Professional Documents
Culture Documents
Sebenta Reais David
Sebenta Reais David
História ......................................................................................................................................................... 5
PRINCÍPIOS GERAIS dos Direitos Reais ........................................................................................................ 6
1. Princípio da Tipicidade ........................................................................................................................ 6
2. Princípio da Especialidade .................................................................................................................... 6
3. Princípio da Elasticidade ...................................................................................................................... 7
4. Princípio da Transmissibilidade ............................................................................................................ 7
5. Princípio da Publicidade ....................................................................................................................... 8
6. Princípio da Boa Fé ............................................................................................................................... 8
CONCEITO e ESTRUTURA dos Direitos Reais ............................................................................................... 8
Teoria Clássica ou Realista ....................................................................................................................... 8
Teorias Modernas ou Personalista ........................................................................................................... 8
Teoria do Poder Direto e Imediato sobre uma Coisa........................................................................... 8
Teoria do Poder Absoluto .................................................................................................................... 9
Teorias Mistas ...................................................................................................................................... 9
Orientações Doutrinárias Portuguesas .................................................................................................... 9
CARACTERÍSTICAS dos Direitos Reais ........................................................................................................ 10
I. Caráter Absoluto ................................................................................................................................. 10
II. Inerência ............................................................................................................................................ 10
III. Sequela .............................................................................................................................................. 11
IV. Prevalência ........................................................................................................................................ 11
Objeto dos Direitos Reais: COISAS ............................................................................................................ 13
Situações Jurídicas Propter Rem ............................................................................................................... 18
Obrigações Propter Rem ........................................................................................................................ 18
Ónus Reais .............................................................................................................................................. 19
Pretensões Reais .................................................................................................................................... 20
CLASSIFICAÇÕES dos Direitos Reais........................................................................................................... 22
Direitos Reais de Gozo, de Garantia e de Aquisição .............................................................................. 22
Direito Real Maior e Menor ................................................................................................................... 22
Direitos Reais sobre Coisa Própria e Coisa Alheia .................................................................................. 23
Direitos Reais de Proteção Definitiva e Proteção Provisória ................................................................. 23
Direitos Reais Simples e Complexos ....................................................................................................... 23
Direitos Reais Autónomos e Subordinados ............................................................................................ 24
Direitos Reais de Titularidade Imediata e Titularidade Mediata ........................................................... 24
POSSE .......................................................................................................................................................... 25
Fundamento da Proteção Possessória ..................................................................................................... 25
POSSE E DETENÇÃO ................................................................................................................................ 27
Solução da Lei .................................................................................................................................... 28
Âmbito da Posse ..................................................................................................................................... 30
2
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
ACESSÃO ................................................................................................................................................ 61
Distinção das Benfeitorias ................................................................................................................ 61
Art. 1326º tem as espécies de acessão ............................................................................................. 62
Formas de Atuação da Acessão ........................................................................................................ 63
Transmissão dos Direitos Reais ................................................................................................................. 65
Contratos Reais...................................................................................................................................... 65
Modificação dos Direitos Reais ................................................................................................................. 66
Defesa dos Direitos Reais .......................................................................................................................... 67
Extinção dos Direitos Reais .......................................................................................................................... 69
REGISTO – Publicidade dos Direitos Reais ................................................................................................ 73
Princípios do Registo Predial ................................................................................................................. 73
Modalidades de Atos de Registo .......................................................................................................... 75
Processo do Registo............................................................................................................................... 76
Efeitos do Registo .................................................................................................................................. 76
PROPRIEDADE ............................................................................................................................................. 81
Art. 1305º - Conteúdo do Direito de Propriedade .................................................................................. 81
Características do Direito de Propriedade .............................................................................................. 81
Formas de Aquisição da Propriedade ..................................................................................................... 81
Propriedade sobre as Águas – art. 1385º e ss. ....................................................................................... 82
Natureza do Direito de Propriedade ....................................................................................................... 83
PROPRIEDADE HORIZONTAL ........................................................................................................................ 84
Requisitos Legais e Partes Comuns do Prédio ........................................................................................ 84
Constituição da Propriedade Horizontal ................................................................................................. 85
Título Constitutivo ............................................................................................................................ 85
Condomínio ............................................................................................................................................ 86
Poderes .............................................................................................................................................. 86
Limitações aos Poderes – art. 1420º ................................................................................................ 86
Obrigações ......................................................................................................................................... 87
Administração das partes comuns ................................................................................................... 87
Modificação e Extensão .......................................................................................................................... 88
Natureza da Propriedade Horizontal ...................................................................................................... 89
USUFRUTO ................................................................................................................................................. 90
Características e Objeto ......................................................................................................................... 90
Constituição do Usufruto – art. 1440º ................................................................................................... 91
Poderes do Usufrutuário – art. 1446º .................................................................................................... 91
Obrigações do Usufrutuário ................................................................................................................... 92
Direitos do Proprietário de Raiz ....................................................................................................... 93
Extinção do Usufruto – art. 1476º ......................................................................................................... 93
3
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
4
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
História
Origem na categoria de ações romanística:
• Actio in personam – formulavam pretensão contra pessoa, não podendo a pretensão
extravasar a relação obrigacional.
o Deu origem ao iura in personam
• Action in rem – formulavam pretensão contra uma coisa, visando estabelecer a sua
defesa contra qualquer pessoa que de alguma forma perturbasse o aproveitamento
pelo titular, podendo este perseguir a coisa onde quer que ela se encontrasse.
o Deu origem ao iura in rem – Direitos Reais, que incidem sobre coisas, tendo
eficácia real1.
1
Eficácia do direito contra qualquer pessoa – direito de cariz absoluto
2
Havendo semelhança de consequências jurídicas geradas a partir da atribuição de direitos reais sobre
coisas corpóreas.
3
Situações da vida humana valoradas pelo Direito – aquelas situações da vida às quais o Direito confere
relevância para os fins próprios do Direito
5
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
1. Princípio da Tipicidade
Numerus clausus dos direitos reais – art. 1306º CC
➢ Proíbe a inexistência de direitos reais que não se encontrem previstos na lei.
o Se as partes quiserem criar novos direitos reais, ao abrigo da sua autonomia
privada, a lei nega-lhes a pretendida eficácia real, atribuindo-lhes apenas
natureza obrigacional – vincula inter partes.
➢ Limitação do número de realidades que podem ser qualificadas como direitos reais.
o Infração a esta regra leva a conversão legal.
▪ OA: apenas as restrições ao direito de propriedade estão sujeitas a
conversão legal; constituição de figuras parcelares é nula nos termos
gerais.
▪ ML: não há base para estabelecer essa distinção e estando em causa a
criação de um novo direito real, o tratamento dado é o mesmo.
Justificação do princípio: cariz absoluto dos direitos reais pode ser entrave à circulação dos bens
(o titular pode opô-lo eficazmente a qualquer adquirente de boa fé); sobreposição sucessiva de
direitos pode dar origem a litígios, afetando a possibilidade de exploração dos bens; Estado deve
criteriosamente instituir a ordenação jurídica dos bens.
Críticas: parte mais rígida e menos mutável do Direito Privado patrimonial – congelado e
cristalizado na forma clássica
2. Princípio da Especialidade
Tem que ser possível individualizar concretamente a coisa que constitui o objeto do direito
real: coisas corpóreas, determinadas, com existência presente e autónomas de outras coisas.
• Subprincípio da determinação: a coisa tem de estar determinada – se o titular tiver
direito a receber coisas genéricas não tem direito real e sim direito de crédito (art. 539º).
o Só há direito real a partir do momento em que as coisas sejam determinadas
(art. 408º/2).
o Não há direitos reais autónomos sobre universalidades, incidindo o direito
individualmente sobre cada uma das coisas que compõe a universalidade.
4
JAV: a autonomização de um ramo do Direito depende da existência de princípios jurídicos próprios que
lhe permitam constituir um subsistema autónomo dentro do sistema geral da ordem jurídica.
6
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
3. Princípio da Elasticidade
Admissibilidade das compressões e expansões dos Direitos Reais, em virtude da constituição
de um novo Direito Real que onere a coisa ou extinção posterior desse Direito.
➢ Conteúdo do direito não é imutável – varia conforme se vão constituindo e extinguindo
os direitos reais que incidem sobre a coisa – pode haver mudanças no conteúdo do
direito real.
➢ Em consequência da extinção do direito real menor, o direito real maior pode retomar
o seu conteúdo originário.
4. Princípio da Transmissibilidade
Comum aos outros direitos patrimoniais – mais importante nos direitos reais, tendo mesmo
garantia constitucional.
➢ Implica que os direitos reais possam ser objeto de sucessão por morte e que possam
ser transmitidos por ato inter vivos.
o Mas há direitos reais que não podem exceder a vida do titular (art. 1444º) e
outros inalienáveis (art. 1488º).
5
STJ decidiu assim, em 1996, em relação aos elevadores – a partir do momento que estão incorporados
no prédio faze parte dele e não podem haver direitos reais autónomos sobre o elevador.
7
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
5. Princípio da Publicidade
Factos jurídicos relativos aos direitos reais devem ser dados a conhecer ao público em geral.
• Forma mais comum de assegurar a publicidade dos direitos reais: Posse (art. 1268º/1)
• Forma mais perfeita de assegurar a publicidade dos direitos reais: Registo
6. Princípio da Boa Fé
Princípio geral do Direito Civil.
• Aplicação mais restrita do que no Direito das Obrigações – não há princípio que protege
o possuidor de boa fé contra a reivindicação de móveis.
o Mas releva para efeitos da posse, usucapião e acessão industrial.
Natureza ontológica das relações: direitos reais estruturam-se com base na relação de uma
pessoa com uma coisa, através da qual esta era afetada ao sujeito – tutelada pela actio in rem
e dirigida contra qualquer pessoa.
8
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Críticas: direito real não estabeleceria poderes para o titular e apenas deveres de abstenção a
terceiros, sendo um dever universal de respeito ou obrigação passiva universal (Windscheid); é
muito abstrata e faz esquecer o núcleo fundamental do direito que é precisamente a relação
com a coisa.
Teorias Mistas
Conjugam as duas conceções, considerando que o direito real tem:
• Lado interno – poder direto e imediato sobre a coisa
• Lado externo – relação com todos os outros sujeitos da ordem jurídica
o Jaime de Gouveia: é a relação jurídica que se estabelece entre o titular do direito
e todas as outras pessoas que se obrigam a respeitar o poder que o titular tem
de tirar da coisa, objeto do direito, todas as utilidades que a ordem jurídica
consente.
Defensores: Pires de Lima, Galvão Telles, Henrique Mesquita, Antunes Varela, Mota Pinto,
Santos Justo.
Críticas: estão sujeitas às críticas de qualquer uma das anteriores.
Menezes Leitão
Direito Real: direito
absoluto e inerente a uma coisa corpórea, que permite
ao seu titular determinada forma de aproveitamento jurídico desta.
9
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Permissão normativa específica de aproveitamento de uma coisa corpórea existe nos direitos
reais mas também noutros, tendo que se acrescentar outros traços distintivos como o caráter
absoluto e a inerência.
➢ É um direito absoluto porque pode ser oponível a qualquer pessoa e incide sobre uma
coisa corpórea, à qual é inerente.
I. Caráter Absoluto
Consiste no facto de os direitos reais não se estruturarem com base em qualquer relação
jurídica, sendo oponíveis erga omnes.
➢ MC discorda pois também entende os direitos de crédito como oponíveis a terceiros.6
Consequência é a 1) existência dum dever genérico de respeito desse direito por parte dos
outros sujeitos, aos quais o 2) titular do direito pode sempre opor eficazmente o seu direito.
1) Atribuem ao titular um domínio reservado de atuação, que todos os outros sujeitos têm
de respeitar.
2) Oponíveis a qualquer pessoa que se pretenda ingerir no domínio reservado ao seu
titular – grande potencial de reação
Direitos reais de gozo – propriedade pode constituir-se por ocupação (art. 1318º); ação de
reivindicação (art. 1311º a 1315º).
Direitos reais de garantia – faculdade da satisfação do crédito a partir dos rendimentos da coisa
ou do produto da sua venda.
Direitos reais de aquisição – aquisição pode ser desencadeada independentemente do atual
titular do bem/feita contra qualquer pessoa.
II. Inerência
Consiste no facto de os direitos reais estabelecerem com a coisa uma ligação especialmente
intensa, não podendo ser dela separados, designadamente para passarem a ter outra coisa
como objeto.
Estão de tal forma ligados à coisa que é o seu objeto que a ela inerem e não podem ser
desligados – coisa tem de ser existente, certa e determinada para poder ser objeto do direito
real.
6
Fala também em direitos reais relativos, como a servidão de vistas.
JAV discorda pois a servidão de vistas é oponível a terceiros.
10
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
➢ Não podem ser separados da coisa nem passarem a ter outra coisa como objeto – é
juridicamente impossível transmitir o direito da coisa sem a própria coisa.
o Transmissão do direito para outra coisa é juridicamente impossível. Ex: alguém
tem usufruto do prédio X e quer que esse usufruto passe antes a incidir sobre o
prédio Y – não o pode fazer; tem de extinguir o usufruto sobre X para constituir
um novo sobre Y
➢ Também não permite alargar o direito a uma realidade sobre a qual não incidia.
Manifestação positiva no art. 1545º/2
Implica que as vicissitudes da coisa se reflitam no direito real que incide sobre as mesmas –
manifestando a inerência dos direitos reais (art. 730º/2, 1485º, 1535º/e).
III. Sequela
Constitui uma manifestação dinâmica da inerência7 – titular pode ir buscar a coisa,
independentemente de qual o seu atual possuidor, mesmo que ela venha a ser objeto de uma
cadeia de transmissões (ubi rem invenio, ibi vindico).
➢ Características dos direitos reais e apenas destes – res perit domino
➢ Permite ao titular do direito atuar sobre a coisa para realizar o seu direito
Direitos reais de garantia: possibilidade de executar o direito e ser-se satisfeito com a venda
Direitos reais de aquisição: possibilidade de fazer sua a coisa (art. 1410º)
IV. Prevalência
Significa que o direito real que primeiro se constituir prevalece sobre todos os direitos reais de
constituição ou registo posterior, bem como sobre todos os direitos de crédito que se venham
a constituir.
• Maior força dos direitos reais sobre os direitos de crédito – confrontando direitos de
crédito com direitos reais, prevalece o real mesmo que os de crédito tenham sido
constituídos primeiro.
Direitos reais que não se compatibilizem sobre a mesma coisa são hierarquizados por uma
ordem de precedência, que pode ser conferida pela prioridade na constituição ou pela
prioridade no registo.
• Direitos reais, no confronto com outros direitos reais incompatíveis, prevalecem se se
tiverem constituído/registado primeiro.
7
JAV não liga à Inerência e sim ao Caráter Absoluto
11
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
MC segue Pinto Coelho e OA e nega que a prevalência seja, em absoluto, uma característica dos
direitos reais.
➢ ML discorda: os direitos de crédito não possuem prevalência pois regem-se pela
igualdade entre credores – o que não se verifica nos direitos reais, pois aquele que
constituiu primariamente o direito tem prioridade (prior in tempore, prior in iure),
aproximando-se à noção de prevalência (art. 604º/2).
➢ Ela funciona é em termos divergentes.
Direitos reais de gozo: implica que apenas o direito resultante da primeira alienação se
constitua, não chegando o segundo direito a constituir-se. O segundo é inválido pois não há
legitimidade.
Direitos reais de garantia: credores não estão em pé de igualdade e um será satisfeito
prioritariamente, tendo em conta a precedência do seu direito real.
• Satisfação preferencial do direito real constituído em primeiro lugar.
• Se o valor não chegar para satisfazer totalmente o direito que tem preferência, então
satisfaz até onde pode e o que não for satisfeito é crédito obrigacional.
Direitos reais de aquisição: constituindo-se um direito real, o direito de crédito extingue-se
por impossibilidade – essa extinção resulta de ter sido constituído um direito real incompatível,
que sobre ele prevalece.
Há algumas exceções: privilégios creditórios (art. 745º e ss.); privilégio imobiliário especial (art.
751º)
Prevalência pode ser extensiva a direitos não reais: art. 733º, art. 736º, 747º/1/a.
12
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
O conceito de Direito Real pode ser essencialmente delimitado em função do seu objeto: as coisas
corpóreas (art. 1302º)9
➢ Por força do princípio da especialidade, as coisas, para serem objeto de direitos reais,
têm que ser corpóreas, com existência presente, autónomas de outras coisas e
determinadas.
o Sem estas características não têm idoneidade para ser objeto de um direito real.
8
PPV: tudo aquilo que não seja pessoa e tiver uma utilidade (apto a satisfazer necessidades)
9
Art. 1303º - ML: é muito difícil verificar-se pois o regime dos Reais no CC pressupõe a existência
de uma coisa corpórea, não se harmonizando com coisa não corpórea.
13
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
• Coisa Corpórea: existência exterior e apreensível pelos sentidos. Suscetíveis de posse (apropriação física)
o Podem sofrer atuação humana direta, no sentido mais imediato de atuação física.
o Palma Ramalho: podem ser consideradas Materiais ou Imateriais
o Art. 1302º - só das coisas corpóreas se pode ser proprietário. Em qualquer dos estados físicos
(gases e líquidos são corpóreos mas envolvem um recetáculo).
o PPV: Coisas corpóreas dividem-se em coisas materiais (têm matéria e dimensão) e coisas imateriais (têm
realidade e existência na natureza física mas não têm matéria como a eletricidade).
Não se definem coisas imóveis, nem móveis, devido à sua grande heterogeneidade. O código decide enunciar, quer
as de origem natural quer as construções humanas (incluindo as realidades jurídicas).
Numeração enunciativa e não taxativa pois há muitas outras coisas imóveis não cobertas pelo artigo –
pontes, estradas, aquedutos
Núcleo essencial: um bem imóvel é um bem ligado ao solo com caráter de permanência, que dele não se
pode desligar – critério de imobilidade material à exceção dos direitos.
Pode-se também aplicar, residualmente, um critério da funcionalidade do bem.
a) Prédios – noção jurídica – porção de terreno ou construção incorporada num terreno, há sempre um solo.
i. Rústico: elemento predominante é o solo, mesmo que lá haja uma construção sem autonomia
económica – o elemento do solo é predominante quando a sua afetação económica, a sua utilidade
própria, residir principalmente no solo, tendo as edificações que nele existirem uma utilidade apenas
instrumental ou acessória.
Art. 204º/2
ii. Urbano: elemento predominante é a edificação (edifício incorporado no solo) – utilidade própria é a
edificação servindo o solo apenas como suporte físico
Art. 204º/2
14
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Logradouro – terreno à volta do qual está implantado, sem autonomia e servente às necessidades
dos habitantes prédio urbano. Ex: jardim
Não se olha para o contexto, mas quando o elemento predominante não chega, olha-se
à utilidade económica e à funcionalidade.
Pode-se alterar a classificação dos prédios10 com a submissão à Câmara Municipal da
alteração do registo – depende apenas do objetivo ou do elemento que agora
predomine.
iii. Frações Autónomas: decorrem da possibilidade de instituição do regime da propriedade
horizontal (art. 1414º)
Palma Ramalho -> Para reconhecer as partes comuns em copropriedade (escadas,
elevador, garagens) enquadra-se como partes de imóveis mas a fração autónoma é um
bem imóvel em si mesmo e segue as regras de bens imóveis.
iv. CC reconhece que o direito de propriedade sobre um prédio abrange o subsolo e o espaço aéreo
respetivos – art. 1344º (desde que não entre numa lógica de abuso de direito e má fé. Ex: espigões
para furar os dirigíveis)
b) Águas – as águas particulares (art. 1386º CC), nomeadamente as que nascem na nossa propriedade, passam
pela nossa propriedade ou estão no subsolo da nossa propriedade, podem ser objeto de direitos privados.
c) Árvores, arbustos e frutos naturais enquanto estiverem ligados ao solo – é tido em conta o critério de
incorporação no solo. A partir do momento que há autonomia passa a ser uma coisa móvel.
d) Direitos ligados aos anteriores – quia jurídico – aplica-se aos direitos sobre os bens imóveis o regime das
coisas imóveis. Ex: terreno X tem registo, usufruto de X também está sujeito a registo.
e) Partes integrantes – art. 204º/3 – quando uma coisa móvel está ligada materialmente a um prédio com
carácter de permanência – coisas originalmente móveis que foram integradas com caráter de permanência numa
coisa imóvel e que passaram, assim, a fazer parte dela, perdendo a individualidade e a autonomia.
i. Critério da ligação material. Bens que não têm autonomia relativamente ao prédio.
ii. Ao estarem separados podem ser tratadas como móveis, mas juntas são parte integrante de um
bem imóvel. Ex: azulejos da cozinha, elevador. A escultura do jardim não é vendida juntamente
com a casa porque não está a ela ligada materialmente, mas os azulejos estão.
iii. O prédio ao ser transmitido, as partes integrantes têm que acompanhar o destino do prédio.
10
Rustico vs. urbano
Teoria do valor – será segundo a parcela que tiver maior valor
Teoria da afetação económica – se visa o aproveitamento do terreno ou construção
Teoria da consideração económica – será o que a comunidade jurídica entender
11
Também pode haver Universalidades de Direito (ex: herança) ou um misto
15
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Favorece-se o tratamento unitário de um conjunto de coisas conglomeradas – o conjunto é que é objeto de Direito.
Individualmente as coisas também podem ser objeto de situações jurídicas. Ex: somos donos de cada livro, mas
também da biblioteca
• Móveis pertencentes à mesma pessoa com o mesmo destino unitário
o Analogicamente pode se aplicar a imóveis
• Têm um tratamento jurídico individual autónomo, sem prejuízo da individualidade jurídica dos seus componentes.
A doutrina considera que prevalece o critério do valor – dependendo da situação jurídica concreta e o negócio jurídico
celebrado.
Ex: Vaca. 1 – Ao cortar-se uma vaca ao meio ela continua uma vaca. 2 – Se for uma vaca para carne o seu valor pode
aumentar; se for para leite pode passar a valer menos. 3 – Se for para carne, não prejudica o uso a que se destinava;
se for para leite já prejudica. Uma vaca para carne é divisível. Uma vaca leiteira é indivisível.
Venda de coisa alheia que se espera vir a ser própria – os efeitos do negócio jurídico dependem da aquisição ou posse
por parte de quem negoceia.
Coisas alheias são objeto de atos de disposição na expetativa da sua futura aquisição pelo disponente.
Disponente fica obrigado às diligências necessárias para que as coisas futuras se tornem presentes
(art. 880º) – negócio só está concluído quando a coisa estiver junto da pessoa interessada.
O fruto é uma coisa que provém periodicamente de outra e que não altera a substância dessa outra.
• Periocidade é importante, regime dos frutos moldado à ideia de que eles vão surgindo
16
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
• Podem ser frutos naturais (frutas das árvores, crias de animais) ou civis (renda que se recebe pelo
arrendamento de um prédio)
• Na coisa composta, como o rebanho, o excesso é que é o fruto. Não conta os que nascem e compensam os
que morrem – só deve ser tido como fruto o que sobrar depois de descontado o necessário para a manutenção da
coisa frutífera.
o Ao nº3 do art. 212º do CC pode-se aplicar analogicamente para os frutos civis como por exemplo as
aplicações de capital, cujos rendimentos só devem ser considerados frutos depois de deduzido o que for
necessário à reposição do capital. Ex: juros do depósito após compensar a inflação.
Frutos Pendentes: quando ainda estão integrados na coisa principal e não têm autonomia
Em princípio os frutos pertencem ao proprietário da coisa frutífera, atendendo ao momento da colheita.
As coisas produzidas aleatoriamente e as que sejam com prejuízo ou detrimento da substância da coisa são tidas juridicamente
como produtos da coisa principal, não frutos.
Quando as despesas não são feitas pelo proprietário da coisa, quem as faz tem o direito a ser reembolsado se elas
forem necessárias mas não se forem voluptuárias.
➢ Regime de benfeitorias serve para saber se se paga a quem fez a benfeitoria
Domínio Público
Determinado por lei – coisas que são propriedade da nação e todos podem utilizar.
O Estado tem poder sobre estas coisas, sendo que esse domínio deve seguir regras mais apertadas daquelas que se
aplicam aos privados.
Reparte-se em várias esferas nomeadamente o natural, construído, monumental e histórico, militar.
17
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Situações jurídicas cujo sujeito ativo ou passivo é determinado em virtude da titularidade dum
direito real.
➢ Correspondem a situações em que a existência do direito real atribui ao seu titular
direitos ou obrigações em relação a outrem.
Origem no Direito Romano – situações tuteladas por uma actio in rem scripta, em que o nome
do demandado não figurava na intentio pois podia ser dirigida contra qualquer pessoa que se
encontrasse em determinada situação.
Regime jurídico
Existem inúmeras situações em que surgem obrigações propter rem no âmbito dos direitos
reais.
Comproprietários (art. 1411º/1); Condóminos (art. 1424º/1); Pagamento de impostos e outros
encargos anuais (art. 1474º); Usuário e morador usuário (art. 1489º); Canôn superficiário (art.
1530º/1); Servidões prediais (art. 1567º/1)
➢ Casos de obrigações propter rem injuntivas – tendo e conta que elas podem ser
convencionais
Não é obrigação propter rem os casos de responsabilidade civil atribuídos ao proprietário que
exigem um facto culposo para se poderem constituir – art. 492º e 1348º
Fazem parte do conteúdo do direito real uma vez que este, como situação jurídica complexa,
além do seu núcleo essencial, que consiste na faculdade de aproveitamento de uma coisa
corpórea, pode incluir outros elementos, entre estes se incluindo essas obrigações.
12
Não estão totalmente sujeitas ao regime vindo do Direito das Obrigações, uma vez que há várias
exceções – quanto à prescrição
18
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
• Em certos direitos a lei confere uma certa amplitude para a constituição de obrigações
propter rem por via negocial – usufruto (art. 1445º), uso e habitação (art. 1485º),
superfície (art. 1530º) e servidões prediais (art. 1564º).
• Apesar disto, estão sujeitas ao princípio da tipicidade e só se podem constituir nos casos
previstos na lei – pois elas vinculam o titular do direito real enquanto tal.
Obrigações propter rem acompanham o direito real de que fazem parte nas suas vicissitudes,
permanecendo ligadas a este.
• São transmitidas caso o direito real também o seja.
• Se a obrigação se venceu enquanto a coisa estava na titularidade do alienante, não é
transmitida com o direito real pois o vencimento desta implicou que ela passasse a
vincular pessoalmente o titular do direito. Ex: adquirente de fração autónoma não está
obrigado a liquidar dívidas do anterior proprietário nem a custear obras anteriores à sua
aquisição.
• Extinguem-se quando se extingue o direito real.
o Podem ainda extinguir-se por ter sido constituído, por via negocial ou
usucapião, um direito real com elas incompatível (como as servidões
desvinculativas)13.
Natureza Jurídica
• Teoria Realista – correspondem a verdadeiros direitos reais, uma vez que não há
obstáculos a que o direito real tenha por objeto um facere, podendo haver direitos reais
in faciendo; são geradas pela propriedade e resultam duma oneração dessa
propriedade; são inerentes às coisas e não às pessoas – Henrique Mesquita14, JAV
• Teoria Personalista – correspondem a verdadeiras obrigações, uma vez que nelas existe
o dever de uma pessoa realizar uma prestação, sendo consequentemente submetidas ao
regime geral das obrigações; especialidade da pessoa do devedor é determinada através
da relação com a coisa, mas, não há direito real pois não há atribuição de direito sobre
essa coisa (que serve apenas para determinar o sujeito passivo da obrigação) e sim sobre
uma prestação – Antunes Varela, MC, ML
• Teoria Mista – têm uma natureza mista pois recolhem elementos dos direitos reais e dos
direitos de crédito; relação de natureza complexa – Penha Gonçalves
• Teoria Relativa – correspondem a direitos reais ou direitos de crédito consoante o
critério que se adotasse, o da estrutura dos direitos e o da vinculação e pertença do
titular em relação a uma coisa determinada - Giorgianni
Ónus Reais
Constitui uma prestação de dare, em dinheiro ou géneros, única ou periódica, imposta ao
titular de determinados bens, que atribui ao respetivo credor preferência no pagamento sobre
esses bens.
13
Outros exemplos são as obrigações propter rem relativas à distância de abertura de janelas (art. 1360º)
e ao não gotejamento de águas sobre o prédio vizinho – estas extinguem-se se se constituir uma servidão
de vistas (art. 1362º) ou servidão de estilício (art. 1365º/2)
14
Para quem o conceito de direito real compreende não apenas os poderes conferidos ao seu titular e as
restrições e limites a que está sujeito mas também as vinculações de conteúdo positivo (obrigações reais)
que sobre ele recaiam.
19
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
➢ Direito a certa quantia sobre bens doados (art. 959º); apanágio do cônjuge sobrevivo
(art. 2018º); redução das doações sujeitas a colação (art. 2118º)
Regime Jurídico
São, como as obrigações propter rem, constituídos em virtude da titularidade de determinados
bens, aos quais permanecem ligados, mas, não fazem parte do conteúdo dos direitos reais.
• Adquirentes respondem pelo cumprimento de prestações anteriores pois sucedem na
titularidade da coisa a que essa obrigação se encontra unida.
• Atribuem preferência no pagamento sobre a coisa que gravam, estando assim
acopulados a uma garantia real, enquanto que nas obrigações propter rem não há
nenhuma garantia real.
o Mas não são meros direitos reais de garantia pois não se limitam a atribuir
preferência no pagamento a um credor, vinculando o dono da coisa a uma
verdadeira obrigação, que surge da titularidade dessa mesma coisa.
Natureza Jurídica
• Ónus reais têm a natureza de direitos reais – MC – existe inerência, dado que se
produziria uma afetação jurídica de uma coisa a outrem, independentemente das
situações jurídicas e materiais que afetem a coisa; têm as características dos direitos
reais.
• Ónus reais têm a natureza de obrigações propter rem – OA, JAC – são inerentes a uma
coisa mas não são funcionalmente dirigidos para o aproveitamento desta; não incidem
sobre coisas e sim sobre prestações.
• Ónus reais têm a natureza de obrigações propter rem, acopuladas a direito real de
garantia – Henrique Mesquita, ML – figura composta entre obrigação propter rem e
garantia imobiliária; são créditos constituídos propter rem a que se encontra associada
uma garantia real, que incide sobre a coisa gravada com o ónus.
• Ónus reais são figura complexa com elementos reais e elementos obrigacionais –
Carvalho Fernandes – elementos obrigacionais e reais que reagem uns sobre os outros
criando um regime particular.
Pretensões Reais
Direitos reais têm caráter absoluto mas permitem atribuir pretensões de caráter relativo, com
natureza obrigacional.
➢ A partir do momento em que se verifique a violação de um direito real o titular desse
direito tem o direito de exigir a cessação da violação.
20
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Direitos relativos com a especialidade de serem originados pelo direito real, estando,
consequentemente, a ele ligados.
➢ Não fazem parte do conteúdo desse direito real.
➢ Estão sujeitas às normas do cumprimento das obrigações
o Mas não se aplica art. 798º e ss. – indemnização por incumprimento pressupõe
a violação de uma obrigação previamente constituída, enquanto que as
pretensões reais surgem diretamente em resultado da violação do direito real.
o Pretensões primárias – ação de reivindicação ou ação negatória – não podem
ser cedidas a terceiro.
21
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
6 figuras no CC: Propriedade (art. 1302º a 1413º); Propriedade Horizontal (art. 1214º a 1238º);
Usufruto (art. ); Uso e Habitação (art.); Superfície (art. 1524º); Servidão (art. 1543º)
1 figura em legislação avulsa: Habitação Periódica (DL 275/93)15
➢ Alguma doutrina inclui a Posse – ML discorda que constitua um direito real.
15
Insere-se nos Direitos Reais pois resulta do regime as características dum direito real.
16
Está no Livro das Obrigações mas tem características de direito real.
22
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Classificação clássica que não se coaduna com a superfície (em que o implante existente em
solo alheio não pode deixar de ser visto como coisa própria do superficiário) nem com a
propriedade horizontal (em que o direito sobre as frações autónomas incide sobre coisa
própria).
MC: a proteção da posse é tão definitiva como a de qualquer outro direito real, só cessando essa
proteção quando a posse cessa.
➢ ML: a tutela da posse formal é provisória, tendo o possuidor que abandonar a coisa se
vier a ser convencido na questão da titularidade do direito real. Classificação só não faz
sentido porque a posse não é um direito real.
23
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
24
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
POSSE
Art. 1251º CC
Posse corresponde à situação em que ocorre o exercício fáctico de poderes sobre as coisas, o
que é objeto de proteção pelo Direito, independentemente da averiguação da efetiva
titularidade do direito sobre essa coisa.
➢ Tutela-se a exteriorização do direito, independentemente da averiguação da sua
titularidade.
Razões dessa proteção prendem-se com a defesa da paz pública e da continuidade do exercício
das posições jurídicas.
➢ O simples facto de se encontrar a exercer poderes sobre a coisa é suficiente para que
a Ordem Jurídica lhe permita exigir a manutenção ou restituição da coisa,
independentemente da discussão sobre a efetiva titularidade do direito.
Posse Formal – exercício fáctico de poderes sobre a coisa não é acompanhado pela titularidade
do direito real.
Posse Causal – exercício fáctico de poderes sobre a coisa está a ser realizado pelo titular do
direito.
➢ Para efeitos de tutela possessória é irrelevante o facto do possuidor ser ou não titular
do direito.
o A posse, como situação de facto só pode ter como objeto uma coia, dado que
não possuem direitos.
o Mas a referência ao direito pode funcionar como delimitação dos termos em
que o possuidor possui a coisa, daí que se refira que a coisa é possuída nos
termos de um direito – verificar em que termos a posse é exercida tendo em
conta o direito.
Teorias Relativas
Correspondem àquelas que buscam o fundamento da proteção possessória não na pose em si,
mas antes em circunstâncias, objetivos ou proposições jurídicas exteriores a ela, considerando
que a posse serve para defender outros institutos que, sem ela, não poderiam ser plenamente
exercidos.
• Tese da Proibição da Violência
o Turbação da posse é delito contra o possuidor (Savigny) – posse não constitui
relação jurídica pelo que a sua turbação/esbulho não consiste na violação de
25
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Teorias Absolutas
Correspondem àquelas em que o fundamento da proteção possessória é encontrado no próprio
instituto da posse.
• Tese da vontade do possuidor na sua incorporação fáctica (Gans, Puchta, Bruns) – tem
que se avaliar se a detenção está de acordo com a vontade universal (lei) ou é ato de
vontade individual; existe direito de propriedade protegido por lei ou há proteção legal
pois os atos de vontade individual são protegidos até que se demonstre que ofende a
vontade universal.
• Tese da preservação do controlo fáctico da coisa, atento o valor económico
representado pelo mesmo (Stahl) – a proteção possessória constitui uma forma de
apropriação das utilidades proporcionadas pelas coisas; estado de facto criador de
utilidades que beneficia de proteção legal, devido ao valor económico que representa.
26
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Menezes Leitão: rejeita as teorias que fundamentam a posse na propriedade, uma vez que a
posse extravasa o âmbito da propriedade, sendo hoje a sua tutela concedida inclusivamente no
âmbito dos direitos pessoais de gozo; a defesa da paz pública é importante mas não decisivo.
➢ Razão da proteção possessória resulta da circunstância do controlo fáctico sobre a coisa,
exercido no próprio interesse, constituir um valor económico, que deve ser disciplinado
e protegido como tal.
POSSE E DETENÇÃO
A distinção, que tem origem no Direito Romano, é feita com base em saber se quem exerce o
controlo material sobre a coisa beneficia ou não dos efeitos da posse.
Animus Detinendi: detentor que se limita a exercer direito de propriedade alheio não tem o
animus possidendi e tem apenas o animus correspondente a deter uma coisa em nome alheio,
não tendo por isso a posse. Ex: locatário possui a coisa em nome alheio – não tem tutela da
posse.
O essencial é a relação material com a coisa, acompanhada de querer manter essa relação, pelo
que em princípio a detenção conduz à posse, uma vez que esta se basta com a existência de um
poder físico sobre a coisa voluntariamente mantido e exercido – traduzindo-se em termos
27
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
positivos do exercício de poderes sobre a coisa e em termos negativos na exclusão dos outros
em relação a ela.
Existe sempre corpus e animus – são elementos essenciais de qualquer relação com a coisa,
dado que esta exige sempre a materialização duma vontade pelo que o animus não poderia
existir sem o corpus, nem o corpus sem o animus.
SAVIGNY:
Posse = animus + corpus + intenção do animus possidendi (x = a + c + α)
Detenção = animus + corpus (y = a + c)
JHERING:
Posse = animus + corpus (x = a + c)
Detenção = animus + corpus – disposição legal que exclui certas relações possessórias
da proteção interdital (y = a + c – n)
Solução da Lei
Inspirada na doutrina subjetivista de Savigny -> art. 1253º/a, c
➢ Há uma exigência do animus domini para caracterizar a posse.
Parte da doutrina17 considera a lei objetivista pois no art. 1251º não há referência ao animus e
o art. 1253º apenas refere as situações que não se consideram como posse (o que é
precisamente o que a teoria objetivista defende).
➢ Art. 1253º/b, c – não se retira a qualidade de possuidor ao detentor por lhe faltar
vontade específica, mas sim porque pretende atribuir a posse a outrem.
o Art. 1253º/a – referência à intenção não é compatível com uma orientação
objetivista
▪ OA: quando agente declara que não quer ser possuidor = JAV, MC
17
JAV
28
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
ML: há que reequacionar a discussão. O debate de Savigny e Jhering era devido aos escritos
romanos negarem interditos possessórios ao locatário, comodatário e depositário mas
conferiam-nos ao credor pignoratício. A nossa ordem jurídica concede as ações possessórias a
todas estas situações, o que implica que entre nós a distinção entre posse e detenção tem de
ser estabelecida em termos distintos.
Art. 1253º/a não pode ser encarado como uma formulação objetivista pois a sua referência à
intenção não serve para converter toda a detenção em posse, sendo antes um dos casos legais
da qualificação de uma situação aparentemente possessória como mera detenção.
Norma pretendeu abranger os atos facultativos e a doutrina (MC) tem-na entendido certos
significados:
i. Exercício pelo proprietário de um poder incluído no seu direito, que poderia igualmente
integrar um direito sobre coisa alheia;
➢ ML: conflito entre titulares de direitos reais – art. 1406º/2
ii. Exercício de poderes sobre bens do domínio público;
➢ ML: regulada no art. 1267º/1/b
iii. Não exercício pelo proprietário de faculdades que a este assistem, beneficiando-se
assim indiretamente de outrem, mas não podendo este, por não ter posse, adquirir por
usucapião servidões negativas;
➢ ML: não se adequa à definição de posse do art.1251º
iv. Ato facultativa corresponderia ao ato de mera tolerância, podendo distinguir-se deste
por envolver uma permissão expressa, enquanto que no ato de mera tolerância a
permissão seria tácita.
➢ ML: cabe no art. 1253º/b
ML: corresponde a situações em que há exercício de poderes de facto sobre a coisa, mas os
mesmos correspondem ao conteúdo de um direito ao qual a lei não reconhece a tutela
possessória. Ex: aplica-se aos hóspedes, no contrato de hospedagem e ao titular do direito
real de habitação periódica, que a lei não reconhecesse tutela possessória.
Art. 1253º/b: deve ser interpretada amplamente, abrangendo todos os casos em que o
exercício de poderes sobre a coisa resulta de uma autorização expressa ou tácita, emanada do
proprietário, sem que, no entanto, essa autorização vise conceder algum direito ao detentor.
29
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
titulares de direitos reais menores. Mandatários sem representação não poderão ser
considerados como detentores, uma vez que são possuidores em nome próprio (art. 1180º)
Âmbito da Posse
Art. 1251º - posse é relacionada com o exercício do direito de propriedade ou de outro direito
real.
➢ Só pode haver posse de coisas adequadas a constituírem objeto dos direitos reais – se
a coisa não é objeto de direito real, então não pode haver posse. Ex: direito de autor
Existe Posse nos Direitos Reais de Gozo – pode existir posse quer em termos de propriedade
plena, quer em termos de usufruto, uso e habitação, superfície e servidões prediais. Não existe
no direito real de habitação periódica porque é limitado no tempo.
18
ML: portanto se se constrói numa praia, não há posse da coisa porque se construiu num domínio
público.
19
Como a propriedade – art. 1344º/1
30
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Existe Posse nos Direitos Pessoais de Gozo, na medida em que atribuem poderes sobre a coisa,
que a lei tutela através das competentes ações possessórias (art. 1037º/2, 1125º/2, 1133º/2,
1188º/2).
• Existência de posse, nestes direitos, não implica a sua qualificação como direitos reais
pois o direito de gozo da coisa é obtido a partir de uma prestação do devedor.
Também existe posse no caso promitente-comprador que obteve a tradição da coisa a que se
refere o contrato prometido – exerce antecipadamente os poderes correspondentes ao
exercício do direito de propriedade, o que justifica que beneficie da tutela possessória.
Concurso de Posses
Caso em que várias pessoas tenham posse sobre a mesma coisa.
Sobreposição de Posses – ocorre sempre que a mesma coisa seja possuída nos termos de direitos
com âmbito distinto.
• Se proprietário, que tem a posse da coisa, constituir um usufruto sobre a mesma,
passarão a existir duas posses sobre a mesma coisa – posse em termos de propriedade
e em termos de usufruto.
• No entanto, se apenas o usufrutuário exercer os poderes de facto sobre a coisa, ele terá
posse em nome próprio em relação ao usufruto, exercendo também em nome alheio a
posse relativa à propriedade.
Comunhão de Posses – ocorre se a coisa for possuída por vários titulares com base num direito
ou acordo comum, ficando assim todos eles na situação de compossuidores.
31
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
• Art. 1286º e pode ocorrer no caso de a posse se referir a um direito real exercido em
comunhão (art. 1403º e ss.) ou art. 669º/2.
Conflito de Posses – ocorre sempre que existam duas posses em conflito sobre a mesma coisa,
o qual terá de ser resolvido com a atribuição da posse a um dos litigantes.
• Existiu a aquisição da posse por um novo possuidor mas a posse do anterior não se
extingue imediatamente, pois ele apenas a perde ao fim de um ano (art. 1267º/1/d), o
que lhe permite recorrer à ação de manutenção ou restituição da posse (art. 1278º)
• Entre a posse do esbulhado e a posse do esbulhador há conflito de posses
Classificações da Posse
Classificações de Menezes Cordeiro + Classificações do art. 1258º
Classificações Doutrinárias
Posse Causal vs. Formal
• Causal – acompanhada da titularidade do direito; possuidor é simultaneamente titular
do direito real a que a posse se reporta.
• Formal – não há titularidade do direito
A lei por vezes mantém a situação possessória, apesar de já se ter perdido o controlo material
sobre a coisa (art 1278º/1 e 1282º) – relaciona-se com o Conflito de Posses
Classificações Legais
Posse Titulada vs. Não Titulada
• Titulada – funda-se num modo legítimo de adquirir, independentemente do direito do
transmitente ou da validação substancial do negócio jurídico (art. 1259º/1) – tem título
legítimo de posse sobre a coisa
• Não Titulada – não deriva de um modo legítimo de adquirir
32
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Liga à forma mas não à substância – é posse não titulada a compra de um imóvel por contrato
oral (vício de forma)20 mas é posse titulada no caso de compra e venda de bem alheio (vício
substancial).
Título não se presume e cabe ao possuidor fazer prova dos factos relativos ao título sob pena de
a posse se ter por não titulada (art. 1259º/2).
Deve ser interpretado num sentido ético e não meramente psicológico – boa fé é aquele que
ignora sem culpa, não apenas o que ignora.
Posse titulada presume-se de boa fé a não titulada presume-se de má fé (art. 1260º/2) e faz
considerações sobre a posse violenta (art. 1260º/321)
ML: Violência pode ser exercida contra coisas ou contra pessoas mas não se confunde com a
ilicitude na sua aquisição.
➢ PL / AV: tem de ser violência contra os indivíduos = JAV
Posse violenta não pode ser registada (art. 1295º/2) e não permite a contagem do prazo para a
usucapião (art. 1297º e 1300º/1).
Implica que o prazo para o possuidor intentar ações correspondentes apenas se inicia após o
conhecimento do esbulho (art. 1282º, parte final).
Posse Oculta não pode ser registada (art. 1295º/2) e não permite a contagem do prazo para a
usucapião (art. 1297º e 1300º/1).
20
Posse não é titulada mas pode derivar em usucapião.
21
Sendo uma presunção inilidível destinada a sancionar a atuação violenta por parte do possuidor.
33
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Vicissitudes da Posse
Constituição da Posse – art. 1263º
a) Apossamento – prática, em relação à coisa, de atos materiais, por forma repetida e
com publicidade.
• Em relação ao anterior possuidor, o apossamento traduz-se num esbulho da
coisa.
22
Mas não basta o contrato relativo à transmissão do direito suscetível de posse, é necessário acordo
específico relativamente à transmissão de posse – lei diz claramente que tem de haver tradição da coisa,
não se aplica o art. 408º/1 à posse.
34
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
23
JAV: Se consentir é traditio brevi manu.
35
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Manutenção da Posse
Savigny: a posse conserva-se enquanto não desaparecer um dos elementos (corpus ou animus),
que só acontecerá se se verificar um corpus ou um animus de sinal contrário àquela posse.
Pessoa deixa coisa na floresta – posse mantém-se enquanto a pudesse ir lá buscar de volta
Jhering: posse é exteriorização da propriedade, pelo que a manutenção da posse pressupõe que
os poderes fácticos sobre a coisa continuem a ser exercidos. A posse considera-se perdida
quando o possuidor vê perturbada a sua relação com a coisa e não adota a diligência habitual
de um proprietário para recuperar essa relação. Pessoa deixa coisa na floresta – posse não se
mantém pois essa não é uma conduta de proprietário diligente.
Art. 1257º
➢ ML: possibilidade de continuação do exercício do direito no sentido de que basta
assegurar um certo controlo sobre a coisa para conservar a posse sobre ela; é a
cessação do controlo sobre a coisa que implica a perda da posse.24
o Pessoa deixa coisa na floresta – perde a posse por abandono, constituindo o ato
de a ir buscar de volta uma repetição do apossamento.
o Pessoa estaciona na via pública – não perde a posso uma vez que detém o
controlo da mesma, tendo as chaves
Art. 1257º/2 – presume-se que a posse continua em nome de quem a começou; a lei presume
a continuação da posse e não é exigível, para efeitos de usucapião, que se demonstre a prática
constante de atos relativos à posse.
➢ Faz inverter o ónus da prova
Modificação da Posse
Sempre que ocorrer alteração nas características da posse. Releva para efeitos de aplicação de
outras figuras.
Ex: é de boa fé e deixa de o ser; é violenta e deixa de o ser.
Sucessão na Posse
Art. 1255º - sucessão é automática e ocorre independentemente da apreensão material da
coisa.
➢ ML: pode ocorrer se os sucessores forem herdeiros do de cuius, mas, também ocorre se
forem legatários.
Acessão na Posse
Art. 1256º - num caso distinto da sucessão por morte, a junção da posse do anterior titular é
facultativa, ainda que possa ser vantajosa (para atingir o prazo da usucapião e etc.)
Art. 1256º/2 – dentro dos limites da posse com menor âmbito. Ex: possuidor a título de
usufrutuário pode invocar a posse do anterior proprietário, mas apenas para efeitos da posse
do seu usufruto – proprietário tinha prédio há 20 anos, eu acesso na posse, só posso juntar à
24
ML rejeita o pensamento de MC e de PL / AV que admitem que o não uso pode extinguir a posse. Para
ML, o que extingue a posse é a cessação de controlo, não o deixar de estar em contacto material com a
coisa (admite fenómenos de desmaterialização, desde que mantenha controlo sobre a coisa)
36
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
minha posse os 20 anos que o antigo possuidor fora usufrutuário (apesar de ele ter sido
proprietário).
• Se tinha posse não titulada e de má fé, a acessão na posse apenas pode ocorrer nesse
âmbito (mesmo que para o adquirente seja titulada e de boa fé)
• ML (= MC)25: art. 1256º não exige a validade (substancial ou formal) do negócio para
permitir a acessão na posse, mas apenas que a sucessão na posse de outrem resulte de
um título diverso da sucessão por morte, como a tradição ou o constituto possessório.
Não há razão para excluir a acessão em caso de posse não titulada pelo que o prazo para
a usucapião pode decorrer em esferas de diferentes possuidores, o que é coerente com
o sistema (art. 1296º). Não se pode é ir buscar uma posse contra quem se está a invocar.
25
Contrários a Manuel Rodrigues, que exige validade substancial, e PL / AV que exigem validade formal
do título.
37
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
d) Posse de outrem por mais de um ano – durante um ano, após o início da nova posse,
haverá uma sobreposição de posses sobre a coisa, pois o novo possuidor já tem a posse
e o anterior só a perde ao fim de um ano.
• A ação de reivindicação baseia-se na posse – se a pessoa é esbulhada fica sem
posse e não pode reagir, porque não tem posse. Assim, a lei permite que a posse
do esbulhado se mantenha para ser reivindicada por ele.
o Situação em que não há corpus mas ainda há posse – o legislador dá
relevância a esta situação mas restringe-a temporalmente.
• Art. 1267º/2 – contagem de prazos para a nova posse.
Efeitos da Posse
A posse atribui benefícios ao possuidor, mas, impõe-lhe deveres.
Direitos do Possuidor
A. Presunção da titularidade do direito – art. 1268º - não vigora o sistema da “posse
vale título”, não se atribuindo a propriedade apenas em função da posse de boa fé das
coisas móveis, mas, dispensa o possuidor de provar a titularidade de um direito para
exercer a posse.
• A menos que se prove a existência de um direito real sobre a coisa, o possuidor
verá conservada a sua posse.
• Presunção de propriedade que é vantajosa para o possuidor só não se aplica se
houver outra pessoa que tenha registado a sua aquisição com data anterior ao
início da posse, pois a presunção conferida pelo registo prevalecerá sobre a
presunção conferida pela posse.
B. Direito de uso da coisa – que corresponde ao exercício de posse sobre ela. É lícito
tanto na posse de boa fé como na posse de má fé, havendo só responsabilidade nos
termos do art. 1269º; o simples uso da coisa não constitui o possuidor no dever de
indemnizar.
C. Direito aos frutos percebidos da coisa, em caso de boa fé – art. 1270º - regime
legal que atende ao facto do poder de fruição competir ao titular do direito, mas, apesar
disto, a lei não considera nula a alienação realizada de boa fé e as soluções são outras.
• O possuidor nada tem que restituir acima do valor dos frutos alienados,
podendo conservar os ganhos resultantes da alienação que excedam esse valor
– art. 1270º/3 remete para o art. 1270º/2.
i. Enquanto possuidor posso fruir sempre? Não: art. 1271º, possuidor de má fé não pode fruir
ii. O possuidor de boa fé pode fruir sempre? Não: se for titular de um direito de superfície ou de uma
servidão, não pode fruir, pois não há fruição nesses direitos.
38
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Deveres do Possuidor
A. Responsabilidade pela perda ou deterioração da coisa – art. 1269º
• Pelo art. 807º/2 fica à disposição do possuidor a possibilidade de provar que o
proprietário teria igualmente sofrido danos se a coisa estivesse na sua posse –
causa virtuais negativas.
B. Responsabilidade pelos frutos que um proprietário diligente teria obtido, em
caso de posse de má fé – art. 1271º
C. Obrigação de pagamento dos encargos da coisa, em caso de atribuição dos
frutos – art. 1272º
Defesa da Posse
Conceção da tutela possessória visa acautelar a paz jurídica e a continuação do valor que
representa a utilização da coisa.
➢ A lei confere ao possuidor Ações Possessórias como meios de defesa da posse.
o Ações possessórias não são ações reais e também podem ser utilizadas para a
defesa de direitos pessoais de gozo, como os direitos do locatário.
39
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Procedimento cautelar comum – art. 362º e 379º CPC, se for obra é art. 397º e ss. CPC
26
Mas só se pode intentar contra um terceiro de má fé; o terceiro de boa fé é tutelado
27
Turbação – ato material que afete o exercício da posse, em virtude de uma pretensão
contrária à posse de outrem, e a conservação dessa posse na esfera do possuidor.
28
Esbulho – pressupõe a privação da posse por parte do possuidor, em resultado de um ato
material (apossamento) ou jurídico (inversão do título da posse) de outrem com a finalidade de
constituir posse própria. Pode ser parcial, quando apenas uma parte do objeto possuído é
subtraído ao seu anterior possuidor.
40
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Pedida uma ou outra, juiz verifica qual a situação realmente verificada – art. 609º/3 CPC
• A ação é julgada procedente bastando a demonstração da posse e da turbação ou
esbulho (art. 1278º/1).
• A ação será procedente se a parte contrária não tiver melhor posse (art. 1278º/2) – a
melhor posse é aquela que for titulada ou, na falta de título, a mais antiga ou a atual
(art. 1278º/3)29
Se forem procedentes, o possuidor é havido como nunca perturbado ou esbulhado (art. 1283º)
– não afeta a contagem do prazo para a usucapião.
Pode ser indemnizado: art. 1284º
Tutelada através do procedimento cautelar de restituição provisória da posse – art. 377º CPC –
exigindo como pressupostos a posse, o esbulho e a violência.
Destinam-se a reagir contra qualquer ato judicialmente ordenado que ofender a posse ou
qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja
titular quem não é parte na causa.
• Única forma de defesa contra atos judiciais, não sendo possível recorrer a outros meios
possessórios.
29
O recibo pode servir para demonstrar que tem a posse mais antiga
30
A justificação para este prazo resulta do facto de a apreciação da turbação ou esbulho ser difícil se se
passar muito tempo após os factos. Se o esbulhado não reagir durante um ano é porque reconhece o
direito ao esbulhador.
31
Derrogação ao princípio do contraditório justificada pela violência do esbulho.
41
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Natureza da Posse
Tese que vê a posse como um mero facto – Windscheid
Posse é mero facto e, embora produza consequências jurídicas, não é em si uma posição jurídica,
pois a proteção do possuidor não resulta de ele ter um direito, mas antes de ser vedado aos
outros o recurso à força.
➢ É incluída no sistema dos Direitos Reais pois estabelece uma relação jurídica com a coisa,
a mais direta e simples relação jurídica.
42
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
De facto, a posse pode ser causal, quando o possuidor é igualmente o titular do respetivo direito
sobre a coisa. Mas mesmo nesse caso, à luz do art. 1251º, a posse não resulta da atribuição do
direito, mas antes do seu exercício.
• No direito real de gozo apenas se incluem os poderes relativos à coisa, sendo o seu
exercício efetivo que atribui a posse.
• Também no caso dos direitos reais de garantia a posse não faz parte do conteúdo do
direito, sendo antes um pressuposto da sua constituição e conservação
A posse não é um direito real e também não faz parte do conteúdo dos direitos reais – a posse
liga-se é intrinsecamente aos direitos reais, não só porque resulta do exercício destes, mas
também porque em certos casos pode ser pressuposto da sua constituição e manutenção.
Faculdade de Uso da Coisa (ius utendi) – permissão de se servir dela para qualquer fim em que
a coisa possa ser utilizada.
• No direito de propriedade é plena (art. 1305º) mas noutros direitos reais de gozo ela
pode ser limitada pelo destino económico atribuído à coisa (art. 1446º), pelas
necessidades do titular (art. 1484º) ou por utilidade específica, suscetível de ser gozado
por intermédio de um prédio (art. 1544º).
43
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Faculdade de Fruição da Coisa (ius fruendi) – permissão de retirar da coisa os rendimentos que
ela possa proporcionar periodicamente, sem prejuízo da sua substância.
• Pode ser fruição natural (frutos naturais) ou civil (rendas ou interesses que a coisa
produz em função duma relação jurídica).
• Não é essencial aos direitos reais de gozo, uma vez que nem todas as coisas são
suscetíveis de produzir frutos.
• Quem obtenha frutos a partir das coisas encontra-se a exercer o direito real
correspondente, pelo que adquire a posse da coisa, podendo adquiri-la por usucapião
se não for titular do direito, e não se poderá operar a sua extinção por não uso, na
hipótese oposta.
Em certos casos, os direitos reais de garantia atribuem ao credor limitadas faculdades de uso
(art. 661º/1/b, 671º/b, 758º, 759º/3) e de fruição da coisa (art. 661º/1/c, 661º/2, 672º, 758º,
759º/3). Nesses casos, os direitos reais de garantia são associados à posse da coisa, sendo
tutelados pelas ações possessórias (art. 661º/1/b, 1037º/2, 670º/a, 758º, 759º). Ex: não há
penhor sem existir posse.
44
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Não se refere apenas a limitações ao direito de propriedade e podem afetar titulares de outros
Direitos Reais de Gozo.
Código de Seabra – não consagrava a propriedade como direito absoluto e via-lhe como limites
a “natureza das coisas, a vontade do proprietário e as disposições expressas da lei”.
CRP 1933 – consagra, no art. 35º, a doutrina da função social da propriedade, limitando assim
esse direito.
Código Civil de 1966 – art. 1305º não fala da função social da propriedade; o art. 1344º/2 apenas
refere o interesse do proprietário.
CRP 1976 – não tem referências à função social da propriedade nem aos limites32 dos poderes
do proprietário.
ML: a propriedade tem uma função social, como se compreende pelas limitações legais que
são estabelecidas em relação aos poderes do proprietário. A função social da sociedade não
pode é ser argumento para estabelecer uma funcionalização absoluta dos poderes do
proprietário (apenas admitindo o proprietário a exercer os poderes cuja utilidade social a lei
reconheça) – a propriedade é direito subjetivo, sendo por isso um espaço de liberdade, que
permite ao proprietário a sua realização pessoal que é por ele decidida.
➢ Esse espaço de liberdade tem é de ser compatibilizado com as exigências da vida
social.
➢ Mas o núcleo essencial do direito de propriedade não pode ser afetado.
➢ Função social da propriedade pode e deve ser explicada pela proibição do Abuso do
Direito – art. 334º - não será permitido o exercício do direito de propriedade em termos
manifestamente disfuncionais ao sistema jurídico.
32
Doutrina tem visto implícito esse limite no art. 61º/1 e art. 88º/2
45
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Expropriação
Limitação do Direito Real é a sujeição ao Direito Potestativo de Expropriação
Requisição
Limitação do Direito Real é a sujeição ao Direito Potestativo de Requisição
Está constitucionalmente sujeita ao regime da expropriação (art. 62º/2 CRP), sendo possível de
ser realizada tendo base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização – art. 1309º CC
Pode abranger coisas móveis (art. 84º C. Exp) como imóveis (art. 81º C. Exp) e tem sempre um
caráter temporário, apenas legitimando a afetação dos bens aos fins da entidade requisitante
por certo período de tempo.
33
Indemnização que não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas antes
ressarcir o prejuízo que para o expropriado adveio – art. 23º/1 C. Exp
46
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Nacionalização e Coletivização
Limitação do Direito Real é a sujeição ao Direito Potestativo de Nacionalização
Art. 83º CRP – apropriação pública dos meios de produção com base na lei
Confisco
Limitação do Direito Real é a sujeição ao Direito Potestativo de Confisco
Servidões Administrativas
Limitação do Direito Real é a oneração do seu direito com uma Servidão
Ius Aedificandi
Limitação do Direito Real é a sujeição aos condicionalismos administrativos relativos à
construção e à edificação
i. Tese que qualifica o ius aedificandi como concessão jurídico-pública, resultante do sistema de
atribuição de plano urbanístico – Jorge Miranda, Rui Machete – era um direito autónomo, que
não resultaria da propriedade privada mas de um ato jurídico concedido pela autoridade
pública a certos proprietários, sendo por isso regulado pelo Direito Público.
• Nega a faculdade de construção no conceito constitucional de propriedade privada,
sendo essa faculdade uma concessão jurídico-pública decorrente do plano urbanístico.
• Faculdade de construção não é entendida como direito subjetivo privado imanente à
propriedade do solo, pois sem a concessão do plano ela não existiria.
• Jurisprudência (TC e STA) tem aderido à classificação do ius aedificandi como direito
subjetivo público, recusando a sua integração no direito de propriedade
47
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
ii. Tese que classifica o ius aedificandi como direito fundamental, sendo enquadrado no âmbito
do Direito Constitucional, podendo, enquanto tal, ser objeto das restrições inerentes ao interesse
coletivo – Mário Esteves de Oliveira, Reis Novais
iii. Tese que defende a inclusão do ius aedificandi nos direitos de propriedade ou de superfície
incidentes sobre o imóvel – OA, Freitas do Amaral, Marcelo Rebelo de Sousa, João Caupers –
qualificação do ius aedificandi como atributo natural da propriedade do imóvel e do direito de
superfície, tendo por base no facto de o poder de transformação aparecer incluído nas
faculdades atribuídas ao proprietário.
• Ius aedificando faz parte da liberdade de utilização da propriedade garantida
constitucionalmente (art. 62º/1 CRP).
• Não é conferido por plano urbanístico, que teria apenas a função de modelar o exercício
do direito.
• ML: é o que resulta do art. 1305º e 1527º e é confirmada pela nova Lei dos Solos (art.
4º/1; 4º/2; 4º3; 13º/2/b,c; 20º Lei 31/2014)
34
Poder discricionário de concessão da licença
35
Poder vinculado de autorização, que só pode ser rejeitado se estiverem preenchidos fundamentos
legais de recusa.
36
JAV diz que se deve repensar e ponderar aplicar estas refras noutros casos: como a coisas móveis e a
coisas móveis + imóveis
48
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Prédio vizinho não tem de ser interpretado como prédio contíguo – significa prédio próximo,
não geograficamente, mas sim num sentido de possibilidade de afetação ou proximidade
social.
➢ Alarga o âmbito de proteção desta disposição37
Dever de abstenção resulta das relações de vizinhança, pelo que não é afetado pela existência
de uma autorização administrativa para o exercício da atividade, quando depende de
licenciamento.
➢ Isso apenas legitima o exercício da atividade em termos de Direito Público, não pondo
em causa eventuais direitos privados que venham a ser afetados pela atividade.
o Privados podem reagir contra a atividade mesmo que tenha havido essa
autorização.
Mesmo que cumpra as normas gerais sobre poluição, pode haver um dever de abstenção pois o
que está em causa é o prejuízo específico causado à utilização do imóvel vizinho – o que pode
ocorrer mesmo em casos de emissões poluentes que se enquadram dentro dos limites legais.
➢ STJ 22/9/09 – proibiu a emissão de ruídos noturnos por uma padaria que perturbava o
sono do vizinho, mesmo tendo os ruídos dentro dos níveis permitidos.
37
Contra PL / AV que dizem que deve ser interpretada restritamente.
49
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Art. 1363º - a diferença entre fresta e janela é se na abertura cabe a cabeça de uma pessoa
(Henrique Mesquita e ML)
• Doutrina diz que se as frestas não respeitarem o art. 1363º o vizinho pode exigir a sua
eliminação, modificação ou levantar construção que as tape.
• Outra doutrina entende que esta colocação desrespeitosa pode levar à constituição por
usucapião de uma servidão predial, diferente da servidão de vistas, dado que constituem
encargo em benefício de prédio diferente (art. 1543º)
o ML: concorda. Proprietário pode adquirir por usucapião uma servidão atípica.
Permite-se ainda, aquele que tem a servidão, reagir contra qualquer ato do
proprietário do prédio serviente que estorve o uso dessa servidão,
designadamente a realização de construção que desrespeite art. 1362º/238
Mesmo regime para o art. 1364º - exigência de grande explica-se em ordem a evitar a devassa
do prédio vizinho, mediante a abertura da janela.
38
Contra Henrique Mesquita que afirma que a constituição da servidão apenas permite ao proprietário
manter essas frestas.
39
Contra PL / AV.
➢ ML concorda com TRP 8/7/08 em que não pode ser argumento para ilidir a indemnização o facto
do lesado não ter exercido o seu direito de arranque e corte, pois isso significaria que ele sofreria
50
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Se causar danos ao prédio vizinho, quem exerce esta faculdade fica constituído em
responsabilidade objetiva.
Obrigação de permitir a passagem não corresponde a uma servidão, mas a uma restrição ao
direito de propriedade, ainda que possa ser equiparada a uma servidão momentânea, regular
ou irregular, desencadeada pela necessidade de passagem.
➢ No entanto, em certos casos, a lei prevê efetivas servidões legais para regular a situação
da passagem – art. 1550º a 1556º
duas agressões: via o seu direito de propriedade objeto de interferência e teria de suportar
custos para evitar que essa circunstância causasse danos efetivos ao prédio.
51
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Art. 1347º
Critério é a suscetibilidade de ter efeitos nocivos e de esses efeitos não serem permitidos por lei.
➢ Há casos em que a lei admite o exercício do direito, independentemente dos efeitos
nocivos – art. 1356º
Art. 1347º/3 – responsabilidade objetiva, pelo risco; mesmo que haja cumprimento do dever de
prevenção do perigo, se se verificarem danos há responsabilidade do titular do prédio.
Art. 1348º/2 – reforça a imputação delitual com uma previsão de responsabilidade objetiva, em
caso de ocorrência de danos.
O responsável é sempre o autor das escavações, não tendo essa responsabilidade o cariz de
obrigação propter rem, pelo que não se transfere para o adquirente do imóvel.
52
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
de incumprimento, tolerar que essas obras sejam feitas pelos donos dos prédios
que padeçam danos ou estejam sujeitos a danos eminentes.
3) Proprietário teria um direito, e não um dever, de fazer as obras, e só não querendo usar
desse direito é que poderiam intervir terceiros – PL / AV
40
Contra PL / AV que dizem que a questão terá de ser resolvida de acordo com as regras gerais do ónus
da prova.
53
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Art. 1403º/1: situação de compropriedade sempre que a propriedade seja atribuída a mais do
que um titular
Art. 1403º/2: presume-se que os titulares do direito têm direitos quantitativamente (quotas)
iguais;
➢ Isso implica que os termos do direito são iguais para os comproprietários – cada
proprietário não tem sobre a coisa faculdades superiores ou inferiores aos outros.
o Pode haver é uma diferente repartição do exercício dessas faculdade, caso o
montante das quotas de cada comproprietário seja distinto.
Constituição da Compropriedade
Pode ser constituída por:
• Negócio Jurídico – sempre que o direito de propriedade sobre uma coisa é atribuído
simultaneamente a vários titulares, por contrato ou testamento.
• Facto jurídico não negocial – usucapião (invocada após situação de composse em
relação à coisa), ocupação (várias pessoas ocupam uma coisa), achamento (sendo
expressamente imposta no caso de tesouros – art. 1324º) e acessão (casos dos art.
1333º/2, 1335º/3, 1340º/2).
• Sentença Judicial – quando é solicitada em tribunal quando às paredes e muros de
meação (art. 1370º)
• Disposição da lei – quando a lei estabelece presunções de comunhão (art. 1358º/1,
1359º/2, 1368º, 1371º)
54
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
• Restrição Quantitativa – não poder privar os outros consortes do uso a que igualmente
têm direito – corresponde à dimensão quantitativa da quota de cada um.
o Cada comproprietário terá de limitar o uso da coisa, através do Uso Simultâneo
da Coisa (ex: utilizam todos o barco comum) ou Repartindo o Uso com Critério
Temporal (ex: casa de férias habitada em diferentes períodos) ou
Espacial/Geográfico (ex: cultivo de áreas diversas do terreno comum).
4. Direito de Preferência (art. 1409º e ss.) – lei atribui a cada um dos comproprietários o direito
de preferência na venda ou dação em cumprimento da quota do seu consorte, em ordem a
evitar que terceiros estranhos se imiscuam na titularidade do direito sobre a coisa.
• Direito de preferência legal com eficácia real, a que a lei atribui mesmo o primeiro lugar
entre os preferentes legais.
• Art. 1410º: ação de preferência
5. Direito de exigir a Divisão da coisa comum (art. 1412º e ss.) – divisão da coia depende de a
mesma poder ser fracionada sem alteração da sua substância, diminuição de valor ou prejuízo
para o uso a que se destina (art. 209º).
• Têm que ser cumpridos os requisitos administrativos para a divisão dos prédios
Renúncia Liberatória – comproprietário pode extinguir o direito que tem sobre a coisa (a sua
quota) de maneira a que não tenha encargos nem obrigações.
• A renúncia não é válida sem o consentimento dos restantes consortes quando a despesa
tenha sido previamente aprovada pelo interessado.
• Art. 1411º/2
• Art. 1411º/3
55
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Art. 1407º/2 – recorrer ao tribunal quando não é possível estabelecer a maioria legal
Art. 1407º/3 – se mesmo sem a maioria se realizar o ato, ele é anulável
Extinção da Compropriedade
Sempre que cessar a situação de contitularidade do direito em relação à coisa.
Cessação pode resultar:
• da aquisição derivada ou originária, por parte de um dos consortes ou terceiro, da
propriedade sobre toda a coisa – pode resultar de negócio jurídico ou de usucapião42 da
propriedade exclusiva (por um dos consortes ou por um terceiro)
• da divisão da coisa em frações, com atribuição da propriedade (horizontal) exclusiva
sobre essas frações a cada um dos consortes – cuja forma está sujeita à forma exigida
para a alienação onerosa da coisa (art. 1413º/2).43
41
Contra Vaz Serra e Carvalho Fernandes que defendem, para estes casos, uma conversão e redução
simultânea do negócio.
42
Art. 1406º/2 exige inversão do título da posse para o prazo começar a decorrer.
43
Por ação judicial a divisão e realizada através do processo especial de divisão da coisa comum: art. 925º
e ss. CPC
56
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
B. Teoria da Pluralidade de Direitos sobre a Mesma Coisa – Pinto Coelho, OA, MC,
Carvalho Fernandes, JAV – pluralidade de direitos da mesma espécie, que recaem sobre
a mesma coisa, o que determina a limitação mútua ao respetivo exercício.
➢ Confunde as situações de contitularidade de direitos com as do concurso de
direitos. Não faz sentido considerar que o direito de propriedade, enquanto
pleno e exclusivo, possa concorrer com direitos idênticos de outros titulares.
➢ Não explica a maior parte dos poderes dever ser exercida conjuntamente.
C. Teoria do Direito Único com Pluralidade de Titulares – PL / AV, Henrique Mesquita –
referência legal a quotas refere-se a partes do direito e não a partes ideias da coisa;
todos os consortes são cotitulares do mesmo direito, no qual possuem uma quota.
Explica o regime da compropriedade.
➢ ML: na compropriedade, o direito de propriedade mantém-se com todas as suas
características, sendo apenas atribuído conjuntamente a mais do que uma
pessoa.
➢ Explica o facto de, em conjunto, os comproprietários poderem sempre exercer
todos os poderes relativos à coisa, bem como a circunstância de a posição de
cada comproprietário poder ser alienada ou onerada.
➢ Explica o facto de o uso da coisa comum pelo comproprietário não lhe atribuir
posse exclusiva, nem superior à sua quota, uma vez que ele se limita a exercer
o direito comum.
D. Teoria da Compropriedade como Pessoa Coletiva – doutrina italiana – a pessoa
coletiva, formada pelos comproprietários é que era a proprietária da coisa. Direito real
seria pertença da coletividade dos consortes, considerada como ente distinto dos
sujeitos que a compõe.
➢ Lei não personifica a compropriedade e não há autonomia patrimonial, o que
constitui o substrato indispensável a qualquer personificação.
Obrigação propter rem – recai sobre os comproprietários da água, antes da divisão desta, mas
também sobre os co-utentes que dela se aproveitam, em virtude de um ato de mera tolerância
do proprietário do prédio superior.
57
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Em virtude da tipicidade dos Direitos Reais o negócio jurídico não pode criar novos direitos reais
(art. 1316º), ficando-se por aquele que já estejam legalmente previstos.
Em certos casos a lei reconhece alguma maleabilidade ao negócio jurídico para conformação do
conteúdo dos direitos reais – art. 1418º e 1445º
Por Lei
A própria lei estabelece o direito – art. 733º e ss. (privilégios creditórios) e art. 704º e ss.
(hipoteca legal).
Em relação aos bens do domínio privado do Estado ou de outras pessoas coletivas públicas, os
mesmos podem ser objeto de usucapião, mas nos termos da Lei 54, de 16/7/1913, mantida em
vigor pelo art. 1304º CC.
Art. 1287º restringe a usucapião aos direitos reais de gozo, excluindo as servidões prediais não
aparentes e os direitos de uso e habitação (art. 1293º).
• Quanto à aquisição por usucapião das servidões prediais não aparentes dispõe o art.
1548º/1. Ex: servidão de passagem só poderá ser adquirida por usucapião se houver
sinais visíveis permanentes do seu exercício, como a existência de uma porta ou
caminho entre dois prédios.
o Não aquisição por usucapião das servidões aparentes resulta do facto de não
ser fácil determinar a existência de uma posse pública, por elas serem
facilmente confundíveis com atos de tolerância do proprietário serviente.
58
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
• Quanto aos direitos de uso e habitação, não podem ser adquiridos por usucapião porque
se tem de restringir a sua constituição, em virtude da limitação dos seus conteúdos e do
facto de em termos práticos ser difícil a sua distinção do usufruto.
Art. 1290º - exige para a usucapião a inversão do título da posse, só se iniciando o respetivo
prazo a partir da inversão do título.
➢ Art. 1252º/2 – presunção de que a posse é de quem exerce poder de facto
➢ A situação de posse em nome alheio tem de ser demonstrada por quem se opõe à
usucapião
Art. 1297º e 1300º/1 – exige-se posse pública e pacífica; a posse oculta ou violenta não é idónea
para a usucapião
PRAZOS
Variam consoante se trate de coisas móveis ou imóveis – regra é sempre a natureza dos bens e
não o valor.
IMÓVEIS
5 anos
• Art. 1295º/1/a – registo de mera posse e boa fé
o Só pode ocorrer mediante sentença transitada em julgado que o possuidor
possuía a coisa pública e pacificamente há mais de 5 anos (art. 1295º/2) – pelo
que é um prazo aparente uma vez que só se pode registar a posse após 5 anos
(totalizando 10)
10 anos
• Art. 1295º/1/b – registo de mera posse e má fé
• Art. 1294º/b – existir título de aquisição e registo deste e boa fé
15 anos
• Art. 1294º/b – existir título de aquisição e registo deste e má fé44
• Art. 1296º - não existindo título de aquisição nem registo deste, mas a posse ser de boa
fé
20 anos
• Art. 1296º - não existindo título de aquisição nem registo deste e a posse ser de má fé
MÓVEIS
Sujeitos a Registo – automóveis, navios e aeronaves
• Art. 1298º/a – 2 anos quando há título de aquisição e registo deste, havendo boa fé
• Art. 1298º/a – 4 anos quando há título de aquisição e registo deste, havendo má fé
• Art. 1298º/b – 10 anos, não havendo registo, independentemente do título ou da boa
fé
44
Ter título faz presumir boa fé, mas pode ser ilidida
59
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Art. 1292º - determina a aplicação à usucapião das regras relativas à suspensão e interrupção
da prescrição.
• Usucapião é moldada segunda as regras: dos art. 318º e ss. (suspensão do prazo da
usucapião – quando a sua contagem é paralisada durante a verificação de certos factos
ou situações a que lei atribui esse efeito) e art. 323º e ss. (interrupção do prazo de
usucapião – quando não apenas a sua contagem é paralisada em virtude de certos factos
ou situações que a lei atribui esse efeito, mas também se inutiliza o prazo anteriormente
decorrido).
Prazos para a usucapião não são prejudicados pela existência, em algum momento, e turbação
ou esbulho da posse – se vier a ser julgada procedente a ação de manutenção ou restituição –
art. 1283º.
Também não é prejudicado por sucessão na posse, continuando a correr na esfera dos
sucessores desde o momento da morte, independentemente da apreensão material da coisa –
art. 1255º.
No caso de acessão na posse, é facultativa a junção do prazo da posse do antecessor (art.
1256º/1), sendo que, se as posses forem de natureza diferentes, a junção só pode ocorrer nos
limites da posse que tiver menor âmbito (art. 1256º/2).
Invocação da Usucapião
Usucapião só é eficaz se for invocada, sendo por isso voluntária – art. 303º ex vi art. 1292º
• Tribunal não pode suprir oficiosamente a usucapião.
• Uma vez invocada, os efeitos da usucapião retroagem ao início da posse – art. 1288º
• Como aquisição originária do direito, a usucapião suplanta todos os registos existentes
sobre o bem (usucapio contra tabulas) – registo da usucapião é meramente enunciativo
(art. 5º/2/a Cód RP)
60
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Tem de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita – art. 303º ex
vi art. 1292º
• Pode ser invocada também pelos credores e por terceiros com legítimo interesse da sua
declaração, ainda que o possuidor a ela tenha renunciado – art. 305º/1 ex vi art. 1292º
o Tem que se ter em conta o art. 305º/2 e 3
AUJ 1/2008, STJ (Azevedo Ramos): Na ação de impugnação de escritura de justificação notarial
prevista nos art. 116º/1 e ss. Cód RP e art. 89º e 101º do Código do Notariado, tendo sido os
réus que nela afirmaram a aquisição, por usucapião, do direito de propriedade sobre um imóvel,
inscrito definitivamente no registo, a seu favor, com base nessa escritura, incumbe-lhes a prova
dos factos constitutivos do seu direito, sem poderem beneficiar da presunção do registo
decorrente do art. 7º Cód RP.
ACESSÃO
Art. 1325º - situação que ocorre quando a coisa que é propriedade de alguém se une e incorpora
com uma coisa que não lhe pertencia.
➢ Perante a junção de duas coisas, a lei determina a aquisição da propriedade sob a coisa
que resultou dessa junção apenas por um dos proprietários, com a consequente perda
da propriedade pelo outro.
Não se restringe à propriedade e por esta via podem ser adquiridos outros direitos reais –
usufruto (art. 1471º/2) e hipoteca (art. 691º/1/b)
45
ML: não é negócio jurídico e sim um quase-negócio jurídico, uma vez que não cria o direito nela
declarado, traduzindo-se antes numa declaração unilateral do justificante, que o mesmo terá de
comprovar se for impugnada.
61
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
62
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Acessão Industrial
Resulta de ação humana
Pressuposto comum: não ser possível fazer reverter as coisas ao estado de separação ou à sua
primitiva forma, ou, sendo-o, tal implique a produção de prejuízo para uma das partes.
➢ Se for possível realizar sem prejuízo o regresso das coisas à situação anterior, deixa de
se verificar acessão industrial mobiliária.
46
ML: boa fé na autorização teria de ser uma autorização pura e simples – no caso em que a autorização
é para algo específico pode ser discutível se havia efetivamente boa fé
63
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
• PL / AV – automático – sentido literal dos art. 1339º e 1340º, com o facto de estes não
terem regulado as consequências de o proprietário não querer adquirir a propriedade
do implante e ainda a circunstância de a sua renúncia levar à constituição de um direito
de superfície, que teria de observar a forma legal desse ato.
• OA – potestativa – “adquire pagando” dos art. 1339º e 1340º demonstram esse caráter
potestativo, favorecido pelo art. 1333º/1 e 1343º mais as disposições que subordinam
a aquisição à licitação, ou que preveem que o beneficiário não queria adquirir.
o Não faz sentido impor ao beneficiário o pagamento de uma indemnização em
contrapartida de uma aquisição que ele pode não pretender.
o Só ocorre perda da propriedade com pagamento da indemnização.
o Aquisição automática impediria partes de estipularem solução diferente para o
conflito e atribuiria o risco ao beneficiário da acessão.
o MC, Carvalho Fernandes, JAV
• ML: aquisição deve considera-se, tal como a usucapião, uma forma de aquisição
originária dos direitos reais, adquirindo assim o titular um direito novo, que não está
dependente das vicissitudes do direito anterior.
o No entanto, ao contrário do que sucede na usucapião (art. 5º/2/a Cód RP), o
registo da acessão não é meramente enunciativo, pelo que, no caso de estar
sujeita a registo, serão tutelados os direitos adquiridos por terceiro e registados
antes da acessão.
64
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Exceções:
• Art. 1488º - usuário e morador usuário não podem alienar o seu direito nem onerá-lo.
• Art. 1545º - servidões prediais não podem ser separadas dos prédios a que pertencem,
portanto não podem ser alienadas autonomamente do prédio dominante.
• Art. 1409º e 1535º - Direitos de preferência não podem ser transmitidos isoladamente
do respetivo direito
• Art. 760º - direito de retenção tem proibição parcial pois não pode ser transmitido sem
o crédito48
De acordo com o princípio da tipicidade, as partes só podem introduzir cláusulas com eficácia
real no caso de essa possibilidade estar incluída no próprio tipo legal do direito em causa –
caso do usufruto (art. 1444º/1 in fine); substituições fideicomissárias (art. 962º e 2286º); doação
com reserva do direito de dispor (art. 959º).
➢ Caso não estejam previstas, pelo princípio do art. 1306º, só poderão ter eficácia
obrigacional – violando as cláusulas há apenas responsabilidade obrigacional (art.
798º).
➢ Na hipoteca é nula – art. 695º
Contratos Reais
Devido à alienabilidade dos direitos reais, inclui-se no âmbito da autonomia privada a
possibilidade de celebração de contratos com efeitos reais – negócios de disposição de
direitos, pressupondo por isso a titularidade do direito que é seu objeto.
Contratos reais quod effectum – transmissão dos direitos reais produz-se por mero efeito do
contrato; art. 408º
➢ Exceções no art. 408º/2
➢ A partir do momento da celebração do contrato o adquirente suporta o risco relativo à
perda ou deterioração da coisa (art. 796º)
➢ Pode convencionar-se que a transmissão da propriedade só ocorra com o pagamento do
preço (art. 409º/1) – cláusula de reserva de propriedade49
47
Se o negócio for inválido não chega a haver transmissão do Direito.
48
Art. 727º - em relação à hipoteca pode haver possibilidade de cessão sem o crédito assegurado.
49
Sujeita a registo nos termos do art. 409º/2
• Desvio ao sistema de título para não passar logo para a esfera do devedor.
o 1ª proteção: não conta logo como património do devedor para pagar a outros credores
e aquele que reservou a propriedade (caso não pague).
65
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Contratos reais quod constitutionem – necessitam da tradição da coisa de que são objeto para
se constituírem; penhor (art. 669º/1), doação verbal (art. 947º/2), mútuo (art. 1142º).
66
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Paradigmaticamente os Direitos Reais podem ser defendidos através das AÇÕES REAIS:
1. Ação de Reivindicação – ação declarativa de condenação pelo art. 1311º e ss.
• Art. 1315º permite estender este regime à defesa de qualquer titular de direitos
reais que atribuam a posse da coisa.
o Só tem legitimidade ativa para recorrer à ação de reivindicação quem seja
titular de um direito real que atribua a posse da coisa, mas não tenha essa
posse.
o Tem legitimidade passiva para a ação de reivindicação quem seja possuidor
ou detentor da coisa, mas não seja titular do correspondente direito real.
• Baseia-se em dois pedidos:
o Reconhecimento do Direito Real que assiste ao autor;
o Restituição da coisa, como consequência do reconhecimento.
o Segue os termos do processo comum e pode acumular-se com outros
pedidos, como a indemnização.
• É necessário fazer prova da titularidade do Direito Real – não bastando a
demonstração da aquisição derivada do direito, pois nada garante que o autor
adquiriu a coisa ao seu legítimo proprietário;
o Tem de se demonstrar que adquiriu originariamente o direito52 - prova é
dispensada quando existem presunções de propriedade, como a derivada
da posse (art. 1268º/1) ou do registo (art. 7º Cód RP).
• Se o possuidor ou detentor for titular de algum direito que legitime essa posse ou
detenção, o Tribunal limita-se a condenar o réu a reconhecer o direito do autor,
embora não ordenando a restituição da coisa.
• Art. 1313º - é imprescritível; sendo improcedente quando ocorre a aquisição por
usucapião a favor de outrem.
• Está sujeita a registo (art. 3º/1/a)
2. Ação Confessória – não envolve pedido de entrega da coisa e é uma simples ação de
apreciação positiva (art. 10º/3/a CPC).
• No Direito Romano era tradicionalmente reservada à defesa de direitos reais
menores como a servidão e usufruto – autor solicitava que o proprietário fosse
condenado ao reconhecimento do seu direito real menor sobre a coisa de forma a
não levantar oposição ao exercício desse direito.
52
Prova que pode ser extremamente difícil em concreto (probatio diabolica)
67
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
• Perdeu utilidade pois a reivindicação pode ser utilizada para tutelar qualquer direito
real (art. 1315º).
3. Ação Negatória – é uma simples ação de apreciação negativa (art. 10º/3/a CPC).
• Proprietário instaura a ação conta quem invoca ter um direito real incidente sobre
um bem seu, de forma a obter a declaração de inexistência desse direito.
4. Ação de Demarcação – ação usada para estabelecer os limites entre os prédios no âmbito
das relações de vizinhança pelos art. 1353º e ss.
• Segue a forma de processo comum e o Tribunal respeita o art. 1354º.
• Ação imprescritível, sem prejuízo dos direitos adquiridos por usucapião (art. 1355º)
68
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
1. Expropriação
2. Perda da Coisa
Por força da inerência do direito real à coisa que é seu objeto, a perda da coisa extingue o
direito sobre a mesma.
• Tem de ser uma perda total, pois se for parcial apenas há modificação do objeto do
Direito Real (art. 1478º/1).
• Perda pode ser por desaparecimento ou destruição – se for deterioração o direito
mantém-se, ainda que a coisa diminua de valor ou perca aptidão para o fim a que se
destina
Consagra quanto à superfície (art. 1536º/1/e, in fine) mas deve considerar-se de aplicação
generalizada a todos os direitos reais – embora quanto às servidões temos o art. 1571º e
1569º/1/b).
4. Abandono
Pressupõe a cessação da relação material com a coisa (corpus) em virtude de um ato
intencional do seu titular dirigido à extinção da sua propriedade (animus derelinquendi).
• É voluntário e não constitui negócio jurídico e sim um comportamento material a que se
atribui a natureza de ato jurídico simples (art. 295º).
• Não se encontra previsto como causa de extinção dos direitos reais – só da posse (art.
1267º/1/a) – há referência no art. 1318º e o 1397º.
o Só pode haver abandono para esse tipo de coisas, vigorando para os outros
casos o instituto da renúncia.
5. Renúncia
Renúncia Abdicativa – extinção do direito realiza-se sem qualquer contrapartida para o titular.
• Usufruto (art. 1476º/1/e); Uso e habitação (art. 1485º); Servidões prediais (art.
1569º/1/d); Hipoteca (art. 730º/d); Consignação de rendimentos (art. 664º); Penhor
(art. 677º); Privilégio (art. 752º); Direito retenção (art. 761º); Todo os direitos reais de
garantia
69
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
6. Prescrição
Não se aplica face aos direitos reais de gozo – art. 298º/3 sujeita-os a causa de extinção própria
(o não uso, que se rege pelo regime da Caducidade).
• Exceção da superfície (art. 1536º/1/a, b -> art. 1536º/3)
Extingue alguns direitos reais de garantia – hipoteca (art. 730º/b), privilégios creditórios (art.
752º), direito de retenção (art. 761º). Há uns excluídos (art. 664º e 677º).
7. Caducidade
Extinção do direito em virtude da superveniência de um facto jurídico stricto sensu, como o
decurso do tempo ou a morte.
• Opera nos direitos reais temporários, ocorrendo a sua extinção em consequência desses
factos – Usufruto (art. 1476º/1/a); Uso e habitação (art. 1485º).
o Há outros direitos que tanto podem ser perpétuos como temporários pelo que
se aplica quando forem temporários – Superfície (art. 1536º/1/c); Servidões
prediais (art. 1569º/1/e)
o Propriedade é em princípio perpétua, pelo que não se aplica – só nos casos em
que a lei prevê que é temporária (art. 1307º/2).
8. Não Uso
Constitui causa de extinção de certos direitos reais baseada na inércia do titular do direito real
de gozo em relação ao exercício das faculdades integrantes desse direito.
• Distingue-se da prescrição dos créditos, pois a inércia do titular não consiste no não
exercício dos seus poderes em relação a terceiros.
o Por este motivo, o não uso também nada tem a ver com uma eventual
usucapião por terceiro, uma vez que esta pressupõe a violação do direito em
consequência do seu exercício por terceiro, enquanto que o não uso se basta
com a mera omissão das faculdades integrantes do direito.
70
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
O não uso não é causa de extinção da propriedade sobre outros bens, nem da propriedade
horizontal ou do direito de superfície.
9. Confusão
Equivalente a Direito das Obrigações – art. 868º
Quando na mesma pessoa se reúnem as qualidades de titular de um direito real maior e de
um direito real menor, o que determina a extinção do direito real menor por já não se justificar
a compressão do direito real maior nessa situação.
É causa de extinção do Usufruto (art. 1476º/1/b), Uso e habitação (art. 1485º), Superfície (art.
1526º/1/d), Servidões Prediais (art. 1569º/1/a).
Quando a posse desempenha uma função de publicidade de certos direitos reais de garantia, a
restituição da coisa implica igualmente a perda do direito (art. 677º e 761º).
71
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
13. Extinção do direito real maior com base no qual o direito se constituiu
Extinção de um direito real maior com base no qual aquele direito se constituiu.
• Decorre da regra de que ninguém pode atribuir a outrem mais direitos do que aqueles
que tem – o titular de um direito não pode onerar o seu direito com encargos que
extravasem da sua duração e se o fizer, esses direitos extinguem-se com a extinção do
direito sobre o qual se constituíram.
• Hipoteca e usufruto (art. 699º/2); Superfície (art. 1539º/1)
72
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
A Posse é forma de publicidade do controlo material das coisas, que é exercido em termos de
um direito real.
Registo Predial
A cargo das Conservatórias do Registo Predial, que são serviços do Instituo dos Registos e
Notariado, IP.
➢ Atos do registo predial podem ser requeridos em qualquer conservatória do território
nacional, independentemente do lugar da situação dos prédios.
Função no art. 1º - através do registo é possível saber qual a situação jurídica do prédio (e
também da relação que se estabelece entre o prédio e certas pessoas).
• Registo Predial54 organiza-se com base num sistema real (descrições relativas às
situações dos prédios) embora se tenha igualmente um ficheiro relativo às pessoas que
são titulares deste (art. 24º Cód RP).
Princípio da Obrigatoriedade
Apesar do registo continuar a ser voluntário e depender do pedido dos interessados, esse
pedido passou a ser obrigatório – art. 8º-A a 8º-D Cód RP
• Art. 8º-A: obrigatoriedade do registo de certos factos e exceções
• Art. 8º-B: obrigação de registar incide sobre as entidade que celebrem a escritura
pública, autentiquem os documentos particulares ou reconheçam as assinaturas
• Art. 8º-C: prazo de dois meses a contar da data em que os factos tenham sido titulados
• Art. 8º-D: se o registo não for cumprido no prazo, o Negócio Jurídico não é inválido e a
consequência é um acréscimo nos emolumentos.
53
Não só em relação a prédios mas também a móveis sujeitos a registo (há registo automóvel que em
certas disposições remete para o Cód RP)
54
Com o DL 224/2007 instituiu-se o Sistema Nacional de Exploração e Gestão da Informação Cadastral
(SINERGIC) que veio complementar o Registo Predial e procura assegurar uma identificação única dos
prédios, que permita unificar os conteúdos cadastrais e submete-los a gestão uniforme e informática.
73
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Princípio da Legalidade
O registo é objeto de controlo pelo conservador – art. 68º
• Controlo da legalidade não é meramente formal e tem de fazer uma fiscalização da
validade substancial do ato contido no título – limita-se à averiguação dos casos de
nulidade dos atos (art. 69º/1/d), já que não tem legitimidade para suscitar a questão da
anulabilidade55
• Pode recusá-lo ou realizá-lo provisoriamente e com dúvidas – art. 69º a 71º
• Decisão poe ser impugnada mediante interposição de recurso hierárquico ou mediante
impugnação judicial – art. 140º, 141º, 145º
• Se registar ato falso ou juridicamente inexistente incorre em responsabilidade – art.
153º
Princípio da Legitimação
Quando resultar a transmissão de direitos ou constituição de encargos sobre imóveis, não
podem ser titulados se não houver registo a favor da pessoa de quem se adquire o direito ou
contra qual se constitui o encargo – art. 9º
➢ Aquele que não registou não vai conseguir transmitir o direito que substantivamente é
titular (art. 9º) – continua a ser proprietário mas não pode vender, uma vez que não
consta no registo como proprietário (isto devido ao princípio da legitimação).
Legitimação reforça proteção conferida pelo trato sucessivo, na medida em que veda que o
próprio negócio seja titulado, sem que se encontre comprovado o registo prévio a favor do
transmitente.
• MC: desrespeito por este princípio leva a nulidade
• ML: não há problema de legitimação substantiva e sim de legitimação formal – há
apenas sanções para o agente que não registar
55
Esse valor negativo não é de conhecimento oficioso e depende de arguição por parte dos interessados
– art. 287º CC
56
É o título que justifica a usucapião
74
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Princípio da Prioridade
O direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que lhe seguirem relativamente aos
mesmos bens, por ordem da data dos registos e, dentro da mesma data, pela ordem temporal
das apresentações correspondentes – art. 6º
75
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Processo do Registo
Legitimidade e representação no pedido do registo
O registo só pode ser solicitado por quem tenha legitimidade registal – art. 36º Cód RP
• Contitularidade – art. 37º
• Averbamentos às descrições – art. 38º
• Registo pode ainda ser pedido em representação do interessado por mandatário – art.
39º
Pedido de Registo
Art. 41º e ss. Cód RP
Efeitos do Registo
Fé Pública
Devido à segurança do comércio jurídico imobiliário (art. 1º), o registo deve estar em
conformidade com a situação jurídica substantiva do imóvel, permitindo o registo dar a
conhecer essa situação jurídica.
➢ Há casos de desconformidade entre a situação substantiva e a situação registal, que
afetam a fé pública do registo: não realização; inexistência; invalidade; inexatidão;
invalidade do registo.
Resulta que o registo é normalmente meramente enunciativo (não dá nem tira direitos) e
estabelece apenas uma presunção de titularidade – que pode entrar em conflito com a
presunção resultante da posse.
➢ Art. 1268º/1 CC – a presunção resultante do registo só prevalece se for anterior ao início
da posse, já que, no caso contrário, será a presunção a favor do possuidor que terá
prevalência.
Registo Consolidativo
Registo consolida a posição do adquirente do imóvel, pois a lei determina que os factos
sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respetivo registo –
art. 5º/1 Cód RP.
• Com o registo, o adquirente vê plenamente consolidada a sua posição, uma vez que
passa a poder opor eficazmente o seu direito perante terceiros, o que antes lhe estava
de alguma forma vedado.
76
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Art. 5º/1 – resulta de que os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros
depois da data dos respetivos registos.
57
Após vários Acórdãos de Unificação de Jurisprudência com soluções diversas entre si o legislador
decidiu definir o conceito – sendo criticado por MC e Carvalho Fernandes
58
AV dispensava o requisito da gratuitidade e da boa fé por considerar que não se deve impor ao
terceiro maior diligência do que a consulta do registo, onde o direito aparece inscrito em nome do
alienante.
59
Esta situação é uma exceção. Princípio da consensualidade continua a ser a regra no nosso sistema,
em que a realidade substantiva prevalece, sendo a Fé Pública uma exceção.
77
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
• Devido ao art. 5º/4, aplica-se à dupla alienação ou oneração de um bem, levando a que
a disposição posterior que tenha sido previamente registada prevaleça sobre a anterior,
que não foi registada.
• A segunda disposição é nula e não poderia permitir a aquisição da propriedade –
portanto, é o registo que permite que a propriedade seja adquirida pelo adquirente
na segunda disposição, através da aquisição tabular.
•não
B regista
A
•regista
C •adquire
Doutrina maioritária exige, para a aquisição tabular, que a segunda disposição seja realizada a
título oneroso e de boa fé – sem isto, o direito do primeiro adquirente não pode ser posto em
causa
Requisitos JAV:
1º. Registo desconforme à realidade substantiva
2º. Ato de disposição praticado com base na situação desconforme
3º. Boa fé de terceiro
4º. Caráter oneroso do negócio jurídico
5º. Terceiro regista a sua aquisição antes do registo do facto aquisitivo do titular do Direito
Real
Art. 17º/2 – no caso de existir boa fé do terceiro e a sua aquisição tiver ocorrido a título
oneroso, o seu direito como sub-adquirente não é posto em causa pela declaração de nulidade
da prévia inscrição, em virtude da necessidade de proteger aqueles que confiaram na validade
do registo.
A B C
•regista •registo inválido •registo
aparentemente
inválido- válido
Doutrina entende que quando se pede a nulidade do registo, mesmo estando num caso do art.
291º CC, utiliza-se o art. 17º/2 devido a esse pedido de invalidar o registo.
Art. 122º - devido à necessidade de proteção daquele que confiou na exatidão de um registo,
tendo efetuado com base no mesmo uma aquisição de boa fé e a título oneroso.
• Portanto, aquele que registou a sua aquisição antes da retificação ou da pendência do
processo, não vê o seu direito afetado pela posterior retificação da prévia inscrição.
78
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Art. 291º CC – já não se refere à invalidade registal, mas antes à invalidade substantiva,
havendo um conflito entre o transmitente no primeiro negócio inválido e um sub-adquirente
num segundo contrato, que vem a ser afetado em consequência da invalidade do primeiro
contrato.
Contrato inválido substantivamente
A B C D
• regista • regista • não regista • regista
• adquire
mesmo com a
invalidade de A
eB
Se não se exigisse o registo antes da ação de nulidade, o terceiro não podia ser tutelado
porque poderia saber que o direito de quem lhe está a vender esta a ser posto em causa.
79
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Registo Enunciativo
Registo não atribui eficácia consolidativa ao direito, podendo ser oposto a terceiros
independentemente do registo.
➢ Função do registo é de apenas dar publicidade à situação.
Registo Constitutivo
Regra do sistema é a de que o registo não tem eficácia constitutiva ou extintiva de direitos,
não podendo pois atribuí-los nem retirá-los.
➢ Único caso de registo constitutivo: Hipoteca – art. 4º/2 (na sequência do art. 687º CC)
o ML: constituição da hipoteca é facto complexo, sendo que o registo funciona
como um dos elementos necessários para que essa constituição ocorra.
80
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
PROPRIEDADE
Direito real máximo – direito real com o maior conteúdo possível e mais importante dos
direitos reais.
➢ É o paradigma, não apenas dos direitos reais como dos direitos subjetivos em geral.
Este conteúdo não é ilimitado e está sujeito aos limites e restrições da lei, que são genéricos
para os Direitos Reais.
60
OA discorda
81
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Ocupação de animais
• Art. 1319º
• Art. 1320º
• Art. 1322º
82
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Os donos dos prédios para onde derivam as águas vertentes de qualquer fonte ou nascente
podem aproveitá-las (art. 1391º).
83
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
PROPRIEDADE HORIZONTAL
Novo Direito real que faz coexistir sobre o mesmo edifício dois tipos de faculdades distintas dos
condóminos.
• Faculdades correspondentes à propriedade exclusiva sobre uma fração autónoma do
prédio;
• Faculdades correspondentes à compropriedade sobre as partes comuns do edifício.
Surge com a construção em altura, que gerou a necessidade de atribuir a propriedade separada
do seu andar (apartamento) a cada proprietário, que é o que está na base do surgimento do
instituto da propriedade horizontal.
Art. 1415º: exige que as frações autónomas sejam idóneas a constituir objeto do gozo exclusivo
por parte dos condóminos
• Art. 1421º/2 – presunção que pode ser ilidida se o título constitutivo dispor
diferentemente, ou atendendo-se às características específicas do imóvel.
• Art. 1221º/3 – parte mantém-se comum mas exclusivamente afeta à utilização por um
condómino.
61
ML: Subsolo é comum pelo que impede os proprietários dos pisos térreos de os escavar profundamente.
62
Doutrina e jurisprudência têm entendido que as paredes exteriores ao prédio (paredes perimetrais)
são obrigatoriamente partes comuns mesmo que não desempenhem a função de paredes mestras.
84
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Título Constitutivo
Ato modelador do estatuto da propriedade horizontal e as suas determinações têm natureza real
– art. 1418º
Art. 59º Cód Notariado – só se pode constituir propriedade horizontal por documento passado
pela câmara municipal comprovando que as frações autónomas satisfazem os requisitos legais.
Art. 62º Cód Notariado – tem de se exibir documento comprovativo da inscrição no Cód RP64
63
Até lá o dono do prédio fica como proprietário pleno pois não faz sentido aplicar as restrições da
propriedade horizontal enquanto não existirem outros condóminos.
64
Art. 82º/2 e ss.
85
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Condomínio
Além do título constitutivo, a propriedade horizontal é regulada pelo Regulamento do
Condomínio – disciplina o uso, a fruição e a conservação das partes comuns e das frações
autónomas.
➢ Havendo mais de 4 condóminos, é obrigatório esse regulamento, competindo à
Assembleia de condomínio ou Administrador (art. 1229º-A)
Poderes
Art. 1420º - cada condómino tem um direito incindível sobre dois direitos (proprietário
exclusivo da sua fração + comproprietário das partes comuns do prédio), não podendo ocorrer
a sua alienação separada ou renúncia às partes comuns.
➢ Propriedade horizontal não é mero somatório destes dois direitos, mas sim uma figura
autónoma que, em certos aspetos, até se afasta muito dos direitos com base no qual se
molda.
65
Ex: uso continuado de lugares de estacionamento por um dos condóminos não constitui posse exclusiva
dos mesmos.
86
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Obrigações
ENCARGOS DE CONSERVAÇÃO, USO E FRUIÇÃO DAS PARTES COMUNS – art. 1424º
Estas despesas e a respetiva cobrança de receitas cabe ao administrador (art. 1436º/1/d), mas,
quando se tratar de reparações indispensáveis e urgentes nas partes comuns, na falta de
iniciativa do administrador, pode ser feito por qualquer condómino (art. 1427º).
Provisão para pagamento das despesas do condomínio – prática social levou a instituir-se esta
regra de prestação mensal.
➢ Funciona como adiantamento e o administrador pode ainda reclamar o pagamento do
restante quando as prestações não cheguem para cobrir as despesas com reparações e
etc.
Fundo Comum – obrigatório pelo art. 4º/1 DL 268/94 como reserva para custear as despesas de
conservação.
➢ Assembleia de condóminos deve administrar este fundo comum de reserva, depositado
em instituição bancária.
87
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
➢ Quanto a cada fração autónoma, cabe a cada proprietário decidir como são
administradas – é ineficaz qualquer deliberação face às frações autónomas.
➢ Conjunto de condóminos é responsabilizado, com culpa presumida nos termos do art.
493º/1.
ADMINISTRADOR
Órgão executivo da administração das partes comuns do condomínio, cabendo-lhe
desempenhas as funções previstas no art. 1436º, as outras que a lei impende sobre ele e as
funções de que venha a ser encarregado pela assembleia.
➢ É remunerável (art. 1435º/4) quer desempenhado por condómino como por terceiro.
Funções
• Administração corrente das partes comuns do edifício – art. 1436º/c, f, g, m66
• Gestão financeira do condomínio – art. 1436º/b, d, e
• Funções de execução – art. 1436º/1, h
• Poderes de representação do conjunto dos condóminos – art. 1436º/i, 1437º
Não se pode substituir aos condóminos e exercer direitos que a estes competem, relativamente
às suas frações autónomas.
➢ Questões de relações de vizinhança entre frações autónomas não cabe ao
Administrador resolver.
Modificação e Extensão
Regime da propriedade horizontal pode ser modificado através de alterações ao seu título
constitutivo, ainda que, de acordo com o princípio da autonomia privada, se exija o acordo de
todos os condóminos.
➢ Art. 1419º + Art. 1422º-A
Extingue-se por:
• Acordo entre condóminos – aplica-se a todo o edifício a compropriedade;
66
Além de providenciar pela realização das obras necessárias à conservação das partes comuns (art. 89º
RJUE) pelo que o mesmo se constituirá em responsabilidade civil se em consequência do incumprimento
desse dever ocorrerem danos parar qualquer condómino ou terceiro.
88
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
89
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
USUFRUTO
Art. 1439º - Direito Real menor, que embora atribua a plenitude das faculdades de gozo
relativas à coisa, só o faz temporariamente, e não permite ao usufrutuário a alteração da sua
forma e substância.
Remonta ao antigo Direito Grego e evoluiu pelo Direito Romano, não tendo sofrido grandes alterações na
Idade Média sendo posteriormente codificado na época das codificações.
Características e Objeto
1. Direito que atribui gozo pleno da coisa – compreende qualquer utilidade que se retire
da coisa, seja usando-a ou apropriando-se dos seus frutos, seja permitindo a terceiro
esse gozo.
• Beneficia da generalidade dos poderes de gozo que a coisa seja suscetível de
proporcionar, não sendo o seu gozo circunscrito a determinadas faculdades.
2. Direito não exclusivo – incide sobre direito alheio, concorrendo com a propriedade,
sendo limitado por esse outro direito.
3. Direito temporário – tem limites máximos de duração
• Art. 1443º
• A morte do titular ou decurso do prazo extinguem o usufruto (art. 1576º/1/a)
i. Permite-se o usufruto simultâneo e sucessivo e o direito de acrescer
(art. 1441º e 1442º).
4. Limitado pela proibição de alteração da forma ou substância da coisa – articula-se com
o art. 1446º (respeito pelo destino económico da coisa).
• OA: exigência mais genérica é a do art. 1439º, que faz parte do próprio tipo do
usufruto, enquanto a do art. 1446º é disposição supletiva e pode ser afastada.
i. ML: é a proibição de alteração de forma e substância que faz parte do
tipo legal do usufruto, sendo o respeito pelo seu destino económico uma
disposição supletiva, cuja observância não se afigura essencial.
• MC: art. 1439º é definição legal e não tem natureza imperativa, pelo que o
usufruto não está vinculado a respeitar a forma e substância mas sim o destino
económico da coisa.
Os direitos do usufrutuário podem ficar limitados por um direito com base no qual se constitui
um usufruto a favor de terceiro.
➢ Assim, um usufruto constituído sobre um direito de superfície não atribui ao
usufrutuário qualquer direito sobre o solo, apenas lhe permite exercer
temporariamente sobre a coisa as faculdades que competiam ao superficiário.
➢ Pode ser constituído sobre uma quota em compropriedade – tem que haver
consentimento dos outros comproprietários (art. 1408º).
90
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Aquisição Originária
• Usucapião – nos termos gerais dos art. 1287º e ss., bastando para tal que a respetiva
posse não seja exercida nos termos da propriedade, mas apenas nos termos de
usufruto.
Faculdade de fruir a coisa: poder de perceber os frutos da coisa, nos termos amplos deste
conceito (art. 212º).
Usufrutuário adquire a propriedade dos frutos a partir do momento em que eles são separados
da coisa, podendo a partir desse momento exercer sobre os frutos todos os poderes que
competem ao proprietário.
• Fruição natural – enquanto permanecem ligados à coisa-mãe, os frutos naturais
pertencem ao proprietário, tendo o usufrutuário apenas o seu usufruto.
67
Se o usufrutuário infringir estes direitos é responsável perante o proprietário nos termos da
responsabilidade civil delitual (art. 483º).
91
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Obrigações do Usufrutuário
Obrigações de natureza propter rem
1. Obrigação de inventariar os bens objeto do usufruto – art. 1468º/a – enumerar e
descrever as coisas móveis e imóveis objeto do usufruto, sendo instrumental em relação
à definição do âmbito do seu direito de usufruto, bem como do objeto a restituir após a
sua extinção.
a. Deve ser assistido pelo proprietário de raiz ou com citação deste, para evitar
divergências entre os dois.
b. Consequências é a de que o usufrutuário não pode legalmente exercer as
faculdades correspondentes ao usufruto e se o fizer, responde perante o
proprietário de raiz.
92
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
8. Dever de restituir a coisa, findo o usufruto – art. 1483º - que pode ser suspenso, se
houver direito de retenção a favor do usufrutuário, designadamente em virtude de
benfeitorias realizadas na coisa.
68
Se adquirente do trespasse falecer antes do alienante:
• Carvalho Fernandes – extingue-se o usufruto. Atenta ao art. 1444º/2
• OA, ML – direito de usufruto transmite-se aos sucessores do adquirente até à morte do alienante
93
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
94
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
9. Usufruto de créditos – usufruto irregular (art. 1463º, 1464º, 1465º, 1466º) pois
nenhuma das modalidades previstas na lei representa qualquer direito real, mas apenas
uma forma de oneração do crédito, com a atribuição temporária de certas prestações
periódicas, ou da obrigação de pagamento dos juros ou outros ganhos produzidos pelo
crédito a outro credor.
Natureza
• Teoria do Desmembramento – PL / AV – fragmentação do direito de propriedade em
dois direitos distintos (usar e fruir – usufruto; dispor e transmitir – nua propriedade).
➢ ML: parte da conceção errada que os direitos reais menores são figuras
parcelares da propriedade – ela não é desmembrada, antes se comprime.
• Teoria da Propriedade Temporária – Allara – poderes do usufruto são idênticos aos da
propriedade, sendo apenas temporários e não tendencialmente perpétuos (como a
propriedade).
➢ ML: posição do usufrutuário é inferior à do proprietário e não são direitos
distinguíveis apenas pela limitação temporal
• Teoria do Direito Real de Gozo Típico – MC, JAV, ML – usufruto é autónomo face à
propriedade e, embora sendo direito de gozo pleno, não atribui a plenitude das
faculdades relativas à coisa, atendendo os poderes de disposição do usufrutuário serem
limitados.
Uso e Habitação
São direitos reais próximos do usufruto mas não atribuem o gozo pleno da coisa, e sim um gozo
limitado pelas necessidades do titular ou da família (art. 1484º).
➢ Diferem entre si quanto ao seu objeto.
Remonta ao Direito Romano e desenvolveu-se a propósito de coisas não frutíferas. Evoluiu até que se
admita alguns frutos e posteriormente foi consagrada a habitatio.
95
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Conteúdo e Regime
Direitos moldados sobre o regime do usufruto, mas em que os poderes de uso e fruição são mais
limitados.
Uso – faculdade de se servir de certa coisa alheia e haver os respetivos frutos, na medida da
necessidades, quer do titular quer da família (art. 1484º/1).
Habitação – quando o uso tem por objeto a casa de morada de família (art. 1484º/2).
Natureza
• Tese da Integração no Usufruto – Mota Pinto, OA, MC – orientação CC
• Tese da Autonomia – Carvalho Fernandes, JAV, ML – são autónomos pois não atribuem
o gozo pleno de um direito sobre a coisa, tendo estabelecidas limitações (das
necessidades do titular do direito e da família).
o Poderes de disposição são absolutamente proibidos e no usufruto são
admitidos.
o ML: meio termo entre usufruto e servidão, tendo do primeiro a sua atribuição a
uma pessoa determinada e do segundo a sua limitação a certas faculdades da
coisa.
96
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
SUPERFÍCIE
Definição legal do art. 1524º não cobre toda a realidade do direito de superfície: pode abranger
obras no subsolo (art. 1525º/2), direito de construir sobre edifício alheio (art. 1526º), alienação
separada das árvores em relação à propriedade do solo (art. 1528º).
➢ Subdivide-se em duas fases distintas: poder de realizar a obra e o poder de a manter.
Não se admitia, no Direito Romano, até que razões de ordem prática e social levaram a admitir-se esta
figura.
Conceção do direito de superfície manteve-se durante a Idade Média mas foi fortemente combatida pelo
Código de Napoleão, cujo Código de Seabra seguiu
Objeto e Duração
Direito de Superfície comporta as faculdades de construção e plantação, incidindo
essencialmente sobre o solo alheio, o que permite a sua transformação de forma a torna-lo
idóneo a receber a construção ou plantação.
• Pode abranger parte do solo que tenha utilidade para a obra (art. 1525º/1) e o mesmo
quando ocorre obra no subsolo (art. 1525º/2).
• Caso do direito de sobreelevação, em que direito se superfície incide sobre a parte do
edifício necessária à sua elevação (art. 1526º).
Após a realização da obra e estando ela já implantada em solo alheio, o direito de superfície
passa a incidir autonomamente sobre o implante, o que não é adquirido pelo proprietário por
acessão, sendo antes as faculdades de gozo exclusivo do implante atribuídas ao superficiário.
➢ Apenas os implantes que pudessem desencadear acessão industrial imobiliária (art.
1339º e ss.) é que poderão ser objeto do direito do superficiário.
Direito de Superfície pode ser temporário ou perpétuo – de acordo com o estabelecido no título
constitutivo.
69
Pode abranger apenas uma única árvore.
97
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
70
Tendo em conta a natureza imobiliária das coisas em causa (art. 204º).
98
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
4. Uso e fruição dos bens implantados – pertence naturalmente ao superficiário, pelo que
pode exercer sobre o implante os mesmos poderes de gozo que competem ao
proprietário.
• Limites das relações de vizinhança e o pleno uso e fruição do subsolo pelo
proprietário (art. 1533º), ou inversamente do solo, quando a superfície incida
sobre o subsolo.
5. Disposição do direito de superfície – art. 1534º - além de poder alienar o seu direito,
pode onerá-lo através da constituição de direitos reais de gozo ou garantia sobre o
mesmo (art. 1539º).
99
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
71
Caso de não uso do direito de superfície – art. 298º/3
72
O que implica a necessidade de invocação (art. 303º), possibilidade de suspensão do respetivo prazo
(art. 318º e ss.) ou da sua interrupção (art. 323º).
100
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Natureza
• Teoria do Desmembramento – PL / AV, OA – não é direito sobre coisa alheia e sim sobre
coisa própria (o implante), que permanece em terreno ou prédio alheio, sem sujeição
às regras da acessão, constituindo-se uma propriedade superficiária.
o ML: não pode ser qualificada como propriedade
• Teoria do Direito Real de Gozo Autónomo – MC, ML – direito real menor que comprime
a propriedade do solo, pois não é direito exclusivo e pleno, coexistindo com o direito do
proprietário do solo e não atribui todas as faculdades. É direito real complexo que inclui
faculdades de outros tipos legais.
• Teoria Dualista – Mota Pindo, Carvalho Fernandes – distingue entre as faculdades de
construção e plantação e o direito incidente sobre as construções e plantações, sendo
direitos distintos e de natureza diferente: direito real autónomo que abrange as
faculdades de construção e plantação e direito de propriedade sobre a construção e
plantação73.
o ML: quebra a unidade do direito de superfície pois o direito é sempre o mesmo,
quer abrangendo as faculdades quer abrangendo as construções em si. Uma vez
realizado o implante, a faculdade de transformação do solo não desaparece.
73
Conceção de Mota Pinto ≠ CARVALHO FERNANDES
Faculdades de construção e plantação são direitos reais de aquisição e o direito sobre a obra ou
plantações é direito real de gozo autónomo, que não seria propriedade por não ser exclusivo
(não é concebido sem a propriedade do fundeiro).
101
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
SERVIDÕES PREDIAIS
Noção legal do art. 1543º
• Lei ao definir como encargo atenta essencialmente no seu lado passivo – em relação ao
prédio serviente.
• Deve tomar-se em conta o lado ativo – em relação ao prédio dominante
o É um direito incidente sobre coisa alheia74: definido como a atribuição ao titular
de um prédio (dominante) de utilidades provenientes de outro prédio
(serviente).
74
Resulta da definição legal que os dois prédios devem pertencer a proprietários distintos, não podendo
constituir-se uma servidão entre dois prédios pertencentes ao mesmo proprietário – o proprietário tem
naturalmente o direito de afetar utilidades de um dos seus prédios em benefício do outro, mas essa
afetação resultará do exercício da propriedade e não da servidão.
➢ Se a propriedade não for exclusiva, já se constitui servidão
102
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
4. Indivisibilidade (art. 1546º) – não são suscetíveis de serem repartidas por partes,
incidindo sobre a totalidade do prédio serviente e não sobre apenas uma parte deste,
sendo sempre exercidas por intermédio de todo o prédio dominante e não apenas sobre
uma sua parte.
• Mesmo que seja limitado, por local, dias ou horas, há sempre uma utilidade
total da servidão.
• Divisão dos prédios não implica a multiplicação das servidões e ou cada fração
onde recaía a servidão mantem-se ou há contitularidade da mesma.
Modalidades de Servidões
Servidões positivas, negativas e desvinculativas
• Positivas – atribui ao titular do prédio dominante o poder de realizar certos atos sobre
o prédio serviente. Ex: passagem, apascentamento
• Negativas – titular do prédio serviente fica obrigado a abster-se da prática de certos
atos, de forma a incrementar as utilidades do prédio dominante. Ex: não edificação,
limitação da edificação em altura
• Desvinculativas – ocorre a libertação do prédio de uma restrição legal imposta em
benefício do prédio serviente. Ex: escoamento, estilicídio
75
Haverá sempre constituição de nova servidão (art. 1545º/2).
103
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
• Não aparentes – não se revelam por sinais (art. 1548º/2). Não podem ser adquiridas por
usucapião (art. 1548º/1 + 1293º/1/a) e também não permitem a constituição por
destinação do pai de família (art. 1549º).
o Não tem nada a ver com o caráter público ou oculto da posse – pode haver posse
pública em servidões não aparentes (servidão de aproveitamento de águas) e
posse oculta em servidões aparentes (servidão de passagem).
Servidões Legais
Pode ser constituída sem o consentimento do proprietário do prédio sujeito à servidão.
• Art. 1547º/2 – podem ser objeto de constituição voluntária por NJ ou através de
sentença judicial ou decisão administrativa.
• Art. 1569º/2, 3 e 4 – causas de extinção particulares.
76
ML: é o que faz mais sentido dada a subsidiariedade da ação de enriquecimento (art. 474º).
104
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
2. Servidão de presa – art. 1559º e 1560º - não se limita a recolher águas em prédio alheio,
atribuindo antes a faculdade de represar a água e a fazer derivar desse prédio.
➢ Pode ser águas particulares ou águas públicas.
3. Servidão de aqueduto – art. 1561º e 1562º - faculdade de conduzir sobre prédio alheio
as águas a que o titular da servidão tenha direito.
➢ Pode ser águas particulares ou águas públicas.
4. Servidão de escoamento – art. 1563º - faculdade de fazer escoar sobre prédio vizinho
as águas que existem em excesso em determinado prédio.
➢ Não se confunde com o art. 1351º.
3. Usucapião (art. 1548º) – apenas no caso das servidões aparentes (art. 1548º/1 +
1293º/a).
➢ Devido ao facto das servidões não aparentes não se revelarem por sinais visíveis
e permanentes, estas podem ser exercidas na ignorância do proprietário do
prédio serviente ou são confundidas com atos de mera tolerância.
105
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
4. Destinação do pai de família (art. 1549º) – ocorre sempre que em dois prédios do
mesmo dono, ou em duas frações de um só prédio, houver sinais visíveis e permanentes,
postos em um ou em ambos, que revelem serventia de um para com o outro.
➢ 4 requisitos:
i. Dois prédios ou duas frações de um prédio tenham pertencido ao
mesmo dono – o uso anterior dos prédios foi por antigo proprietário
comum;
ii. Existam sinais visíveis e permanentes reveladores de uma situação
estável de serventia de um dos prédios em relação a outro – sinais
inequívocos em relação à vontade ou consciência do antigo proprietário
de criar uma situação estável e duradoura de afetação das utilidades de
um prédio em benefício de outro;
o Relativamente à servidão de águas, não depende da existência
de sinais reveladores da destinação do antigo proprietário (art.
1390º/2) – caso particular de constituição por destinação do pai
de família que dispensa este requisito.
iii. Dois prédios ou frações tenham vindo a ser separadas do mesmo
domínio;
iv. Não haja no documento relativo a essa separação nenhuma declaração
contrária à existência desse encargo – esta figura tem caráter supletivo
pelo que as partes podem dispor em sentido contrário no respetivo
documento.
Após a sua constituição, as servidões são exercidas, atendendo ao seu conteúdo, nos termos
dos art. 1564º e ss.
Disposições supletivas, tendo em conta que o Título Constitutivo é o elemento
modelador determinante em relação ao exercício da servidão.
106
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
d) Renúncia – que não requer aceitação do proprietário do prédio serviente (art. 1569º/5).
• Pode haver renúncia liberatória à servidão para o proprietário de um dos
prédios dominantes se eximir do encargo de custear obras (art. 1567º/2).
77
Positivas – proprietário do prédio dominante deixa de gozar o direito adquirido;
Negativas – titular não se ter oposto à violação do dever de non facere;
Desvinculativas – volta-se a observar as restrições habituais nos prédios.
78
Implica que a servidão perca toda e qualquer utilidade que até aí vinha tendo para o prédio dominante,
uma vez que se se verificar a manutenção de utilidades, ainda que por forma mais reduzida, não se
justifica a extinção.
107
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Natureza
• Teoria do Desmembramento da Propriedade – Teixeira de Abreu, José Tavares –
desmembra-se a propriedade pelo que a servidão é um direito real que incide, não sobre
coisa alheia, mas antes sobre coisa própria, sendo a servidão frações da propriedade.
o ML: teoria ultrapassada pois não há desmembramento da propriedade, apenas
a sua compressão.
• Teoria da Propriedade Especial – Neuner – é faculdade integrante da propriedade sendo
uma parte que foi retirada da extensão do direito de propriedade e que seria atribuída,
como propriedade, em exclusividade a outrem.
o ML: falha pois não é, ao contrário da propriedade um direito exclusivo
• Teoria da Limitação do Exercício do Direito – Windscheid, Guilherme Moreira, PL / AV
– limitação ao exercício do direito do proprietário do prédio serviente, que não afeta o
seu conteúdo, mas que permite ao titular do prédio dominante aproveitar-se de certas
utilidades proporcionadas por coisa alheia.
o ML: está de alguma forma presente no art. 1543º quando qualifica a servidão
como encargo, mas, só qualifica o lado passivo e a servidão tem um lado ativo.
• Teoria Dualista – próximo de JAV – desmembramento nas servidões positivas e
limitação nas servidões negativas.
o ML: a servidão tem um conceito unitário.
• Teoria do Direito Real Menor – OA, Carvalho Fernandes, ML – direito real de gozo
incidente sobre coisa alheia, ainda que o gozo que a servidão proporciona incida
sobre coisa diferente daquela que constitui o seu objeto.
108
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
DL 275/93, de 5 de agosto
Tendo em conta a republicação pelo DL 37/2011
Art. 3º/1 – duração é tendencialmente perpétua, mas o título constitutivo pode limitá-la a um
prazo, que tem de ser no mínimo de 1 ano.
Art. 3º/2 – permite apenas uma utilização temporária e periódica dos apartamentos. Extensão
temporal limitada, ainda que se renove anualmente.
Art. 10º e 11º - tem de ser emitido um certificado predial com determinados requisitos
109
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Natureza
Doutrina tem qualificado, pacificamente, como um direito real de gozo menor, não sendo uma
forma de propriedade, na medida que não se trata de um direito exclusivo, já que coincide
necessariamente com a propriedade do titular do empreendimento.
110
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Diferem dos Direitos Reais de Gozo pois não visam proporcionar aos titulares retirar uma
utilidade imediata (retirar vantagens da coisa). As vantagens são indiretas.
Estes direitos são figuras que têm as características e os princípios dos Direitos Reais.
➢ Nomeadamente o princípio da tipicidade e se não se respeitar há garantia mas
meramente obrigacional.
111
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
No caso de bem móvel não sujeito a registo, é possível constituir um penhor e afetar os
respetivos frutos ao pagamento do capital em dívida (art. 672º) – permite, por essa via, que seja
obtida uma função idêntica à da consignação de rendimentos.
Regime
Atribui ao credor, na execução, a preferência sobre os demais credores pelos rendimentos do
bem sobre que incide e permite exigir esses rendimentos mesmo que o bem seja alienado a
terceiro.
Figura maleável quanto ao poder em que ficam os bens – nos termos do art. 661º
a) Bens continuam em poder do concedente: credor tem direito de exigir dele a prestação
anual de contas (art. 662º/1). Concedente mantém os bens em seu poder e tem o dever
de entrega dos rendimentos ao credor.
b) Bens passam para o poder do credor: credor fica equiparado ao locatário79,
administrando-os para obter os rendimentos que são objeto da garantia. Concedente é
que pode exigir contas do credor (art. 662º/2)
c) Bens passam para poder de terceiro: colocados na posse de terceiro através de título
específico, cabendo-lhe a faculdade de gozo desses bens mediante contrapartida de
uma prestação que é entregue ao credor a título de garantia
No caso de garantir cumprimento da obrigação e pagamento dos juros, os frutos da coisa são
imputados primeiro nos juros e só depois no capital (art. 661º/2) – extinção da obrigação
garantida vai assim ocorrendo através da entrega desses rendimentos ao credor, a qual não
implica novação e como que se reconduz a dação em cumprimento.
Titular da consignação não tem a faculdade de executar a coisa – apenas pode pagar-se através
dos seus rendimentos, que obtém gradualmente sem necessidade de aguardar que o devedor
incumpra a obrigação garantida.
• É oponível a terceiros.
• Não sobrevive à venda executiva – art. 824º/2
O art. 665º aplica à consignação de rendimentos o regime da hipoteca: art. 692º-696º, 701º,
702º
79
Ele não fica locatário (pois sendo assim teria de pagar renda) mas fica equiparado a tal
Está sujeito ao art. 663º
80
Manifestação da inerência
112
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Natureza
• Pinto Duarte – não tem natureza real completa, na medida em que ao credor é retirada
a possibilidade de executa o bem, e a garantia não sobrevive à venda executivo.
• Andrade Mesquita – não tem caráter de garantia e é meio de realização atual do
crédito, reconduzível à datio pro solvendo.
• ML – garantia real das obrigações por força da qual o credor se paga pelos rendimentos
de certos bens imóveis ou móveis sujeitos a registo.
o Embora, além de garantia real, possa funcionar como meio que permite
satisfazer o crédito (mas isso depende da vontade do devedor que pode, em
qualquer altura, optar por cumprir a obrigação garantida extinguindo a
consignação).
Art. 666º/1 – penhor constitui uma garantia real, dado que atribui uma preferência sobre
bens determinados, cuja especificidade consiste em ter por objeto os bens não suscetíveis de
hipoteca (bens móveis desde que não suscetíveis de hipoteca).
• Tradicionalmente não se admitia um penhor sobre universalidades de facto, mas, a
prática tem admitido que certas universalidades podem ser objeto de penhor –
estabelecimentos comerciais e o penhor irregular do art. 666º/2.
• Garantia acessória e não há limites legais à obrigação garantida, podendo abranger
capital e/ou juros (não se aplica o mesmo que no art. 693º/2).
• Resulta sempre de um contrato que pode ser celebrado pelo devedor e por terceiro –
legitimidade para constituir o penhor (art. 667º) sendo forma legal não exigida (excepto
para o penhor de direitos – art. 681º).
No caso do penhor de créditos81 (art. 679º e ss.), dado que estes não podem ser objeto de
direitos reais, o penhor perde a natureza real e é garantia de outro tipo.
Modalidades
• Penhor com desapossamento: exige a entrega da coisa ou de documento que atribua a
exclusiva disponibilidade dela ao credor ou a terceiro (art. 669º/1).
o Pode ser a atribuição de composse (art. 669º/2).
o O essencial é que o credor seja privado da disponibilidade material da coisa, o
que desempenha uma função de publicidade, visando-se com ela assegurar que
os terceiros possam ter conhecimento da existência do penhor, e que terão de
suportar o exercício do direito do credor pignoratício, caso a coisa seja objeto de
alienação.
• Penhor sem desapossamento: há outros casos em que noutros diplomas legais se
dispensa o desapossamento. Ex: caso do penhor mercantil e da garantia de créditos por
estabelecimentos bancários autorizados.
81
Sempre que estes créditos têm por objeto coisas móveis e sejam suscetíveis de transmissão.
113
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Natureza
• Penhor como figura processual
• Penhor como direito de crédito
• Penhor como direito misto
• Penhor como direito real de garantia – ML – faculdades de execução e venda da coisa
e de preferência no pagamento sobre o produto desta à frente dos credores comuns
correspondem claramente a um direito real que, por ter por função garantir a satisfação
de um crédito, representa um direito real de garantia.
82
Se houver fundado receio, pode haver venda antecipada (art. 674º)
114
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Art. 686º destaca o traço distintivo desta garantia: o seu objeto, na medida em que se restringe
às coisas imóveis ou equiparadas (automóveis, navios e aeronaves), mais precisamente certos
bens registáveis, bem como o facto de ter que ser registada sendo isso que confere a
propriedade.
➢ Caracteriza-se por, ao contrário do privilégio, não estabelecer a preferência em atenção
à causa do crédito, vigorando o princípio da prioridade na constituição.
Constituição
Art. 703º estabelece distinção entre hipotecas:
1. Hipoteca Legal
Definida no art. 704º como resultante imediatamente da lei, mas só se constitui mediante o
registo (art. 687º e art. 4º/2 Cod RP).
• Registo é efetuado com base em certidão de título de que resulte a garantia e em
declaração que identifique os bens, se necessário.
• Podem ser registadas em relação a quaisquer bens do devedor – art. 708º
2. Hipoteca Judicial
Definida no art. 710º como resultante de sentença que condena o devedor à realização de uma
prestação em dinheiro.
➢ Funciona como uma penhora antecipada, podendo recair sobre quaisquer bens do
devedor suscetíveis de penhora, admissível independentemente do trânsito em julgado
da decisão condenatória, bastando que ela tenha sido proferida.
3. Hipoteca Voluntária
Definida no art. 712º como resultante de contrato ou declaração unilateral.
➢ Pode ser pelo devedor e por terceiro (art. 717º) sendo a legitimidade aferida pelo art.
715º.
➢ Forma de escritura pública – art. 714º
Registo da Hipoteca
Art. 687º exige que seja registada, sob pena de não produzir efeitos, mesmo em relação às
partes – Registo Constitutivo (art. 4º/2 Cód RP).
➢ Podem ser registadas provisoriamente antes de titulado o negócio – art. 47º, 92º/1/i
Cód RP
Objeto da Hipoteca
O crédito garantido pela hipoteca pode estender-se aos acessórios deste crédito que constem
do registo – art. 693º/1 – como os juros moratórios e remuneratórios, clausulas penais,
despesas de constituição de registo e etc.
115
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Como direito real de garantia, a hipoteca só pode incidir sobre os bens determinados,
pertencentes ao devedor ou a terceiro – no caso das hipotecas voluntárias art. 716
➢ Quanto às hipotecas legais, o art. 708º, sem prejuízo do direito de redução, estabelece
que podem ser registadas em relação a todos os bens do devedor (tal como nas judiciais
– art. 710º).
Vicissitudes da Hipoteca
Modificação da Garantia
• Alteração do objeto – art. 692º
• Tem subjacente uma ideia de sub-rogação real mas pode ter por objeto algo diferente,
moldado sobre o regime do penhor de créditos (art 681º/2).
• Reforço da hipoteca – art. 701º
• Redução da hipoteca – art. 718º, 719º, 720º
• As hipotecas voluntárias não são normalmente redutíveis, o que é coerente com o
princípio da indivisibilidade da hipoteca (art. 696º).
Transmissão da hipoteca
• Cessão da hipoteca – art. 727º, 728º
• Cessão do grau hipotecário – art. 729º
• Ambas estão sujeitas a registo – art. 2º/1/h Cód RP (por averbamento à inscrição
hipotecária – art. 101º/1/c Cód RP).
Execução
Não pode ser dispensada – lei proíbe o pacto comissório no art. 694º
➢ A defesa do proprietário da coisa hipotecada na execução varia consoante ele seja o
próprio devedor ou um terceiro, em relação à obrigação garantida – art. 697º, 698º
116
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
Extinção
• Art. 730º
o Alínea a) Pode ocorrer renascimento se se conhecer o vício na data em que teve
conhecimento da extinção da obrigação (art. 766º, 839º, 856º, 860º/2, 866º/3,
873º/2) – se no registo tiver sido cancelado só renasce na nova inscrição (art.
732º).
o Alínea d) Pode ser renúncia ao crédito ou à própria hipoteca – ML diz que a
melhor interpretação é como referindo-se apenas à hipoteca
• A expurgação da hipoteca também pode ser uma causa de extinção
• Art. 717º/1
• Caducidade
• Extinção do direito sobre que a hipoteca incide
Natureza
Hipoteca limita-se às faculdades de executar a coisa e de obter pagamento sobre o seu valor,
com preferência em relação aos demais credores do devedor.
➢ Hipoteca pode ser caracterizado como direito real de garantia e efetivamente possui
caráter absoluto, inerência, sequela e prevalência.
O privilégio garante naturalmente o crédito que dele beneficia, podendo, nos termos do art.
734º, garantir igualmente os juros relativos aos últimos dois anos se forem devidos.
Extinguem-se pelas mesmas causas da hipoteca – art. 730º ex vi art. 752º
Há outras disposições da hipoteca que se aplicam – art. 753º
Natureza
Privilégios especiais são direitos reais, uma vez que incidem sobre coisas determinadas, e
gozam de sequela, sendo oponíveis a terceiros, conferem preferência no pagamento ao credor
que deles beneficia – assemelha-se ao penhor e hipoteca.
Privilégios gerais não podem ser considerados como direitos reais de garantia pois não incidem
sobre coisas determinadas nem gozam de sequela, só podendo ser exercidos em relação aos
117
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
bens que se encontrem à data da penhora no património do devedor. São garantias especiais
sobre universalidades.
Natureza
Moldado sobre o regime do penhor ou da hipoteca constitui um verdadeiro direito real de
garantia, na medida em que, tal como aqueles direitos, possui as características do caráter
absoluto, inerência, sequela e prevalência.
É garantia muito forte e pode prevalecer sobre hipoteca constituída anteriormente (art. 759º/2)
mas assume cariz provisório, na medida em que pode ser excluído pela prestação de caução
suficiente (art. 756º/d).
Tem também uma função compulsória, visando compelir o devedor a realizar a prestação em
dívida, de forma a recuperar o objeto retido.
Penhora
Consiste numa apreensão dos bens do executado (seja ele o devedor ou terceiro) afetos à
garantia da obrigação exequenda, em ordem a que eles possam ser sujeitos aos fins da ação
executiva, a saber, a satisfação do direito do credor exequente e, eventualmente, do dos
outros credores com garantia real sobre esses bens.
118
Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB
➢ É ato judicial mas resulta, em termos substantivos, numa garantia das obrigações, na
medida em que, além de impedir o executado de continuar a dispor dos bens
penhorados, atribui ao exequente preferência na satisfação do seu crédito sobre esse
bens, preferência essa que apenas cessa no caso de insolvência do executado.
o Integra-se entre as garantias reais das obrigações, pois atribui ao exequente um
direito sobre uma coisa corpórea, oponível erga omnes, que lhe atribui
preferência no pagamento sobre a venda desse mesmo bem.
Regras dos art. 601º, 817º, 818º CC e 735º CPC (muito mais regras do CPC que disciplinam o
regime processual da penhora e os seus efeitos).
Preferência Real
Faculdade de adquirir um bem, suportando as mesmas condições de outro adquirente, que
celebrou um contrato relativamente àquele bem.
Pode resultar na atribuição de eficácia real ao pacto de preferência, nos termos do art. 421º,
assim como da concessão legal de direitos de preferência.
O direito de preferência tem eficácia erga omnes e não está sujeito a registo83, podendo o
titular do direito de preferência opor eficazmente o seu direito não apenas ao adquirente como
a eventuais sub-adquirentes do bem.
83
Mas a ação está sujeita a registo: art. 3º/1/a Cód RP
119