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O Problema Mineral No Ceará
O Problema Mineral No Ceará
Pedro D’ Andrea
BRASIL, JUNHO DE 2023.
-
Expediente
ISBN Nº e DOI
-
AUTORES
Erivan Silva
Pedro D’ Andrea
APRESENTAÇÃO
Talita Furtado
REVISÃO
Sandy Carvalho
DIAGRAMAÇÃO E ARTE
Mayra Souza
REDES
MAM – Movimento pela Soberania Popular na Mineração
mamnacional.org.br
@mam.nacional
@mamnacional
@mamnacional
Sobre
os autores
Erivan Silva
Mestre em Geografia Humana pela Universidade Estadual Vale
do Acaraú – Dinâmica territorial: campo e cidade. Graduação em
Licenciatura Plena em Ciências da Religião e Ciências Sociais pela
Universidade Estadual Vale do Acaraú. Especialização em Educa-
ção Ambiental pela Universidade Regional do Cariri. Membro do
Movimento pela Soberania Popular na Mineração.
Pedro D’Andrea
Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Geograf ia da
Universidade Estadual do Rio de Janeiro – Faculdade de Forma-
ção de Professores. Membro do Movimento pela Soberania
Popular na Mineração.
Índice de figuras
MAPAS
Mapa 5. Área em processo de pesquisa para mineração de ferro. Fonte: MAM, 2022.
GRÁFICOS
Gráfico 1. Processos Minerários por Substâncias Minerais (10 maiores) – 2000 a 2021, Ceará.
Gráfico 2. Demanda por Área (em hectares) por Substâncias Minerais (10 maiores) – 2000 a
2021, Ceará.
Gráfico 6. Interesse Minerário por Empresas – 50 maiores (número de títulos): 2000 a 2021.
Gráfico 7. Interesse Minerário por Empresas – 50 maiores (área em hectares): 2000 a 2021.
Gráfico 11. Vazão Setor Mineral x Setor Industrial (litros/dia) – Ceará, 2022.
TABELAS
5
Coleção:
O Problema Mineral
no Ceará
Mineração no estado do Ceará?
6
milhões de anos de formações geológicas na absurda produção
média de 400 milhões de toneladas/ano, amputando a base de
qualquer possibilidade de projeto de soberania nacional.
1
Disponível em: Disponível em: http://emdefesadosterritorios.org/essencialidade-forjada-e-danos-da-mineracao-na-pan-
demia-da-covid-19-os-efeitos-sobre-trabalhadores-povos-indigenas-e-municipios-minerados-no-brasil/(Acesso em 16 de
setembro/2022).
7
setor. E qual a extensão do índice de terceirização e das violações
de direitos dos trabalhadores mineiros em nosso estado?
2
Disponível em: https://www.brasildefatomg.com.br/2019/04/29/no-brasil-1-milhao-de-trabalhadores-estao-na-minera-
cao-e-80-sao-terceirizados#:~:text=Se%20a%20gente%20pegar%20o,s%C3%A3o%20contratados%20diretos%20da%20mi-
nera%C3%A7%C3%A3o (Acesso em 16 de setembro/2022).
8
Passados quase 100 anos, a dinâmica de acumulação do
setor mineral foi drasticamente alterada e, conforme buscamos
mostrar neste primeiro volume da coleção O Problema
Mineral no Ceará, a fase da maior e mais vertiginosa expansão
da mineração no estado ocorre no atual momento histórico
e apresenta sua face mais financeirizada, moendo mundos e
trabalhadores, agudizando e desterritorializando os territórios
Quilombolas e Indígenas, ocupando os espaços de reprodução
social do campesinato, exportando tecnologia e trabalho.
9
Trata-se de um chamado do Movimento pela Soberania
Popular na Mineração às organizações, movimentos, sindica-
tos e universidades cearenses a formularem desde suas práxis
políticas o lugar da mineração no estado do Ceará na teoria da
exploração mineral no país. O conjunto de publicações anuais
buscará reunir aqueles e aquelas que se propõem a pensar um
outro modelo de mineração para o país desde o Ceará e o
nordeste brasileiro, para consolidar uma perspectiva crítica de
debates e embates para aquela que tem sido a importação do
e para o estado de um modelo de saque, espoliação, mercanti-
lização da natureza e super-exploração do trabalho.
Os organizadores
10
Apresentação
3
Professora da Universidade Federal Rural do Semiárido. Doutora em Direito pela Universidade de Brasília. Pesquisadora
do Núcleo Tramas. Membro da Articulação Antinuclear do Ceará e da Rede Brasileira de Justiça Ambiental.
11
Por outro ângulo, tal expansão contribui para acirrar
o cenário de conflitividade no país. O mapa produzido pela
Universidade Autônoma de Barcelona identificou que o Brasil
ocupa a posição de terceiro país do mundo com maior número
de conflitos ambientais4, os quais envolvem majoritariamente
a questão agrária, da água e da mineração. Além disso, esti-
ma-se que 40% das terras indígenas do país estão há menos de
10km dos 30.554 empreendimentos extrativistas em funcio-
namento legalizado no Brasil e que 38% dos conflitos socio-
ambientais latentes oriundos desta proximidade estão locali-
zados no Nordeste5. Tais conflitos carregam, ainda, a violência
como traço central. Dados sobre o assassinato de ativistas
ambientais no mundo em 2019 revelam que, dos 212 ativistas
mortos, 50 deles estavam engajados em conflitos envolvendo
mineração, número que se acredita subnotificado6.
4
EJOLT. Environmental Justice Organizations, Liabilities and Trade. Environmental Justice Atlas, 2016. Disponível em:
http://ejatlas.org/, acesso realizado em 20.10.2022.3
5
Informações disponíveis em <http://livre.jor.br/latentes/>, acesso realizado em 12.10.2022.
6
GLOBAL WITNESS. Defending Tomorrow: The climate crisis and threats against land and environmental defenders.
London: [s.n.]. Disponível em: <globalwitness.org>, acesso realizado em 20.10.2022.
12
a qual consiste na expropriação simultânea do trabalho, dos
bens naturais, dos vínculos coletivos e do conjunto de ativi-
dades locais que sustentam a vida, promovendo uma ofen-
siva racializada contra os sujeitos comunitários na disputa
pelo controle e gestão de seus territórios.
13
reforma agrária às avessas, o setor avança sobre territórios
tradicionalmente ocupados no Ceará, disputando mais de
quatro milhões de hectares de terra, o que corresponde a um
terço de todo o estado. Com isto, renovam-se os debates sobre
a questão fundiária e as novas cercas que expulsam povos e
comunidades do campo.
14
de captação de água e podem atingir três importantes bacias
hidrográficas (Acaraú, Curu e a Arataiaçu). Neste caso, já há
compromisso do governo estadual com a construção de adutora
de água para o empreendimento, além de outorga concedida
pela Agência Nacional das Águas, a despeito do fato de que a
viabilidade hídrica do projeto ainda esteja sob análise no órgão
ambiental federal.
15
O texto aponta, portanto, uma crítica ao Estado e à sua
incapacidade de deter os efeitos da injusta expansão mine-
ral, sobretudo quando se alia à ela de forma indiscriminada.
Observa-se que há em curso um aceleracionismo antiambien-
tal na esfera normativa impulsionado neoliberalismo em asso-
ciação com o regime extrativista, de forma que as minerado-
ras vêm atuando ativamente contra as normas estabelecidas.
Esta cartilha sistematiza algumas destas incidências, a exemplo
do Projeto de Lei 5822/19, que autoriza a exploração mineral de
pequeno porte em reservas extrativistas; o Decreto Federal nº
10.966/2022, que institui o “Programa de Apoio ao Desenvol-
vimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala”, equi-
parando o garimpo nesta categoria; e o Projeto de Lei 571/22,
que permite que o presidente da República declare a minera-
ção uma questão de interesse nacional, liberando a extração em
qualquer área do País.
7
Informações obtidas em < https://www.gov.br/anm/pt-br/assuntos/noticias/anm-e-cni-firmam-acordo-para-acelerar-pro-
cessos-minerarios>, acesso realizado em 20.10.2022.
8
Informações obtidas em <https://observatoriodamineracao.com.br/o-governo-pode-fazer-o-que-bem-entender-sobre-mi-
neracao-em-terra-indigena-diz-lider-de-lobistas-com-influencia-direta-em-brasilia/>, acesso realizado em 20.10.2022.
16
Esse perfil de repertório discursivo pode ser desarticu-
lado a partir das contribuições críticas que este texto organiza,
sobretudo ao transparecer que o crescimento do setor não
vem acompanhado por evidências que mensurem vantagens
relativas quando se consideram os custos econômicos, sociais
e ambientais dos seus impactos destrutivos. O olhar lançado
pela cartilha, desta forma, vai além do estudo de empreendi-
mentos pontuais ou locais e contribui para uma revisão crítica
do modelo institucional e econômico que baliza a mineração
no país.
17
locais, do patrimônio histórico-cultural, das memórias e dos
afetos coletivos, as lutas comunitárias se opõem às injustiças
que o setor promove e presenteiam o conjunto social com os
benef ícios da biodiversidade que resguardam.
Boa leitura!
18
1. O Problema
Mineral Brasileiro:
Uma breve consideração
O Rio? É doce.
A Vale? Amarga.
Ai, antes fosse
Mais leve a carga.
Entre estatais
E multinacionais,
Quantos ais!
A dívida interna.
A dívida externa
A dívida eterna.
19
Parafraseando Raymundo Faoro em sua obra “Os Donos
do Poder” lançada em 1958, “o Estado brasileiro nasceu contra e
sem o povo” e a mineração também. Nessa perspectiva, a explo-
ração mineral brasileira começou há mais de 300 anos com o
seu primeiro momento histórico na chamada corrida pelo ouro
ainda no período colonial, que durante todo o século XVIII
marcou a expropriação da colônia que alimentara a acumulação
primitiva para dar vida ao nascimento do capitalismo na Europa.
20
Segundo Coelho (2015), a CVRD nasce com f inancia-
mento dos EUA e da Inglaterra (Acordo de Washington9) que
durante três anos repassou toda a produção mineral para os
países centrais (manutenção da indústria bélica) – continua a
lógica da dependência.
9
Resultado de conversações bem-sucedidas entre os governos do Brasil e dos Estados Unidos durante os dois primeiros
meses de 1942, os Acordos de Washington diziam respeito basicamente ao fornecimento de certas matérias primas
brasileiras à indústria norte-americana e foram assinados em Washington em 03 de março de 1942. Os acordos incluíam:
a) criação de uma corporação destinada a promover a expansão econômica brasileira, com cooperação técnica e financeira
dos Estados Unidos; b) projeto de modernização da mina de Itabira (minério de ferro) e da ferrovia Vitória-Minas;
c) fundo para o desenvolvimento da produção de borracha”. Disponível em: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/
verbete-tematico/washington-acordos-de. Acesso em: 03 jan. 2020.
21
Cardoso e Vieira (2017) afirmam que a Lei Kandir apresen-
tou-se como mais um mecanismo de entrega dos nossos bens
primários e que seria uma forma de incentivar as exportações.
A nova regra, além de provocar e contribuir com o fenô-
meno da “desindustrialização”, feriu diretamente a fonte de
recursos dos estados que se dedicavam à atividade de expor-
tação de produtos primários, como Minas Gerais e Pará. Em
outras palavras, a Lei Kandir garantiu incentivos e subsídios às
exportações de produtos primários e reforçou a divisão inter-
nacional do trabalho, que atribuiu ao Brasil o papel primário-
-exportador.
10
“Período no qual os preços das matérias-primas se mantiveram acima da média histórica, em um ciclo de alta dos preços
dos produtos primários (minerais e agrícolas). A partir do início dos anos 2000, a China passa a ser o grande consumidor
mundial de matérias-primas. Com investimentos em sistemas de eletricidade, transportes e habitação, a China seguiu o
caminho da industrialização de média e baixa tecnologia com intenso consumo de recursos naturais. A alta na deman-
da por commodities minerais está diretamente conectada aos investimentos chineses em infraestrutura, que são grandes
demandantes de minerais como o minério de ferro e o cobre, o que elevou vertiginosamente os preços das commodities
em geral. O enriquecimento de partes da população mundial, particularmente na China, pressionou os preços das com-
modities para cima. Ainda, é preciso considerar a influência da especulação em mercados financeiros nos preços das ma-
térias-primas, que servem como objeto de negociação em mercados futuros e derivativos, o que colaborou também para
a elevação dos preços das matérias-primas. Este movimento de transformação tornou, durante o período, superavitária
a balança comercial dos países primário-exportadores. Assim, países especializados na exportação de matérias-primas
obtiveram vantagens comparativas no intercâmbio internacional durante esse período, o que levou, em muitos casos, à
especialização na exportação de matérias-primas, o que causou fenômenos como a [reprimarização das exportações] e a
[desindustrialização]” (GOMIDE et. al., 2018, p. 44-45).
11
A financeirização pode ser definida como o processo no qual o modo de acumulação da riqueza se baseia no poder
excessivo do setor financeiro (grandes bancos privados e suas holdings, organismos financeiros internacionais, agências de
rating, bancos centrais, etc). Analisando a financeirização enquanto processo sociológico, a financeirização representa o
processo no qual são formados estratos de classe ligados aos ganhos deste sistema. Ao processo no qual os bens naturais
são padronizados de acordo com normas dos mercados internacionais, e transformados em mercadorias comercializáveis
nestes mercados, deu-se o nome de comoditização da natureza. O processo no qual os bens naturais comoditizados geram
ativos e transações em mercados financeiros é a financeirização dos bens naturais. Dessa forma, bens naturais retirados
em escala local são transacionados por agentes internacionais em mercados externos gerando não apenas sua comer-
cialização, mas também diversas operações financeiras. Dos bens naturais extraídos em nível local desdobram-se eixos
comerciais globais, que envolvem, além de agentes locais - de empresas extrativas aos entes estatais - também os mercados
financeiros (GOMIDE et. al., 2018, p. 120).
22
natureza impondo um itinerário de conflitos e com eles a
necessidade de um conteúdo combativo sem chance de outra
mediação aos afetados do complexo mineral na produção e no
consumo senão o de reabilitar o conflito ambiental e do traba-
lho com alcance de um conflito de classe.
12
A palavra inglesa “commodity” significa simplesmente mercadoria. Mas no mercado o termo refere-se a produto
básico, em estado bruto ou com baixo grau de transformação. São mercadorias com pouco valor agregado e quase sem
diferenciação - que podem, portanto ser negociadas globalmente sob uma mesma categoria. Minério de ferro, madeira,
carne e frango “in natura” e petróleo são algumas das mais comercializadas. Disponível em: https://www.nexojornal.com.
br/explicado/2016/03/31/As-commodities-e-seu-impacto-na-economia-do-Brasil. Acesso em 11 de nov. 2019.
23
atividade sobre o meio ambiente, os territórios urbanos e rurais
e os trabalhadores e trabalhadoras da mineração.
24
brasileira sofreu uma reversão reprimarizante, qual seja: uma
ampliação da participação percentual dos setores primários
em detrimento das indústrias de transformação. Mais saqueio,
menos investimento na industrialização, aumento de buracos
fulminantes abertos em todo território nacional e elevada
dependência tecnológica e da variação do preço dos minérios
nos mercados financeiros.
13
A GIFFONI R., COELHO T., e MAIA M. A mineração vem aí... E agora? Rio de Janeiro: FASE/POEMAS, 2019.
25
Cabe a nós, compreendermos seu caráter dependente e
estruturado para garantir as condições e vantagens exigidas
pelos países centrais desde o Brasil colonial até os dias atuais.
As transnacionais chegam no Brasil, saqueiam os territórios
e levam nosso minério deixando apenas as veias e feridas
abertas em forma de sofrimento e pobreza para a população.
14
ACOSTA, Alberto. Extractivismo y neoextractivismo: Dos Caras de la Misma Maldicion. In: Grupo Permanente de
Trabajo Sobre Alternativas al Desarrollo. Más Allá Del Desarrollo. – 1a ed – Quito: Fundacion Rosa Luxemburgo, 2011
26
2. A fome e a sede da
mineração no Ceará
Por mim
Espalharás no papel o jejum das palavras
Este gesto breve até o amor
Dele a luz tempera o indivisível
Como é natural
Fica-nos a mandíbula
Uma certeza falsificada
E o sol empoeirado sobre as infâncias
É só!
27
A expressão "terra da luz" que o Ceará ganhou como
apelido não tem relação com sua localização geográfica por
estar próximo da linha do equador, tampouco pelo sol que
abrilhanta nossas terras de serras, sertões e praias o ano inteiro.
O apelido ou codinome faz alusão ao ato revolucionário quando
em 1884 o jangadeiro conhecido por Dragão do Mar se recu-
sou a transportar homens e mulheres escravizados para navios
negreiros ancorados no porto do Mucuripe, em Fortaleza, para
serem vendidos e levados para o sul do País. O ato marcou a
história do Ceará que se tornou a primeira província do Brasil
a abolir o regime escravocrata. Analisando por esse viés, a "terra
da luz" também rima como "terra da liberdade".
28
É nesse trocadilho de sentidos e contradições do mundo
revestido de fantasias que a indústria mineral se apresenta no
Ceará, e mesmo que ela não possa iluminar e nem ser ilumi-
nada dado o seu caráter destrutivo, é narrada como a “riqueza”
oculta na geologia cristalina que mora abaixo do chão onde
pisam populações sertanejas, camponesas, pescadoras, indíge-
nas, quilombolas, serranas e os verdadeiros jangadeiros. Por
assim dizer, a "terra da luz" está se tornando também para o
covil oligárquico cearense, a "terra dos cristais", e os sertões
que antes serviam apenas para justificar o tal atraso e atrair
a indústria da seca, agora é narrado como “rico” para atrair as
empresas mineradoras.
15
Para sabermos, a CFEM é distribuída aos Estados, Distrito Federal, municípios e órgãos da administração da União.
É creditada automaticamente em contas correntes específicas, no sexto dia útil que sucede ao recolhimento por parte
das empresas de mineração. A divisão fica 65% para os municípios, 23% para os estados e 12% para a União.
16
Disponível em: https://www.gov.br/anm/pt-br/centrais-de-conteudo/mineracao-em-numeros/copy_of_estatisticas/
arrecadacao-cfem/arrecadacao-da-cfem-por-superintendencias-2002. Acessado em 03 de julho de 2021.
17
Disponível em: https://sistemas.anm.gov.br/arrecadacao/extra/relatorios/arrecadacao_cfem_ano.aspx?ano=2020.
Acessado em 03 de julho de 2021.
29
Segundo a ANM18, haviam 1.997 trabalhadores da minera-
ção no Ceará divididos entre minas e usinas (1.354 e 643, respec-
tivamente), no ano 2000. Segundo a ADECE19, atualmente são 5
mil trabalhadores diretos. A mineração foi percussora do tema da
terceirização de seus trabalhadores no Brasil na década de 1980.
Os trabalhadores da mineração são em sua maioria terceirizados,
recebem injustos salários, adoecem mais e morrem em maior
número em decorrência de tal atividade.
22
Disponível em: http://www.anm.gov.br/assuntos/ao-minerador/sigmine. Acessado em 15 de agosto/2022.
31
Gráfico 3 : Atividade Econômica x Processos Minerários Ativos
32
Os dados relativos aos processos minerários ativos retirados
na Agência Nacional de Mineração (ANM) sugerem um reordena-
mento da política mineral em que o Ceará passa a integrar estraté-
gica e especificamente essa nova fase do setor no país. O interesse
sobre o estado cresceu 24 vezes (2000 a 2021), ao mesmo tempo
em que o número de minas em operação cresceu 8,5 vezes (2001 a
2021). O gráfico 4 apresenta visualmente este processo.
33
0
100.000,00
200.000,00
300.000,00
400.000,00
500.000,00
600.000,00
100
200
300
400
500
600
800
0
700
900
1940-1949 2.088
11
1940-1949
1
1950-1959 1.075 1950-1959
7
1960-1969 483 1960-1969
1970-1979 16.849
34
1970-1979
1980-1989 20.730
59
1980-1989
110
2000 4.647 2000
2001 7.139 2001
2002 9.744 2002
2003 10.775 2003
2004 15.938
20 28 27 35 35
2004
2005 13.005 2005
2006 22.275
48 55
2006
2007 73.286 2007
121
34
2.1. A demanda por terra do setor mineral
24
Requerimento de pesquisa, autorização de pesquisa, direito de requerer a lavra, requerimento de lavra, concessão de
lavra, licenciamento, registro de extração etc.
25
Disponível em: https://50anos.incra.gov.br/caninde-referencia-de-luta-pela-reforma-agraria-no-ceara/. Acessado em 20
de outubro/2021.
26
Mapeamento das Comunidades Quilombolas do Estado do Ceará, 2019.
27
Disponível em: https://www.seduc.ce.gov.br/wp-content/uploads/sites/37/2017/01/dados_quilombola.pdf. Acessado em
20 de outubro/2021.
28
Inventário dos Povos de Terreiro do Estado do Ceará, 2021.
35
Estamos diante, portanto, de uma diversa, profunda e his-
tórica presença de Povos e Comunidades Tradicionais imbuídas
de uma relação dialética com a natureza a partir de uma relação
ser humano-natureza constituídas pela ação de ambos entre si.
Ou seja, o metabolismo compreendido a partir da troca entre
matéria e energia nessa relação mediada pelo trabalho naturaliza
o ser humano ao passo que humaniza a natureza. A expansão da
fronteira mineral transforma natureza produto da acumulação
de capital, fazendo-se enquanto mais um dos contornos da má-
quina de comer o mundo e de moer gente, que a cada mordida
provoca inúmeras, e em distintas escalas, rupturas metabólicas.
36
d) O Decreto Federal nº 10.966/2022, que institui o que
chamou de “Programa de Apoio ao Desenvolvimento
da Mineração Artesanal e em Pequena Escala” e equi-
para o garimpo nesta categoria;
37
Mapa 1 : Mineração no estado do Ceará - Onde não tem mineração no Ceará?
40
Gráfico 6: Interesse Minerário por Empresas – 50 maiores
(número de títulos): 2000 a 2021
Codelco de Brasil Mineração Ltda 253
Terrativa Minerais S.A. 144
Nexa Recursos Minerais S.A. 138
C. Fernando R. da Paz & Cia Ltda 98
Vulcano Export Mineração Exportação e Importação Ltda 93
Votorantim Cimentos N/NE S.A 88
Vermont Mineração Exportação e Importação Ltda 77
SM Indústria de Minérios do Brasil Ltda 56
Pedra Branca do Brasil Mineração Ltda 53
Lepanto Mineração Ltda 52
Vicenza Mineração e Participações S.A. 51
RP Mineração Ltda 48
Brasil Fortescue Mineração Ltda 42
Quartzblue Mineração Ltda 39
Minérios Nacional S.A. 38
Casa Grande Mineração Eireli 38
Antolini, Exportação, Importação e Mineração Ltda 36
MPP Indústria e Mine ração Eireli 34
CSN Cimentos S.A. 34
Mineração Parnamirim Ltda 32
Divino Lopes dos Santos 31
Carbopar Carbomil Participação e Mineração S.A. 29
South Atlantic Gold Brasil Exploração Mineral Ltda 28
Lara do Brasil Mineração Ltda 28
Ical Indústria de Calcinação Ltda 28
Zeus Mineração Ltda 26
Mont Granitos S.A. 26
COOBAM - Cooperativa de Base Mineral 26
Companhia Industrial de Cimen to Apodi 26
Plenna Materiais de Construção Ltda 25
Luiz Gentil Neto 25
Gramazini Mineração Ltda 25
Cortez Engenharia Ltda 25
Cerâmica Brasileira Cerbras Ltda 25
Milgran Indústria e Comércio de Granitos Ltda 24
Corcovado Granitos Ltda 24
Milka Mineração Exportação e Importação Ltda 23
Sudamérica Ltda 22
Mineração Cardeal do Nordeste Ltda 22
Lomacon Locação e Construção Ltda 22
Calmap Industria de Calcário Ltda 22
Br Stone Mineração, Exportação e Importação Ltda 22
Rhuanny Agropecuária Ltda 20
Mineração Coto Comércio, Importação e Exportação Ltda 20
MDN Mineração do Nordeste Ltda 20
Coréa Calcário Ltda 20
Votorantim Metais S.A. 19
Mineração Agreste Ltda 19
Jeonas Costa Lírio 19
L&M Mineradora e Construções Ltda 18
29
Disponível em: https://www.cptnacional.org.br/downlods/category/3-cadernoconf litos (Acessado em 15 de
setembro/2022)
30
Disponível em: http://www.snis.gov.br/downloads/diagnosticos/ae/2018/Diagnostico_AE2020.pdf (acesso em 15 de
setembro/2022).
43
de uma pessoa residente no estado do Ceará de 137,35 litros/dia, o
Agro é Pop, Agro é Tudo concentra um montante de água capaz
de abastecer 15,3 milhões de cearenses, o mesmo que duas vezes o
estado do Ceará. Considerando apenas esse quadro, parece viável
absorver e importar um modelo mineral com uma fome capaz de
desejar 30% de todo o território cearense? Qual seria o tamanho
dessa sede? Sobraria água para o povo que já convive com a seca?
774 697
838 89
673
16
277
1054
172
2291
385.305.984
23.965.632
256.064.544
1.463.272.992
105.771.744 1.705.736
80.100.576
2.108.720.045
31
Disponível em: http://outorgasvigentes.cogerh.com.br/paginaSemValidacao/outorgaVigente/outorgas_fh.xhtml (acesso
em 15 de agosto/2022.
44
Nos interessa, ainda, identificar qual o tamanho da sede
deste setor, considerando as atividades já licenciadas. Ou seja, o
tamanho do consumo de um setor que avança saqueando nos-
so subsolo e espoliando nossas águas quase que invisivelmente.
O gráfico 10 nos mostra então, qual a vazão destinada ao setor
industrial em comparação com os demais setores.
32
Na ordem: Companhia Siderúrgica do Pecém; Porto do Pecém Geração de Energia; MPX Pecém II Geração de Energia
S.A.; Central Geradora Termelétrica Fortaleza S.A.; Usina Siderúrgica do Ceará; Termoceará.
33
Disponível em: https://www.opovo.com.br/noticias/economia/2021/10/06/canadense-jangada-mines-investira-rs-54-
milhoes-na-exploracao-mineral-em-taua-ceara.html. Último acesso em: 20 de outubro/2021.
45
Gráfico 10: Vazão Industrial x Demais Setores (litros/dia) – Ceará, 2022
402.625.728
4.935.542.285
Gráfico 11: Vazão Setor Mineral x Setor Industrial (litros/dia) – Ceará, 2022
145.071.648
257.554.080
46
3. Territórios em
conflito com a mineração
no Ceará
47
Dentre o grande número de processos minerais que explo-
diram nos últimos 20 anos, cresceram também o número de
territórios em conflitos com a mineração em todo estado. Os
conflitos iniciam-se antes mesmo que o saque mineral esteja
consumado, pois desde os primeiros processos de intimidação
dos territórios ou narrativas falaciosas feitas pelas mineradoras
propagandeando a atividade mineral como "solução econômi-
ca" que o medo e o terror começam a rondar as comunidades.
48
A mineradora Globest34 obteve licença do órgão ambien-
tal do estado para explorar minério de ferro apenas no mês de
setembro do ano de 2011, mas desde o mês de outubro de 2010
que as atividades de exploração tinham iniciado. A mineração foi
licenciada a 200 metros da margem direita do Rio Poty e ao lado
de três comunidades camponesas, o que significou uma afronta
ao princípio da precaução à vida do Rio Poty que está diretamen-
te relacionado com os modos de vida do território camponês. A
irresponsabilidade da mineradora somada à insensatez do órgão
licenciador estatal resultou em diversos crimes socioambientais
como poderemos analisar na tabela 1.
34
Disponível em: https://mamnacional.org.br/2019/02/27/quiterianopolis-e-o-novo-brumadinho-no-ceara/. Acessado em
30 de julho/2020.
49
Tabela 1: Sistematização dos crimes ambientais da empresa Globest
Participações Ltda.
Fonte: Relatório Técnico da SEMACE nº 4038/2017- DIFIS/GEFIS (organizado por Silva, 2020)
50
Além dos 14 crimes listados, a empresa Globest responde
por três ações penais perante a Vara Única de Quiterianópolis
acusada por práticas de crimes ambientais. O processo de 2012
foi sentenciado em novembro de 201735.
35
Condenou a empresa por crime ambiental previsto no art. 38 da Lei nº 9605/98 por danificar vegetação em APP.
51
Mapa 3 : Território camponês em conflito com a mineração de ferro – Quiterianópolis, Ceará
Cartografia Social - Cartografia decolonial
52
Como podemos visualizar no mapa, existem pilhas de re-
jeitos que estão a cerca de 200 metros do Rio Poty. Ao longo
dos anos as enxurradas vão carregando o rejeito para dentro do
leito do rio e ao mesmo tempo se espalham nas lavouras dos
camponeses. Portanto, o Rio Poty está assoreado e os lugares
produtivos cobertos e contaminados por rejeitos de mineração.
No local do encontro dos rejeitos com as águas do Rio Poty,
antes da mineração era o local de plantar arroz, tomar banho e
pescar, hoje, o que se ver é destruição.
36
Núcleo de Tecnologia e Qualidade Industrial do Ceará – NUTEC é vinculada à Secretaria da Ciência, Tecnologia e
Educação Superior do Estado (SECITECE).
53
O destaque entre as substâncias que ficaram acima do va-
lor de prevenção é para o antimônio, que na amostra de sedi-
mento deu resultado de 2.986,57 mg/kg e no solo de 963,14,
quando conforme a resolução do CONAMA 420/2009, o valor
de prevenção deveria ser apenas 02 mg/kg e o valor de investiga-
ção poderia ser até de 25 mg/kg, porém já considerando riscos
à saúde humana de forma generalizada. Conforme o relatório
da NUTEC, a exposição aguda por ingresso oral do antimônio
resulta em irritação da mucosa gástrica, vômito, cólica abdomi-
nal, diarreia e toxidade cardíaca, para além de ser cancerígeno.
37
Corresponde à lista de valores para solo e sedimentos (Resolução do CONAMA 420/2009).
54
3.2. Mineração de ferro em Ipaporanga: ameaça e medo.
38
Disponível em: https://geo.anm.gov.br/portal/apps/webappviewer/index.html?id=6a8f5ccc4b6a4c2bba79759aa952d908.
Acessado em: 30/09/2021.
55
Mapa 4 : Zona de proteção ambiental, hídrica, histórica e cultural de Ipaporanga
56
Portanto, como se trata de uma região com interface
que dispõe de área de patrimônio natural e cultural riquís-
simos, dado o seu potencial paisagístico, hídrico e de solos
férteis, as comunidades camponesas defendem que esse
grande território continue sendo o grande potencial eco-
nômico local que lhes proporciona produção agropecuária
e extrativista em abundância. As diversas comunidades que
compõem o grande território de pé de serra se benef iciam
das águas e das terras férteis para produzirem trabalho e
renda ao longo de todo ano para se autossustentarem.
57
Mapa 5 : Área em processo de pesquisa para mineração de ferro
58
As comunidades camponesas da serra e pé de serra desen-
volvem diversas atividades econômicas, sobretudo pela agricul-
tura familiar camponesa que se utiliza de práticas agroecológi-
cas para produzir frutas (manga, caju, castanha, entre outras e
suas respectivas polpas) e uma diversidade de legumes e verdu-
ras. É muito comum a criação de animais como aves (galinha,
peru, pato, etc.), suínos, caprinos, ovinos e bovinos. Há, ainda,
usos extrativistas de pequeno porte no território que geram
economia e renda, tais como a extração de palha e cera de car-
naúba, extração de oiticicas, buriti e coco babaçu. Também há
potencial na produção de vassouras e derivados de palmeiras.
39
Disponível em: https://mamnacional.org.br/2017/11/15/no-ceara-comunidade-debate-ameacas-de-mineradoras/.
Acessado em 30 de julho/2020.
40
Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2019/10/23/artigoor-a-chantagem-politica-do-uranio-exploracao-da-
mina-de-itataia-no-ceara. Acessado em 30 de julho/2020.
59
de urânio e fosfato poderá trazer para a saúde humana confor-
me apresentou o parecer técnico41 que analisou o Estudo de Im-
pacto Ambiental do Projeto Santa Quitéria (2014) e apontou
falhas em relação à saúde pública, à saúde dos trabalhadores e
à Saúde Ambiental.
41
Disponível em: https://geo.anm.gov.br/portal/apps/webappviewer/index.html?id=6a8f5ccc4b6a4c2bba79759aa952d908.
Acessado em: 30/09/2021.
42
Disponível: https://territorioslivres.org/resistencias/nota-santa-quiteria-territorio-livre-de-mineracao-de-uranio-e-
fosfato-manifesto-politico/. Acesso em: 03/12/2022
60
Mapa 6 : Os impactos diretos e indiretos da mineração de urânio e fosfato no Ceará
61
O Mapa foi elaborado por equipe interdisciplinar, com
pesquisadores, ativistas da Articulação Ceará Antinuclear
(AACE), movimentos sociais e representação das comunidades.
Nele é representada a área que poderá ser atingida e fortemen-
te vulnerabilizada pelas fases de mineração e carregamento de
urânio e fosfato da mina de Santa Quitéria-CE, pelas rodovias
estaduais e federais e com destino aos portos do Pecém em São
Gonçalo do Mucuripe em Fortaleza.
62
médios açudes, como a barragem Edson Queiroz, que abastece
a cidade de Santa Quitéria (município com população estima-
da de 46.763 habitantes IBGE, 202043), antes de alcançar o rio
Acaraú, e, por esse motivo, também, degradar a saúde comuni-
tária e o modo de vida das populações camponesas, pescadores/
as, étnicas e tradicionais ribeirinhas.
43
Disponível em https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ce/panorama. Consulta realizada em agosto de 2021.
63
Em conjunto com a mineração e o transporte do urânio
e fosfato, os impactos cumulativos deverão ser amplamente
analisados em decorrência da extensiva zona de mineração in-
cluída na poligonal da cartografia com área de 44.630,71km2
(30% do território cearense), com a concessão de lavra emitida
pela CPRM (ferro, cobre, calcário, quartzito, granito, entre ou-
tros)44. Lembra-se, ainda, que os metais pesados, a poeira pro-
vocada pela extração de rochas ornamentais e brita, também
exprimem elevada toxidade para os seres humanos, em razão
dos severos efeitos biológicos que desencadeiam em função
dos seus comportamentos bioquímicos no interior dos orga-
nismos.
44
Ver mapa com os requerimentos e autorizações de pesquisa e concessões de lavra disponível em https://geo.anm.gov.
br/portal/apps/webappviewer/index.html?id=6a8f5ccc4b6a4c2bba79759aa952d908. Consulta realizada em agosto de 2021.
64
tentativa de licenciamento entre 2010 e 2019 o licenciamento
ambiental já estava sendo conduzido pelo IBAMA, e o tema
hídrico era um ponto importante na análise de viabilidade
ambiental do empreendimento, sobretudo pelo momento de
escassez hídrica acentuada pela qual passou o estado entre os
anos de 2012 e 2018.
65
O parecer, por fim, conclui que “a concepção atual do pro-
jeto, principalmente no que se refere ao tratamento das ques-
tões hídricas e energéticas, não se insere no necessário contexto
de sustentabilidade ambiental” (IBAMA, 2016, p. 89). Tal con-
clusão foi reafirmada no Despacho no 4299534/2019-DILIC,
que decide pela negativa da licença e arquivamento do processo
em fevereiro de 2019.
45
Disponível em: https://www.gov.br/participamaisbrasil/relatorio-da-missao-santa-quiteria-ce1. Acesso em: 03/12/2022
66
das Pedras, o Assentamento Queimadas e o Assentamento Mor-
rinhos, além da demanda do empreendimento de mineração. Da
vazão prevista da adutora (281 L/s), apenas 1,96% estão destina-
dos ao abastecimento das comunidades rurais, enquanto 98,04%
seriam para abastecimento do empreendimento. O licenciamen-
to ambiental junto à SEMACE, no entanto, vem sendo condu-
zido considerando a adutora como uma obra de infraestrutura
hídrica de atendimento não à demanda industrial, mas à deman-
da de abastecimento humano, ainda que um volume relativo tão
pequeno esteja sendo previsto para este fim.
67
Sobre esse sistema, manifesta-se particular preocupação, tan-
to pelo fato de a água ser caracterizada como insumo essencial ao
processo produtivo do PSQ quanto pela localização desse projeto
no semiárido, notadamente definido pelo regime de déficit hídrico.
Seria razoável admitir que a existência de LP (aprovando o projeto
conceitual) ou LI (recepcionando o projeto executivo e os programas
ambientais dele decorrentes) para o sistema seria suficiente para sub-
sidiar a avaliação de viabilidade ambiental do PSQ. No entanto, mes-
mo com a existência de LI (LI no 112/20022-DICOP, conforme con-
sulta ao sítio da SEMACE), não são eliminadas as incertezas quanto
a execução do projeto de abastecimento hídrico de forma compatível
com o cronograma do PSQ. Mesmo se considerando os termos do
Memorando de Entendimento entre o Governo do Ceará e a INB,
não fica evidente a plena garantia de execução compatível do projeto.
Assim, a separação de projetos (empreendimento principal e abaste-
cimento hídrico), onde se destaca, inclusive a existência de empreen-
dedores distintos, é entendida como um limitador para as avaliações
que cabem ao Ibama no contexto do que orienta a teoria de AIA.
Essa situação seria totalmente diferenciada se a adutora já estivesse
implantada e com LO vigente, circunstância que direcionaria o ques-
tionamento no âmbito da AIA apenas à condição de efetiva dispo-
nibilidade de recursos hídricos ao projeto, o que seria prontamente
sanável por meio do instrumento da outorga (responsabilidade da
SRH). (IBAMA, 2022, p.15)
68
4. A luta por
Soberania Popular
na Mineração46
Nesse território,
desde os pés à fronte,
andando, andando, andando,
passarei a vida
46
Esse ponto foi produzido a partir de reflexões sistematizadas em dois documentos do MAM (Elementos Constitutivos
do MAM – 2015 e; A Luta pela Soberania Popular na Mineração – 2018).
69
4.1. Territórios Livres de Mineração
70
soberania alimentar e nutricional, protegendo e conservando
a sociobiodiversidade, as águas e os bens comuns às futuras ge-
rações, o direito ao trabalho e a saúde, o fortalecimento das
economias locais e o patrimônio sociocultural, material e ima-
terial e paisagístico.
71
Esta dinâmica de super-exploração do trabalho e da natu-
reza compromete o desenvolvimento local, regional e nacional
principalmente considerando a extração de bens não renová-
veis. Devido ao aumento das taxas de exploração, os impactos
não são devidamente avaliados e danos irreversíveis são impos-
tos a natureza, territórios e trabalhadores mineiros. Torna-se
inviável a adaptação de estrutura social ao modelo econômico
instalado à força e desde fora. Processos intensivos de extração
minerária atraem migrações, provocam inchaço e desorganiza-
ção das cidades e aumento da taxa de desemprego e violência,
especialmente entre os jovens. Por outro lado, a ritmos tão ele-
vados a perspectiva é que os empreendimentos abandonem os
territórios rapidamente, que ao produzirem uma economia de
enclave e dependente, imputam qualquer possibilidade de di-
versificação econômica.
72
projeto de privatização da mineração no país, já que reforçam
nossa inserção dependente e subordinada à divisão internacio-
nal e territorial do trabalho nos subjugando à condição econô-
mica primária e exportadora. Além de ser um dos setores que
menos paga impostos no mundo, seja pela sonegação, evasão e
subsídios, conta desde a Lei Kandir com a desoneração de qual-
quer imposto sobre a circulação de mercadoria.
73
789, convertida na Lei nº 13.540, de 2017. A porcentagem utilizada
dependerá do mineral explorado, chegando ao máximo de até 4%47.
47
Alíquota de 1%: Rochas, areias, cascalhos, saibros e demais substâncias minerais quanto destinadas ao uso imediato
na construção civil; rochas ornamentais; águas minerais e termais; Alíquota de 1,5%: ouro; Alíquota de 2%: diamante
e demais substâncias minerais; Alíquota de 3%: bauxita, manganês, nióbio e sal-gema; Alíquota de 3,5%: Ferro, com
observações previstas na Lei podendo sofrer variação entre 2% e 3,5%.
74
Para além da captura da renda mineral por parte das mul-
tinacionais via CFEM cuja alíquota é consideravelmente menor
quando comparada a outras taxações no mercado internacio-
nal, é preciso considerar que os lucros exorbitantes obtidos pe-
las corporações façam uso de evasões ficais, desvios e sonegação
de impostos e, principalmente, transferência da renda pública
gerada pela atividade mineradora para os capitais privados de
empresas nacionais e transnacionais do setor.
75
lavrar minério. Enquanto isso, centenas de comunidades vi-
vem na região próxima à mina de Itataia e têm de andar qui-
lômetros para buscar água. O nome disso é injustiça hídrica
na qual o estado nem opera e nem distribui a água conforme
a necessidade da população, mas escolhe matar a sede da mi-
neração e deixar o povo sem acesso à água.
76
5. Referências
bibliográficas
ACOSTA, Alberto. Extractivismo y neoextractivismo: Dos Ca-
ras de la Misma Maldicion. In: Grupo Permanente de Trabajo
Sobre Alternativas al Desarrollo. Más Allá Del Desarrollo. – 1a
ed – Quito: Fundacion Rosa Luxemburgo, 2011.
77
IBAMA. Despacho no 02001.019631/2015-11 COMOC/IBAMA,
proferido no processo no 02001.005454/2004-24. 150 pág. 2015;
78
5.1. Dicas de leitura
79