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Copyright © desta edi¢ao: ESETec Editores Associados, Santo André, 2008. Todos os direitos reservados Silva, W. C. M. P. Sobre Comportamento e Cognicaéo: — Org. Wander C. M. Pereira da Silva 42 Santo André, SP: ESETec Editores Associados, 2008. v.21 436 p. 23cm 1. Psicologia do Comportamento e Cognic¢ao 2. Behaviorismo 3. Analise do Comportamento CDD 155.2 CDU 159.9.019.4 ESETec Editores Associados Diagramacao e arte: Ana Carolina Grassi Leonardi Solicitagao de exemplares: comercial@esetec.com.br Santo André - SP Tel. (11) 4438 6866/4990 5683 www.esetec.com.br Capitulo 25 Punigées do sistema penal sob a luz da Anilise do Comportamento Anna Beatriz Carnielli Howat Rodrigues’ Felipe de Carvalho Pimentel* Lucinéia Pesente™ 1. introdugao e objetivo A norma juridica néo apenas descreve, mas Prescreve, normaliza comportamen- tos e dita medidas de valores sociais com o objetivo de moldar os individuos segundo o espirito das leis, convertendo em uma construc&o legal legitimadora de Praticas Politico-normativas que reclamam a homogeneizaeéo dos Aumanos no universo juridico dominante (Philippi, 1994, Pp. 173). com tamanhas idiossincrasias (Arantes, 2004), Nes palavras de Philippi (1994) a jungao das ciéncias direito & psicologia “desemboca "2 concepg¢éo de um sujeito responsavel, racional, imputavel e, portanto, controlavel” p.172). Para atender a esse controle as normas juridicas descrevem e estabelecem Sermas para o comportamento, assim come apontam valores sociais “com o objetivo ‘= moldar os individuos Segundo 0 espirito das leis, convertendo ‘=cal legitimadora de pri em uma construgdo ‘aticas politico-normativas que reclamam a homogeneizacao Ses humanos no universo j ridico dominante” (Philippi, 1994, p. 173). “Seduanda de! Psicologia da Universidade Federal do Espirito Santo e Westrando de Psicolac Sessiada Capes. Bolsista do Programa de iniciagaio Cientifica. gia da Universidade Federal do Espirito Santo ~ Mestranda de Psicologia da Universidade Federal do Espirito Santo, Sobre Comportamento e Cognisio 305 O cenario juridico traz em seu bojo uma série de polémicas que carecem de uma adequada resolugao. No final dos anos 70, as discussées sobre as condigdes humanas nos espagos prisionais e de reclusao ganharam corpo no Brasil possibilitan- do que houvesse uma racionalidade critica também sobre os procedimentos de traba- thos dos psicdlogos nesses espacgos (Aguiar, 2005). Quando falamos em Psicologia Juridica podemos estar nos referindo a atuagao na area de familia, infancia e juventude, criminal, entre outras, privilegiando aqui o campo criminal, onde sero focalizadas as praticas punitivas judicidrias de penas prive- tivas de liberdade (prisées) e as penas e medidas alternativas pensando-as sob a luz da Analise do Comportamento a partir do cenario tedrico construido pela literatura refe rente ao tema. Mais especificamente, cabe aqui entao analisar os modelos de praticas punitivas e seus possiveis efeitos “desejados” sobre o comportamento dos usuarios assim como analisar os efeitos colaterais de tais praticas, pensando, também no nos so papel como psicdlogo neste campo de atuacao. 2, Breve Historico das prisdes e a possibilidade das penas e medi- das alternativas A prisao, tal qual conhecemos na atualidade, 6 uma instituigéo que nasce com © capitalismo e desde ent&o, vem sendo utilizada para administrar, Seja pela via corregao, seja pela via da neutralizacao, as classes tidas como Pperigosas (Kolker 2004, p.158). © surgimento desse sistema e¢ para isso voltaremos na historia até a Era Classics européia tomando emprestado alguns escritos de Foucault (1997) em Vigiar e Punir. De acordo com o autor a maior parte das condenagées para aqueles que iam contra o qu= era “bom” fazia-se por banimento (acompanhado pela exposigao e marcagéio com fem= te) ou multa (acompanhada Por agoite), entretanto, para as penas mais sérias som sofrimento, correlacionando o sofrimento com a gravidade do crime, sendo en marcantes os exemplos destas praticas, como a decapitagdo, o esquartejamento, Outras que manifestavam ao maximo do poder de quem punia. No fim do séc XVIll e comeco do séc XIX, com 0 advento do movimento ilumini tudo 0 que retomava ao espetaculo punitivo passou a ter cunho negativo e tais prati Passaram a ser extintas (Foucault, 1997; Rosa, Ribeiro Junior & Rangel, 2007). O aconteceu neste periodo, segundo Biscaia & Souza (2005), foi que o Direito P. julgamento, em principios do século XIX, Surgem como pega fundamental no conjuné das punigées (Foucault, 1997; Kolker, 2004; Mameluque, 2006; Rosa, Ribeiro Junior Rangel, 2007). Os homens da lei Passam a entender que a punicao deveria ser efice= 306 Anna B.C. H. Rodrigues, Felipe de C. Pimentel, Lucinéia Pesente para livrar 0 homem do crime, 0 essencial seria Corrigir, reeducar, “curar’. De certa forma, pretendeu-se extinguir o dominio sobre © Corpo, pois desta maneira estaria se exercendo uma fraca influéncia da razdo e da religiao sobre o “espirito humano”, logo, o castigo passou do sofrimento fisico e dor no corpo para uma economia dos direitos suspensos. lronicamente, como nos fembra Mameluque (2006), as prisées surgiram a partir do progresso das idéias, como a forma mais civilizada de penalidade. As prisées, anteriormente conhecidas pelos povos primitivos como medida preventiva enquanto decidia-se a pena imposta para o individuo (Biscaia & Souza, 2005), transformaram-se, apés a Segunda Guerra, como espinha dorsal do sistema. O Codigo Penal foi publicado em 1940 instituindo como penas privativas de liberdade a pena de reclus@o (maximo 30 anos) e detencao (maximo de 3 anos) (Mameluque, 2006). Percebe-se, desta forma, que durante os tempos ‘tentou-se implementar prati- cas “mais voltadas para o respeito e humanidade”, menos cruéis, menos sofridas e mais suaves, entretanto, Pensamos que um paradoxo passa entaéo a tomar forma: ao mesmo tempo que é€ defendida a idéia de reabilitagéo e reconstituigaio da conduta de quem infringe a lei, nao é tao clara a empreitada publica no investimento sobre tais ambientes, muito menos em tecnologias comportamento que promovam tal reabilita- go; 0 aparelho judiciario/penal, como coloca Adorno (1994, citado por Souza et al., 1998), da forma que é hoje e que veio sendo construido, acaba deixando seu ideal de reeducagao de lado contribuindo para a perpetuacao da violéncia, mudando o foco para a questéo das diferengas e das desigualdades, mantendo assimetrias e preservando distancias hierarquicas. A partir da faléncia das penas de prisdo, surge a necessidade de buscar alter- nativas, a partir de um desenrolar econdmico, histdrico e social, o Cédigo Penal de 1984 Passou a prever 3 tipos de sangdes penais: a pena privativa de liberdade, a pena restritiva de direitos (penas alternativas) e a pena de multa (medidas alternativas) (Biscaia & Souza, 2005). Dotti (1998, citado por Biscaia & Souza, 2005) diz que se pensou nas medidas e penas alternativas como uma forma de tomar mais eficiente e significante o Direito Penal, evitando a entrada de uma pessoa na prisdo e buscando diminuir a reincidéncia criminal, 0 que se coloca como algo muito interessante de ser pensado, pois, como nos lembra Kolker (2004), quando o individuo adentra na maquina peniten- ciaria, se devolvido 4 sociedade, o é na qualidade de delingiiente, afastados do seu meio social, em geral por muitos anos L..]; submetidos a condi- gGes que sé estimularao a sua revolta; perseguidos por seu estigma e por sua folha corrida, recusados no mercado de trabalho por seus antecedentes penais e, doravante sob a vigilancia freqdentemente da policia, os condenados @ pena de priséo sero também condenados a reincidéncia (p.168). A titulo de contextualizacao, vale lembrar que as penas alternativas s&o: a) pres- tago de servico & comunidade ou entidades publicas (art. 43, !V, e art. 46 do CP) na qual © condenado realiza tarefas gratuitas em hospitais, creches, escolas, etc e cada hora de prestagao de servigo equivale a 1 dia de condenaco; b) prestagao pecuniaria (art. 43, |, CP), que consiste no pagamento a vitima, seus dependentes ou entidade publica ou Privada de destinag&o social uma importancia em dinheiro fixada pelo juiz (maior que 1 salario minimo e menor que 360 salarios); c) perda de bens e valores (art. 45, § 3°) que © a perda de bens e valores do condenado em favor do Fundo Peninteciario Nacional; d) interdigéo temporaria de direitos (art. 47, CP), que consiste na proibigéo de exercer cargo ou fung&o publica, mandato eletivo, suspensdo da carteira de habilitagado e obri- Sobre Comportamento e Cognicto 307 gacao de n&o freqientar determinados lugares; e) limitagao de fim de semana (art. 48. CP)..que consiste na obrigatoriedade de permanecer aos sabados e domingos, pela periodo de 5 horas, em casa de albergado ou estabelecimento similar (Biscaia & Sou za, 2005). A Suspensao Condicional da Pena (art. 77, CP), ou “sursis” 6 uma medida alternativa que tem por finalidade permitir que o individuo n&o se sujeite 4 execugao d= pena privativa de liberdade de pequena duraco, ou seja, permite que, mesmo conde- nada, uma pessoa ndo fique na cadeia. Ela é aplicada para casos em que a pena nao for superior a 2 anos e 0 sentenciado deve cumprir condigées estabelecidas pelo juiz (por ex: doagao de cestas basicas, prestagdo de servigo a comunidade, etc.) (Biscaia & Souza, 2005). A Lei 9099/95 instituiu quatro medidas alternativas, ou seja, despenalizadoras. S40 elas: a) composic&o civil (art. 74 da lei 9099/95) que consiste em reparar os danes, sofridos pela vitima da forma mais rapida e menos formal; b) transagao penal (art. 76 ca Lei 9.99/95), que consiste em propor para o autor da infragao a aplicag&o de pena restritive de direitos ou multa; c) suspensao condicional do processo (lei 9.099/95), na qual podera haver suspens&o condicional do processo nos delitos com pena minima igual ou inferior a 2 anos sem condenacao e fazendo com que o acusado continue a ser réu primario. porém, cumprindo as mesmas condigdes da “sursis” (Biscaia & Souza, 2005). Suplicios, punigées, prisdes, e, atualmente, penas e medidas alternativas fo- ram formas encontradas a fim de vingar ou punir aqueles que praticaram atos tides contra as normas sociais vigentes, é importante frisar que, com a influéncia da pene mais humana e a passagem dos suplicios para as outras sang6es, regras comegaram a serem pensadas no sentido do que seria legal ou ilegal de ser feito ao voltar o mal para o individuo que fez um mal, desta forma, passou-se a punir de acordo com os seguintes principios: 1) Regra da quantidade minima, na qual o proveito do crime deve- tia ser menor que o proveito da punigdo para que ele nao fosse desejado; 2) Regra da idealidade suficiente, que versa que a punig&o nao deveria trazer sofrimento fisico, mes sim, desprazer; 3) Regra dos efeitos colaterais, segundo a qual a pena deve ter efeitos mais intensos naqueles que nao haviam cometido o crime, servindo de modelo; 4) Regra da certeza perfeita, em que a cada crime tem que haver uma sangao correspon- dente e que se tenha certeza que a sango vira (Foucault, 1997). Desta forma, percebemos que, até se ter a Lei de Execugées Penais (LEP) muitas idéias foram modificadas, muitas situagées foram pensadas, pois como todo conjunto de regras, 0 processo de continua transformagao é inevitavel. Todavia, perce- be-se que este conjunto de regras enfrenta grandes problemas ao tanger de maneira insatisfatéria a multiplicidade de contingéncias sociais sob as quais os comportamen- tos dos sujeitos que as compée € fung&o, além da forma como 6 colocada em pratica. 3. Sob a luz da Analise do Comportamento Ao analisarmos a condic&o atual das regras que regem os sistemas prisionais nos deparamos imediatamente com complexas interagdes e possibilidades de pena (como as citadas anteriormente). O ponto de partida para esta andlise € que o controle social é fundamental (Skinner, 1953), porém, n&o é possivel uma definigao pronta sobre © método ideal que se deva empregar na “corregao” dos sujeitos infratores. De fato, parece que estamos longe de um consenso. Revela-se entao pertinente uma analise mais apurada sobre as contradigdes imediatas que surgem a0 analisar 0 processo em si. Para tanto, Bonamigo (2003) ressalta que no campo juridico “o primeiro passo para 308 > Anna B. C. H. Rodrigues, Felipe de C. Pimentel, Lucinéia Pesente 9 psicdlogo iniciar seu trabalho é realizar uma analise funcional institucional e cultural” (p. 369). Neste ponto, justifica-se a necessidade de compreensdo dos processos de controle coercitive contrapondo-os com os objetivos sociais nas praticas penais. Em “Coergao e suas implicagées” (1989), Sidman analisou amplamente a utilizagao de técnicas de punigao para estabelecimento de controle da realidade social. Seguindo este raciocinio, o autor mostra alguns efeitos complexos que a punicao tem sobre 0 comportamento dos sujeitos sob tal pratica. Numa andlise comportamental, segue-se a premissa de que a punig&o n&o produz comportamento, apenas o suprime momentaneamente enquanto o agente punitivo esta presente e favorece o aparecimen- to de respostas alternativas (Skinner, 1989). Como nos mostra Catania 99), além da supress&o inicial de respostas, a punigao apresenta uma série de @feitos colatera que podem ser enumerados da se- guinte maneira: 1) eliciago de respostas emocionais — ao entrar em contato com estimu- los aversivos, 6 observada nos sujeitos uma série de respostas emocionais, como por exemplo, palpitages, tremores e raiva; 2) emissdo de respostas incompativeis ao com- portamento punido — uma vez em contato com a Punigao os organismos tendem a emitir uma segunda resposta chamada de resposta incompativel ou resposta controladora que tenta impossibilitar a repetigéio do comportamento punido; 3) Contracontrole — este prova- velmente seja o efeito da puni¢&o mais indesejavel, nele quem é controlado tende a emitir uma resposta visando impedir que o agente controlador mantenha © controle. Em detri- mento a todos esses efeitos indesejaveis causados pelo controle aversivo, este pode ser percebido cotidianamente como o mais usado na tentativa de controle do comportamen- to. A pena de priso imposta por restrigo de liberdade é claramente uma punig&o que visa Por intermédio de punic&o positiva e negativa a redugaéo dos comportamenios que foram considerados socialmente inadaptativos. Para Sidman (1989) e Moreira & Medeiros (2007), essa postura perante os com- portamentos considerados inapropriados é freqiientemente repetida devido a alguns fatores, tais como: a) imediaticidade da resposta — 0 agente punitivo ao suprimir um comportamento, geralmente 6 de imediato negativamente reforgado; b) eficacia no de- pende da privacdo - o organismo nao precisa estar privado de reforgadores para a eficacia de uma punigao sobre o sujeito; c) facilidade no arranjo de contingéncias. Skinner (1972) argumenta que por mais que as técnicas de tortura tenham sido deixadas de lado, as técnicas punitivas néo deixaram de ser empregadas, pois, como argumenta Sidman (1989), a preferéncia pela utilizag&o da coergSo faz parte das interagdes humanas. Com isso, néo podemos desconsiderar o fato de que a punicao, em primeira instancia, diminui a freqiiéncia do comportamento de quem foi punido, um sistema de justiga baseado apenas em punicéo mantém muitas pessoas “na linha” e satisfaz aque- les que buscam vinganga contra os transgressores; mas um cédigo de leis também gera desobediéncia e a utilizagdo da coergao em longo prazo esta fadado ao fracasso a medi- da que gera-desengajamento pessoal, isolamento da sociedade, neurose, rigidez inte- lectual, hostilidade e rebelido, e, para muitos que administram e fazem cumprir o sistema, pode gerar brutalidade. A busca por um controle alternativo neste contexto 6 emergente. Alternativas ao controle aversivo apesar de serem aconselhaveis, acabam por dar muito trabalho no manejo das contingéncias. Moreira & Medeiros (2007) enumeram possiveis alternativas para o controle do comportamento que envolve menos aversividade, essas so mais indicadas por apresentarem meios Ppositivos para o con- trole do comportamento dos infratores. Dentre essas alternativas destacam-se: aja utilizagao do reforgo positivo em lugar do negativo — ao ministrar o reforgo positivo também se obtém um aumento na freqtiéncia de resposta e 0 sentimento que acompa- Sobre Comportamento e Cognicio 309 nhara essa conseqiiéncia sera prazer e satisfagao e nao alivio, com isso, espera-se o desenvolvimento de repertorio mais adaptativo como, por exemplo, a escolha pela ree~ lizag&o de tarefas que abonem dias de pris&o e ainda provéem renda para a familia do preso; b) realizagao inicial de procedimentos de extincao em vez do uso indiscriminado da punig&o, tendo as respostas inadequadas auséncia de reforgamento no contexte penitenciario; c) reforcar diferencialmente comportamentos adequados com beneficios diretos e contingentes sobre tais respostas; e finalmente d) optar por um aumento da densidade de reforcos para respostas alternativas — esse procedimento consiste em nao utilizar a extingao, mas reforgar com mais freqléncia comportamentos alternatives e com menos freqiiéncia os indesejaveis. E necessario aqui avaliar o que é reforcador para os detentos e ent&o promover contingéncias de reforgamento que concorreriam com as que controlam as respostas “criminosas” e anti-sociais. Apesar destes procedimentos ja conhecidos pela ciéncia do. comportamento. as penas e procedimentos corretivos que vém sendo utilizados até o momento pare- cem nao ter acesso as informagdes da analise comportamental acerca dos efeitos adversos da punicdo. Ora, se o objetivo declarado é o desenvolvimento pessoal e 2 reabilitagéo do sujeito 4 comunidade, como esperar isso de um procedimento que se respalda unicamente no estabelecimento de condigdes que suprimem respostas ine- dequadas e desenvolvem respostas funcionalmente semelhantes em topografias dife- rentes? Em outras palavras, 0 sistema penal em voga esta fadado ao fracasso, pois tenta, por intermédio da punicao “cua”, instalar ou desenvolver comportamenio: socialmente adaptativos em um ambiente que apresenta uma quantidade limitrofe ou inexistente de reforgadores positivos para tais respostas. Chama a atenc&o tamanha contradicao: instalar comportamentos adaptativos por intermédio de punig&o. Pare Mameluque (2006) “A punigao foi se tornando a parte mais velada do processo penal (p.624). De fato, ainda nao ha tecnologia do comportamento que tenha respondido de maneira satisfatoria a problematica supracitada. Isso esta provavelmente ligado tanto 2 falta de insergao e de experiéncia da psicologia como um todo no ambito juridico come também devido @ pequena atenc¢&o que a area da analise aplicada do comportamento tem direcionado ao problema (Bonamigo, 2003). E claro que n&o se pode ser ingénuo ao negar a evolugéo do processo historico cultural e pensar em uma sociedade nao punitiva, mas isso nao invalida a necessidade de estudar sistematicamente as formas em que as penas tém sido empregadas, os resultados de tais agdes para entéo formu- lar de maneira pragmatica modelos de andlise funcional criteriosa e verificar as varia- veis de controle que geraram melhores resultados; isto tudo considerando as limita- ¢6es que naturalmente este trabalho ira enfrentar inicialmente. Sendo assim, deve-se partir do pressuposto que 0 controle coercitivo é inegavel, tanto como qualquer forma de controle social, contudo, averiguar novas formas praticas de fazer com que este controle seja mais eficaz e funcional faz-se ent&o pertinente. Holland (1978) defende que enquanto ficarmos preocupados em definir uma “personalidade criminosa” e atuar nesta personalidade, por meio da corregao, para que ela deixe de ser criminosa, poucos avangos seréo dados no campo juridico. Levando em conta 0 individuo como parte de seu meio, o autor prevé que enquanto nao se atentar para 0 fato de que o individuo também 6 controlado pelas contingéncias sociais, dife- rentemente de uma intervengao clinica, continuara se reproduzindo individuos propen- sos para o crime. Sendo o comportamento adaptavel, ele se ajusta as contingéncias de reforgamento ou punigaéo. Poderiamos pensar que nas prisdes, por exemplo, o sujeito 310. Anna B. C. H. Rodrigues, Felipe de C. Pimentel, Lucinéia Pesente crime), ou seja, na priséo é possivel que uma classe de Fespostas “criminosa” seja fortemente instalada por ambos reforgadores positivos e negativos, gerando ampla con- corréncia nas contingéncias entre a vida cotidiana (que Ihe Prové poucos reforgadores generalizados ou n&o) e a vida no crime (que estabelece amplo controle de estimulos e 4. Consideragées Finais Como abordado até o momento, a andlise das contingéncias mais presentes no cenario das punigées utilizadas pelo sistema penal mostra que a area carece de complexa realidade, a populacao como um todo tende a nao se envolver com os proble- mas deste universo, é mais facil excluir do que lidar com os sujeitos que nao se compor- tam como 0 esperado). Precisamos de um trabalho em rede, em conjunto, pois somente com integragao que as penas e medidas venham contribuir para uma sociedade menos injusta (Amaral, 1997; Aguiar, 2005; Biscaia & Souza, 2005). Nosso primeiro papel como psicdlogo neste campo seja o de dar sustentagao para a formag&o dessas redes e a criag&o de politicas publicas, De acordo com Aguiar (2005), dentro dessa légica o Psicdlogo precisa confrontar racionalidades ja construidas é trabalhar com os direitos objetivos e subjetivos da cidadania, justiga, qualidade de vida.e autonomia. Podemos trabalhar com essa populagao promovendo possibilida- des, ampliando repertérios mais adaptativos e conseqiientemente sujeitos mais segu- ros, saindo do campo moralista e levando para 0 campo ético. Sobre Comportamento e Cognisio 311 Eticamente, devemos intervir para a promogao de cidadania e autonomia principalmente, tirar 0 foco do delito e coloca-lo no sujeito, nao a fim de continuar ap= nas culpabilizando-o, a fim, todavia de responsabiliza-lo de seus atos e torna-lo ator atuante em sua historia, fazendo com que ele assuma suas escolhas e as conseqilé cias advindas das mesmas. Concluindo de acordo com as idéias de Aguiar (2005) “Somente a busca pela resolutividade nas agdes do psicdlogo permite ampliar olhar que a sociedade e o Estado tem sobre o seu exercicio social. Ao cont efetivamente com politicas e agées na diminuigao da violéncia e no reibaxal das taxas de reincidéncia de delitos, 0 psicdlogo passa a representar como interlocutor ativo na sociedade. Deve-se pensar seriamente sobre sua rein: nas politicas publicas de promogao de justiga e cidadania, pois sé a reinventando o que se faz, 6 que sé pode reconectar contratos sociais de egre de presidios e penitenciarias por uma via que no seja o delito.” (p.270/1) Referéncias Aguiar, A. (2005). Psicologia Juridica e Politicas Publicas no Campo da Reinsergo Social de Reclu: In Cruz, R.M.; Maciel, S. K; Ramirez, D. C. (org). O Trabalho do Psiedlogo no Campo Juridico. i Paulo: Casa do Psicdlogo. Amaral, A. B. do. (1997). A progressdo do regime e os crimes hediondos. Jus Navigandi, Ter: 1(6). Disponivel em: . 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