O poema «Viriato» insere-se na primeira parte da Mensagem, o «Brasão», na qual, tendo
como referência os símbolos da bandeira, desfilam os heróis fundadores ligados ao nascimento de
Portugal. Viriato figura como o segundo dos sete castelos presentes na bandeira, um dos responsáveis que garantiu a formação da nacionalidade, uma das bases fundadoras. Depois de salientar a importância do mito, no poema «Ulisses», Fernando Pessoa faz referência a um herói histórico, real, tornado mítico pelos seus feitos corajosos. De Viriato, pouco se conhece da sua história, mas consagrou-se como um símbolo da luta pela independência. Efetivamente, acredita-se que de pastor passou a líder, a chefe militar da tribo dos Lusitanos, no séc. II a.C.. Este guerreiro conseguiu reunir sobre o seu poder grandes territórios no centro da Península Ibérica e através da sua bravura e astúcia resistir aos invasores romanos. Na Mensagem, o chefe lusitano é associado à semente do que será Portugal. Logo, na primeira estrofe desta composição poética, Pessoa realça a importância da memória histórica. Inicialmente, refere que a nossa alma recorda-se das nossas origens, do passado esquecido, ou seja, se a alma «faz» e «conhece» é «porque lembra o que esqueceu» da história. As ações esquecem-se, mas permanece viva a memória do instinto que os possibilitou, o mesmo que movia Viriato nos seus atos. De facto, a lembrança de Viriato é uma recordação do nosso passado que prevalece forte, é «fecundo», dá-nos estímulo e vida e influencia decisivamente o ímpeto da Nação. O «eu» poético conclui «Vivemos raça, porque houvesse/ Memória em nós do instinto teu» para assim destacar que o instinto de nobreza de caráter vive na memória coletiva, por isso, indicia- se que somos um povo destinado a atuar desde os primórdios. Consequentemente, na segunda estância, verifica-se a reafirmação do que foi afirmado na estrofe anterior. Viriato permanece vivo enquanto mito, é um exemplo, reencarna constantemente, revive num ciclo interminável, que influencia as futuras gerações de portugueses. O guerreiro lusitano e o que representa, a nobreza, a bravura, o ideal de liberdade, antecipa a nação que nasce e que existe ainda antes de ter ou ser território. O líder foi o princípio de algo «tu, ou do que eras haste» e, por isso, foi decisivo para o futuro de Portugal («Assim Portugal se formou»). O conetor conclusivo «Assim» salienta que o mito é essencial na fundação da nacionalidade. Por fim, na terceira estância, o poeta recorre à metáfora da manhã para compará-la com o mito de nobreza de Viriato. Nos primeiros versos, o sujeito lírico declara que o «ser» de Viriato, o seu mito, é como o amanhecer para o dia, é um início de algo. A «fria luz» quando antecede o novo dia ( «precede a madrugada»), não é ainda nada, apenas um principio. Mais uma vez, Pessoa reforça a ideia que o mito é um nada, mas que pode potenciar tudo, é «já o haver o dia», uma vez que sem a luz (mito) o dia (a vida) não pode nascer por completo, pois ficava só madrugada e nunca podia ser dia. No entanto, apesar de ser potenciar vida, o mito permanece num «confuso nada», isto é, o símbolo é impreciso e inútil por si, visto que tem de encontrar uma utilização, um momento ideal para fecundar a realidade.