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Livro Anual de Psicanalise XXI — 2008 International Journal of Psycho-Analysis (UPA — 2005) ivro Anual de Psicandilise (2008), XX1, 137-153 AVALIACAO PSICODINAMICA DE MUDANCAS EM CRIANCAS COM AUTISMO SOB TRATAMENTO PSICANALITICO Genevieve Haac,' Syivie Torpsman, ANprée Duprat,? Simone URWAND, FRANCOISE JARDIN, Marté-Curistine CLEMENT, ANNICK CUKIERMAN, CATHERINE DRuon, ANIK MAUFRAS DU CHATELLIER, JACQUELINE TRICAUD, ANNE-Marie DUMONT, Paris, Franca Abordagem psicanalitica do autismo A partir da perspectiva psicanalitica, as avaliagdes de criangas com autismo tém per- manecido descritivas e tm se concentrado na coeréncia psicodinamica dos sintomas agru- pados em sindromes, e no retraimento da vida pulsional ¢ dos relacionamentos emocionais Esses séo vivenciados como esmagadores e desorganizadores devido a fragilidade da pri- meira construg&o do ego: desde muito cedo existe um circulo maligno bloqueando os pro- cessos relacionais de identificagao para a formagio do ego corporal. Somente essa formacao permitiria lidar com as ansiedades primitivas relativas a0 corpo ¢ permitiria 0 reconheci- mento de emogdes e a presenga de outros. Que se saiba, jamais essas idéias chegaram a ser formalizadas como escalas de avaliacao. _ Desde 1987, um grupo francés de psiquiatras e terapeutas psicanaliticos de criangas tomou parte em dois projetos de pesquisas sobre autismo do INSERM.’ Os membros do grupo, com base em 25 anos de experiéncia de trabalho terapéutico com criangas autistas, também aprofundaram sua compreensao de expressdes corporais, emocionais e cognitivas muito iniciais, com o uso do método Esther Bick de observagdo de bebés no ambiente fa- niliar, que assim os capacitou a prestar meticulosa atengdo as maneiras pelas quais as ctiangas autistas usam seu corpo. Com base em seqiiéncias surgidas repetidamente, con- Seguimos identificar varios padres evolutivos. As criangas autistas observadas ini © tratamento em diferentes momentos do espectro autista ¢, durante a psicoterapia, s Tam mudangas que parecem formar um padrao psicopatolégico coerente. A partir dessa experiéncia terapéutica parecia necessério € importante propor um instrumento de aval 3 Autora correspondente Falecida, 3. Insttet Nacional de Saude e Pesquisa Médica (INSERM RRC N’ 48 70 10 € RRC N’ 49 20 06, coor ‘enado por Pierre Ferrari a Oe a 138 GENEVIEVE HAAG SYLVIE TORDJMAN, ANDREE DUPRAT ETAL, so, em forma de tabela de classificagdo,* tendo como base a perspectiva psicodinimeg ue possa ser usado pelos grupos que prestam atendimento, A tabela de classificagi, gut indica os estigios progressivos no autismo infantil, também nos permitiu seguir o progress, clinico das criangas autistas dentro de um contexto de estudo de pesquisa clinico-bioligi. co longitudinal do INSERM." Esta pesquisa usa os itens da tabela de classificagio basen. dos na observagdo clinica direta da crianga, por dois psiquiatras independentes de criangas Em paralelo, realizou-se um diagnéstico do distirbio autista, de acordo com critétios gy DSM-III-R © do DSM-IV, CID-10 ¢ CFTMEA (Mises € Quemada, 1993-2002), que foi con. firmado pela Entrevista para Diagnéstico do Autismo — Revisada (ADI-R) ¢ pela escala dg Programa de Observagao de Diagnéstico de Autismo (ADOS) (Lord et al., 1994). Em v4. Tios casos tratados ao longo de um periodo de 10 a 15 anos, e onde a escala ADOS nig se encontrava disponivel, a descrigdo inicial da estrutura clinica foi submetida ao critérig de referéncia: DSM-III-R ou DSM-IV, CID-10 ¢ CFTMEA. Além do mais, 0 diagnéstico de distarbio autista foi confirmado pela escala ADI-R, que tem validagao para dar um diagnés, tico retrospectivo de autismo, de acordo com critérios do CID-10 e do DSM-IV, com base ha entrevista com os pais a respeito dos primeiros quatro a cinco anos de vida. Antes de apresentar esta tabela de classifica, faremos um resumo do trabalho psi- canalitico principal, assim como de outros trabalhos sobre autismo, e discutiremos as pos- siveis ligagdes entre essas diferentes abordagens. Perspectivas psicanaliticas sobre o autismo Num movimento de vai-e-vem entre a observagao de bebés no ambiente familiar e 0 trabalho clinico com bebés gravemente perturbados, E. Bick (1968) descreve como se in- trojeta a fungao inicial de continéncia, que ela chamou de “pele”. Quando ha uma falha na introjegdo dessa fungdo, s6 ¢ possivel uma identidade superficial, que ela chamou de ‘iden- tidade adesiva’; as criangas com autismo parecem estar massivamente fixadas em um ponto em que esta identidade adesiva é patolégica. Quanto aos mecanismos de defesa dominantes no autismo, Meltzer (1975) descreve como mecanismo central em funcionamento no autismo sensu stricto: 0 desmantelamento do aparelho perceptivo em suas partes componentes de sensualidade e de percepgao set- sorial por meio da suspenstio da fungdo ativa de atengao, que é realmente o fio que man- tém os sentidos coesos na consensualidade do desenvolvimento normal, Meltzer relaciona este desmantelamento aos mecanismos obsessivos em geral — na verdade, sua expressio patolégica mais primitiva ~ pois remove todo o significado da experiéncia e no pode set simbolicamente representado. O resultado desse tipo de desmantelamento nao esta dispo- nivel para comunicagao interna nem para memorizagio. A segunda maior descoberta teérica de Meltzer refere-se as diferentes caracteristicas espaciais do aparelho mental e as suas dimensdes temporais correspondentes. Aqui ele lev em considerago a importante descoberta de Bick (1986) sobre a formagdo da pele ¢ 42 identidade adesiva bidimensional, que se relaciona ao tempo circular (a ‘volta ao igual” t= pico de certos rituais autistas) e descreve como preambulo a isso, uma espécie de suspens0 unidimensional em que o tempo esti encerrado em si préprio (tempo fechado**). 0 te= No original, grid. (N. da T.) 4. Equipe de Pesquisa Clinica do INSERM: ERCA 93 19, diretora do projeto: Sylvie Tordiman. ** No original, closure-time. (N. da T.) a AVALIAGAO PSICODINAMICA DE MUDANCAS EM CRIANGAS COM AUTISMO 139 qo oscilatsrio corresponde ao desenvolvimento da formagao da pele estabelecendo um mun- tp interno tridimensional e a execugdo da identificagao projetiva. Finalmente, adquire-se a fogao de que 0 tempo € linear € ndo reversivel gragas ao desempenho adequado da intro- jeqio ¢ a capacidade de individualizagao. ‘A terceira maior contribuigdo de Meltzer (1980) relaciona-se ao objeto e ao conflito esiéticos: a emocionalidade priméria, pré-natal, é essencialmente estética em sua natureza (mmisica e danga). De acordo com Meltzer (1980), as criangas autistas tém sensibilidade especial as emogoes estéticas, 0 que muito rapidamente pode arrasé-las; ficar assim sub- mersas provoca a retragio de todo o contato com o objeto. Ele ressalta a importancia do contato visual e da dupla interpenctragao fundamental da boca/mamilo e olho no olho du- rante a amamentagao. A contribuigao de Frances Tustin (1981, 1986) também se mostrou extremamente importante. Tustin mostrou que, para John, seu caso de estudo usado como exemplo, 0 essencial é evitar completamente qualquer percepedo da condi¢do de separagao corporal. 0 aparecimento desse tipo de percepgao faz surgir uma sensagao de que parte do corpo foi perdida, especialmente a boca, ‘foi embora’ com 0 ‘botiio’ do seio. Tustin cita Winnicott, que imaginara essa possibilidade como parte da experiéncia de ‘depressio psicética’. Outras caracteristicas da depress4o psicotica — que hoje em dia tendemos a chamar de ‘depressdo primaria’ — sdo sensagées fisicas de cair infinitamente ¢ de aniquilagao por liquefagao. Com base nesse ponto de vista, entende-se que os esteredtipos tem como objetivo manter certo sentimento de existéncia ao produzir na crianga um estado de excitagdo per- manente que Tustin, mais tarde, chamaria de auto-sensualidade mascarando sentimentos de separagao. Ela enfatizou 0 papel desempenhado pelos ‘objetos autisticos’: objetos duros segurados na mao, ou produtos corporais endurecidos mantidos dentro de um ou de ou- tto orificio do corpo. Ela prosseguiu desenvolvendo a idéia das ‘formas autisticas’, que transmitem os rudimentos da sensagao tatil, e as ‘formas’ de som, de cheiro, de gosto e de Visio, que parecem mais serem sentidos (num nivel tatil) do que escutados, cheirados, degustados ou vistos. Além disso, ela enfatizou a espécie de ‘cisio sensorial’ — duro/mole, seco/molhado, Pesado/leve — que criancas com autismo usam muito: ¢ como se elas se agarrassem alter- nadamente a extremidade de cada graduagao sensorial, sem serem capazes de passar por toda a gama de modalidades disponiveis. Tustin descreve os tacessos de birra’ a serem esperados sempre que se interromper um ritual autista ou movimento estereotipado. Esses acessos de birra também ocorrem quando a crianga melhora — em outras palavras, quando em um estado um pouco mais in- tegrado, a crianga tem maior consciéncia da separagdo corporal e, em conseqti ncia, frustra- S¢ mais facilmente. espegimente, Tustin comega a enfatizar a cisdo ey a corpo, i fee: oo do gcislmente por Haag (1985), aprofundando os aspectos do ego corpors como foi usa- chan ttbela de classificagao (ver adiante). Na Franga, a contribuigdo de D. Houzel (1985) sag s{04 €M particular a fungao das ‘ansiedades de precipitagao’ na psicopatologia. Bigpeeaades sio a base do comportamento estereotipado ou de rituais, tais como a Inglaterra, a pesquisa atual liderada pelo grupo da Tavistock (Alvarez ¢ Reid, 1999) entre a tm debate etiopatogénico muito estimulante, eve ando semelhangas e diferengas nig qa wdromes pés-traumaticas ¢ autismo. Agora enfatizamos @ importineia do horm Sobre’, stFesse aumentado no autismo (Tordjman, 1977). E provavel que exista muita Posicio entre predisposigdes genéticas ¢ sindromes pos-tra umaticas com caracteri a 140 GENEVIEVE HAAG SYLVIE TORDJMAN, ANDREE DUPRAT ETAL, Maneiras de combinar trabalho psicanalitico com trabalho nao Psicanalitieg A descrigio de Leo Kanner (1943) da sindrome do autismo infantil precoce mostroy. se s6lida e duradoura. Os clinicos ¢ pesquisadores chegaram a um consenso sobre a yal;, dade do autismo como categoria diagnéstica ¢ sobre as diversas caracteristicas essenciaig para a sua definigdo (Rutter, 1996). . Ha ampla concordancia de que 0 autismo € um distiirbio do desenvolvimento que te. presenta as manifestagdes comportamentais de uma disfun¢ao subjacente. A fim de defj. nit 0 diagnéstico, os pesquisadores tm usado varias abordagens, que cairam em duas categorias principais: um ponto de vista clinico ou um procedimento estatistico comple. xo. A abordagem mais comum se apéia nas experiéncias clinicas e na capacidade do pes quisador clinico em discernir caracteristicas que, entdo, so usadas para delinear um conceito diagnéstico especifico (por exemplo, a descrigdo de Kanner € 0 trabalho de Asperger). Algumas classificagées propdem um esquema baseado na observagao da natu. reza de padrdes de interagao social: distante ou passivo, ou ativo, porém estranho (Wing € Gould, 1979). Os psicanalistas britanicos (Alvarez e Reid, 1999) propdem subgrupos den- tro desta classificagao: por exemplo, no grupo ‘distante’: as criangas com carapagas e as extremamente sensiveis. Outras classificagdes tiveram como foco: perfis cognitivos (Fein et al., 1985), problemas de linguagem (Allen e Rapin, 1992) presenga de sinais evidentes de disfungao do sistema nervoso central (Tsai et al., 1985). Essas abordagens precisam lidar com o problema importante e desconcertante de nivel intelectual. Varios pesquisadores pro- puseram uma diferenciagdo entre autismo primério (mais elevado) e autismo com funcio- namento inferior, dados os padres muito diferentes de necessidade educacional, de associagao com problemas médicos, de resultados, de histérico familiar e dai por diante associados ao QI mais baixo ou mais alto. Abordagem do desenvolvimento Alguns estudos com foco na psicopatologia do desenvolvimento no autismo, usando a psicologia do desenvolvimento ou a abordagem cognitiva, combinam com as observagdes dos psicanalistas. Os estudos do desenvolvimento social focalizaram particularmente @ orientagao social (olhar intencional, atengaio compartilhada), imitagao e brincar, apego e ha- bilidades pragmiticas. Concernente a orientagao social: concordamos inteiramente com as descrigdes que ressaltam que criangas com autismo nao conseguem estabelecer padrao de encarar 0 ou- tro. A face humana provoca pouco interesse na crianga autista (Volkmar, 1987). Levando em consideragao as demonstragdes de criangas com autismo, acrescentariamos que esta evitagao se relaciona principalmente com ansiedades referentes ao contato olho no olho: sej medo “predatério” ou medo de cair atrés dos olhos do outro diante da indiferenga. Ah potese de Meltzer de ser esmagado pela emogao estética reforga 0 problema anterior: 0 temor de cair atras da cabega do objeto. Essa nogdo parece ligada nao somente com a possivel ‘auséncia’ fisica ou psiquica, como também A fragilidade da pele do sujeito projetada so- bre a cabega do objeto. O desvio do olhar e a auséncia de outras formas de intercambio ndo verbal, no inicio da vida em criangas autistas, especialmente as musicais por meio 42 balbucio, também interfere com 0 aparecimento da intersubjetividade: a co-construgao d° significado emocional partilhado entre a crianga e 0 provedor de cuidados (Trevarthen 1979) que é essencial para a formagao do simbolo do ponto de vista psicanalitico. Quando a crianga nao consegue atingir a intersubjetividade, com freqiiéncia ndo Con “4 desenvolver a série de comportamentos conhecidos como ‘atengao compartilhads - segui a! eee Be eee een eSE PE Se [AVALIAGAO PSICODINAMICA DE MUDANGAS EM CRIANGAS COM AUTISMO 141 ou seja, aquelas habilidades de comunicagdo social pré-verbal que permitem a uma erian- ™ Zompartilhar com outra pessoa a experiéncia de um tereeiro objeto ou acontecimento Ramer, 1983). AS vezes so conhecidos como “trocas triidieas”, Hi um debate interes- sante sobre & descrigao da ‘atengao compartilhada’, que parece ser um passo importante simfyocesso de identificagdo, e sua auséncia na crianga autista, Com base em experiéne psicanaliticas com criangas autistas, parece relacionar-se a certa forma primitiva de iden- vrjeagao projetiva Util. Algumas criangas ‘explicaram” que era uma questo de introjegao da funeao continente € mostraram de modo teatral a fantasia de estar no mesmo envelope & gpservando o mundo ld fora, Por exemplo, a paciente de Haag, Paula, mostrou que a cor- tina da janela poderia envolvé-la ¢ & sua terapeuta, combinando assim sensagdes tateis das costas das duas, € trocas de sons evocados pelo telefone real que ela movimentou pelas cortinas, como se estivesse tecendo. A seguir, pds a terapeuta cara a cara, fazendo uma mimica como se fosse pular para dentro dos olhos dela, antes de virar a terapeuta para a janela para que, juntas, pudessem olhar para fora e, finalmente, apontou o dedo a fim de fazer a terapeuta nomear © que estavam vendo (0 apontar protodeclarativo). Dessa maneira, Paula explicou como fazer uma pele conjunta resultando em ateng’o compartilhada. Ai em- purrou a terapeuta para a cortina dupla, ficando cada uma, entdo, em sua propria pele, mas sendo capazes, é claro, de olhar para a mesma diregao. ‘A capacidade de imitar também parece ser um pré-requisito para atividades simbéli- cas subseqiientes. Varios estudos documentaram déficits nesta area (ver Smith e Bryson, 1994, para uma revisdo). A auséncia do brincar simbédlico no autismo surge de dificulda- des sociais, ou pode fazer parte de um problema mais geral para a aquisigéio de pensamento ¢ de linguagem simbélica. As habilidades para o brincar simbélico se relacionam com a ha- bilidade de diferenciar coisas de ages, de separar processos de pensamento da realidade conereta (Piaget, 1951) em diregao a linguagem simbélica. Concernente ao apego: a auséncia relativa ou a estranheza dos comportamentos de apego nas criangas autistas indicam sua dificuldade de construir ligagdcs socioafetivas bisicas. Quando as criangas se apegam a objetos, esses apegos com freqiiéncia sao nhos, os objetos so incomuns (por exemplo, duros: ver Tustin, 1986). Assim como os comportamentos de apego, os comportamentos sociais das criangas autistas sio empobre- cidos ou atipicos. A crianga pode nao buscar conforto fisico junto aos pais, e pode mos- trar-se dificil de ser carregada (Volkmar, 1987). A hipotese de que individuos com autismo podem demonstrar comportamento social estratégico (motivacional), porém nao afiliado, que refletiria a necessidade relativa 4 proxim idade e ao contato humano (Waterhouse © Fein, 1997), pode se encaixar dentro do ponto de vista psicanalitico referente a intensa necessidade de a crianga controlar seus relacionamentos em certos estigios do estado de autismo. Concernente as habilidades pragmdticas: aproximadamente 50% das criangas autis- tas nunca desenvolvem linguagem expressiva. Nas que 0 conseguem, a fala é com fr cia caracterizada por ecolalia, tom e ritmo anormais, ¢ ha uma falta generalizada de linguagem comunicativa (Volkmar, 1987). Essas consideragdes so especialmente ilustra- das pelos estudos de intercambio musical inicial de Trevarthen (1979). Quando uma crian- $8 com autismo fala, uma das maiores areas de déficit é a da pragmitica, isto é, 0 uso da linguagem dentro de um contexto social. O uso problematico da pragmatica levou algumas Pessoas a encararem os déficits de linguagem no autismo como ‘auséncia de uma teoria da mente’ (Frith, 1989): uma inabilidade, ao falar, de levar em consideragao 0 que o ou- Title sabe © a ouvir os outros, deduzir suas intengdes ¢ emogdes (Tager-Flusberg, 1993). Tae ossivel entdo uma discussio relativa & proposta de Tager-Flusberg: do ponto de son Psieanalitco, a “teoria da mente" chama nossa atengao Como uma perturbaeao abran- 2s iden tentificagao. A maneira de se pereeber 0 espago é central para os problemas com ificagdes primarias, tanto a adesiva como a projetiva: em nossa terminologia, a ina- PP a 142 HAAG, SYLVIE TORDIMAN, ANDREE DUPRAT ET AL, bilidade de co: uir identificagdo projetiva util da crianga autista €0 que impede ide, ficagio com emogdes e pontos de visia de outra pessoa. Essa identificacdo nag pogo” adquirida a menos que tenha comegado a comunicagao dentro de um espaco tridimen, He nal, Outro tipo de abordagem cognitiva para esse assunto € 0 trabalho de Bullinger (ra sobre 0 fluxo sensorial, sobre os aspectos centrais e periféricos dos diferentes senip.) sobre a contribuigao da interagao sensorial para a construcao do espago e sobre g ieee muscular ¢ emocionalidade; 0 trabalho dele cruza perfeitamente com os Pontos de fg psicanaliticos de como se constrdi o ego inicial. : m conclusao, como se viu em algumas abordagens cognitivas, houve no Passado g tentativa de localizar o problema principal do autismo dentro dos préprios mecanismos oy.) nitivos, sem referéncia ao nascimento da psique como um todo. Entretanto, mesmo deste Ponto de vista, hoje se da mais atengao, de diversas maneiras, aos problemas de emocio.. nalidade e de identificagio. Isso oferece alguma esperanca de se estabelecer certa congrugn. cia entre as principais abordagens do assunto. Como foi sugerido por Alvarez e Reid (1996), © autismo é realmente um distarbio cognitive-emocional. Avaliagdo A avaliagao de individuos com autismo exige a contribuigao de diversas especialida- des, inclusive psiquiatria de criangas ¢ de adolescentes, psicologia, fala ¢ linguagem, pedia- tria, neurologia, reabilitagao fisica e educag4o. Os pais so incluidos no processo de avaliagaio de duas maneiras complementares: como informantes, por exemplo, para entre- vistas semi-estruturadas como ADI-R (Lord et al., 1994), ADOS (Lord et al., 1994), Pro- grama de Observacao Diagnéstica de Autismo Pré-Lingilistico (PL-ADOS) (Di Lavore et al., 1995), e como observadores que podem dar contexto aos comportamentos mostrados pela crianga durante a avaliagao. A avaliagao psicolégica se concentra em estabelecer o nivel geral de funcionamento intelectual ¢ adaptativo, assim como em descrever os pontos fortes e fracos da crianga. A avaliagao deveria descrever padrées tanto de funcionamento verbal como nao verbal nas seguintes areas: solugao de problemas, formagio de conceito, estilo de aprendizado, habi- lidades de memorizacao. Outras areas de interesse incluem funcionamento adaptativo, ha- bilidades motoras ¢ visual-motoras, 0 brincar e a cognigao social. O instrumento mais amplamente usado para avaliar 0 comportamento adaptativo é a ‘Escala de Comportamen- to Adaptativo Vineland” (VABS) (Sparrow et al., 1984) que avalia a capacidade de auto-su- ficiéncia em varias areas de ago, inclusive de comunicagao, habilidades para a vida diaria, socializagio ¢ habilidades motoras (para a revisdo do teste usado para a avaliagao de ¢0- municagao, ver Marans, 1997). Apresentagao da tabela de classificagao: um relato dos principais estégios por meio dos quais a crian¢a com autismo progride durante 0 tratamento psicanalitico No preparo da tabela de classificagdio, recorremos a revelagdes inesperadas feiss 90 longo de tratamentos que produziram melhoras. Ficara evidente que, sobre a a mos grande importincia tanto a génese da imagem corporal, dada em considerdve’ | Ihe, confirmando a intuigao de Freud de que ‘o primeiro ego ¢ um ego corporal’, qu estruturagao do espago, que esta, de fato, inseparavelmente ligado a ele. Este € um 40 P ee rrr eee aaa...” AVALIAGAO. PSICODINAMICA DE MUDANCAS EM CRIANGAS COM AUTISMO. 143 _ profunddos de conexdo entre os aspectos instintivo, emocional e de identificagio ts eal ride com a habilidade de aprender, chamada hoje em dia de ‘cognigaio" a pesonmytante reconhecer como os diferentes aspectos do desenvolvimento dessas F tamagem corporal, expressoes de emogto no relacionamento, exploracio do es sips objetos, Finguagem, desenhos etc.) se interligam conforme a crianga vai pro- Toso acontece de modo suave e com sincronia desde 0 inicio ~ ainda que seja pastante incomum — ou acontece através de uma série de cisdes transitérias, porém mais. Paros persistentes, que precisam ser analisades conforme ocorrem. Surge a descrigao ov a via dupla de desenvolvimento, com a retomada do desenvolvimento normal em uma se amig preservagd0, ou mesmo novo desenvolvimento, de caractersticas estritamente pa- viggicas na outra, Além do mais, o progresso ndo é estritamente linear, mas geralmente wiiieo ou, melhor ainda, em espiral: percebe-se freqllentemente que a etapa predominante de desenvolvimento coexiste com a reelaboragao de estégios anteriores. Mas nota-se que teea reelaboraedo usa niveis simbélicos cada vez mais elaborados: do corpo, depois de re~ presentagdes arquitetOnicas, depois de representagdes com objetos geométricas (cubos., cis, varetas), e finalmente 0 uso de figuras humanas ¢ animais. Por exemplo, ansieda- des corporais a respeito de cair mostram-se primeiro por meio da queda conereta: algumas criangas desabam como trapos quando saem da sesso. Uma delas, paciente de Haag, de- pois de prolongadas férias de vero, brincou na pia, criando uma tempestade na dgua ¢ ati- rando os brinquedos para fora, depois desabou como estivesse liquefeita e falou com voz trémula e preocupada: “Nao vamos escorrer pela descarga abaixo, vamos?”. Mais tarde, as ctiangas podem mostrar esse tema novamente deixando os objetos cairem e, is vezes, es- palhando-os pelo chao rian 160 gredindd- O estado de ‘autismo grave’ Este é provavelmente um extremo conceitual, que pode realmente jamais ocorrer em criangas, seja em estado extremo ou continuamente, Seria compativel com a sobrevivén- cia? Na verdade, a experiéncia clinica demonstrou que mesmo criangas pequenas, ness¢ estado, parecem ter desenvolvido algumas percepgdes tio-somente para desprez: cancelé-las — por exemplo, a percepgio da terceira dimensdo do espago, ou a realidade ex- tema dos objetos, e a independéncia dos corpos. Elas se mostram capazes de certa com- Preenso da fala, se apenas for possivel desvendar 0 que as esta esmagando ~ em especial basic! experiéncias corporais e 0 medo do contato visual, olho no olho. Se os seus a ae especialmente as costas ~ forem apoiados durante esse estigio, essas crian- aceitar algum contato (Soulhairol, 1988; Haag, 1997). Entretanto, estaremos li- dang . a ba com este estado sempre que se observarem os seguintes fendmenos, em proporgdes sivas: 2 eo quase permanente usando comportamento sensorial estereotipado auto- sacdea a ustin, 1981): sacudir ritmicamente um objeto que faz som; provocar sen- tones {ei auditivas ou visuais; movimentos de balancar ou rodopiar a cabega, 0 Titmadas ae corpo todo em busca de sensagées de vertigem; esfregar ou dar pancadas ) Mem © Vt tpos na superficie da pele ete. = me et (uster que nada mude) (Kanner, 1943) esté incl tanto entre esses sine sparc taais mais complexos que se observam quando 0 retraimento autista ett em idade posterior sons en de impulsos e emogdes b. ose a Tealne & Peteepeao da presenga separada dela ¢ evtada tanto quanto po ito evidente um tremor emocional profundo e muito primitivo que surge, -os reduz-se ao minimo absoluto com outras: Des el. Fica el 144 GENEVIEVE HAAG SYLVIETORDJMAN, ANDREE DUPRAT ET AL, Por exemplo, em uma irrupgio de esteredtipos agitados, ou mesmo em um enorine aue de birra quando existem caracteristicas especialmente provocadoras de ansiegt ou de preocupagdo no ambiente. Em contrapartida, nao se organizaram afetos diten’ cidos e com muangas. Nesseestigio s6 ovorrem paroxismos de ansiedade e deg tomando o corpo todo, descritos por Tustin como ataques de birra e como expiggg emocionais no vocabulario cognitivo, quando se rompem a fora esteredtipos ¢ vita ‘ 4) Imagem corporal: um estado hipert6nico (caminhar na ponta dos pés) ou o oposig, estado marcadamente hipotonico ~ indica sensacdes fsicas de eair ou derreer.Algumay criangas diio demonstrages muito coneretas de suas experiéncias; por exemplo, uns crianga fica deitada no chao ao longo da fresta da porta, completamente largada, baban. do e espalhando a baba no chao com sua bochecha, como se estivesse imersa na sa va. Outra crianga que ja conseguia verbalizar disse que era como se estivesse derretendy como um torrao de agiicar, no espago que separava o consultorio da sala de espera, aon, de ela ia se encontrar com a mic. Assim, nesse estigio ela conseguiu verbalizar 0 que antes fora expresso pela corrida apressada através desse espaco.* Atividades estereay. padas de trepar ou escorregar, sugerem necessidade constante de dominar os mesinos sentimentos. Ha uma auséncia ou uso limitado de certas partes do corpo, principalmente @ drea ao redor da boca: os lébios da erianga podem ficar moles e ela pode deixar a saliva escorrer. ©) Contato visual: esta ausente ou fugaz, ou evasivo, ou permanece sem penetragao, ou se apdia na visao periférica (Bullinger, 1989). f) A fala é geralmente inexistente ou ecolélica. Repetigdes ecoldlicas podem ser trabalha- das imediatamente ou s6 depois de um intervalo. A voz da crianga tem geralmente um tom alto e todo igual. O tom indubitavelmente indica a ansiedade a respeito do espaco, As vezes ha gritos altissimos que ferem os timpanos de quem escuta; algumas c as demonstraram que isso se relaciona a sensagao fisica de cair (Haag, 1990a). A exploracao do espago e dos objetos revela uma tendéncia a ficar dentro de um esps- 40 uni ou bidimensional (Meltzer, 1975). No espaco unidimensional, a crianga esté pe- trificada e com freqiéncia imével, embora possa circular em volta de um ponto especifico, mével ou fixo (por exemplo, uma lampada no teto). No espago bi- dimensional, encontrado com maior freqiiéncia, a crianga opera ao longo de dois ca- nais sensoriais. Existe uma luta contra a percepgao das formas tridimensionais: esticam as dobras de cortinas, achatam a massa de modelar, empilham pequenos pratos planos, exploram a superficie de objetos enquanto, a0 mesmo tempo, evitam escrupulosamen- te furos ou protuberdncias. Quando caminham pelo ambiente, evidentemente um espt- ¢0 tridimensional, para nés, freqlentemente o fazem de modo peculiar, que dé a impressio de deslizarem por uma superficie h) O sentido de tempo na crianga é unidimensional ou circular: no tempo unidimensional # crianga esta perdida e estaticamente agarrada a uma tinica modalidade sensorial. 0 tem- po circular (bidimensional) caracteriza-se pela repetigio, com insisténcia na manutet- gao da mesmice absoluta, € com tendéncia a um niimero minimo de ciclos. Se for imposta uma alterago no desempenho das atividades de tempo ritualizado, a eriany pode ter um ataque de birra. . i) A agressividade pode ser dirigida contra 0 se/f, ou contra os outros, freqiientemente* modo indiferenciado, e pode surgir pela primeira vez quando comegam os ataques birra, 8) eeeetrerrettee ee 5. A, Maufras Du Chateller, sequéncia nao publicada, ee ee TFTTnvWT7™'"777"*7=C=FG]_ ‘AVALIACAO PSICODINAMICA DE MUDANGAS EM CRIANGAS COM AUTISMO_ 145 tem contraposigo, a automutilagdo autistica verdadeira necesita ser claramente iden- Ffeada devido ao seu significado. E muito perigosa, pois consiste em um aumento in- sidioso da intensidade do auto-estimulo sem envolver um impulso agressivo genuino. Exemplos ineluem machucados na pele causados pela intensificagao progressiva das Mneadas estereotipadas; dano aos olhos, causado pela presstio cada vez mais intensa poe globos oculares, para obter efeitos ent6pticos de luz; machucados causados por gol- que a erianca se dé para sentir os ossos vibrarem, e dai por diante, Em termos p: analiticos, 0 instinto de morte venceu completamente. No que se refere a0 sistema imunoldgico, existe grande resisténcia as infecgdes. d Estagio de ‘recuperacao da pele’ Este € 0 comego de uma fase simbiética que, de inicio, é geralmente patolégica. No concernente a imagem corporal, encontra-se um padrao repetido: contato corporal de costas é ativamente buscado pela crianga ou é passivamente aceito se por iniciativa de um adul- to. Ai a crianga é capaz de buscar ou combinar esse contato com contato visual penetran- te—o que pressupde a elaboracao dos medos primitivos provocados pelo contato visual (Haag, 1991a) — a ponto de mergulhar dentro dos olhos do outro, causando um efeito de Ciclope (Haag, 1985, 1990a). Bruno viveu esse tipo de situagdo na relagio terapéutica sentindo suas costas sendo pressionadas contra alguma coisa ao mesmo tempo em que mergulhava dentro dos meus olhos. Depois disso, passou um pequeno cubo plastico desde o meio das sobrancelhas para trds por cima da cabega, na linha mediana do seu cranio; ento se virou ¢ mostrou que havia um espago atrés onde podia juntar objetos (Haag, 1991a, 1991b). Deste ponto em diante, as criangas tendem a mostrar um senso de envolvimento: por um lado pelo aumento de in- teresse por roupas, por ondulagées, pelo interior das dobras, por recessos espaciais (en- tolar-se nas cortinas) e pela ago de rodear, mas, por outro, através de novas manifestagdes de ansiedade ligadas a problemas com roupas (nudez compulsiva, rasgar roupas, ¢ fazer escindalo para se vestir). Entendemos esse comportamento paradoxal como resultado da Projecao dos anseios anteriores de se grudar aos recipientes. Haag chamou estas novas an- siedades sintomaticas de ‘ser espremido’, que ¢ uma espécie muito primitiva de claustrofobia. Por exemplo, as criangas nesse estagio podem entrar ¢ sair rapidamente de Varios recipientes, ou se colocarem nos bragos de alguém e, a seguir, imediatamente que- feu eScapar outra vez. Em referéncia & analogia entre pele ¢ roupas, um menino pos-au- que ainda estava fragil, em um estégio avangado de seu tratamento, disse: ‘nunca vou Poder me casar porque nao tenho camisa’.® ome ha uma diminuigdo evidente do retraimento ¢ dos esterestipos, ao menos oeorte pcrianga tem a atengdo de alguém. Ha ataques de birra mais freqiientes, ¢ esses Posta a en 86 quando seus rituais ou esteredtipos séio rompidos, mas também como res- etigncia ae Por exemplo, em contato com outras pessoas ou quando vivem a ex- ia de desejos instintivos mais definidos. ; : forme Gonceme a fala, notamos 0 aparecimento de exercicios vocais espontineos: meio fees, fal qual descrito por Meltzer (1986). A brineadeira vocal seria, portanto, ‘cues jee e8Petimentar os elos de comunicagdo que a erianga parece ter sentido como Cida na ime tO7MO" (Haag, 1991b). A lalagao também pressupde que a boca foi restabele- 'gem corporal. Esta reintegragao é observada quando a crianga reexplora o mundo 6 OT 'eaud, seqdéncia nao publicada. ~~ TTT 146 GENEVIEVE HAAG SYLVIE TORDJMAN, ANDREE DUPRAT. ETAL. com a area em torno da boca, ¢ exibe intensa ansiedade de despersonaliy sentir que a perdeu novamente. De fato, algumas criangas mostram que da boca acompanha a recuperagdo da pele. Rocky, durante a terapia, usoy a °UPeTagag delar durante longo tempo, depois de ter sentido muito medo dela; ele entoa Sl! de mee precisava grudar pedagos de argila nos seus olhos e na sua boca, a fim de ne os buracos da sua face, todos os buracos pretos ¢ gotejantes. Depois de w uma mascara de argila, um circulo grande ¢ redondo para 0 seu rosto, mas tegrou em pedagos ¢ retalhos. Entio, a mascara finalmente se solidificou, ficards Segunda pele. Conseguiu se olhar no espelho, ¢ explorar seu olhar através dos by fez para seus olhos, nariz e boca (nao mais através de apenas uma répida olhada de Ele olhou para mim, parada atras dele, continuando a examinar em volta de sua b dela, da minha também, seus dentes, sua lingua ¢ ai cle fez a mimica de penet lingua, assimilada ao mamilo dentro de sua boca, dentro do reflexo dos Noss espelho. Nessa época, escutaram-se alguns sons ¢ a seguir algumas palavras,” Nao tura dessa recuperagdo da boca, eujo ceme é a continuidade lingua-mamilo, algumay ot gas querem nos mostrar que o resultado final deveria ser uma separagao natural ce rompimento da lingua e do mamilo. Durante uma sesso psicanalitica de grupo, Maurice nos mostra um lengo no qual Bambi ¢ a mde estdo grudados, presos na mesma pele. Ning identidade adesiva bidimensional, a lingua de Bambi aparece como uma unio, um eloens © pélo da mae. Maurice enfia este lengo na boca, e deixa s6 um pedacinho de fora, Ele me convida a puxé-lo para fora, muito devagar, varias vezes, e pereebemos que este lengu! mamilo, inicialmente confundido com a lingua, pode agora ser separado sob a condigao dy que a pele em comum deva ser representada por um pélo macio e liso, com um elo forte € seguro (Haag e Urwand, 1993). Deve-se observar que, em criangas que comegaram a falar com tons de voz anormais, a lalagdo tende a reaparecer antes que os tons auténticos da crianga possam ser integrados a voz dela. Desenhar € ainda com freqiiéncia ndo-existente. Fazer marcas pode tornar-se possi- vel com mais facilidade, se alguém apoiar a mao da crianga ou apoiar suas costas e Ihe ofe- recer uma superficie dura. A crianga pode tragar 0 contorno de suas maos ou de objetos, ou fazer pontos, curvas espiraladas ou circuitos fechados, que sao formas tridimensionais (Haag, 1990b). Quanto a exploracao do espaco ¢ de objetos, podem-se observar sinais claros de per- cepgaio do espaco tridimensional junto com 0 inicio do interesse por buracos, dobras ¢ re- cipientes, que s&o penetrados pelo corpo ou pela mao. As criangas podem tocar as paredes 4 volta da sala com suas mios Senso de tempo: ainda existe uma preocupagao com o tempo circular (retorno ao mes- mo ponto) junto com 0 comego de uma sensacao de tempo oscilante que liga ao inicio da identificagao projetiva: crenga nao realista na reversibilidade do tempo. : Aagressividade dirigida a outras pessoas pode comegar, ¢ esta especificamente ditigide ao rosto, em atos que ligam ao impulso oral e uma intensa possessividade do rosto (vei® 0s “ataques” ao rosto no segundo semestre de vida dos bebés). Esses ataques reagem ber a jogos de transformagaio e dramatizacao que introduzem brincadeiras de mane (brincadeiras de ledes, ou as que transformam o puxar de nariz. ou cabelo em caricias Essas transformagdes sao essenciais para a crianga ter um bom desenvolvimen? |) relacionamentos carinhosos, de aceitag%io dos rituais da sociedade ¢ a construga0 ah arsenal agressivo adequadamente diferenciado, para ataque e defesa. E também um pt 2620 sempre €8sa rec yn Aue ™ tem, como ‘Sua 208 que ©Sguelha), Oca, dentry Tar com sua 08 olhos np 7. 8. Urwand, seqGéncia clinica nao publicada a an AVALIAGAO PSICODINAMICA DE MUDANGAS EM CRIANGAS COM AUTISMO_ 147 « pata brinear de faz de conta e, assim, um passo importante em diregio a asso para simbolizaga0- Quanto a0 ezes, temporario d ‘0 sistema imunoldgico, pode-se observar um aumento totalmente novo e, as je vulnerabilidade a infecgdes. ‘A fase simbidtica estabelecida’ *Cisdo vertical do ego corporal’ (Haag, 1985) Imagem corporal: esse estigio caracteriza-se por um aumento de contato com adul- tase a clissica fendéncia de pegar a mao de um adulto para fazer coisas. Uma vez que jaja um grau minimo de relagio face a face e trocas de contato visual, o peito tende a tmergit na imagem corporal, mas ao custo de um perfodo mais ou menos longo durante o qual ocorre uma fuséo parcial, com metade do corpo da crianga preso a metade do cor- po do adulto, algo parecido com o estagio discernido no desenvolvimento de bebés de trés rete meses de idade. Quando a crianga é capaz de ‘pegar de volta’ sua metade propria do corpo, ao incorporar esta identificagao adesiva lateralizada usando brincadeiras auto-erd- ticas entre as duas maos, pode surgir uma explorag4o, com o dedo indicador, de buracos ¢ orificios associada a maior familiaridade com o espaco tridimensional. As criangas que permanecem patologicamente presas nesse estagio ficam entrincheiradas em uma gama de manobras com o objetivo de sustentar 0 sentimento de que as duas metades do seu corpo estio soldadas. Arielle comparou as duas metades do seu corpo as duas partes da peque- na casa de bonecas unidas por uma dobradiga, e também as duas caixas idénticas que ela alternadamente colava ou separava uma da outra, Ela mostrou-me que endurecera 0 cor- poa fim de manter as duas metades unidas. Celine, outra menina, mantinha seus pés e maos colados de cada lado da linha central de uma lajota decorativa, colocada no centro do cho de uma passagem; caso contrario, ficaria presa na metade do corpo de outra pessoa. Du- rante uma série de sessées, Chen queria fundir metade do seu corpo ao espelho: ele ia até oespelho e colava seu corpo em um ponto que fazia parecer que metade do corpo derre~ tia e desaparecia dentro do espelho (Urwand, 2004). Empenho em trocas emocionalmente ticas ajuda a unido interna, promovendo desse modo o desligamento das metades dos corpos dos pacientes das metades dos corpos de outros. O contato visual pode adquirir caracteristicas de oralidade, transformando-se em boca devoradora, ¢ pode haver ansiedades persecutérias que geralmente so mais bem conhe- Sidas do que os terrores predatérios primitivos, descritos acima. A fala & possivel, como eco ou mostrando varias cisdes: uma crianga, antes muda, pode comesar a fala em meia-dupla,* dizendo, por exemplo, ‘pa’ em vez de papa, 0 que Shee Gms cue vezi da imagem corporal. As silabas duplas também so pos- non (al, Papa), em tom de voz normal. Supomos, portanto, que no desenvolvimento entre ala com silabas duplas caminha em conjunto com a brincadeira identificatéria cara duas metades do corpo. Outras cisdes podem ser observadas, (ais como come- Tees uit Somente com vogais, evitando as consoantes, que esto associadas a uma du- passive (Tustin, 1981; Haag, 1996). i : : eden thar: se a crianga comegou a fazer marcas ritmicas, as espitals ¢ a pontuacio rar mais aprumadas. Aspectos mais ou menos patoldgicos ainda so obser- No ori ‘ana, hait-doublets. Em termos lingUisticos, a repeticao da mesma silaba quando o beb® co- mitir as primeiras palavras, por exemplo ‘papa’ em vez de ‘papal’. (N. da T.) SS = 148 GENEVIEVE HAAG, SYLVIE TORDJMAN, ANDREE DUPRAT. ETAL, vaveis nos desenhos feitos em metade de um espago, ou numa brincadeira go tades de um desenho nas laterais de duas folhas de papel unidas vertical 7es, a crianga desenha metade de uma figura e deixa a outra metade para s outra pessoa. Aparece um grande interesse na duplicagao (fotocépias, imprimir uma folha de papel em outra, xerox). A crianga se torna mais h numa superficie destacdvel. 4 exploracao do espaco e dos objetos: encontra-se agora um intresse esp cantos. A sensagio de uma solda entre as duas metades do corpo ao longo da linha da, I Dor vertebral & projetada nessa percepedo arquitetual e, nesse momento, as erangac OMe Soldar-se aos cantos, para consolidar e confirmar este constructo corpolespacig parece demonstrar a equivaléncia simbélica entre o eixo dos seus préprios compos ¢ 4 Bi entre duas paredes (Haag, 19903). interesse na verticalidade também aparece na dope vertical, em cortar longitudinalmente, e explorar a encadernagao de livros, Dg patolégico, algumas criangas fazem uma dobra no meio de cada pagina de um livro Gan ™megalomaniaco da sua eneadernagio), ou seletivamente atacam as encadernagies de lyn’ Também se encontra interesses em reunir coisas ¢ em colocé-las umas dent da outras, o que agora a crianga consegue fazer. Existe interesse em brincar com as dob: digas das portas, que deve ser diferenciada das atividades de fechar-abrir que se conease, mais com o exercicio de controle do esfincter. Finalmente, desenvolve-se ointeresse pr pares de objetos que so comparados e contrastados, um estégio inicial para a formatay das séries simétricas-assimétricas. Senso de tempo: ainda ha alternancia entre o tempo circular e 0 tempo oscilante, A agressividade: podem aparecer atividades de auto-agressao. Isso pode consistr em ataques feitos por um lado do corpo, que & confundido com o corpo de um adulto, con. tra 0 outro lado: por exemplo, golpear um lado da cabega. Também jé se viu criangas gol. peando seus préprios corpos no meio, onde os lados se unem (meio da testa, meio do peito), em juntas e beiradas da mobilia e da arquitetura. O sistema imunolégico: parece clinicamente normal agora, mas é preciso haver con- firmago com medidas de avaliagao imunolégica. ag mete oy er desenhag, Papel carbon, P* ‘abil para Aesenyt ‘Ciséo horizontal do ego corporal com a integracdo dos membros inferiores e das zonas anais e sexuais’ (Haag ,1997a) Confirma-se 0 desenvolvimento progressivo positivo com aumento da mentalizagio ¢ possivel progresso de linguagem e simbolizacao. O controle do esfincter é adquirido ou mais bem integrado. Mas ha oscilages freqiientes ¢ mais ou menos prolongadas de humor, de tipo maniaco-depressivo. Por algum tempo a crianga pode correr o risco de se direcionsr para a perversio com temas de masturbacao anal (Meltzer, 1972) que inclui ataques sid cos fantasiados (ou reais), as vezes com tortura e crueldade. Desta maneira, Pierre att vessou uma longa fase maniaca em que havia uma intensa projecdo, em sua terapeul®, ae sentimentos de desespero, desamparo, inferioridade, e de ser esmagado, que foram ine tados para ele. Uma hiperpenetragao na esfera anal (o que chamavamos de seu ‘Castelo Escuridao’) acompanhada de fantasias muito perversas de tortura, para as quas fo Pet so impor limites firmes; ao mesmo tempo ele foi convidado a juntar-se & terapeuta ‘n> _ de cima’, a fim de sair do claustro que Meltzer (1992) desereveu como resultant d identificagao projetiva agressiva para dentro da parte de baixo* da mae (Haag, 19976): No original, mother's bottom, no sentido de traseiro da mae. (N. da T.) > avalaGAO pSICODINAMICA DE MUDANCAS EM CRIANCAS COM AUTISMO_ 149 isual; existe uma luz ainda mais cintilante nos olhos da crianga. conta *Ne ais imitagdes da estrutura musical completa da fala (balbuciar), que pala: existe" Mrjavras. Em alguns casos, parece haver uma cisio entre palavras e es incorpo ido, algumas criangas emergiram do mutismo cantando: nossa fungao a, Nesse sisi! A cisfio horizontal também pode ser discernida no nivel de voz: saber a Tel jor (nivel alto) ¢ uma voz mais baixa, As vezes nota-se que 0 som de ene ume VO“ prolongedo, exagerando 0 aspecto “musical” normal de algumas palavras cots pala’), Neste ponto, as criangas podem demonstrar disposigao de construir um (Fonagys I abuldrio que normalmente aparece no segundo ano de vida. eo vera: 0 eix0 das VOItAS espirais, ou 0S movimentos citculares ritmicos podem se an nats horizontais; os desenkos se sobrepdem horizontalmente em dus folhas, ou os tome exenhos sfo grudados juntos horizontalmente, eas representagdes de metades de anos sto cortadas horizontalmente. : * exploragdo dos esparos e objetos: os primeiros vislumbres de interesse pelos altos stuns dos espacos, objetos e recipientes (a parte de cima ¢ de baixo de armérios, o lado Sinito ¢ 0 avesso das roupas). Se conseguir dominar as habilidades necessdrias, a crianga poic agora fazer recortes e dobras nas quais as dimensdes verticais e horizontais se inter- tam. As formas das construgdes feitas de partes encaixadas se tornam mais complexas. No que se refere s peculiaridades patol6gicas, podemos encontrar alinhamento obsessivo e aglomeragao de objetos, repetida infinitamente e com muito pouca variagao. Sentido de tempo: atingimos o limiar entre tempo oscilante ¢ linear, com redugaio do controle megalomaniaco. O tempo linear é o tempo de separagao — agora tolerado, embo- a.com tristeza e raiva — e de aceitagao do nascimento, junto com a percepgao da passa- gem inevitavel do tempo. Agressividade: por algum tempo pode haver dano auto-infligido nos membros inferio- tes (por exemplo, golpear as canelas ou joelhos, cutucar os dedos do pé). A agressividade dirgida a outros, inclui elementos normais e patolégicos a partir do nivel de constructos sts Pode have posse maniaea (amarrar, comprimir ou eapturar pessoas) no que 8s ve~ sat eter de excitagaio sexualizada e até mesmo tirnica. Existem atos de crueldade mais e criancas menores etc. O sistema imunolégico: as criangas podem adoccer algumas vezes. Contato ¥ “O estagio de individuagao’ ey aa 0s esteredtipos desaparecem quase completamente, enquanto se de- ispessoan¢ wndeiras de faz-de-conta. Papéis muito mais desenvolvidos sto designados Patna a 05 animals. A mutualidade torna-se possivel, ¢ hé tentativas genuinas de com- Treaténcia, ta ee violentas também ocorrem — como no segundo ano de vida. Mas, com Clean gy Ambém se instala uma fase, mais ou menos longa, de rivalidade direcionada aos tan nea menores. O estigio do espelho se confirma. om title: cue lho no contato visual. ‘Naor aque and @ erianga formou uma imagem corporal completa, o aparecimento do a ida cine nova organizagao (Spitz, 1965). A estrutura gramatical é gradativamente rosé i pied se internaliza 0 vinculo do didlogo. Pode-se observar uma melhora na 12 dais g eis clidade da fala junto com a entonagdo e a énfase), ¢ escutar mondlogos a Vidualizad usa varias vozes para representar trocas entre diversos interlocutores ae P80 ete) pages, Hinguagem para as amenidades sociais também aparece (muito bem!, Pree didlogy ae Persistir algumas anomalias no tom vocal, 0 momento de participar So), le ser escolhido e usado de modo adequado (uso de palavras muito sen 150 GENEVIEVE HAAG SYLVIE TORDJMAN, ANDREE DUPRAT ETAL A exploracdo de espacos e objetos: agora existe um interesse bem deg, brincadeiras de esconde-esconde e de atividades de continente-contido — q,. colocar coisas dentro de outras, ou embrulhar coisas como atividades dg mani i segundo ano de vida (Sinclair et al., 1982). Também podemos ver criangas El asao, i chando coisas (janelas, portas, caixas) com a idéia de dominar o estincter, ¢ 4;.eiMdo ¢ ge 0 lado de fora e 0 de dentro, ou oferecendo coisas que sao colocadas na mag Sti en soa, ¢ af apanhadas de volta. * Outra Desenhos: podem aparecer circulos fechados ¢ formas radiais, seguidos ou menos rapidez, por outras espécies de figuras, dependendo da idade da 74.0" Mais cla tiver atingido 0 estigio de maturidade relevante em algum momento do sea, €e vimento irregular: homens-batata, sdis, preencher figuras, fazer cruzes (trés-quqn M0 quadrados (quatro anos), e divisio do plano horizontal para separar o pano de funy que contém paisagens e cenas figurativas (cinco a seis anos) (Haag, 1994), "{° brane Como peculiaridade patolégica persistente, pode-se encontrar uma es: tengao de figuras humanas, uma predomindncia de formas abstratas e 9 obsessivo do pano de fundo. O senso de tempo: com maior aceitagao da separagio, po como linear. Agressividade: agora a crianga expressa agressividade auténtica contra no caso de rivalidade ou competigao, por uma pessoa ou por um objeto (m cabelo, ou bater), para possuir objetos ou territrio, no mais em busea da posse orl my mitiva da face ou de outras partes do corpo como objetos parciais. A auto-agressio ¢ pre sivel se a repressdo da agressio dirigida aos outros voltar-se contra o self'e combinwras com uma tendéncia a se identificar com 0 agressor. O sistema imunolégico parece normal. CnVolvig, decantar g.° om tre Pes. TUpUlosa abs. Preenchimentg @ crianga agora pensa no tem Outras pessoas order, puxar 9 Conclusées Temos a esperanga de que 0 uso desta tabela de classificagao se mostre util —, em uma gama de situagdes praticas ou de pesquisa diferentes — para psicanalistas, professores, edu- cadores € outros terapeutas, assim como para pais. E diminua a cisdio que ainda separa as perspectivas psicanaliticas das preocupagGes que influenciam a educagao e o treinamento de criangas com autismo ou com caracteristicas autisticas marcantes. O uso da tabela de classificagao necessita um glossario cujas palavras-chave se referem as descobertas cli: nicas principais descritas no texto principal. Este glossario ainda esta em desenvolvimen- to € sera apresentado com tabelas que levam em consideragao os resultados da nossa pesquisa. : No que concerne A pesquisa clinico-biolégica, esta tabela de classificagio também pode ser usada para diferenciar subgrupos clinicos cujo quadro bioldgico é provavelmen te diferente. De fato, a pesquisa biolégica que nao leva em consideragao as diferenas ¢! nicas, nao pode produzir nem repetir resultados biol6gicos significativos devido & excess'* diversidade clinica das criangas estudadas. Por exemplo, talvez se pudessem esclarecct descobertas contraditérias de quantidades anormais de plasma beta-endorfinas (a be endorfina é um opidide agindo na periferia, como um neuro-horménio de estresse), pesquisa fosse empreendida levando em conta os diferentes estagios evolutivos do oe autistico (Tordjman et al., 1996, 1997). Por meio da perspectiva psicodindmica um? t dagem clinico-biolégica integrada seria, portanto, de grande interesse para inere™ compreensao dos estados autisticos. et—~—

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