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Metodologia do

Ensino de História
Governo do Estado do Amazonas

Armazonino Armando Mendes


Governador

Universidade do Estado do Amazonas

Cleinaldo de Almeida Costa


Reitor

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Vice-Reitor

editoraUEA

Maristela Barbosa Silveira e Silva


Diretora

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Samara Nina
Produtora Editorial

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Rodrigo Choji de Freitas
Conselho Editorial
Clarice Bianchezzi
José Vicente Aguiar
(orgs.)

Metodologia do Ensino de História


Jamerson Eduardo Reis
Coordenação Editorial

Samara Nina
Projeto Gráfico

Samara Nina
Capa e Diagramação

Bianca Vieira
Gabriel Lima
Wesley Sá
Revisão

Samara Nina
Finalização

Todos os direitos reservados © Universidade do Estado do Amazonas


Permitida a reprodução parcial desde que citada a fonte

Esta edição foi revisada conforme as regras do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central da Universidade do Estado do Amazonas

J83
Metodologia do Ensino de História. - Organização: BIANCHEZZI, Clarice;
AGUIAR, José Vicente. — Manaus: Editora UEA, 2017.
202 p.: Il., color.; 21 cm

ISBN: 978-85-7883-446-3

Inclui referências bibliográficas


1. História. 2. Ensino. 3. Metodologia. 4. Humanas. I. José Vicente Aguiar. II.
Clarice Bianchezzi. III. Universidade do Estado do Amazonas.

CDU 372.89.02

Editora afiliada:

editoraUEA

Av. Djalma Batista, 3578 – Flores | Manaus – AM – Brasil


CEP 69050-010 | +55 92 38784463
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SUMÁRIO

9 Apresentação

19 História local e ensino de história

21 Sítio Arqueológico da região de Valéria/AM


turismo e educação patrimonial em contexto rural
Naia Maria Guerreiro Dias
Mary Tania Carvalho

31 Educação itinerante nas comunidades ribeirinha


de Manaus na primeira década do século XXI
Erivelto Nick Farney C. Montenegro
José Vicente de Souza Aguiar

43 Do Japão à Amazônia
história e memória da colônia japonesa na vila
Amazônia
Cristiana Andrade Butel
Mary Tania Carvalho

51 Prostituição no baixo meretrício em Manaus


1890 – 1920
Manoel Clovis Braga da Silva
Salatiel da Rocha Gomes

61 Desabastecimento da cidade de Manaus/1942-1945


visão da associação comercial do Amazonas
Daniel da Costa Silva
José Vicente de Souza Aguiar

73 O Gymnásio amazonense diante do projeto de


civilização da Belle Époque manauara no governo
de Eduardo Gonçalves Ribeiro de 1892 a 1896
Carlos Henrique Gonçalves Assis
Arcângelo da Silva Ferreira
83 Abordagem étnico-racial e ensino de história

85 Legislação indigenista e seus desdobramentos


no Amazonas republicano (1889-1910)
Máycon Carmo dos Santos
Alcemir Arlejean Teixeira

95 Regimento das missões (1686-1757)


o projeto de catequese para os indígenas das aldeias
missionárias da Amazônia colonial, na visão dos
jesuítas Antônio Vieira, João Bettendorff e João Daniel
Robert de Souza Valois Batista
Arcângelo da Silva Ferreira

103 Algumas considerações acerca da representação


do negro na historiografia regional
Alderise do Perpetuo Socorro de Freitas Esteves
Arcângelo da Silva Ferreira

113 A presença negra no Amazonas


influências históricas e culturais
Maria Cleudenice Lopes Freitas
Tenner Abreu

125 África e a formação étnica do Brasil


aprendendo a história da África em sala de aula
Sônia Aparecida Pereira de Souza
Arcângelo da Silva Ferreira

135 Cinema e ensino de história

137 Cinema e ensino de história


o uso de filmes como instrumento didático em uma
escola em Parintins
Jessica Dayse Matos Gomes
Diego Omar da Silveira

149 Olhares sobre a escravidão


história e cinema
Licindio Dolzane dos Santos Júnior
Alcemir Arlejean Teixeira
Gênero e ensino de história

161 A padronização do comportamento feminino


por meio dos jornais e da literatura na cidade de
Belém nas primeiras décadas de 40 do século XX
Bruno Silva Monteiro
Arcângelo da Silva Ferreira

171 O imaginário da mulher nas colunas sociais e


policiais do jornal O Diário de Manaós no ano de 1890
Railda Pedrosa Ferreira
Arcângelo da Silva Ferreira

181 Ensino de história e outros temas

183 A utilização do livro didático de história


práticas e possibilidades no 6° ano do ensino
fundamental em três escolas estaduais de Parintins
Lucileni de Souza Menezes
Noélio Martins Costa

193 Diversidade religiosa no ensino de história


reflexões sobre a prática docente
Eliomar Cardoso Novo
Diego Omar da Silveira

205 As permanências do novo


multidão e protestos populares em Thompson e
Hobsbawm
Alonso Guilherme Soares Lima
Arcângelo da Silva Ferreira

215 A ditadura civil-militar e o ensino de história


reflexões e apontamentos teórico-práticos
Klinger Tavares Farias
Diego Omar da Silveira

227 Reflexões sobre a utilização de objetos de


aprendizagem no ensino de história
Mary de Lima Rates
Salatiel da Rocha Gomes
CINEMA E ENSINO DE HISTÓRIA: O
USO DE FILMES COMO INSTRUMENTO
DIDÁTICO EM UMA ESCOLA EM
PARINTINS
Jessica Dayse Matos GOMES49
Diego Omar da SILVEIRA50

O presente texto analisa brevemente como os filmes têm


sido trabalhados pelos professores de História nos anos finais
do Ensino Fundamental e no Ensino Médio em uma escola da
rede pública em Parintins, no Amazonas. Problematiza também
em que medida os estudantes têm compreendido conteúdos
históricos através dos filmes, quando estes são de fato utilizados
de acordo com uma metodologia e com finalidades claras e
bem definidas – seja nas salas de aula ou em ambientes menos
formais de ensino-aprendizagem. Partimos de uma bibliografia
já relativamente vasta (e que não para de crescer), da observação
participativa e da experiência como docentes envolvidos com
propostas de utilização do audiovisual para discutir alguns temas
que constam nos currículos oficiais de História Geral e do Brasil.
De modo geral, as relações entre historiadores e os
filmes são bastante complexas e difíceis de definir: vão da
desconfiança do cinema como fonte e objeto de análise até a
aceitação, mais contemporânea, da linguagem fílmica como
narrativa historiográfica (cf. Mauad; Knauss, 2006). Marc
Ferro (2010) já apontava há algumas décadas o equívoco de
tratar as representações cinematográficas como condizentes
com uma suposta “verdade histórica” e apontava os caminhos
para a produção de uma “contra-análise da sociedade”, capaz
de revelar, por meio das imagens, o seu “avesso” e “os lapsos”
entre aquilo que um grupo ou uma instituição projeta sobre si
49
Especialista em Metodologias do Ensino de História pela Universidade do Estado do
Amazonas (UEA) e mestra em Sociedade e Cultura na Amazônia pela Universidade Federal
do Amazonas (UFAM). É professora de História no Ensino Fundamental na rede estadual
(SEDUC) em Parintins.
50
Mestre em História pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). É professor do
curso de História do Centro de Estudos Superiores de Parintins (CESP) da Universidade
do Estado do Amazonas (UEA) e organizador do livro Cine-História. Ensino, pesquisa e
extensão com audiovisual na Amazônia. Rio de Janeiro: Autografia, 2017.

137
e o que de fato ela é. Mais contemporaneamente, a maioria dos
programas de estudo tem assumido a tarefa de considerar os
filmes (individualmente ou no conjunto de uma produção) em
primeiro lugar como uma “representação, isto é, um conjunto de
ideias que compõem a trama”, depois como uma “uma estrutura,
mais próxima de uma abordagem sintática” e, por último, como
um ato, inserido em um “processo dinâmico de apresentação
de uma história a um receptor” que varia conforme os tempos,
lugares e condições econômicas.
Esse deslocamento implicou também no reconhecimento
de que “o cinema não é apenas uma prática social”, mas, como
considera Alexandre Busko Valim (2012, p. 284), “um gerador
de práticas sociais” que surgiu com as sociedades modernas
e foi se adaptando às várias fases da modernidade. “Além de
ser um testemunho das formas de agir, pensar e sentir de uma
sociedade, é também um agente que suscita transformações,
veicula representações e propõe modelos” e que, foi por isso,
tão utilizado pelas forças políticas, seja para bem formar o
cidadão (na perspectiva dos poderes hegemônicos) ou para
suscitar levantes sociais contra a ordem estabelecida. No campo
da educação, seu uso em espaços formais ou não-formais é
relativamente recente, se torna mais comum na segunda metade
do século XX – o pós-guerra para os países desenvolvidos e
décadas de 1970 e 1980 para o Brasil. As maneiras pelas quais
se utiliza o “cinema na escola” ou pela qual “a escola vai ao
cinema” continua passível de problematização.

Ensino de história e o uso de filmes

Em uma concepção mais tradicional, a utilização de filmes


na escola e/ou na sala de aula tornou-se algo relativamente
rotineiro, mas que tem por finalidade o entretenimento dos
alunos. Em suas reflexões, Rosália Duarte (2009, p. 70) chama
nossa atenção para algo com o que nos deparamos com certa
frequência: professores que fazem “uso dos filmes apenas como
recurso didático de segunda ordem, (...) para ‘ilustrar’, de forma
lúdica e atraente, o saber que acreditamos estar contido em
fontes mais confiáveis”. Outras vezes, se recorre aos filmes com
intenções ainda menos nobres, como suprir a ausência de um
professor ou substituir repentinamente uma atividade externa

138
frustrada pela chuva ou uma viajem não realizada por falta
de transporte. Nesses casos, recorre-se às precárias videotecas
escolares ou a qualquer material disponível e exibem-se filmes
sem nenhuma reflexão sobre seu conteúdo, qualidade estética
ou adequação à faixa etária dos estudantes.
Observando a recorrência com que esses eventos,
lamentavelmente, se repetem, nos lançamos em uma reflexão
que busca problematizar a relação entre cinema e escola, e
que compreende o ato de ver um filme como algo tão relevante
para a formação integral da criança e do adolescente quanto ler
obras da literatura, filosóficas, sociológicas e outras mais. Além
disso, buscamos realçar que em um contexto de aprendizagem
significativa nada deve ser feito sem um objetivo pedagógico
previamente traçado. Isso equivaleria “a manusear um livro sem
que este seja lido” pelo aluno – que “vê, mas não lê”, da mesma
forma que nada apreende do filme que foi “passado”, sem que
houvesse para isso uma razão (THIEL; THIEL, 2009, p. 13).
Essa utilização crítica e consciente do cinema como
ferramenta de ensino está prevista nos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs), tanto para a abordagem de temas transversais
quanto para tratar de assuntos previstos nos conteúdos da área
de História. Em ambos os casos de criar, nos diferentes níveis
de ensino, estratégias para estimular adequadamente o gosto
pelo cinema, da mesma forma fazemos com a literatura e as
outras artes, pensando nos vários níveis de articulação que
elas apresentam com determinadas realidades sociais. O que
significa, por sua vez, “dispor de instrumentos para avaliar,
criticar e identificar aquilo que pode ser tomado como elemento
de reflexão sobre o cinema, sobre a própria vida e a sociedade
em que se vive” (DUARTE, 2009, p. 72).
Nessa perspectiva, o cinema como recurso didático no
ensino de História pode ser tomado como uma peça-chave,
“fundamental para a problematização, contextualização e
construção histórica de temas propostos pelo professor, como
também uma possibilidade prazerosa de análise posterior
dos alunos” (SANTOS, s/d, p. 06). Mas o professor que utiliza
filmes na sala de aula deve estar atento para as mensagens
transmitidas em cada produção, sua adequação para trabalhar
determinados temas históricos e os níveis de linguagem (mais
metafórica ou mais realista em que cada película opera. Não

139
importa se há correspondência literal – o que por sinal é quase
impossível – entre o acontecido e o narrado, mas sim que
aprendamos a questionar as representações do passado e suas
implicações atuais. “Carruagens, naves espaciais, máquinas
do tempo; índios, cowboys, prostitutas e astronautas; castelos,
cocheiras e albergues; velas e candelabros e até mesmo os gestos
e afala dos atores carregam marcas de como a humanidade
representa (imagina) sua história” e, portanto, podem ser
tomados como “indicadores das mudanças históricas pelas quais
o cinema passou. Um olhar mais atento permite identificar em
praticamente qualquer filme conteúdos e tema que interessam
ao ensino de História” (DUARTE, 2009, p. 75).
Roberto Abdala Júnior (2005, p. 01) considera que “a
história sempre fascinou cineastas e, a despeito das críticas
que deferiram às produções cinematográficas, os historiadores
nunca deixaram de frequentar as salas de cinema e até os sets de
filmagem”. Outras vezes colaboraram com roteiros e investiram
em produções do estado que tinham caráter marcadamente
pedagógico. Esse é por exemplo o caso do cinema educativo que
se expandiu na Europa já depois da Primeira Grande Guerra,
mais precisamente entre os franceses, alemães, italianos e
soviéticos e estimulou a criação de institutos de cinema
educativos com produção própria (CAPARRÓS-LERA; ROSA,
2013, p. 191ss.). No Brasil, de acordo com a Revista Nacional
de Educação (1932, p. 05), o cinema voltado a fins educativos
foi sinalizado pela primeira vez em 1928 pelo diretor geral
da Instrução Pública do Distrito Federal – Fernando Azevedo
– através do decreto 2.940. A criação do Instituto Nacional de
Cinema Educativo (INCE), pelo governo de Getúlio Vargas, em
1936, também se configura como um passo importante para a
introdução dessa modalidade de produção cinematográfica em
nosso país e trabalhos frutíferos, mas infelizmente ainda pouco
valorizados como o de Humberto Mauro, servem de exemplo
dessa aposta “na modernização cultural e política do país, na
secularização da cultura e na publicização da educação como
instrumentos essenciais de democratização das instituições”
(RANGEL, 2010, p. 39).

140
Resultados e discussão

Para a realização deste trabalho, que visa abordar


experiências como filmes no ensino de História em uma escola
pública de Parintins, alguns procedimentos metodológicos foram
fundamentais. Seguimos aqui a indicação tanto de Alexandre
Busko Valim (2012) quanto de Luciana Pinto (2004, p. 04) que
propõem uma análise do cinema em pelo menos dois níveis: 1)
a história no cinema, que analisa os filmes enquanto fontes de
documentação histórica e meios de representação da história,
com a possibilidade de utilizá-lo em conjunto com outras fontes;
2) o cinema na história, em que se analisa a repercussão que
os filmes alcançam na sociedade, podendo assumir um papel
importante no campo da propaganda política e na difusão de
ideologias, bem como sua recepção em diferentes públicos e
momentos históricos.
Ambas as formas foram levadas em consideração ao longo
dos meses em que realizamos observações em duas turmas,
uma do 9º ano do Ensino Fundamental e outra do 3º ano do
Ensino Médio. Também conversamos com professores da área
de ciências humanas sobre os filmes de sua preferência, sobre
a utilização do cinema em sala de aula e sobre a adequação de
tratar a história por meio de filmes. Nesse último caso nossos
guias para analisar as falas dos docentes foram os livros Cinema
& Educação, de Rosália Duarte (2009) e Como usar o cinema na
sala de aula, de Marcos Napolitano (2013).
Na turma de 9º ano, quando estávamos abordando
questões relacionadas aos impactos da Segunda Guerra Mundial
no Brasil e, consequentemente, para a nossa região, exibimos um
documentário sobre a imigração japonesa para o médio-baixo
Amazonas, no sentido de expor aos alunos um dos pontos de vista
sobre o cultivo da juta e o apogeu econômico do local, diretamente
ligados à formação dessas colônias nipônicas. Priorizamos o uso
de documentário, pois, ele nos pareceu, naquele momento, “mais
fácil ou até mais apropriado que o filme de ficção. A linguagem dos
documentários é mais clara (...) e outra vantagem (...) é o tempo
de duração” (CAPARRÓS-LERA; ROSA, 2013, p. 205). Além disso,
o vídeo apresentava perspectivas das pessoas envolvidas nesse
processo, de seus descendentes e permitia discutir com maior
concretude acerca da construção de uma memória da presença

141
japonesa em um meio no qual algumas das marcas visíveis,
materiais, já foram apagadas pelo tempo e sobre a qual restam
poucos testemunhos históricos/historiográficos.
O conteúdo foi trabalhado ao longo de três aulas e nelas
pude observar – por meio dos debates que surgiram após a
apresentação do documentário – que esse tema de estudo antes
considerado distante e sem implicações para o local passou a ser
tratado de outra forma. Por meio de fotografias e depoimentos
orais os alunos forma instigados a constatar outros aspectos
dessa imigração, inclusive constatando que os japoneses
vieram a se somar, do ponto de vista étnico, na composição
do amazônida. De modo geral, ficou um tanto evidente que a
maioria dos alunos conhecia pouco a história local (inscrito
no currículo dos anos iniciais do Ensino Fundamental) e que
muitos nunca haviam se questionado sobre a historicidade do
processo de imigração japonesa. Também observaram que o
tema é tratado nas páginas de livros didáticos produzidos no
Sudeste do país, enquanto praticamente nada circula sobre o
assunto no Norte do Brasil. Após as discussões, solicitamos um
texto dissertativo onde os estudantes apresentaram suas leituras
do documentário e do conteúdo ensinado.
Com a exibição desse documentário, nos vimos trabalhando
a temática descrita no currículo e também desenvolvendo
importantes reflexões sobre o conhecimento da história local
e sua relação com a macro-história, nacional e mundial. Sobre
exercícios desse tipo Mônica Fantin (2007, p. 123) afirma que o
cinema realiza o encontro de práticas socioculturais distintas,
sendo então, um agente que sociabiliza e permite reunir pessoas
das mais diferentes naturezas: encontros na sala de exibição, das
pessoas com elas mesmas, das pessoas com as histórias nos filmes,
das pessoas com as culturas nas várias representações sugeridas
nos filmes e com imaginários sociais diversos, etc. Há encontros
de identidades com os imaginários cinematográficos onde o
filme também pode ser entendido como meio de consciência
intercultural, também de lugar de reconhecimento local e/ou
oportunidade de afirmação de discutíveis domínios culturais.
Para a turma de 3º ano do Ensino Médio foi utilizado o
filme Uma história de amor e fúria, do gênero animação, que
apresenta o amor entre um herói imortal e Janaína passando
por quatro fases da história do Brasil (600 anos). A colonização,

142
a escravidão, a ditadura civil-militar e o ano de 2096. Em todas
essas fases, as personagens vivenciam um romance marcado por
encontros e desencontros e recortado por violência e problemas
sociais, políticos e ambientais, como na última fase – futurística
– quando a água é escassa, gerando guerras em torno da disputa
por recursos hídricos.
Devido a atenção dada ao cinema e o estilo anime/HQ
utilizado no filme, pudemos desenvolver os temas abordados
na película em uma linguagem muito apreciada pelos jovens,
revisando diferentes eventos e contextos da história do Brasil,
mas sem o viés da história oficial, com o encadeamento de ideias
proposto nos suportes mais tradicionais, como o livro didático,
por exemplo. Abrangendo temas como o “início da colonização”,
a “balaiada” e a “ditadura civil-militar”, o filme nos permitiu
fazer revisões sobre os mesmos, mas a partir de um elemento
novo e esteticamente mais atraente. Após a exibição, foi realizada
uma roda de conversa para que todos pudessem elaborar seus
pontos de vista acerca do que viram. Eventuais dúvidas foram
dirimidas e novos problemas sobre as temáticas tratadas no
audiovisual foram formatadas: a violência e a exploração das
riquezas naturais durante a colonização em oposição aos saberes
tradicionais dos povos indígenas, que viviam antes da chegada
do europeu em harmonia com a natureza; os movimentos sociais
e as revoltas populares, como a “balaiada” também chamaram
a atenção dos alunos, sobretudo por ser projetada do ponto de
vista de um participante, permitindo falar sobre “heróis que
morreram e não viraram estátua”.
Outro assunto que despertou os estudantes foi a ditadura
e a luta contra violência do Estado e a censura, a partir do que
tentamos desdobrar um debate sobre os “não-ditos” da História e
o lado obscuro das ditaduras. O tema também instigou o debate
sobre o movimento estudantil, culturas juvenis jovens e luta pela
cidadania. Para finalizar as reflexões sobre o filme Uma História
de amor e fúria, na aula seguinte à exibição foram feitas análises
sobre a realidade futura apresentada na parte final da narrativa.
Nela se projeta um país cheio de corrupção e onde a pouca água
potável que resta é reservada aos ricos, enquanto os mais pobres
mendigam para saciar sua sede. O crescimento das desigualdades
sociais e a crise ambiental – e o que se pode fazer em relação
a esses problemas – foram temas destacados pelos alunos, que

143
expuseram suas ideias, não isentas de equívocos e estereótipos,
mas que, de qualquer forma puderam ser discutidas em espaço
público e de maneira horizontal e democrática. Pudemos
observar certa dificuldade de compreensão do filme por parte
dos alunos, uma vez que as quatro fases apresentadas não são
exploradas em profundidade e que é o expectador que tem que
atuar, organizando mentalmente uma mensagem mais complexa
do que comumente observamos nos filmes de Hollywood, que
“passam na televisão”.
Das conversas que tivemos com os demais professores
de História e ciências humanas da escola, ficou a impressão
de que a maioria utiliza os filmes, mas que têm dúvidas sobre
a melhor forma de fazê-lo e que não dominam uma discussão
metodológica sobre cinema - educação. Questionados sobre
os filmes que utilizam nas aulas de História, três professores
afirmaram que exibem com frequência longas - metragens
como Tempos Modernos, Cruzada, Apocalypto, 1492: a conquista
do paraíso, O homem da máscara de ferro, A lista de Schindler.
Entre os brasileiros, o mais citado foi Caramuru, a invenção
do Brasil. A questão do tempo foi a mais apontada, já que um
filme quase sempre dura mais que uma hora-aula e fica difícil
compatibilizar a apresentação do filme com a discussão em um
só dia. Pode-se retornar ao tema dois ou três dias depois, mas
sem a mesma riqueza de detalhes que se teria ao discuti-las logo
após o término da exibição. Poucos conhecem documentários e
indicam a dificuldade de consegui-los como um inconveniente.
Além disso, nem todas as escolas dispõem de um espaço
adequado para as exibições. Em alguns casos, elas são feitas em
televisões, o que aniquila a possibilidade de trabalhar aspectos
visuais do cinema, como a projeção. Isso é tão mais importante
na medida em que consideramos que, em Parintins – cidade
que teve sucessivas salas de exibição ao longo do século XX –
não existe atualmente cinema, nem mesmo comercial. Mais
recentemente um cineclube atende à população no Liceu de
Artes e Ofícios Claudio Santoro (Bumbódromo).
Ainda com essas dificuldades apostamos que é possível
aprender um pouco de História com o cinema e que, como forma
de cognição, essa arte serve para interpretar a ação humana em
diferentes lugares e contextos. Essas experiências impregnadas
de tensões, rupturas e permanências modificam o modo como

144
os sujeitos pensam a si mesmos, aos outros e do mundo em que
veem e vivem. Lara Rodrigues e Cristiani Bereta da Silva (2014, p.
333) contribuem para o nosso debate quando afirmam que saber
analisar criticamente a obra fílmica visualizada na sala de aula
contribui para que os alunos treinem sua ótica para os filmes que
vierem a assistir no ambiente familiar ou nas salas de projeção
dos cinemas. Essa preparação para decodificar as finalidades, os
objetivos e as entrelinhas existentes em cada filme acabam por
potencializar o repertório de saberes científicos, conquistados
pelos discentes, nos limites ou fora dos muros da escola.

Considerações finais

Realizar aulas que motivem ainda mais a aprendizagem


histórica não é uma prática que alcança sucesso de maneira
imediata, pois, requer um misto de teoria e prática, dedicação,
criatividade e paciência, uma vez que, o professor pode alcançar ou
não o que foi esperado em seu planejamento didático. Na medida
em que adquirimos alguma experiência, as coisas se tornam menos
difíceis e a utilização dos filmes como instrumento nas salas de
aulas, em especial para tratar de História, se torna mais leve e
fluida. O que não significa que o professor possa estar menos
atento. Como alerta Napolitano (2013), são inúmeros os cuidados
que o professor deve ter com a escolha do material, verificação dos
equipamentos e preparação do debate (com uma ficha do filme,
contendo os dados básicos da produção: direção, duração, ano,
local de produção, gênero, distribuição e classificação). Atuando
dessa forma ele se cerca dos cuidados necessários para que exista
uma articulação entre o filme exibido e o conteúdo curricular,
reforçando nos estudantes as competências e habilidades que
devem ser trabalhadas em sala de aula, ampliando sua “capacidade
narrativa e descritiva” para decodificar “signos e códigos não
verbais” e aperfeiçoando “a criatividade artística e intelectual”,
além da “capacidade crítica sociocultural e político-ideológica”
(NAPOLITANO apud FREITAS, 2012, p. 99).
O documentário e o filme exibidos nas turmas alcançadas
pelo nosso projeto chamaram a atenção dos alunos para a
importância de eles conhecerem múltiplas narrativas históricas
e identificarem que as representações cinematográficas não são
inocentes, ao contrário se vinculam às ideologias dominantes

145
(no caso dos filmes que servem ao mercado) ou a projetos
alternativos de sociedade. Buscamos esclarecer que o que
importa não é a representação realista do evento, mas a validade
das metáforas e das discussões levantadas, em filmes que às
vezes caricaturam propositalmente um evento, como forma de
promover a crítica social. Outras vezes conseguimos que eles
problematizassem questões do seu entorno mais direto por meio
das estórias ou de elementos presentes em determinada obra.
Quanto aos professores, mesmo afirmando que existem
inúmeras dificuldades em trabalhar com filmes na sala de
aula – e indicando que necessitam de formação para isso –
eles apontam no cinema uma forma de tornar a relação de
ensino-aprendizagem mais lúdica e prazerosa. O que significa
também uma aposta de que as discussões sobre cinema, história
e educação devem ser cada vez praticadas, abrindo assim novas
perspectivas no ensino (de História) na atualidade.

REFERÊNCIAS

ABDALA Jr., Roberto. O cinema é uma outra história:


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on-line de Ciências da comunicação, 2005.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros
Curriculares Nacionais: História. Brasília: MEC/ SEF, 1998.
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DUARTE, Rosália. Cinema & Educação. 3. ed. Belo Horizonte:
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FANTIN, Mônica. Mídia-educação e cinema na escola. In: TEIAS.
Rio de Janeiro, ano 8, n. 15-16, janeiro-dezembro de 2007.
FREITAS, Enio de. História e Cinema: encontro de conhecimento
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NAPOLITANO, Marcos. Como usar o cinema na sala de aula. ed.
5. São Paulo: Contexto, 2013.

146
PEREIRA, Lara Rodrigues; SILVA, Cristiani Bereta da. “Como
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Passo Fundo: UPF, v. 21, n. 2, p. 318-335. Julho - Dezembro de
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PINTO, Luciana. O historiador e sua relação com o cinema. In:
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Flamarion; VAINFAS, Ronaldo (org.). Novos Domínios da História.
Rio de Janeiro: Campus: Elsevier. p. 283-300, 2012.

FILMES
UMA HISTÓRIA de amor e fúria. Direção: Luiz Bolognesi.
Duração: 75 min. Ano: 2012. País: Brasil. Gênero: Animação/
ficção. Distribuição: Europa Filmes. Classificação: 12 anos.
VILA AMAZÔNIA – 80 Anos de Imigração Japonesa na Amazônia.
Série Vila Amazônia I. País: Brasil. Manaus, 2011. Gênero:
Documentário. Não comercializado. Classificação livre.

147

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