevendo as varias construgbes. 4431 yang 138 NEGAGKO Nega¢ao oracional [Na classe das construgdes ce negagdo oracional, agregamos trés grandes subtipos, ‘que designamos negacao oraclonal simples, negagaio oracional de subordina- ‘edo e nega¢do oracional de coordenacio. Serao em seguida identificados e carac- terizados, sendo subsequentemente suscitada a questao do estatuto gramatical do ‘operador de negacao oracional simples. Subtipos da negacéo oracional [Numa construcdo de negagdo oracional simples, um dos operadores negativos ‘nao ou nem precede imediatamente o verbo (em forma finita ou no infinitivo) de ‘uma orasdo, frdsica ou ndo, ou umm pronome clitico em préclise, tomando negativa «essa oracao (e apenas ela). £ 0 que temos em (1), com o operador nao (1) a. Nao esté a chover. (0 Pedro nao é ribatejano. ‘Alguns estudantes ndo foram a festa. ‘Metade dos estudantes nao tinha ainda decidido se ira a festa. (0 Pedro resolveu nao ir a festa ‘A Ana ndo me disse se ia a festa, peaog ‘A negagdo com 0 operador no pode ou nao ser enfética, consoante a entoa- fo. Porém, quando é usado o operador nem em vez de ndo, ao valor semantic dda negagdo oracional é acrescido um valor discursivo de @nfase da negagao, que pode marcar, nomeadamente, a surpresa de uma entidade perante a situacao des- crita?. Vejam-se exemplos: (2) a. AAna fol-se embora e nem se despediul b. O presidente da mesa nem cumprimentou a assisténcial .A.uma pergunta dessas, eu nem respondo. 4d. Nem queiras saber 0 que andam para ai a dizer de ti! ©. 0 Paulo ficou tao perturbado que nem jantou, ‘No dmbito da negasao oracional simples 6 petinente estabelecer uma distingo entre, porum lado, nega¢a#o oracional comum, que pode se realzada por no ou em ~ exemplificada em todos os dados de (1) ¢ (2) ~ e, por outro lado, negagao oracional discursiva, realizada sempre com o operador ido. Esta tltima pode ser subdividida em negacao retorica e negacao metalinguistica, Comecemos pela negaco retrica: (8) a. Nao me passas o sal, por favor? b. Nao me ajudas a arrumar estes livros? c. _ Nao me entregas este livro ao Pedro? d. Nao se importa de que eu me sente? ® Cingimo-nos&negago em orgies e em faes delaras, una vez que os tpos de ease (Scart, Imperativo,Inertogativoexclamativo ct Caps 1 e8) parece sr ndependentes do carter aemativa ‘ou negtiv das frases em que se reaizam, Sobre as nogbes de “fase” e*oak20"adotads nesta Grams, ef. Cap. 112 0 operador de negapto oracional e maradar d tate tem no se confunde com a mesma expressto ‘enquanto operador de negaczo de consituntes associado a uma ou mals propongbes implica (como femme o Pana responded pega) ~cf 143220 14.33, ses subtipos, subordina: dos e carac: ramatical do res negativos nitive) de indo negativa | ASPETOS GERAIS DA NECAGAO T4114 ‘Antes de mals, registe-se que este tipo de negagio oracional parece restrin- gir-se a frases interrogativas, as quais, independentemente da negacdo, podem ser “perguntas ret6ricas", em que o carter interrogativo tem valor meramente discursivo. Como mostram os exemplos de (3), a negagdo ret6rica consiste numa forma de negacao oracional simples em que o operador de megagao & facultativo, uma vez que tanto a pergunta de base afirmativa como a pergunta de base negativa permitem obter exatamente a mesma informagao. A diferenca € fundamentalmente de carter discursivo, envolvendo modalidades comuni cativas como a cortesia ou valores similares (compare-se, p.e., a pergunta nega- tiva mao me ajudas a arrumar estes livros? com a sua varlante positiva ajudas-me a asrumar estes livros?) A negacio ret6rica nfo tem as mesmas propriedades da comum, sendo, por ‘exemplo, incompativel com apéndices interrogativos. Por exemplo, se a (3b) se acrescentar um apéndice como pois ndo?, a negacdo passa de ret6rica a comum: no me ajudas a arrumar estes livros, pois ndo? Ao contrério de (3b), que € equiva- lente, no plano informacional, simples pergunta ajudas-me a arrumtar estes livros?, 2 frase com apéndice interrogativo faz uma afirmacdo negativa ~ no me ajudas a ‘arrumar ests livros -, a que acrescenta 0 apéndice como forma (também ela ret6- rica) de confirmagao, ‘Quanto A negacio metalinguistica, rata-se de negacao oracional associada a ‘um processo discursivo em que um falante contrapSe a uma dada proposicao uma ‘outra que nao contradiz necessariamente a primeira. Observem-se alguns exemplos, considerando que, em cada um dos pares de frases que se seguem, a primeira fun- ciona como o contexto discursivo que desencadeia a reagao de negacio (metalin- _guistica) presente na segunda: @ ‘a, Bste vinho é bastante bom. b, _Perdiio, este vinho nao é bastante bom, é excelente! 6) © Governo vai aumentar de novo 0s impostos. © Governo nao vai aumentar de novo os impostos, vai mas é perder as. leicoes, (NB: entendendo-se que a perda se segue a0 aumento) (6 a, Aminha ajuda nao é muito importante. b. Concordo, a tua ajuda nao é muito importante, é absolutamente essencial. Como se vé, em todos estes casos 0 operadlor de negacio néo serve propriamente para contradizer 0 contetido da proposicao a que esté aplicado, mas antes ou para adicionat informagio ou para relativizar a verdade de uma afirmacao prévia. Por ‘exemplo, a frase (4b) no contradiz a afirmagdo de que o vinho em causa € bas tante bom, antes a reforga, ao afirmar a seguir a frase negativa que 0 vinho é de excelente qualidade Na negacdo oracional de subordinagdo, o operador negativo sem precede imediatamente uma oragao subordinada, finita ou nao, como em (7): (7) a A/Ana saiu sem que eu desse por isso. Db. A Ana saiu sem se despedtt. Jpn 141342 wesa12 neeagao Na negacao oracional de coordenagiio, 0 operador negativo nem coordena ‘uma oragdo de valor negativo a outra igualmente de valor negativo, como em (8)*: (8) a. Os salétios nao sobem nem os presos descem, b. Nem 0s salérios sobem nem os precos descem, Estatuto do operador de nega¢ao oracional simples © estatuto semanticoe sintitico do operador negativo é bastante evidente nas negagoes de subordinacio e de coordenacdo: no primeiro caso, funciona como uma conjuncao subordinativa e, no segundo, como uma conjuncao coordena- ‘iva, em ambos os casos com a particularidade de dar origem a uma frase que € a versio negativa (e contradit6ria) da que se obtém sem tal operador.Jé na negagdo ‘oracional simples, oestatuto do operador negativo 6 menos claro, como se vers de seguida (restringindo-nos & negacdo comum, dadas as pecullaridades seménticas das negacoes discursivas). Em sintese antecipada, o que sobre esta questo parece razodvel pensar-se & que a construgdo aqui designada “nega¢ao oracional simples” pode corresponder a diferentes modos ( até posicdes) de aplicasio de um operador negativo e, consequentemente, a diferentes arranjos de significado, © que estamos aqui a identificar como “negagao oracional comum” tem sido caracterizado de maneiras diversas por diferentes autores*. Destacamos segulda- ‘mente trésconceg6es possvels “© O operador de negaso est aplicado externamente a uma proposigao completa sta caracterizagdo faz pleno sentido para frases sem sujeito como (La) e também seria admissivel para (1b e (1), por terem como sujeitos nomes préprios, portanto imunes a relagoes de escopo, mas jé faria menos sentido para (Ic) € (1d), ndo s6 por se afastar da ordem visivel dos constituintes da frase, como acontece também com (1b) e (10), mas também porque exige uma sintaxe abstrata complexa que subtrala (0S sujitos ao escopo da negacso. © Ooperador de negacao aplica-se, i maneira de um advérbio, ao sintagma verbal. Neste caso, 0 operador de negagio da origem a uma denotaco complementar da do sintagma verbal, hipétese que dé conta, sem problemas, de todos 0s dados de (1). ® A negagio oracional é vista como um modo de predicacéo, isto é como uma forma de (no caso mais tipico) associar um sujeito e tim predicado tendo como resultado uma proposigao com operador negativo, com a particularidade de essa roposicao poder ficar sob o escopo desse operador; para esta terceira possibilidade (defendida, entre outros, por Horn 1989, que a faz remontara Aristoteles), tal como para a anterior, os dados de (1) nao si problemsticos. ‘A malor parte das construgdes do portugués aqui classificadas como “negagao oracional simples” aparentam, a uma primeira andlise, poder ser adequadamente tratadas como negagio de sintagma verbal. Isto verifica-se nomeadamente porque, ‘como veremos adiante, a lingua portuguesa apresenta certas particularidades no (que respeita a relagdo semantica da negagio com os sintagmas nominais. Por “fm 14.22, €refrda uma anise altemativa ests consti também 0 Cap 35, * Horn (1989) constitul uma fonteesiencal de informaga, nomeadamente bibliog outa qustoestlacionadss com 8 nega. ceca desta al do ». na no ide mo io te ue, no Por ASPETOS GERAIS DA NEGAGKO 1413.12 ‘exemplo, dada uma frase como todos os estudantes estrangeiros ndo vieram a festa, a ‘inica interpretagio possivel é a mesma de nenhum estudante estrangeiro veio a festa, nao estando disponivel uma interpretagio equivalente a nem todos as estudantes estrangeiros vierant & festa’. Nao é assim em Iinguas como o frances ou o inglés, em. {que frases com sujeitos quantificados universalmente geram ambiguidade. De facto, as frases correspondentes a nossa frase portuguesa — respetivamente, tous les étudiants trangers ne sont pas venus i: la fétee all foreign students didn’t attend the party ~ si0 ambiguas entre a interpretagio equivalente a nem todos os estudantes estrangeiros vierart a festa ea interpretagio equivalente a nenhu estudanteestrangeiro veio a festa E, talvez mais estranhamente ainda para falantes de portugués, linguas existem em que as frases correspondentes a uma frase portuguesa como um estudante nao veio 4 festa podem ter, em fungao da entoacio, tanto a interpretacao existencial que se obtém em portuguts (equivalente a hd wm estudante que nao veio festa) como uma interpretagao de negacdo existencial (equivalente a nenhum estudante velo a festa), que a frase portuguesa nao admit. Nao obstante as restrigdes acabadas de referis, hé que tet em conta que, em Portugués, certos sintagmas quantificados originam ambiguidade quando se situam a direita do verbo, como em nao responderam & pergunta mais de dez estudantes (woltaremos a este assunto em 14.2.1.2). Ora, uma negacio de sintagma verbal que contemple estes casos ndos6 é semanticamente problemitica como requer uma sintaxe bastante complexa. Além disso, hé ainda que ter presentes outros factos dificlmente explicdvels com negagio de SV. Um deleséilustrado por sequencias de frases como esta (9) Nenhum dos membros da direcao pediu que o assunto fosse agendado, porque, se [1 tivesse pedido, té-o-ia sido, Note-se que a interpretagao do sujeito nulo assinalado por “[-1" s6 pode set dada pelo sintagma nominal indefinido algum das membros da diregao, que nao figura visivelmente no texto, assim sugerindo que nenhum resulta da incorporagao de um ‘operador negativo ao determinante indefinido positivo algun, ‘Assim, se se pretender construir uma gramatica de alcance translinguistico & ccobrir determinados factos da lingua portuguesa, a hipstese aristotélica da negacao. ‘como modo de predicagdo é a que se afigura mais adequada para um tratamento econémico e elegante da negacio oracional. Todavia, nio se requer aqui a tomada de uma posigio apoditica sobre esta matéria, atentos os objetivos predominante- ‘mente descritivos que sdo prosseguids. A concluir esta breve subsecco, convém acentuar que, mesmo que tanto a ‘nega¢do de sintagma verbal como a negagdo proposicional externa nao possam ser .generalizadas pata caracterizar toda a negacdo oracional simples, hd certos factos linguisticos que sé sio compativels com uma ou com outra eno com a negagdo como. modo de predicagao. © primelto tipo de factos esté patente em dados como estes: (10) a. Estas criangas nado t0m pai ou nao tém mae. b. Estas crlangas nao tém pai ou estas criangas nao tem mae, Em texmosténicos, dase que, em porsguts, negagao no assume “escopo lego" retvamente sintagmas quantiscados colocados sta esquerda, quando esta posi cnénica dos mesos Le. no ‘resultant de desloayio) A nordo de “escopo”€explicada em 18.2.1, 44132 4132 wecacko Repare-se que a frase (10a) serd verdadeira dado um grupo de crlangas que tanto podem ser drfas de pai como 6rfas de mae (ou dos dois), distinguindo-se, por isso, da frase (10b), formada por coordenagao de orag0es, que $6 seré verdadelra se as criangas do grupo em causa forem todas 6rlas de pai ou todas érfas de mile. Assim sendo, a primeira frase ndo pode ser tomada como resultante de algum proceso de redugdo da segunda, pelo que as negacbes nela presentes sao inquestionavelmente de sintagma verbal. O segundo tipo de factos em questio € ilustrado por coorde- nagdes de oragées como as que se seguem: (11) a. Bu ndodesarrumo uma loja para experimentar roupa es6 no fim pergunto, 105 pregos, b. Nesta empresa, um funcionério ndo faz um bom trabalho num primeiro ano € a administragio promove-o logo no ano seguinte. Observe-se que, embora 0 operador negativo surja, nos dois exemplos, na posigdo tipica de negacdo oracional na primeira orago coordenada (eu naa desarrumo uma loja para experimentar roupa, no primeiro exemplo, ¢ um funciandrio ndo faz um bom trabalho num primeiro ano), 0 que de facto se nega é a frase composta resultante da coordenagao das duas oracdes, ou seja, 0 primeiro exemplo 6 equivalente a ndo verdade que eu desarrumo uma loja para experimentar roupa e s6 no fim pergunto 0s ‘precos. Estes factos sugerem que uma negacio que obedece a descricao da negacio oracional pode de facto funcionar como uma negag3o proposicional, isto é, uma hnegagdo externa a orago ou frase em que ocorte’. Negagdo de constituintes Classifia-se como negagio de constituintes uma grande valedade de construgbes formadas por um operador negativo aplicado a um consituintesintatico de valor positivo, Neste Ambito,dstinguemse a negasao de sintagma verbal, a negagao wantificacional e 3 negagdo nominal com sem. Como j vimos, € pertinente considerar como negacio de constituintes uma negagio de sintagma verbal resultante da aplicagdo de um dos operadores negatl- ‘0s!o ou nema um sintagma verbal. Porém, dado que do nos debrugamos aqui sobre as propredades que podem resular da diferenga ence uma negagao oacional genuina e uma negacéo de sntagma verbal, ambas com a mesma ordem de consti tints, itima ser também referid, por simpliicasto, como “negcto oraciona” Expressamente lassificada como negagdo de sintagina verbal, ha anda acon- siderar a negagio com o verbo negativa deixar, como na frase o Peo dean de fazer wa viagem importante por caus das eeiges, que significa o Peo nao fee uma Viagem importante por causa das eleiges: * Como éconhecdo da erat, o mesma eft de scopoarg pode core estrutras com oagbes subordinaas: esta el no € menos inpetate pore plea pouca get ue pode sex pararaseada por no peo facto de se aplicar a pouca ente que eva Ie € menos importante’. Note orem. que neste caso ‘2 escopo largo da negacio article facmente com ms nqagio de sintagma verbal, * Obviamente, importa nio confundi © verbo negatvo dar com visas outoe seus homnimos, que encontramos em faes como a Ana det lio am eas, o eal dea An, « Ana dono Pao ear «Arden oc fii, Ana dese car Bio, in ta deur wna casa, 0 Pano denn de fama (nu date dfs. ASPETOS GERAIS DA NECAGKO 143.2 ‘A negagao com o verbo deixar apresenta algumas particularidades. A pri- ‘meira consiste na auséncla de ambiguidade de escopo relativamente ao adjunto adverbial, a0 contrario do que acontece quando ocorre 0 operador nao. Em rela- io ao exemplo acabado de dar, isto significa que a frase o Pedro nao fez uma via- gem importante por causa das eleicdes pode significar nao foi por causa das eleigdes que o Pedro fez uma viagem importante, mas esta interpretacdo ¢ impossivel com 0 verbo negativo deixar. ‘Outro facto tipico da negagao com deixar consiste na possibilidade de este verbo, ao contrario dos outros operadores negativos, ser compativel com expres- s0es do tipo de nenhum (adiante designadas “expressoes intrinsecamente negati- vvas") em posi¢ao pré-verbal, como nos exemplos que se seguem (sobre restrigoes @ estas ocorréncias, ef. 14.4.1): (12) a. *Nenhum doente ndo seréatendido por nfo estar inscrito na consulta ’b. Nenhum doente deivard de ser atendido por nao estar inscrito na consulta, Note-se ainda que o verbo negativo deixar tem fortes restrigbes de ocorréncia, patecendo ser favorecido por contextos em que se exprime uma dependéncia (nomea- damente, de tipo causal ou final) entre duas situagdes, Vejam-se as frases seguintes: (13) a. A Sara ndo jantou. b. Sara deixou de jantar, Enquanto a primeira frase nega que se tenha verificado a situagao de a Sara jantar, a segunda, diversamente, exprime um valor aspetual, tendo um sentido prOximo do da frase a Sara costumava jantar, mas agora jd no janta, que nada tem a ver com ‘oda anterior frase negativa. Porém, em contextos como os que a seguir se exempli- ficam, quer 0 operador nao quer o verbo deixar introduzem um valor de negacao: (14) a. A Sara nao jantou por tua causa. b. A Sara deixow de jantar por tua causa, (15) @. © Pedro nao fez. bons negécios para acompanhar a mulher na doenca. b. 0 Pedro detxou de fazer bons negécios para acompanhar a mulher na doenga. Um segundo subtipo de negacao de constituintes é a negagao quantificacio- nal (a que, pela sua amplitude, € dedicada a seccd0 14.3). Os constituintes que rea- lizam este tipo de negagao envolvem sempre um valor de negacao e um valor de quantificago, podendo este estar implicito, Em todos os casos, um dos operadores nnd ou nem precede, imediatamente ou ndo, um sintagma nominal quantificado, originando um valor quantificacional complementar. Distinguem-se os diferentes formatos sintéticos que a seguir se descrevern. (i) Negagao quantificacional por aplicagao direta de um operador negativo a um ‘quantificador, como em (16a-c): (16) a. Estavam na festa ndo muitas estudantes. 1. Nem todas as raparigas foram a festa. Nem vinte estudantes estavam na festa. wasaa necacko (li) Negasio quantificacional por aplicacio do operador negativo nem ao quan- tificador de um sintagma nominal quantificado precedido de preposicao, como em (17a,b), ou a uma expressao adverbial que implicitamente contém © quantificador universal, como em (17¢): (17) a. Nem com toda a gente podemos simpatizar. b. Nem com vinte pessoas podemos contar. © Nem sempre se tem razao, (Gi) Negasao quantificacional por meio de express6es intrinsecamente negativas (ou, por brevidade, expresses autonegativas) como ninguém, nada ou manca, (0410 quantificadior nenhum e suas variantes morfol6gicas em combinagio com ‘um nome’ (18) a. Ninguém protestou, b. Nada me suxpreende, ©. Nenhura estudante respondeu a pergunta. (@v) Negagio quantificacional por aplicagao do operador negativo nema sintagmas nominais coordenades: (29) Nem a Ana nem o Pedro dangaram. (¥)Negagao quantificacional por aplicagao do operador negativo nem a um sin- tagma nominal de valor referencial, obtendo-se um valor quantificacional implicito (L., por “implicatura”)®, como em (20), onde se afirma explic- tamente que uma entidade (a Ana) ndo dangou e, implicitamente, que era de esperar que ela dancasse e, além disso, que mais ninguém (de um grupo contextualmente identificével) dangou (0 que constitui uma assergdo quan- tificacional implicita) (20) Nem a Ana dangou. Por tltimo, exemplifica-se a negagio nominal com sem, abrangendo a aplica- ‘$20 do operador de negacio sem tanto a grupos nominals como a sintagmas nomi- nals (sobre esta diferena, cf. Cap. 20). Nao send lexical (ao contrério dos casos jé referidos do tipo de sem-abrigo), esta classe de negaciio de constituintes tem uma sintaxe rudimentar que nao justifica aqui um tratamento desenvolvido. Flea exem- pilificada em (21), onde o operador negativo sem surge aplicado aos nomes fiundo € ‘mangas, gerando os modificadores de grupo nominal ser fimido e sem mangas, ¢ 20 * Laka (1990) wou para a expresses conespondentes em cstelhano a ningun, nado, munca, jonas e ‘onium Na desigagio ingest“ word abreiando naive word. ™ Anogio de implicatura fol introduzida pelo filésoto Paul Grice et 1967 aparece em forma publicada ‘em Grice (1978), Pode denise como «uma proposio que & impicada pela enunciated wana fae le embora ese proposigto no faga parte nem Seje ma conseutncia loca dn que reslnente dees (Gazdar 1979:38, tn) Ao ipo deimplieatura presente na tase (20), Grice hamou implicatura convene ‘onal, por depender apenas das expresses ulisadas. Aum outo tipo, que est tambem dependents de fatores contexts ituago conhecimentoprévio da ealidde, entre tts) chamou implicates con ‘vesacional. Por exemplo, se, perante uma pergunta sobre a qualidade de umn filme gu sgt ol vee 4 respota for apenas “a misca ea bot, pode ser ego infer, or impletur convenaconal que estos questionada nfo encontiou outasqulidades no filme sintagn verbal a Aspete A prese negac simples entre w 0 dasa nomini de suba tipos d eaneg Variant As cons sintatia existens negacke respeita discursi NN C—O ASPETOS PARTICULARES D& NEGAGAO HRASICA 14211 sintagma nominal alguns colaboradores habitual, gerando 6 modificador de grupo verbal (nesta Gramética, um adjunto adverbial) sem alguns colaboradores habituas: (21) a, Esta tarefa revelou-se um poco sem fundo, b. Anoiva levava um vestido sem mangas © Estou a trabalhar sem alguns colaboradores habituais, Aspetos particulares da negasao oracional AA presente seceao ocupa-se da variacto sintética e semantica das construgbes de ‘negasio oracional, em fungao de diversos fatores. No Ambito da negacdo oracional simples, anallsam-se, em 14.2.1, dois dominios de variasZo: primeio, oda relacéo centre uma oragdo negativa e a correspondente forma afirmativa e, em seguida, © das relagées de escopo entre um operador de negacio oracional e sintagmas pominais. Em 14.2.2, observam-se as diferentes realizagdes da negacio oracional de subordinagao e de coordenaco, Finalmente, em 14.2.3, s4o caracterizados tres tipos de construgbes especials de negacto: a dupla negacio, a negacdo reforcada ea negacao expletiva, Variantes das construcdes de negacdo oracional simples As construgdes de negacio oracional simples, que, como se vit, se caracterizam sintaticamente por apresentarem uma particula negativa a preceder imediatamente ‘um verbo em forma finita (os bebés no choraram/os bebés no tém chorado) ou no infinitivo (tentaremos n@o acandar os bebés) ou ainda um pronome pré-verbal (as ‘riangas nao se sujaram), nao sao uniformes no plano semantico, podendo variat fem relacdo a alguns fatores. Um deles é a propria natureza da relagao semantica existente entre uma ora¢do negativa e a sua correspondente afirmativa. Outro. tem a ver com as relagdes de escopo que podem estabelecer-se entre o operador de ‘egacdo constituintes nominals ou adverbiais presentes na oragdo. Outto ainda respeita a selego do operador nem em vez de ndo, que tem implicagoes de tipo dliscursivo, Cada um destes dominios de variagdo semantica das oragbes negativas serd em seguida considerado, Relaco semantica entre oragdes afirmativas ¢ riegativas A relagdo semantica entre oragoes (frdsicas ou no) afirmativas e negativas nao € sempre a mesma, dependendo das construcdes nominais envolvidas. Obser- ‘vem-se exemplos onde o sujeito & um nome proprio ou um designador de espé- he (as baleias): (22) a. 0 Pedro nao 6 portugués. D. O Pedro ¢ portuguds. (23) a. Asbaleias nao respizam por guetras, b. As balelas respiram por guelras. Em ambos estes pares, a frase negativa é contraditéria da correspondent afirma- ‘iva, isto €, se uma é verdadeia, a outta ¢ falsa. A contradicéo verifica-se porque as ‘duas frases atribuem a uma mesma entidade (o Pedro ou a espécie das baleias) duas SN aaa necacko propriedades que se excluem mutuamente (‘ser portugues’ ¢ ‘ndo ser portugués’, ‘num caso, ¢‘respirar por guelras’e ‘ndo respirar por guelras’, no outro) ¢ tal facto, dado 0 tipo de construgdes nominais em causa, gera contradigao. A relagdo de contradicao é confirmada pelo facto de as frases negativas que se seguem serem equivalentes a (22a) ¢ (23a), respetivamente: (24) Nato é verdade que o Pedro € portugues. (25) Nao é verdade que as balelas respiram por guelras. Estas sdo frases negativas em que o predicador principal é a expressao ser verdade, tendo como seu complemento as afirmativas (22D) e (23), e que, semanticamente, realizam uma negacao contraditéria destas mesmas frases afirmativas. Na perspetiva dda exclusio, pode-se dizer que cada uma das frases negativas de (24) ¢ (25) exclui uma dada situagao do conjunto das situacoes verificadas na realidade (respetiva- mente, a situacio de o Pedro ser portugués e a situagao de as baleias respirarem por guelras), ou, mais tecnicamente, que tal situacio nio pertence ao conjunto das situagbes verificadas. ‘Com outros sintagmas nominais na posigio de sujelto, uma frase negativa com a mesma estrutura das observadas em (22) ¢ (23) nao € contraditéria da cortespondente afirmativa, como mostram os seguintes dados, em que os sujeltos ‘contém um numeral cardinal (de2) ¢ 0 determinante indefinido (e quantificador de tipo existencial) alguns: (26) a. Dez estudantes ndo s2o portugueses. b. Dez estudantes so portugueses. 27) a Alguns estudantes nao sto portugueses. b. Alguns estudantes sao portugueses [As frases de cada um destes pares no séo contraditérlas entre si. © que se verifica é que, em cada par, e dependendo do namero de estudantes existente no contexto, tanto podemos tet uma frase verdadeira ¢ outra falsa como ambas verdadetras ou “ambas falsas. De facto, a contradicao s6 se verifica em frases com a estrutura sinté- tica de (22)-(23) quando o sujeito € um nome proprio com ou sem determinante (no exemplo dado, 0 Pedro) ou um designador de ¢spécle (como as baleias), que tem ‘um estatuto semfntico muito semelhante ao de um nome proprio. Veja-se outro exemplo de negacio nao contraditéria: (28) a. Mais de metade dos estudantes nao sio portugueses. b. Mais de metade dos estudantes sto portugueses, ‘Uma ver-mais, temos um par de frases que no s2o contraditérias, mas sim, em ter- rminologia légica, contrérias, uma vez que nio podem ser ambas verdadeiras, mas podem ser ambas falsas (por exemplo, numa situacZo em que exatamente metade dos estudantes sao portugueses). {1} © comportamento em cause dos nomes propris e dos designadores de espécie idecorre de possuirem simultaneamente as duas sequintes propriedades semanticas, idenifcadas no que diz respetto a expresses das Iinguas natras por Zwart (1998) ASPETOS PARTICULARES DA NEGACRO FRASICA 14212 (02 propriedade da conssténcia, que, rio existe qualquer unidade de valor negativo na oragao que justifique a ocorrén- ae cia do operador negativo expletivo. Em qualquer dos casos, trata-se de construsdes es sobre que é dificil -e talvez imprudente ~ proferirjuizos de gramaticalidade, sendo de admitir, pela sua grande frequéncia, que {4 estdo legitimadas como marcadores « {tata desgnaedo padece de alguna impropiedade uma ver que, por um lado, 0 opeador expletivo, ‘semanicamente nul aparece hugate da fase onde no se apis o valor ngatvo Go pimelro ope ‘Sore por outro pod nem segue exis ientdode formal entre nidade ngatva com valor semtico ‘ea dade tomade como “redundant”, ASPETOS PARTICULARES DA NEGAGAO QUANTIFICACIONAL 142 cenféticos. Comecemos por ver casos ditos de negagao redundante (onde 0 opera dor em itilico constitui o elemento entendido como redundante em relacgio a0 (que aparece sublinhado) (49) a. Nao tarda muito que nao chovat b. £ dificil nao lermos estes resultados sem um profundo sentimento de nostalgia. (bli, 18.03.1999) © no se passa um tinico dia sem que as federages do patronato mao fagam declaragdes alarmistas. (gress 27.04.1996) ‘Nao poderia detxar de fazer outra coisa (blo, 16.11.1998) &. Fui'ver o que se passava com a famosa lel 50/90 e verifco, com espanto, que nada de nove ela altera ao que tacitamente nda estivesse jé disperso por algumas leis. pabice, 27.03.1994) f. tal ndo impediu que no houvesse criticas violentas actual direcsto (ic, 1310199) Vejamos agora exemplos de negaco expletiva nao redundante: (50) a, As coisas que eles nao terio dito! (0 que eles no terdo sofrido para subir aquela montana! ‘Quantas pessoas eu ndo conheco que aceitariam este trabalho! Imagino o que nao vai ser preciso gastar nestas obras! Seo local néo ficou mais bonito, esta agora, pelo menos, com a cara lavada © um ar mais arrumado, até que o vandalismo, um dos receios dos ven- dedores, ndo dé cabo da estética. (iti, 13.11.1996) £. Podemos sempre interrogar-nos sobre 0 que nao teria acontecido em alguns dos pafses para onde a ONU costuma mandar missbes de fscalizagio das eleigdes para avaliarem se elas foram limpas ejustas. Exes, 18.11 2000) 343. Aspetos particulares da negasao quantificacional ‘A negacdo de constituintes quantificacional aqui descrita ¢ realizada pelos opera- dores negativos nao e nem e pelas express6es autonegativas,jéreferidas em 14.1.3.2 Quando aplicados a um quantificador, os operadores ndo e nem dao origem a um constituinte negativo, que designamos quantificador negativo", sendo.o quantifi- ceador de base a que se aplica o operador designado quantificador positivo. A partir dos quantificadores negativos, de contagem ou de medigao (cf. Cap. 21), formam-se sintagmas negativos (nomeadamente, nominais e adverbiais).Os sintagmas negati- vvos podem também ser obtidos por aplicacaio de nema constituintes de outras classes além dos quantificadores, nomeadamente a nomes proprios, sintagmas determinados cesintagmas nominais coordenados, como se vers ja de seguida eem 14,3.2.2, adiante © primeiro tipo de negacao de constituintes quantificacional aqui considerado (em 14.3.1) 6 negagdo da universalidade (como em nem todos ou rtem sempre). Em segundo lugar (14.3.2), vém os constituintes de negacao existencial, realizada por " Bastante comum o uso da designagto“quantiicador negado” para expresses composts com nao (ou seus equivalentes noutras linguas) e“quantiicadornegativ par as expresdes a que agulchamamos autonegtivas” (come ningun, MM E 1431 NEGACAO. cexpressdes como ninguém, nada, nem um elefante ou nem o Pedro nent a Ana, Em texceto lugar (14.3.3), s40 introduzidos os constituintes de negagdo de cardinalidade, realizada, por exemplo, por nem dez ou nem metade. Do ponto de vista semantico, as rnegagbes existencial ede cardinalidade constituem formas de negacio da igualdade ‘ou superioridade, dado que em ambos os casos ¢ transmitida a informagao de que uma determinada quantidade nao é igual nem superior a um dado valor (ou, equivalentemente, ¢ inferior a esse valor) ~ por exemplo, com nen (que nos remete para 0 niimero 0, inferior a1), ou nem vinte (que nos remete para valores Inferiores a 20). Rigorosamente, também a negacio de universalidade poderia caracterlaatse nestes termos, embora neste caso s6 a negacio da igualdade seja relevante. Tanto a negagio da universalidade como ade cardinalidade so realizadas pelo operadar nem. Passa-se 0 mesmo com a negagao existencial, com excegio dda nogacao existencial de classe, que ¢ efetuada pelas expressBes autonegativas Em quarto e Gltimo lugar (14.3.4, séo apresentados os constituintes negativos ‘que exprimem negagio da inferioridade ou negacio da superioridade, ito é, que ‘negam quea quantidade de entidades sobre que se predica sea inferior (nao poucos, no menos de cem) ou superior (no muitos, no mais de vine) a um valor expresso por um. ‘numeral ou contextualmente subentendido. Sdo todos formados com 0 aperador nao. Nega¢&o da universalidade ‘A negago da universalidade constitui uma forma de nega¢o da igualdade (a um determinado valor quantitativo, no caso o ntimero total dos membros ce um con- junto), Realiza-se pela aplicacdo de nem a um quantificador universal, de contagem ‘ou de medigao, precedido ou nao de preposicio, ou a uma expresso adverbial que ncorpore o valor do quantificador (como € 0 caso de sempre) (51) a, Nent todos os estudantes tinham lido o livro. [Nent tacos os membros desta equipa levantariam esta pedra2" [Nem em toda a gente se pode confiar, ‘Nem todo 0 campo est lavrado, ‘Nem por tados os meus amigos me sacrifcaria tanto, ‘Nem em toda a parte se vive em liberdade. {Nem sempre podemos estar bem dispostos. Note-se que em todas estas frases o operador nem surge em posi¢do inicial de frase. ‘Uma das caracteristicas deste tipo de negacio reside precisamente na imposs lidade de a sequéncia formada por nem e o constituinte de valor universal a que sti aplicado ocupar outra posigao na frase. De facto, um constituinte de negacio de universalidade com nem s6 pode surgir em posigao nao inicial numa oraca0 se ‘outro constituinte for topicalizado, como em o liv, nem todos os estudanteso tnham lido (no caso, 0 constituinte inicial 9 livo esté deslocado para a posicio inicial) ‘A tigidez posicional da estrutura de nem aplicado a um quantificador uni- ‘versal poderia sugerir estarmos perante uma forma de negagao oracional externa, semelhante & negacdo oracional de subordinacio, Esta hipétese parece, porém, © A impordncia desta macrolaseé manifesta no papel que desempena no fenomeno da concordincla negate (145.1. > kia ambigua entre tur coletva eet dstbutivs, facto agulielevante pouco plas Dials, ipica (52) a. *N b. *N Tambéa tivo ter esea 0 sem de ne versalidade: diferenciags semintica ¢ ficagao uniy Ambito da 9 Negagio« Anegacaos (realizads 9 existencial negacao ex serd tratadal Negacdo A negagso. incluem o« sintagmas: (eainda new Seguem-se¢ (63). N N N 5 Como suge ‘mem por 3 sobre o qua tece com Frum, form outros casa prlo quant no caso de} Deve & negativo, a elementog cula de neg nhecido pal

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