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SERAFIM E MALACUECO NA CORTE DO REI ESCAMA Pequena peca para atores ou fantoches Personagens: Serafim Malacueco Pirata da Perna de Pau Rei CENA 1 (Cenério: a fachada de uma casa simples - uma porta e uma janela - com estrutura de rodas, que 2 movimente em cana.) (Aparecem dois vagabundos estarrapados: Serafim, o magro; Malacueco, 0 gordo.) Serafim - Ai que sono! Que preguiga! Que cansago! Malacueco - Ai que estafa! Que fadigal Que quebreiral Serafim - Quebreira de qué? Malacueco - Cansago de qué? Serafim e Malacueco - De ndo fazer nada! (om coro) Serafim - O pior é que estou com uma fome... Malacueco - E eu com uma larica... Olha, vamos aquela casa. Pode ser que nos deem de comer. (Batem a ports da casa.) Serafim - Vossa Exceléncia precisa de regar o jardim... Malacueco -... que ja esté muito seco... Serafim - Aqui esta o Serafim... Malacueco - ... e 0 Malacueco. Serafim - Em troca pedimos. Malacueco - ... pao para a viagem. ‘Serafim - Nao temos dinheiro para pagar estalagem. (Abre-se a porta com espathatato e aparece o Pirata da Perna de Pau, de espada na mao.) Pirata da Perna de Pau - Quem sao vocés? Serafim - Serafim. (muito encolhido, com a voz a ‘sumirse) Pirata - O qué? Serafim - Serafim. (mais alto, mas ainda assustado) Pirata - E tu? (para Malacueco) Malacueco - Ma....la.. .cué.. .cué.. .cué.. .cueco. (trémuilo e gaguejante) Pirata -O qué? Malacueco - Malacueco. (ainda assustaco) Pirata - Serafim e Malacueco? (cesignando-os com a espada) Serafim e Malacueco - Dois eriados ao vosso dispor (deesieitade vena) fem-coro e servis) Pirata - Meus criados? Eh! Eh! Estao contratados. Eh! Eh! (tindo-se) Serafim -Nés sé disseros. (tentando atathar) Malacueco - Nés nao dissemos. (idem) Pirata - O vosso patrao, a partir de agora, sou eu. Malacueco - Parece que falamos de mais. (para o Seratim) Pirata - Sabem quem eu sou? (Serafim e Malacueco dizer que nfo com a cabera Pirata - Eh! Eh! Adivinhem. Sou a Branca de Neve? (indo) Serafim - A primeira vista nao parece... (hesitando) Pirata - Eh! Eh! Sou o Capuchinho Vermelho? Ou sou 0 Lobo Mau? Malacueco - Talvez... talvez mais... a segunda hipétese (amedo) Pirata - Nem um nem outro. Eh! Eh! Eu sou (cantarolando) o Pirata da Perna de Pau, do olho de vidro, da cara de mau... Serafim e Malacueco - Bri! Que medo! Pirata - Vocés dois fazem parte da equipagem do meu navio. Vou s daqui: navegar por esses mares fora alé encontrar uma terra em que as minhas maroscas nao sejam conhecidas. Serafim - E se 0 barco vai ao fundo? Malacueco - Nés nao sabemos nadar... Pirata - Dentro de agua ¢ que se aprende. Eh! Eh! A minha frente, marchem! (Gies marcham, capitaneados pelo Pirata.) Malacueco - Meteste-me em bons trabalhos, Serafim! (tremende) Serafim - Tu é que me meteste... Malacueco - Foste tu! Serafim ~ Nao, foste tul (Batem um no outro. 0 Pirata da Perna de Pau dé uma cacetada-espadeirada em ambos.) Pirata ~ Quero disciplina! (Anarece em cena a ectrutura lateral de um barco a remos.) Pirata - Toca a embarcar. E disciplinal Malacueco - Aia minha cabeca! Serafim - Ai as minhas costas! (Entram denivo do barco. Malacueco Seratim tomam conta dos remos. 0 Pirata comanda, de pé, 4 proa,) Pirata - Toca a remar. (A casa, movida por rodas, vai recuaride, barco fica no mesmo sitio. Se possivel, alguns efeites visuais que deem a ‘uso de movimento.) Pirata (cantando) - Eu sou 0 Pirata da Perna de Pau, do olho de vidro, da cara de mau... (Aparece em cena uma minascula ita, também movida a todas, que se aproxima do barco, onde esforcadamente remam Seratim @ Malacueco.) CENA 2 Pirata - Terra a vista! (Aha aproxima-se do barco, Por tras da ilha aparece © Rei. Tem um aspeto grotesco de rei de Carnaval) Pirata - Todos ao ataque. Eh! Eh! Abordagem! (Atha e 0 barco chocam, © Pirata, de espada em punho, sai do barco. Os dois vagabundos sequenr-no, Pirata (dirigindo-se ao Rei, ‘ameagadoramente) Rei Pirata Rei Pirata da Perna de Pau Rei Pirata ‘medrosamente.) - Deita cA para fora todo 0 teu dinheirame, manipango. Ja. Ja que tenho pressa. - Como vindes insolrido, estrangeiro! Quem sois? Que pretendeis? Donde vindes? Trazeis alguma mensagem de um rei meu amigo, 6 ilustre embaixador? ~ Qual mensagem nem qual carapuca! Quero os teus tesouros, depressa, Toca a despachar - Expressais-vos com presteza, mas eu nao vos entendo. Sabeis porventura que estais falando com um rei? (Serafim e Malacueco prestram-se por terra.) - Eh! Eh! Rei de qué, pode saber-se? - Rei desta ilha, senhor absoluto de todo o mar que vedes em volta. D. Ordonho |, rei das Espinhas de Carapau e das Escamas de Bacalhau. Prestai-me homenagem. (Serafim © Malacueco vottam a prostrar-se,) - Eh! Eh! E o teu palacio, os teus vassalos, os teus stibditos, onde estao eles? (0 bareo, puxado dos bastidores, comega a afastar-se da ila.) Rei Pirata Rei Pirata Serafim Pirata (chorando) Rei Serafim Rei (Para Seratim) Serafim (curvando-se) Rei Malacueco (curvando-se) Serafim Malacueco Serafim Pirata - Nao tenho palacio, nem vassalos, nem stbditos, ilustres estrangeiros. Vivo sozinho. Se tivesse vassalos e subditos nao me deixavam ser rei como eu quero. - Eh! Eh! Pois entdo da ca o teu mealheiro, o teu tesouro, que nés vamo-nos jé embora e nao te incomodamos mais. - O meu tesouro, impaciente estrangeiro, é constituido, como o seu titulo anuncia, por espinhas de carapau ¢ escamas de bacalhau. Se assim o quereis, levai-o e enchei com ele o vosso barco. - Onosso barco... Onde esta ele? Socorro! Socorro! O nosso barco & puxado pela corrente. (O barco afasta-se e desaparece) Vio busca-lo, vadios. Tragam 0 meu barco, malandros. - Nés no sabemos nadar... - Nom eu! Fum! Fum! Perdi o meu querido barco, 0 barco que ou tinha roubado com tanta habilidade. Fum! Fum! Sou um desgracado, um pobre naufrago. Fum! Fum! - Descansai, ilustre estrangeiro, que eu vos darei quarida no meu reino, enquanto nao arranjardes transporte para a vossa terra. -Enés? - Vés passais a pertencer ao meu séquito. Nomeio-vos, ilustre estrangeiro, Duque das Aguas Claras. ~ Oh Majestade, que grande honral = © vosso companheiro tomara o titulo de Marqués das Aguas Turvas. - Que bonito, Seratim. - Nao me trates por Serafim. Sou o Duque das Aguas Claras. - E eu 0 Marqués das Aguas Turvas. Temos a vida garantida. - Nunea mais voltamos a trabalhar. (Serafim e Malacueco fazem salamaleques um 20 outto,) - Também quero um titulo, 6 rei das Espinhas! Eh! Eh! Um titulo c& para o Pirata amigo! i. - Vés sereis o Almirante-Mor da esquadra do meu reino, - Onde esto os barcos dessa esquadra? - Sossegai, Almirante! A esquadra, uma esquadra a perder de vista, té-la-emos, um dia, para conquistar o Mundo. Pirata - Eh! Ehl Combinadol... Para conquistar 0 Mundo. Malacueco - Nao gosto disto, Duque. Serafim - Nem eu, Marqués. Pirata - Que esto vocés para ai a conspirar? Tratem do nosso almogo. Depressal Rei - Duque das Aguas Claras ¢ Marqués das Aguas Turvas... (ohamando) Malacueco e Seratim - As ordens de Vossa Majestade. (prostrando-se) Rei - Obedecei ao Almirante-Mor! Ide com prontidao pescar-nos um peixe de bom porte, amanhai-o © cozinhai-o, enquanto eu @ 0 Almirante vamos dar um passeio pela ilha Serafim - Mas eu sou Duque, Majestade. (protestando) Malacueco - E eu, Marqués... Rei - Pescar e cozinhar para o rei é uma honra. (Dé-ihes uma cana de pesca © uma enorme frigidera ou serti) Va, Marqués e Duque, ide, ide... E vés, Almirante, vinde comigo. (Rei e Pirata atastam-se, até detxarem de ser vistos.) Seralim - Nao gosto nada disto, Malacueco. Malacueco - Nem eu, Serafim. (Ambos perderam a pose aristeorética, Atraram & «aqua» a litha da cana de pesca, ‘A outta ponta da linha-corda da cana deve alcargar os bastidores.) Serafim - Se conseguissemos fugi... Malacueco - Mas como? Com tanto mar pelo meio. (A cana esiremece.) Serafim - Um peixe picou. Puxa, Malacueco, puxa. Malacueco - Nao ha-de ser grande coisa. (puxando) (Vem um peixe pequenino, na ponta da linha.) Serafim - Aqui est um peixe para o jantar de Suas Exceléncias (trando 0 peixe} Malacueco - E tao pequenino, Serafim. Deita-o outra vez ao mar, coitadinho. Ele que cresca. Serafim - Vai buscar-nos um barco que nos livre desta ilha, peixe pequenino. (dangande 0 peixinte 20 mar) (Malacueco vottou a langara linha, na creo dos bastidores.) Malacueco - Nao ha barcos por estes sitios. Serafim - Que infelicidade a nossa, Malacueco. Malacueco - Ail Ail Serafim. Pesquei um peixe muito grande. Vé tu como ele puxa. (A linha estica-se) Ajuda-me, Serafim, (Serafin agarra- se 20 Melacueco) Ai que © peixe tem mais forca do que nés. Serafim - Puxa-nos para o mar! Socorro! Malacueco - Eu noo largo. Dé-me a serta, Serafim. (Continuam a ser puxados, Caem a «Agua» e montam a figideira ou eertd, que tera um rodado de patins. A itha desaparecerd, em senido contrario,) Serafim - Ai que eu ndo sei nadar. Malacueco - Nem eu. Agarra-te que vamos de serta aquatica, (Escoregam em cima da frigideira, puxados dos bastidores) (Variante para teatro de tantoches. Depois da «deixa» de Seratim, dirs Malacueco: «Nem eu. Mas como somos fellas de papelio ou de madeira ou de esferovite, etc, ndo nos afogamos»_) CENA 3 (No mesmo cenario da Cena 1. Os dois vagabundos esto caidas por terra.) Malacueco Serafim Malacueco Serafin Malacueco Serafim Malacueco Serafim Malacueco - Olha, Serafim, onde o peixe nos deixou... = Que bom, Malacueco. Estamos salvos. (Abragam-se.) - Estou ca a pensar que este peixe grande, se calhar, era 0 pai do peixe pequenino. ~ Se calhar era... - Eo Reie o Pirata da Perna de Pau? Que sera feito deles? - Continuam & espera do almoco. - E da grande esquadra para conquistar o Mundo! ~ Deixé-los esperar... - Deixé-los esperar. (Risonhamente, abrem a porta da casa, clue era do Pirata da Perna de Pau, de que manifestamente tomam conta, Serafim Serafim e Malacueco (em coro) Malacueco Serafim e Malacueco (em coro) Entretanto, cantam.) Nao nos chamem vagabundos vagabundos, vagamundos que vagabundos ndo somos. Andamos por esse mundo nao temos patrées nem donos nem criados nem mordomos. - Nem criados nem mordomos. -Trabalhamos, mas nao tanto entretanto descansamos, és somos causa de espanto, Nao temos chefes, amos, protectores, senhores que mandam. Cantamos, quando cantamos. - Cantamos, quando cantamos... (Vao andando pelo meio do pablico, em atitude de recalher tostées para 0 peditéro...) Serafim Serafim e Malacueco (em coro) Malacueco Malacueco e Serafim (epeter) - Estou cansado de cantar nao apanho nem vintém. Vou-me ja daqui embora, isto assim nao me convém. Uns escudos, uns tostées nao fazem falta a ninguém. ~ Nao fazem falta a ninguém - Eu jé tenho a boca seca de estar a cantar sozinho, venha de la uma pinga déem-me um copo de vinho. E também nao era mau um pastel de bacalhau... - E também nao era mau um pastel de bacalhau (Flepetem de novo) Antonio Torrado, in Teatro as trés pancadas

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