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4 MARCIA REGINA FERREIRA DE BRITO 445 bu TMUNICAMP B777e . Te squat “DO Um estudo sobre as atitudes em relacio 4 Matematica em estudantes de 1° e 2° graus FACULDADE DE EDUCACAO UNICAMP 1996 ‘Trabalho apresentado pata concurso de Livre Docéncia na area de Aprendizagem do Departamento de Psicologia Educacional da Faculdade de Educagiio da UNICAMB. Resumo S80 poucos os estudos a respeito das atitudes com retagdo & Matematica desenvolvides em excolas brasileres piblicas ou particulares, Entrelanto, existe uma grande quantidade de estudos a respeito desse tema em ‘cutros paises, principaimente na Gri-Bretanha, Estados Unidos, Espanha e Portugal. A avaliagfo do impacto das influéncias sociais nas atitudes tem sido tema de muitos dos estudos desenvolvidos nesses paises. Baseada no modelo de Educag8o como um provesso de inferagio social, onde as atitudes desempenham ‘um papel fundamental, a presente pesquisa tern como objetivos verificar a existencia e ocorréncia de atitudes em relagic & Matemitica a direg2o (positiva ou negative) que estas assumem, buscando estabelocer relagées entre -essas atitudes e alguns fatores selecionados. (Os sujeitos foram 2007 estudantes de 1° grau (3* a 8 série) e 2° grau (trés séries) de quatro escolas piiblicas¢ urbanas da regio de Campinas. A primeira etapa do estuda refere-se at tradugio, adaptagdo ¢ validagio ‘da escala de atitudes em relagio 4 Matemstica, proposta originslmente por Aiken ¢ revista por Aiken e Dreger (Shaw e Wright, 1967), Os instrumentos usados:0 estwdo foram essa escala ¢ um questionério preparado de acordo ‘com 05 objetivos propostos. Os resultados da andlise da escala mostraram um item alfa = 94. A medida de sclequago da amostra de Kaiser-Meyer-Otkin apontou o valor 0,97200. ‘A utilizagdo da ANOVA apontou a existéncia de diferengas significativas (p <050) nas atitudes em relagdo & Matemética quando os sujeitos so agrupados de acardo com a escola, série, grau, idade, sexo, cdesempenho, aulo-peroepeao do desempeno, ajuda nas torefas de Matematica, compreeasio dos problemas e das explicagses do professor ¢ a preferéncia por diseiplina. Quando os grupos séo analisados (ANCOVA) de acordo ‘com duas possibilidades, apenas os agrupamentos escola x idade © escola x grau epreseutam diferengas significativas, ‘Ocstudlo fornece ainda uma ampla revisto da literatura existente « respeito das atitudes em relago & Matemética e, na conclusfo, tenta esbogar um “perfil” do estudante com atundes favoraveis em relagio a essa disciplina Abstract Few studies of attitudes toward Mathematics have been conducted in Brazilian public or private schools. However, attitudes toward Mathematics have been studied in many countries, particularly in Great Britain, The ‘United States, Spain and Pormgal. The impact of social influences on attitudes is becoming the main objective of ‘many studies developed in those countries. ‘Assuming thai education is a process of social interaction, where attitudes play a key role, the rescarch presented here had as objectives to access attitudes and the direction (positive or negative) assumed by those attitudes . An attempt to establish relationships between attitudes and some related factors is made. ‘Subjects were 2007 students (grades 3 to 12) from four public urban schools. This study first translated and validated a scale of altitudes toward Mathematics developed by Aiken und reviewed by Aiken and Dreger (Shaw and Wright, 1967). Data was collected through this scale of attitudes and a questionnaire prepared according to the proposed objectives. The data malysis of the scale showed an alpha = .94 and the Kaiser-Meyer-Olkin value was 0,972. ANOVA pointed out differences (p< .050) in attimdes toward Math when subjects are grouped according to school, grade, achievement, self-perception of achievement, receiving help in homework, comprehension of problems and teacher explanation, and discipline preferences. ANCOVA showed that grouping the subjects in two possibilities, only school x age and school x grade arc significantly different. ‘A wide review of the existing literature on attitudes toward Mathemutics is also provided and in conclusion an attempt is made (o trace a picture of a student with positive attitudes toward Mathematics. indice RESUMO ABSTRACT INTRODUCAO 1. ATITUDE: EVOLUCAO DO TERMO E CONCEITUACAO O que sio as atitudes Importncia e relevancia das atitudes para a Educagao A escola ¢ as atitudes: A educagiio como processo de interagio social 2. O PROBLEMA, O METODO E AS DELIMITACOES DO ESTUDO O problema Questdes da pesquisa Objetivos do trabalho Descrigdo do método usado para estudar 0 problema Limitagdes do estudo 3. REVISAO BIBLIOGRAFICA Atitudes com relagao 4 Aritmetica ‘Alitudes e desempenho em Matematica ‘Atitudes e preferéneia por disciplina Género e diferengas de atitudes com relago 4 Matematica Atitudes e ansiedade matematica Asatitudes, os professores e a formagio de professores de Matematica 27 28 28 29 30 37 Atitudes em relag&o as Ciéncias e ao ensino de Ciéncias Algumas consideragdes a respeito da revisao bibliografica 4, SUJEITOS, INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS Sujeitos Material Procedimentos para adaptagfo da escala de atitudes com relag3o 4 Matematica A escala de atitudes com relago a Matematica 5, RESULTADOS E ANALISE DOS DADOS Aniilise deseritiva dos dados dos sujeitos Analise da escala de atitudes Tratamento estatistico dos dados da escala Calculo da média dos sujeitos na escala de atitudes Andlise de varidncia Analise da questio relativa & auto-percepgtio do desempenho 6. CONCLUSOES E CONSIDERACOES FINAIS 7. BIBLIOGRAFIA ANEXOS 162 181 183 184, 185 186 188 198 200, 218 222 232 233 285 288 304 Indice de tabelas Tabela 1- Distribuicao de frequéncia dos sujeitos segundo a idade Tabela 2~ Distribuigdo da frequéncia dos sujeitos de acordo com a escola Tabela 3~ Distribuigao da frequéncia dos sujeitos de acordo com a série Tabela 4+ Distribuig&o da frequéncia dos sujeitos de acordo com o grau Tabela_ 5- Distribuigdo da frequéncia dos sujeitos de acordo com o sexo Tabela_ 6- Distribuigao da frequéncia dos sujeitos de acordo com o periodo Tabela 7- Distribuigdo da frequéncia dos sujeitos de acardo com a profissao do pai Tabela &- Distribuigdo da frequéncia dos sujeitos de acordo com a profisso da mae Tabela 9- Porcentagem de alunos que recebem ajuda no estudo de Matematica, Tabela 10- Porcentagem dos alunos que recebem ajuda do pai no estudo de Matematica Tabela | 1~Porcentagem dos alunos que recebem ajuda da mae no estude de Matematica Tabela 12-Porcentagem dos alunos que recebem ajuda do irmao no estudo da Matematica Tabelal3- Porcentagem dos alunos que recebem ajuda de outros no estudo de Matematica Tabela 14- Distribuigdo dos sujeitos de acordo com a idade que iniciou a escola Tabela 15- Distribuig&o de frequéncia dos sujeitos de acordo com a experiéncia pré-escolar Tabela 16- Distribuig&o dos sujeitos de acordo com a reprovagio anterior Tabela 17- Distribuigao dos sujeitos de acordo com a época em que estudam Matemitica 201 202 202 203 203 204 205 205 205 205 206 207 207 208 Tabela 18- Distribuiggo de frequéncias, de acordo com o numero de horas "didrias" que os alunos estudam Matematica Tabela 19- Porcentagem de alunos que entendem os problemas matematicos dados em sala de aula ‘Tabela 20- Porcentagem de alunos que entendem somente com a explicagao do professor Tabela 21- Distribuigdodos sujeitos de acordo com as notas de Matematica Tabela 22- Distribuig&o dos sujeitos de acordo com a preferéncia por disciplina (Disciplina preferida) Tabela 23- Distribuigdo dos sujeitos de acordo com a preferéncia por disciplina (isciplina que menos gosta) Tabela 24- Distribuiggo dos sujeitos de acordo com a preferéncia por disciplina isciplina que retiraria da escola) Tabela 25- Preferéncia pela disciplina Matematica (disciplina preferida) Tabela 26- Preferéncia por outras disciplinas que no a Matematica (Disciplina que menos gosta) ‘Tabela 27- Frequéncia de alunos de acordo com a preferéncia por disciplina (Disciplina que retiraria da escola) Tabela 28- Frequéncia ¢ porcentagem de respostas as questdes da escala de atitudes em relagaéo 4 Matematica Tabela 29- Estatistica inicial Tabela 30- Estatistica final Tabela 31- Matriz de rotagao de fatores Tabela 32- Distribuigdo das médias de acordo com a escola Tabela 33- Anélise de variancia da média dos alunos quando agrupados de acordo com a escola Tabela 34- Distribuigiio das médias de acordo com a idade Tabela 35- Distribuigéo das médias de acordo com as séries 209 210 210 212 214 215 216 217 217 220 226 230 234 235 236 239 Tabela 36- Distribuigdo das médias de acordo com o grau Tabela 37- Distribuigdo das médias de acordo com 0 sexo Tabela 38- Distribuicdo das médias de acordo com 0 periodo Tabela 39- Distribuigdo das médias de acordo com a profisstio do pai Tabela 40- Distribuigao das médias de acordo com a profissio da mie Tabela 41- Médias dos grupos de sujeitos, na escala de atitudes, distribuidos de acordo com o inicio da escolaridade Tabela 42- Média dos sujeitos, na escala de atitudes, de acordo com ter ou no pré- primario Tabela 43- Distribuigdio das médias dos sujeitos de acordo com a reprovagao Tabela 44- Distribuigéo da médias dos sujeitos agrupados de acordo com receber ou nao ajuda nos estudos Tabela 45- Distribuigo das médias de acordo com a ajuda nos estudos (pai) ‘Tabela 46- Distribuigdo das médias de acordo com a ajuda nos estudos (mae) ‘Tabela 47- Distribuigao das médias de acordo com a ajuda nos estudos [irmio(s)] Tabela 48- Distribuigio das médias de acordo com a ajuda nos estudos (outros) Tabela 49- Distribuigdo das médias de acordo com os “habitos’de estudo Tabela 50- Distribuigao das médias de acordo com as horas diarias dedicadas ao estudo de Matematica Tabela 51- Distribuigéo das médias de acordo com ter ou nao aulas particulares ‘Tabela 52- Distribuigdio das médias de acordo com a compreensao de problemas ‘Tabela 53- Distribuigdo das médias de acordo com a compreensio da explicagio do professor em sala de aula Tabela 54- Distribuigao das médias de acordo com a atengiio na aula de Matematica Tabela 55- Distribuigao das médias de acordo com as notas em Matematica 241 242 244 245 246 248 (249 250 251 252 252 253 254 257 258 259 261 263 264 Tabela 56- Distribuigdio das médias de acordo com a preferéncia por disciplina (Disciplina que mais gosta) ‘Tabela S6A- Ordenagio das médias de acordo com a preferéncia por disciplina (Discipline preferida) Tabela 57- Distribuigaio das médias de acordo com a preferéncia por disciplina (Disciplina que menos gosta) Tabela 57A- Ordenagfio das médias de acordo com a preferéncia por disciplina Tabela 58- Distribuigio dos sujeitos de acordo com a disciplina que retirariam do curricula, Tabela 59- Distribuigio das médias de acordo com a preferéncia por disciplina (Preferéncia por Matematica) Tabela 60- Distribuigao das médias de acorde com a preferéncia por disciplina (Preferéncia por outras disciplinas) Tabela 61- Distribuigio das médias de acordos com a preferéncia por disciplina (Disciplina que retiraria do curricula) Tabela 62- Andlise de variabilidade Tabela 63- Analise dos efeitos principais Tabela 64- Distribuigio de frequéncias de acordo com a auto percepgio do desempenho Tabela 65- Distribuigdo das médias dos grupos de acordo com a auto-percepgiio do desempenho indice de Figuras Figura 1- A Educagio como um processo de interagao social 266 269 270 274 275 278 279 280 283 284 285 286 17 Anexos ANEXO_ 1- Questionario. ANEXO 2- Escala de atitudes. ANEXO 3- Anillise de confiabilidade da escala. ANEXO 4A- Matriz fatorial. ANEXO 4- Matriz de correlagdes. ANEXO 5- Estatistica do total de itens. ANEXO 6- Factor plot in rotated factor space. ANEXO 7- Distribuigao das médias de atitudes, por questo, quando os sujeitos so agrupados de acordo com a alternativa escolhida, ANEXO 8 - Distribuig&io das médias de acordo com a idade. ANEXO 9- Distribuigo das médias de acordo com a escola ANEXO 10- Distribuigao das médias de acordo com o sexo ANEXO 1 1- Distribuigéo das médias de acordo com a série. Introducdo Esse trabalho tem sua origem nas experiéncias que foram gradativamente adquiridas por mim trabalhando junto a alunos e professores envolvidos com a Educagio Matematica e, principaimente, em atividades desenvolvidas em algumas escolas de primeiro e segundo graus com professores de Matematica e seus alunos. O delineamento e as questOes aqui presentes foram sendo construidas gradativamente e ficaram mais claras através das atividades desenvolvidas com criangas que apresentavam dificuldades em Matematica. Minhas atividades na universidade estfo grandemente relacionadas ao ensino de ‘Matematica ¢ 4 formagio de professores de Matematica. E na area de Educagio Matematica que exergo preferencialmente a docéncia ¢ também ¢ essa area a escolhida por mim para atividades de pesquisa, orientacdo de pos graduados ¢ servigos de extensio. Atuando na disciplina Psicologia Educacional-Aprendizagem, nos cursos diumo ¢ noturno de Licenciatura em Matematica, é comum ouvir afirmagdes dos alunos a respeito dos sentimentos gerados pelas disciplinas “matematicas”. Segundo esses alunos, algumas dessas disciplinas sio dificeis e aversivas. Um répido olhar parece mostrar que as pessoas, de um modo geral, e os ahinos de segundo grau, em particular, nio gostam da Matematica e das atividades que envolvem a Matematica. Aparentemente, esse sentimento se cristalizaria na universidade. Estaria expresso na conhecida frase "odeio calculo”, que os alunos de graduagio de anos atras imprimiram em camisetas ¢ passaram a usar como uma forma de protesto em relacio a disciplina A midia, de certa forma, mantém ¢ reforga essa idéia, O iiltimo anexo ¢ um exemplo disso. Participando de congressos ¢ encontros de Educagiio Matematicade bancas de dissertagGes e teses ou ainda assistindo a seminirios e palestras ouve-se, com frequéncia, a afirmagdo de que os alunos ndo gostam da Matematica. A idéia veiculada é que os alunos néo gostam da Matemética "per se". Porém, nao so tratados os varios outros aspectos componentes do ensino-aprendizagem de Matematica. Desenvolvendo atividades com professores em algumas escolas, pude verificar também que muitos desses professores tem como fato comprovado que os seus alunos apresentam sentimentos negativos em relagdio 4 Matematica e, conseqiientemente, apresentam "aversio" a essa disciplina e ds tarefas que exijam conhecimento matematico. Em oposigio a isso, a observago do comportamento das criangas em aulas de Matematica, conversas informais com essas criangas no patio da escola e o acompanhamento de algumas criangas em atividades extra classe mostravam um conflito com a existéncia de atitudes hnegativas em relagic 4 Matematica. Essas criancas demonstravam gostar da Matematica e demonstravam apreciar os trabalhos propostos, apresentendo, na fala, atitudes altamente favoraveis com relagdo a essa disciplina. Curiosidade despertade, foi iniciado o proceso de busca, na literatura existente, dos estudos ja realizados com a finalidade de tornar mais claro o fendmeno que se pretendia estudar, conhecer as pesquisas jé realizadas sobre 0 tema, bem como os instrumentos ¢ métodos utilizados pelos diferentes autores no estudo das atitudes. A revisfio ¢ entendida aqui como © conhecimento da historia do fenémeno, a busca das razdes pelas quais as atitudes com relagao 4 Matemitica se transformaram em "problema" de pesquisa. Originalmente, o projeto foi elaborado com a finalidade de verificar a ocorréncia ou niio de atitudes negativas com relagio 4 Matematica. No entanto, com o envolvimento das atividades nas escolas e com base em observagdes de situagdes que sugeriam a presenga de atitudes negativas em alguns casos especificos, foram selecionadas algumas variaveis com a finalidade de verificar se elas estariam relacionadas, de alguma forma, as atitudes em relag&o 4 Matematica. Para medir as atitudes com relag¢do a Matematica foi usada a escala revista de atitudes em relagio a Matematica, elaborada por Aiken e revista por Aiken e Dreger. Essa escala foi escolhida porque aparece na literatura como uma das mais usadas para verificar os sentimentos que cada individuo apresenta com relacdo a Matematica. O resultado final do trabalho, aqui apresentado, tenta fornecer um panorama geral dos trabelhos relacionados ao tema e apresenta, além das conclusdes que foram possiveis extrair dos dados, algumas possibilidades de aprofundamento em aspectos que nao foram suficientemente esclarecidos, gerando novas possibilidades de pesquisa. A linha de pesquisa "Psicologia Educacdo Matematica” trabalha basicamente com atitudes ¢ habilidades e como o conhecimento matematico é construido e se estrutura relacionado a esses dois componentes do processo de aprendizagem ¢ ensino. Em decorréncia do presente trabalho, que serviu como ponto de partida para a linha de pesquisa, dois outros que se originaram a partir deste, jé foram concluidos (Gongalez, 1995 e Pacheco, 1995). Em virtude das varias significagdes assumidas pelo termo atitude ao longo do tempo, © capitulo I trata de definir situar conceito, particularmente nos aspectos referentes & Psicologia Educacional. Trata ainda de distinguir atitudes de crengas, opinides, valores € comportamento, tece algumas consideragGes a respeito da importancia e relevancia das atitudes para a educago. Ainda neste capitulo ¢ apresentada a insergio das atitudes no modelo de educagdo como um processo de interagao social. No capitulo I] sdo apresentados o metodo, o problema, as questdes geradoras,os sujeitos e uma breve descricao do método das escalas, destacando o trabalho ¢ as consideragée s de alguns autores sobre a técnica das escalas. O capitulo I] trata da revisao da literatura, que apresentou uma caracteristica bastante peculiar. Praticamente nao so encontrados trabalhos a respeito das atitudes com relagdo a Matematica desenvelvidos nas nossas escolas, se esses trabalhos séo concretizados, possivelmente nfo estio sendo adequadamente divulgados. Por outro lado, atitude é um dos temas mais encontrados ma literatura sobre ensino de Ciéncia e Educacdo Matematica dos principais periddicos das areas de Psicologia Educacional e de Ensino de Ciéncias ¢ Matematica, particularmente nos paises de lingua inglesa e, em seguida, os de lingua espanhola, particularmente aEspanha. F interessante notar que Portugal também vem desenvolvendo alguns trabalhos nesta linha, Devido & quantidade de trabalhos encontrados, foram selecionados apenas os que estavam diretamente relacionados ao tema ou que servissem para ilustrar algum aspecto do procedimento. Assim, 0 capitulo se subdivide em itens referentes as diversas variaveis estudadas (desempenho, género, etc.) & outros subtitulos nao previstos na primeira etapa, tais como atitudes e ensino de Ciéncias, formagao de professores e ansiedade matematica. A literatura é apresentada em uma sequéncia temporal. tentande mostrar a evolugdo ¢ importancia do tema. Ja no capitulo IV so deseritos os sujeitos que participaram do trabalho, os iv instrumentos usados para obtengao dos dados e os procedimentos adotados no decorrer da investigagao. O capitulo V trata da andlise dos dados, apresentando primeiramente uma descrigfio dos sujeitos em termos porcentuais, em seguida apresenta a analise referente 4 validagio do instrumento ¢, posteriormente, através da andlise de variancia (ANOVA) mostra as diferengas entre os grupos. ‘No capitulo VI esto as concludes que puderam ser extraidas dos dados desta pesquisa. A partir dos resultados obtidos so feitas algumas generalizagdes e inferéncias. Sao destacados também alguns pontos para futuros trabaihos de pesquisa no grupo ¢ é sugerida a necessidade de programas que visem a melhoria das atitudes em relagdo 4 Matematica, nao apenas dos alunos, mas também dos professores. Capitulo I Atitude: Evolu¢ao do Termo e Conceituacaio O conceito de atitude, assim como os demais conceitos, pode ser visto tanto como um constructo mental como uma entidade piiblica. Entidade piblica e constructos mentais sio entendidos aqui com a mesma significagio dada por Klausmeier (1977). De acordo com esse autor, entidade publica é entendida como a informagiio organizada a respeito de uma coisa ou classe de coisas (objetos, eventos e processos), que corresponde ao significado das palavras presente nos dicionarios, livros, enciclopédias e outros meios utilizados pelos estudiosos de uma area para veicular conhecimento daquela area, Por outro lado, 0 conceito como constructo mental é idiossincritico, refere-se a informago acumulada pelo individuo ao longo de sua vida, de acordo com as experiéncias de aprendizagem ¢ de acordo com seu proprio padrio de desenvolvimento. Assim, a atitude seria um conceit que pode ser definido, que possui atributos relevantes ¢ irrelevantes como todos os demais conccitos. Ja Vinacke (1974), acredita que a atitude € um processo mediacional que precisa ser diferenciada de conceito: “Bu pretendo distinguir conccito de outros processes mediacionais, principalmente das atitudes. Os conceitos tém a fiangto de selecionar ¢ organizar os efeitos de estinaulos extrinseoos (por exemplo, experiéncia, conhecimento e informagio), enquanto as atitudes té a fungio de selecionar e regular as respostas. Assim, os conceitos referem - se aos significadas dos objetos, ‘enquanto as atitudes referem « se & escolha e decisao, Em sentido mais amplo, conceitos e atitudes no so independentes um do outro, mes representam componenies do sistema cognitive complexo". (Vinacke, 1974) Atitude, enquanto um tema da Psicologia é também um conceito, pois refere - se ao conhecimento organizado que foi acumulado a seu respeito, podendo ser classificado em consiruto mental (a concepedo de cada individuo sobre o que ¢ atitude) e entidade piiblica (0 conhecimento académico acumulado a respeito desse conceito). Para melhor compreender o conceito de atitude como uma entidade publica faz-se necessaria uma revistio da evolugao desse conceito que, de certa forma, acompanha o desenvolvimento da Psicologia desde o inicio do século. O QUE SAO AS ATITUDES Atitude, hoje, ¢ utilizada como sindnimo de coisas que, seguramente, esto bem distantes de seu significado original. De modo geral, atitude acaba sendo entendido como um sinénimo de comportamento, em um enfoque que prioriza apenas o aspecto observavel, colocando - a como equivalente 4 motivacdo e outros, Seguramente, atitude nao é sinénimo de comportamento e nao pode ser confundida com ele. A atitude pode até ser um dos componentes do comportamento, mas nao séo nimos. Nao existem dividas entre os autores da literatura psicologica que as atitudes esto intimamente relacionadas & motivagiio, mas nem por isso devem ser vistas como o mesmo fenémeno. ‘Além disso, sendo um conceito passivel de aprendizagem, carrega consigo um forte componente social, O termo atitude ¢ origindrio do latim e a definig&io deste termo é encontrada nos dicionarios quase sempre relacionada a uma disposi¢do, sendo algumas vezes confiundida com comportamento € outras vezes com a motivaco. A seguir, com a finalidade de clarificar 0 conceito, sao apresentadas algumas definigdes do mesmo. A definigdo encontrada em lingua italiana é: Aititudine: of. 1. Disposizione innata per certa, attivita anche in quanto oggetto di fini dell’orientamento professionale: a. Per le lettere, per le matematiche, per la pittura. 2. Positura della persona, atteggiamento: mettersi in a. di supplice. [Devoto, G. ¢ Oli. G. C. (1986) - Vocabolario della Lingua Italiana, Firenze: Dizionari Le Monnier. 5° Ristampa, 1986.] A definicao um atribui um certo aspecto inato a atitude, provavelmente referindo-se ao fato de que certas atitudes, como por exemplo, as atitudes com relagdio a uma determinada disciplina (no caso, a Matematica) esto relacionadas as habilidades necessarias para adquirir os contedidos dessas matérias, Isso tornaria o sujeito, visto ter facilidade em um determinado contetido, predisposto ou motivado a apresentar atitudes mais favoraveis na area ou disciplina que envolve a aquisigdo e utilizacio desse conteudo. Assim, definigdes deste tipo estariam mais vinculadas as pré-disposigdes do individuo, aos aspectos inatos relacionados as habilidades. J& em lingua portuguesa, tomando como referéncia 0 “Novo Dicionério da Lingua Portuguesa” de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira [2* Edigio, revista e ampliada (13* impresso), Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira SA, 1986], o termo vai ser conceituado como: Afitude: [Do latim attitudine, ate, Do fr. Attitude] sf. 1, Posigao do corpo; porte, jeito, postura: Mantém-se erecta, em atitude elegante, 2, Modo de proceder ou agir: comportamento, procedimento: Qual foi sua atitude em face do desafio? 3. P. ext. Afetagio de comportamento ou procedimento: Sua cordialidade é pura atitude. 4, Proposito, ou maneira de se manifestar esse propdsito: A atitude das nagées aliadas na 2 ° Guerra Mundial foi de hostilidade ao nazismo. 5, Reagao ou maneira de ser, em relagdo a determinada (s) pessoa (s), objeto (s), situagdes, etc.: Sua atitude negativa revelave-the o desequilibrio psiquico, 6. Astr: Posigao de um foguete, missil ou satélite artificial, determinada pota diregtio de seu eixo principal em relagfio a um dado sistema de coordenadas. 7. Mar. G. Bras. Orientacdo do eixo longitudinal do projétil, ou de um dos trés cixos do missil guiado, em relagio a umta referencia preestabelecida. Os diversos dicionarios de Psicologia consultados mostram, basicamente, os mesmos significados. Para ilustrar, foi escolhido 0 “Diccionario de Psicologia”, compilado por Howard C Warren [Traduccién y revision de E. Imaz, A. Alattore y L. Alaminos; 2° Edicion (20* reimpresion), Mexico: Fondo de Cultura Economica, 1993], onde Actitud. 1. Disposicién o preparacion estabilizada. 2, Experiéneia abreviada pero amplia. 3, Disposicién psiquica especifica hacia una experiencia nasciente, mediante la cual esta es modificada, sea un estado de preparacién para um cierto tipo de actividad. 4. Tendencia estabelecida a renovar las funciones nerviosas, esp. las del cerebro (G. E. Miller). [ef, acvitud social.] ingl. Attitude: al. (1) Halung, (2) Bewusstseinslage, (3) Einstellung. Além destas definiges mais amplas, este dicionario apresenta também explicagdes sobre varios tipos particulares de atitudes, por exemplo, atitude em relagdo 20 processo, ao objeto, a0 estimulo, atitude social etc Assim, pode ser constatado que existe uma ampla variedade de empregos do termo ¢ esta diversidade dificulta, de certa forma, as propostas de mudangas de atitudes que, porventura, possam surgir nos projetos e planejamentos educacionais Varios autores (Koballa, 1988; Shrigley e outros, 1988; Sjédal, 1990} trataram da evolugio do termo “atitude” e € interessante notar como o emprego do termo foi, gradativamente, sendo alterado. De uma concepgiio mais ligada ao somatico, o conceito evoluiu para uma concepgéo mais ligada aos aspectos cognitivos e afetivos O terme atitude foi usado pela primeira vez como um conceito psicologico (Brown, 1954) por W. Thomas e F. Znaniecki no livro “The Polish peasant in Europe and America” (Chicago Univesity of Chicago Press), publicado em 1918 ¢ era usado para descrever 0 proceso de aculturagao do camponés oriundo da Polonia. Esse emprego do termo é 0 marco a partir do qual o termo atitude deixa de ser utilizado no sentido de uma agdo do corpo e adquire um carater marcadamente cognitivo. Existem diferengas a respeito do significado do termo atitude mesmo entre os pesquisadores da area. Um exemplo disso pode ser visto em Bergen, Dalton ¢ Lipsitt (1994) que escrevem a respeito do conceito de atitude presente na teoria de crescimento e desenvolvimento de Myrtle B. McGraw, particularmente nas décadas de 20 a 40. Neste artigo, provavelmente pelo fato de McGraw ser uma pesquisadora dedicada ao estudo do desenvolvimento motor e neuroldgico, o conceito de atitude aparece mais no sentido de comportamento, sendo considerada mais abrangente que a emogao € representa uma atividade que permeia o organismo como um todo. Neste sentido a atitude é considerada mais como carga motivacional, pois segundo essa autora o “estado atitudinat” definitivamente influencia a atividade, dando forga ¢ dirego para a “ago somatica O exemplo acima mostra o emprego do termo “atitude” com um significado semelhante a0 que Charles Darwin (Koballa, 1988) usava para descrever a manifestagdo fisica de animais quando em estado de “alerta” (seja na fuga ou em uma luta), sendo que essa manifestagao era, supostamente, permeada por urna forte emogao, Bloom (1974) define atitude como uma disposiedo geral do individuo para "olhar" aleuma coisa de uma maneira positiva ou negativa. Para ele, as experiéncias de sucesso e fracasso na escola levam ao desenvolvimento de atitudes positivas ou negativas. O autor diferencia atitude de interesse colocando esse ultimo mais relacionado ao sucesso na tarefa e atribui a diferenca entre os conceitos a aspectos de generalidade. Isto significa que a atitude com relagdo a escola ou a algum conteido é muito mais provavel de ser generalizada para outros clementos componentes da situagdo, enquanto 0s interesses so mais especificos ¢ menos generalizaveis. O ponto de semelhanga entre as atitudes ¢ 08 interesses estaria no fato de, tanto em um como em outro, o objeto de afeto ser exterior ao individuo. McLeod (1990) tratando das atitudes em relacZo 4 Matematica, no contexto da teoria do processamento de informacao, afirma que essas atitudes se desenvoivem de duas maneiras diferentes. ‘Na primeira maneira, a atitude com relagéo a Matematica se desenvolve através da automatizacéo, isto é, uma reag&o emocional ocorre repetidamente € 0 sujeito vai automatizar a atitude de forma positiva ou negativa, dependendo do efeito. O efeito, de acordo com essa cancepgio, ¢ intenso a principio, mas vai, gradativamente, sendo menos percebido até ser incorporado de maneira automatizada. A partir desse ponto, o efeito passa a se constituir em um automatismo. Na segunda maneira, a atitude j4 desenvolvida com relagdo a um determinado objeto, evento, pessoa ou coisa 6 transferida para outro semelhante. Na terminologia cognitiva a atitude de um esquema ¢ atada a um segundo esquema relacionado. Esta explicagdo é bastante semelhante a gencralizagao da ansiedade, dentro do modelo comportamental, diferindo apenas na descrigéo do processo intemo de incorporaco. O exemplo dado pelo autor ilustra bem estas duas formas de surgimento das atitudes: "Por exemplo, se um estudante tem repetidas experiéncias negativas com as provas geométricas, impacto emocional serd, inicialmente, intenso, mas ird diminuir de intensidade com o tempo. Eventualmente, a reagto emocional a prova geamétrica tomnar-se-c mais automatizada, haveré menos impulso fisioldgico e a resposta tornar-se-d eslével, podendo provavelmente, ser medida através de questiondrio. A segunda fonte de atitude é a vinculagdo de uma atitude jé existente a uma tarefa nova, mas relacionada. Um estudante que apresenta uma atitude inegativa com relagdo é prova geoméirica pode vincular essa mesma atitude com a prova algébrica." (Mc Leod, 1990) A anilise dos textos referentes as atitudes mostra que, além de nfo existir concordancia com Telagao a definigao de atitudes, também existe dificuldade em separar conceitos que so semelhantes, mas nfo sinnimos de atitudes. Muitas vezes, por serem conceitos praximos, eles sfio, erroneamente, tratados como a mesma coisa. De acordo com Nunnally (1970) as atitudes dizem respeito aos sentimentos sobre determinados objetos sociais - objetos fisicos, tipos de individuos, determinadas pessoas (geralmente personalidades), instituigSes sociais, politica ¢ outros. O autor distingue os interesses € os valores das atitudes pelo fato de que as atitudes sempre so relativas a um determinado “alvo” ou objeto. Em contraste, interesses ¢ valores referem-se a numerosas atividades - atividades especificas na medida dos interesses ¢ categorias muito amplas de atividades na medida dos valores. Atualmente alguns dos trabalhadores de Educac#o Matematica referentes a atitudes e valores no discriminam de forma adequada esses dois conceitos. Aparentemente, a énfase hoje 6 posta nos valores muito mais que nas atitudes, contrariamente ao que ocorria nas décadas de 60 ¢ 70, quando ‘os estudos das atitudes eram mais enfatizados que os estudos sobre valores. Nunnally em 1970 informava que era mais freqiente (¢ talvez relevante) a pesquisa sobre atitudes que sobre valores, ressaltando que a logica e a metodologia de pesquisa eram essencialmente as mesmas. Shirley, Koballa e Simpson (1988) também buscaram diferenciar os varios termos que podem ser confundidos com as atitudes e destacam como conceitos relacionados as atitudes: as crengas, as opinides ¢ os valores, De acordo com esses autores, se fosse tomado um continuum, as crengas estariam mais prdximas dos componentes cognitivos, ao passo que as atitudes estariam mais proximas do componente afetivo. Tanto as atitudes quanto as crengas sao aprendidas, bi-direcionais (gostar/nao gostar) e estio mescladas ao impulso-para-a-agio. Entretanto, as crengas sio mais estaveis, duradouras e resistentes que as atitudes, sendo que algumas crengas sao observaveis, enquanto as atitudes, nao. Além desses termos, opinidio também € frequientemente confundida com atitude, mas de acordo com Koballa (1988) a opiniao é mais afetiva que a crenga e mais cognitiva que a atitude. Com a finalidade de diferenciar entre gosto, atitudes e valores, Klausmeier (1977) usa a estabilidade como critério de diferenciagao. Esse autor, considerando que algumas atitudes sio aprendidas € tornam-se duradoura e estéveis e qutras so aprendidas e depois simpiesmente se modificam ou desaparecem, comparou esses trés elementos, ressaltando que: “o gusto nefene-se a algo especifico, ial coma gostar ou nde gostar de um animal ow de uma cor particular Os valores sito mais gerais e abareani divas masores de experiéncias, enquanto as atindes estado no meio dos dois. Por exemple, podemos pensar em gosto como se aplicanda a wn arranjo especifice de uma composigéo musical, en: atinidle, como aceltagae on rejeigder dle cerins tipas de misica, como cldssiea ox jaze, ¢ em um valor conto & papel da nntsica na vida do individue. Ha uma diminuigae gradativa no miimere dle vezes que ncorne a mudanga relativa ao gosto de wm individue: 4 suas atitudes em relagée a tipos de misica ¢ ao valor da muisica em sua vida”. (Klausmeies. 1977) Os valores podem ser considerados mais complexos, amplos ¢ abrangentes que as atitudes so mais limitados pela cultura, sendo claramente unidirecionais. Embora esses dois conceitos estejam impregnados por componentes avaliativos, sendo ambos dindmicos, os valores apresentam maior estabilidade que as atitudes ¢ diferem destas porque esto mais carregados de apelo moral e ético. ‘As atitudes, embora avaliativas, esto mais relacionadas ao gostar/ndo gostar de alguma coisa, enquanto os valores estéo mais vinculados a aspectos de julgamento moral que envolve 0 conceito de certo/errado, Assim, diferentemente das atitudes, os valores sie de carater unidirecional e, sendo mais est&veis, nfo oscilam entre dois polos, isto é, os individuos podem diferir na definigéo de lealdade, por exemplo, mas no tertio davidas que lealdade ¢ um valor adequado. ‘A anélise da literatura a respeito das atitudes com relagdo & matemiética mostra que 08 termos atitudes, crengas ¢ valores so, muitas vezes, empregados como sinénimos, 0 que gera confusio e obscurece ainda mais a atribuigéo de significado. Seria conveniente que tais termos fossem empregados e definidos de acordo com a estabilidade, a direcionalidade, 0 dominio, o grau de complexidade e a abrangéncia inerente a cada um deles. Obviamente, com relagdo & Matematica, os individuos apresentam opiniées ¢ crengas com relaco a ela (por exemplo, emitem opinides bascados na creniga de que 8 Matematica é uma disciplina “mental”, isto 6, treina a mente para outras atividades. Professores com esse tipo de crenga, atribuem ‘um valor exagerado a essa disciplina e com isso podem influenciar as atitudes de scus alunos, levando-os a gostar menos de resolver problemas matematicos ¢ apresentar uma baixo desempenho (comportamento) na disciplina. O exemplo acima é uma tentativa de mostrar o profindo entrelagamento entre esses seis conceitos, o que de certa forma dificulta a pesquisa educacional a sespeito desse fendmeno. Com certeza, a clarificacio desses conceitos permite uma melhor compreensio da influéncia exercida por eles. Inimeras definigdes de atitudes foram apresentadas por te6ricos da Psicologia ¢ areas afins 9 ao fongo do presente século ¢ varios pesquisadores trataram das diferentes definigdes elaboradas por esses diferentes autores dentro das varias abordagens da psicologia tais como Fishbein and Ayzen (1975), Bem (1973); Shaw and Wright (1967) e mais recentemente Sjédahl (1990). Dentre as varias definigées, é interessante destacar a de Guilford (1954) para quem a atitude seria uma disposigdo pessoal, presente em todos os individuos, podendo apresentar variados graus De acordo com esse auttor, o ser humano reage de maneira favordvel ou desfavordvel (positiva ou negativa, em outros termos) a objetos, situagGes, fatos, individuos, proposigdes etc. Ainda de acordo com Guilford, como as atitudes estdo relacionadas 4 motivagao, esta seria a responsavel por sua natureza bipolar, quando a afitude é vista como um contirtuum. Como a motivagao se manifesta em termos de apetites ou aversdes, os individuos desenvolvem inclinagées favoraveis ou desfavoraveis em relagao a objetos ou classes de objetos. A maneira como as atitudes sio formadas ¢ desenvolvidas € determinada através de aprendizagens de discriminagao ¢ generalizagio com relago aos objetos de atitudes. Esse autor trata as atitudes como “tragos de personalidade”, uma vez que, embora clas sejam sujeitas a mudanga no decorrer da vida do individuo, a direggo e a forga das atitudes so suficientemente estaveis ¢ duradouras, justificando analisa-las como um trago de personalidade. A definigfio de Ross Stagner (1937), citado em Billig (1944) contém varios elementos dessa definigio posterior de Guilford, e € basica para o presente trabalho: “A atitude é sempre caracterizada por 1} um objeto, 2} uma directo € 3) intensidade. O objeto pode ser considerado 0 aspecta cognitive ou intelectual da expertincia; a direséo é dada pelo grau predominante de sentimento de prazer ou desprazer em relagdo a esse objeto, entendido cognitivamente. A intensidade pode ser pensado em relacdo a tensdio ou grau de atividade que vat ser liberada por situagdes que envolvem as atitudes” (Stayner, 1937) Se a atitude com relagdo 4 Matematica fosse adaptada a essa definigdo de Stagner, poderia ser dito que essa atitude em particular se caracterizaria por um objeto (a Matematica), uma diregdo (positiva ou negativa) e uma intensidade (gostar da ou ter aversiio a Matematica). Da analise dos varios textos e autores podem ser extraidos alguns pontos que constituem os subsidios tedricos deste trabalho e so essenciais para a compreensiio da influéncia das atitudes no processo de ensino-aprendizagem. A defini¢do de atitude, aqui apresentada, é baseada nas varias definigdes previamente apresentada por outros autores e tenta contemplar os atributos essenciais do conceito ¢ as relagées entre cles. De forma mais completa, atitude poderia ser definida como uma disposiciio pessoal, idiossincratica, presente em todos os individuos, dirigida a objetos, eventos ou pessoas, que assume diferente direcéio e intensidade de acordo com as experiéncias do individuo. Além disso, apresenta componentes do dominio afetivo, cognitive e motor. Em primeiro lugar, as atitudes n&io devem ser confundidas com o comportamento € nao so gerais. Embora as pessoas se expressem na forma mais ampla, a atitude é sempre com relago a um "objeto" especifico. Por exemplo, quando o professor vé uma crianga falando com outra na aula ¢ diz que a crianga tem uma "atitude inadequada”, cle esta incorrendo em duplo erro. Confunde atitude com comportamento ¢ atribui 4 atitude um carater geral que ela ndo possui. A atitude 6 sempre “atitude com relagdo a", isto é, a atitude sempre possui um referente. Quando falamos de atitude, estamos nos referindo a um evento interno, aprendido, com componentes cognitivos e afetivos, que varia em intensidade ¢ é dirigido a um determinado objeto. Hoje a concepgiio definigao das atitudes envolve os dominios cognitivos (conhecimento 1 sobre © objeto da atitude), afetivo (sentimentos com relagdo ao objeto de atitude) e conativo (predisposigao para agir de uma certa maneira em relagao ao objeto de atitude) (Gauld e Hukins, 1980). Cada um desses dominios contribui de diferentes maneiras e em diferentes graus para a construgao das atitudes. A atitude aqui é concebida como sendo pertencente aos trés dominios e interpenetrada por eles. Além disso, as atitudes sao adquiridas e nfo inatas e embora algumas atitudes sejam mais duradouras e persistentes que outras, elas ndo s&o estaveis e vatiam ao longo da vida dos individuos, de acordo com as circunstancias ambientais. As atitudes sio altamente suscetiveis as influéncias da cultura na qual o individuo esta imerso. Como as atitudes so aprendidas, a escola pode e deve ensind-las, O ensino de atitudes deveria fazer parte dos objetivos dos varios curriculos escolares de qualquer nivel de ensino. A definigao de atitude ¢ a compreensio de seus fatores determinantes precisam ser conhecidos pelos educadores matematicos para possibilitar a andlise da(s) variavel(is) que esta(4o) influenciando a situagao de ensino-aprendizagem, possibilitando a previsio de comportamentos desejaveis que influenciarfo tanto no desempenho do individuo como na sua fitura escolha profissional. As atitudes com relag&o 4 Matematica, sendo um conceito central que € composto tanto pelo dominio cognitivo, quanto pelo cognitive e conativo, é essencial para a compreenstio, planejamento ¢ avaliago do ensino-aprendizagem dessa disciplina. ‘Assim, a compreensio dessas atitudes e seus componentes, por parte dos educadores matematicos, possibilitaria uma methora no desempenho e nas atividades relacionadas a essa disciplina, tanto por parte do professor como do aluno. Compreender as atitudes com relagao 4 Matematica significa buscar as experiéncias que 0 12 individuo teve com relagao a essa disciplina e compreendé-las dentro do contexto dessas experiéncias Isso toma tempo ¢ exige dos professores atitudes que, muitas vezes, eles também nao possuem. Quais seriam as possibilidades de ajuda para alunos que, sabendo que tém um desempenho ruim em disciplinas que envolvem Matematica, buscam ajuda? O que dizer aos estudantes niversitérios dos cursos de Fisica, Matematica e Quimica que reconhecem ter um fraco desempenho? Somente a compreensao dessas atitudes inseridas na realidade social da qual o individuo faz parte permite um avanco em diregdo a construgdo de atitudes mais positivas. IMPORTANCIA E RELEVANCIA DAS ATITUDES PARA A EDUCACAO O estudo das atitudes tem sido pouco desenvolvido em nossa cultura. As escolas, o ensino € 0 procedimento dos pesquisadores em educago no levam em conta esse proceso de ensino- aprendizagem ¢ no fazem referéncias is atitudes, Hoje, quando surge o termo atitude, ele vem mesclado com uma série de componentes e sindnimos que dificultam sua compreensio. Freqitentemente, 0 termo é confundido com outros que, na verdade, nao sio seus sinGnimos, mas apenas componentes de sua origem. Exemplificando, em algumas ocasiées, o termo atitude é usado como sindnimos de comportamento, como se a atitude do sujeito significasse a sua ago, o proprio evento observavel e no a mola propulsora da ago. Ora, 0 comportamento origina-se a partir de motivagSes intrinsecas ¢ extrinsecas do individuo e as atitudes so fatores componentes desta origem. Na verdade, as atitudes so componentes dos estados internos dos individuos ¢ o comportamento a manifestagdo desse estado. {As atitudes so estudadas desde o inicio do século e o termo foi empregado primeiramente 13 para designar a postura de modelos estaticos passando para modelos méveis. Como constructo psicolégico, o termo se desenvolveu a partir de estudos nao s6 da psicologia como da sociologia. Enquanto © socidlogo analisa muito mais 0s processos existentes na sociedade, nas instituigdes e nos diversos segmentos desses, a psicelogia vai interessar-se mais pelo constructo individual, pela atitude enquanto um componente do organismo individual. Entretanto, os recortes nfio so tao faceis, pois os individuos esto imersos em grupos, instituigdes e culturas. As atitudes sio tratadas pela psicologia social e ¢ esta sub-area da psicologia que, tradicionalmente, pesquisa € busca elementos relevantes para a compreensio das atitudes e formas, meios e modos de lidas com as mudangas de atitudes. As varias segmentagdes da psicologia acabam mutilando os fendmenos ¢, muitas vezes, por esta segmentacao, estes fendmenos vio perdendo sua relevncia e ficando esquecidos no planejamento de novas acdes ou areas concorrentes. Isto é, a excessiva especializacdo permite aos pesquisadores deixar de lado fendmenos importantes que influenciam diretamente suas atividades Por exemplo, quais atitudes com relagdio & pesquisa deverao ser desenvolvidas nos estudantes de pos- graduagdio? Quais as atitudes que nossos professores de escolas publicas possuem, realmente, com relagdo ao ensino ou a escola, ou ao contetido ete...? Essas questdes nao fazem parte das preocupagdes primeiras da psicologia social, mas sim da psicologia educacional € € no contexto da psicologia educacional que se desenvolve o presente trabalho. As sub-areas psicologia social ¢ psicologia educacional tém elementos que estio intimamente relacionados e é a concorréncia ¢ inter-relagao destas duas areas que vao permitir uma abordagem mais completa das atitudes ¢ as possibilidades de mudanga de atitudes que so desejaveis em educagho 14 Frequentemente sao feitas alteracGes em varios setores (econémico, educacional ete...) da sociedade e os implementadores das mudangas esperam que os individuos assumam as mudangas como suas e passem imediatamente a executa-las. Isto é bem caracteristico do sistema educacional, tanto no ensino de 1° e 2° graus quanto no ensino superior. Um bom exemplo envolvendo mudangas de atitudes diz respeito 4 politica de formagao de professores nas universidades (os cursos de Licenciatura). Todos os setores da universidade sio unanimes em afirmar que devem ser feitas mudangas substantivas nestes cursos € algumas tentativas até sdo esbogadas, mas estas limitam-se a agdes episédicas que se concentram em incluir efou excluir disciplinas, aumentar ou diminuir carga horaria, como se isso fosse suficiente para alterar todos os demais componentes do processo de formaciio de professores. E esquecide que isto envolve uma mudanga de atitudes dos individuos com relacdo ao ensino e 4 formacio de professores (sua televancia e importancia) e estas nao ocorrem a curto prazo. Essa mudangas educacionais requerem tempo e programagao para serem atingidas e exigem também corregdes ligeiras que nao alterem substantivamente o objetivo final. Infelizmente, a cada mudanga na administragdo surge uma nova alteragdo nas grades curriculares, sendo que os professores, na verdade, continuam com aquelas praticas que consideram mais adequadas, nfo alterando de forma significativa suas atitudes. As atitudes nao podem ser diretamente observadas mas podem ser inferidas através do comportamento. Uma vez que as atitudes apresentam estreita relagao com 0 comportamento elas sio passiveis de desenvolver - se mediante a criagdo ¢ manutenco de situagdes adequadas. Portanto, uma das funcdes primordiais da escola deveria ser o desenvolvimento de atitudes positivas nos alunos. Os estudos referentes as atitudes de estudantes nao parece ter sido grandemente apreciados 15 ‘UNICAMP 88 HBLIOTECA no Brasil. Existe uma lacuna com relagao a esses estudos. Enquanto nos Estados Unidos, Australia e alguns paises da Europa (particularmente Reino Unido, Espanha ¢ Portugal) proliferam estudos desse tipo, as pesquisas em nossas escolas tem privilegiados outros fendmenos. A atitude, enquanto componente do sistema educacional, ¢ deixada de lado. Tesser ¢ Schaffer (1990) mostram que o estudos das atitudes tem estado presente na literatura em psicologia social desde a década de 20 e esta presenga tem sido mantida: “... 0 estude das atitudes na psicologia social mantém hegemonia tanto em 1920 como em 1930 € também nos anos 50 ¢ 60, foi dominante nos anos 80 e continuaré a dominar a psicologia social na década de 90. A principio, as pesquisas se centravam nos problemas de mensuragio {Bogardus, 1925; Thurstone e Chave, 1929; Likert, 1932) e mudangas de atitude (Hovland et al, 1953; Rosenberg et al, 1960; Festinger, 1957}. A pesquisa atual seré relativa d estrutura das atitudes." (Tesser € Schaiter, 1990) Existe uma quantidade bastante grande de livros, textos, artigos em psicologia social que tratam das atitudes e estas aparecem, de forma geral, na psicologia social e, de maneira mais especifica (relacionadas a escola, método e/ou contetido), na psivologia educacional A ESCOLA E AS ATITUDES: A EDUCACAO COMO PROCESSO SOCIAL Sendo a educagdo um processo social ¢ a sala de aula o ambiente onde os professores e alunos trabalham em conjunto para um fim comum que é compartilhar de significados relativos a determinadas disciplinas ¢ o desenvolvimento de habilidades previstas no curriculo, essa educagao € afetada por uma série de fatores que concorrem simultaneamente. Germann (1988) apresenta um modelo tedrico que busca mostrar a interagSo das diversas 16 varidveis que agem conjuntamente com as atitudes, influindo e dirigindo a maneira pela qual as Pessoas pensam, sentem e agem em seus ambientes. De acordo com esse autor existem cinco elementos relevantes na situago em sala de aula: o aluno, o curriculo, o professor, o meio ambiente ¢aadministragao ou forma de controle, sendo que este ultimo € subdividide em dois componentes: primario (professores, alunos e curriculo) e secundario (colegas, amigos, pais, administrago-federal, estadual e municipal, autores de livros ¢ editotes, liderangas educacionais — sindicatos e centros académicos — e varios outros). Esta visio de Educagao como um processo de interagio social é sintetizada por Germann. (1988) da soguinte forma: Eo oe NT oem we Figura 1- A Educagio como um processo de interaco social (Germann, 1988) ‘Como pode ser observado, além dos agentes primérios ¢ secundarios, existem outros 17 que influenciam o significado da experiéncia humana € 0 modo como os individuos sentem, pensam agem no seu meio-ambiente. E dentre essa classe de fatores que Germann (1988) situa as atitudes, considerando-a relevante para a compreensio da Educag&o como um processo de interagao social. A aceitago desse modelo de concepgio de educagao como um processo de interagao social, onde as mais diversas exigéncias vao estar presentes e em constante choque, torna dificil o desenvolvimento de programas que visem a mudangas de atitudes. Isto ocorre porque estes Programas necessitam de muito tempo para serem estabelecidos ¢ comegarem a surtir efeito ¢, muitas vezes, contrariam interesses das mais diversas naturezas. Assim, ¢ mais simples mudar apenas a estrutura aparente de um curriculo que levar os individuos a alterar a direg&o de suas atitudes. © que ocorre nas nossas escolas sio mudangas episddicas, de pequeno impacto, que no produzem altcragées mais significativas na educag4o como um todo. Por exemplo, quando se trata da formacio de professores, ¢ initil mudar o curriculo a cada ano, se as mudangas nao forem acompanhadas de mudanga de atitudes com relacaoao ensino e a formagao de professors. Um outro aspecto relevante e que merece ser tratado, ainda que de maneira breve, é a mudanga de concepgdes a respeito da educagdo em geral e do ensino em particular. Atualmente, é bastante comum a énfase acentuada na qualidade do ensino. Gradativamente, o modelo de "qualidade total”, até agora reservado a producdo industrial, vem sendo cada vez mais telacionado 4 educagdo. E curioso observar que muitos individuos que escrevem sobre educagdo na imprensa (a grande maioria deles constituida por empresarios, economicistas e socidlogos) tém enfatizado, a partir do inicio dos anos 90, a necessidade de elevar a competéncia nas escolas, embora essa competéncia s¢ja apropriada apenas a um bom desempenho em provas ¢ testes, Assim, qualidade e competéncia séo tratados em um mesmo nivel ¢ relacionados apenas a aspectos cognitivos. 18 Tratando da competéncia na educagdo, Leat (1993) enfatiza que um erro freqiientemente cometido ¢ tratar esta competéncia como um fenémeno puramente cognitivo. Ressalta que os sentimentos, tanto na escola quanto em outros dominios profissionais, sio de fundamental importancia, Analisando uma outra realidade educacional, mostra que termos como competéncia e qualidade, diretamente relacionados ao ensino ¢ 4 aprendizagem, tém aparecido com freqiiéncia em propostas educacionais ¢ nas falas dos educadores. Leat assinala, em seu trabalho, que estes conceitos devem ser considerados dentro de uma estrutura mais ampla que aquela composta pela dupla competéncia - qualidade, devendo ser mais abrangentes. Essa maior abrangéncia possibilita a inclusio de conceitos mais relacionados a esfera afetiva, além da competéncia e da qualidade desejéveis em qualquer processo de ensino-aprendizagem. Esse autor enfatiza a necessidade de aliar o ensino, baseado na competéncia do professor a fatores de ordem afetiva, mostrando que a competéncia no é apenas um produto dos processes cognitivos, De acordo com ele, o pensamento ¢ indissociavel do sentimento e qualquer tentativa para desenvolver competéncia ¢ qualidade precisa, necessariamente, levar em consideracao os aspectos emocionais do ensino, Ensinar estrategias ¢ habilidades esta intimamente relacionado as atitudes do professor com relarao ao ensino, ao conteado, ao auto-conceito ¢ a uma série de outros fatores que compdem o ambiente educacional. Para uma maior competéncia e qualidade, o fator cognitive eo fator emocional devem estar em sintonia ¢ um ndo pode ser priorizado em detrimento do outro. Ascola, tomada como agente de mudancas, é o instrumento através do qual se busca atingir uma certa "qualidade" que seja compativel com as necessidades de conhecimento geradas pelo avango da tecnologia. Desta maneira, ¢ esperado que a escola habilite os individuos de tal forma que estes estejam 19

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