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MANUEL VALENTE HAPESSOAS TENEBROSAS QUE ESCREVERAM OBRAS MARAVILHOSAS> esa 37 originais, queaguardamsentenganasecre- tériae fotografias, Duashoras deconver- sa, entre cigarrose temas quelhe io cares: oFisco,oatrevimento,apaciéncia,apoesia, o futebol, as viagens, as mulheres, «desde sempreomaisimportante>. ‘Manuel Alberto Valente, «adolescente adiado», nasceu em Coimbrées, Vila Nova de Gaia, em 1945, Vive em Lisboa desde os 20 anos, no mundo da edigio, hé mais de ‘tres décadas, ‘@Quepapeltem um editor hoje? ‘Omesmo de sempre: servir de filtro entre ‘oqueseescreveeo que merece ser publica- do,Sabemos, éclaro, quenosiiltimosanosa situagao mudou bastante, Um teérieo des- tascoisasdisseatéqueseestavaacaminhar ‘paraumaedigio sem editores, Ehi, de fac- ‘o,hole,achamada autoedico-emsupor- ‘edigital, cadaum pode publiear o quequi- set. O queprovoca,claro,oaparecimentode Yixo, muito Lixo, Falta A autoedicio o olhar ‘eriticodoeditor. Queétambémquem, mui- ‘as vezes, ajuda oautoracinzelaro proprio. ‘©Nos siltimos anos, 0 centro da edigo deslocou-se, portanto, do autor para 0 eitor. Oeditorperdeumuitopoder? Agrande mudanga dos tiltimos anos tem ‘que ver com isso. Hé 80 anos, os editores, procuravam autores. Com a criagio dos ‘grandes gruposeditoriaisedachamadain- iistriaeditorial,aedigiocomecouaprocu- raro que oleitor quer le. E porque 0 queo damoleitor. Hoje ofatorsurpresajinio uma prioridade. Pelocontrrio? ‘Nos.anos 1980, quando iniciei, na D. Qui- xote, aminha earreira, propusemos ao lei- tor portugués autores completamente ameasnisnae j desconhecidos, que sio hoje nomes incon- ‘toméveis. Passadas umas semanas, pou- cas, sobre apublicagio de A Insustentével Levera do Ser (Milan Kundera], a expres- so entrow nos hi- bitos quotidianas dos portugueses. Todas ‘usavam, do Parlamentoaosjomais. E,de repente, havia a eonviego de que estéva- rosa dar qualquer enisa de novo ao pais. E ‘eraumorgulho. Isso mudouradiealmente. Hoje, oeditor,sobretudoodosgrandesgru- ‘pos, estd muito condicionado peo share. (@Entristece-o? Eutenho boa boca, como se costuma dizer, masreconhego que nliodéomesmoprazer. Descobrir novas wozese novasmaneiras de dizerasmesmas coisas dimuitoprazcr, ‘© De que carateristicas essenciais€ feito umbomeditor? Em sentido cléssico, tem de ser um grande Jeitor, Tem de ter uma cultura geraleleva- dda, quelbepermitaintegrareoompreender ‘oquele. Tem, também, deestar muito ber informado,eparaissotemosjornais,asfei- ras asrevistasliterdrias.Etem desercapaz die nso aplcar apenas o gosto pessoal, s2- ‘endo reconhecer qualidedes obrasdeque porventura gostemenos. 2Umoriginalapadrinhado? ‘A minha longa experiéneia diz-me que é ‘muito raro aparecer um original anénimo com qualidade. Os que tém alguma quali dadechegam,emregra,apadrinhados. Por ‘umoutroeseritor,porumjornalista,poral- sguém do meio. Os textos anénimos, sal ‘arissimas excogSes, io muitocarentes de qualidade echegam de pessoas eonvenci- das de que um romance se resume a con- tarumahistériaemmeiadiziadepalavras. ‘®Confronta-se com muito desplante? Algum. Hi pouco tempo, reeebi um orig- nal de alguém que afiangava que o seu li- ro tinha todas as eondigées para ser um sito eque irfamos todos ganhar muitodi- heir. Quandoseleu orginal, verificos- se que era um texto quase infantojuvenil, \Sem qualidade decentenas eli- vrosdeaventuras, ‘@Encontrarazdesparaessafultadecons- ciénciaautocritica? E muito curioso, conhego autores, ou pre- tendentesaautores,quedizemcoisasdogé- nero: «Sabe, en quero escrever, nfo tenho ‘tempo para ler» Eeu espanto-me aocons- tatarquehi muita genteconvencidade que possivel escrever sem ler. O primeirocon~ selho quese deve dar de haver um génio, um caso ou outro, masemregraéumaimpossibilidade. ‘Nota um deeréscimo de qualidade dos originais? Recebem-se hoje mais originais, mas os textos siopiores. Percebe-se queosautores Teram pouco ¢, sobretudo, que viram mui- ta televisio. Alguns manuseritas so uma «0S LIVROS _ IMPORTANTES ESTAO TODOS PUBLICADOS. NAO HA GRANDES OBRAS NA GAVETA. HISTORIAS DE ESCRITORES FANTASTICOS QUE NAO ENCONTRAM EDITOR SAO S6 ISSO, HISTORIAS, MITOS, LENDAS.» espécie de guides. Nao slo romances. As pessoas tm prazer evontadedeppartilharo {que fazer com os seus amigos e isso expl- a0éxito de pseudoeditoras que publicam aquilo que autor, entre aspas hes entre £82, até porque é0 préprio quem paga 2 edi- Ho. Depois, hécasosemqueomarketingé automaético. Bastaserolivrodealguém que esteiapresentena casa das pessoas. ose dos ‘eram os grandes prescritoresdelivros. Os professores continuam a ter um papel importante nas eamadas mais jovens. Os livreiros, infelizmente, esto a desapare- cer. O liveiro-prescritor, aquele que sabia dapoda, pertence quaseao passado, A critica e a divulgacio na imprensa ainda pesam? amuito pouco. Tempos houve em que os leitoresiamalivrariapedirolivrorecomen- dado por um jornal ou por um criteo, Por ‘vezes, evavam até orecortedo jornal. Hoje ndoéassim. Acritica tem umaimportan ‘muito relativa, funciona em cireuito mu fechado. E mais importante uma entrevis- tadivulgamaisemelhor um autor. @Cresceaimportiinciadasredessociais, E cada vez mais. Por isso, as editoras tém epartamentos dedicados is redes soci ‘£um trabalho muito importante, sobretu- Qual deve ser a relagio de um editor comoseu autor? ‘Tem de serbos, nf tem desr intima. Ha casos em queum autorsetransforma nom ggandeamigo,casosem queno. Terntam- ‘Bém de seruma relagdo desta confian-

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