You are on page 1of 6

ONCOLOGIA

CÂNCER
Os cânceres, até recentemente definidos
em função da célula tumoral propriamente dita,
hoje são encarados como doenças
mais complexas, que envolvem diferentes
tipos de células presentes no mesmo
microambiente: células de defesa,
de vasos sangüíneos e de suporte dos tecidos.
Essa nova perspectiva permitiu
o surgimento de outros alvos para as terapias
contra esses males. À medida que as interações
entre essas diferentes células são mais bem
entendidas, é possível desenvolver novas formas
de tratamento. Além disso, drogas de uso
já consagrado contra outras doenças começam
a ganhar novas indicações, atuando como
tratamento complementar no câncer.

Andréia Hanada Otake,


Roger Chammas
Laboratório de Oncologia Experimental,
Faculdade de Medicina,
Universidade de São Paulo
e Roberto Zatz
Faculdade de Medicina,
Universidade de São Paulo

28 • CIÊNCIA HOJE • vol. 38 • nº 223


ONCOLOGIA

Novos alvos
para tratamento

O que teria acontecido se os alquimistas tivessem descoberto o elixir teríamos algum tipo de câncer. Pelo menos um,
da vida eterna, uma poção mágica que tornasse entre as centenas de tipos da doença conhecidos
imortal quem a bebesse, ou ao menos prolongasse na atualidade. A boa notícia é que, com o desen-
a vida bem além dos limites atuais? Não é difícil volvimento da pesquisa na área biomédica, será
imaginar o lado positivo de ter uma vida longa, possível, no futuro, controlar progressivamente a
quase ilimitada. O tempo, porém, continuaria pas- letalidade da doença. Assim, ela deixaria de cau-
sando, e isso certamente teria conseqüências no sar tantas mortes, como acontece atualmente. O
organismo, já que certas doenças – e muitos de nós homem do futuro, ao atingir uma idade centená-
esquecemos esse fato – acompanham, de maneira ria (ou maior), ainda poderia viver bem, mesmo
quase inevitável, o envelhecimento. Os cânceres, tendo um câncer, já que este seria controlado cli-
também conhecidos como tumores malignos (figu- nicamente.
ra 1), são assim.
Portanto, se vivêssemos 120 ou 130 anos com os
mesmos hábitos que temos hoje, invariavelmente
Células tumorais,
genes e marcadores
Os cânceres são doenças do material genético (o
genoma) de nossas células, e decorrem do acúmulo
progressivo de mutações, ou seja, alterações no có-
digo genético. As mutações fazem com que células
que antes executavam um programa bem definido,
associado às suas funções em seu tecido de origem,
cresçam de maneira descontrolada (figura 2). Esse
crescimento alterado é conseqüência não só da
duplicação celular desordenada, mas também da
progressiva resistência à morte celular (como se as
Figura 1. Comparação entre um tumor invasivo e seu tecido de células tivessem bebido o ‘elixir da vida eterna’).
origem, ilustrando a aplicação do uso de marcadores que per- Além disso, as células cancerosas ultrapassam
mitem distinguir as células tumorais das normais. À esquerda
os limites dos tecidos de origem, adquirem a ca-
da imagem, observada em microscópio, está o tecido normal de
revestimento do intestino grosso – as células normais (coradas pacidade de modificar o ambiente que as cerca,
em roxo e mostrando um padrão de alinhamento) formam o re- desrespeitam fronteiras e migram pelos diversos
vestimento dessa parte do intestino. À direita, as células (cora- tecidos do corpo, podendo estabelecer novos tu-
das em marrom) apresentam um arranjo caótico, desordenado, mores – as metástases – ao se fixarem em locais
que invade o tubo digestivo: trata-se de um câncer. A coloração
distantes do ponto de origem. A capacidade de
em marrom é obtida pela presença de um marcador desse tu-
mor e permite ao médico patologista, responsável pelo diagnós- invadir os tecidos vizinhos e de formar as metás-
tico em nível microscópico, identificar a lesão e, às vezes, pre- tases é responsável, em última análise, pela mor-
dizer seu comportamento te de dois a cada três pacientes com o diagnóstico
de câncer. 

janeiro/fevereiro de 2006 • CIÊNCIA HOJE • 29


ONCOLOGIA

mamos de ‘marcadores’ associados a tumores. Os


marcadores são moléculas que servem como uma
impressão digital, ou um código de barras, permi-
tindo que reconheçamos o tumor. Em um futuro
próximo, eles vão ajudar os médicos a prever o
comportamento do tumor e a indicar o melhor
tratamento para o paciente. Definidos os marca-
dores, podemos criar métodos que permitam iden-
tificar uma lesão cancerosa ao microscópio, em
exames de sangue (como no caso da pesquisa do
antígeno prostático – PSA, do inglês prostatic
serum antigen – presente no soro) ou em exames
de imagem. Esses métodos, porém, não substituem
o exame clínico – apenas o complementam. Em
um segundo nível, a comparação pode sugerir ao
médico que o paciente deve ser acompanhado com
mais atenção, por apresentar maior risco de uma
Figura 2. Tumores são gerados a partir de uma célula mutada (em verde,
à esquerda). O acúmulo de mutações ao longo de anos é em parte res- recaída da doença. Em um terceiro nível, a com-
ponsável pela geração de células geneticamente diferentes na massa paração tem permitido identificar novos alvos pa-
tumoral (células de cores variadas no esquema) – é a heterogeneidade ra terapia.
ou variabilidade, como proposta na teoria da seleção natural de Darwin. Há alguns bons exemplos de moléculas inte-
O tratamento de tumores com a droga X, por exemplo, mata muitas célu-
ligentes, desenvolvidas a partir do conhecimento
las tumorais, mas algumas que resistem a essa droga repovoam o tumor
em tempos relativamente curtos. Já são testados tratamentos experi- acumulado de como algumas proteínas codificadas
mentais que aumentariam a sensibilidade dos tumores à droga X, redu- por genes causadores de câncer atuam dentro de
zindo o número de células resistentes e aumentando o tempo necessário uma célula. A primeira dessas drogas, o mesilato
para o tumor voltar ao tamanho original. Existe ainda a possibilidade de de imatinib (Gleevec), foi planejada para bloquear
diminuir o tumor a um nível que deixe as células em um estado de
a atuação de uma proteína que favorece a sobre-
dormência – o bloqueio da formação de novos vasos, que nutrem os tu-
mores, parece ser um mecanismo promissor para isso vivência da célula tumoral. É usada, por exem-
plo, no tratamento de formas de leucemias, sendo
eficiente em até 90% dos casos de leucemia
mielóide crônica.
Até o final do século passado, a comunidade
científica tinha identificado um número conside-
rável de genes associados de alguma forma aos
cânceres. Esses genes, de modo geral, codificam Uma aplicação
(ou seja, contêm instruções para a síntese de) pro-
teínas que fazem parte de circuitos ou vias essen- inesperada
ciais para a vida de uma célula, controlando fun-
ções como duplicação, diferenciação, estabilidade das leis de Darwin
do genoma, morte e migração celular. Todas essas
funções estão de alguma forma alteradas na célula Por mais inteligentes que sejam, as estratégias que
cancerosa. Essa lista de genes está sendo comple- têm a célula tumoral como alvo principal esbarram
tada agora com o seqüenciamento completo do ge- em um fenômeno que só agora estamos começando
noma humano. Enfim, conhecemos todas as peças a entender: o desenvolvimento de resistência ao
do quebra-cabeças. Precisamos agora montá-lo e medicamento, como tem acontecido no tratamento
entender como as peças se encaixam em diferen- da leucemia mielóide crônica com Gleevec. Exis-
tes situações – por exemplo, durante o desenvolvi- tem diversas explicações possíveis para a chamada
mento, em condições normais e em doenças, como ‘quimiorresistência’, e a principal delas, acredita-
nos cânceres. mos, está na própria natureza da doença, que se
A comparação entre células normais e células desenvolve ao longo de muitos anos. Em adultos,
tumorais tem sido útil em diferentes contextos. admite-se que a formação do tumor maligno come-
Em um primeiro nível, tal comparação facilita o ça entre 10 e 20 anos antes do diagnóstico clínico.
diagnóstico do câncer. Algumas substâncias têm Durante esse tempo, as células tumorais são sele-
sua quantidade muito aumentada quando um tu- cionadas pela capacidade de sobreviver em um
mor existe; outras são modificadas pela existência ambiente freqüentemente desfavorável. Além dis-
do tumor. Estes são alguns exemplos do que cha- so, o acúmulo de mutações favorece o aparecimento

30 • C I Ê N C I A H O J E • v o l . 3 8 • n º 2 2 3
ONCOLOGIA

de várias subpopulações de células cancerosas den- vando ao retardo mental. Estudos clínicos com
tro de um mesmo tumor. Portanto, embora se ori- drogas como essas, criadas originalmente para tra-
ginem de apenas uma célula, os cânceres já são tar doenças do metabolismo, são necessários até
bastante heterogêneos no momento do diagnóstico. que elas possam ganhar espaço no arsenal de me-
Essa heterogeneidade possibilita uma ampla dicamentos contra o câncer.
variação da sensibilidade das células de um tumor
a determinada droga. Entende-se assim o desen-
volvimento da resistência. Imagine que, em cada
mil células tumorais, uma seja resistente à droga O tumor como
‘X’. Após um tratamento 100% eficiente (que ain-
da não existe), restaria essa célula resistente. Se um complexo
houver tempo e condições suficientes para que
essa célula se duplique, assim como suas descen- microambiente
dentes, ela acabará regenerando as mil células. Se
a resistência for determinada geneticamente, pra- O crescimento de um tumor não depende só de
ticamente todas as novas células serão resistentes uma célula geneticamente alterada. Diferentes ti-
ao tratamento ‘X’. pos de células compõem o tumor e definem o
Assim, o desenvolvimento do câncer pode ser destino da célula tumoral. Foi surpreendente, por
comparado ao processo de seleção natural, como exemplo, perceber que certas moléculas típicas
proposto pelo inglês Charles Darwin (1809-1882), de tumores malignos são produzidas não pelas
mas no contexto de um indivíduo. As mutações e células cancerosas, mas por células normais pre-
a instabilidade genética da célula tumoral estão sentes em sua vizinhança. Algumas dessas molé-
associadas à variabilidade, enquanto as condições culas são indispensáveis para a propagação do
de cada tecido e os diferentes tratamentos repre- tumor, tanto no local de origem como à distância
sentam a pressão seletiva. (metástases). Parece inacreditável, mas de algu- 
A compreensão dos mecanismos de
morte ou sobrevivência das células
tumorais em resposta a diferentes dro-
gas permitirá, por exemplo, associar tra-
tamentos que visem aumentar a sensi- REDES DE PESQUISA
bilidade de um tumor a um agente quí-
mico ou quimioterápico. A idéia é tor- O estudo de doenças como o câncer envolve a interação de muitos grupos de
nar mais eficiente o tratamento com pesquisa que se especializam em diferentes aspectos da doença e dominam
uma determinada droga, mas sem au- métodos de estudo que se complementam. O grupo de Adesão Celular e
mentar os riscos de efeitos colaterais, Câncer (onde atuam Andréia Otake e Roger Chammas) é um dos nós de uma
que infelizmente acompanham o uso rede que conta com a ativa colaboração de outros grupos de São Paulo,
de medicamentos. Em alguns tumores, Ribeirão Preto, Rio de Janeiro, Uberlândia e Goiânia, além de parcerias com
como em um tipo de tumor de pele centros do exterior. O objetivo desse grupo é compreender as funções bioló-
chamado melanoma, alguns lipídios de gicas de moléculas associadas ao desenvolvimento de tumores, que podem ser
membrana das células tumorais favore- usados como marcadores de progressão da doença.
cem a sobrevivência destas e induzem Vários candidatos a marcadores foram identificados no estudo de melanomas,
a morte de células normais – por exem- tumores de pele bastante resistentes a tratamento. Alguns desses marcadores
plo, células do sistema de defesa de controlam a sobrevivência das células tumorais, fazendo com que resistam a
nosso organismo, os linfócitos. Existem quimioterápicos. Estão sendo testadas estratégias para controlar a expressão
hoje drogas que permitem bloquear a desses marcadores, visando tornar a célula tumoral mais sensível a outras
formação desses lipídios, aumentando a drogas. Outra família de moléculas identificada está ligada à geração dos
sensibilidade das células tumorais a vasos sangüíneos que nutrem o tumor. O grupo liderado por Roberto Zatz
quimioterápicos. (disciplina de nefrologia da Faculdade de Medicina da USP) mostrou que
Embora esses estudos ainda estejam drogas usadas para o tratamento da pressão alta podem ter outras aplicações
em suas fases iniciais, este com certe- além da original: interferem, por exemplo, com a resposta inflamatória e
za é um assunto que vai ser bastante angiogênica em doenças dos rins. Os dois grupos estão associados em projeto
explorado nos próximos anos. Atual- que visa avaliar a aplicação dos inibidores do receptor de angiotensina na
mente, algumas dessas drogas estão formação de vasos intratumorais, com resultados bastante promissores em
sendo exploradas para o tratamento de modelos experimentais.
algumas doenças raras, em que há
acúmulo desses lipídios no cérebro, le-

j a n e i r o / f e v e r e i r o d e 2 0 0 6 • C I Ê N C I A H O J E • 31
ONCOLOGIA

ma forma há uma comunicação entre a célula complexos (figura 3). Fazem parte desse microam-
tumoral e células normais, e a primeira é capaz biente, além das células tumorais propriamente di-
de induzir as outras a produzir substâncias que tas, células dos vasos sangüíneos, células sangüí-
lhe permitam invadir tecidos vizinhos e migrar neas (como glóbulos brancos e seus derivados) e
pelos tecidos do organismo. fibroblastos (que formam o tecido de sustentação do
Aprendemos a pensar que nosso corpo trava tumor). Essa descoberta fez com que os cientistas
uma guerra contra parasitas e células tumorais, passassem a contar com maior número de possíveis
destruindo-os. A doença surge quando perdemos a alvos para tratamento dos tumores. A compreen-
batalha (entretanto, sempre esperamos que os tra- são de como as células malignas interagem com as
tamentos nos ajudem a ganhar a guerra). Usando outras células do microambiente tumoral é vanta-
essa mesma comparação, podemos dizer que a cé- josa porque essas últimas são geneticamente muito
lula tumoral consegue ‘seduzir’ células normais e estáveis, o que reduz muito a probabilidade do de-
fazer com que atuem a seu favor, ou seja, mudem senvolvimento de clones resistentes a tratamento.
de lado na guerra do organismo contra o tumor
(um ‘inimigo’ que se origina de uma parte do pró-
prio corpo).
Entre as células normais presentes na massa Destruir os vasos e
tumoral estão as que integram a parede de vasos
sangüíneos, fundamentais para levar nutrientes e matar o tumor de fome
oxigênio aos tecidos, inclusive ao tumor. O câncer
só se expande a níveis detectáveis clinicamente se Os vasos associados ao tumor, por exemplo, são
houver a formação de vasos, processo que chama- excelentes alvos para terapia antitumoral. A idéia
mos de angiogênese – de ‘angio’ (vaso) e ‘gênese’ é antiga: matar o tumor de fome. Muitos têm busca-
(criação), ambos termos de origem grega. A capa- do a solução para isso. Infelizmente, porém, a ques-
cidade de induzir e sustentar o processo de angio- tão não é tão simples. Pioneiro nesses estudos, o
gênese é outra característica essencial da célula médico Judah Folkman, da Harvard Medical School,
cancerosa. nos Estados Unidos, resumiu bem as dificuldades
Com a descoberta de que outros tipos de células que ainda existem nessa área. Quando sua desco-
influenciam de modo significativo o destino das berta de substâncias que bloqueariam a forma-
células cancerosas, consolidou-se o conceito de que ção de vasos em tumores se tornou pública, ele
os tumores malignos constituem ‘microambientes’ respondeu aos repórteres que buscavam mais um

Figura 3. Tumores são microambientes: além das células tumorais, estão presentes na massa tumoral células
endoteliais (no revestimento dos vasos sangüíneos que nutrem o tumor), células de suporte (como fibroblastos) e
células derivadas dos glóbulos brancos do sangue (leucócitos), o que inclui as células de defesa do sistema imune.
Cada célula dessas é um novo alvo para o controle do tumor. Novos tratamentos – além dos quimioterápicos, que
visam matar células em processo de duplicação – baseiam-se na exploração desses novos alvos. Na figura, o efeito
de um tratamento que tenha as células endoteliais de um tumor como alvo: a destruição do vaso (à direita) leva à
morte de células tumorais e à remodelação do tecido, que facilita a entrada no tumor de células derivadas dos
leucócitos. A combinação de tratamentos depende de pesquisas clínicas bem controladas que começam a ser fei-
tas no país e no exterior

32 • C I Ê N C I A H O J E • v o l . 3 8 • n º 2 2 3
ONCOLOGIA

furo jornalístico: “Sim, as notícias


são boas, especialmente para os
camundongos.”
Embora promissoras, as subs-
tâncias descobertas por Folkman
– a angiostatina, descrita em 1994,
e a endostatina, em 1997 – ainda
não têm efetiva aplicação em hu-
manos. Mas pesquisas clínicas
com a endostatina parecem bas-
tante encorajadoras. O intervalo
médio de uma década entre a
descoberta de um medicamento
potencial e as conclusões sobre
sua efetiva aplicação em huma- Figura 4. Drogas já usadas contra outras doenças podem ter efeitos
nos dá uma idéia da complexida- contra o câncer: bloqueadores do receptor I da angiotensina II, usados
de e do investimento em pesquisa para o tratamento da pressão alta, têm mostrado efeitos antitumorais
necessário nessa área. em animais de experimentação. O emprego de drogas já testadas cli-
nicamente, através da ampliação de suas indicações, poderá levar a
Mesmo que o conceito de Folk- uma grande economia de recursos de pesquisa. Tais drogas têm sido
man seja intuitivamente correto, o utilizadas apenas em esquemas experimentais, mas esses estudos são
fato é que muitas células tumorais promissores e poderão aumentar o arsenal de drogas para o combate
podem sobreviver à privação pro- do câncer, após validação em ensaios clínicos
longada de nutrientes e oxigênio, o
que poderia, por um mecanismo
de seleção semelhante ao descrito anteriormente, levar a malformações congênitas, mas que agora
levar ao predomínio de células resistentes ao trata- tem mostrado uma potencial ação antiangiogênica.
mento. Certamente uma estratégia isolada não nos Drogas usadas contra a pressão alta também têm
permitirá evitar o desenvolvimento de tumores, mas sido testadas no tratamento de melanomas em ca-
o controle da angiogênese é o que mais se aproxima mundongos. Esses medicamentos bloqueiam a
da idéia de um tratamento que detenha o seu cres- angiotensina, um peptídeo (pequena porção de uma
cimento, mesmo sem liquidá-lo – ou seja, um trata- proteína) que controla a função dos vasos sangüí-
mento que leve à ‘dormência’ da massa tumoral. neos. Além disso, esses medicamentos controlam a
Talvez o tumor não deixe de existir, mas terá sua reação inflamatória local, interferindo assim no
expansão controlada. processo de angiogênese. Os autores e outros inves-
tigadores têm observado que o tratamento de ca-
mundongos com esses medicamentos retardou o

Velhos medicamentos crescimento de melanomas, por diminuir a forma-


ção de novos vasos no microambiente do tumor

para novos alvos (ver ‘Redes de pesquisa’).


A busca de novas funções para medicamentos de
uso consagrado na clínica poderá acelerar a tradu-
Que drogas serão usadas para as terapias antian- ção para a prática médica dos conhecimentos que
giogênicas? As estratégias são variadas. Muito tem têm sido gerados nos laboratórios. Espera-se que a SUGESTÕES
PARA LEITURA
sido feito nessa área, mas ainda não há uma con- associação dessas drogas com medicamentos em-
clusão sobre a eficácia dos tratamentos. Estudos pregados no tratamento convencional de tumores WEINBERG, R. Uma
com pacientes voluntários têm sido organizados ajude a controlar o câncer com eficiência cada vez célula renegada:
como o câncer
em diferentes centros no mundo e, em breve, de- maior. Para isso, as pesquisas em animais de expe- começa. Rio de
vem ser divulgados resultados promissores. Uma rimentação (ensaios pré-clínicos) são essenciais, e Janeiro, Rocco,
linha de ação bastante interessante é a que se baseia seus resultados podem em breve justificar ensaios 2000.
YOUNES, R. N. O
não no desenvolvimento completo de novas drogas clínicos (com humanos). Tais ensaios seguem re- câncer. São Paulo,
antiangiogênicas, o que demora em torno de uma gras bastante rígidas, para que sejam geradas as Publifolha, 2001.
FRANKS, L. M. e TEICH,
década, mas no uso de drogas já testadas em diver- evidências necessárias para a indicação ou não da N. Introdução à
sas situações clínicas e que exibem algum poten- utilidade de um medicamento. Assim, em um fu- biologia celular e
molecular do
cial antiangiogênico (figura 4). turo não tão distante, conseguiremos aumentar nos-
câncer. São Paulo,
Esse é o caso, por exemplo, da talidomida, droga so arsenal de medicamentos cada vez mais eficien- Roca, 1990.
que teve seu uso abandonado há várias décadas por tes para o controle e tratamento dos cânceres. ■

j a n e i r o / f e v e r e i r o d e 2 0 0 6 • C I Ê N C I A H O J E • 33

You might also like