Os modelos clássicos de controle de constitucionalidade: modelo norte-americano,
modelo austríaco e modelo francês.
Conforme exposto por Moraes, considerando os sistemas jurídicos adotados pelos
diversos ordenamentos para garantia da supremacia da Constituição, podemos identificar três grandes modelos de justiça constitucional: modelo norte-americano, modelo austríaco e modelo francês. O art. 3º da Constituição dos Estados Unidos da América prevê que o Poder Judiciário será composto pela Suprema Corte e os tribunais inferiores serão estabelecidos pelo Congresso, garantindo-lhe independência. Marcado pela supremacia constitucional e pelo judicial review, o sistema constitucional americano permite ao judiciário, em especial à Suprema Corte, interpretar a constituição federal a fim de, no caso concreto, adequar a ela as demais leis. Podemos dividir as competências da Suprema Corte em competências originárias e recursais. A competência originária, em suma, pode ser obrigatória, casos que envolvam disputas entre Estados-membros, ou facultativa, casos que envolvam Estado-membros e o Governo Federal e casos de corpo diplomático estrangeiro, tendo a corte prorrogativa de julgar ou não determinado caso. Já a competência recursal também pode ser tanto obrigatória quanto facultativa, aproximando a corte do modelo de controle de constitucionalidade e proteção dos direitos fundamentais europeu. No modelo norte-americano não há competência de controle concretado de constitucionalidade, tendo apenas o controle difuso de constitucionalidade, que é exercido em face a leis e atos normativos federais, estaduais e municipais, sendo sua competência firmada com base no importante caso Marbury vs Madison. Em relação aos efeitos das decisões da Suprema Corte, tem-se os efeitos duplos sobre as partes do processo e em relação aos demais processos análogos devido ao stare decisis. Ao declarar a inconstitucionalidade de um ato legislativo, será o ato nulo para todos os fins legais, como se nunca tivesse existindo, não podendo criar direitos e obrigações. Os efeitos das decisões da suprema corte no caso concreto, em casos recursais as hipóteses são de negar provimento, a decisão do tribunal inferior torna-se definitiva e todas as partes deveram cumpri-la, e ao dar provimento ao recurso, a decisão atacada poderá ser, parcialmente ou totalmente, reformada – corte passa a ser definitiva - ou anulada – o feito retorna à origem para nova decisão. Enquanto, que os efeitos gerais das decisões da suprema corte - Precedentes – as decisões de Mérito da Suprema Corte são precedentes obrigatórios a todos os tribunais inferiores e autoridades administrativas, mas não a própria corte suprema, o que gera certa insegurança jurídica. É vinculante apenas a ratio decidendi. No entanto, a Constituição Austríaca que foi promulgada em 01 de outubro de 1920, opõe-se ao judicial review norte-americano que se distribui por todos os juízes e tribunais, estabelecendo um controle concentrado, no qual o Tribunal Constitucional possuía a exclusividade para o exercício do controle jurisdicional de constitucional das leis e atos normativos. O Tribunal Constitucional austríaco possui como principal competência a realização do controle de constitucionalidade, seja no campo abstrato ou concreto. De acordo com Feliz Ermacora, o Tribunal também possui competências administrativas e políticas, assim, entre essas, têm-se: (i) a resolução de litígio com o Estado acerca de incidentes patrimoniais, (ii) as interpretações de normas de direito constitucional federal, as quais possuem força obrigatória, (iii) as atuações como Tribunal Eleitoral, (iv) sancionar a responsabilidade jurídica dos demais órgãos supremos do Estado, (v) resguardo dos direitos e das liberdades fundamentais, inclusive, do direito internacional. O Tribunal Constitucional Austríaco possui como competência exclusiva em analisar a inconstitucionalidade de leis, atos normativos e tratados internacionais incorporados à Constituição, de maneira que os demais tribunais não possuam jurisdição para declarar que determinada norma vai de encontro ao texto constitucional. Ainda, possui outras competências, tais como: (i) acolher acusações por infrações mediante culpa contra órgãos estatais; (ii) julgar recursos contra acordos de autoridade administrativas; (iii) acolher acusações por infrações ao Direito Internacional; (iv) impugnar eleições; (v) julgar a possibilidade de perda de mandato da assembleia representativa geral e (vi) julgar a possibilidade de ilegalidade em regulamentos estatais. Assim, quando decretada a inconstitucionalidade ou extrapolação da competência, a decisão entra em vigor na data da publicação ou no prazo determinado pelo Tribunal Constitucional, de maneira que o representante do Executivo, deve publicar a derrogação por completo da lei conforme a sentença. Ainda, tem-se que os efeitos da decisão da Corte Constitucional Austríaca são erga omnes, ex nunc, repristinatórios e vinculantes. Por fim, o sistema francês foi aprimorado na Constituição da 5ª República, de 1958, que criou o Conselho Constitucional, dotado de jurisdição constitucional e de poder de controle de constitucionalidade. Foi concebido inicialmente como órgão de controle do Parlamento, o Conselho Constitucional evoluindo para uma Câmara de jurisdição sobre direitos e liberdades fundamentais. A Jurisdição Constitucional Francesa foi ampliada em 2008, no qual viabilizou o controle repressivo de constitucionalidade, nos moldes teorizados por Hans Kelsen. A determinação de que qualquer dispositivo declarado inconstitucional pelo Conselho Constitucional, por provocação do Conselho de Estado ou da Corte de Cassação será expurgado do ordenamento jurídico, com efeito erga omnes, não retroativos, repristinatórios e vinculantes. O controle de constitucionalidade francês ainda pode ser realizado de maneira preventiva, por um órgão especial, distinto dos três Poderes clássicos, denominado Conselho Constitucional. Antes da promulgação, as leis são enviadas a esse conselho que declara ou não a sua constitucionalidade, e essa decisão vincula as autoridades administrativas e judiciárias. As sessões do Conselho ocorrem no Palais Royal, deverá ter no mínimo sete membros para a sua instalação, exceto em casos de força maior constatado em ata, e em regra suas decisões devem ser tomadas por maioria simples, tendo o Presidente do Conselho o seu voto de qualidade. Suas decisões são formais, sempre iniciando pela fórmula “attendu” (considerando), diferente da maioria dos Tribunais Constitucionais. Decidindo em uma única instância, suas decisões são inapeláveis, seus efeitos serão erga omnes, vinculantes, obrigando a todos os poderes públicos e todas as autoridades administrativas e judiciais, inclusive ao Conselho de Estado e a Corte de Cassação. Destaca-se, contudo, que os efeitos vinculantes são aplicados em relação ao dispositivo da decisão e não em relação a sua motivação, o que poderá gerar o descumprimento total da decisão, como no caso de o Conselho Constitucional julgar improcedente determinada demanda, permitindo a promulgação de uma determinada Lei desde que seja dada a ela uma determinada interpretação, conforme a Constituição. Contudo, como não existe a possibilidade deste Conselho ser chamado a aplicar a lei nos casos concretos, nada garante que o juiz civil, penal ou administrativo dê a interpretação fixada pelo Conselho, pode aplicar a lei da forma de melhor lhe aprouver, visto que a lei foi considerada constitucional. Na hipótese de controle abstrato de constitucionalidade, os efeitos da decisão serão a expurgação da lei tida como inconstitucional do ordenamento jurídico, tendo efeito erga omnes, não retroativos, repristinatórios e vinculantes para todas as autoridades judiciais e administrativas.
O Controle de Constitucionalidade Brasileiro
A ideia de controle de constitucionalidade está tanto ligada à Supremacia da
Constitucional, como também se refere a rigidez constitucional e proteção dos direitos fundamentais, assim como além de estabelecer limites ao poder do Estado, são também uma parte de legitimação do próprio Estado, determinando seus deveres e tornando possível o processo democrático em um Estado de Direito (Moraes, 2020). O controle de constitucionalidade Brasileiro pode ser classificado como um sistema completo e complexo, haja vista ter incorporado os métodos de diversos países, como os Estados Unidos, França e Austríaco, expostos acima. A sua complexidade reside não na ideia de controle de constitucionalidade, mas nos mecanismos que se criam para efetivá-la. Em última instância, o controle de constitucionalidade consiste na análise da conformidade com os requisitos de constitucionalidade materiais e formais – subjetivos e objetivos. Por sua vez, o objetivo do controle de constitucionalidade é garantir a supremacia da constituição e garantir a efetividade dos direitos fundamentais, funcionando como tribunal contra majoritário em defesa das minorias. O controle de constitucionalidade é uma opção política, tomada pelo poder constituinte e a este caberá decidir quem dará a última palavra em matéria constitucional. No Brasil, essa escolha política feita pelo legislador constituinte privilegiou o STF, havendo um claro desejo de fortalecer o Poder Judiciário em detrimento do Poder Executivo. Isso porque, embora o controle de constitucionalidade existisse desde 1969, o Poder Judiciário não conseguia exercê-lo em virtude de uma série de obstáculos, os quais o legislador constituinte resolveu remover na Constituição de 1988. Por isso, apenas após 1988 tem-se a ampliação do modelo de jurisdição constitucional. Como citado acima, o controle de constitucionalidade engloba a análise de dois tipos de requisitos, os formais e os materiais. Inicialmente, verifica-se a conformidade com os requisitos formais, que dizem respeito ao processo legislativo. Primeiro, examinam-se os requisitos formais subjetivos, atinentes à primeira fase do processo legislativo, à fase da iniciativa, ou seja, a quem tinha o poder de deflagra o processo legislativo. Depois, verifica-se se os requisitos formais objetivos forma atendidos, isto é, se o ato normativo foi regularmente elaborado. Sendo o ato normativo formalmente constitucional, é preciso analisar os requisitos de constitucionalidade material, que tratam da compatibilidade do objeto do ato normativo com o objeto da constituição. Em relação as espécies do controle de constitucionalidade brasileiro, podemos visualizar a partir do organograma disposto na doutrina de Moraes. Vejamos:
A partir do momento em que é realizado, o controle de constitucionalidade pode
ser preventivo ou repressivo, distinguindo pela entrada do ato no mundo jurídico. Assim, no primeiro caso, evita-se a entrada, no ordenamento jurídico, de um ato normativo maculado de inconstitucionalidade, exercendo-se uma função preventiva. Já o segundo, trata da retirada, do ordenamento jurídico, de um ato normativo que viola a constituição. O controle de constitucionalidade preventivo é um controle realizado durante o processo legislativo de formação do ato normativo. Quando do início de um projeto de lei a ser apresentado, a quem der o início do processo legislativo, deve verificar a regularidade material do referido projeto de lei. Poderá ser exercido pelos poderes legislativo, executivo e judiciário. O controle preventivo exercido pelo Poder Legislativo é realizado pelas CCJ que verificará se os projetos de leis apresentados, podendo tornar-se uma lei, verificando a existência de algum vício a ensejar a inconstitucionalidade. Assim, o projeto de lei poderá ser rejeitado pelas Casas Legislativas e ser declarada sua inconstitucionalidade por algum vício ocorrido, sendo arquivado definitivamente após trâmite de eventuais recursos em razão do parecer ser negativo ou ocorrer a possibilidade da correção do vício. Já o controle preventivo pelo Poder Executivo é realizado pelo Chefe do Poder Executivo, pelo Presidente da República, quando aprovado o projeto de lei pelas Casas Legislativas, poderá sancioná-lo caso concorde ou vetá-lo, sendo que o veto ocorrerá quando o Chefe do Executivo considerar que o projeto de lei for inconstitucional ou contrário ao interesse público. Por fim, o controle preventivo exercido pelo Poder Judiciário seguirá o entendimento majoritário do STF, ou seja, é realizado pelo judiciário visando garantir ao parlamento o devido processo legislativo, vedando a sua participação em procedimento desconforme com as regras da Constituição. Quando introduzido um ato normativo inconstitucional, é preciso retirá-lo do ordenamento por meio do controle repressivo. No Brasil, este tradicionalmente foi exercido pelo Poder Legislativo. Esse cenário foi modificado pela Constituição de 1988, ao atribuir o controle repressivo ao Poder Judiciário. Tem dois tipos de sistemas ou métodos de controle judiciário de Constitucionalidade repressiva, sendo o reservado ou centrado (via de ação) e o difuso ou aberto (via de exceção ou defesa). Excepcionalmente, o controle de constitucionalidade poderá ser realizado pelo próprio Poder Legislativo, que poderá retirar normas editadas, com plena vigência e eficácia, do ordenamento jurídico, que deixará de produzir seus efeitos, por apresentarem um vício de inconstitucionalmente.