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AS LEIS OA IMET so levadas a0 exagero. Noutros termos, a imitagao deles mesmos por eles mesmos (a meméria eo hébito, com efeito, nao sao outra coisa) 6 neles téo notdvel como a imitagao de outrem. Nao existe uma ligagdo entre estes dois factos? "No se pode compreender muito claramente, diz Maudsley com insisténcia, que haja_no sistema nervoso uma tendéncia inata para a imitacdo". Se esta tendéncia 6 inerente aos itimos elementos nervosos, & permitido conjecturar que as relagées de célula a célula no interior de um mesmo cérebro poderiam 0 bem, ndo existir sem analogia com a relacéo singular de dois cérebros. dos quais um fascina o outro, e consistir, & semelhanca desta, numa polarizacéo particular da crenga e do desejo armazenados em cada um dos seus elementos. Assim talvez se explicassem certos factos estranhos, por exemplo, no sonho, 0 arranjo espontaéneo de imagens que se combinam segundo uma certa Idgica prépria, eviden- temente sob o dominio de uma de entre elas que se impde e dé o tom, isto 6, sem duvida em virtude do elemento nervoso predominante em que ela residia e don- de saiu (1), (1) Esta visdo esté de acordo con a de ideia-nestra desenvolvida por M. Paulhan na seu Livro, tao profundanente pensado, sobre a ACTIVIDADE MENTAL (Alcan, 1889). 14 CAPETULO IV A arqueologia ea estatistica © que 6 a hist6ria? Tal é a primeira questéo que se nos apresenta. Seremos levados pelo caminho mais natural € responder-Ihe e a formular as leis da imitacdo, ocupando-nos de duas espécies de pesquisas bem distin tas que 0 nosso tempo pés em grande destaque: os estudos arqueolégicos e os estudos estatisitcos. Vamos mostrar que elas séo conduzidas inconscientemente & medida que elas delimitam melhor 0 seu caminho Util e fecundo, para Perspectivar os fenémenos sociais sob um aspecto seme- Thante 20 nosso, e que sob este ponto de vista os resul: tados gerais, os tragos salientes destas duas ciéncias, ou antes destes dois métodos tao diferentes, apresentam uma notével concordéncia. Consideremos primeiro a ar- queologia I Se os craneos humanos séo encontrados numa se- Pultura galo-romana ou numa caverna da idade da pedra, a0 lado de utensilios diversos, 0 arquedlogo guardard os utensilios © enviard os craneos ao antropélogo. Enquanto este se ocupa das racas, aquele ocupa-se das civilizacdes. Bem se quiseram delimitar ou interpenetrar; mas nao séo menos radicalmente diferentes do que uma linha hori- zontal o pode ser da sua perpendicular, mesmo no seu Ponto de intersecgao. Ora, do mesmo modo que um, igno- rando totalmente a biografia do homem de Cro-Magnon ou de Neanderthal que ele estude, © sem se importar 115 AS LEIS A DHLTAGKO com isso se dedica exclusivamente a distinguir de craneo fem créneo, de esqueleto em esqueleto, um mesmo traco de raca, reproduzido e multiplicado pela hereditariedade @ partir de uma singularidade individual até qual ele se esforcaria em vao, aliés, por chegar, 0 outro, de forma semelhante, sem conhecer trés quartas partes do tempo do nome dos mortos pulverizados que Ihe deixaram os Seus despojos para decifrar como um enigma, nao vé e& do procura neles sendo os processos artisticos ou indus- triais, os dogmas, os ritos, as necessidades e as crengas caracteristicas, as palavras e as formas gramaticais, ates tadas pelo conteddo da sua sepultura, todas estas coisas transmitidas e propagadas por imitacdo a partir de um inventor quase sempre ignorado, miltiplas irradiagées de que cada um destes exumados onénimos foi o vefculo efémero @ 0 simples lugar de cruzamento. A medida que mergulha num passado mais profundo, © arqueélogo perde mais de vista as individualidades; para 1 do século XIl, 05 manuscritos j4 Ihe comegam a faltar e eles prdprios, alias, 0 mais das vezes actos off interessam-no Sobretudo pelo seu cardcter impessoa Depois, os edificios ou as suas ruinas, enfim, quaisquer restos de olaria ou de bronze, quaisquer armas ou instru- mentos de silex, oferecem-se sozinhos as suas conjecturas, E como 6 maravithoso ver o tesouro de indugdes, de factos, de ensinamentos inaprecidveis que 0s pesquisadores da nos- sa 6poca extrairam, sob esta modesta forma, das entranhas da terra, por todo'o lado onde a sua picareta bateu, em Itélia, na Grécia, no Egipto, na Asia Menor, na Mesopo- tamia, na América! Houve um tempo _em que a arqueologia como a numismética, néo era senéo a criada da hist6 pragmética, em que ndo se teria visto no labor actual dos egiptélogos sendo o mérito de confirmar o fragmento de Maneton. Mas, no presente, os papéis foram invertidos: 08 historiadores j4 ndo séo mais do que os guias secun- dérics © os auxiliares dos escavadores que, revelando-nos © que aqueles nos escondem, nos pormenorizam, por assim dizer, a fauna e a flora desenhadas por estes paisagistas, as riquezas de vidas e de regularidades hermoniosas dis 116 A ARQUEOLOGIA EA ESTATISTICA simuladas sob este pitoresco. Por eles, sabemos de que conjunto de ideias particulares, de segredos profissionais ou hierdrquicos, de necessidades prdprias, se compunha © que 0s analistas chamam um Romano, um Egipcio, um Persa; e também em que espécie desses factos violentos, feputades culminantes que se chamam conquistas, invasdes, revolugdes, eles nos fazem entrever a expansao ‘incerta ¢ indefinida'e a sobreposicdo dos sedimentos da histéria verdadeira, a estratificacdo das descobertas sucessivas Propagadas contagiosamente. Colocam-nos, portanto, no melhor ponto de vista para julgar que os’ factos violentos, diferentes entre eles @ alinhados em séries irregulares, tal como os cimos dos montes, serviram simplesmente para favorecer ou para entravar, para apertar ou estender nos limites mais ou menos mal definidos, a propagagao regular © tranquila de tais ou tais ideias de génio. E, como Tucidides, Herédoto, Tito Livio se tomam simples cicerones, algumas vezes Gteis, outras vezes enganadores, para uso’ dos antiquérios, assim os herdis dos primeiros capitées, homens de Estado legisladores, podem passar pelos servidores inconscientes © por vezes contrariadores desses inumerdveis e obscuros inventores, dos quais os segundos descobrem ou circuns- crevem com tantos esforcos a data e 0 berco ainda mais que © nome: 0 inventor do bronze, o inventor do algodéo e da vela, da charrua, da arte de tecer, o inventor da escrita! Néo & que os grandes politicos e os grandes querreiros néo tenham tido, certamente, ideias novas brithantes, verdadeiras invencdes no sentido lato do termo, mas invenges destinadas a nao ser imitadas (1). Que se Ines chame planos de campanha ou quaisquer expedientes parlamentares, leis, decretos, golpes de estado, elas nao tomam parte na Histéria a ndo ser se contribuirem para importar ou insuflar outras categorias de invences jd (1) Se 0 si0, & contra a vontade dos seus autores, por exenplo o ovinento giratério de Un qe os Alenies tio habilmente souberam copier contra o sobrisho de Napoledo. AS LEIS DA ho conhecidas, destinadas, elas, @ serem imitadas pacifica~ mente. A histéria no se ocuparia mais das manobras de Maratona, Arbela ou de Austerlitz do que de belas partes de fracassos se estas vitérias nao tivessem tido sobre 0 desenvolvimento asidtico ou europeu das artes gregas ou das instituigdes francesas a influéncia que se sabe. ‘A historia, tal como se ouve, nao passa, em suma, prestado ou do obstéculd posto, por invengdes idade_momenténea, a um Conjunto de invengSes indefinidamente imitaveis ¢ uteis. Quanto a suscitar directamente estas, aquelas nao conse- quem mais do que a elevacao dos Pirinéus que nao bastou para fazer nascer a camurca uo levantamento dos Andes para tazer crescer a asa do condor. £ verdade que a sua acgdo indirecta 6 considerével: antes de mais, nao sendo uma invengéo, sendo 0 efeito de um encontro singular de imitagBes heterogéneas num cérebro — num oérebro ox cepcional, 6 verdade —, tudo 0 que abre novas, safdas bs irradiagdes imitativas diferentes tende a multiplicar oportunidades de semelhantes singularidades (1). Fi Mas abro um paréntesis para prevenir uma objeccdo. Vocé exagera, dir-me-do, a estupider humana e a sa importéncia social assim como a da imaginagao inventive. © homem néo inventa pelo prazer de inventar, mas para responder a uma necessidade sentida. © génio desabrocha na sua hora. E, portanto, a série das necessidades, nao 2 das invengées, que importa sobretudo anotar, e a ci- vilizacéo 6 a multiplicagao ou a substituic3o gradual das necessidades tal como a acumulagao e a substituicao graduais das inddstrias e das artes. — Por outro lado, © homem ndo imita sempre pelo prazer de imitar quer 08 seus antepassados, quer os estranhos seus contempordneos. (A) Exenplo da influéneia indirecta da initagio sobre 2 invencao na continuagaa da moda crescente de ir tonar aguas, tendo-se feito sentir 2 utilidede (2) de descobrir novas fontes minerais, desco- briran-se ou captaran-se EM FRANCA, de 1838 2 1863, duzentas © trinta e quatro novas fontes. 118 De entre as invengdes que se oferecem a sua imitagdo, de entre as descobertas ou ideias teéricas que se oferecem & sua adeséo (a sua imitagdo intelectual), ele imita, ele adopta somente, o mais das vezes, ou cada voz mais, as que Ihe parecem uteis ou verdadeiras. E, portanto, a pro- cura da utilidade € da verdade, néo a ‘agao imitaga0, que caracteriza o homem soci poderia ‘ser definida como a ut trabalhos, a verificagéo crescente dos pensamentos, muito mais do que a assimilagéo crescente das actividades mus- culares © corebrais. Eu respondo recordando antes de mais que, nao Podendo a necessidade de um objecto preceder a sua nocdo, nenhuma necessidade social pdde ser anterior A invengéo que permitiu conceber a mercadoria, o artigo, © servico préprio para a satisfazer. E verdade que esta invengao foi a resposta a um desejo vago, que, por exemplo, a ideia do telégrafo eléctrico respondeu ao problema, desde hd muito posto, de uma comunicagao epistolar mais répida; mas 6 especificando-se daf 0 modo que o desejo se espalhou e fortificou, e ele nasceu no mundo social; & ele proprio, por outro lado, ndo fol sempre desenvolvido Por uma invenco ou por uma série de invengdes mais antigas, isto 6, no exemplo escolhido, pelo estabelecimento dos correios, © depois do telégrafo aéreo? Nao exceptuo mesmo as necessidades fisicas, as quais ndo se tornam forgas sociais, também elas, a 'ndo ser por uma especifi- cacao andloga, como eu jé tive ocasiéo de chamar a atengéo. E demasiado claro que a necessidade de fumar, de tomar café, ché, etc., 6 apareceu depois da descober_ ta do café, do ché, do tabaco. Outro exemplo, entre mil: "O vestuério ndo se segue ao pudor, diz muito bem M. Wiener (© Perd); mas, ao contrério, o pudor manifesta-se na sequéncia do vestudrio, isto 6, 0 vestuério que esconde tal ou tal parte do corpo humano ‘faz parecer inconveniente @ nudez dessa parte que se tem o hébito de ver coberta". Noutros termos, a necessidade de estar vestido, enquanto necessidade social, tem por causa a descoberta do ves- tudrio e de certo vestudrio. Longe de ser o simples efeito 119 AS LETS DA IMITAGKO A ARQUEOLOGIA E A ESTAT das necessidades sociais, portanto, as invengdes séo a sua causa, e nao creio t@-las sobrevalorizado. Se os in- ventores num dado momento viram a sua imaginagao para o lado que thes indicam as necessidades vagas ‘do piblico, 6 preciso nao esquecer, repito-o, que o ptblico foi arrastado no sentido destas necessidades por inventores anteriores, que, também eles, cederam a influéncia in- directa de inventores mais antigos; e assim sucessivamente, até que, em dofinitivo, na origem de qualquer sociedade e de qualquer civilizagao, se encontram, como dados pri- mordiais e necessdrios, por um lado, sem duvida, inspi- ragdes muito simples embora muito dificeis, devides a necessidades inatas e puramente vitais em muito pequeno ndmero; por outro lado, e mais essencialmente ainda, descobertas acidentais feitas pelo prazer de descobrir, ples jogos de imaginagao naturalmente criadora. Quantas guas, quantas religides © poesias, quantas inddstrias mesmo tém este ponto de partida! Isto para a invencdo. A mesma resposta para a imitagao. Nao se faz tudo o que se faz por rotina ou por moda; nao se acredita em tudo 0 que se acredita por preconceito ou sob compromisso; 6 verdade, embora a credibilidade, a docilidade, a passividade populares ultra passem imensamente os limites admitidos. Mas ainda mesmo que a imitacéo seja electiva e reflectida, que se faca o que parece mais util, que se acredite no que pa- rece mais verdadeiro, as acgdes e os pensamentos que se escolheram foram-no: as acgées, porque elas eram as mais préprias para satisfazer e desenvolver as necessidades de que 2 imitagao anterior de outras invencdes anteriores tinha depositado 0 primeiro germe em nés (1); os pensa- (A) Nao & somente pela natureza das necessidades ou dos desejos an- teriores, é ainda pela das leis do pais relativas, por exemplo, 4 proibigao de tal indistria, ov a livre troca, ou 8 instrugao obri- gatéria de tal ou tal rano do saber que se é influenciado ou deter- mminado na escolha da sua carreira au da sua doutrina, das suas acgdes @ das suas ideias, sempre copiadas de outro. Mas as leis 120 mentos, porque eles concordavam 0 melhor possivel com o conhecimento jé adquirido por nds de outros pensamentos também eles bem recebidos em razdo da sua confirmagao por outras ideias vindas até nés previamente ou por im- pressdes técteis, visuais e outras que nds conseguimos ao renovar por conta prépria experiéncias ou observacées cientificas, a exemplo dos seus primeiros autores. Vé-se, assim. as ‘imitagdes como as invengdes, encadearem-se sucessivamente, apoiarem-se umas nas outras, quando nao cada uma sobre si mesma, e, se fizermos’ recuar esta segunda cadeia como a primeira, chega-se, enfim, logi- camente, & imitagéo nascida de'si por assim dizer, a0 estado mental dos selvagens primitivos, entre os quais, como entre as criancas, 0 prazer de imitar por imitar 6 © mobil determinante da maior parte dos actos, de todos aqueles dos seus actos que pertencem a vida soci Assim, Portanto, também no sobrevalorizei demais a importancia da imitagao. Ir Em suma, uma fraca imaginacéo demasiado espa- Inada aqui e acolé no meio de uma vasta imitatividade Passiva que acolhe e perpétua todos os seus caprichos, como as ondulagdes de um lago prolongado o toque de asa de um péssaro; eis 0 panorama das sociedades dos primeiros tempos tal como se apresenta a0 nosso espirito. Esté plenamente confirmado, parece-nos, pelas pesquisas dos arquedlogos. "M. Tylor observa com razdo, diz Sumner Maine nas suas Instituigdes Primitivas, que o verdadeiro resultado da nova ciéncia de Mitologia Comparada & pér cont.) agen sobre a imitagdo do mesno modo, no fundo, que as necessidades © 0s desejos, Estes comandan-nos cono aquelas, © entre esta espécie de comand e 0 outro hi esta inica diferenga: un & um mestre externo ¢ 0 outro um tirano interna, Para além do mais, as leis n30 sio sendo a expressio das necessidades © dos dese jos Goninantes da classe governante mum dado momento, necessidades e Gesejos explicivels sempre do modo 8 indicedo. 421 AS LEIS DA IMITAGAO em relevo a esterilidade nos tempos primitivos dessa fa- Culdade do espirito de que nés fazemos a condigéo maior da fecundidade intelectual, a imaginacao. O direito com- parado conduz ainda mais infalivelmente & mesma con. cluséo, como se poderia ai chegar em razdo da estab, lidade da lei © do costume". Esta observago sé prec: de ser generalizada. Por exemplo, que hd de mais simples do que representar a Fortuna com uma corndpia na mao ou Vénus com uma maga na mao? Contudo, Pausénias tem 0 cuidado de nos ensinar que o primeiro destes atri- butos foi imaginado originariamente por Bupalus, um dos mais antigos estatuérios da Grécia, e 0 segundo por Ca. nachus, escultor de Egina. De uma ideia insignificante que atravessou o espirito destes dois homens derivam, portanto, as inumeraveis estétuas da Fortuna e de Vénus que apresentam os atributos indicados. Um outro resultado também importante e menos Rotado dos estudos arquecldgicos 6 de mostrar o homem, nas épocas antigas como muito menos encerrado hermeti camente nas tradigées e nos costumes locais, muito mais imitativo do exterior e aberto as modas estrangeiras, em Questao de jdias, de armas, e mesmo de instituicdes e de indlstrias do que se seria levado a pensar. Fica-se ver- dadeiramente surpreendido ao ver, uma certa idade antiga, uma substéncia téo indtil como o ambar, importado do Baltico, seu pals de origem, até as extremidades da Europa meridional, ¢ ao constatar a semelhanga das decoracces de témulos contemporaneos com outros de pontos muito distantes ocupados por racas diferentes. "Numa mesma Spoca muito recuada, diz M. Maury (Jornal dos cientistas, 1882, a propésito das antiguidades uganianas), uma mesma arte, de que comegamos a distinguir os produtos, estava espalhada nas provincias litorais da Asia Menor, no. Arqui- Pélago e na Grécia. E nesta escola que pareciam estar metidos os Etruscos. Cada nago modificou os principios conforme o seu génio". Entim, mesmo nas idades pré-his- téricas mais primitivas, a gente fica maravilhada com esses tipos de silex, de desenhos, de utensflios em osso, por toda a parte os mesmos em quase toda a superficie do 122 A ARQUEGLOGIA E A ESTATES: globo (1). Parece que qualquer perfodo arqueolégico de~ marcado & assinalado pelo prestigio preponderante de uma zagao particular que cobriu pola sua irradiagéo e pe- la marca da sua coloragao todas as civilizagdes concor- rentes ou vassales; mais ou menos como cada perfodo paleonte 6 0 reino de qualquer grande espécie ani- mal, de um molusco, de um réptil, de um paquiderme, A arqueologia pode-nos ensinar ainda que os ho- mens foram sempre muito menos originals do que se gabam de ser. ~ Acaba-se por j4 ndo se perceber 0 que id nao se v8 e por j4 no reparar naquilo que se vé sempre E por isso que os rostos dos nossos compatriotas, no meio dos quais vivemos, nos espantam pela sua diferenca e pelos seus caracteres distintivos, embora pertencam 3 mesma raca, cujos tracos comuns se apagam aos nossos olhos; € que, 20 contrério, ao viajar pelo mundo, nos parece que todos os drabes, todos os negros, todos os chineses se assemelham. Dir-se~4 talvez que a verdade esté compreendida entre estas duas impresses _opostas Mas aqui, como quase em toda a parte, este método de meio termo apresenta-se errado. Porque’ a causa da ilu- so que cega em parte o homem sedentério no meio dos seus conterraneos, a capa do hébito, ndo obscurece de forma aiguma a vista do viajante entre estrangeiros. A (1) Poder-se-ia ver & prinoira vista, na senelhanga tio flegrante dos machados, das pontas de flecha © do outras armas ou instrunen- tos on silex descobertos na Anérice « no antigo continente, 0 efei- to de uma simples coincidéncia que a identi¢ade das necessidades hunanas de guerra, de caga, de vestuirio, ote, dastaria para expli- car, Mas sabenos jé as objeccdes que se podem fazer a essa expli- cagiv. Rerescentenos 0 facto de que machados polidos, pontas de Flecha, nesso {doles en nefrite ou en jade, rochas ABSOLUTANENIC DESCOMHECEDAS EM TODO O CONTINENIE AMERICANO, foram encontrados no Névico. Nao é isso una prova de que, DESDE A IDADE DA PEDRA, os gernes da civilizacéo tinham sido importados do antigo pera o ove continente? Para as ideias posteriores, 0 facto desta inportagao é duvidoso. (V.M. de Nadalllac, A AMERICA PRE-AISTORICA, pag. 542). 123 AS LEIS Ok IMLAGKO impressao deste tem razdo para parecer muito mais exacta do que a daquele, e revela-nos claramente que entre os individuos da mesma raga os tragos de semelhanga, devi- dos _& hereditariedade, assentam sempre sobre tragos de dissemeihanca. Pois bem, por uma razéo anéloga, se passarmos agora do mundo’ vital para o mundo social, ficamos es pantados, 20 percorrer os quadros e as estétuas dos nossos Pintores @ dos nossos escultores contempordneos nas nossas exposigées, ao ler os escritores actuais nas nossas biblio~ tecas, a0 ‘observa ra, 03 gestos, os ditos de nossos amigos @ conhecidos nos nossos saldes, ficamos sempre e€ exclusivamente espantados em geral com as sues diferengas aparentes, nunca com es suas semelhancas. Mas quando, no museu Campana, deitames uma olhadela sobre os produtos da arte etrusca, quando, numa galeria holandesa, veneziana, florentina, espanhola, viajamos pela Primeira vez através das pinturas da mesma escola € da mesma época, quando, nos nossos arquivos, percorremos manuscritos da Idade Média, ou quando, num museu re~ trospectivo de arte, as exumacées das saltam aos nossos olhos, parece-nos que estao ai mi cépias pouco discemiveis de um mesmo modelo, e que antigamente todas as escritas, todos os modes de pintar, de esculpir, de construir, todos os modos de viver social- mente, por assim dizer,’ se pareciam com enganos num mesmo tempo e num mesmo pais. - Uma vez mais, nao pode estar af uma aparéncia enganadora e nds deveriamos. Por analogie, reconhecer que, mesmo nos nossos dias, 16s nos imitamos infinitamente mais do que inovamos. Isto néo € uma mediocre licéo a retirar dos estudos ar queolégicos. Num século, de certeza absoluta quase todos estes romancistas, estes artistas, estes poetas sobretudo, @ maior parte macacos ou, mais ‘ainda, témures de Hugo de que nés gabamos infantilmente a originalidade, Passarao, @ com muita razéo, por servis copistas uns dos outros. Tentamos estabelecer num capitulo precedente que toda ou quase toda a semethanga social deriva da imitacao, 124 A AROUEDLOGIA EA Estar ist mo toda ou quase toda a semelhanga vital tem por causa a hereditariedade. Este principio téo simples foi implicitamente aceite, por unanimidade, pelos arquediogos do nosso século como fio condutor no muito obscuro la birinto das suas imensas escavagées subterraneas; e isso pode-se pressentir pelos servigos que ele thes prestou, e pelos que ele € chamado ainda a prestar-Ihes. Um velho timulo etrusco, decorado com frescos é descoberto. Como a sua idade? Qual € 0 assunto das suas pinturas? vem-se estes problemas assinalando as as_e imperceptiveis por vezes, destas pi com outras de origem grega de onde se ‘conclui imediatamente que a Grécia era jé imitada pela Etrdria na época_em que essa cova tumular foi cavada. Nao vem ao. espirito explicar essas semelhangas por uma coincidéncia fortuita Tal € 0 postulado que serve de quia nestas questées © que, empregue por espiritos sagazes, jamais engana. Muitas vezes, 6 verdade, levados por preconceitos naturalistas da sua idade e da ‘sua época, os cientistas ndo se limitan a deduzir semelhancas de imitaco, e induzem o seu_pa- rentesco. Por exemplo, das escavacdes feitas em Este, na Venécia, tendo dado vasos, sftulas e outros objectos que apresentam semelhancas estranhas com o produto des escavagées feitas em Verona, em Bellune @ noutros lo- cais, M. Maury inclina-se a pensar que os autores destes diversos tamulos pertenciam a um mesmo povo, conjectura que nada parece justificar, mas ele tem o cuidedo de acrescentar: "ou pelo menos a populacdes que observavam 0s mesmos ritos funerdrios e que tinham ume indUstria comum", 0 que néo 6 a mesma coisa. Em todo 0 caso, parece mesmo certo que os chamados Etruscos do Norte, da Venécia, se 6 que eles tinham mesmo sangue etrusco nas veias, misturaram-no fortemente com sangue celta. Por outro lado, M. Maury observa a este propésito a influéncia que uma nagéo civilizada exerceu sempre sobre 03 barbaros seus vizinhos, mesmo sem conquista. "Os gauleses da Gélia Cisalpina, diz ele, imitaram visivelmente © trabalho etrusco". Assim, a semelhanca dos produtos artisticos néo prova nada em favor da consanguinidade € revela somente um contagio imitative 125 AS LEIS OA IMITAGKO Obrigados, para relacionar 0 desconhecido ao co- nhecido, a procurar nas analogias mais distantes, mais imperceptiveis ao olhar profano, em matéria de formas, de estilos, de cenas, de lendas figuradas, de linguas, de costumes, etc., os segredos das geragdes desaparecidas, os arquedlogos exercitaram-se em descobrir por toda a parte imprevistos, uns certos, outros semelhantes em diversos graus segundo uma escala muito espalhada de probabilidade. Por isso, eles contribuiram maravilhosamente para estender e aprofundar 0 dominio da imitatividade tumana, e para resolver quase inteiramente num feixe de imitagoes com- binadas de outros povos a civilizacdo de cada povo, mesmo 2 mais original a0 primeiro aspecto. Eles sabem que a arte drabe, de fisionomia tao nitida, 6, no entanto, uma simples fusdo da arte persa com a arte grega, que a arte grega deriva da arte egipcia, e talvez de outras fontes certos processos, e que a arte egipcia se formou ou de- senvolveu sucessivamente com aportagées miltiplas, asi ticas ou mesmo africanas. Nao existe limite assinaldvel para esta composi¢ao arqueolégica das civilizagGes, nao existe molécula social que a sua quimica nado espere dissolvé-la com sucesso em dtomos mais simples. Entre- tanto, 6 a trés ou quatro no mundo antigo, a um ou dois no novo, que os seus obreiros reduziram o nimero dos cen- tros ainda indecomponiveis de civilizagao, situados todos, coisa estranha, aqui sobre planaltos (México e Pert), acolé na for ou na margem de grandes rios (Nilo, Eufra~ tes, Ganges, rios chineses), embora os grandes cursos de gua, observa com razao M. de Candolle, nao sejam de forma alguma mais raros nem mais insalubres na América do que na Europa e na Asia, © que os planaltos habitaveis também ndo faltem nestas Ultimas partes do mundo. O arbitrério que presidiu & escolha dos primeiros civilizado- res ou importadores de civilizagao para a fixagdo das suas tendas manifesta-se aqui. E até ao fim dos tempos, tal- vez, as nossas civilizagées derivadas dessas levardo a mar- ca ‘indelével desse capricho primordial! Gragas aos arquedlogos, aprendemos onde e quando, pela primeira vez, apareceu uma descoberta nova, até onde 126 ‘A ARQUEDLOGIA € A ES! e até que época ela irradiou, e por que caminhos ela chegou do seu local de origem até & patria de adopcao. Fazem-nos recuar, se ndo ao primeiro forno de onde saiu 0 bronze ou o ferro, pelo menos & primeira regiao e& 20 primeiro século em que a ogiva, ou a pintura a leo, ou a imprensa, e mesmo, as ordens de arquitectui etc muito mais anteriormente, onde grega, ou o alfaboto fen | 88 revelaram ao mundo maravilhado. Toda a sua cu- dade (1), toda a sua actividade séo empregues em seguir nas suas modificagdes @ nos seus multiplos disfar ces uma dada invengao, em reconhecer no claustro 0 Atrio, na igreja romana © pretério do magistrado romano, na cadeira curul 0 trono etrusco, ou ainda a tracar os mites do dominio em que uma inveng30, a0 espalhar-se Por graus, se expandiu, e que, por razes a procurar (sem- pre, a nosso ver, na continuagao da concorréncia de in- vengées rivais), ela néo péde franquear; ou ainda a estu: dar os efeitos do crescimento das diversas invengoes que & forca de se propagarem, se reencontraram enfim num c6rebro_ imaginative Estes eruditos, numa palavra, perspectivam por torga @ talvez no seu intimo 0 mundo social do passado sob um ponto de vista cada vez mais eproximado daquele que eu pretendo que 0 soci6logo, (eu entendo aqui 0 socidlogo pu- ro, distinto do naturalista) por uma abstraccéo necesséria, embora artificial, 9¢ deveria colocar clara _e voluntaria- mente. Ao contrario dos historiadores que ndo consideram na histéria_sendo individuos em concorréncia ou em con- flito, isto 6, bragos e pernas tal como cérebros, ¢ nestes cérebros ideias @ desejos das mais diversas proveniéncias, (1) Lu sei que a curiosidade dos antiquirios & muitas vezes pueril © vaidosa. Mesno 0s maiores, tais como Schliemana, porecen mais preocupados en descodrir o que diz respeite 2 qualquer individuo célebre, Heitor, Priano, Aganénnon, do que en sequir os destinos des invengdes capitais do passado.’Mas una coisa é 0 adbil ov fim pessoal dos trabalnadores @ outre coisa @ produto liquide e 0 cio definitive do trabalho. 127 AS LEIS DA MITAG entre os quais se introduzem aqui @ acol4 novidades, per- dades, apresentadas a par de amontoados de simples a0 contrério desses maus deturpadores da realidade, que nao souberam agarrar a verdadeira articulac3o dos factos vitais @ dos factos sociais, © ponto em que eles se separam sem ruptura, 03 arquedlogos, esses, fazem so- Ciologia pura porque sendo-Ihes impenetraveis os individuos por eles exumados, @ apresentando somente ao seu exame as obras desses mortos, vestigios de ideias e de necessi- dades arcaicas, eles owem de qualquer modo, segundo o ideal de Wagner, a misica do passado sem ver a orquestra. € uma crue! privagdo 20s seus olhos, sei-o muite bem, estarem reduzidos a tal; mas 0 tempo, que destruiu os cadéveres © as memérias dos pintores, dos fabricantes, dos escritores, dos quais eles decifram as inscrigées ou interpretam penosamente os frescos, os bustos, os frag- tos de vasos, os palimpsestos, nao thes prestou aux algum para separar 0 que houve de propriamente Moe. Tectos,hurnenos, eliminando.o que howe’ de vital 8 fejeitando camo impureza o contetido carnal e frdgil dessa forma gloriosa verdedeiramente digna de ressurreigao. Para eles, portanto, a histéria, simplificada e trans figurada consiste simplesmente em aparigdes ¢ desenvol- entos, em concorréncias e em conflitos de ideias ori- de necessidades originais, de invengdes, numa Gnica que se tornam desta forma as grandes’ personagens histéricas © os verdadeiros agentes do progresso humano. A prova de que este ponto de vista totalmente idealista esta correcto, 6 que ele € fecundo. Nao é colocando-se nele, & forge, repito-o, mas também por acaso, que o fil610go, © mitélogo, o 'arquedlogo contemporaneo sob os seus diversos nomes, resolve todos os nés 9 elucida todas as obscuridades da hist6ria e, sem the retirar nada do seu pitoresco e da sua graca, Ihe empresta o atractivo de uma teoria? Se a histéria esté em vias de se tornar ciéncia, nfo & a ele que se deve? It A ele © a0 operador estatistico também. Este, como aquele lanca sobre os factos humanos um olhar 128 A aRgueoLos: € a estaristica totalmente abstracto e impessoal: ndo se occupa dos in~ Jividuos, de Pedro ou de Paulo, mas das suas obras; ou melhor, dos seus actos, revelagéo das suas necessidades @ das suas ideias: acto de fabricar, de vender ou de com- prar tal produto, acto de cometer ou de reprimir tal delito, acto de pleitear em separacdo de corpos, acto de votar em tal ou tal sentido; e mesmo actos de nascer, de casar, de se tornar pai, de morrer, todos os actos’ da vida individual que, por certos aspectos, se relacionam também com a vida acial, enquanto que a propagacao de certos exempios, de certos preconceitos, parece in~ fluenciar no crescimento mais ou menos acelerado ou retardado do ndmero dos nascimentos ou dos casamentos, no grau de fecundidade dos casamentos, na mortalidade dos recém-nascidos. Se a arqueologia 6 uma colecgdo e uma classifica g80 de obras similares, de que o que importa mais 6 a semethanca mais exacta possivel, a estatistica 6 uma numeracao de acgdes © mais similares que se Posse. A arte aqui esté na escolha das unidades, tanto quanto possive! semelhantes e iguais entre si. — De que se ecupa a estatistica, como a arqueologia, senéo das inven 98es @ das edigdes imitativas que delas se fazem? Somente, uma trata de invengdes na maior parte mortas, esgotadas pela sua propria exploséo; a outra de invencées vives, Mmuitas vezes modernas ou ‘contemporaneas ainda em ex. Panséo @ sempre a crescer ou em vies de estagnar ou de decrescer. Enquanto que uma nos diz até onde © com que rapidez as embarcagées fenicias levaram as lougas Gregas através das Aguas do Mediterraneo e até para além dele, a outra ensina-nos até que ilhas da Oceania até que proximidade do Pdlo Norte ou do Pélo Austral as embarcacées inglesas levam hoje os téxteis ingleses e, Por outro lado, que numero de metros eles exportam ou debitam por ano. — £ preciso reconhecer, contudo, que 0 campo da invencdo parece mais especialmente Préprio da arqueologia, e 0 da imitagéo da estatistica. Enquanto a primeira se preocupa com descobrir a filiacéo das sucessivas descobertés, a segunda revela-se ao medir 129 AS LEIS DA IMETAGKO 2 expansdo de ma delas. O dominio da arqueologia & mais filoséfic estatistica mais cient/fico. © método destas duas ciéncias 6 precisamente in verso, 6 verdade; mas isso diz respeito as suas condigdes exteriores de trabalho. Um estuda longamente os exem Gissiminados de uma mesma arte antes de poder Gar-se a conjecturar a origem © a data do py gistral de que ele esté dependente; deve c \Guas indo-europeias antes de as refi a ia talvez, 0 ariano, ou & sua irma pr © sanscrito; recua penosamente das _imitacées gem. O outro, que quase sempre fontes das quais mede as expanses, vai efeitos, das descobertas aos seus menores conforme os anos @ os p: r-vos~4, teaiatoe sucessivos que, desde © momento em que 4 méquinas a vapor comecou a espalhar ficar sucessivamente em Prange a, necersdade a. hulne, 2 produgao desta substancia neste pais seguiu uma pro aressio perfertarmente regular 8, do 1/50 c 1368, tornou- ~se 62 vezes e meia maior. Dir-vos-& ainda que a par- tir da descoberta do agdcar de beterraba, ou melhor, 2 partir do momento em que a utilidade desta descoberta deixou de ser contestada, a fabricagdo desta mercadoria jevou-se, néo menos regularmente, de 7 milhées de qui- logramas em 1828 (af estava quase estaciondria pelos motives indicados) para 150 milhdes de quilogramas trinta anos depois (Maurice Block). Escolhi aqui os exemplos menos interessantes e contudo, nao se assiste, pela virtude destes éridos nume- Fos, ao’ nascimento, ao progress, a0 enraizamento gra- dual, de uma necessidade nova, de uma moda nova do publico? Nada de mais instrutivo em geral do que os Quadros cronoldgicos dos estatisticos, onde, ano apés ano, eles nos revelam a sibida ov a baixa crescente de um consumo ou de uma produgao especial, de uma opiniao Politica particular traduzida’em boletins de voto, de uma Necessidade de seguranga determinada expressa em apdli- ces de seguro contra incéndio, ou em cadernetas da caixa 130 A ARQUEOLOGIA E 4 ESTATESTICA econémica, etc., isto 6, no fundo, sempre os destinos de uma crenca ou de um desejo importados @ copiados. Cada um desses quadros, ou melhor cada uma das curvas gré- ficas os representam 6 uma monografia histérica, de certa maneira. E 0 seu conjunto é a melhor histéria que se pode narrar. Os quadros sinépticos apresentam compa- ragées de pais para pais, de provincia para provincia, oferecem ordinariamente muito menos interesse. Prestem atencéo, como matéria para reflexdo filosdtica, a0 mapa francés da criminalidade, departamento por departamento © & curva gréfica da progresséo dos reincidentes desde hé cinquenta anos. Ou entao confrontem a proporcéo da Populagao urbana em relacéo & populacdo rural, departa_ mento por departamento, com a proporcéo dessa popula G40 urbana ano por ano; ao ver-se, por exemplo, que, de 1851 a 1882, a proporcao de que se trata foi elevada de 25% para 33%, quer dizer do quarto para o terco, segundo uma progressdo regular ininterrupta, tereis a certeza do facto da acgéo de uma causa social determinada, enquanto que © contraste da proporgéo 26% por exemplo’e da pro- Porgao 28% por exemplo entre dois departamentos vizinhos ndo wos ensinaré grande coisa. Enquanto um quadro, re— Presentando a progresséo dos enterros civis durante. dez anos em Paris ou na provincia seria significative, a com_ Paragao do némero de enterros civis em Franca, na In glaterra @ na Alemanha, num dado momento, seria rela- tivamente despida de valor. Nao pretendo que seja.indtil mencionar que em 1870 howe catorze milhdes de telegra- mas privados em Franga, onze milhées na Alemanha vinte € quatro milhdes na Inglaterra. Mas 6 muito mais instrutivo aprender que em Franca, nomeadamente os nove mil telegramas de 1851 se elevaram para quatro mithées em 1859; para dez milhées em 1869 © depois Para catorze milhes em 1879; e nao se pode seguir esta Progressao, primeiramente acelerada e depois retardada, sem se recordar 0 crescimento de qualquer ser vivo. Porqué esta diferenca? Porque as curvas sozinhas, em geral, e nao © mapas, embora haja muitas excepgdes, conduziram a uma progresséo imitativa. 131 AS LEIS OA DITAGAO A estatistica, vé-se, segue uma caminhada muito mais natural a arquelogia, e ¢ totalmente precisa nas informagées, tal como no resto que nos fornece. Ela 6 também um método sociolégico por exceléncia e falta € poder aplicé-la ds sociedades mortas tal como aplicamos, como mal menor, o método arqueoldgico. Quanto no darfamos em medaihas e em m inscrigdes funerdrias, em umas, por uma dustrial e comercial, cu. mesmo’ crimina’ mano! Mas para prestar todos os servigos . esperam, para responder vitoriosamente &s criticas irdnica de que ela 6 objecto, € preciso que a e a arqueologia, tenha consciéncia 20 mesmo tempo verdadeira utilidade e da sua i ia real, que ela saiba para onde vai, para onde dev endo se aven- ture no perigo dos ‘caminhos que a conduzem ao seu fim. Ela prépria nao passa de um mal menor. Uma estatistica psicolégica, apontando os crescimentos e os individuais das crencas especiais, das nei ciais, criadas originariamente por um inovador, sozinha, se fosse praticamente pos a razo_profunda dos nimeros fornecidos pela estatistica wigar (1). Esta do pesa, conta somente, e sé conta actos, compras, ven- das, fabricagdes, consumos, crimes, processos, etc. Mas é 36 a partir de um certo grau de intensidade que um de- sejo crescente se transforma em acto, ou que um desejo em declinio se revela de repente e deixa agir um desejo contrério mantido em desvantagem até af. Direi o mesmo de uma crenca. Importa muito a0 percorrer as obras es- tatisticas, no esquecer que no fundo as coisas a medir (1) Segundo a estatistica dos caminhos de ferro, dos sutocerros, dos barcos a vapor de recreio, etc., as receitas baixan regular- nente todas as soxtas-feires; o que ten 2 ver evidentenente com 0 breeaneeLto to etpaliado e contudo tGe dbilitedo, relat oo perigo de empreender seja 0 que for nesse Sequindo de ano para ano as variagdes desta baixa periédica, medir-se-ia facil- io gradual da absurda crenca ex questio. 132 AE A ESTATESTICA estatisticamente so qualidades intemas, crengas e desejos © que muitas vezes, em igual némero, os actos numerados por elas exprimem pesos muito diferentes dessas coisas Em certas épocas do nosso século, 0 nimero das entradas as _igrejas permaneceu o mesmo enquanto que a fé re- igiosa se ia enfraquecendo; pode acontecer que logo que um governo seja ferido no seu prestigio, a afeigao dos seus adeptos seja reduzida a metade, embora o seu nii- mero tenha decrescido pouco, como se vé pelos escru- tinios mesmo na véspera de uma queda sdbita: de onde uma causa de iluséo para aqueles que as estatisticas eleitorais tranquilizavam ou desencorajavam com meis do que razao. As imitacdes realizadas sd numerosas, mas isso no € nada em comparagdo com as imitacdes desejadas! © que se chama os desejos de uma populagao, de uma Pequena cidade por exemplo ou de uma classe num dado momento, compse-se exclusivamente de tendéncias, por muito irrealizdveis ainda, para imitar em todos os aspectos outra tal cidade mais rica ou tal classe superior. Este conjunto de ambic&es simias constitui a energia potenc de uma sociedade. Bastard, para a converter em. energia actual, um tratado de comércio, uma descoberta nova, ou mesmo também uma revolugéo politica, que tome acessiveis as bolsas médias ou as capacidades médias tal luxo ou tal poder reservado antigamente a felizes Privilegiados da fortuna ou da inteligéncia. Ela tem, uma grande importéncia e seria bom pér-se ao corrente das suas variagdes para mais ou para menos; contudo, a sa_ tisfagéo habitual nao parece inquietar-se com isso € jul= Garia este tormento ridiculo, ainda que, por quantidades de procedimentos indirectos, @ avaliacdo aproximativa des. ta forga possa por vezes estar a0 seu alcance. — Sob este ponto de vista, a arqueologia mostra-se superior nas informagdes que Ihe devemos sobre as sociedades enter. radas; porque se ela nos informa com menor detalhe @ Preciséo sobre a sua actividade, ela pinta-nos mais. fil. mente as suas aspiragées. Um fresco de Pompeia revela ~nos muito mais 0 estado psicolégico de uma cidade de 133 AS LEIS DA IMETAGRO ee gp ee ee et oe esa oarsmen calc aera en aia ndo pode ainda exprimir todos os seus ramos, enquanto Pia eae tal eased ean a todos os sentidos. H4 uma arqueologia linguistica, a filo logia comparada, que nos monografa & parte cada raiz ae ree acts ele aaa cant ae ee aaa Ss Secs cer eae siecle epee emeaecrar eerie rales milo crear fel tc Pilsen ere hen Sansa ee ae Peale eae sede ates cain, Gi eg ieee ace eee na ee ee atic SCR ied ered eprint muitas ciéncias distintas e florescentes. E preciso con- ee oe deaaea fer seer eager an eee ae Se ae era eal a set ee cet erage nee do social; estatistica da populagdéo, da natalidade, da a eee eae stints, mesenty, sce nelee sob a forma de mapas eleitorais (1). Quanto a estatistica eee oat ar (1) 0 sufrdgio universal nao tem talvez valor, a nao ser num aspecto néo salientado: de saber como um TRABALHO INTERMITENTE DE ESTATISTICA POLITICA pelo qual uma nacao i chamada eens mae elon nas suas opinides sobre questies vitais. Pare se exercitar nas watts See "ait Spat ee ee S's Ses Ne fk a elt wt 134 A ARQUEOLOGIA E A EStATIS! jjosa, que nos levaria a representar graficamente o movimento anual da propaga¢ao relativa das diversas sei- tas, e as variagdes termométricas de qualquer espécie da f8 dos seus aderentes; quanto & estatistica linguistica, que nos deveria enumerar ndo somente a expansao compa~ rada dos diversos idiomas mas, em cada um deles, a mo- da ou 0 declinio de cada vocébulo, de cada forma do discurso; recearfamos, ao falar mais tempo dessas ciéncias hipotéticas, fazer sorrir 0 leitor. Mas dissemos o suficiente para justiticar esta afir- magao: que operador estatistico vé os factos humanos sob 0 mesmo ponto de vista que o arquediogo, e que esse ponto de vista esté conforme ao nosso. — Resuma- mo-lo em duas palavras, com o risco de o mutilar ao simplificélo, antes de ir mais longe. No meio desta confusdo incoerente dos factos hist6ricos, sonho ou pesa- delo enigmatic, a razao procura em vao uma ordem ¢ do a encontra porque se recusa a vé-la onde ela estd. Por vezes imagina-a e, ao conceber a histéria como um Poema do qual um fragmento nao poderia ser int sem 0 todo, ela remete-nos para a inteligéncia desse enigma no momento em que os destinos finais da huma- nidade estarao completos e as mais recuadas das suas origens perfeitamente conhecidas. E bem preciso repetir a famosa palavra: ignorabimus. Observemos no fundo dos nomes e¢ das datas, no fundo das batalhas e das revolu- gbes: que vemos nés? Desejos especiais, provocados ou Super-excitados por invencdes ou iniciativas préticas de que cada uma aparece num ponto e irradia dai incessan— temente como uma esfera luminosa, entrecruzando-se harmoniosamente com milhares de ondulacdes andlogas cuja multiplicidade nunca 6 confuséo; e também crengas especiais, trazidas por descobertas ou conjecturas teéricas, que irradiam igualmente com uma rapidez e em limites varidveis. A ordem na qual eclodem e se sucedem estas (cont.) LIZAR totalmente o sufragio chamedo universal. (Ver a este respeito un estudo publicado nos mssos ESTUDOS PENAIS E SOCEAIS) 135 AS LEIS 04 IMITAGAO invengdes © estas descobertas nao passa de caprichosa e acidental em grande medida; mas a longo prazo, pela minacéo inevitével das que se contrariam (quer dizer, nto fundo, que se contradizem mais ou menos por algumas das suas proposicdes implicitas), 0 grupo simulténeo que elas formam torna-se concerto e coesao. Considerada assim, como uma expanséo de ondas emanadas de centros distintos, e como um arranjo légico desses centros e dos seus cortejos ondulatérios, uma nagao, uma cidade, 0 mais modesto episédio do chamado poema da histéria, torna-se um todo vivo e individual, e um espectéculo digno de se contemplar por uma retina de fildsofo. Ww Se este ponto de vista é verdadeiro, se verdadei- tamente ele 6 0 mais préprio para esclarecer os factos sociais pelo seu lado regular, mensurdvel e numerdvel, segue-se que a estatistica sociolégica deveria colocar-se af, n&o pouco mais ou menos e disfarcadamente, mas conscientemente e imediatamente, o que Ihe pouparia, como & arqueologia, tantas apalpadelas e anotagdes esté- reis. E vamos enumerar as principais consequéncias que dai adviriam. ~ Primeiro, na posse de uma pedra de toque para reconhecer 0 que ihe pertence © o que lhe nao per- tence, convencida de que 0 imenso campo da imitagao humana 6 totalmente dela, mas nada mais do que este campo, ela deixaria, por exemplo, acs naturalistas, o cuidado de dirigir a estatistica, puramente antropoldgica pelos seus resultados, para as isengées do servigo ar nos diversos departamentos franceses, ou para estabele- cer 0s gréficos de mortalidade (néo\ digo de natalidade, Porque aqui o exemplo de outrem intervém poderosamente para restringir ou estimular a fecundidade da raga). Isso é biologia pura, tal como o emprego do método grafico de M. Marey, ou a observagdo das doengas pelo midgrafo, esfigmérafo, pneumégrafo, espécies de estatisticos mecé nicos das contracgdes, das pulsacdes, dos movimentos respiratérios. 136 Em segundo lugar, 0 estatistico sociélogo jamais perderia de vista que 2 sua tarefa propria 6 medir crengas especiais, desejos especiais e empregar os processos mais directos para juntar o mais possivel estas quantidades tdo dificeis de atingir; que as enumeracdes de accoes, © mais possivel semelhantes entre si (condigéo mal satis feita pela estatistica criminal entre outras), e, na sua falta, as enumeracdes de obras, por exemplo de artigos de comércio, também similares, devem tender sempre e referir-se a este objectivo final, ou antes a estas duas finalidades: 1° por registos de accdes e de obras, tracar @ curva dos crescimentos, das estagnagdes ou dos de- eréscimos sucessivos de cada ideia nova ou antiga, de cada necessidade antiga ou nova, & medida que eles se espalham e se consolidam, ou & medida que s80 repelidas © desenraizadas; 2° por’ aproximagées habeis entre as séries assim obtidas, pelo destaque das suas variacdes con comitantes, tragar a oposicao ou a ajuda maior ou menor ou nula que se prestam ou em que se opdem esas diver- Sas propagagées ou consolidacées imitativas de desejos e de ideias (conforme consistem, como consistem sempre, em Proposigées implicitas que se interafirmam ou de entre- nega mais ou menos e em maior ou menor niimero) sem desprezar contudo a influéncia que podem ter sobre elas 0 sexo, a idade, 0 temperamento, o clima, a estacao, causas naturais cuja forca é medida de outro modo, se houver lugar para a estatistica fisica ou biolégica Noutros termos, trata-se, para a estatistica socio- légica: 12 de determinar o poder imitative préprio de cada invengdo num tempo e num pals dados; 22 de mos trar os efeitos favoréveis ou nocivos produzidos pela imi- tagao de cada uma delas e, por conseguinte, de influenciar aqueles que tero conhecimento desses resultados numéricos sobre a vantagem que teriam em seguir ou em nao seguir tais ou tais exemplos. Em definitive, constatar ou influ enciar imitagées, eis todo o objecto das pesquisas deste género. Como exemplo da maneira como a segunda destas duas finalidades foi atingida, pode citar-se a estatistica médica, a qual se relaciona, com efeito, com a ¢ AS LETS OA mTTAGHO social enquanto compara, para cada doenga, a proporgdo dos doentes curados pela aplicacao dos diversos processos, dos diversos medicamentos antigamente ou modernamente descobertos. Ela contribuiu assim para generalizar a va © tratamento da sarna pelos insecticidas, etc. A a dos crimes, dos suicidios e das alienacées montais, ao mostrar que a residéncia nas cidades os mul- tiplica em largas proporgées, seria de natureza também a moderar, ainda que de forma ténue, é verdade, a grande corrente imitativa que conduz os habitantes dos campos para a vida urbana. M. Bertilion assegura-nos mesmo que a estatistica do casamento seria para nés um encoraja Mento para fazer um uso ainda maior desta antiga in. vendo de nossos antepassados — mais original do que parece, entre paréntesis — ao revelar-nos a menor mor. talidade dos homens casados comparada com a dos celi batérios da mesma idade. Mas nao nos demoremos sobre este delicado assunto. Dos dois problemas que acabo de distinguir e que me parecem impor-se ao operador estatistico, 0 segundo ndo poderia ser resolvido senao a partir do primeiro; & talvez bom notd-lo. Procurar, por exemplo, como se faz frequentemente, medir a accao de tal penalidade, de tais crengasreligiosas, de tal educacdo, sobre as tendéncias criminais, antes de ter medido a forca destas tendéncias entregues a si mesmas, tais como, nos dias de insurrei- Ges, nas populagdes livres de qualquer policiamento, de qualquer padre ou de qualquer perceptor, elas culminam incéndios, em assassinios, em pilhagens muito seme- Ihantes, instantaneamente imitadas de uma ponta & outra de um pais: proceder assim, ndo é pér o carro & frente dos bois? A primeira operagao preliminar deve, portanto, ser de organizar um quadro das principais necessidades inatas ou gradualmente adquiridas, a comegar pela necessidade social de se casar ou de se tornar pai, das principais crengas, antigas ou novas; ou, 0 que 6 unum et idem, das familias de actos, exemplares de um mesmo tipo, que exprimem as suas forcas internas com maior ou menor 138 A AROUEOLOGTA E A ESIATESTICA exactiddo. Para isto pode servir sobretudo a estatistica comercial e industrial, que se torna muito interessante quando a olhamos sob este éngulo. Cada artigo fabricado ou vendido nao responde, com efeito, a uma necessidade especial, a uma ideia particular? Os progressos da sua venda e da sua fabricagéo, num dado tempo e lugar, nao traduzem a sua forga motriz, quer dizer, a sua velocidade de propagacéo, assim como a sua massa de qualquer espécie, isto 6, a sua importéncia? A estatistica da in- distria e do comércio 6, portanto, 0 fundamento princi pal de todas as outras. O que valeria mais ainda a pena, Se a coisa fosse possivel, seria a aplicacdo, numa escala maior, aos seres vivos, do método de investigacdo que a arqueclogia utiliza em relacdo aos mortos: quero dizer o Preciso e completo, casa por casa, de todo © das variagées numéricas de cada espécie de mével de ano para ano. Excelente foto grafia do nosso estado social, mais ou menos como, ao inventariar com 0 cuidado que se sabe, 0 contetdo’ dos tamulos, da morada dos mortos, no Egipto, na Italia, na Asia Menor, na América, por toda'a parte os pesquisadores go passado conseguiram ter-nos fornecido a melhor ima- gem das civilizagoes extintas. Mas na falta de recenceamento inquisitorial que eu imagino ¢ das casas de vidro que ele supe, a estatistica do comércio @ da industria, completa @ sistematizada, a estatistica da livraria, nomeadamente, que nos revela’ as Mudangas sucedidas na proporcéo relativa das categorias de livros publicados cada ano, basta jé para nos propor- cionar os dados de que temos necessidade. A estat istica judicidria sé aparece teoricamente depois, e convenhamos gue, apesar do seu interesse mais profundo, de um gé nero diferente, ela &-Ihe inferior ainda em outro aspecto, As unidades que ela adiciona carecem de semelhanca. Di_ zem-me que esta forja fabricou este ano um milhao de carris de ago, que esta manufactura recebeu dez mil fardos de algodao: eis unidades semelhantes, referentes @ inecessidades semelhantes. Mas por mais que se por Menorizem os roubos, por exemplo, ou os processos” de 139 DA IMTTAGAO escraviddo, em classes ou subclasses, ndo se chega nunca a deixar de agrupar em conjunto actos muito disseme- Ihantes, inspirados por necessidades e ideias diferentes, de origem distinta e referindo-se por acaso a miltiplas fa. ‘as de acces. Quanto ao resto, poder-se-ia fazer uma coluna separada para os assassinatos de mulheres cortadas em pedagos, ou para os envenenamentos pela ‘os de recente que fazem caracteri lo a partir cos seus processos de execu: gdo que seria preciso classificar os crimes e 0s delitos, para os catalogar convenientemente. Ver-se-ia entéo qual é 0 Ga imitagdo em semelhante matéria. Seria preciso descer ao pormenor. Se se pudessem classificar 0s danos a partir da natureza da vitima inquirida ot pena evitada por seu intermédio, te cago diferente, mas ainda natural, que reproduziria, sob uma forma, a dos artigos ou servigos industriais cuja compra fornece as pessoas satisfagdes semelhantes, v Estando © campo da estatistica sociolégica nitida- mente delimitado, estando ciaramente tracadas as curvas aréficas relativas & propagagdo, isto 6, & con de cada necessidade especial, de cada opinido espi durante um certo némero de anos e numa certa extensdo de paises, resta interpretar estas curvas hierogliticas, por vezes pitorescas e bizarras como 0 perfil dos montes muitas vezes sinuosas e graciosas como as formas de vida. Ou eu me arrisco muito, ou © nosso ponto de vista aqui nes d& uma grande ajuda. As linhas de que ai trata séo sempre ou montantes, ou horizontais, ou des cendentes, ou ainda, se sao irregulares, pode-se sémpre decompé-las do mesmo modo em trés espécies de ele- mentos lineares: escarpadas, planaltos, declives. Segundo Quételet e a sua escola, os planaltos seriam morada su- perior do operador estatistico, a sua descoberta seria o seu mais belo triunfo ou deveria ser a sua aspiragao cons. lacao 140 A AROUEOLOGIA € tante. Nada de mais préprio, segundo ele, para fundar a fisica social, do que a reprodugao uniforme dos mesmos ndO somente de nasi tos e de casamentos 0 de crimes e processos, durante um periodo de tempo considerével. Daf a ilusdo (dissipada, 6 verdade depois, especialmente pela ultima estatisitca of! sobre a crim de progressiva do dltimo meio-século) de pensar que estes ditimos ntimeros se reproduziam efecti vamente com uniformidade. Mas, se o leitor teve o reconheceré que, sem diminuir em nada a importncia das linhas horizontais, dever-se-é a ‘as ascendentes, sinais da propagacao_ re gular de um género de imitagao, um valor teérico bem superior. Eis porqué: Pelo facto mesmo de que uma ideia nova, um gosto novo, ganhou raiz em qualquer parte num cérebro feito de uma certa maneira, ndo hd razdo para a vagao nao se propague mais ou menos rapidamente num numero indefinido de cérebros supostos semeinantes e postos em comunicaggo. Ela propagar-se-ia _instantanea- mente em todos esses cérebros se a sua semelhanga fosse perfeita e se eles comunicassem entre si com uma inteira e absoluta liberdade. E para este ideal f sorte inaces~ sfvel, que nés caminhamos a grandes passos, como nos podemos convencer pela difusio téo répida dos telefones na América desde a aurora da sua aparicao. Ele esté quase atingido no que diz respeito as inovacdes legislati- vas, leis ou decretos, que, em outras épocas, sé a custo se aplicavam, sucessivamente e com lentidéo &s diversas provincias de cada Estado, e agora se executam de um extremo a0 outro do territério no préprio dia da sua promutgacéo. & que aqui no h& nenhum entrave, — A falha de comunicagao desempenha em fisica social, 0 mesmo papel que a falta de elasticidade em fisica. Uma prejudica a imitagao, enquanto a outra a ondulagéo. Mas a propagacao imitativa de certas invengées que se co nhecem (caminhos de ferro, telégrafos, etc.) tende in cessantemente a diminuir, em proveito de todas as outras, esta insuficiéncia de contactos de espiritos. E, quanto & trabalho de nos seal 141 AS LEIS DA IMITAGKO diferenca dos espiritos, ela tende a diluir-se paralelamente pela prdpria propagacao das necessidades e das ideias nascidas de invencoes passadas, a qual trabalha assim no sentido de facilitar a propagacéo de invencées _tuturas (entendo eu daquelas que 2 nao contradirao). Por si mesmas, portanto, uma ideia ou uma neces sidade, uma vez lancadas, tendem sempre a espalhar-se mais, segundo uma verdadeira progresséo geométrica (1) Esté'af 0 esquema ideal ao qual se conformaria a sua curva gréfica se elas pudessem propagar-se sem se choca- rem entre si. Mas, como estes choques sao inevitdveis mais dla menos dia, e véo-se multiplicando, s6 a longo prazo 6 que cada uma destas forcas sociais pode encontrar © seu limite momentaneamente insuperével_e chegar, por acidente, de forma nenhuma por necessidade natural, 2 este estado estacionério por um tempo, de que os pro~ dutores estatisticos em geral parecem ter tao pouco com preendido 0 significado. Estacionamento aqui, como aliés por toda a parte, significa equilibrie, paragem mitua de forcas concorrentes. Estou longe de negar o interesse tedrico deste estado, uma vez que estes eq como equagées. Ao wer, por exemplo, o consumo de tal substancia, café ou chocolate, diminuir numa nagdo a partir de tal data, eu sei que a forca da necessidade correspondente é precisamente igual Aquela das necessi- dades rivais cuja satistacdo mais ampla do primeiro exi- Gitia © sacrificio, dado 0 nivel das posses. Regula-se o prego de cada objecto de cima, Mas seré que cada um dos nimeros anuais de séries progressivas, dos lados, nao exprimiré, também ele, uma equagéo entre a forca da necessidade de que se trata numa data indicada e a forga das necessidades concorrentes que, na mesma data, a (A) ho mesmo tempo tenden a enraizar-se, @ 9 seu progresso em extensdo incentive o sou progress em prafundidade. f, pi acgdo destas duas imitagies, de sie do cutro, nio existe, note fmo-Lo bem, entusiasno ou fanatisno do presente ov do passado, forca histérica, que nao se explique. 2 nitua 142 © A ESTAr impediram de se desenvolver mais? Se por acaso a pro gressdo parou_em tal ponto mais do que om tal outro, se © planalto néo € mais elevado ou mais baixo em cada caso, nao 6 um puro acaso histérico que esté na causa disso, isto €, 0 facto de que as invengdes contraditorias de onde nasceram as necessidades hostis pelas quais a Progressdo 6 bloqueada, terem aparecido aqui em vez de sta época que noutra e, entim, terem aparecido em lugar de nao terem? Acrescentemos que os planaltos séo sempre equi- fios instaveis. Apés uma horizontalidade mais ou menos nativa, mais ou menos prolongada, a curva vai re~ A subir ou a descer, a série a crescer ou a conforme aparecer uma nova inveng3o auxiliar , confirmativa ou contraditéria. Quantos &s séries decrescentes, pode-se ver, séo um simples efeito dos crescimentos vitoriosos que empolgam a opinidéo ou o gosto piblico em vias de declinio, hé pouco ou hé muito em vias de progresso, e s6 merecem ser consideradas pelo teorizader como a imagem invertida das séries cres- centes que elas supéem. Também. constatamos que todas as vezes que 6 dado a0 operador estatistico pegar numa invengdo & nascenca e tragar anualmente o curso numérico do seu destino ele PGe em frente dos nossos olhos linhas constantemente as- cendentes, pelo menos até uma certa época, e mesmo muito regularmente ascendentes, durante um certo tempo muito mais curto. Se esta reguiaridade perfeita ndo sub- siste, isso tem a ver com causas que vamos indicar em breve. Mas quando se trata de invengdes muito antigas, tais como 0 casamento monogamico e cristo, que tiveram tempo de atravessar 0 seu periodo progressive © de encher até aos limites, por assim dizer, todo 0 seu dominio pré- prio de imitagao, 6 preciso nao se admirar se a estatis- tica, que nao assistiu aos seus comegos, desenvolve a seu respeito horizontais pouco sinuosas. Que o ndmero anual de casamentos permanece em proporgéo mais ou jos constante com 0 niimero da populaco (salvo em Franca, por exemplo, onde hé uma lenta diminuicéo pro- 143 © mesmo que a influéncia do casamento sobre ou sobre o suicidio se traduz anualmente iguais, nada de menos ma- 0 que acaba de ser dito. HA velhas tuigdes entranhadas no sangue de um povo como naturais, 0 temperamento, 0 sexo, a fe, a estacao iam sobre os actos humanos tomados em ma tao espantosa unitormidade (muito exagerada, c , e bem mais circunscrita do que geralmente se cré) e com uma regularidade também ainda notavel sobre factos vitais, tais como a doenca ou E, contudo, mesmo aqui que encontramos nés no 10 destas séries ies? Vejamas; seré uma curta Jigressao Isto. A estatistica, por exemplo, revelou que de cinco em cinco anos a mortalidade 6 sempre trés vezes maior nos nossos departament: 03 do Mediterraneo que no resto da Franga, ou pelo menos do que nos depar. tamentos mais favorecidos. A explicagéo do facto encon tra-se, no extremo calor do clima provencal durante 10, estagdo tao nociva a primeira infancia uma revelacdo da estatistica contraria ao precon- como © Inverno o 6 para a velhice. Qualquer que © clima intervém aqui como uma causa fixa, sempre asi mesma. Mas o que é 0 clima sendo uma enti- inal em que se exprime um certo agrupamento das seguintes realidades: 0 sol, a radiaco luminosa que tende a espalhar-se indefinidamente no ilimitado dos es- pagos e que o obstéculo da terra contraria fazendo-o Parer; os ventos, quer dizer, fragmentos de ciclones mais ou menos definidos, que tendem incessantemente a alar gar-se, a propagar-se por todo © globo, e s6 so detidos pelas cadeias de montanhas ou por outros ciclones con- trérios; a altitude, quer dizer, o efeito de forgas subter- réneas elevatérias que aspiravam a uma expansdo sem fim de crosta terrestre, felizmente resistente; a latitude, quer dizer, 0 efeito da rotacéo do globo terrestre, ainda fluido, nos seus estorgos impotentes para se contrair cada vez mais; @ natureza do solo, quer dizer, das moléculas 144 A ARQUEOLOGIA € A ESTATESTICA cujas_atinidades, sempre incompletamente satisfeitas se exercem inutiimente & vita delas © cuja atraccdo, exer cendo-se a qualquer distancia, tende a contactos impos— siveis; a flora, enfim, em ‘certa medida, quer dizer, Giversas espécies ou variedades vegetais das quais cada uma, descontente com 0s seus limites, invadiria com 98 seus inumerdveis exemplares todo 0 globo, se a con- corréncia das outras todas ndo refreasse a sua avidez? O gue dizemos do clima, poderiamos dizer também da idade, do sexo, e de outras influéncias de ordem natural. Em suma, fisicas ou vivas, todas as realidades exteriores nos 80 0 mesmo espectéculo de ambigdes infinitas, irreali zadas_@ irrealizéveis, que se agrithoam ¢ se paralisam Feciprocamente. O que nelas se chama fixidez, imutabili_ dade das leis da natureza, realidade por exceléncia, nao € nto fundo mais do que a sua impoténcia para ir mais longe no seu caminho verdadeiramente natural e de se realizar mais plenamente. Pois bem, também ha destas influéncias fixas (momentaneamente fixas), de ordem social, que a estatistica descobre ou pretende descobrir; Porque as realidades sociais, ideias © necessidades, nao sao menos ambiciosas do que as outras, e é nelas que se determinam por anélise estas entidades sociais que se Genominam costumes, instituigées, lingua, legislagéo, religido, ciéncias, indistria e arte. As mais velhas destas coisas, as que passaram & idade adulta, cessaram de crescer, mas as jovens desenvolvem-se, como se tem disso ®, Prova, entre outras, pelo crescimento incessante dos Rossos orgamentes, que aumentaram, aumentam e au. mentardo sempre até a catdstrofe final, ponto de. par- tida de uma nova progressdo destinada_a um desfecho analogo, © assim sucessivamente. Sem ir mais longe do que 1819, desde essa data até 1869, 0 montante das cobrangas indirectas elevou-se muito regularmente de 544 para 1323 milhées de francos. Quando 33 ou 37 milhées de homens ~ 33 em 1819, 37 em 1869 — tém necessi- dades crescentes, porque se copiam cada ver mais uns pelos outros, devem produzir e consumit cada ver mais Para as satisfazer, © & inevitével que as suas despesas 145 AS LETS DA INTTAGAO despesas comuns se elevem em proporgéo com privadas (1) Se a nossa civilizagao europeia tivesse dado desde h& muito pouco tempo, como a civilizacdo chinesa, tudo © que ela era susceptivel de dar, om matéria de invengdes e descobertas; se, vivendo sobre um capital antigo, ela se compusesse exclusivamente de velhas necessidades e de velhas ideias, sem qualquer acrescento recente mesmo que fosse pouco ‘notdvel, é provavel, a partir do precedente que 0 wto de Quételet se tivesse cumprido. A estatistica aplicada a todos os aspectos da nossa Vide social conduziria por toda a parte a séries uniformes horizontaimente desenvolvidas © perfeitamente compardveis as famosas "leis da natureza". € talvez porque a natureza muito mais velha que nds @ teve tode o tempo exigido para conduair a este estado de esgotamento inventivo todas as suas civilizagdes, quero dizer, os seus tipos vivos (ver dadeiras sociedades celulares, ‘como se sabe), que se nota nela esta fixidez ou esta rotacao sobre si que tanto se elogia. Dai a bela periodicidade regular, tao admi- rada, dos némeros fornecidos pela estatistica sécio-fisio— \6gica por assim dizer, que se preocupa obstinadamente com pér em relevo as influéncias constantemente iguais da dade, do sexo, sobre a criminalidade, sobre a nup- cialidade, Poder-se-ia, certamente, estar ‘convencido an- tecipadamente dessa ‘regularidade, como se pode estar certo que, se se dividisse os acusados erh nervosos, bilio 80s, linfaticos, sanguinios, quem sabe mesmo em loiros & morenos, a participagéo anual de cada uma destas cate- gorias nos delitos anualmente cometidos se mostraria sempre @ mesma, © que seria meihor assinalar 6 que certas regula~ ridades estatisticas, aparentemente de outro género, se (1) Esta progressio néo & privilégio do msso si regine, diz M. Delahante (UMA FAMILIA DE BANOUEIROS NO sécuLO WIII), "a renda geral representou para o governo UM PRODUTO SCMPRE GRESCENTE de cen a cento e sessenta allhie 146 A ARQUEOLOGIA € A ESTATESTICA Felacionam, no fundo, com aquelas. Por exemplo, por que € que, desde hé cinquenta anos, pelo menos, os réus con denados em matéria correccional apelam em muito perto de 45 vezes sobre 1000, enquanto que o ministério pablico, durante 0 mesmo perfodo, apelou segundo uma proporcao incessantemente decrescente, do dobro para o igual? O decréscimo, no que diz respeito ao apelo dos delegados Piblicos, € um efeito directo da imitagdo profissional constantemente crescente. Mas 0 estacionamento numérico, NO que conceme ao apelo dos réus, como explicé-lo? Notemos que 0 condenado, quando se pergunta a si pré- prio se deve apelar, ndo se regula em geral sobre o que fazem ou fariam os seus semelhantes em caso igual, exemplo que ele ignora o mais das vezes. Consulta ainda menos a estatistica, onde poderia ler a prova de que os tribunais de primeira insténcia sio cada vez mais levados @ confirmar as decisées dos primeiros juizes. Mas, en- tre @ esperanga do sucesso e 0 medo do fracasso, coisas 'guais, aliés (quer dizer, os motives para esperar ou para temer tirados das circunstancias tém 0 mesmo peso anual), é a natureza mais ou menos audaciosa que o faz pender mais para um lado do que para o outro, Aqui intervém, Portanto, como peso suplementar que conta na balanga, uma dose determinada de audécia e de confianga que faz parte do temperamento médio dos delinquentes © que. como tal, se traduz necessariamente, pela proporcao uni. forme dos seus apelos. © erro de Quételet explica-se historicamente. Os Primeiros ensaios de estatistica foram, com efeito, levados @ cabo sobre a populacao, quer dizer, sobre a natalidade ou @ mortalidade nas diversas idades ‘da vida em diversos lugares, nos dois sexos, assim como sobre o casamento; © como esses efeitos de causas climatéricas e fisiolgicas ou de causas sociais muito antigas deram naturalmente lugar a repetices de algarismos quase iguais, caiu-se no erro de goneralizar essa observagdo, desmentida ‘de sequida E G assim que a estatistica, cuja regularidade ndo exprime Sendo, no fundo, a subserviéncia imitativa das massas @ fantasias ou a concepgdes individuais de homens supe. 147 AS LETS DA DAITA riores, péde ser seriam regid por vontades ou mas por mitos chamades leis naturais! Contu statistica da populagdo jé feito abri © numero dap nece estacionario em pais algum; cresce ou uma lentidéo ou uma. raj pow para povo, de século na hi a ‘Fisica social; e nos Temos 50? Eis uma necessidade sea tiga, @ necessidace do paternidade, de os ‘nascime me_eloquentement ou de baixa no piblico. Ora, apesar de estatistica mostra-no-la sujeita a enormes o: historia consultada delxa-nos perceber no da nossa Franca, por exemplo, uma sucessao de de. mentos e de fepovoamentos graduais, alternativ territério. — E que esta caracteristica’ de uramente aparente. Uma coisa & 0 des. tural, outra coisa & 0 desejo social, imitative zado de se tornar pai. O primeiro pode ser constante 2 0 Segundo, que se enxerta sobre o primeira em cada grande mudanga de costumes, de leis ou de religido esté sujeito a flutuacses e a rensvacées seculares, 0 erro dos economistas esta em confundir este com aquele, ou, antes, em sé considerar aquele, enquanto sd este interessa a0 socidlogo, Ora, ha tantas necessidades cistintas © novas de paternidade, no segundo sentido, como motivos distintos © sucessivos pelos quais 0 homem em sociedade quer ter hos. E sempre, na origem de cada um dostes motivos, como explicacao’ do seu nascimento, encontramos des cobertas prdticas ou concepgées teérices. O Espenhol ou © Anglo-Saxdo da América é fecundo porque tem a Amé rica para povoar; sem a descoberta de Cristévao Colombo, quantos milhdes ‘de homens no existiriam! O Inglés in. sular é fecundo, porque tem um tergo do globo para co lonizar: consequéncia directa, entre ‘outras’ causas, desea 148 OLOGIA EA ESTA sequéncia de bem sucedidas exploragées © de tragos de génio_maritimo ou guerreiro, ou de. iniciativas privadas uas_coldnias. Na’ Irlanda, ou a populacéo de 3 milhoes ara 300000 em 1845. O Ariano antigo quer jade para que a chama do seu lar nio' se extinga e seja alimontads todos os dias com o seu licor sagrado, porque a sua religiéo o persuade de que esta extingdo seria um mel para a sua sombra. O cristao 26 1930 sonha ser chefe de uma fam mmevosa para obe- decer docilmente ao multiplicamini biblico. Ter criangas, para os Romanos dos primeiros tempos, € dar querreiros & répiblica, @ qual nao existiria sem ‘este feise de ins vengoes, de instituigées militares ou politicas, de origem etrusca, sabina, latina ov outra, de que Roma fer a ex ploragao. Para 0 obreiro das minas, dos caminhos de ferro, das_manufacturas de algadéo, é dar novos bracos a eases jas nascidas de invencdes modernas. Cristévao Co- lombo, Watt, Fulton, Stephenson, Ampere, Parmentier podem passar, celibatérios ou nao, pelos meiores multi plicadores da espécie humana que jamais existiram Paremas, est aqui o suficiente para me fazer entender. € possivel que se olhem as criancas presentes sempre da mesma maneira, desde que hé pais; mas de certeza absolute que se olham de outro mode as criancas fas, conforme se vé nelas, como o pater familias antigo, escravos domésticos sem eventuais direitos ds parte; ou, como Europeu actual, mestres ou eredores, talvez exigentes, de quem se poderd ser escravo um dia Efeito da diferenga dos costumes @ das leis, que es ideiag © as necessidades fizeram. Vé-se, aqui como em tods Parte, que sao as iniciativas individuais, contaglosamente Imitadas, que tudo fizeram (entendo socialments), Desde ha milhares de séculos, sem divida, a especie, humans feduzida a um numero itrisério de individuos, teria cessaco de progredir, sob a presséo dos bisontes © dos urses, de tempos a tempos, do decurso da histéria, quelques homem de génio nao tivesse vindo dar uma forte chicotada na sua forga de reprodugo, tanto abrindo moves se 149 AS LEIS DA IMETAGAO coloniais ou industriais, & actividade do homem, como inovador religioso, tal como Lutero, reanimando ou antes rejwenescendo sob uma forma completamente nova 0 fervor popular ea fé geral da Providéncia, alimentador dos pas saros dos campos. A cada chicotada deste género, pode dizer-se que uma nova necessidade de paternidade, no sen tido social, nascia e, acrescentada ou substituindo as pre- cedentes, 0 mais das vezes acrescentada do que substi tuindo, ia entrar por seu lado na via propria do desen volvimento. Agora, tomemos nas suas origens qualquer uma dessas necessidades sociais de reproducao, e sigamo-la na sua carreira. Tanto vale prendermo-nos a este exemplo como a outro qualquer para concluir uma lei geral que em breve iremos formular. No meio de uma populacao mantida estaciondria durante muito tempo, porque 0 desejo de ter filhos se encontrava ai dominado'exaccamente pelo medo mais forte da miséria que eles causariam ao mul- tiplicar-se mais, espalha-se imediatamente a nova de que uma grande ilha, descoberta e conquistada por urn compa- triota, procura Um novo meio de engrandecer a sua. fa- milia’ sem se empobrecer, enriquecendo-se até. A esta nova, e 8 medida que ela se propaga e se confirma, o desejo de pateridade redobra, quer dizer que o precedente desejo € ultrapassado por um novo, Mas este ndo se rea- liza imediatamente. Entra em luta com todo um povo de habitos_enraizados, de rotinas antigas, de onde nasce a convicgdo geral de que ninguém se pode aclimatar nessa terra longingua, que se deve morrer ai de fome, de febre e de seudade. Longos anos se passam antes’ que esta resisténcia ambiente seja totalmente vencida. Entao, estabelece-se uma corrente de emigragio, e 0s colonos, libertos de qualquer preconceito, piem-se a desenvolver @ sua fecundidade exuberante. £ 0 momento em que a tendéncia para uma progressdo geométrica, lei de qualquer Necessidade e ndo somente da necessidade de reproducao, Passa ao acto e se satisfaz em certa medida. Mas este momento néo dura sempre. Em breve, pelo préprio efeito a prosperidade ascendente que acompanha os progressos dessa fecundidade, esta afrouxa, cada dia mais entravada 150 Anoveot hE a tsraristica pelas necessidades de luxo, de lazer, de independéncia fantasista que ela prépria fez nascer e que, chegados a um certo grau, pdem ao homem ultracivilizado este di- lema: "Entre as alegrias que te oferecemos e as alegr Ge uma familia numerosa, escolhe; quem quiser estas, renuncie aqu Daqui uma paragem inevitével da pro- gressdo assinalada; depois, se a civilizagdo se prolonga ao extremo, surge uma despovoagao principiante, que o Im- pério romano conheceu, que a Europa modema e mesmo a América conhecerao certamente um dia, mas que nunca foi nem runca iré muito longe, dado que, levado para 14 de um certo limite, produziria um recuo da civilizacao, uma) uigdo das necessidades de luxo, que relevaria © nivel da populacao. Portanto, se no surgir nada de novo, apés algumas oscilagdes, o estabelecimento de um estado estaciondrio, definitivo até nova ordem do acaso ou do génio, impse-se necessariamente. Podemos generalizar sem medo esta observagao. Dado que ela se pode aplicar a uma necessidade tao pri_ mitiva na aparéncia como a da paternidade, com muito maior facilidade se aplicaria &s necessidades ditas de !uxo (todas consequentes de uma descoberta, esté claro). Por exemplo, & necessidade de locomogdo a vapor. Esta’ sufocada a principio pelo receio de acidentes e pelo habito de vida sedentaria, nao tardou em desenvolver-se triunfaimente até aos nossos dias em que se encontra face a outros adversarios mais poderosos, formados em. Parte ou olimentados por ela, quero dizer, a necessidade gessas mil satisfacées variadas da vida civilizada sem as Quais © prazer de viajar ndo poderia crescer indefinida- mente. Com menos clareza, mas nao menos certeza, a Mesma observacdo também se aplica as necessidades de ordem superior, tais como a de igualdade, de liberdade ica, acrescentemos de verdade. Estas’ trés tltimas, neles compreendida a terceira, séo bastantes recentes. A primeira nasceu da filosofia humanista e racionalista do fosso século XVIII, de que os chefes e as origens sdo conhecidos; a segunda, do parlamentarismo inglés de que seria dificil, sem ir muito longe, indicar os inventors 151 AS LETS 04 DALTAGAO @ propagadores sucessivos. Quanto & necessidade de ver- dade, se fizermos fé em M. Dubois-Raymond, este tor- mento teria sido ignorado na antiguidade, de que esta lacuna explica a inferioridade cientifica e industrial tao estranha a par dos seus dons eminentes, e seria o fruto préprio do cristianismo, dessa 0 do espirito que, exigindo a 6 ainda mais do que as obras, e a fé em factos oonsiderados histéricos, ensina aos homens o alto prego do verdadeiro. A fé crista teria desta forma gerado @ sua grande rival, o entrave moderno & sua propagacéo até af triunfante, ‘a ciéncia, que data sd do século XVI Imensa entéo, mas localizada num pequeno nimero de » produziu 0 amor do verdadeiro que depois. transbor- € transborda sempre. Mas jé em certos sinais é | perceber que nao seria preciso entrar muito no século XX tao alterado na curlosidade desinteressada como 08 trés séculos anteriores. E pode-se predizer, de certeza absoluta, que nao estd longe o dia em que a necessidade de bem estar que a indistria, filha da ciéncia, so teré de- senvolvido desmesuradamente, abafard o ardor cientifico @ Prepararé as novas geracées ‘para sacrificar utilitariamente a necessidade social qualquer ilusao consoladora, cémoda @ comum, talvez imposta pelo estado, o culto livre e in- dividual da verdade inquietante. E nem a sede j4 muito diminuta de liberdade politica, nem a nossa paixdo actual de igualdade escaparao certamente a um destino seme- Inante. Talvez seja preciso dizer o mesmo da necessidade de propriedade individual. Sem adoptar sobre este assunto todas as ideias de M. de Laveleye, deve-se reconhecer que esta necessidade civilizadora de primeiro plano e nascida de um conjunto de invengdes agricolas, foi pre- cedida pela necessidade de propriedade comum (pueblos da América do Norte, comunismo Hindu, Mir russo, etc.); que na verdade nao cessou de crescer até acs’ nossos dias 8 custa desta Ultima, como o prova a diviséo gradual do que restava ainda de comum, por exemplo os logra- douros piblicos das nossas aldeias; mas que j4 nao cres- cem © que no dia em que entrar em luta com a neces- 182 sidade de melhor alimentacao e de bem poderd ver recuar diante desse rival que e! gerado. Néo somente qualquer necessidade social, mas qualquer nova crenga atravessa, ao propagar-se, as trés fases de escritas acima, antes de atingir o repouso final. Em resumo, portanto, crenga ou necessidade, sempre Ihe 6 preciso primeiro, a esse germe social fazer-se apa rece? penosamente através de um emaranhado de hébitos e de crengas contrdrias; depois, superado esse obstdculo, espalhar-se apés a sua vitéria, até que novos i suscitados pelo triunfo, venham obstruir 2 sue marcha © opér, enfim, uma fronteira intransponivel a sua difusao. Estes novos inimigos, se se tratar de uma recessidade, seréo em grande parte os hdbitos que ela terd provocado directa ou indirectamente; se se tratar de uma crenca, sempre errada em parte, sabemo-lo bem, serdo as ideias parcialmente opostas que dela se terdo deduzido ou que ela terd feito descobrir: as heresias ou as ciéncias nasci das do dogma e contrdrias ao dogma do qual elas fazem parar 0 impulso vitorioso através do mundo, as teorias cientificas ou as invengdes industriais, sugeridas' por teorias anteriores de que elas limitam as’ aplicagdes e circuns. crevem o sucesso ou a verdade (1). (1) Quando uns crenga ou un desejo cessaran de se propagar, contuda, continuar 2 enraizer-se no seu campo, tornado por exemlo una relig: periodo conquistador. Por outro lado, # 3 excepyaa disso, o enral- vamento gradual de que se trata apresenta, coma a difusdo gradual que acompanha ov segue, fases bem marcadas © aniloges. A crenga, 10 seu inicio, conbatida ainda, & juizo consciente, e 2 recessidade ascente, pela mesma razi0, @ voligio, desejo. i unaninidade que cresce e que roune em cada um a convitz3o © 0 querer, 0 jufzo passa ao estado de princ de dogma, de quase Percepgio seni-inconsciente; 0 desejo, 30 estado de paixto e de necessidade propriamente dita; a quase per encontrando-se confrontada cada vez ais frequentenente com aden, ou ume ideis revolucionéria apés 0 seu

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