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CENTRO UNIVERSITÁRIO ANHANGUERA DE CAXIAS DO SUL

Av. Alexandre Rizzo, 505 - Sala 01  Desvio Rizzo


Caxias do Sul (RS)  95110-000  (54) 3533-4600

Farmácia Solidare: Estudo de Caso Sobre o Remanejamento de


Medicamentos

Gabriela Gambato1
Carina Cassini1
Caroline Olivieri da Silva Frozza1
Diene de Borba Pacheco Januario1
Giovana Rech1
Mariel Raquel Borges Betto Pasinato 1

Charlene Silvestrin Celi Garcia 1

Resumo
Há uma preocupação mundial quanto aos resíduos químicos, mais precisamente os
medicamentos. Neste sentido, programas de remanejamento de medicamentos têm
sido instituídos para sanar este problema. No município de Farroupilha foi instituído o
Programa Farmácia Solidare que visa realizar o remanejamento de medicamentos
descartados pela população. Com o objetivo de verificar informações consistentes que
permitam avaliar a viabilidade destes programas, realizou-se um levantamento de
dados nos sistemas informatizados utilizados durante os três anos de atividades
logística de remanejamento. Os dados obtidos, são expressivos para o município, pois
os números são crescentes tanto para as doações recebidas na farmácia como para
as dispensações realizadas. Um quantitativo de 1,6 toneladas de resíduos químicos,
representados por produtos farmacêuticos, foram descartados de forma correta. O
total de medicamentos dispensados representa uma economia de aproximadamente
1,4 milhões de reais na aquisição de medicamentos pela população. Desta forma,
salienta-se que os benefícios para os municípios são de caráter econômico e
ambiental. Embora os benefícios sejam significativos, ainda existem limitações
relacionadas ao programa sendo elas legislativas, sanitárias e profissionais.

Palavras-chave: Medicamentos. Remanejamento. Assistência Farmacêutica. Uso


Racional. Logística Reversa

1 Introdução
O fornecimento de serviços e produtos para o cuidado da população constitui
um elemento da saúde coletiva (CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA (CFF), 2016).
Deste modo, os medicamentos são essenciais na atenção à saúde pois previnem
epidemias, auxiliam no diagnóstico de patologias e promovem a saúde (MINISTÉRIO
DA SAÚDE (MS), 2017). Relacionado a expectativa de vida da população brasileira,
observa-se um aumento da longevidade, com isso também se acarreta um
crescimento no consumo de medicamentos, principalmente nos tratamentos de uso

1
Docente do Curso de Farmácia da Faculdade Anhanguera Caxias do Sul.
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contínuo. Em consequência, repara-se um impacto social, relacionado a Política


Nacional de Assistência Farmacêutica, e um impacto ambiental relacionado a logística
dos medicamentos no caso de sobras de tratamentos (MINISTÉRIO DA SAÚDE (MS),
2001).
As diferentes esferas de governo têm investido em programas sociais para
ampliar o acesso aos medicamentos, principalmente para o controle de doenças
crônicas como hipertensão, diabetes e asma, melhorando assim a qualidade de vida
de muitos brasileiros (MINISTÉRIO DA SAÚDE (MS), 2001). Entretanto, há indicadores
de que a proporção da necessidade de acesso e a utilização de recursos terapêuticos
é frequentemente superior a capacidade de financiamento e provisão dos sistemas de
saúde (CFF, 2016). Dentre os recursos terapêuticos, há os serviços dos profissionais
de saúde relacionados ao uso de medicamentos. Assim sendo, a atenção
farmacêutica é o serviço fundamental para garantir o sucesso na terapia dos pacientes
que fazem uso de insumos farmacêuticos. Contudo, a escassez de acesso a este
serviço gera um impacto maior, o impacto ambiental (EBELE; ABOU-ELWAFA
ABDALLAH; HARRAD, 2017).
O Brasil está no ranking dos países consumidores de medicamentos, no qual a
automedicação não orientada merece destaque tanto para aquisição própria como
pelo compartilhamento de medicamentos entre parentes e amigos. Carentes de
orientação farmacêutica, a população inconscientemente faz uso de medicamento de
forma inadequada resultando em sobras ou vencimentos de medicamentos, o que
gera descarte de lixo químico no meio ambiente (PINTO et al., 2014). Estudos tem
demostrado elevadas concentrações de fármacos nos solos e nas bacias de captação
de água, deste modo, isto é um indicativo que há descarte de medicamentos de forma
inadequada e as consequências podem causar efeitos adversos à saúde de humanos
e animais (ARCHER et al., 2017). Atualmente, há grande preocupação com a utilização
correta dos medicamentos e também com a contaminação dos recursos naturais
devido ao descarte inapropriado, isto levou diversos profissionais farmacêuticos a
instituírem projetos independentes, conhecidos internacionalmente como Pharmacy
Take-Back Programs ou Drug Take-Back Programs, visando o recolhimento de sobras
de insumos farmacêuticos para que eles fossem descartados conforme legislação
vigente (LUBICK, 2010). Entretanto, na manipulação destas sobras, observa-se que
muitos medicamentos poderiam ser remanejados beneficiando a fração da população
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que, por alguma razão, ainda não tem acesso aos medicamentos (BRANDÃO; MOURA,
2010). Dentre os programas com esta finalidade, está instituído no município de
Farroupilha, Rio Grande do Sul, o projeto Farmácia Solidare. O programa visa realizar
o remanejamento de medicamentos descartados pela população nos pontos de coleta
distribuídos na cidade. Com início das atividades no ano de 2015, o projeto atende os
munícipes e evita que grande parte dos medicamentos não utilizados sejam
descartados no ambiente. A partir do exposto, o objetivo deste trabalho foi realizar um
estudo de caso do programa Farmácia Solidare apresentando o fluxo qualitativo e
quantitativo dos medicamentos remanejados pela farmácia no município de
Farroupilha.

2 Material e Métodos
2.1 Local do estudo e levantamento de dados
O estudo foi conduzido na Farmácia, área física pertencente ao programa
farmácia Solidare, onde é realizada a maior parte da logística dos medicamentos. A
busca de dados foi realizada nos softwares já utilizados pelo município. Atualmente o
fluxo de medicamentos é registrado no software MV o qual permite o gerenciamento
de programas e unidades de saúde, o acompanhamento da situação e histórico de
saúde dos cidadãos. Inicialmente foi realizada a revisão dos cadastros de todos os
medicamentos para verificar se constavam as ações terapêuticas dos medicamentos
gerenciados no período do estudo. A partir disso, realizou-se o levantamento de dados
do fluxo dos medicamentos no período de Junho de 2015 (início do projeto) a Junho
de 2018, totalizando 3 anos de atividades. Alguns dados apresentados foram
referentes ao terceiro ano de atividade, devido às limitações que o sistema utilizado
no início das atividades possuía, não permitindo a apresentação de dados para anos
anteriores.
Os gráficos dos resultados foram construídos nos softwares GraphPad Prism e
Excel for windows.

3 Resultados e Discussão
Diversas cidades brasileiras possuem projetos de remanejamento de
medicamentos na forma de farmácia (BRANDÃO; MOURA, 2010). Além disso, estes
tipos de programas também tem repercussão mundial (LUBICK, 2010). Quando se
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observam os números, se evidencia que estes são significativos tanto para o meio
ambiente quanto para a população. Na Figura 1 são apresentados os resultados do
fluxo de medicamentos relativos aos três anos de atividades do Programa Farmácia
Solidare na cidade de Farroupilha (RS).

Figura 1 - Fluxo quantitativo de medicamentos em unidades farmacêutica


e valor representativo no 1º ano (2015-2016), 2º ano (2016-2017) e 3º ano
de atividades (2017-2018) da Farmácia Solidare. A: Medicamentos
recebidos. B: Medicamentos dispensados. C: Medicamentos vencidos

R$ 865 mil
R$ 939 mil
R$ 728 mil

A 500000
Unidades Farmacêuticas

400000

300000

200000

100000

0
1° ano 2 ° Ano 3° Ano
Período de Atividade
R$ 631 mil
R$ 431 mil

B 400000
Unidades Farmacêuticas

R$ 366 mil

300000

200000

100000

0
1° ano 2 ° Ano 3° Ano
Período de Atividade
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R$ 203 mil
C 150000

Unidades Farmacêuticas

R$ 104 mil
100000

R$ 102 mil
50000

0
1° ano 2 ° Ano 3° Ano
Período de Atividade

Fonte: dados da pesquisa.

No primeiro ano de atividades foram recebidos pelo programa 322.158

unidades farmacêuticas, o montante de unidades foi crescente com o passar dos anos

chegando a 386.550 unidades no terceiro ano de atividades, totalizando 1.428.824

unidades farmacêuticas durante os três anos de atividades (Figura 1 A). As

dispensações também foram progressivas atingindo 294.835 dispensações no

terceiro ano (Figura 1 B), ou seja, um aumento de aproximadamente 52 % em relação

ao primeiro ano. Dentre as dispensações do último ano, destacaram-se os

medicamentos para tratamento de patologias cardiovasculares que somam 31% do

total de medicamentos dispensados (Figura 2).


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Figura 2 - Percentual de dispensações no terceiro


ano de atividades (2017-2018) por ação
terapêutica/sistema
2%

5% Doenças
20% Microbianas
Inflamação

Sistema
Cardiovascular
7% 31% Sistema
Endócrino
1% Sistema
Gastrointestinal
Sistema Nervoso
Central
19% Sistema Urinário
10% Suplementos
5%
Vitamínicos

* Foram classificados como outros as classes


terapêuticas/sistemas com distribuição inferior a 1%.
Fonte: dados da pesquisa.

Embora muitos medicamentos sejam remanejados, permitindo o acesso da


população, muitas unidades ainda estão vencendo dentro da própria farmácia. Na
Figura 1 (C), observa-se que a proporção de vencimentos foi maior para o terceiro ano
de atividade, chegando a 98.129 unidades farmacêuticas. Contudo, nota-se
correlação positiva entre a quantidade de medicamentos que entram na farmácia e a
quantidade de medicamentos que vencem (r = 0,927) e também entre a quantidade
de medicamentos que entram na farmácia e a quantidade de medicamentos que são
dispensados (r = 0,858), deste modo, observa-se um fluxo contínuo de medicamentos.
Além do mais, totaliza-se 1,6 toneladas de produtos farmacêuticos descartados de
forma correta (medicamentos e produtos que chegam vencidos somados aos que
vencem na farmácia).
Dentre os medicamentos recebidos, estes são oriundos da comunidade
farroupilhense, de hospitais, de consultórios médicos e outras entidades/projetos. Na
Quadro 1 observa-se que, para o terceiro ano de atividade, a maior participação em
doações é da comunidade (57,30 % das unidades farmacêuticas), assim como nas
dispensações, 71,29 % das unidades farmacêuticas dispensadas destinam-se a
comunidade farroupilhense. Ao final do terceiro ano somaram-se 6.995 atendimentos,
em média 40 atendimentos por dia de dispensação.
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Quadro 1 - Característica da logística dos medicamentos no terceiro ano de atividade


(2017-2018
Quantidade Representação em %
Origem (Unidades (Unidades Valor (R$)
Farmacêuticas) Farmacêuticas)
Entradas (doações)

Comunidade
221.494 57,30 511.089,37
farroupilhense
Distribuidoras e
115.924 30,00 211539,79
laboratórios
Consultórios médicos 27.106 6,15 73.850,72
Hospitais 13.715 3,55 35.551,10
Outras
8.311 1,61 35.342,87
entidades/projetos
Total 386.550 100 867.373,85
Quantidade Representação em %
Destino (Unidades (Unidades Valor (R$)
Saídas (dispensações)

Farmacêuticas) Farmacêuticas)
Comunidade
210.194 71,29 476.202,33
farroupilhense
Farmácia básica
49.175 16,68 73.312,48
municipal
Outras
27.162 9,21 60.475,16
entidades/projetos
Hospitais 8.311 2,82 21.716,52
Total 294.835 100 631.706,488
Fonte: dados da pesquisa.

O Decreto Municipal n.º 5.841 (abril – 2015) instituiu o programa Farmácia


Solidare, cujo o início das atividades se deu em junho de 2015 no município de
Farroupilha – RS com o intuito de realizar a logística reversa de medicamentos e,
desta forma, beneficiar o meio ambiente evitando que resíduos químicos provenientes
dos produtos farmacêuticos contaminassem a cidade, permitindo uma nova forma de
acesso aos medicamentos no Município, evitando a automedicação e intoxicações.
Desta forma, semanalmente são recolhidos os produtos farmacêuticos depositados
nas caixas coletoras distribuídas na cidade, além disso, dentre os pontos de coleta,
estão as unidades básicas de saúde e empresas apoiadoras do programa.
Após a coleta, na própria farmácia, é realizada a triagem dos produtos. Para o
bom andamento do projeto, formulou-se um manual de boas práticas, estabelecido
pelo regimento interno da farmácia e procedimento operacional padrão para todas as
etapas envolvidas na logística dos medicamentos.
Os programas de fomento na área farmacêutica, principalmente nas diferentes
esferas de governo, abriram algumas janelas de oportunidade para programas sociais
em prol do acesso aos medicamentos, pois observa-se certa incapacidade do atual
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modelo em atender ao conjunto da população (GADELHA et al., 2008). Dados de 2017


do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística apontam 69.542 habitantes para o
município de Farroupilha (IBGE), 2018). Deste modo, observou-se que nosso programa
de gerenciamento através da Farmácia Solidare conseguiu de alguma forma
beneficiar aproximadamente 10 % (6.995 atendimentos) da população do município
de Farroupilha. Ou seja, mesmo com os programas de assistência farmacêutica
disponíveis, ainda há uma demanda crescente, principalmente aos medicamentos que
não estão na Relação Nacional de Medicamentos (RENAME) (BRASIL, 2017).
Dentre todos os medicamentos que foram recebidos, as amostra grátis,
abastecem substancialmente a Farmácia Solidare. As formas farmacêuticas são
variadas, tais como, cápsulas, drágeas, pomadas, loções, aerossóis, soluções,
suspensões, xaropes, supositórios e pastilhas. Os medicamentos termolábeis não são
remanejados, embora sejam aceitos para o descarte correto.
Quando os medicamentos são dispostos no lixo comum, ou na água e esgoto,
devido as suas propriedades químicas, eles persistem no ambiente podendo estar na
forma ativa, inativa ou transformada em uma forma química potencialmente alterada
(EBELE; ABOU-ELWAFA ABDALLAH; HARRAD, 2017). Atualmente, os tratamentos
convencionais da água são ineficazes para removerem os fármacos e a persistência
de sua bioacumulação no ecossistema resulta em uma desestabilização do equilíbrio
do meio ambiente (PINTO et al., 2014).
Segundo Archer et al. (2017) estudos recentes com a água do esgoto
mostraram a presença de 55 contaminantes emergentes, dentre os medicamentos
detectados na superfície da água foram identificados o diclofenaco, o ibuprofeno, o
cetoprofeno, o sulfametoxazol e os fibratos. Em adição, o autor acrescenta que alguns
tipos de medicamentos até poderiam ser eliminados, mas muitos acabam persistindo
e um percentual se mantém na água.
Os medicamentos de venda livre são os que mais causam preocupações em
todos os sentidos, pois são produzidos em grande escala devido a demanda, são
comprados sem prescrição médica, utilizados com pouca ou nenhuma orientação
farmacêutica e prevalecem nas “farmacinhas” do ambiente doméstico, onde ficam até
vencer a mão de qualquer pessoa que quiser fazer uso (MOURA; COHN; PINTO, 2012).
Em prol de sanar este problema, a Farmácia Solidare, conseguiu descartar de forma
correta 1,6 toneladas de produtos farmacêuticos. Salienta-se que na inexistência
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deste tipo de programa, provavelmente este quantitativo de substâncias químicas


estariam dispostas nos domicílios da população e em algum momento chegariam ao
meio ambiente.
A contaminação ambiental por produtos farmacêuticos, tanto medicamentos
como os cosméticos, preocupam entidades acadêmicas, governamentais e
empresariais e tem sido o objetivo de diversos estudos em todo o mundo (DAUGHTON,
2014; EBELE; ABOU-ELWAFA ABDALLAH; HARRAD, 2017). Isso porque estes produtos
podem apresentar impacto ecotoxicológico no ecossistema aquático com capacidade
de induzir modificações fisiológicas mesmo em pequenas quantidades (ARCHER et al.,
2017; GIRARDELLO et al., 2016).
Outro problema impactante que se visualiza é a guarda de produtos
farmacêuticos em locais visíveis ou inadequados, pois podem acabar sendo utilizados
sem orientação causando doenças, intoxicações e uso abusivo (UDOFIA; GULIS;
FOBIL, 2017). Além disso, grande parte da população não sabe como realizar o
descarte correto dos medicamentos, mas apresentam feedback positivo em participar
de capacitações que promovam a educação ambiental, pois tem noção de que a
disposição de medicamentos no lixo doméstico não é a melhor opção (MASSOUD et
al., 2016).
O Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox) relata que
38,1% das intoxicações notificadas no ano de 2015 são causadas por medicamentos
(FIOCRUZ, 2015). A população mais jovem e os idosos são os principais acometidos.
As intoxicações em crianças, ocorrem principalmente pela curiosidade, pois buscam
conhecer qualquer objeto ou produto que lhes pareça atraente ou interessante,
enquanto que os idosos acabam se intoxicando devido a múltiplas administrações do
mesmo medicamento, como falha do próprio esquema farmacoterapêutico (MASSOUD
et al., 2016).
O questionamento quanto aos benefícios de programas de remanejando
acabam tendo respostas positivas pois conseguem evitar que o acesso fácil e
intoxicações aconteçam. Neste sentido, programas que fazem a coleta de produtos
farmacêuticos não utilizados tem demostrado que fazem a diferença (LUBICK, 2010).
Um dos grandes desafios para a implementação de programas de
remanejamento e descarte de medicamentos são os custos para que a logística
ocorra, principalmente para o descarte correto dos produtos (THACH; BROWN; POPE,
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2013). Para que ocorresse o descarte correto dos produtos farmacêuticos não
possíveis de remanejamento no município de Farroupilha, nos três anos de atividades
do programa Farmácia Solidare, o Município investiu 17.890,00 reais, ao mesmo
tempo que distribuiu o equivalente a R$1.428.000,00, mostrando um balaço financeiro
positivo (Figura 1).
Com programas de conscientização da população para a destinação correta
dos produtos não utilizados, observa-se uma demanda crescente deste serviço, e
portanto, há necessidade de disponibilização maior de recursos financeiros para esta
finalidade. Além da população, verifica-se No Quadro 1 que há colaboração entre
entidades que distribuem produtos farmacêuticos. Um quantitativo de 16,68 % dos
medicamentos distribuídos pelo programa, no terceiro ano de atividade, foram
remanejados para a farmácia básica do município, representando uma economia de
R$73.312,48 para aquisição de medicamentos.
Também são remanejados produtos farmacêuticos para hospitais e outras
entidades que possuem parcerias firmadas. A influência socioeconômica deste tipo
de programa foi investigada e, no estudo, o autor conclui que há um impacto positivo
direto na economia familiar (BERTOLO et al., 2018). Estima-se que na região Sul e
Sudeste do Brasil a população tem uma gasto médio de R$ 89,00 por família apenas
com medicamentos (HIRATUKA et al., 2013).
Embora os resultados financeiros sejam positivos, ainda há um quantitativo de
medicamentos que vencem dentro da própria farmácia. No terceiro ano de atividades
foram descartadas 98.129 unidades farmacêuticas, cerca de 203 mil reais (Figura 1
C). Isso pode estar ocorrendo por alguns fatores tais como: chegada do medicamento
na farmácia com prazo de validade próximo ao vencimento; dias de dispensação
reduzido; pouca rotatividade do medicamento; e desconhecimento da disponibilidade
do mesmo.
Neste sentido, evidencia-se que algumas medidas poderiam ser tomadas para
reduzir e até mesmo evitar que os produtos vençam na farmácia. Dentre as soluções
para este tipo de problema, destacam-se a realização de campanhas e preparação de
materiais informativos como cartilhas, páginas on-line, sites, aplicativos para celular e
até mesmo palestras para população, que podem causar um impacto positivo quando
realizada de maneira adequada (VASCONCELLOS et al., 2017). Em adição, os recursos
que permitam a apresentação em tempo real da disponibilidade dos medicamentos e
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a implementação de uma central regional de distribuição de medicamentos são


hipóteses levantadas como alternativas para redução do descarte por vencimento e
facilitar o acesso. Tais modelos de centrais de distribuição de medicamentos para
estes programas já tem demonstrado sucesso em outros países.
Embora a regulamentação na área farmacêutica esteja bem estabelecida e
atualizada no Brasil, evidenciam-se certas lacunas. Dentre as legislações
relacionadas ao descarte de produtos farmacêuticos estão a RDC nº 44, de 17 de
agosto de 2009, que no Art. 93 permite que às farmácias e drogarias participem de
programas de coleta de medicamentos a serem descartados pela comunidade e a
Resolução RDC nº. 222, de 28 de março de 2018 que regulamenta as boas práticas
de gerenciamento dos resíduos de serviços de saúde e dá outras providências
(BRASIL, 2018).
No caso de substâncias pertencentes a portaria 344, é vedado às drogarias o
fracionamento da embalagem original e no caso de sobras, a legislação deixa claro
que a autoridade sanitária local deverá orientar o paciente ou seu responsável, sobre
a destinação do medicamento remanescente (MINISTÉRIO DA SAÚDE (MS), 1998).
Quanto a logística reversa de medicamentos, no Brasil, há o Decreto nº 9.177, de 23
de outubro de 2017 que estabelece normas intersetoriais e a Associação Brasileira de
Normas e Técnicas (ABNT) na NBR 16457:2016 especifica os requisitos aplicáveis às
atividades de logística de medicamentos (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS
TÉCNICAS (ABNT), 2016).
Entretanto, até o momento, não há legislação nacional que regulamente o
exercício de programas de remanejamento ou reutilização de produtos farmacêuticos,
assim como não há permissiva para distribuição de amostras grátis em ambientes
além dos consultórios médicos (BRASIL, 2012). O estabelecimento destas políticas é
relevante, devido que muitos medicamentos que acabam sendo descartados poderem
ser reaproveitados, pois, conforme legislação, devem apresentar em condições de
utilização.
Muitos programas, com esta finalidade, acontecem no Brasil de forma
autônoma e solidária por programas sociais, com participação de voluntários e
entidades beneficentes ou de caridade. O desafio para o setor é a instituição de
regulamentação específica com apoio do setor farmacêutico, da classe profissional e
das instituições de ensino para que haja padronização das atividades operacionais e
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a presença de profissional habilitado para supervisionar, orientar e se responsabilizar


por todas as etapas da logística de remanejamento ou de descarte dos resíduos
farmacêuticos.
Deste modo, a Farmácia Solidare conta com a responsabilidade técnica do
profissional farmacêutico e possui certidão de regularidade perante ao Conselho
Regional de Farmácia do Rio Grande do Sul. O farmacêutico deve estar presente
nestes tipos de programas para que ocorra a dispensação orientada, a assistência
farmacêutica, a farmácia clínica e a cooperação com instituições de ensino para
possibilitar estágios e pesquisas técnico-cientificas (BRANDÃO; MOURA, 2010).
Ao avaliar as classes de medicamentos dispensadas pela Farmácia Solidare,
observa-se que 31 % dos medicamentos dispensados são para tratamento de
problemas cardiovasculares (Figura 2), este tipo de análise se faz pertinente para
ações de prevenção, proteção e promoção da saúde. As doenças cardiovasculares
representam um percentual significativo na morbimortalidade da população sendo,
portanto, um problema de saúde pública.
O manejo das doenças cardiovasculares na prevenção e no tratamento são
necessárias uma vez que a OMS estima que ¾ da mortalidade cardiovascular podem
ser diminuídos com adequadas mudanças no estilo de vida (SOCIEDADE BRASILEIRA
DE CARDIOLOGIA, 2013). Também com perspectivas de reduzir morbimortalidade,
estudos apontam que a inserção do profissional farmacêutico no acompanhamento,
na educação em saúde para prevenção da doença cardiovascular bem como no
acompanhamento da farmacoterapia, tem mostrado desfecho positivo na qualidade
de vida dos pacientes (ALTOWAIJRI; PHILLIPS; FITZSIMMONS, 2016).
A limitação técnica visível para a situação atual do Programa Farmácia Solidare
é o sistema de coleta dos produtos farmacêuticos. O programa conta com dispositivos
de coleta dos produtos farmacêuticos nas unidades de saúde e em empresas que
apoiam o projeto. Os dispositivos de coleta apresentam-se na forma de caixas de
papelão revestidas de material adesivo plástico com identificação do programa. As
dimensões são compatíveis a capacidade de coleta, possuindo abertura na parte
superior na altura de 1,2 m em relação ao solo. De acordo com a norma NBR
16457:2016 o dispensador contentor deve possuir características que forneçam
segurança no manejo apropriado nas operações da logística reversa dos
medicamentos, dentre elas ser rígido a puncturas e vazamentos, possibilitar o
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amortecimento da queda dos medicamentos durante o descarte e possuir um


antirretorno para o recebimento dos medicamentos descartados pelo consumidor
(ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT), 2016).
Desta forma, observa-se que o sistema adotado para coleta dos produtos
farmacêuticos não está em acordo com as normas estabelecidas pela ABNT. Além
disso, as caixas coletoras não são providas de tecnologia para identificação da origem
dos produtos. Assim sendo, levanta-se uma indagação sanitária quanto ao
armazenamento e transporte que são questionáveis, mas possíveis de ajustes com o
levantamento de projetos municipais para adequação da demanda. Apesar desta
limitação, os programas de remanejamento de medicamentos tem se tornado
populares entre os municípios e a percepção geral dos usuários para este tipo de
programa é positiva, tendo apoio de entidades nestas iniciativas e havendo a
necessidade de ampliar cada vez mais (THACH; BROWN; POPE, 2013). Futuramente
as instituições de programas de remanejamento poderão se solidificar, atingindo
grande parte da população que não tem acesso aos medicamentos e também
evitando a contaminação do ecossistema pelos produtos farmacêuticos não utilizados,
mas não resolverão uma questão delicada, a cadeia produtiva (HIRATUKA et al., 2013).
Além disso, deve-se ter conhecimento de que a grande proporção de produtos
farmacêuticos e medicamentos que chegam aos aterros ou são incinerados provem
na própria industrialização tanto nacional como internacional, ou seja, da cadeia
produtiva como um todo. Desde a síntese dos produtos químicos, passando pela
produção em larga escala pelos laboratórios farmacêuticos e chegando aos
estabelecimentos que fornecem os produtos (HIRATUKA et al., 2013). Pinto et al.,
(2014) afirmam que é relevante citar a influência da distribuição de amostras grátis
por parte dos laboratórios, através de seus representantes, sem que se tenha certeza
da sua utilização real, contribuindo então no aumento da quantidade de medicamentos
vencidos.
Conforme indicadores, há uma quantidade significativa de produtos
farmacêuticos sendo produzidos e paralelamente há uma fração também significativa
da população que não tem acesso ou que utilizou de forma parcial os produtos
farmacêuticos, consolidando-se aqui, portanto, a necessidade imediata de
estabelecer critérios e regulamentação pertinentes ao setor para o desempenho de
programas de remanejamento de medicamentos como o programa Farmácia Solidare.
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4 Conclusão
Os programas de remanejamento de medicamentos, como o programa
Farmácia Solidare do município de Farroupilha, apresentam relevância social pois
evitam que a população fique exposta aos medicamentos em desuso evitando
acidentes. Além disso, o programa possibilita o acesso a medicamentos nas lacunas
de acesso, muitas vezes por questões burocráticas, que ainda estão presentes nas
políticas públicas, evita a contaminação do ecossistema com resíduos químicos e
ainda possibilita convênios institucionais para a prática da assistência farmacêutica.
Conclui-se também que há necessidade do desenvolvimento deste tipo de serviço em
outros municípios que já tenham demonstrado interesse na implantação do programa,
bem como, a ampliação de legislação específica para este tipo de atividade, para que
ocorra a regulamentação das farmácias, padronização dos programas e dos critérios
de seleção dos medicamentos.

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