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Ficha de Educação Literária 4

Nome N.o 10.o Data / /

Avaliação E. Educação Professor

Crónica de D. João I, de Fernão Lopes


Lê o excerto do capítulo 115 da Crónica de D. João I, de Fernão Lopes. Caso seja necessário, consulta as notas.

Per que guisa1 estava a cidade corregida para se defender,


quando el-Rei de Castela pôs cerco sobr’ela.
Nem uu falamento2 deve mais vizinho seer deste capitulo que havees ouvido, que poermos logo
aqui brevemente de que guisa estava a cidade, jazendo el-Rei de Castela sobr’ela; e per que modo
poinha em si guarda o Meestre, e as gentes que dentro eram, por nom receber dano de seus emigos;
e o esforço e fouteza3 que contra eles mostravom, em quanto assi esteve cercada.
5 Onde sabee que como o Meestre e os da cidade souberom a viinda del-Rei de Castela, e esperarom
seu grande e poderoso cerco, logo foi ordenado de recolherem pera a cidade os mais mantiimentos
que haver podessem, assi de pam e carnes, come quaes quer outras cousas. E iam-se muitos aas
liziras4 em barcas e batees, depois que Santarem esteve por Castela, e dali tragiam muitos gaados
mortos que salgavom em tinas, e outras cousas de que fezerom grande açalmamento5; e colherom-se
10 dentro aa cidade muitos lavradores com as molheres e filhos, e cousas que tiinham; e doutras pessoas
da comarca6 d’arredor, aqueles a que prougue de o fazer; e deles7 passarom o Tejo com seus gaados
e bestas e o que levar poderom, e se forom contra Setuval, e pera Palmela; outros ficarom na cidade
e nom quiserom dali partir; e taes i houve que poserom todo o seu8, e ficarom nas vilas que por
Castela tomarom voz.
(…)
15 De triinta e oito portas que há na cidade, as doze eram todo o dia abertas, encomendadas a boõs
homees d’armas que tiinham cuidado de as guardar; pelas quaes neua pessoa, que muito conhecida
nom fosse, havia d’entrar nem sair, sem primeiro saber em certo por que razom ia ou viinha; e ali
atravessavom paos com tavoado9 pera dormir os que tal cuidado tiinham, por de noite seerem deles
acompanhadas10, e neuu malicioso seer atrevido de cometer neuu erro.
20 E dalguas portas tiinham certas pessoas de noite as chaves, por razom dos batees que taes horas
iam e viinham d’aalem com trigo e outros mantiimentos, segundo leedes em seu logar; outras chaves
apanhava uu homem cada noite de que o Meestre muito fiava, e veendo primeiro como as portas
ficavom fechadas, lhas levava todas aos Paaços onde pousava.
(…)
Nom leixavom os da cidade, por seerem assi cercados, de fazer a barvacãa 11 d’arredor do muro
25 da parte do arreal12, des a porta de Santa Caterina, ataa torre d’Alvoro Paaez, que nom era ainda feita,
que seeriam dous tiros de beesta; e as moças sem neuu medo, apanhando pedra pelas herdades,
cantavom altas vozes dizendo:

Esta é Lixboa prezada,


mirá-la e leixá-la.
30 Se quiserdes carneiro,
qual derom ao Andeiro13;
se quiserdes cabrito,
qual derom ao Bispo14,

106 Editável e fotocopiável © Texto | Mensagens • 10.o ano


e outras razões semelhantes. E quando os emigos os torvar15 queriam, eram postos em aquel cuidado
35 em que forom os filhos de Israel, quando Rei Serges, filho de Rei Dario, deu lecença ao profeta
Neemias que refezesse os muros de Jerusalem; que guerreados pelos vezinhos d’arredor, que os nom
alçassem16, com ua mão poinham a pedra, e na outra tiinham a espada pera se defender; e os
Portugueeses fazendo tal obra, tiinham as armas junto consigo, com que se defendiam dos emigos
quando se trabalhavom de os embargar17, que a nom fezessem.
Fernão Lopes, Crónica de D. João I, Teresa Amado (ed.), Lisboa, Comunicação, 1992, pp. 170-175 (com supressões).

1 guisa: modo, maneira; 2 falamento: discurso; 3 fouteza: 12 arreal: acampamento de tropas; 13 Andeiro: referência ao conde
coragem; 4 liziras: lezírias; 5 açalmamento: abastecimento; de Andeiro, amante de D. Leonor Teles, que foi assassinado pelo
6 comarca: divisão territorial de um distrito judicial, sob a alçada Mestre de Avis; 14 Bispo: alusão ao Bispo de Lisboa, que, em parte
de um tribunal de primeira instância; 7 deles: alguns deles; por ser castelhano, foi acusado de compactuar com os inimigos do
8 todo o seu: tudo o que tinham; 9 tavoado: tabuado (tapume Mestre de Avis, tendo sido assassinado pelos apoiantes de D. João;
de tábuas, soalho); 10 por de noite serem deles acompanhadas: 15 torvar: perturbar, estorvar;

para de noite as portas se manterem sob a sua vigilância; 16 que os nom alçassem: para que não erguessem a muralha;
11 barvacãa: barbacã (obra de fortificação avançada, geralmente 17 se trabalhavom de os embargar: se esforçavam para os impedir.

erigida sobre uma porta ou ponte de acesso, que protegia a


entrada de uma cidade ou castelo medieval);

1. Tendo em conta o segundo parágrafo, explicita a forma como os habitantes de Lisboa e dos
arredores da capital se prepararam para a vinda do rei de Castela.
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2. Com base nos terceiro e quarto parágrafos, explica as medidas de segurança que foram tomadas
em Lisboa durante o cerco feito pelo rei de Castela.
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3. Completa as afirmações apresentadas, selecionando a hipótese correta para cada uma das alíneas.
A partir do quinto parágrafo, o cronista evidencia a) __________ do povo de Lisboa. Para tal, faz
referência a uma cantiga que tinha o objetivo de b) __________ os castelhanos. Além disso,
Fernão Lopes recorre também a um episódio bíblico com o intuito de c) __________.

a) b) c)

1. exaltar a determinação dos portugueses no processo


1. a coragem 1. aclamar
de construção da barbacã

2. o desespero 2. provocar 2. evidenciar a bondade do rei Serges

3. salientar a desproporção entre a fação portuguesa e o


3. a falta de organização 3. atrair
exército castelhano

Editável e fotocopiável © Texto | Mensagens • 10.o ano 107

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