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Aula01 Libras
Aula01 Libras
GUARULHOS – SP
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 3
5 A PRÁTICA DE LIBRAS..................................................................................... 21
6.9 Tópicos......................................................................................................... 40
9.3 Avaliação de Materiais Didáticos Para o Ensino Dos Sujeitos Surdos ......... 85
Prezado aluno!
Bons estudos!
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2 ASPECTOS CLÍNICOS DA SURDEZ
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comprometimento), quanto à etiologia (causa da surdez) e o período de aquisição da
mesma. Assim,
Por isso, conhecer alguns aspectos clínicos da surdez faz-se necessário para
o desenvolvimento de uma boa prática educativa.
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Acima de 70 dB a pessoa é considerada surda, necessitando do uso de
língua de sinais para se comunicar;
Fonte: www.ouviclin.com.br
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aula e acima de tudo o interesse do professor em aprender e querer se comunicar
com o aluno surdo, a fim de garantir uma aprendizagem efetiva
Por que alguns surdos falam e outros não? Geralmente essa diferença está
associada ao período de aquisição da surdez ou ao tipo de identidade surda adotada
pelo indivíduo.
De acordo com o período de aquisição a surdez pode ser:
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2.4 Tipos de Surdez ou Perda Auditiva
Fonte:www.tectronica.files.wordpress.com
As ondas sonoras são captadas pelo ouvido externo e passa para o ouvido
médio onde são conduzidas pelo martelo, bigorna e estribo até a cóclea que fica na
parte interna do ouvido. É na cóclea que o som é processado, vibra e vai para o
cérebro, passando pelo nervo auditivo. Quando ele chega aos centros auditivos do
cérebro é possível a compreensão da mensagem recebida.
Os tipos de surdez variam de acordo com a localização da lesão no aparelho
auditivo.
O MEC divide em quatro os tipos de perda auditiva, são elas:
Condutiva - patologias localizadas no ouvido externo e/ou médio.
Geralmente são ocasionadas por causas pós-natais e em sua maioria
são reversíveis após tratamento;
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Neurossensorial - de origens pré-natais. Localiza-se no nervo coclear e
esse tipo de lesão é irreversível;
Mista - afeta ao mesmo tempo o ouvido externo e/ ou médio e o ouvido
interno. Ocorre devido a fatores genéticos, determinantes de má
formação. Esse caso também é irreversível;
Central - alteração localizada no cérebro. Pode ser localizada desde o
tronco cerebral até as regiões subcorticais e córtex cerebral. (BRASIL,
2006, p.16).
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A construção da identidade da pessoa surda ocorre através da convivência com
os outros, ou seja, a partir da interação com surdos ou ouvintes. O convívio da pessoa
surda refletirá diretamente sobre qual identidade ela assumirá. Entender qual a
identidade assumida pelo aluno surdo permitirá ao professor perceber a concepção
que o aluno tem de si mesmo e dentro de qual cultura ele está inserido, a ouvinte ou
a surda. Sendo duas culturas distintas, é importante a identificação e valorização da
cultura dentro do contexto educacional.
De acordo com Costa (2009):
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história dos surdos, pois deu-se os primeiros passos para a integração em sociedade
com o objetivo de oportunizar o acesso à educação e ao trabalho aos surdos.
Na Grécia antiga, na qual se cultuava o corpo e a beleza física, as pessoas com
deficiência eram afastadas da sociedade, sendo privadas do convívio social e
posteriormente atiradas ao rio Tibre. Segundo Silveira (2012), as pessoas com
deficiência eram vistas como um perigo à sociedade, já que eram incapacitadas de
procriar a própria espécie. Em algumas culturas as pessoas com deficiência eram
associadas a imagens demoníacas, a forças sobrenaturais que as levavam a serem
imperfeitas e associadas também com bruxaria e feitiçaria. No século XIX, há registro
de algumas tentativas de recuperação e reconstrução de membros; em alguns casos
não só de membros, mas também a reconstrução do psíquico.
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É importante lembrar que a Libras foi criada a partir da língua de sinais
francesa. Com a vinda do francês Eduard Hernest Huet para o Brasil, que foi aluno do
Instituto de Paris, a educação de surdos teve início durante o segundo império. Nessa
época, promoveu-se a Libras, com forte influência da França. No entanto, não havia
escolas especiais para surdos, por isso Huet solicitou ao imperador Dom Pedro II um
estabelecimento para educar os surdos brasileiros. No dia 26 de setembro de 1857 foi
fundado o instituto de surdos-mudos do Rio de Janeiro, atualmente conhecido como
Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES).
A partir desse momento, o Brasil deu seus primeiros passos para a educação
de surdos, utilizando o ensino do alfabeto manual. Em meados de 1911, o INES
adotou a metodologia do oralismo para que os surdos tivessem a oportunidade de se
comunicar e conseguir com eficácia expressar suas vontades e pensamentos.
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nivelamento cognitivo era necessário, pois era o meio encontrado para garantir o
sucesso do método pela pedagogia emendativa.
Após 100 anos de existência, o INES contou com o primeiro profissional na
área da educação, a diretora e professora Ana Rímoli de Faria. Para a época foi uma
grande inovação, principalmente com a implantação do curso Normal de formação de
professores para surdos. No país o curso tornou-se referência, tinha duração de três
anos e sua base era voltada para a metodologia do oralismo.
3.4 Bilinguismo
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4 NOÇÕES DE LIBRAS
A aquisição da língua brasileira de sinais pelas crianças surdas é algo que ainda
nos inquieta, nos retira da zona de conforto. É algo que mostra, muitas vezes, diversas
lacunas nos processos de aprendizado e ensino-aprendizagem; mostra as fragilidades
de um processo de inclusão social falho, despreparado para uma sociedade diversa
e diferente. A escola, assim como as demais instituições sociais, não está preparada
para atender às especificidades linguísticas, culturais e identitárias dessa minoria que
ora se apresenta.
Neste capítulo, você aprenderá sobre as questões relacionadas à aquisição da
língua brasileira de sinais pela criança surda, bem como os estágios que a compõe,
os processos pelos quais ela passa e sobre a importância da Libras no cotidiano
escolar.
Cerca de 95% das crianças surdas são filhas de pais ouvintes, e essa condição
acarreta uma série de questões que podem determinar sua trajetória escolar e,
consequentemente, sua formação (SKLIAR, 1997). Prover o acesso à língua desde a
mais tenra idade é essencial para garantir um desenvolvimento pleno e integral do
sujeito, além de proporcionar sua percepção e interação com o mundo que o cerca.
Quadros e Cruz (2011) apontam que somente 5% das crianças surdas são
filhas de pais surdos e, por isso, possuem o input linguístico adequado no período de
aquisição da linguagem. Neste ponto, trazemos para a reflexão o conceito de cultura
surda, apresentado por Strobel no livro A Imagem do Outro Sobre a Cultura Surda,
publicado em 2009. A autora define cultura surda como a forma de “[...] o sujeito surdo
entender o mundo e modificá-lo a fim de torná-lo acessível e habitável ajustando-o
com suas percepções visuais, que contribuem para a definição das identidades surdas
[...]” (STROBEL, 2009, p. 27).
Qual a relação da cultura surda com o uso da língua brasileira de sinais?
Quando pensamos que a aquisição da língua pelas crianças surdas é análoga à das
crianças ouvintes, nos causa estranheza quando recebemos um discente surdo em
nossa sala de aula que não domina a língua brasileira de sinais (Libras).
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As crianças ouvintes, logo ao nascerem, entram em contato com a língua
majoritária — no nosso caso, a língua portuguesa —, na modalidade oral, por meio
dos mais diversos canais. No entanto, a maioria das crianças surdas não possui esse
contato linguístico desde o nascimento. A língua brasileira de sinais é um dos artefatos
culturais apresentados por Strobel (2009) cuja importância é fundamental. Por isso,
há a necessidade de uso da Libras desde o nascimento, para que essa criança cresça
imersa em sua cultura e crie sua identidade. Infelizmente, essa é a realidade de
apenas 5% das crianças surdas. Ao crescerem e se desenvolverem, tomando
consciência de sua condição, alguns surdos passam a frequentar as associações e a
se relacionar com seus pares e desenvolvem/adquirem os demais artefatos culturais,
além da língua e da identidade.
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4.2 Recepção e Produção da Libras
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linguísticos, quem garante que na escola próximo da sua residência haverá outras
crianças surdas regularmente matriculadas?
No ano de 2002, a língua brasileira de sinais (Libras) é reconhecida como meio
de comunicação e expressão da comunidade de surdos do Brasil por meio da
publicação da Lei nº 10.436, também conhecida como Lei de Libras (BRASIL, 2002).
Na constituição dessa legislação, a Libras passa a ser disciplina obrigatória nos cursos
de formação de professores (licenciaturas e magistério) e fonoaudiólogos, além de
optativa nos demais cursos de graduação. É provável que a Libras ainda não seja
uma disciplina obrigatória nas escolas de educação básica de nosso país por ser
considerada um meio de comunicação de um determinado grupo social.
O Decreto nº 5.626, de 2005, que regulamenta a Lei de Libras, apresenta a
possibilidade de o ensino para as crianças surdas ser ministrado em Libras do 1º ao
5º ano do Ensino Fundamental, além das formações para professores, intérpretes,
instrutores e outros atores da educação de surdos (BRASIL, 2005). Chamo a atenção
para o inciso I do art. 22º do referido Decreto:
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Ora esse sujeito tem o direito de estudar próximo à sua residência, ora de estar
junto a seus pares, ora ter sua instrução em Libras, ora...., ora..., ora.... As legislações
vigentes não dialogam entre si e fazem a educação desses indivíduos ser um
complexo labirinto a ser vencido. A comunidade surda (i.e., alunos surdos, professores
surdos, professores ouvintes bilíngues e intérpretes) defendem um modelo de
educação bilíngue tendo a Libras como língua de instrução e a língua portuguesa na
sua modalidade escrita como segunda língua, mas vale ressaltar que esse modelo é
adotado em escolas de/para surdos e, no Brasil, nem todas as cidades do país
possuem escolas que trabalham nessa perspectiva.
No processo inclusivo, o ensino da Libras é importantíssimo, uma vez que, em
grande parte das escolas comuns, o discente surdo é o único falante da língua de
sinais, não havendo nenhum par linguístico. Esse ensino parte do pressuposto de que
é por meio da comunicação e da interação com o outro que acontece o
desenvolvimento intelectual, cognitivo e linguístico, além do aprendizado com
qualidade. É necessário também que a escola incentive e pratique a pedagogia da
diferença, de modo que comunidade reconheça a diferença linguística e cultural de
seus alunos (MARTINS, 2019).
Para que os indivíduos surdos alcancem níveis satisfatórios de aprendizado,
relacionamento e desenvolvimento integral, a escola precisa criar estratégias
adequadas para o processo de ensino-aprendizagem, buscando metodologias e
práticas que potencializem o uso de recursos visuais, além de avaliações condizentes
com as especificidades linguísticas e a criação de políticas que valorizem seus
artefatos culturais, essenciais para seu crescimento.
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4.4 (In)conclusões
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De acordo com Martins (2019), a escola precisa repensar suas práticas,
métodos, currículos e avaliações para que contemplem as especificidades dos
discentes surdos, além de incentivar o uso da Libras em seus espaços e entre seus
atores. Assim, um espaço que oferece possibilidades linguísticas para os surdos pode
proporcionar um melhor aprendizado e gerar um sentimento de pertencimento.
5 A PRÁTICA DE LIBRAS
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isso, quando passamos a conviver mais com surdos, precisamos nos atentar a esses
simples detalhes, que, na verdade, fazem muita diferença.
Para o surdo, no entanto, isso também precisa ser aprendido, assim como para
os ouvintes que ingressam na comunidade surda. Por isso, quanto mais cedo a
criança surda estiver em contato com a língua de sinais, conhecer e vivenciar
experiências com surdos, tanto na escola quanto na sociedade no geral, maiores
serão as possibilidades de desenvolver sua identidade surda.
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No caso das histórias, quando narradas oralmente, a fala das personagens, a
mudança de uma para outra, a organização da história e o gênero são percebidos
pela entonação de quem lê ou conta. O ouvinte percebe quando não há um preparo
prévio ou quando a pessoa que narra a história não o faz com destreza. Quando elas
são narradas ou contadas por meio da língua de sinais, esses aspectos são passados
por meio do corpo. Inicialmente, é feita a organização da história no espaço, ou seja,
os elementos que a compõe vão sendo distribuídos no espaço, à frente de quem
sinaliza. A partir disso, toda a história vai se construindo, e, para demonstrar quando
um ou outro personagem está falando, o posicionamento é usado, o que se dá por um
leve movimento de corpo; em relação à entonação, ela ocorre por meio da intensidade
dos sinais e do uso das expressões faciais e corporais (FALKOSKI, 2019).
Outro exemplo são os jogos, para os quais existem diferentes modalidades:
Olímpiada, Copa do Mundo, competições em cada modalidade esportiva, entre outros,
pensando nos ouvintes. A comunidade surda normalmente organiza uma olímpiada
escolar ou olímpiada de surdos, a primeira organizada entre escolas e instituições de
ensino que atendam surdos, já a segunda conhecida como Surdolimpíadas. Elas
ocorrem a cada 3 anos em um país diferente, sendo importante destacar que são
diferentes modalidades disputadas e que o Brasil vem se destacando ano após ano;
agora também têm sido organizadas no Brasil, entre os estados. Muito se discute o
motivo de fazer separado de outras pessoas com deficiência, porém, quando se pensa
na principal diferença do surdo para os ouvintes, aí começa a fazer sentido: a língua.
Principalmente se pensar na organização das regras e instruções que são feitas por
meio da língua de sinais: não seria justo e fácil que, em um jogo entre surdos e
ouvintes, o primeiro grupo recebesse dicas e orientações auditivas durante todo o
jogo, e o segundo grupo, não. Ao falar desse tópico, torna-se necessário fazer uma
ressalva quanto à divulgação esportiva, visto que dificilmente os noticiários trazem
notícias ou a cobertura desses encontros de pessoas surdas, pois ainda se dá pouca
importância para esses eventos, mesmo sendo de conhecimento da sociedade a
existência de uma comunidade surda.
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Observar esses aspectos consiste em olhar para a diferença, perceber que não
são músicas, histórias ou jogos diferentes, mas sim a forma como acontecem e são
organizados. Em algumas situações, é possível contar com a tradução e a
interpretação sem grandes prejuízos, já em outras, não. Esse fator precisa ser levado
em consideração, pois nem sempre a diferença se resolve apenas com a presença de
um intérprete. É diferente um surdo assistir a uma peça de teatro com personagens
sinalizando e assistir a mesma peça com intérprete. No primeiro caso, se olhar para a
fala-sinalização, perderá a ação, e vice-versa.
Além dessas diferenças, outra que se destaca muito é a língua utilizada pela
comunidade. De acordo com Giordani (2012, p. 71), “A comunidade de surdos se
identifica essencialmente pela língua que usa [...]”, essa língua é que auxiliará,
juntamente com outros aspectos culturais, na construção da identidade surda. No
caso do Brasil, usa-se a Língua Brasileira de Sinais, também conhecida como Libras.
Todavia, deve-se deixar claro que cada país tem a sua língua, porém todas seguem
basicamente os mesmos princípios quanto à sua composição de fonologia, morfologia
e sintaxe.
O ser humano não nasce sabendo e dominando os conhecimentos necessários
para viver em sociedade, esses conhecimentos precisam ser ensinados e aprendidos.
As possibilidades de aprendizagem e de ensino estão disponíveis para todas as
pessoas? Sim, a possibilidade de aprender sempre está disponível. No entanto, elas
nem sempre são proporcionadas, principalmente, para a criança com deficiência.
Muitas vezes, julga-se que algumas pessoas não podem ou não conseguem aprender.
Segundo Mazzotta e D’antino (2011, p. 379):
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estratégias de violência simbólica. Um dos segmentos populacionais
reiteradamente colocados nessa posição tem sido o composto de pessoas
com deficiências físicas, mentais, sensoriais ou múltiplas, além daquelas que
apresentam outros transtornos de desenvolvimento.
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as pessoas esquecem que a comunicação precisa ser feita entre pessoas, não por
meio de aparelhos, mas sim pessoalmente.
Um aplicativo, por exemplo, não usa expressão facial ou corporal ao dar um
sinal. Pensando na prática, o sinal de “triste” não é composto apenas por uma
configuração de mão, articulação ou ponto de contato. Ele necessariamente precisa
da expressão fácil de tristeza e da expressão corporal de encolhimento, ou seja, o
sinal, para ter seu sentido compreendido, necessita de todos esses parâmetros.
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língua de sinais em campo reduzido. Contudo, da mesma forma, os parâmetros da
língua devem ser respeitados e seguidos para que haja sua correta compreensão.
De acordo com Paixão e Alves (2018, p. 48), “A visão de que a comunidade
surda é uma minoria linguística é muito importante porque interfere no modo de lidar
com a surdez, sobretudo, na educação e no modo de interagir com o surdo. Por outro
lado, demonstra um modo de constituir-se surdo [...]”. Hoje, no Brasil, pode-se dizer
que ainda são poucos os ouvintes usuários da Libras, embora tenham sido criados
cursos envolvendo o aprendizado da língua. Todavia, as dificuldades persistem, pois,
situações como ir a um médico ou a uma loja acabam tornando difícil a vida da pessoa
com surdez, devido ao fato de esta depender sempre de um intérprete ou familiar que
saiba a língua e possa fazer a mediação, o que faz haver sempre a dependência de
alguém.
Com o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais como forma de
comunicação da comunidade surda, muitos foram os avanços conquistados. A
inserção da disciplina nos cursos de formação de professores e de fonoaudiologia, a
oferta e o aumento de procura por cursos na área também são indícios de uma
preocupação. Paixão e Alves (2018) ainda abordam o aspecto positivo da difusão da
língua de sinais e, consequentemente, os espaços ocupados por surdos que antes
eram destinados apenas a ouvintes. Hoje, por exemplo, se ouve falar de surdos na
faculdade, no mestrado e no doutorado, inclusive ocupando cargos de mais destaque,
não só de empacotador de mercado ou na produção de empresas, como somente
acontecia.
A sociedade tem muito a evoluir ainda, pois, em espaços básicos de saúde e
educação, na maioria das vezes, não há a garantia de comunicação ou, então,
recursos visuais que possibilitem a compreensão por parte da pessoa surda. Pense
no momento da consulta médica, aquela em que você já se sente constrangido só de
precisar falar com alguém sobre o seu problema, e ainda precisa ter uma segunda
pessoa que possa sinalizar ou explicar o que você está sentindo ou o que está
acontecendo, de modo que se tornam momentos desconfortáveis para todos os
envolvidos, não só para o surdo (FALKOSKI, 2019).
Além da sinalização, a Libras possui uma forma de ser escrita, o sistema
SignWriting. Esse sistema é pouco utilizado dentro da comunidade surda, devido à
sua complexidade, pois faz-se necessário desenhar o sinal com toda a sua
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composição: configuração de mão, ponto de articulação e movimento, deixando de
lado as expressões facial e corporal apenas. No entanto, segundo Paixão e Alves
(2018, p. 48), esse sistema poderia ser utilizado “[...] para o letramento do surdo, uma
vez que, é um sistema de fácil aprendizagem pelo surdo e que o letramento amplia o
desenvolvimento do pensamento [...]”. Entretanto, ele se torna mais demorado do que
a escrita por meio do português, o que faz a maioria dos surdos optar por não utilizá-
lo.
Nessa linha é que as escolas bilíngues surgem: para garantir o aprendizado da
língua de sinais como primeira língua e do português escrito como segunda. No
entanto, não é bem assim que tem acontecido, uma vez que, mesmo tendo uma
proposta bilíngue, a maioria das instituições acaba não a colocando na prática, e,
quando o surdo chega em locais que precisa também dominar o português escrito,
acaba não dando conta.
Existem muitas discussões a respeito do local mais adequado para os surdos
estudarem: escola inclusiva ou escola especial bilíngue. A partir de vários estudos,
tem-se apontado os benefícios de a criança estudar na escola onde sua língua esteja
em evidência em todos os espaços e momentos enquanto estiver formando seu
desenvolvimento inicial.
Pensar na escola inclusiva é, além de garantir a presença de um intérprete ou
professor bilíngue em sala de aula durante todos os momentos, favorecer o
aprendizado da língua de sinais pelos alunos da turma, professores, funcionários e,
quando possível, estendê-la a todos os alunos da escola. Professores que reclamam
da não participação de seus alunos surdos nas aulas, professores que dizem que
surdo só se interessa pelo que quer e não aceita o que ouvintes dizem não
compreendem que a falta de comunicação, a falta de fluência em Libras por todos os
envolvidos possa ocasionar, sim, a falta de interesse. O aluno surdo não consegue
participar de todos os momentos da escola “sozinho”, pois, para interagir com seus
colegas ou outros alunos e com seu professor, ele precisa de alguém que conheça a
língua e possa fazer a mediação sempre. Segundo Thoma (2012, p. 97):
[...] a atividade do desenho nos primeiros anos da infância não deveria ser
apenas mero passatempo. É importante que, em um determinado momento,
os primeiros traços da criança comecem a fazer sentido e trazer algum
significado, e é aí que entra o papel do adulto, da fala e da mediação. O
desenho infantil passa a ser significativo pelo ato de nomear (ZERBATO;
LACERDA, 2015, p. 429)
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ajudar a conduzir as aprendizagens necessárias para cada momento. O profissional
da educação precisa estar atento a tudo o que acontece em sala de aula, observar,
anotar e refletir são ações básicas de qualquer professor, mas, quando se trabalha
com crianças que necessitam de mais recursos, isso se torna fundamental. A partir
dos erros e acertos é possível planejar e pensar quais seriam os passos necessários
para um maior avanço e desenvolvimento do sujeito.
Uma turma que tenha um aluno surdo com certeza terá momentos de
aprendizagens mais significativas do que as outras turmas, pois a necessidade de
buscar recursos visuais não favorece apenas o ensino de quem não escuta, mas sim
de todo e qualquer aluno.
Um exemplo que poderia ser pensado para o ensino do sistema solar: o
professor utiliza, além da sua explicação falada, vídeos, imagens e até mesmo uma
representação por meio de maquete desse sistema solar, com sua composição
espacial, suas especificidades, o que faz todos os seus alunos abstraírem e
compreenderem o conceito de forma mais rápida e concreta. Por vezes, esquecemos
da importância do concreto e do visual.
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língua sem status, sem reconhecimento, o que está totalmente errado. Ela vem, aos
poucos, se constituindo enquanto forma de comunicação do surdo e vem
conquistando seu espaço na sociedade.
Existem diferentes leis que dão conta, no papel, da garantia de direitos, porém,
na prática, isso nem sempre acontece, o que precisa mudar. Quando um programa
de televisão que deveria ter intérprete não tem, está descumprindo uma lei de
acessibilidade existente. No momento em que as escolas não contam com
profissionais qualificados e com formação específica para atender os alunos surdos,
está deixando de seguir os documentos legais (FALKOSKI, 2019). Esses são apenas
dois exemplos, mas poderiam ser dados tantos outros, devido a tantas falhas que
encontramos no sistema e que muitas vezes poderiam ser evitadas se as pessoas
exercessem a função de se colocar no lugar do outro.
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6 NOÇÕES DE LÉXICO, DE MORFOLOGIA E DE SINTAXE COM APOIO DE
RECURSOS AUDIOVISUAIS
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a fonética das línguas orais estuda os sons da fala;
a fonologia estuda os sons e como eles se combinam entre si formando
elementos;
a morfologia identifica a estrutura interna das palavras;
a sintaxe busca reconhecer a estrutura da frase;
a semântica tem como objetivo entender o significado das palavras e da
frase;
a pragmática estuda a linguagem em uso e os princípios de comunicação.
De acordo com Quadros e Karnopp (2004, p. 47), a fonologia tem como objetivo
“[...] determinar quais são as unidades mínimas que formam os sinais [...]” e
“estabelecer quais são os padrões possíveis de combinação entre essas unidades e
as variações possíveis”. Ou seja, a fonologia se dedica a estudar a composição do
sinal. O sinal se compõe a partir de cinco parâmetros: configuração de mão (CM),
movimento (M), locação (L), orientação da mão (Or) e expressões não manuais
(ENM). Pensar em um sinal sem um desses componentes é praticamente impossível,
pois cada um exerce uma função primordial. Separados, eles não apresentam
significado, porém quando juntos formam o sinal. A seguir, você pode aprender mais
sobre esses parâmetros.
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Orientação da mão: é o modo como as mãos estão organizadas, ou seja, para
qual direção a palma fica posicionada — para cima, para baixo, para o corpo,
para a frente, para a direita ou para a esquerda.
Expressões não manuais: um dos itens mais importantes da Libras é a
expressão dos movimentos da face, dos olhos, da cabeça ou do tronco; é isso
que dá sentido ao sinal.
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6.3 Morfologia
6.4 Sintaxe
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6.5 Estrutura Gramatical: Aspectos Próprios da Libras
A Libras segue alguns dos princípios básicos de qualquer outra língua no que
diz respeito à sua estrutura gramatical. Porém, como conta com diferentes recursos,
como classificadores e expressões não manuais, algumas mudanças são possíveis e
aceitáveis.
É importante você levar em conta que existe uma ordem básica para a narrativa
ser estabelecida; os sinais tendem a ser feitos seguindo essa ordem. Costuma-se
sinalizar iniciando pelo sujeito (S), seguido pelo verbo (V) e pelo objeto (O). Porém,
mudanças são possíveis, dados todos os aspectos mencionados anteriormente. Na
língua portuguesa, algumas frases são consideradas agramaticais e não
pronunciáveis, mas na Libras, dependendo dos recursos utilizados, essas frases
podem ser aceitas e até melhor compreendidas. Considere os exemplos a seguir.
Ambas as frases são possíveis e permitidas, cada uma na sua língua. Caso a
primeira frase seja sinalizada da forma como está escrita, tem-se o caso do português
sinalizado. Porém, quando a segunda é sinalizada, respeita-se o uso geral da Libras.
Em alguns casos, é necessário repetir um sinal para que ele seja compreendido
e reforçado: “futebol João gostar futebol”. Nesse caso, a palavra “futebol” possui
um significado muito importante e a sua repetição oferece essa ideia ao interlocutor
que recebe a mensagem. Mas isso depende da situação comunicativa e da intenção
da frase; esta pode ser afirmativa, negativa ou interrogativa (FALKOSKI, 2019).
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Como ordem dominante, tem-se: SOV, SVO e VSO. De acordo com Quadros
e Karnopp (2004, p. 135), “A língua de sinais brasileira apresenta certa flexibilidade
na ordem das palavras [...]”, sendo, portanto, aceitáveis outras possibilidades de
formação. Porém, tais possibilidades precisam ser compreendidas por quem sinaliza
e por quem recebe a mensagem.
“Eu como alface algumas-vezes” (note que o advérbio é formado por duas
palavras, porém sinalizadas com um único sinal, por isso estão separadas por
um traço);
“Eu algumas-vezes como alface”;
“Algumas-vezes eu como alface”.
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6.8 Verbos
6.9 Tópicos
Nas sentenças com tópico, a ordem da frase pode variar. Considere, por
exemplo, a frase “Pesquisar ela não-gostar”. A palavra “pesquisar” aqui entra como
um tópico que logo em seguida será explicado pelo comentário “ela não-gostar”. Esse
tipo de construção costuma favorecer o entendimento de quem recebe a informação.
Primeiro se informa sobre o que será dito e em seguida vem a informação
propriamente dita em Libras.
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Alguns casos apresentam outra estrutura, por exemplo, o verbo “convidar”.
Sinaliza-se “Você convidar ele”, porém as marcações de “você” e “ele” não são feitas
pelo apontamento, mas por um movimento das mãos de um lado em direção ao outro.
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6.11 Recursos Audiovisuais No Ensino De Libras
A Libras tem um valor inestimável para os surdos e para aqueles que crescem
na comunidade surda. É uma língua que permite adentrar e participar de um grupo: o
grupo de surdos. A Libras se constitui como primeiro artefato da comunidade surda e,
além de ser uma forma de comunicação, ela expressa a identidade de quem se
considera uma pessoa com surdez. Pensar no aprendizado da Libras exige refletir
sobre como essa comunidade se constitui e principalmente sobre como usar a língua
de forma correta.
No ensino da Libras, o uso de recursos visuais é fundamental, tanto
considerando o caso de ouvintes que aprendem a língua quanto a situação dos
próprios surdos, que precisam aprendê-la de forma mais sistemática. Para os dois
grupos, é necessário buscar metodologias diferenciadas e que sejam muito visuais
(QUADROS, 2017).
No caso do ouvinte, o português é aprendido desde os seus primeiros contatos
com a língua, quando ouve palavras simples e inicia a sua reprodução. Pais e mães
ficam atentos às primeiras palavras pronunciadas; mesmo quando elas não parecem
ter um significado compreensível por qualquer pessoa, eles as compreendem.
Conseguem diferenciar quando um “papa” quer dizer “comida” e quando quer dizer
“papai”. É difícil explicar, mas quem está na situação e faz parte do contexto consegue
entender os significados que as palavras apresentam. Para o surdo, isso acontece da
mesma forma, porém visualmente e com o uso de gestos. Costumam-se chamar as
primeiras formas de comunicação da criança surda de “sinais caseiros”, pois eles
possuem significado, mas não são compreensíveis por qualquer pessoa. Pais, mães
e cuidadores vão estabelecendo formas para se comunicar, fazendo combinações e,
assim, possibilitando à criança compreender e ser compreendida.
A escola serve como um espaço para aperfeiçoar o aprendizado da língua, seja
oral ou sinalizada. Nela, é possível conhecer e identificar os recursos que a língua
oferece para estabelecer uma comunicação mais rica e que seja entendida por muitas
pessoas. Assim, aos poucos, ocorre o aprendizado de classes gramaticais, regras de
estrutura e funcionamento da língua. Os alunos aprendem o que pode ser dito e aquilo
que não pode ser compreendido.
Por volta do 1º ano do ensino fundamental, quando o aprendizado começa a
se formalizar, a criança ouvinte comete muitos erros de fala e escrita, pois utiliza
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palavras que nem sempre existem ou seriam possíveis. Recorrendo ao vocabulário
que possui e unindo os conhecimentos já adquiridos, ela vai fazendo novas
combinações, acreditando que as palavras que cria já existem ou são facilmente
compreensíveis. Uma criança pode dizer, por exemplo, “donaviaria” em vez de
“rodoviária”. Mas esse é um processo necessário e que acontece com todas as
crianças ouvintes, que precisaram passar por diferentes etapas de ensino até
compreender que existem regras que devem ser seguidas, que algumas vezes é
possível criar novas palavras, mas outras vezes, não.
Já as crianças surdas, em sua maioria, não têm contato com a Libras desde
que nascem, principalmente se forem de uma família de ouvintes. Pense na situação
de uma criança com 4 anos, idade na qual hoje é obrigatório estar numa escola, que
nunca teve contato com a sua língua. Ao chegar à escola, a sua primeira
aprendizagem precisa ser dos sinais; é necessário construir um vocabulário ao qual a
criança possa recorrer para organizar e criar frases. Quando estiver no 1º ano, ela terá
quatro anos de atraso em relação ao léxico que uma criança ouvinte possui, o que
trará consequências significativas para o seu desenvolvimento.
Veja o que afirma Fernandes (2007, documento on-line):
Dessa forma, quanto mais cedo a criança com surdez for colocada em contato
com a sua língua e receber estímulos visuais, mais fácil e rapidamente se
desenvolverá. O ideal seria a existência de espaços de educação infantil que dessem
conta desse contato inicial que a criança surda precisa ter, usando recursos e
materiais audiovisuais que facilitassem o seu desenvolvimento.
Falkoski e Witchs (2010) apresentam uma proposta de trabalho voltada a
crianças da educação infantil, mas que poderia ser utilizada em diferentes momentos
do desenvolvimento do sujeito surdo. Note que os aspectos mencionados não são
difíceis de serem colocados em prática em sala de aula:
43
Atendimento na sala de aquisição de língua, com jogos e brinquedos adaptados
para o ensino da Libras (como dominó de sinais), palavras em português, cores
e seus sinais, histórias em DVD, etc.;
Atendimento às professoras das turmas das crianças surdas, com ensino de
Libras e esclarecimento de dúvidas relacionadas aos alunos;
Ensino da Libras a todos os funcionários da escola, para que se comuniquem
com os alunos surdos;
Encontros com familiares das crianças surdas para estudo de Libras e também
para sanar dúvidas relacionadas ao desenvolvimento dos alunos (nesse
momento, os pais poderiam expor seus sentimentos e dificuldades);
Atividades com as turmas da escola, juntamente aos alunos surdos, para
exploração de novos sinais por meio de jogos e brincadeiras, a fim de ativar a
comunicação;
Intermediação da comunicação nas turmas regulares para o incentivo do uso
da Libras como língua principal pelos alunos surdos.
44
cena colegas, outros professores e funcionários. A partir desse trabalho inicial de
aquisição de língua, é possível aos poucos ir contemplando os aspectos gramaticais
e estruturais da Libras, pois a aquisição serve de base para os conhecimentos
subsequentes. Afinal, não é possível falar de algo se não se sabe como falar, ou seja,
não é possível sinalizar se não se conhecem os sinais.
45
7 CARACTERÍSTICAS FONOLÓGICAS
Fonte: http://fonologia.org
47
Não devemos utilizar apenas datilologia em uma conversa, pois ela não tem
essa função, assim como não devemos traduzir uma frase sinal por sinal, o que a faz
um português sinalizado, e não a Libras.
48
Na imagem acima, há o sinal de “idade” + expressão interrogativa que
contextualiza toda a frase: “Quantos anos você tem?”.
Após essa reflexão, tente idealizar sinais com as mãos e com o corpo que
poderiam expressar essas palavras. Tenho certeza de que não encontrou dificuldade
para sinalizá-las. De modo simplificado, essas palavras fáceis de sinalizar e que todos
entenderiam são os sinais icônicos.
Inverteremos, agora, esses exemplos. Observe os sinais a seguir:
49
Os sinais apresentados são sinais que qualquer pessoa faz no dia a dia,
independentemente de ser surdo ou de estar em sinalização em contexto da Libras.
As imagens representam: [NÃO], [CASA] e [BEBER].
50
Respectivamente: admirar, desculpe, quarta-feira.
Você, provavelmente, não conseguiu entender. Assim são os sinais
arbitrários da fonologia em Libras, isto é, não têm ligação nenhuma com o seu
significado.
Nem sempre uma palavra terá um sinal sistematizado dentro dos cinco
parâmetros em Libras, diante disso, este grupo de sinais pode variar devido ao
regionalismo. Por exemplo, em Minas Gerais, uma palavra pode ser feita por meio da
soletração, ao passo que, em Sergipe, há um sinal específico para ela.
51
Conforme citado anteriormente, é importante considerar o regionalismo, uma
vez que as línguas de sinais também oferecem oportunidades únicas para testar
ideias sobre a natureza da própria linguagem, ideias geralmente formuladas
exclusivamente a partir de observações na língua oral. De todos os itens da lista de
diferenças e semelhanças entre as línguas orais e sinalizadas, as áreas que
apresentam as divergências mais marcantes ocorrem na morfofonética e na fonologia.
A interface entre morfologia e fonologia é, de fato, diferente, dadas as liberdades e
restrições disponíveis para cada sistema.
Diante dos exemplos apresentados entre os vocabulários lexicais e fonológicos,
creio que as diferenças entre eles ficaram esclarecidas, porém é importante buscar
outras leituras para aprimorar seus conhecimentos.
52
7.6 Estruturas Sublexicais: Cinco Parâmetros em Libras
53
“Segunda-feira” tem CM em “V” ou em “2” (ordinal).
54
7.8 Pontos de Articulação
Cabeça
Para toda regra pode haver uma exceção, o que ocorre no ponto de articulação.
Nem todos os sinais idealizados na região da cabeça precisam encostar na face, mas
devemos observar que a mão predominante está na região da cabeça ou da face,
tendo como ponto de alicerce o queixo, o nariz, o olho, a boca, a bochecha, a orelha,
a maçã da face, a testa ou o topo da cabeça.
Observe os exemplos a seguir:
55
Observe que o sinal de “bonito” tem movimento à frente da face, mas não
exatamente precisa ser feito varrendo (encostando) o rosto; “mulher” e “telefone”
também tiveram como apoio a bochecha, e todas os sinais tiveram como ponto de
articulação “cabeça”.
Braço
Os sinais que têm como ponto de articulação “braço” terão seu apoio no braço,
no antebraço, no punho ou no cotovelo (PINTO, 2019).
Mão
Para este PA, os sinais serão feitos no dorso da mão, na palma da mão e nos
dedos da mão.
56
Em ambos os exemplos os sinais estão sendo feitos na palma da mão, assim,
o seu PA é “mão”.
Tronco
O ponto de articulação “tronco” tem como referência os sinais em que as mãos
serão posicionadas na barriga, na cintura, no peito, no pescoço ou no ombro (PINTO,
2019).
Ambos os sinais têm como PA “tronco”, visto que sua mão configurada está
incidindo no peito.
Espaço Neutro
Para o ponto de articulação “espaço neutro”, há somente duas localizações: a
frente do tronco ou acima da cabeça, ou seja, a mão não encostará em nenhum outro
membro do corpo.
Neste PA, a mão predominante do sinalizador estará, no mínimo, a dez
centímetros de distância do tronco ou acima da cabeça.
57
Para o sinal da palavra “demitir”, o movimento será concluído após soltar o
dedo médio para a frente; e o sinal de “vôlei” é feito simulando o lance de jogo acima
da cabeça.
Movimento
O terceiro parâmetro, “movimento” (MV), pode ser caracterizado por sinais
lexicais, pois são atos dinâmicos com uma trajetória, um começo e um fim. Sua
representação fonológica varia de acordo com a parte do corpo usada para articular o
movimento (são as setas nas imagens). O movimento utilizado entre um sinal e outro
é uma mudança natural e não prevalece no movimento do sinal.
As partes do corpo envolvidas no movimento são organizadas dentro de uma
característica própria de cada sinal, começando com as articulações proximais e
terminando com as articulações mais distais. Em alguns sinais, é possível que não
haja movimentos, o que faz o sinal ser sem movimento, bem como é possível ter dois
tipos simultâneos de movimentos articulados em conjunto, ou seja, o movimento das
duas mãos simultaneamente, e, ainda, há uma gama de movimentos possíveis para
realizar um sinal (PINTO, 2019).
Já sabemos que os movimentos são parte da fonologia, não apenas de pares
mínimos, que são bastante escassos, mas também porque a especificação de
movimento é ativa na gramática, morfológica e fonologicamente.
Observe os exemplos a seguir:
58
Orientação
A orientação é tradicionalmente considerada um parâmetro secundário, uma
vez que há menos pares mínimos baseados apenas na orientação (BRITO, 1995).
Alguns autores se baseiam na direção da palma da mão e das pontas dos dedos da
mão (p. ex., a palma da mão está voltada para a esquerda e as pontas dos dedos
estão voltadas para a frente). Pinto (2018, p. 106) cita, ainda, que:
[...] quando um sinal tem sua direção e há uma inversão, significa a oposição,
contrário ou concordância. Esta se refere à direção em que a palma da mão
fique virada para produzir um sinal. Podendo ser: palma da mão para cima,
palma para baixo, palma da mão direita, palma da mão esquerda, com a
palma para frente ou palma da mão para trás (palma virada para você).
Expressão Faciocorporal
O quinto e último parâmetro, as expressões faciocorporais (ECF), também é
conhecido como “expressões não-manuais”. Esse recurso é idealizado com a face
e/ou o corpo, podendo ser feito em conjunto com a utilização das mãos ou para
transcorrer um contexto. Esse item é extremamente importante, e, caso não seja
idealizado concomitantemente, os sinais tornam-se comprometidos e até sem sentido.
Diante de todos os parâmetros apresentados, forma-se o sinal em Libras.
Observe um sinal em que são aplicados os cinco parâmetros de Libras:
59
Agrupando os dados da tabela, conseguimos obter as informações necessárias
para que um sinal seja realizado de forma adequada. Todos os sinais têm esses
parâmetros, e uma pequena falha na execução de algum deles altera o seu
significado, inclusive trazendo consequências à morfologia da Libras.
60
ter conhecimento de uma língua sinalizada, e, em alguns casos, são ativamente
desencorajados a aprender a Libras. Uma criança surda filha de pais ouvintes
enfrenta, assim, uma séria interrupção na transmissão de geração para geração da
linguagem, pois há ausência de informações perceptivelmente acessíveis extraídas
de um sistema linguístico nativo.
Eventualmente, crianças surdas de pais ouvintes podem encontrar uma língua
sinalizada, possivelmente quando entrarem em uma escola que ofereça Libras ou
mesmo em uma escola inclusiva. Esse acesso pode ocorrer em idades variadas, o
que seria incorreto, afinal, quanto mais cedo a criança ter acesso à sua língua natural,
melhor será a sua aquisição linguística. De acordo com Pinto (2018, p. 215):
Sinalizadores Nativos
São expostos à Libras por seus pais desde o nascimento. Os cuidadores são
geralmente membros ativos da comunidade surda, o que oferece às crianças um rico
ambiente linguístico, a partir do qual elas podem aprender uma linguagem gesto-
62
visual, além da comunicação sinalizada por seus próprios pais. Esse é o melhor
caminho quando se descobre a surdez em uma criança.
Sinalizadores Iniciais
Calcula-se que entre 90 a 95% das crianças surdas são filhas de pais ouvintes
que nunca foram expostos à Libras. Muitas vezes, os pais dessas crianças passam a
aprender a Libras depois da descoberta da surdez do seu filho, e, como resultado, a
informação linguística fica deficiente e insuficiente para a crianças. A Libras começa
a ser introduzida em associações de surdos ou em cursos de Libras ou somente
quando a criança começa a frequentar uma escola especializada ou inclusiva. Por
isso, a fluência na língua de sinais se destaca entre 5 e 6 anos de idade.
Sinalizadores de Transição
Os surdos tardios em transição são frequentemente indivíduos que recorreram
à oralização, processo em que indivíduos surdos são ensinados a falar para entender
os membros da família que são ouvintes. Esses indivíduos não são expostos à Libras
antes dos 6 anos ou mais e, como consequência, têm sérios problemas no
aprendizado educacional.
Surdos Oralizadores
Constituem os casos mais extremos de aquisição tardia da Libras. Na verdade,
esses indivíduos surdos foram cercados por uma comunidade ouvinte e, portanto,
foram totalmente privados da língua de sinais, sendo ensinados a falar e ler os lábios.
Segundo Pinto (2018, p. 44), esse tipo de surdo “[...] pode ter uma surdez leve ou
moderada e leva uma vida de ouvinte, comunicam apenas pela leitura labial e fala,
dão muita importância ao aparelho auditivo, são contra Intérpretes e tem dificuldade
de encontrar sua identidade [...]”.
63
e objetiva a adquirir uma segunda língua em uma segunda modalidade (língua de
sinais). De fato, nessa modalidade, as pessoas são frequentemente referidas como
aprendentes do M2 (2ª modalidade), uma vez que o alvo da L2 é expresso como outra
língua oral e estrangeira, geralmente o inglês, para brasileiros.
Entender os mecanismos de aquisição da Libras como L2 é particularmente
relevante, pois tem consequências importantes na comunidade surda. Pais ouvintes
de crianças surdas, intérpretes de Libras e trabalhadores de apoio de comunicação
em língua de sinais precisam de boas habilidades na Libras para se tornarem bons
modelos linguísticos para crianças surdas e estreitarem a lacuna comunicativa entre
pessoas surdas e ouvintes. Entretanto, comparando a Libras como L1 ou aquisição
de L2 oralizada, o estudo da aquisição da Libras como L2 permanece amplamente
inexplorado. Os poucos estudos disponíveis investigam, principalmente, o
desenvolvimento fonológico, o papel da iconicidade na língua de sinais e o
desenvolvimento por meio da audição de adultos. “Para aprender libras, o ouvinte terá
que iniciar estudos fazendo um curso básico de libras e tentar conviver o máximo de
tempo com surdos para conhecer a cultura dessa comunidade, o que irá favorecer, e
muito, na aquisição [...]” (PINTO, 2018, p. 223).
Fonte: https://prezi.com
64
comunicativos sem analisar contrastes e regularidades sublexicais. Por meio da
pressão de um modelo de filtro e seleção fonológica, surge um sistema de contrastes,
e a substituição sistêmica leva à regularização. Ao sinalizar uma palavra, a criança
pode procurar regularidades visuais entre famílias de formas de mãos por meio da
fonologia emergente, porém, em ambas as modalidades, há um efeito marcante. As
limitações sensorimotoras das crianças levam a estratégias para reduzir a marcante
produção, e isso possivelmente influencia as conexões entre partes da gramática e o
crescimento das representações fonológicas e a analogia do “menos é mais”.
Muitos estudos psicolinguísticos fazem uma suposição de que há equivalência
suficiente entre as modalidades de sinal e fala para testar as teorias da estrutura e do
processamento da linguagem. Ao mesmo tempo, existem aspectos que são mais
divergentes. Embora haja um amplo leque de maneiras de se falar sobre espaço e
movimento, não há uma língua oralizada que articule palavras em um espaço real,
como as línguas de sinais o fazem com o recurso do “classificador”. Uma frase em
português, como, por exemplo, “a bola está rolando sobre o gramado”, codifica os
componentes semânticos de figura, fundo e localização de uma maneira arbitrária e
específica da linguagem.
Quando surdos falam sobre espaço, eles usam construções de
“classificadores”, por meio das quais as unidades morfológicas da construção podem
codificar a semântica espacial e a entidade simultaneamente no espaço real (PINTO,
2019). Uma comparação intrigante diz respeito ao domínio das crianças surdas sobre
o sistema classificador em comparação com as crianças ouvintes. A modalidade visual
pode parecer muito mais icônica do que as palavras e influenciar a taxa e a
padronização do desenvolvimento da linguagem.
O desenvolvimento de morfemas verbais em línguas faladas geralmente
começa com verbos familiares aprendidos dentro de casa e contextos repetitivos
antes de ser usado com itens novos. A aquisição de classificadores em crianças
surdas segue, assim, um padrão superior, e a produtividade é alcançada lentamente,
mesmo com os gestos e a iconicidade disponíveis. Ao esperar pela produtividade,
observa-se que o modelo de classificador é preenchido em parcelas. A produtividade
é sinalizada quando os componentes de significado começam a ser intercambiáveis
no modelo. Embora a Libras seja usada de maneiras muito diferentes em crianças
65
bimodais, esse caminho de desenvolvimento para uma estrutura combinatória é
familiar e previsível.
8 LITERATURA SURDA
66
no sistema sensorial. De fato, algumas pessoas com surdez têm ou necessitam de
uma reeducação oral, caso não tenham aprendido ou desenvolvido a comunicação
por meio da Libras e tenham vivido, quase que exclusivamente, em meio a pessoas
ouvintes. Ao contrário, um ouvinte com pais surdos pode ter aprendido a língua de
sinais como língua materna e ter vivido principalmente em um ambiente social de
cultura surda. É a partir desses fatos que podemos identificar e definir a literatura
surda.
A literatura da qual estamos falando deveria constituir um meio de acesso não
só à cultura surda, mas à cultura dos países e comunidades de modo geral. Para
crianças surdas, muitas vezes, é mais difícil adquirir referências culturais comuns; por
isso, elas devem ser movidas pelo desejo e pela curiosidade que a própria literatura
traz, como o de transmitir e receber informações e conhecimentos a fim de aprender
outras culturas, outras ideias, distinguindo uma literatura realista de uma fantasiada e
desfrutando do prazer que desenvolve a expressão de sentimentos e emoções.
As principais características dessa literatura são o enriquecimento de
vocabulário, a aquisição de conceitos e a decifração do acesso aos significados.
Ser surdo é pertencer a uma cultura na qual os sinais, sejam escritos ou
sinalizados, têm uma importância primordial na literatura voltada a ela. Quando a
literatura retrata a questão dos surdos e da surdez, muitas das vezes, é concebida
pelo viés patológico, e não no sentido socioantropológico que estabelece uma
temática da diferença e não da falta dela (SANTOS; LIMA, 2016, p. 3).
As pessoas com surdez não deveriam limitar-se às literaturas ouvintistas, o que
poderia torná-las socialmente incapacitadas ao acesso à cultura. A literatura surda no
Brasil ainda se encontra em criação e caminha a passos lentos, o que a torna uma
definição em construção. Apesar disso, é importante destacar que a literatura surda
não se dá apenas por meio do silêncio, mas por uma literatura não auditiva.
A literatura é uma parte importante e valiosa de qualquer cultura e, para os
surdos, não é diferente. Essa parte da cultura ajuda a explicar a identidade, as crenças
e os modos de vida das pessoas com surdez, sendo apreciada e compartilhada não
somente por essa comunidade.
Não é possível articular os conceitos da literatura surda sem ao menos passar
por suas exterioridades culturais e pela própria prática da linguagem não verbal, ou
seja, sem o conhecimento mínimo da língua de sinais.
67
Em relação ao conceito de literatura surda, vale apenas trazer a importância de
que esta literatura se constitui na perspectiva de quem vive na comunidade surda e é
usuário da língua de sinais como sua L1 (SANTOS; LIMA, 2016, p. 3).
Cada comunidade de surdos se caracteriza por uma difusa biografia em meio
a batalhas e conquistas. Por isso, também é importante o conhecimento histórico dos
surdos para realizar uma análise mais profunda sobre o assunto. A ancestral história
dos surdos até a contemporaneidade é fascinante e, ao mesmo tempo, desumana e
cruel, pois, unifica estudos sobre deficiências e a afirmação da diferença física,
caracterizando os surdos como pessoas impossibilitadas.
Essa história e essa cultura não podem ser confundidas simplesmente com o
que realmente é a literatura surda. Não se pretende, com isto, ignorar que esses fatos
fazem parte desta literatura, mas sim deixar claro que a história e a cultura
apresentadas em escrita de língua de sinais ou pela própria Libras não são o único
repertório da literatura surda — precisa-se muito mais do que isso. É necessário que
poemas, poesias, textos, ciência, dentre outros, também estejam presentes na
literatura de forma viável, em meios utilizados pelos surdos.
68
A literatura do silêncio é a literatura visual, é um corpo de materiais literários
que podem ser desde criativos até trabalhos técnicos ou científicos. Para Karnopp
(2008, p. 14-15), “a literatura surda está relacionada com a cultura, contada na língua
de sinais de determinada comunidade linguística, constituída pelas histórias
produzidas em língua de sinais pelas pessoas surdas, pelas histórias de vida que são
frequentemente relatadas”.
Com toda essa base, a literatura surda, por meio da língua de sinais, auxilia na
compreensão, no aprimoramento e na construção de vocabulário nos mais variados
contextos, que viabilizam uma ampliação de conhecimento da própria língua de sinais,
propondo embasamento para auxiliar nos encaixes dos diferentes contextos e
parâmetros e lembrando, sempre, das devidas expressões.
A partir dos elementos supracitados, as características próprias de cada
estrutura literária voltada às pessoas com surdez nos presenteiam com inúmeras
possibilidades de recriação, permitindo, assim, que aprofundemos a compreensão da
língua de sinais, investigando e expandindo o conhecimento por meio das literaturas
surdas.
Porém, os surdos, de certa forma, constituem um grupo acanhado de cultura
linguística e precisam adaptar-se, em sua maioria, à literatura ouvintista.
A literatura voltada aos surdos necessita de muito mais do que a simples
oralização ou das palavras descritas no papel; ela carece de movimentos em
classificadores, construção espacial, marcadores manuais e expressões faciais e
corporais para que a significância se torne ainda mais viva e verdadeira. Sem esses
elementos, não se produz uma literatura surda de qualidade e compreensível a esses
usuários.
Quando falamos em literatura surda ou por meio da língua de sinais, também
entramos no campo da tradução, já que não trata apenas de obras nacionais: elas
também podem ser traduzidas ou adaptadas, mas não necessariamente são literatura
surda. O clássico filme “Mr. Holland – Adorável Professor” de 1995) é um bom
exemplo, afinal, trata-se de um filme em que há um personagem surdo, mas isso não
significa que o filme tenha sido feito especificamente para essa comunidade.
Os surdos formam um grupo de fator particular, que necessita de uma
combinação entre língua de sinais e cultura própria para atribuir aquilo que é visto, e
não aquilo que é escrito. Sabe-se que não é impossível unir ambas as coisas, mas a
69
construção literal descrita pelos próprios surdos é particular e para um público restrito
nos interesses editoriais.
No Brasil, por exemplo, o conto “Cinderela Surda”, escrito por Lodenir Becker
Karnopp, Carolina Hessel e Fabiano Rosa, foi a primeira obra escrita em língua de
sinais (no sistema SignWriting) voltada exclusivamente ao público surdo e, nesse
fruto, estão inseridos elementos da identidade e cultura própria dessa comunidade.
É difícil conhecer um escritor surdo que escreva voltado exclusivamente ao
público de sua cultura. Alguns dos mais conhecidos no Brasil são, sem dúvida, além
dos já citados acima, os instrutores do Instituto Nacional de Educação de Surdos
(INES). Internacionalmente, a mais conhecida é Marlee Matlin, surda, atriz vencedora
do Oscar de 1987 e que publicou três livros. Certamente, esses escritores estão
classificados na categoria de “literatura surda”, um subgênero literário, já que o tema
de que tratam não é apenas surdez, mas algo maior (PINTO, 2019).
Independentemente do autor surdo, é comum que a maioria escreva
curiosidades e experiências do mundo do silêncio, não porque sua cognição descritiva
seja restrita, mas pela necessidade de expor sua cultura, de lutar em favor dos seus
direitos e de fazer com que suas mãos sejam ouvidas.
Todas as obras literárias oralizadas e utilizadas por uma comunidade de forma
verbalizada ou escrita são originadas e destinadas às pessoas ouvintes, o que exclui
o aproveitamento da literatura surda, afinal, essas obras não são propostas para a
comunidade que vive no silêncio.
Como nenhum método amplamente aceito foi desenvolvido para o registro da
língua de sinais por escrito, ele prossegue como uma linguagem puramente “visual-
espacial”. Após a chegada da tecnologia e do mundo cibernético, as línguas de sinais
puderam ser gravadas, preservadas e distribuídas, porém, em pequenas e amadoras
demandas.
Hoje, no mundo virtual, por meios dos sites de acesso a vídeos, é possível
encontrar inúmeros trabalhos que podemos classificar como literatura surda. Mas
quais trabalhos seriam esses?
É possível encontrar documentários, histórias, músicas, principalmente,
poemas e outras obras em línguas de sinais para todo tipo de gosto, idade e sexo.
Mas você por acaso já ouviu falar em algum filme de longa-metragem com tradução
em Libras? Muitos dizem: “mas os filmes têm o closed caption”! Sim, mas, embora o
70
tenham, isso não configura um filme como dirigido à comunidade surda
especificamente, já que a legenda não transpõe o mínimo realismo sonoro aos surdos.
A Universidade Gallaudet, nos Estados Unidos, desenvolve, todos os anos,
produções extraordinárias, belíssimas e destinadas exclusivamente à população que
tem a língua de sinais como sua L1 — nesse caso, sim, obras literárias surdas. No
Brasil, o INES, fundado e situado no Rio de janeiro, propõe ideias com essa mesma
conveniência.
71
Brasil, esse sistema ainda está em fase de desenvolvimento e há poucos profissionais
que estudam a sua aplicação na literatura.
A literatura surda, geralmente, apresenta usos criativos de sinais, expressões
faciais e corporais, classificadores, empréstimos semânticos, entre outros elementos
para facilitar o entendimento e propor uma comunicação eficaz. Um tipo mais comum
de literatura surda no Brasil são as historinhas infantis por meio de narrativas
desenvolvidas por diversas pessoas e instituições voltadas à educação. Esse tipo de
trabalho é caracterizado pelo uso de uma série de classificadores que asseguram a
realidade idealizada pelas mãos.
72
73
8.3 Diferenças Entre Literatura Surda e Literatura Tradicional
74
Diante do descrito, isso significa que qualquer sociedade tradicional é oral e
que qualquer sociedade moderna é escrita? Não, a oralidade e a escrita não são
sistematicamente opostas, as duas formas coexistem em todas as sociedades. A
oralidade não é uma literatura secundária, mas é importante distinguir a literatura
“verbalizada” da “oralizada”. Do mesmo jeito, a oralidade não é uma cultura padrão.
Não é por falta de escrita que existe a literatura oral, mas porque essa corresponde
às mais diversas necessidades e a preferências de busca por conhecimento.
Vamos entender melhor quais seriam as literaturas tradicionais? Para isso, é
importante que você entenda suas classificações. De acordo com Pinto (2019), as
literaturas tradicionais são classificadas por gênero, subgêneros, mídias, técnicas,
entre outros.
Em relação aos gêneros e subgêneros, encontramos, por exemplo:
75
Mario de Andrade (“Macunaíma”);
Mario Quintana (“Eu passarinho”);
Monteiro Lobato (“Sítio do Pica-pau Amarelo”).
Atualmente, ainda não contamos com variados livros próprios à literatura surda
no Brasil, mas podemos encontrar versões adaptadas ou transcritas por meio digital
(em vídeo) pelos mais variantes meios eletrônicos, como o YouTube e em blogs, nos
quais é possível buscar, como em qualquer literatura, materiais de ótima qualidade,
mas, infelizmente, também materiais que degradam a imagem cultural surda ou que
não oferecem o mínimo de culturalidade pessoal.
Apesar da escassez de obras escritas em língua de sinais disponíveis no Brasil
para as pessoas com cultura e necessidade de uma literatura surda, podemos
mencionar os seguintes autores e obras:
Carolina Hessel, Fabiano Rosa e Lodenir Karnopp: autores que se
dedicam exclusivamente à escrita ou à transcrição literal por meio da escrita da língua
de sinais e escreveram os primeiros livros de literatura infantil em SignWriting no
Brasil, “Rapunzel Surda” e “Cinderela Surda” (Figura 1).
76
Sérgio Ribeiro: autor de “Textos em Libras” (Figura 2), em que reúne
alguns textos de sua autoria na categoria didáticos, infantil, infanto-juvenil e juvenil
escritos em SignWriting.
78
se comunicam pela língua de sinais, que é a sua língua materna ou sua primeira língua
(L1), e que tem na língua portuguesa na modalidade escrita a sua segunda língua
(L2).
Para produzir uma educação de qualidade e para que os sujeitos tenham
aprendizagens significativas, é fundamental que tenhamos um ensino propositivo e
voltado para as especificidades dos sujeitos, independentemente da sua condição. No
caso dos sujeitos surdos, é fundamental que esses conhecimentos estejam muito
claros para essa equipe que irá elaborar o material didático.
A produção de material didático, de uma forma geral, tem evoluído bastante,
tendo em vista que a tecnologia veio e vem colaborando de uma forma bastante
presente na elaboração de materiais voltados para a área da Educação de uma forma
geral. O uso de material didático não é novidade: a Educação, desde os seus
primórdios, utiliza os mais diversos tipos de materiais didáticos, cujo objetivo é servir
de ferramenta para auxiliar o professor no dia a dia e proporcionar aos alunos um
ensino de qualidade.
Antes de pensar na elaboração do material didático para os surdos, é
necessário que se tenha muito claro que a língua de sinais é a língua oficial desses
sujeitos. Diferente da língua portuguesa, que é uma língua na modalidade oral, a
língua de sinais é uma língua na modalidade gestual/visual, ou seja, o canal de acesso
à língua se dá pelos movimentos gestuais e pelas expressões faciais, que são
percebidos pela visão. Essa questão muda toda a forma de se pensar e elaborar o
material didático, já que o surdo percebe o mundo pela visão.
Outra questão importante é a de que os surdos, pela concepção cultural, não
se consideram pessoas com deficiência, e, sim, sujeitos que pertencem à outra
cultura, no caso a cultura surda. Essa é uma questão que requer bastante cuidado e
conhecimento na proposta de materiais didáticos para esses alunos, porque a
concepção da surdez precisa ser respeitada e considerada (SZULCZEWSKI, 2019).
A partir dos anos 1990, com a Declaração de Jomtien (1990) e a Declaração
de Salamanca (1994), o Brasil assumiu um pacto internacional de “educação para
todos”. Nesse sentido, muitas políticas públicas foram pensadas para incluir todos na
escola regular. Contudo, além de incluir, torna-se necessário pensar propostas
pedagógicas que atendam tanto os alunos sem quanto os alunos com deficiência,
respeitando as especificidades de cada um.
79
Aos sujeitos surdos, está garantido o direito linguístico, da mesma forma que o
acesso aos conhecimentos ou conteúdos escolares, que têm que acontecer por meio
da língua de sinais. No entanto, no dia a dia das instituições escolares, não é bem
assim que acontece. A maioria das escolas regulares não conta com professores
bilíngues, ou seja, os conteúdos são apresentados pelo professor na língua
portuguesa e o intérprete de língua de sinais tem a função de interpretar esses
conhecimentos para os alunos surdos. O que muitas vezes acontece é que esse
intérprete não tem a formação necessária nesse conteúdo específico, e isso impacta
de forma negativa no momento da tradução desses conteúdos. Somente o intérprete
de língua de sinais não garante a aprendizagem desses sujeitos, tendo em vista que
o ensino dos alunos surdos precisa levar em conta tanto as questões linguísticas
quanto as culturais e sociais do aluno surdo. Essa questão envolve de forma direta a
produção do material didático para os alunos surdos, de modo que podemos
questionar: será que os materiais didáticos estão sendo pensados e elaborados para
atender esses alunos?
Apesar de muitos avanços, tanto em relação à concepção da surdez quanto em
relação às políticas públicas, a produção de materiais didáticos bilíngues ainda é
escassa. Segundo Moraes, Scolari e Paula (2013 apud GALASSO et al., 2018, p. 2),
“[...] parte significativa da bibliografia de disciplinas técnicas é desenvolvida somente
em língua portuguesa, e os alunos surdos contam somente com a exposição da aula
interpretada, sem a possibilidade de revisar o conteúdo e estudar a partir de materiais
didáticos produzidos em Libras”
Outra questão importante apontada por Galasso et al. (2018) é em relação à
infraestrutura das instituições, já que tanto as escolas quanto as universidades não
têm infraestrutura física adequada para receber esses alunos ou métodos de ensino
que contemplem a especificidade da Libras e da cultura surda.
Em relação à produção do material didático, os tradutores-intérpretes de língua
de sinais têm uma função essencial nesse processo, já que a tradução “[...]
caracteriza-se como atividade constante e necessária para produção de qualquer
objeto de aprendizagem bilíngue” (GALASSO et al., 2018, p. 4).
Como você pode perceber, a produção e a tradução de material didático para
o ensino de surdos requer um trabalho sério e comprometido com as especificidades
tanto linguísticas quanto culturais e sociais dos sujeitos surdos. Ou seja, não há como
80
pensar em um ensino de qualidade para eles se todas essas características não forem
pensadas e respeitadas no momento da elaboração desse material.
82
dificuldades com a língua portuguesa na modalidade escrita. Mesmo que a legislação
entenda que a língua portuguesa na modalidade escrita seja a L2 dos sujeitos surdos,
essa questão precisa ser muito discutida e pesquisada — nesse sentido, uma opção
que vem ganhando força é a escrita de sinais.
Outra questão interessante em relação à produção e tradução de materiais
didáticos voltados para a acessibilidade dos surdos é uma experiência realizada no
Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES) e desenvolvida pelo Núcleo de
Educação Online (NEO). Para os idealizadores do projeto, o primeiro passo para a
produção de materiais didáticos bilíngues é a estruturação de uma equipe
multidisciplinar que seja capaz de desenvolver ações pedagógicas (professores),
linguísticas (tradutores-intérpretes) e técnicas (filmagem, design gráfico e edição).
83
Essas três etapas são importantes para a produção de materiais didáticos para
a inclusão de alunos surdos no ensino superior. A etapa de pré-produção é dividida
em cinco etapas, quais sejam:
84
Muitas experiências estão sendo realizadas na produção de material didático
para o ensino dos sujeitos surdos, e o material didático digital desponta como uma
excelente alternativa nesse sentido. Por meio dos vários recursos digitais disponíveis,
é possível fazer um trabalho de tradução que contemple as especificidades do sujeito
surdo. É importante que você lembre, também, que o material didático precisa ser
pensado para as especificidades dos surdos e para o nível de ensino para o qual se
pretende produzir o material.
A avaliação dos materiais didáticos bilíngues para o ensino dos sujeitos surdos
é uma etapa fundamental no processo de produção desses materiais. Embora os
materiais didáticos bilíngues para surdos ainda sejam escassos, algumas
experiências importantes já estão sendo realizadas. No entanto, de um modo geral,
muitas instituições ainda estão trabalhando com textos escritos na língua portuguesa,
o que não é o ideal, tendo em vista que a língua natural dos sujeitos surdos é a língua
de sinais. Esse material precisa ser traduzido para a língua de sinais para que os
alunos surdos tenham acesso ao material na sua língua natural.
Essa escassez de material não ocorre somente na área da Educação, outras
áreas de conhecimento têm esse problema também. Cunha et al. (2018) produziram
e avaliaram vídeos em Libras que foram utilizados com o objetivo de tornar acessível
aos surdos informações importantes sobre questões de prevenção de algumas
doenças, como a dengue e a tuberculose.
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A utilização de vídeos na produção de materiais didáticos acessíveis bilíngues
tem se tornado uma realidade no ensino de surdos, porque a tecnologia visual
contribui para o diálogo da cultura surda e fortalece as questões identitárias,
respeitando a forma de ser surdo.
Contudo, é importante lembrar que esses materiais precisam ser produzidos a
partir de conteúdos técnicos e linguagem adequada ao público-alvo a ser atingido. No
que se refere aos materiais didáticos para surdos, o grande desafio é a questão
linguística, já que os textos escritos estão na língua portuguesa, ou seja, uma língua
oral e serão traduzidos para a língua de sinais, uma língua gestual/visual.
Os vídeos foram avaliados por alunos surdos do ensino médio e também por
intérpretes de língua de sinais. Os critérios adotados para avaliação foram pensados
a partir das características linguísticas dos surdos e também das questões técnicas
envolvendo a produção dos vídeos, como:
a estrutura dos aspectos sintáticos de Libras, que obedecem à ordem
de: sujeito – verbo – objeto (SVO);
a não utilização de conjunções, preposições e artigos;
os verbos utilizados no infinito;
os termos específicos da disciplina (ou do material) que não têm sinal
em Libras;
o uso da datilologia (soletração);
o uso dos classificadores;
a velocidade da tradução;
o layout dos vídeos;
adequação das legendas;
uso de imagens.
86
Teixeira e Baalbaki (2014), ao buscarem avaliar textos escritos na língua
portuguesa para serem traduzidos para a língua de sinais, sinalizam que não existem
critérios predefinidos tanto para análise quanto para avaliação de materiais em língua
portuguesa (L2) para os surdos. Nesse sentido, as autoras encontraram na proposta
de Tomlinson e Masuhara (2005) três tipos de avaliação que serviram de subsídio
teórico para os seus estudos, quais sejam:
avaliação de pré-utilização;
avaliação durante a utilização;
avaliação de pós-utilização.
87
referência à língua de sinais;
análise contrastiva das duas línguas;
inserção de elementos visuais.
10 A PEDAGOGIA BILÍNGUE
88
10.1 Princípios da Pedagogia Bilíngue
Partindo dos princípios destacados, você pode perceber que há uma lógica,
cuja construção ocorre em etapas para a concretização de um processo pedagógico
que envolve compreensão da ação educativa, destacando a diferença cultural e
fixando o reconhecimento do ensino da língua de sinais no contexto social.
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Para uma melhor compreensão da inserção dos princípios da pedagogia
bilíngue em processos didático-pedagógicos, é necessário fazer uma alusão reflexiva
ao processo de enaltecimento da cultura surda por meio da pedagogia bilíngue
embasada em seus princípios elementares para o multiculuralismo, em que o avanço
só é possível se todas essas etapas forem bem articuladas com o ato educativo na
sociedade e com suas respectivas dinâmicas de pensamento teórico para viabilizar
uma prática coerente com a promoção da educação bilíngue.
Alguns autores entendem que a pedagogia bilíngue ou educação bilíngue,
como alguns a chamam, concretiza-se, primeiramente, no espaço educacional, a fim
de que a cultura surda efetivamente seja reconhecida e, logo, valorizada pela
sociedade — considerando a escola como pressuposto imediato à inclusão no que se
refere às diferenças culturais existentes na sociedade (SOUZA, 2018).
A língua de sinais inserida nos conteúdos didáticos do ambiente escolar
fundamenta a prática da educação bilíngue, na qual está o princípio da inclusão. Ou
seja, com o ensino de Libras partindo da escola por meio atividades extraclasse, por
exemplo, o aluno do ensino regular poderá adquirir interesse pelo assunto numa
abordagem de interação a partir de estratégias de ensino.
No princípio do processo identitário, a partir da inclusão, é produzido um
pensamento a respeito da cultura surda em que assuntos relacionados a essa
comunidade podem ser motivo de discussões entre os alunos. Nisso, o processo
identitário da pessoa surda e de sua cultura pode ser mais explorado, despertando
interesse nos aprendizes de uma segunda língua.
Ainda no princípio do processo identitário, inserem-se temas como
características de comportamento frente à interação dos surdos com os ouvintes ou
entre outros surdos, além de outros assuntos que fazem parte do conjunto das
características pertinentes que definem a realidade dos surdos.
A língua brasileira de sinais é uma expressão do pensamento o surdo brasileiro.
Durante muito tempo, os surdos foram considerados incapazes pelo fato de, entre
outras inúmeras razões, a língua oral ter supremacia nas relações entre as pessoas.
No entanto, esse pensamento presente na sociedade brasileira foi desprezado graças
às diferenças culturais existentes no meio social, dentre as quais temos a cultura surda
com sua especificidade, que têm se apropriado dos atos educativos do ensino bilíngue
90
em escolas de ensino regular, cursos livres, pastorais e outros segmentos religiosos
cuja ideia inicial é fortalecer a comunicação entre surdos e ouvintes.
Quanto ao princípio das relações de poder, pode-se dizer que a pedagogia
bilíngue tem um viés de socialização, de interação e de integração da pessoa surda.
Nesse cenário, temos a comunicação como fator primordial das relações que
envolvem os surdos, pois a efetivação do ensino de duas línguas numa proposta de
bilinguismo Libras/língua portuguesa e vice-versa leva a um enriquecimento nas
relações sociais, em que fronteiras não terão mais espaço devido à comunicação
entre surdos e ouvintes.
As relações de poder se traduzem como, por exemplo, dependência de acesso
a serviços públicos, informações básicas, ou seja, na dimensão da vida social,
limitando-a ou até mesmo cerceando-a; com o ensino bilíngue, atinge-se o objetivo da
quebra das barreiras da comunicação entre surdos/ ouvintes, trazendo um
empoderamento à pessoa surda.
Cabe destacar, ainda, que a pedagogia bilíngue, além de ter a base teórica
pautada em seus próprios princípios, na prática, ocorre por meio de um processo de
aquisição e desenvolvimento da linguagem de acordo com as metodologias aplicadas
na alfabetização tanto para crianças quanto para jovens e adultos. Assim, seu objeto
principal consiste na interação com a língua por meio de habilidades, como a
visuoespacial, a motora e a construtiva (SOUZA, 2018).
O ensino bilíngue, assim, tem uma estrutura inicial em que o ponto de partida
é o input linguístico de representações visuais ativadas com estímulos de imagens
dos sinais e seus significados; passa por ativação da habilidade visuoespacial e da
habilidade linguística; e chega à competência bilíngue (comunicação total ou
comunicação semiótica em níveis básico, intermediário e avançado) (Figura 1).
91
A definição de indivíduo bilíngue como aquele que se comunica em outra
língua, ainda que com pouca profundidade, mas estabelecendo uma comunicação,
deve-se enfatizar que é simples e que tem apenas o intuito de destacar o mínimo de
comunicação, já que, é preciso lembrar, a escrita dos surdos não tem a mesma
estrutura da língua portuguesa — por exemplo, uma transcrição da Libras para língua
escrita poderia criar a seguinte frase: “Eu ir hoje casa pai”. Nesse caso, há pouca
apropriação da estrutura em si da língua portuguesa, mas há um processo de
comunicação sendo realizado. O mesmo pode acontecer na relação do ouvinte com
o surdo, em que esse tenta gestualmente realizar comunicação a partir de sinais
conhecidos e apontamentos básicos agregados na mensagem a fim de garantir a
comunicação.
Obviamente, quando não se tem domínio da língua (fluência), o tempo da
comunicação aumenta, pois não há objetividade nos termos utilizados, mas o mesmo
ocorre com outras línguas no ato comunicativo.
92
Nesse contexto, também é importante destacar que a cultura surda faz parte
da pluralidade brasileira, em que diferentes costumes, modos de ser, modos de se
comunicar ou ainda de tradições e outras manifestações não nos separam, ao
contrário, nos unem pela ideia da pluralidade num só lugar. Essa cultura está
politicamente estabelecida, visto que a Libras passou a ser reconhecida por
intermédio da Lei nº. 10.436, de 24 de abril de 2002, como língua de manifestação e
expressão dos surdos, conforme artigos preliminares, a saber:
A cultura surda e a proposta de educação bilíngue são duas questões que não
se desassociam, não se separam, sempre caminham juntas, já que a prerrogativa do
bilinguismo é a valorização da língua de sinais, da cultura, da comunidade e da
identidade surdas.
Karin Strobel (2009), em seu livro As imagens do outro sobre a Cultura Surda,
aponta-nos oito artefatos que constituem o que ela define como cultura surda:
93
experiência visual; linguístico; familiar; literatura surda; vida social e esportiva; artes
visuais; política e materiais.
A experiência visual significa a utilização da visão para perceber o mundo ao
seu redor. O surdo usa dessa experiência para ser, estar e se relacionar com o mundo
à sua volta. O artefato linguístico traz um “aspecto fundamental” para a formação
identitária do sujeito surdo. Segundo Strobel (2009), uma das principais marcas do
povo surdo é a língua de sinais, por meio da qual os surdos vivem sua cultura,
percebem o mundo em que vivem, captam as experiências visuais, transmitem o
conhecimento que adquirem e se relacionam.
Esses dois artefatos destacados, experiência visual e linguístico, são os pilares
de uma proposta bilíngue. Quando utilizamos uma metodologia visual e ministramos
as aulas em língua de sinais, estamos usando e valorizando esses dois artefatos
culturais surdos.
Para dar suporte à construção da(s) identidade(s) surda, além do contato
precoce com a língua de sinais, outro fator importante é a identificação com um surdo
adulto. Na proposta educacional bilíngue, o professor surdo ocupa um lugar de
representação, ou seja, modelo linguístico, cultural, social, político e identitário para
as crianças que frequentam a escola básica. Como apresentado anteriormente, cerca
de 95% das crianças surdas são filhas de pais ouvintes, de modo que esse contato
com surdos adultos é fundamental para o reconhecimento de suas características e
para a construção de sua identidade.
As crianças surdas constroem sua subjetividade a partir do contato com o outro,
das relações que estabelecem com esse modelo de identificação em “espaços de
interidentificação”. A escola bilíngue é um espaço propício para essa
interidentificação, uma vez que facilita o encontro entre pares, descobertas, a
subjetivação e as construções identitárias e culturais (MIRANDA; PERLIN, 2011).
Perlin (2010) acrescenta que a identidade surda é construída dentro de uma cultura
visual, corroborando com o que foi exposto.
Em um espaço bilíngue, todas as representações surdas acontecem porque o
espaço educacional foi pensado por e para surdos. É importante destacar que não
defendemos uma separação entre surdos e ouvintes, pelo contrário, acreditamos que
o trabalho em conjunto contribui para uma melhor harmonização das questões
relacionadas ao ensinar e ao aprender. Quando há surdos na equipe de gestão de
94
uma escola bilíngue, é possível que sutilezas do “olhar surdo” possam ser melhor
exploradas no cotidiano escolar.
Por longos anos, as práticas, os métodos, as avaliações e os currículos não
representavam aquilo que de fato os surdos buscam: a valorização de sua cultura,
língua e identidade(s). O currículo foi, e ainda é, instrumento de colonização quando
reproduz discursos hegemônicos e práticas ouvintistas. Com a abordagem bilíngue, é
possível que estejamos frente a um “currículo surdo”, um currículo organizado para
combater essas práticas de dominação e que valorize a cultura do olhar e as
experiências visuais. Assim, é necessário que as práticas bilíngues se aproximem de
um olhar antropológico e cultural da surdez.
Skliar (2010) apresenta três razões para o fracasso escolar dos surdos. Em
primeiro lugar, atribui esse fracasso ao surdo, em decorrência de sua deficiência; em
segundo lugar, há uma culpabilização dos professores ouvintes e, por fim, o fracasso
está relacionado aos métodos de ensino. A discussão sobre esse fracasso é
recorrente nas rodas de conversas entre professores e pesquisadores da área. Skliar
(2010) atribui uma justificativa para isso, apresentando-a como um fracasso da
instituição-escola, das políticas públicas e da responsabilidade do Estado — isso
pensado a partir de uma perspectiva inclusiva, de desvalorização de todas as
questões que perpassam o sujeito surdo.
Quando trabalhamos numa concepção antropológica, cultural, social, política e
bilíngue da surdez, a deficiência dá lugar à diferença e a culpa não será mais dos
professores ouvintes e de nenhum outro professor, pois as aulas serão ministradas
em língua de sinais e não haverá métodos limitados, uma vez que as orientações, o
planejamento e a organização escolar serão pensados por/com e para surdos.
95
A interação ou o contato com os conteúdos via mediação do professor,
inicialmente, trará à tona o contexto cultural do surdo, observando as suas
peculiaridades, das mais simples às mais complexas, ainda que, de uma forma geral,
será importante vislumbrar as informações e provocar as curiosidades de seus alunos.
Nesse primeiro momento, torna-se fundamental conhecer a cultura da segunda língua
a ser aprendida e entendê-la como uma diferença cultural presente na sociedade, tal
como outras existentes, mas que fazem parte da realidade brasileira. Nesse sentido,
Botelho (2002, p. 26) afirma que, “no ensino e na aprendizagem na visão da
concepção interacionista de aprendizagem, o cerne é a interação via construção do
conhecimento; a partir disso, o ensino bilíngue recorre a algumas metodologias da
alfabetização na aquisição da linguagem”.
Também é importante destacar que, na mediação da aprendizagem, as
tecnologias possuem um importante papel para as necessidades de comunicação que
transformam a realidade do aluno surdo quando oferecem possibilidades como
mandar um e-mail e receber uma pronta resposta, ter acesso à informação em tempo
real e, ainda, acessar rapidamente com uma mensagem todo o grupo de amigos de
uma mesma cidade, de outras cidades e de participar de grupos virtuais, além de
acesso às compras on-line e outras possibilidades da internet. Assim, para os surdos,
as modificações trazidas pelas novas tecnologias vão muito além da educação, têm
um viés social cuja inserção comunicativa, em muitas das atividades de vida diária
antes inacessíveis, encurta-se pelo uso das novas tecnologias.
Desvelar uma diferença cultural na mediação da aprendizagem implica tornar
o assunto interessante para os alunos a partir de diálogos curiosos a respeito da
cultura surda, de modo que os alunos se sintam instigados a realizar suas próprias
buscas sobre o assunto. Antes de tudo, falar de diferença cultural requer discutir a
constituição da identidade surda e seus desdobramentos.
A identidade surda por si só já gera questões sobre a trajetória histórica dos
surdos e o histórico da educação dessa comunidade no país, além de chamar a
atenção para comportamento, assuntos relacionados à psicologia social e aos
contextos vivenciados pela comunidade surda, assim como para as mudanças
relevantes para os surdos nos últimos anos, como as principais questões políticas e
as conquistas alcançadas.
96
Enfim, são diálogos pertinentes a uma cultura dentro de outras culturas, num
mesmo país. A proposta da mediação no primeiro momento pedagógico via interação
é de conscientizar os alunos para a importância da aprendizagem dessa cultura, assim
como de outras culturas, e, ao mesmo tempo, sensibilizar para o reconhecimento das
partes como um todo, ou seja, elementos de um mesmo conjunto, ainda que com
fortes e marcantes diferenças — nessa perspectiva, somos iguais.
A mediação do professor na aprendizagem como recurso para tornar eficiente
a conscientização da segunda língua em face das diferenças culturais insere-se nesse
contexto. Isso ocorre por meio da participação em escolas de surdos, encontros
sociais com surdos e outros eventos que possam gerar a empiria, que se soma aos
conteúdos didáticos da segunda língua, propondo uma prática da linguagem, ainda
que elementar em sua estrutura, visto que essa ação pedagógica estimula o
aprendizado e o torna mais atraente para quem aprende (SOUZA, 2018). Por fim, na
mediação, o professor é um promotor da interação e da empiria no que se refere à
educação bilíngue.
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Assim, dada a importância da Libras como fator de educação social para o
pensamento inclusivo, implementá-la é uma ação que requer rupturas no campo do
estigma e do preconceito. Dessa forma, a pedagogia bilíngue segue desbravando tais
rupturas e enaltecendo a cultura surda na perspectiva do ato educativo/interacionista
pelo respeito às diferenças e pela apropriação de direitos e deveres a partir da
comunicação total ou da comunicação semiótica do ensino da segunda língua, a fim
de compartilhar indivíduos entre si como seres ativos (BOTELHO, 2002).
É importante ter claro que a comunidade surda quer ser levada a sério, deseja
um tratamento respeitoso e uma inclusão, isto é, que seus indivíduos sejam
reconhecidos como figuras capazes na sociedade.
99
11 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
100
BRITO, L. F. Por uma gramática da língua de sinais. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,
1995. PINTO, D. N. Libras: Língua Brasileira de Sinais. Aracaju: UNIT, 2018.
BRITO, L. F. Uma abordagem fonológica dos sinais da LSCB. Espaço, Rio de Janeiro,
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101
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LOPES, M. C. et al. (org.). Cultura surda & libras. São Leopoldo: Unisinos, 2012. p.
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HOLDEN, S.; ROGERS, M. O ensino da língua inglesa. São Paulo: Special Book
Services Livraria, 2001.
102
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2017.
RIBEIRO, S. S. Textos em Libras. 2016. Disponível em: . Acesso Em: 12 jan. 2019.
103
THOMA, A. S. Representações sobre os surdos, comunidades, cultura e movimento
surdo. In: LOPES, M. C. et al. (org.). Cultura surda & libras. São Leopoldo: Unisinos,
2012. p. 79–86.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
104
_______________. Por uma pedagogia crítica da visualidade: A Inclusão do Surdo
em Debate. In: CARLOS, E. J. Por uma pedagogia crítica da visualidade. João
Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2010.
105