You are on page 1of 183

Capa: Magnifique Design

Diagramação: Brenda Ripardo

Todos os direitos desta obra são exclusivos da autora.

Alguns locais e personagens são reais, entretanto, a história e os fatos descritos nesta obra
são provenientes inteiramente da imaginação da autora e da liberdade poética.
Hugh é um conde recluso, rejeitado pela sociedade por causa de boatos que assombram
sua família até que a rainha concede um título de nobreza real a ele, o que o coloca em evidência
e facilita seus planos.
Depois de escolher uma bela e recatada jovem para se casar, ele acredita que sua
vingança está mais perto do que nunca de se concretizar. O conde só não contava com o fato de a
esposa ser tudo, menos submissa e meiga.
Margareth odeia o marido, não, espere, na verdade, ela odeia o pai que a obrigou a se
casar com um conde que pode até ter os olhos mais lindos do mundo, mas que não passa de um
selvagem.
Ela queria ser livre, dona de si mesma, mas acabou amarrada a um homem rude que não
vê a hora de pôr as mãos em seu corpo jovem e inexperiente. Tudo bem, talvez ela odeie o
marido, o pai e a própria inexperiência, mas isso não quer dizer que ela vai entregar assim sua
vida e seu coração.
Enquanto puder dificultar a vida dele, ela fará com gosto, mesmo que acabe por ser
devolvida. Talvez esse seja o objetivo, afinal.
Um casamento por obrigação.
Um conde selvagem e rude.
Uma lady megera e linguaruda.
Em uma história onde paixão e ódio andam lado a lado, talvez o amor seja capaz de
mudar tudo... ou não.
Apaixone-se por Hugh e Margareth e descubra se eles serão capazes de encontrar o
caminho até o coração um do outro em meio a uma vingança e muitas confusões.

Não recomendado para menores de 18 anos.

Tropos: Haters to lovers; Casamento arranjado; paixão avassaladora; mocinha plus


size.
Hugh Ruthenford era o homem mais rico do salão e, com certeza, o mais assustador
também.
Vestido com um fraque de peito estufado e calças de sarja francesa que afunilavam em
perfeito caimento, ele caminhava exultante, recebendo os cumprimentos pela cerimônia de seu
casamento. O mais impressionante, no entanto, passava longe das roupas de alfaiataria
caríssimas. Provavelmente, naquele salão de pessoas fúteis da alta classe, não haveria quem
ousasse dizer que o mais chamativo naquela vistosa imagem eram os olhos. Mas eram
justamente eles que o colocavam em evidência.
Aquele homem poderia vestir a roupa que quisesse, jantar nos mais refinados clubes de
cavalheiros e, mesmo assim, jamais perderia o brilho ferino dos olhos verde-esmeralda. Havia
um ‘quê’ de selvagem na silhueta dele e Margareth sabia bem que em breve descobriria o que
havia por trás do rosto charmoso, afinal agora era sua esposa.
Margareth odiava o pai com todas as forças e odiava ainda mais o homem arrogante com
quem fora obrigada a se casar, horas antes, numa cerimônia cara que seria capaz de alimentar
boa parte de Londres. Inacreditável como as pessoas daquela estirpe podiam ser vazias, fúteis e
alienadas com o que ocorria no resto da cidade. É claro que Margareth também o seria, não
fossem as conversas com Doth, a governanta velha de aparência tímida, ancas largas e uma
inteligência negligenciada.
Ela tinha sede de viver, queria conhecer o mundo, ir para América e envolver-se nas lutas
dos homens sem títulos. Traçar seu próprio caminho. Mas agora tudo estava acabado, pois o pai
a obrigara a casar-se com aquele homem. Talvez não o odiasse em outras circunstâncias. Poderia,
quem sabe, até se interessar em desafiar seu jeito autoritário ou apreciar os belos olhos verdes
que refletiam uma selva diante do sol. Poderia até querer aventurar-se no mundo dos mistérios
que o envolviam. Em outras circunstâncias.
Hugh aproximou-se da esposa apreciando a beleza delicada da jovem que desposara.
Estava claro que ela o odiava, era uma garota voluntariosa com ideias de liberdade das quais
jamais desfrutaria. Pelo menos não na Inglaterra de sua Majestade, a rainha Victória. O farfalhar
das saias batendo na crinolina de aço roubaram atenção de Hugh.
Ele não tinha a menor pretensão de agradar aquela jovem iludida que fora criada longe do
trabalho árduo e da dureza da vida. Mas sabia, lutara muito para estar ali e o casamento
consolidava sua participação naquela sociedade que mais parecia um pedaço de queijo, cheia de
falhas e buracos.
Um conde não deveria precisar se esforçar tanto para alcançar seus desejos, mas ele
nunca fora realmente aceito e sabia exatamente o motivo disso. Agora, tudo ia mudar.
Ele era um homem rico, forte e havia tomado para si uma das jovens mais desejadas da
elite inglesa. Se esses malditos hipócritas soubessem... pensou, aproximando-se ainda mais da
esposa e apreciando os modos dissimulados de delicadeza. Ela tinha os cabelos louros, presos no
alto com cachos que pendiam sobre os olhos azuis muito atentos. A boca vermelha estava
vincada numa linha tensa quando se virou para o marido, forçando um sorriso frio que o teria
acertado como um tapa, em qualquer outra situação.
— Você está muito bem nesse vestido.
Hugh sorriu, apreciando o imenso arranjo de panos que o lembrava de um bolo grande,
com decoração em pedras e flores.
— Não vejo a hora de tirar essa porcaria — Margareth resmungou, tocando de leve o
ventre sob o espartilho com a mão enluvada.
Em seguida, a agora condessa aceitou a mão e iniciou o trajeto em direção ao meio do
salão para a valsa.
Hugh gargalhou. Pelo menos ela era natural, ao contrário da maioria das jovens nobres.
Além de linda, é claro, como nenhuma outra que ele vira. Linda e rebelde.
— Se eu soubesse que você se sentia dessa forma, teria acabado com os festejos e a
levado imediatamente para o quarto.
Margareth corou, compreendendo a insinuação marota nos lábios de Hugh. Bom, dentro
do possível, já que ela não fazia ideia do que aconteceria na tal noite de núpcias. Ainda que
estivesse beirando os vinte anos, era completamente inocente nos assuntos dos adultos e por mais
que, com a aproximação do casamento, implorasse para que a mãe a ensinasse continuava
ignorante.
Sentia-se burra diante daquele homem que deveria ser experiente e bruto, ela era tão
inexperiente e diante do olhar de fera devoradora só podia estremecer e remoer a falta de
conhecimento a que era relegada como toda jovem de boa família.
Seria entregue a ele como um grande e suculento jantar de gala, e não tinha nada que
pudesse fazer, não tinha ideia de como lidar com isso.
E para piorar, as palavras da mãe ecoavam em sua mente, fazendo-a ter vontade de
chorar: “Deite-se, feche os olhos e deixe-o fazer o que quiser”.
Aquilo era ultrajante, não ser dona nem do próprio corpo e nem sequer ter ideia do que
ele faria com ela. E se ele fosse violento? E se fosse...
Hugh, ao perceber lágrimas raivosas aflorando no delicado rosto da esposa, compadeceu-
se. Imaginava as coisas que provavelmente estariam aterrorizando-a naquele momento e ainda
que seu instinto selvagem desejasse atacá-la ali mesmo e despi-la até sentir seu corpo cheio de
curvas estremecendo de prazer, ele sentiu pena.
Se a vida para um homem como ele, forte, rico e possuidor de um título de nobreza já era
difícil, imaginava o quanto não seria para uma menina sem experiência. Talvez seus planos
pudessem esperar um pouco mais... Talvez.
— Não se preocupe, não farei mal a você — curvou o maxilar duro na direção da manga
bufante do vestido de noiva e sorriu com malícia, o que provocou calafrios em Margareth. A
ponta dos lábios carnudos roçou de leve a pele do ombro dela. A sensação de sentir o calor que
emanava dos lábios dele deixou-a tonta. — Você está bem?
— Acho que este espartilho está querendo deixá-lo viúvo — ela forçou um sorrisinho
presunçoso. — No fim, talvez ele nos faça um favor...
Se ele queria provocá-la, podia muito bem provar um pouco do próprio veneno. Hugh
olhou-a com admiração... não era a primeira vez que ela o surpreendia e aquele temperamento
difícil era um verdadeiro afrodisíaco para o animal que havia dentro dele.
A ansiedade começava a aflorar por baixo da roupa enfadonha e ele não via a hora de
colocar suas mãos naqueles seios firmes e cheios. Arrancar o espartilho seria a melhor e mais
tensa preliminar. Teria uma noite deliciosa, pensou, ajustando a mão na lombar de Margareth e
conduzindo-a para a valsa.
O sangue latejava em suas veias. Hugh sentia um misto de irritação, por se vender tão
facilmente para as curvas acentuadas de uma bela jovem, e excitamento pela expectativa de tocar
o corpo inocente.
O instinto sexual sempre fora seu maior fraco. Ainda que estivesse focado no plano e
jamais deixasse nada ser usado contra ele, o sexo acabava sempre prevalecendo e por diversas
vezes precisara pagar para jovens de baixa classe que o satisfaziam por algum tempo
desaparecerem. Talvez Margareth o surpreendesse também na cama, mostrando-se uma
verdadeira gata selvagem. Se isso acontecesse, pouparia um bom dinheiro, afinal, se não fosse o
caso, pelo menos ela serviria para o seu propósito maior, a vingança.
— Preparada? — sussurrou no ouvido dela, fazendo-a engolir um gemido baixo que o
satisfez.
— O que acha? — ela perguntou com a voz firme e determinada, passando o braço sobre
o dele e erguendo o queixo.
— Ótimo. — Hugh sorriu e assim que a música começou, ele a puxou pelo salão.
Margareth deslizou e o acompanhou, enquanto Hugh a puxava por todo o salão e os olhos
recaíam com muita curiosidade sobre eles.
As batidas compassadas da valsa aceleraram o coração do conde e ele apertou a esposa
um pouco mais, colando-a vulgarmente ao próprio corpo. Se eles queriam um espetáculo, ele
estava disposto a proporcionar.
Hugh roçou o corpo nela e ela gemeu baixo, isso o fez apertar os dentes, sentindo a
queimação começar a percorrer desde a boca do estômago até lugares bem escondidos.
A sensação de tê-la tão perto, de sentir seus seios sobre o espartilho apertado o deixaram
ainda mais excitado e ele precisou de muito esforço para se concentrar, insuflando o ar com força
seguidas vezes para não perder os passos.
Com os pensamentos em chamas, rodopiou Margareth que parecia flutuar no mesmo
ritmo inflamado e quente, sintonizada a ele como se os dois fossem parte de algo mais profundo
e latente.
Era inegável a energia que pulsava ali e ambos pareciam um único ser, deslizando pelo
salão como plumas sopradas no ar, deixando todos atordoados com a beleza e selvageria da
valsa.
O salão aquietou-se, como se cada um ali prendesse a respiração diante da sensualidade
do mais jovem casal da nobreza, o conde e a condessa de Surrey.
Hugh entrelaçou os dedos longos aos de Margareth logo após sentarem-se lado a lado na
carruagem. Aquilo não era comum, afinal, ele não era dado a gentilezas, mas naquela noite
estava de bom humor.
Ela erigiu o corpo com desconforto quando percebeu que ele se aproximava demais das
pernas dela. Nem toda anágua do mundo seria capaz de evitar aquela sensação provocante. Muito
menos de afastar a queimação que percorreu o corpo de Margareth, ao sentir os dedos fortes do
conde apertando sua mão pequena.
Algumas horas se passaram no decorrer do percurso, mas ele fizera questão de ir para a
casa de campo ao invés de ficar na propriedade da cidade ou sair em uma longa viagem, como a
maior parte dos nobres fazia quando se casavam.
Hugh odiava a casa da cidade e tudo que representava viver naquele casarão cheio de
criados e nenhuma paz de espírito. A casa de campo, pelo contrário, parecia ajustar-se melhor a
ele e ao seu espírito livre. Assim como um dia se ajustou ao espírito livre de sua mãe e seu pai.
Margareth, exausta dos últimos dias de preparativos do casamento, da longa cerimônia e
dos festejos, sentiu dor nos olhos ao tentar ficar acordada. Em algum momento do percurso, ela
foi vencida pela exaustão e dormiu, deixando a cabeleira loura cair sobre o ombro de Hugh.
Depois de um bom tempo, ela nem sentia mais que estava ali, enclausurada em um
vestido e uma carruagem. Hugh, por outro lado, não fechou os olhos, sentindo-se tomar, pouco a
pouco, pelo cheiro de flores do cabelo da esposa, pela respiração cansada e pela suavidade da
pele de suas mãos, ainda enroscada na dele.
O cocheiro tocou depressa por cima dos cascalhos da estradinha que culminava na
propriedade do conde. Os solavancos arrancaram de Hugh os mais chulos xingamentos,
distraindo-o do seu foco, a jovem virgem e inocente que desposara.
O ar fresco arrebatou Hugh e sossegou seus pensamentos turbulentos. O casamento havia
decorrido exatamente como deveria. A jovem esposa, apesar de voluntariosa, era bonita e sagaz,
além de muito recatada diante da sociedade.
Bem o que ele precisava.
O fato de Lorde Sinclair estar à beira da ruína havia sido um verdadeiro presente para sua
empreitada em busca da derrocada daqueles que lhe deviam. Precisou dar alguns
empurrõezinhos, mas agora isso não tinha mais a menor importância. Além do mais, quem
recusaria casar a filha com um conde? Um conde com um título de nobreza real, dado
diretamente pela rainha Victória.
Em breve teria influência direta sobre o principal homem da Câmara dos Lordes, seu
sogro. Um passo a mais em direção ao seu destino. Voltou para a carruagem e sacudiu
Margareth. Ela despertou um pouco confusa.
— Está em casa, condessa.
—Ham. — Margareth resmungou. — Ah, sim...
Esfregou os olhos e impulsionou o corpo para sair da carruagem. Sempre que passava por
aquele tipo de situação se imaginava sendo a rainha Victória e abolindo o uso daquela
parafernália toda. Nunca mais usaria ancas ou panos. Iria vestir-se como homens, com calças
confortáveis... É claro que isso não passava de um pensamento bobo, mesmo assim ela sonhava
viver em algum lugar onde isso fosse possível.
Agora, porém, nem a esse sonho mais tinha direito de se apegar, pois estava casada com
aquela fera indomável que se divertia com sua vergonha e que parecia decidido a tomar posse de
toda a sua inocência.
Margareth baixou os olhos por alguns instantes, aspirando o cheiro de terra úmida que
subia do chão quente. Depois de alguns segundos, concentrada nos aromas naturais, ergueu os
imensos olhos azuis e arquejou. A propriedade era exuberante. Um palacete com pelo menos 300
janelas, duas torres nas extremidades e uma entrada em forma de arco por onde facilmente
passaria uma comitiva.
Dois criados magros vestidos de pajem se aproximaram do casal, curvaram-se em
respeito ao Conde e sua esposa e seguiram para a parte traseira da carruagem, retirando o baú e
as malas. Outros dois seguiram para a carruagem que vinha logo atrás, com mais malas e
pertences da condessa. Outro criado dirigiu-se à porta da carruagem e com uma reverência
esticou a mão para apoiar a nova senhora da casa. Ela desceu com esforço por causa das
crinolinas e suspirou ao ser arrebatada pela brisa fria.
Margareth aproximou-se da porta, farfalhando as saias pesadas, o braço enganchado no
esposo. Uma fileira de pelo menos vinte criados postou-se ereta diante da entrada da mansão,
homens de um lado, mulheres do outro. Hugh estufou o peito e a voz de trovão saiu em seguida:
— Esta é a sua senhora, a condessa Margareth Ruthenford.
Os criados curvaram-se.
— Esta é a senhora Garden, a governanta. O que precisar dirija-se diretamente a ela, que
tem minha inteira confiança. Em breve providenciaremos mais criadas pessoais, mas até lá, a
senhora Garden cuidará de tudo.
Margareth acenou em concordância.
A senhora Garden era uma mulher beirando os cinquenta anos, magra, alta, os cabelos
esbranquiçados presos num coque perfeito bem no alto da cabeça. Os olhos eram envolvidos por
duras linhas de expressão exprimiam atenção, inteligência e... afeto. Margareth sempre
considerara as criadas mais velhas como tristes e cansadas, mas aquela mulher não demonstrava
nem uma coisa nem outra. Pelo contrário, esbanjava vigor. Com um aceno para os lacaios, a
senhora Garden os dispensou:
— Terance, leve as bagagens para o aposento de vestir da condessa. Os demais estão
dispensados. Se a senhora quiser me acompanhar, vou acomodá-la. O senhor vai precisar de
alguma coisa, Vossa Graça?
Hugh teve vontade de rir ao perceber a formalidade com que a velha Gertrude recebeu
sua esposa. É claro que sempre o tratara como alguém importante, mas o conhecia a tempo
suficiente para dispensar toda aquela pompa e circunstância, era desse jeito que ele gostava, o
jeito como fora criado pelos pais.
— Não Gert, pode acomodar minha esposa.
Todos os criados, com exceção de duas jovens de aparência sonolenta, saíram, ainda
fazendo reverências que deram vontade de rir à Margareth. Ela se conteve, apertando os lábios e
pressionando os dentes. Tinha a impressão de estar em uma peça teatral, onde os personagens
tinham seus lugares e papéis definidos, porém sem saber como encená-los.
Algo ali era muito diferente do que ela esperava para a propriedade de um conde tão
importante, mas ela não questionaria isso logo na primeira noite como senhora da casa, sua
mente estava mais ocupada com outra coisa, uma bem mais assustadora, a noite de núpcias.
Quando se retirou, foi escoltada pela senhora Garden e as duas criadas, deu um olhar de
relance para Hugh, que arqueou uma sobrancelha e sorriu, abrindo duas covinhas sedutoras.
Tudo bem, ele tinha fama de rude, de impetuoso e até muito cruel, mas também podia ser
absolutamente charmoso e sensual, capaz de provocar arrepios por toda a espinha da jovem
condessa.
O conde seguiu para a biblioteca, serviu-se de um cálice de licor e sorveu a dose bem
devagar, apreciando a penumbra. O cheiro dos livros empoeirados sempre provocara muitos
espirros em Hugh quando menino. Agora, porém, provocava-lhe uma sensação agradável de
poder, de imponência e até de familiaridade.
Ele era, sem dúvida, um homem poderoso e aquele era seu reino, sua casa e seus livros.
Ele fechou os olhos por um momento, afundando em sua cadeira e bebeu mais um cálice de
licor, imaginando como Margareth deveria estar se sentindo.
Mady, a criada designada pela senhora Garden para os últimos cuidados com a patroa,
penteava delicadamente os cachos rebeldes de Margareth. Sem todos aqueles babados e anáguas
ela era uma mulher delicada e a criada gostou de tocar os cabelos sedosos.
Apesar de ser mais robusta que a maioria das ladys que se casavam com nobres,
Margareth era lindíssima, tinha seios grandes que se acentuaram ainda mais ao se livrarem do
espartilho e o rosto era como pêssego, viçoso, corado e macio.
A criada parecia realmente feliz ao cuidar dela, mas isso não mudava a sensação de
abandono e medo que a inundavam, deixando seus músculos tensos e muito ansiosos.
Não saber o que aconteceria ali naquele quarto a estava enlouquecendo. Só o que tinha
certeza é de que o marido deveria consumar a união imediatamente e que os homens
costumavam gostar do que quer que fosse a tal consumação, enquanto as mulheres deveriam
apenas se submeter e não sentir nada a respeito.
Estava em dúvida se deveria fingir que gostara ou mostrar-se indiferente. A mãe lhe
dissera para ser totalmente indiferente ao que ocorresse, mas Margareth sabia que Hugh não era
bem o tipo de Conde com quem a família imaginara que ela se casaria e ele não parecia ser do
tipo indiferente a nada.
O marido estava mais para uma fera selvagem só a custo domada, sob uma camada de
panos e uma cartola. Além do que, a mãe não era o melhor exemplo de felicidade conjugal, se é
que isso realmente existia, então a dúvida persistia e Margareth não conseguia tomar uma
decisão.
Por muito tempo, ela sonhou com as histórias que lera nos romances e almejava ser tão
feliz quanto a própria Rainha Victória com seu consorte, o príncipe Albert. Ela tinha feito o que
muitas moças da sociedade sonhavam por anos, tinha conquistado um nobre poderoso e lindo,
com olhos devoradores que seriam capazes de arrancar o ar de seus pulmões. Ela queria que isso
pudesse ser algo bom, já que não tinha mais escapatória.
Respirou fundo, segurando a bile que subiu.
Em poucos instantes descobriria o que acontecia entre os casais e isso a estava deixando
nauseada, em pânico. Decidiu esperar e ver como se sentia a respeito, não tinha pretensão de
dizer nada que não fosse verdade, mesmo se isso significasse ofender o belo marido conde.
Hugh subiu para os aposentos da esposa quase uma hora depois. Já era tarde e ele tinha os
sentidos um pouco entorpecidos pelo licor e pelo vinho do casamento, mesmo assim, estava
ansioso para colocar as mãos no corpo jovem e farto da esposa. Já conseguia até imaginar o
gosto da pele dela, o cheiro do seu desejo e o som dos seus gemidos.
Algo o fazia ter uma estranha certeza de que Margareth seria capaz de enlouquecê-lo com
gemidos manhosos. Algo no seu jeito intenso garantia que ele teria muito prazer em se afundar
entre as pernas dela.
Margareth estava sentada na cama fofa, com um livro no colo, nervosa demais para
dormir. Os cachos dourados sob a luz de uma lamparina serpenteavam rebeldes pelas costas da
jovem. Hugh olhou com atenção para ela, que vestia um camisolão branco macio e estava um
pouco ofegante... sentiu vontade de tomá-la ali mesmo, arrancar a coisa horrível que vestia e
consumar a união no chão, sobre o tapete felpudo em que pisava naquele momento, mas se
conteve e entrou no quarto com calma.
A lareira crepitava e o calor fazia com que as bochechas do conde ardessem, assim como
o pau que latejava cheio de desejo pela mulher que pertencia a ele.
Os olhos dos dois encontraram-se por uns poucos segundos, o suficiente para arrancar um
suspiro de tensão de Margareth.
Hugh começou a despir-se sem pressa, apreciando o momento e os olhos curiosos da
esposa.
Ela prendeu a respiração à medida que o marido ia tirando as camadas de roupas. Quando
exibiu o peitoral bronzeado e definido, Margareth estreitou os olhos e sentiu um leve
formigamento entre as pernas. Um calor percorreu o corpo e ela sentiu que sua face corava.
Abaixou os olhos, envergonhada por sentir vontade de tocar o peito do marido, a pele trincada e
forte.
Hugh aproximou-se da cama completamente nu.
Os olhos de Margareth focalizaram-se nos dele, que parecia um gato arisco, pronto para
dar o bote numa presa indefesa. A condessa engoliu em seco, mas deixou que seus olhos
percorressem o corpo musculoso de Hugh.
Ele sorriu com a investigação minuciosa. Esticou a mão para ela que se levantou um
pouco trôpega e ficou parada diante dele, os olhos baixos e confusos.
Hugh tirou o camisolão de Margareth, deixando-a nua, sem qualquer anágua para fazê-la
sentir-se menos boba ou insegura. A condessa tinha um corpo juvenil com curvas que se
acentuavam nos quadris e se afunilavam na cintura, por conta dos espartilhos que usara por anos,
o busto farto e firme e uma cabeleira castanha no meio das pernas. Imediatamente Hugh sentiu a
ereção crescer e implorar.
Sempre gostara de ter belas mulheres aquecendo sua cama, mas aquela parecia diferente,
indefesa, inexperiente e sua.
Margareth era sua condessa, uma virgem recatada que fora dada a ele para fazer o que
bem quisesse. Uma mulher pura, inexperiente e linda, com olhos atrevidos e lábios inocentes.
Lábios que ele mal podia esperar para provar.
Ele se aproximou de Margareth, levantou seu queixo e beijou-a, suas mãos cavando
dentro da cabeleira enquanto a língua tentava acessar algo mais.
Ela não retribuiu o beijo do marido, ainda que estivesse tentada a abrir a boca e render-se,
pois aquele toque provocava algo que ela nunca imaginara, uma necessidade crescente e pulsante
entre as pernas.
Mas as palavras da mãe ecoaram em sua mente e ela congelou.
Era uma moça decente, não podia gostar do que viria a seguir, mesmo que suas partes
íntimas dissessem o contrário. Os dedos de Hugh tocaram o pescoço de Margareth e ela
arquejou.
— Está com medo? — ele sussurrou, um misto de prazer e irritação.
— Não — ela mentiu, subitamente cheia de coragem.
— Pois deveria, é o que as boas damas sentem na primeira noite.
— Talvez eu não seja uma boa dama — ela ergueu os olhos desafiadora.
— Você sabe o que vai acontecer? — Hugh perguntou com a voz rouca, deslizando os
dedos até um dos seios de Margareth. Seios grandes, com mamilos rosados e grandes que
encheriam sua boca de prazer.
— Não, mas minha mãe disse que devo fechar os olhos e esperar que o senhor acabe.
— É o que você pretende fazer?
— É o que o senhor quer que eu faça?
Sem responder, Hugh apertou o seio de Margareth, ela gemeu baixinho, os olhos ainda
focalizados nos dele e sentindo uma umidade crescer.
— Não sei ainda o que quero de você — ele retrucou com os olhos faiscando e a mão
ainda sobre o mamilo perfeito.
Os dedos de Hugh desceram pela cintura de Margareth, provocando arrepios
inexplicáveis na garota, que se sentia ao mesmo tempo aterrorizada e tomada por um desejo
louco de jogar-se nos braços daquele estranho.
O clima escurecido, o cheiro dele, a visão de sua pele, tudo de repente parecia propício
para ela se render, talvez pudesse ser bom... quem sabe ela poderia gostar...
Primeiro ela fechou os olhos e o sentiu apertar seu seio outra vez. Não de um jeito rude,
mas firme o bastante para fazê-la estremecer.
A boca dele pousou na curva do seu pescoço e ele mordiscou a pele quente. Ela sentiu-se
incendiar por dentro, contendo-se com muito esforço para não amolecer.
— Abra os olhos, condessa, me deixe ver o oceano — ele ordenou e ela não pensou duas
vezes, entregando o que ele queria.
Hugh era um conde e seu pedido era sempre uma ordem.
— Você não queria este casamento, não é? — ele perguntou, erguendo o queixo dela com
a ponta dos dedos e a fazendo olhá-lo de baixo.
Ela negou sem abrir os lábios.
— Mas agora você é minha e eu vou fazer o que quiser.
Ela suspirou e Hugh sorriu de um jeito cruel e nada carinhoso.
— E o que você quer? — ela perguntou com a voz embargada.
— Quero o mundo — ele disse simplesmente. — E quero você, entregue e perfeita.
Margareth não disse mais nada, Hugh estava sendo tirano, mandão e um pouco, ou
melhor, muito idiota, mas isso não a assustava. Ela sabia que homens podiam ser um tanto
carentes e reforçar seu poder era algo comum. O que ela não sabia ainda era em como se
enquadrava no quadro geral de tudo.
Por que ele a escolhera?
Por que a filha de um lorde que nem era considerada a preferida da temporada?
Aquele mistério é que roubava sua paz, mas ela não descobriria.
Hugh passou suas mãos por ela e desceu até seus quadris, tocando as curvas com as
pontas dos dedos e arrepiando a pele dela.
Mas de repente, tudo mudou e como um animal arisco, ela o fitou no exato instante em
que ele bateu em suas nádegas com muita força. Margareth gritou, projetando o corpo para o
lado e levando uma das mãos a um tapa que tomou o homem de susto.
— Mas o que deu em você? — Hugh berrou.
— Quem você pensa que é? — foi a única coisa que veio à mente assustada de
Margareth. — Você me bateu.
— E você se achou no direito de me esbofetear por isso? Pois saiba que muitos maridos
espancam diariamente suas esposas. E todas aceitam muito bem...
— Eu não sou uma dessas — ela crispou. — Você não me transformará em um saco de
pancadas.
— Não foi isso que fiz... — ele argumentou, mas ao ver o olhar febril da esposa parou de
falar.
Margareth não disse nada quando ele se aproximou mais uma vez, encolhendo-se de
medo e raiva. Naquele momento, ele a teria jogado na cama e feito amor como louco.
A reação impulsiva da garota o excitara de uma maneira que ele nem imaginava que
fosse possível.
Ele quis testar sua resistência, testar sua obediência e acabou surpreso quando ela se
defendeu, sem medo de enfrentar o marido conde, decidida a não ser uma vítima. Ele gostou
disso e o desejo o fez agir sem pensar.
Hugh a tomou nos braços e a beijou com força. Mas agora ela estava assustada demais
para perceber a paixão que tomava conta dele.
Apavorada lutou, tentando desvencilhar-se. Esperneou e gritou.
— Margareth! — ele gritou e avançou outra vez, segurando-a pelos braços e forçando sua
boca na dela. Margareth mordeu seu lábio inferior com o força, de um jeito que o fez rugir de dor
e surpresa.
Quando ele a jogou em direção à cama, ela rodopiou e foi parar no outro lado do quarto,
assustada, segurando um candelabro dourado cujas velas caíram no chão.
— Se você se aproximar eu... eu...
Hugh então se deu conta de que havia ultrapassado todos os limites. Fora longe de mais
com seu jeito bruto e a esposa não tinha aceitado bem.
Ela podia ser intensa, mas também era uma lutadora que não se deixaria quebrar.
Mesmo com as mãos trêmulas, ela impelia o candelabro na direção dele, enfrentando-o.
Hugh gargalhou. Esperava que a qualquer momento ela começasse a chorar e se rendesse
à sua vontade, como aconteceria com qualquer mulher da estirpe dela, mas Margareth estava
decidida a não dar esse gosto ao conde e se ele tentasse tocá-la com aquela brutalidade o
acertaria bem no meio da testa. E se ele morresse, melhor. Passar a vida como uma viúva
solitária era mil vezes melhor do que ceder à brutalidade insana daquele homem.
— Abaixe isso — ele crispou os lábios, começando a ficar irritado e sóbrio.
— Não se aproxime!
Ele tentou se aproximar, pensou em se desculpar e recomeçar, afinal, ela era uma jovem
sem experiência e deveria estar extremamente assustada, ele sabia que tinha que ter pegado mais
leve, mas se deixou levar pelo desejo selvagem e acabou com um candelabro na direção da sua
cara.
Ela esquivou-se mais um pouco, ainda com o artefato empunhado como se fosse uma
espada ou uma marreta, furiosa.
— Eu o mato, mesmo que acabe pagando por isso, não chegue perto de mim.
— Você é minha! — ele retrucou, irritado. — Vamos conversar...
— Não dê mais um passo — ela o encarou, lágrimas quentes correndo pelo rosto.
— Você é minha e um dia você vai implorar para que eu a toque — Hugh rugiu.
Depois, ele abriu a porta lateral que dava para o quarto contíguo, seu quarto, lançou um
último olhar para ela e saiu furioso, batendo com raiva a porta às suas costas. Quando ela se
fechou com um estrondo forte e ruidoso, Margareth desabou, tremendo e chorando. Se aquele era
o seu destino, então ela preferia a morte.
Margareth se enfiou debaixo dos cobertores, ainda sentindo as mãos e as pernas trêmulas
e o coração batendo com tanta força que parecia prestes a sair do peito. Não tinha mais forças
para chorar e sentia-se além de humilhada, muito assustada.
Sabia que desrespeitara o marido, mas não podia deixar que ele se aproveitasse de sua
situação para subjugá-la de forma tão monstruosa. Fechou os olhos e tentou dormir. Virou
seguidas vezes de um lado para o outro, mas os nervos estavam tremendamente agitados e o sono
não veio.
Ficou acordada por um bom pedaço da noite, em silêncio, um turbilhão de pensamentos e
tristeza tomando conta dela. Por um momento ela chegou a pensar que pudesse gostar de estar
com ele, que a consumação do casamento poderia ser agradável, mas tudo mudou por causa da
selvageria do marido.
Mas ela preferia ser morta enfrentando-o a permitir que ela a tratasse daquele jeito, como
se não fosse nada além de um objeto que ele poderia esbofetear o quanto quisesse.
No meio da madrugada um barulho chamou sua atenção. Um gemido constante ao longe.
Um som abafado pelas paredes reforçadas da mansão.
Margareth levantou-se um pouco confusa e zonza, fraca pelas horas de choro, tateou pelo
quarto, a escuridão só a custo suportada pelo medo de rever o marido.
Caminhou em silêncio, tentando averiguar de onde vinha o som estranho. Parou diante da
porta de ligação com o quarto dele e encostou o ouvido na madeira fria. Prendeu a respiração
quando um gemido rouco passou pela madeira grossa e encontrou seus ouvidos. Uma voz
feminina sobressaiu-se, mas ela não compreendeu o que dizia.
Outro gemido e Margareth não conseguiu aguentar. Sem pensar, abriu a porta com
brusquidão e gritou ao ver o que ocorria no quarto.
Uma jovem com uma enorme cabeleira ruiva estava deitada sobre a cama, nua, a cabeça
movimentando-se para cima e para baixo na direção do órgão íntimo de Hugh. E como antes, ele
estava ereto e firme. O conde estremecia, o olhar vidrado de prazer.
— Mas... mas o que está acontecendo aqui? — esbravejou, perplexa.
Hugh olhou em sua direção e sorriu. A ruiva levantou os olhos do membro e Margareth
teve um vislumbre do tamanho. Era firme e estava molhado. Ela nunca vira um antes, mas
imaginou que seria aquilo o ato de consumar o casamento. Ficou um pouco tonta.
— Ela está fazendo o que você não quis... — Hugh riu, puxando a ruiva para cima e
deitando-a na cama.
Margareth ameaçou sair do quarto, furiosa e desorientada com tudo o que estava vendo,
aquilo era ultrajante, primeiro ele tentou usar a força com ela, agora, consumava seu casamento
com outra mulher, uma... criada.
Nauseada, ela deu alguns passos na direção do seu quarto.
— Pare aí, nem pense em dar mais um passo, Margareth — Hugh esbravejou. — Sente-se
na maldita cadeira e veja, quem sabe assim você aprende alguma coisa.
Margareth sacudiu a cabeça negando, atônita.
— Isso não é um pedido, é uma ordem.
Ela obedeceu, chocada com a arrogância daquele maldito homem. E muito assustada para
contrariá-lo. Ele parecia disposto a obrigá-la a fazer o que queria.
Hugh passou os dedos pelo corpo da mulher, partindo dos seios pequenos onde apertou e
mordiscou-os, seguindo pelo ventre liso e findando na cabeleira entre as pernas.
Começou a acariciá-la com rapidez, colocando e tirando um dedo da fenda escondida
entre os pelos. A mulher gemeu e Hugh olhou direto para a esposa, provocando-a com uma fúria
quase animalesca.
Margareth sentiu náuseas, mas não disse nada. Continuou com os olhos vidrados na cena
do marido tomando outra mulher. À medida que ele intensificava os movimentos, a ruiva
arquejava, erguendo de leve os quadris e a pélvis e gemendo.
Hugh abriu as pernas da mulher e ajeitou-se entre elas, enfiando com força seu membro
ereto e fazendo-a gritar alto. Começou a estocar sem qualquer delicadeza.
Ela cruzou as pernas em sua cintura, gemendo cada vez mais alto e implorando por mais,
numa intimidade que garantia que aquilo já vinha acontecendo há algum tempo.
Pouco depois, ele intensificou os movimentos de vaivém e a ruiva começou a
acompanhar o ritmo, indo e vindo no mesmo compasso que o Conde.
Hugh estremeceu instantes depois, no exato momento em que Margareth derramava
lágrimas de fúria e vergonha. Ele olhou em seus olhos quando o ato chegou ao ápice, um prazer
sóbrio de vê-la sofrendo.
Naquele momento, ela soube que sua vida e sonhos desmoronavam ali mesmo. Um misto
de ódio, tristeza e frustração a invadiu.
— Mais, vossa graça, mais... — A criada pediu com a voz aguda e provocadora, aquela
ruiva abusada estava se divertindo com aquilo e isso a chateou ainda mais.
Depois de alguns instantes, Hugh virou a mulher com brusquidão, posicionando-a com os
joelhos sobre a cama. Ela curvou um pouco o ventre para baixo e afastou as pernas, deixando à
mostra as nádegas e a fenda avermelhada coberta por pelos.
Hugh encaixou-se ali, estocando o membro ainda ereto diversas vezes, sem cuidado, sem
carinho, só força.
Ele a apertou com força, arrancando um gemido de dor que não passou despercebido por
Margareth, depois, passou os dedos por suas costas e cravou-os nos seios, puxando-a com força
em sua direção e empurrando em seguida. Ela continuou a gemer e Hugh não demorou a rugir,
apertando a cintura da ruiva, fazendo-a gritar de prazer.
Ela era realmente bonita, magra como Margareth nunca fora, com seios pequenos e
mamilos rosadinhos, muito menores que os dela e isso só aumentou sua dor. Estava claro que ele
era como os outros, queria uma garota que morresse de fome para caber nos espartilhos mais
apertados, que não tivesse quadris redondos e salientes ou seios que enchessem o corpete.
Magoada, confusa e com raiva, correu para o quarto, abandonando os dois em pleno ato
de consumação do casamento dela. Fechou a porta e deixou o corpo pender, a respiração
ofegante, o coração totalmente descompassado.
Sentada no piso frio, recostou a cabeça na porta, fechou os olhos e pensou em tudo o que
vira. Depois de alguns minutos enfiou-se na cama, sem ânimo sequer para chorar, cansada
demais para conseguir formular algum pensamento coerente.
Quando dormiu, sonhou que estava no lugar da ruiva e que gostava do que ele fazia.
Ao perceber que a esposa tinha saído, Hugh ficou frustrado de um jeito incomum para um
homem como ele, acostumado a ter tudo o que quer. E ele queria não apenas humilhá-la, mas
também fazê-la sentir o mesmo desejo que estava sentindo. Casara-se com uma jovem sem a
menor noção do mundo, mas com coragem o bastante para enfrentá-lo com um candelabro,
ameaçando-o como se fosse mesmo capaz de acertá-lo.
E isso libertara uma fera indomável dentro dele, agora precisava de toda a sua força para
se manter no controle.
— Merda! — crispou, sem conseguir tirar os olhos da porta, lembrando-se das lágrimas
irritadas da esposa. Mas onde é que ele estava com a cabeça? Por que diabos não mudou de
estratégia?
Se a garota não gostava de umas palmadas, ele poderia ter, pelo menos na primeira vez,
cedido e tentado ser carinhoso, agora poderia estar no meio de suas pernas e poderiam ser os
gemidos dela a encherem seus ouvidos.
Mas era um turrão e quando contrariado só piorava mais as coisas.
Pensando bem, ele poderia tê-la tomado à força e, antes de Aila ir ao seu quarto, estava
mesmo pensando nisso. Ficou excitado apenas por lembrar-se dos cabelos cacheados caindo
rebeldes sobre os seios firmes e a lembrança dela com o candelabro o fez sentir um desejo ainda
mais feroz.
Quando a criada ruiva, que volta e meia o visitava, bateu à porta, Hugh chegou a pensar
que a esposa mudara de ideia e, nesse caso, faria um discurso bobo sobre as posições de cada um
no casamento e depois a tomaria com vontade, faria com ela tudo pelo que vinha imaginando
desde que propusera o enlace ao pai da moça.
Dormiria com ela aninhada ao seu peito e pela manhã a faria descobrir o prazer que ele
poderia proporcionar, deixando-a à mercê de seus desejos sexuais e de um prazer que ele podia
apostar que ela era capaz de sentir.
Ver Aila, segurando a vela e vestida apenas com um camisolão de linho grosseiro, as
pernas torneadas de fora e sem nenhuma roupa de baixo, coisa que as mulheres pobres pouco
usavam, a princípio o deixara ressentido, ele queria que fosse Margareth e não a criada com
quem descarregava as energias quando estava precisando. Queria a esposa e não a empregada.
Estava furioso e excitado, o olhar suplicante de Aila e a chateação por Margareth ter sido
tão teimosa acabaram por convencê-lo a abrir a porta e permitir a entrada dela no quarto bem no
meio da noite de núpcias.
Descarregar sua ira em um sexo selvagem com Aila era apenas um pequeno castigo para
Margareth, a lady mimada que desposara e que o rejeitara, como se fosse superior a ele. Se
soubesse de seu passado, provavelmente teria certeza de que era mesmo, mas isso não vinha ao
caso agora.
Quando Margareth irrompera pela porta de ligação dos quartos, ele sentira uma pontada
de culpa tomar seu corpo e chegara a pensar em pedir perdão, por humilhar aquela com quem
deveria passar o resto da vida, levando uma criada para sua cama quando deveria estar na mesma
cama que ela.
Os olhos aterrorizados da moça o deixaram ainda mais confuso. Fora, no entanto, a voz
inquisitória dela que despertara a raiva de Hugh. Ele a obrigara a assistir ao coito grosseiro que
tivera, olhando para seus olhos quando gozava e sentindo a dor dela a cada vez que estocava para
dentro da criada.
Tinha sido um idiota e sabia disso, mas Hugh era um maldito conde, afinal, a esposa é
quem deveria se sujeitar a ele e não o contrário.
A ruiva aninhou-se em seu peito como um gatinho prestes a ronronar. Hugh afastou a
cabeleira e a empurrou para longe de seu corpo suado, não estava com ânimo para ser gentil.
— O que foi, meu conde? — ela voltou a aproximar-se, enrolando-se no lençol macio.
— Você já pode ir.
— Mas eu quero ficar — ela passou a mão no peito do conde, raspando as unhas
descuidadas pelo trabalho.
— Eu disse que você já pode ir — Hugh tirou a mão de Aila que descia para sua virilha e
a empurrou para fora da cama.
— É por causa dela? É por isso que não posso ficar aqui com você?
— Veja como fala comigo, nesta casa você é apenas uma criada.
Aila pulou para a cama, acariciando os próprios seios.
— Ela não pode fazer isso, nem mesmo saberia o que fazer para agradá-lo, Vossa Graça.
É só uma garota mimada que nem mesmo quer o senhor.
Hugh pegou Aila pelos braços e chacoalhou-a com fúria. Só o que lhe faltava era que
aquela maldita criada se achasse no direito de dizer qualquer coisa a respeito de sua esposa.
— Meça suas palavras para falar da Condessa. Ela é a sua senhora e você está aqui agora
só porque ela não quis estar. Você entendeu?
Os olhos da ruiva estreitaram-se com raiva. Hugh jogou-a para fora da cama. Aila caiu
sentada no chão frio e resmungou ao apanhar seu camisolão.
— Vossa Graça... — ela fez uma reverência forçada.
Saiu batendo a porta do quarto e jurando que alguém iria pagar por aquilo.
Hugh deitou-se de costas, olhando para o teto enegrecido pela penumbra mantida pela
pouca iluminação das velas. Quando dormiu, sonhou que fazia amor sob a luz da lua com
Margareth e ela chamava seu nome, implorando para que ele a penetrasse.
Margareth acordou sentindo a cabeça latejar e o estômago roncar. Tivera uma noite
péssima e sentia cada parte do corpo dolorida e tensa. Com o travesseiro pesado de plumas
abafou o rosto, forçando os olhos a não chorarem mais. Depois de algum tempo, cansou-se da
cama e resolveu que era o momento de enfrentar a situação e o maldito tirano louco com quem se
casara.
Saiu do quarto vestindo apenas um chambre de seda fina sobre a camisola. Estava em
bodas e isso lhe dava o direito a certas liberdades, como andar sem as anáguas e a crinolina, pelo
menos por alguns momentos. Aproveitaria cada segundo da liberdade de não ter que usar aquelas
roupas apertadas e pesadas e aproveitaria ainda mais se pudesse infernizar o marido.
Desceu a escadaria a passos lentos, aspirando o cheiro de madeira que invadia as narinas.
O odor de óleo sobre o corrimão era árido e pinicou seu nariz, mas ela não deu importância.
Margareth encaminhou-se para a cozinha principal, onde ouviu a movimentação frenética
de criados. Entrou no recinto e surpreendeu-se. Sem qualquer dúvida, caberiam ali pelo menos
dez famílias perfeitamente acomodadas em mesas grandes. O lugar era enorme e requintado, mas
não chegava a ser frio como ela imaginou que seria. Havia uma aura de serenidade, familiaridade
e ela gostou disso.
Hugh estava parado com uma faca pequena na mão, descascando uma maçã e falando
coisas aleatórias com a Sra. Garden.
A governanta levantou os olhos na direção de Margareth e Hugh se calou, virando-se
devagar na mesma direção. Estava sem camisa e os músculos dourados brilhavam com o feixe de
luz que irrompia pela fresta da cortina. Margareth prendeu a respiração ao ver o corpo forte do
Conde, depois olhou para a governanta e sorriu-lhe afetuosamente.
— Bom dia, Senhora Garden.
— Bom dia, Vossa Graça. — A governanta retribuiu o sorriso com honestidade. — Vou
providenciar para que as criadas subam e ajudem-na a vestir-se.
— Fico muito grata, mas antes gostaria de tomar meu café da manhã.
— Quer que leve ao seu quarto?
— De forma alguma, vou comer aqui mesmo.
Hugh arqueou uma sobrancelha. Imaginava que ela fosse passar o dia inteiro trancada.
Quando finalmente saísse do aposento, imploraria para ser enviada de volta ao pai, o lorde falido
que ficara satisfeito em praticamente vender a jovem e linda filha insolente.
Mais uma vez, Margareth surpreendia Hugh... não apenas saíra do quarto cedo, como
também resolvera tomar o café na cozinha, em meio aos criados e sem a menor compostura com
as roupas. Aquela mulher parecia uma égua xucra, capaz de pastar mansa ou dar coices quando
tocada. Alguém teria de domá-la.
— Dormiu bem, minha querida? — Hugh perguntou provocando.
Margareth ajeitou-se à mesa e enquanto as criadas preparavam sua refeição, sorriu com o
mesmo ar petulante.
— Não posso imaginar que um dia tenha dormido melhor, meu esposo.
Hugh ficou surpreso.
— Tudo estava satisfatório nos seus aposentos?
— Ah, sim, a senhora Garden foi muito competente. Acho apenas que vou precisar de um
pequeno biombo. Talvez um desses artigos franceses com entalhes de flores.
— Um biombo?
— Sim, ao lado da cama.
— E para que você precisaria de um biombo? Você tem seu quarto de vestir.
— Eu sei, eu sei. Não passo de uma garota mimada, mas sempre sonhei em ter um
biombo, como nos livros que leio — ela falou, soltando uma gargalhada em seguida e deixando
claro que estava sendo debochada.
Todas as criadas olharam-na surpresas. Imaginaram uma senhora muito mais arrogante,
mas aquela jovem tinha um riso fácil, comia com ânimo diante das criadas e falava bobagens
provocando o marido.
— Você não precisa de um biombo — ele concluiu com irritação.
— Ora, mas é claro que não preciso. Não preciso de nada — ela lançou um olhar
inocente. — Estava apenas brincando. O quarto é maravilhoso, a senhora Garden providenciou
inclusive para que minhas caixinhas de joias fossem dispostas sobre a penteadeira. Exatamente
como uma condessa poderia imaginar.
Hugh sentiu-se ainda mais confuso, sem saber se ela falava sério ou se mais uma vez
fazia chacota de sua falta de trato com mulheres.
— Aquele quarto é maior do que a casa de muitos trabalhadores, o senhor sabia? —
Margareth deu de ombros, perguntando com um olhar astuto.
— Imagino que sim.
— Sim, também imagino e acho que uma pessoa nem mesmo precisaria de tanto luxo por
uma vida inteira — ela declarou sem qualquer preocupação.
As criadas arquejaram horrorizadas. Aquela jovem ousada falava com autoridade sobre
coisas que provavelmente nunca entenderia, coisas que uma condessa jamais pensaria. E falava
assim com o marido, um conde importante.
— De qualquer forma, eu não esperaria ser tratada melhor— falou muito séria e isso soou
exatamente como pareceu. Uma declaração sobre o que aconteceu e ele sentiu a cutucada com
toda a certeza.
A condessa tomou o chá e comeu um pedaço de bolo, soltando pequenos suspiros
deliciados, seguidos de gemidos quase imperceptíveis. Tudo estava delicioso, mas depois de
encarar Hugh ela perdera completamente a fome.
Contudo, não parou de comer e nem de fingir que aquilo era a coisa mais prazerosa do
universo, então ela forçara a comida pela goela abaixo, apenas para provar ao conde que era
confiante e dona de si mesma.
Se o maldito achava que poderia humilhá-la, ele que se sentasse diante de uma lareira e
ficasse esperando, pois ela nunca mais o deixaria ter esse tipo de poder sobre ela.
— Bem, vou me vestir agora. Gostaria de dar um passeio pela propriedade ainda pela
manhã.
Hugh não disse nada, envolvido num misto de confusão, choque e fascínio. Margareth
soltou um longo suspiro pensativo, virou-se para a governanta e soltou:
— Ah... Senhora Garden, peça que... Como é mesmo o nome da criada ruiva que conheci
ontem, meu senhor?
Hugh não respondeu, engolindo o mau humor e sentindo as bochechas esquentarem de
raiva.
— Aila — a senhora Garden respondeu contrafeita, imaginando a grande confusão que
estava prestes a começar por causa da maldita irlandesa que trabalhava ali sob a proteção do
conde.
— Esta mesma. Senhora Garden, peça que Aila vá imediatamente ao meu quarto, quero
que ela me ajude com o espartilho e pode pedir que Mady também vá. É Mady, não é? Quero
dizer, o nome daquela criada simpática que penteou os meus cabelos ontem...
— É Mady, Vossa Graça — a senhora Garden fez uma mesura.
— Pois bem, peça a Mady e a Aila que subam e ajudem a me vestir o quanto antes.
— Como desejar, Vossa Graça — a governanta curvou-se novamente.
— Esposo — Margareth fez uma reverência perfeita sem olhar nos olhos dele.
Ele apenas acenou com a cabeça e Margareth saiu da cozinha e subiu as escadas sentindo
o coração palpitar forte, como se quisesse sair pela boca.
A respiração ofegante e a sensação de vitória se misturavam. Um jovem criado tirava o
pó dos vãos da escada. Ao perceber a aproximação da condessa, erigiu o corpo e virou-se para
frente, baixando a cabeça em sinal de respeito. O tipo de coisa que deixava Margareth ainda mais
furiosa: formalidades da realeza, absurdos que ela jamais entenderia. Ela sabia que o mundo era
muito maior do que criados limpando escadas e se curvando para uma pessoa como qualquer
outra.
Apesar de ser filha de um lorde sem título de nobreza, acostumara-se ao meio dos nobres,
cujos chás da tarde e conversas tediosas deixavam-na extremamente chateada. Nunca dissera
nada a ninguém, nem mesmo à prima Sophie, com quem brincara na infância e discutira
amenidades na adolescência.
Entrou no quarto e jogou-se na cama, respirando profundamente várias vezes, irritada,
confusa e um pouco vitoriosa por conta da forma como lidara com o marido.
Aila chegou ao quarto da condessa poucos instantes depois, curvou-se e rangeu os dentes
quando Margareth começou a despir-se. Mady bateu na porta em seguida, fez uma reverência
graciosa e postou-se para auxiliar a Condessa. Quando chegou o momento de apertar o
espartilho, Margareth fez um gesto para Mady afastar-se e para que Aila se aproximasse.
— Já viu um destes antes, Aila? — a voz de Margareth saia desdenhosa. Ela não era dada
a tratar as pessoas, principalmente as que a serviam, de forma rude, mas aquela criada ia pagar
caro por ter estado na cama de Hugh.
— Não muitos, Vossa Graça.
— Imaginei, este tipo de veste é para moças de boa família. Custam muito caro. — Falou
num tom frio, sem olhar para a criada e forçando um ar de superioridade que ela não tinha
normalmente.
Aila não disse nada, passando as fitas decorativas e fazendo pequenos laços.
— Então, o que você acha? Estou parecendo uma moça de boa família?
Margareth continuou sem se dirigir especificamente a nenhuma das criadas e apreciando-
se no espelho. Mady aproximou-se, sorridente:
— A senhora está linda, Vossa Graça.
— Penteie meus cabelos, Mady — Margareth se sentou diante da penteadeira.
Mady obedeceu, sorrindo.
— Mas penteie direito, pois devo estar muito bonita para meu esposo. Vamos passear
pela propriedade, quero conhecer aquilo que pertencerá ao meu filho, um dia — os olhos de
Margareth cravaram-se em Aila, que trincava os dentes com raiva.
— O que você está fazendo aí parada? Leve meus sapatos para limpar, pois pegaram
muita poeira na viagem e aproveite para levar minhas roupas de baixo, certificando-se
pessoalmente de deixá-las alvas.
Aila passou a recolher tudo, rilhando mais uma vez os dentes a cada nova peça de roupa
ou botinha que inseria na pilha. Fez uma reverência desajeitada. Depois, virou-se para a porta e
deu o primeiro passo.
—Aila, espere — Margareth crispou num tom autoritário.
A criada voltou para o aposento de vestir, as mãos cheias de roupas íntimas, anáguas e
dois pares de botinhas.
— Sua reverência. Faça-a novamente.
— O quê?
— Você não pode ficar andando pela minha casa sem ao menos saber como se curvar
diante da sua senhora. Repita-a, agora.
Aila cravou os dentes no lábio inferior e curvou-se.
— De novo — Margareth ordenou saboreando a pouca humilhação que podia causar
naquela criatura vulgar que ousara deitar na cama do seu marido. — Faça isso direito criatura,
você serve a uma condessa, não a uma família qualquer.
Aila curvou-se e desta vez forçou o corpo a fazer a reverência corretamente. Aquela
garota mimada pagaria caro pelo que a estava fazendo sentir, mas por hora, ela apenas fez o que
a condessa mandou.
— Saia — Margareth ordenou, virando-se para Mady e dando-lhe um sorriso maroto.
Mady ficou em silêncio. A lição em Aila era merecida, mas também dolorosa e era o tipo
de coisa que só pessoas poderosas podiam fazer com pessoas como elas, duas criadas sem
qualquer importância.
Pelo resto daquele dia, Aila não tornou a ser vista.
A criada trabalhou a meia hora seguinte em silêncio, garantindo que sua senhora estivesse
impecável para o passeio pela propriedade e se preparando emocionalmente para o que parecia
que seria uma terrível batalha na propriedade. A condessa e o conde prometiam colocar fogo em
tudo.
Havia centenas de criados pela propriedade, considerada a menor entre os domínios do
Conde, mas absolutamente grande e espetacular e Margareth amou cada segundo e cada cômodo
em que passara naquela manhã.
Era tudo tão lindo e bem cuidado que ela pensou por um bom tempo que, apesar do que
passara com o conde na noite anterior, havia mais sobre ele que ela não tinha ideia. Um lugar
como aquele, o clima tão sereno (com exceção da criada ruiva, é claro) não podiam ser coisa de
alguém tão bruto e selvagem.
Margareth só não tinha certeza de que seria capaz de desvendar os segredos do marido
antes de acabar louca ou de acabar matando-o com o candelabro.
Há cerca de dois ou três anos, Hugh caíra nas graças do Príncipe. Margareth não tinha
certeza do motivo pelo qual isso ocorrera, ouvira boatos sobre ele ter evitado um acidente de
caça, nada mais profundo ou justificativo, mas, pelo jeito, fora o suficiente para aproximar o
conde da família real e a ele ser cedido o título de nobreza real. Aquilo era raro, mas não
impossível e foi logo antes da aparição do conde na temporada social.
Ele não costumava frequentar os eventos, mas logo que o fez, a escolheu como esposa e
não deixou margem para mais ninguém tentar roubá-la dele. Estava decidido e fez a proposta tão
logo a tirou para dançar.
Ela teria negado, porque sonhava em ser livre, mas o pai não fez questão nenhuma de
deixá-la sequer abrir a boca.
Além da notoriedade por casar a filha com um conde, o que elevaria o status da família,
aquilo poderia resolver seus problemas financeiros. Sem contar que o maldito conde era um dos
queridinhos da rainha e seu marido, um bônus e tanto para uma família praticamente falida.
E ela não podia negar que apesar do jeito selvagem, ele tinha carisma e era sempre muito
elegante, exceto quando tentava dominá-la e a humilhava, como na noite anterior.
Durante o curto período de corte, ele se mostrara um verdadeiro mistério, com um jeito
intrigante de falar e provocar Margareth, que sempre respondia à altura.
Hugh tinha verdadeira aversão à Câmara dos Lordes, embora tivesse assumido sua
posição quando o pai morrera. Apesar de odiar aquilo, ele tinha uma missão que o impelia a
continuar, era um conde e ponto final.
Todos esperavam que desposasse a filha de algum Conde ou outro nobre tão rico quanto
ele ou ainda mais, e cuja filha tivesse um opulento dote.
Esperavam que tentasse uma esposa de linhagem superior, a filha de um duque ou talvez
uma princesa. Mas não. Hugh surpreendera a todos ao fazer formalmente o pedido de casamento
para uma família influente, mas sem nenhum título de nobreza e, muito possivelmente, em sérios
problemas financeiros.
A princípio chocara a muitos, mas como a jovem Margareth detinha beleza extraordinária
e modos indiscutíveis, acabaram-se os boatos rapidamente. Além do que, provocar o conde de
Surrey nunca era uma boa opção, porque ele podia ser terrível com quem o fizesse.
No dia da cerimônia não foram poupados gastos. O conde exibiu a bela e jovem esposa
durante uma valsa que deixara a todos extasiados. Ninguém duvidava de que estivesse
apaixonado por ela depois da dança sensual e polêmica.
Portanto, agora, Margareth era a Condessa de uma região muito próspera que fora
liderada com louvor pelas mãos do pai de Hugh. O que ela jamais imaginaria é que o conde tinha
um segredo. Se soubesse, talvez tivesse gostado um pouco mais do marido.
O conde estava sentado diante da enorme mesa da biblioteca. O ambiente era abafado e
ele o enchia de fumaça com um charuto de odor forte. Aila entrou e fez uma reverência, depois
deu dois passos na sua direção, baixando a cabeça de forma respeitosa.
— Meu amo...
— O que a Condessa queria de você? — Hugh perguntou sem alterar o semblante ríspido.
Aila não respondeu de imediato, pois não sabia que palavras usar para descrever a
humilhação a que fora exposta. Uma coisa era ceder aos caprichos sexuais do Senhor da casa,
buscando algum tipo de benefício, outra coisa bem diferente era o convívio diário. Hugh era um
conde e ela uma criada.
Por algum tempo até almejara ser desposada pelo Conde, por uma paixão avassaladora
ser transformada na condessa de Surrey, uma das regiões mais prósperas de toda a Inglaterra.
Mas quando a Condessa chegou, uma moça elegante, de modos impecáveis e aparência
exuberante, compreendeu que jamais haveria lugar para uma criada como ela na vida dele. Ele
jamais a olhara como a olhou quando desceu da carruagem ou quando entrou no quarto no meio
do ato dos dois.
— Estou esperando...
— Queria ajuda com o espartilho.
— E o que mais?
— Saber se eu já tocara num antes e deixar claro que somente moças de boa família
podem ter um, pois custa muito caro — ela rangeu os dentes, magoada.
— Ah... sim, isso é um fato. O que mais?
— Queria que a ajudasse a ficar bonita para um passeio com o senhor, para conhecer a
propriedade que um dia será do filho do senhor.
Hugh alteou as sobrancelhas. Nunca pensara em filhos, tudo o que via pela frente era a
sede de vingança que corria em suas veias como o sangue herdado dos pais. Filhos. Seria ele um
bom pai?
Pensou por mais alguns instantes e compreendeu. Nunca se tratara de um filho e sim de
Aila. Margareth queria colocá-la em seu lugar, mostrar quem deveria esquentar a cama dele. Se
os pensamentos pudessem sorrir, estariam gargalhando.
Margareth era uma jovem temperamental, já percebera, mas pelo visto era astuta e
rancorosa e aproveitara a oportunidade para humilhar a criada, quando na verdade o maior
culpado de tudo era ele mesmo, que muitas vezes chamara a criada para esquentar sua cama e
satisfazer suas necessidades sexuais, oferecendo nada mais do que algumas horas de prazer.
Ele não esperava por isso, até então tinha certeza de que em algum momento aquela
jovem voluntariosa acabaria cedendo e agindo como qualquer outra esposa normal, submissa,
mas já não tinha certeza agora, depois do curto relato de Aila. Isso seria um desafio, mas estava
disposto a tentar.
Talvez até fosse uma boa distração das preocupações com seus planos futuros.
Começava ali um cabo de guerra entre o conde e a condessa.
Depois de passear ao lado da esposa em silêncio sepulcral, o conde a deixou em sua sala
privada e foi para a biblioteca, sentou-se diante da escrivaninha, uma imensa mesa forrada de
couro ao estilo gótico.
Acendeu seu charuto e ficou pensativo.
Nitidamente, a esposa tinha repulsa dele e isso parecia ter justamente o efeito contrário ao
esperado, acendendo ainda mais a chama de atração e desejo dentro dele. Pensava em muitas
maneiras de tocá-la, imaginava-a gemendo sob seu toque e extasiando com o clímax.
Pensava nas noites ardentes e nas coisas a que gostaria de submetê-la. Mas ela não era
uma criada e tê-la na sua cama poderia levar muito tempo e muitas discussões. Hugh precisava
pensar sobre isso, não era dado a obrigar mulheres e odiava os bastardos que faziam isso, embora
não fosse um exemplo de cordialidade e delicadeza.
Um criado magro bateu à porta... Quando o conde resmungou uma permissão o garoto
entrou, curvou-se em deferência e abaixou os olhos.
— O que foi?
— Lady Margareth pediu para avisá-lo que o chá será servido em alguns instantes.
— Está certo.
— Vossa Graça... — o lacaio saiu, fazendo uma reverência.
Hugh continuou sentado, tragando o charuto e pensando no que poderia fazer para ter
aquela mulher em sua cama. Poderia agradá-la com presentes, joias, ou apenas dar-lhe uma bela
surra e possuí-la à força. De qualquer forma, nenhuma das opções o agradava muito. Pensou um
pouco mais e então teve uma ideia.
Hugh saiu da biblioteca com a mente fervilhando. Sabia como provocar aquela garota
insolente e faria isso com muita satisfação, ou ela acabaria cedendo a ele por desejo ou acabaria
cedendo para se livrar dele.
E ele faria isso do mesmo jeito que a fizera soltar um gemido manhoso e sensual quando
tocou seu seio, provocando o desejo de Margareth.
Estava lá, escondido por anáguas e medo, mas ele sabia que dentro daquelas curvas e
seios grandes havia uma verdadeira fogueira, esperando ser alimentada para incendiar tudo.
De qualquer maneira, Margareth seria sua no sentido mais amplo e ia começar pelo chá.
Com a cabeça fervilhando das provocações que planejava, ele saiu da biblioteca,
esquecendo-se de tudo mais e focando apenas na mulher que queria possuir.
Margareth estava na cozinha principal falando com a senhora Garden sobre coisas que
queria mudar na casa, como os muitos vidros embaçados que gostaria de manter sempre limpos.
Hugh entrou como um furacão. Os criados reverenciaram-no com deferência e um pouco
atrapalhados, mas Margareth manteve-se impassível.
— O que está fazendo?
— Passando algumas instruções à senhora Garden — ela disse, o olhar ainda na direção
anterior. — Senhora Garden, mande servir o chá.
— Sim, Vossa Graça.
— Está se divertindo pelo jeito... — Hugh bradou.
— Suponho que não tanto quanto você — a condessa retrucou, passando por ele com o
nariz empinado.
— Não vire as costas para mim quando falo com você!
— Não vire as costas para mim quando falo com você!
— Não grite, meus ouvidos funcionam bem.
— Falo como bem entender — ele devolveu, irritado outra vez.
O plano de seduzir e conquistar a jovem condessa com pequenas insinuações e
provocações sexuais havia sido derrubado por sua maldita boca grande.
Por que não a elogiara apenas? Por que diabos não conseguia evitar e acabava implicando
com a mulher que só estava cuidando dos afazeres domésticos?
Ele era mesmo um grande cabeça dura. Mas a culpa era dela também, sempre com a
língua ferina e respostas de tirar qualquer um do sério.
— Quem você pensa que é para falar comigo desta forma? — Margareth gritou, virando-
se na direção do conde finalmente e o encarando com uma imensidão azul. Olhos que o
fascinavam e um sorriso petulante que o deixava louco.
O corredor estreito de repente ficou pequeno demais para os dois.
— Eu sou seu marido — ele rebateu, os olhos verdes fitando-a com poder e arrogância.
— Exatamente, caro conde — Margareth aproximou-se dele devagar, como uma fera
prestes a dar o bote. Seus olhos tinham uma expressão determinada. — Você é meu marido e eu
sou sua esposa, não sua criada. Não me falte com o respeito que o mesmo não acontecerá com o
senhor.
Ela falou com o dedo em riste e com um tom frio de arrepiar. Depois virou-se com as
saias farfalhantes, deixando-o para trás completamente perplexo. Hugh saiu em seu encalço.
— Você é uma mulher muito atrevida. Alguém precisa colocá-la no seu devido lugar —
Hugh esbravejou, puxando-a pelo braço e obrigando a encará-lo com os cílios grossos.
— E por acaso essa pessoa seria o senhor?
— Com toda certeza — crispou, levantando a mão e preparando-se para esbofeteá-la, de
repente tomado por uma fúria que nem mesmo ele reconhecia.
— Pois pense melhor — Margareth aproximou-se dele, levantando o queixo, os olhos
faiscantes e furiosos.
Hugh congelou com o enfrentamento, não estava acostumado a ser questionado, ainda
mais por uma mulher, sua mulher, mas acima de tudo, não estava acostumado a lidar com sua
própria selvageria. Nunca levantara a mão para uma mulher antes e sua mãe o teria repreendido
com razão se o visse naquele momento.
— O quê? — inquiriu, atônito consigo mesmo e com ela.
Agora Margareth estava muito próxima a ele e isso o deixou com o coração acelerado, a
respiração pesada e os nervos uma bagunça. Estavam separados apenas pelo tecido refinado do
vestido da condessa que o impedia de chegar mais perto.
— Só tenho uma coisa a lhe dizer, meu caro conde. Nosso casamento ainda não foi
consumado e aposto que o senhor odiaria que um escândalo chegasse aos ouvidos da Rainha
Victória. Eu soube que ela preza muito pela moral e pelo matrimônio. Aposto que ficaria
horrorizada com a minha descrição a respeito da nossa noite de núpcias.
Hugh arquejou. Aquela mulherzinha desgraçada o estava deixando maluco.
— Quem você pensa que é?
— Eu sou a esposa de um conde que prefere deitar-se com criadas.
— Sua...
— Você achou mesmo que o deixaria me tratar como se fosse uma dessas sujeitinhas
sujas com quem se diverte?
— Eu sou seu marido, inferno, posso fazer o que quiser com você.
— Quando o senhor resolver tratar-me como mereço, a porta do meu quarto estará aberta.
A não ser que não queira um herdeiro...
— Quando quiser um, terei, com ou sem seu consentimento.
— Tem certeza disso? — os olhos dela o fuzilavam.
— Você é uma megera!
— E você um tirano!
Hugh segurou Margareth pelos braços e chacoalhou-a com força. Ela forçou-se a não
gritar, nunca mais lhe daria o gostinho de vê-la assustada e humilhada, pelo contrário, abriu um
sorriso mordaz que mandou o bom senso do marido para o inferno.
— O que você quer de mim, afinal? — Hugh berrava, ainda chacoalhando os braços de
Margareth e fazendo os seios fartos no corpete chorarem-se contra o peito dele.
A jovem tirou as mãos do marido de seus braços e esfregou-os com delicadeza. Depois
arrumou os cabelos, olhando-se num imenso espelho adornado por pequenos cristais, na parede
ao lado.
Caminhando com calma, saiu do corredor e entrou na sala de jantar pouco iluminada.
Respirou fundo seguidas vezes, para impedir que um grito de terror escapasse de seu peito.
Cerrou os punhos e cravou as unhas nas palmas fechadas. Se começasse a tremer, provavelmente
perderia o controle e sairia aos berros, desesperada, pedindo para o pai levá-la dali.
Mas ela não queria fazer isso. Não entregaria sua vida nas mãos de nenhum outro
homem, nem mesmo seu pai.
Hugh seguiu-a. Mal percebendo a presença silenciosa dele, ela soltou:
— O que eu quero não importa. E sim o que eu não quero.
— E o que você não quer? — Hugh falou com mais calma, puxando a cadeira para que a
esposa se sentasse diante da imensa mesa escura, de repente recuperado do debate acirrado.
Margareth tinha vontade de gritar na cara dele: “Não quero que aja como uma fera bruta e
selvagem!” Mas não o fez. Com toda a serenidade que descobriu dispor, olhou para as esferas
verdes e furiosas, sorrindo.
— Não quero ver mais aquela criada imunda deitada na sua cama, seja nesta casa, ou em
qualquer outro lugar. Na verdade, não é correto que você se deite com qualquer mulher além de
mim.
— Como você ousa falar esse tipo de coisa? Você é uma dama, ou deveria ser pelo
menos. — O conde crispou o rosto, aturdido.
— Você não estava preocupado com isso ontem à noite.
Hugh engoliu em seco.
— Você me mandou embora ou esqueceu-se disso? — ele esbravejou para o olhar irônico
da condessa.
Margareth bufou, estalou a língua e continuou:
— Não quero mais seus ataques. Comporte-se como o conde que você é, com um título
de alteza real. Isso deve valer de alguma coisa afinal.
Hugh bateu com os punhos fechados sobre a mesa e Margareth pulou assustada.
— Esta é a minha casa, tudo aqui pertence a mim, inclusive você.
— Se o senhor não estiver satisfeito pode me devolver ao meu pai, o fato de não termos
consumado o casamento poderia resolver o assunto.
— E provocar um escândalo?
Margareth deu de ombros. Os dois se mantiveram em silêncio por alguns instantes.
— Você não tem medo do que poderia acontecer com você? — Hugh perguntou, mais
curioso do que outra coisa, depois de se acalmar outra vez, já começando a sentir um certo
desgaste pelas oscilações emocionais e rompantes que a esposa provocava nele.
— Eu sei o que aconteceria comigo.
Ele esperou pelo que viria a seguir.
— Meu pai passaria horas me dizendo que eu fora capaz de estragar sua vida e desgraçá-
lo para toda a sociedade por gerações, depois me enviaria para um convento ou, se fosse
possível, me forçaria a casar com alguém de linhagem inferior à sua e o assunto ficaria encerrado
com a minha vergonha e reclusão. Talvez me aplicasse um castigo, mas não estou certa disso.
— E você estaria disposta a viver sem tudo isso, apenas para me contrariar? — Hugh
falou, olhando para o luxo ao redor.
Margareth sorriu.
— E o que o faz pensar que me importo com tudo isso? — ela devolveu num tom
zombeteiro.
— Se não se importa, por que aceitou meu pedido de casamento?
— Porque fui obrigada.
— Você é mesmo uma megera.
— O senhor já disse isso.
— Pois saiba que não vou devolvê-la e, também, não vou ao seu quarto, não até que me
implore. E eu me deitarei com quantas criadas quiser. Se você não se comportar como deve, vou
dar-lhe o tipo de castigo que merece. — Hugh recuperara o controle e falava com fervor. — E
que se exploda o que a rainha acha ou deixa de achar.
Margareth cerrou os punhos, a fúria só a custo mantida sob o semblante frio e indiferente.
Aquele maldito conde era mesmo uma fera. Mas ele teria o que merece.
Hugh e Margareth não trocaram mais nenhuma palavra por horas. Ela remoendo a raiva
que sentia e ele engolindo o desejo que se inflamava, numa mistura de implicância e vontade de
possuir a esposa.
Atrevida.
Temperamental.
Corajosa.
Ela seria capaz de provocar uma confusão na sociedade, ele não tinha dúvidas.
Depois do jantar, tentando manter o mínimo de civilização que conseguiam, os dois
seguiram para uma sala adjacente a de jantar, Hugh serviu-se de uma pequena dose de licor e
Margareth se sentou perto da janela, apreciando a bela noite que se estendia atrás do vidro.
— O que você estava dizendo? — ela perguntou quando se deu conta de que ele estava
falando alguma coisa, os olhos ainda voltados para o vidro embaçado da janela.
— Que daremos uma recepção em algumas semanas. Depois voltaremos para a cidade.
— Ah! — ela falou, insuflando o ar com força.
— O que foi? Não quer dar uma festa, também? — Hugh resmungou, bebericando o licor.
— Não é isso. Só não gostaria de voltar à cidade tão cedo.
— Por quê? — ele se viu curioso.
Há menos de uma hora, os dois haviam discutido de tal forma que faltou bem pouco para
se engalfinharem, rolando pelo chão aos socos e pontapés. Agora, ela estava sentada, olhando a
vista da imensa propriedade pela janela e considerando ficar para sempre naquele belo lugar,
talvez a casa de campo compensasse um pouco do que vinha passando e tudo o que
provavelmente ainda passaria.
Hugh tomou outro gole da bebida, os pensamentos ainda tumultuados por causa da briga
com a esposa e uma confusão de sentimentos brigando pelo domínio da sua mente. E depois de
tudo, ela não queria ir para a cidade? Será que ela queria enlouquecê-lo?
— Gosto muito daqui — ela disse com sinceridade. — Não conheço bem a propriedade,
mas sinto que poderia amar esse lugar.
— Eu também.
Os dois olharam-se por uma fração de segundo, depois ela voltou os olhos azuis para um
livro de Dickens que repousava ao seu lado e ele continuou bebendo em silêncio.
— Você saberá como organizar tudo?
— Saberei. A senhora Garden me ajudará.
— Ótimo.
Hugh levantou-se para sair.
— O que devo dizer se perguntarem sobre nós?
— Diga o que quiser — ele respondeu e saiu.
Os dois não voltaram a ver-se pelo resto da noite. Margareth ceou no quarto e Hugh não
deu as caras. Nenhum dos dois ousara tentar abrir a porta de conexão dos quartos e depois de um
dia tão estressante, ela não demorou a pegar no sono.
No meio da madrugada, Margareth despertou. A cabeça latejando e o corpo queimando.
Estaria ela com febre? Levantou-se devagar e seguiu até a bacia, despejando um pouco de água
com a jarra de louça fina que Mady abastecera logo cedo e molhou o rosto, a nuca e os punhos.
Foi até a janela e abriu a cortina. A noite escura estava banhada apenas pela beleza da lua,
cheia e pomposa. Com dificuldade, Margareth abriu a janela e deixou o vento forte fustigar suas
faces rosadas. Aspirou o ar e sentiu o aroma das damas da noite. Fechou as janelas e voltou para
a cama.
Antes de deitar, porém, escutou. Com os sentidos em alerta, ela ficou imóvel diante da
cama. Não moveu um músculo sequer, tentando discernir melhor aquele barulhinho ao longe.
Não é possível, Margareth pensou, sentindo a fúria esquentar seu sangue e tremer suas mãos
delicadas. Aquele maldito conde estava fazendo de novo.
Pé ante pé, ela caminhou em direção à porta de ligação dos quartos. Encostou a cabeça
com cuidado para não fazer barulho e ficou ouvindo.
Os gemidos do outro lado da porta e o barulho da cama rangendo provocavam-lhe um nó
na garganta e uma ânsia brutal.
Tinha vontade de entrar, esbofetear aquela maldita criada abusada e fazer coisa pior com
aquele demônio com quem se casara. Mas se ele pensava que ela iria ceder aos seus joguinhos,
estava muito enganado.
Mesmo que sua vontade fosse irromper pela porta e fazer um escândalo para toda a
Inglaterra escutar, ela não o faria. Aguentaria firme e daria o troco. Tanto Aila quanto Hugh
pagariam caro pelo que a estavam fazendo passar.
Margareth continuou com a cabeça colada à porta, respirando lentamente e mantendo os
nervos sob rédeas muito curtas.
Do outro lado da porta, Hugh estava começando a ficar impaciente. Sabia que Margareth
estava acordada, ouvira quando ela derramara água na bacia e abrira a janela. Aquele havia sido
o momento pelo qual tanto esperara. Ela estaria desperta o suficiente para ouvi-lo.
Assim que ela fechou as janelas, Hugh fez um meneio de cabeça para Aila que, em cima
da cama, começou a gemer. Ele caminhou até a porta de ligação dos quartos e colocou a cabeça
rente à porta, tentando perceber se Margareth se movimentava.
Aila estava com a cara fechada, preferia gemer quando o conde a cavalgava, mas se ele
mandava, ela obedecia, além disso, tinha um certo prazer em provocar a condessa.
Então, pulando e gemendo na cama, ela fingia estar nas nuvens com as carícias
enlouquecedoras do conde. Carícias que não existiam porque ela estava pulando na cama feito
uma maldita louca enquanto ele tentava ouvir pela porta se ela estava escutando-os.
Hugh foi até a criada, que estava com sua blusa semiaberta e sua saia de lã sobre seus
lençóis. Sentiu repulsa ao vê-la daquela forma, mas não disse nada. Precisava que ela fizesse um
bom trabalho, queria irritar Margareth a todo custo.
— Você não está fazendo barulho suficiente.
— Desculpe, amo — Aila apressou-se em dizer.
— Trate de se animar mais.
— Talvez se o senhor viesse aqui me ajudar, eu conseguiria me sair melhor.
— Pare de falar besteiras e faça o que mandei.
— Sim, amo.
Aila recomeçou a gemer, fazendo a cama ranger como se os dois estivessem realmente
aproveitando a noite.
Hugh bufava, andando de um lado para o outro com impaciência. Passara a chave na
porta, sabia que Margareth irromperia por aquela porta enlouquecida e pronta para um escândalo,
ficaria ainda mais furiosa quando descobrisse que estava trancada.
Ele demoraria para abri-la, fingindo que estava mesmo comendo a criada, depois acabaria
mostrando quem realmente era o amo da casa, dizendo todas as coisas idiotas que viesse à
cabeça.
Só que Margareth não veio e nem colando o ouvido com toda força na porta, Hugh
conseguiu ouvir qualquer movimentação. Aquela maldita mulher ou estava dormindo como uma
égua velha e cansada e pouco se importava com o mundo à sua volta, ou estava acordada,
ouvindo tudo e pouco se importando com ele.
Definitivamente, escolhera a lady menos submissa que poderia, mas ela não sairia
impune por sua indiferença e pagaria caro por isso. Ele só não tinha ideia de como.
— Pare com isso — o conde disparou furioso para Aila, que se encolheu, respirando
ofegante e cansada de tanto pular.
— Por que o senhor não vem aqui e deixa que eu cuide do senhor? — a criada falou, com
seu sotaque cadenciado das classes inferiores.
Aila começou a tirar a parte de cima de sua roupa, mas Hugh não estava com ânimo para
aquela criatura.
— Dê-se o respeito, pelo amor de Deus, mulher. Vista-se.
— Mas amo...
— E pare de me chamar assim. Saia daqui.
Aila se sentou com os pés para fora da cama. Havia um misto de raiva e frustração em
seu rosto e ela nunca quis tanto ser mais forte para colocar aquele homem no seu lugar.
— O senhor é mesmo um homem cruel.
Ela falou, depois recolheu suas botinas surradas e saiu.
Nesse momento, Hugh sentiu-se culpado. Não apenas por usar uma jovem criada que só
fazia o que ele mandava e de bom grado, como, também, por provocar e humilhar a esposa, uma
jovem sem nenhuma experiência, que se assustara com sua brutalidade e por isso reagira de
forma tão escandalosa.
Se ao menos ele tivesse pensado a respeito, se tivesse compreendido melhor a situação,
agora nada disso estaria acontecendo e as coisas podiam estar bem mais tranquilas.
Hugh afastou os pensamentos culpados da mente, depois bateu os lençóis com força e
despiu-se, mergulhando o corpo nu sob uma grossa cobertura de lã. Rolou na cama pelo resto da
noite, sem pregar o olho por um segundo sequer.
Pouco antes de se levantar, resolveu descarregar as energias contidas nos últimos dias.
Fechou os olhos e começou a massagear seu pau. De início, não pensara em nada e por isso nada
acontecera.
Ficara irrequieto e indignado.
Começou a pensar em Aila, seu corpo nu sendo dominado e gemendo sob seu toque, mas
o membro entre seus dedos pouco deu sinal de reagir, irritando-o mais ainda.
Hugh se sentou na cama, frustrado. Ele estava ficando louco, nem se masturbar mais
conseguia. E de quem era a culpa?
Margareth.
Margareth.
E Margareth.
Estava casado há dois dias e ela já o estava deixando maluco.
Pouco a pouco, a imagem da loura rebelde surgira diante de sua visão. Primeiro com o
vestido pesado, andando de um lado para o outro, farfalhando as anáguas e balançando os braços
com graça.
Contrafeito, Hugh sentiu o começo de uma ereção.
Poderia parar ali, dizendo a si mesmo que não sentia nada pela jovem condessa, que
pouco se importava com seu corpo jovem e quente, mas não estava com vontade de mentir, nem
mesmo para sua própria consciência, então, apenas se rendeu e deixou que tudo viesse com força
total.
Primeiro foi a lembrança da noite do casamento, a valsa quente e devassa, a conversa
sobre o espartilho, a troca de olhares, a viagem até a casa de campo em Surrey, as mãos dela
enganchadas às suas, o sono cansado dela na carruagem.
E depois Margareth nua, os seios fartos e firmes, os mamilos rosados e grandes que
seriam capazes de encher sua boca e o arrepio que percorreu a pele de pêssego dela quando ele a
tocou.
Logo, antes que a memória da confusão estragasse o momento, Hugh começou a
fantasiar, imaginando o que poderia ter feito com Margareth na noite de núpcias ao invés do que
realmente aconteceu.
Teria passado seus dedos longos pelo corpo dela, várias vezes. Depois deixaria os dedos
passearem por sua nuca e envolveria a cabeleira loura desde a raiz, enganchando-os como uma
garra de urso.
Os cabelos louros ficariam presos entre seus dedos, sedosos e ele mergulharia o nariz,
apreciando o cheiro gostoso que exalavam.
Puxaria sua cabeça para junto de seu rosto e beijaria seus lábios carnudos até que ela
ficasse sem ar. Quando estivesse ofegante, ele a deitaria na cama e abriria suas pernas.
Apreciaria seu corpo nu por algum tempo e depois mergulharia no tufo de pelos claros que
cobriam a parte mais feminina dela.
Imaginou-se, fazendo-a gemer e arranhando suas costas. Imaginou-a chamando seu nome
e pedindo mais e ele a penetrando, seguindo seu ritmo com os quadris e os dois chegando juntos
ao ápice.
Quando abriu os olhos, havia ejaculado sobre os lençóis.
Quando Hugh desceu para o café, o dia já estava a todo vapor na propriedade. Os criados
andavam de um lado para o outro, alvoroçados, carregando caixotes de madeira, malharias,
baldes cheios de água e panos. As criadas caminhavam a passos rápidos, executando variadas
funções. O que quer que tivesse passado por ali, estava deixando-as como formigas operárias.
Hugh parou no meio da escada, observando abismado a movimentação frenética. Margareth,
pensou.
O conde sentou-se à mesa com um olhar confuso. Margareth juntou-se a ele instantes
depois, ainda envolvida em seus afazeres. Deu ordens à senhora Garden e pediu a Mady que
mandasse chamar Aila. Quando se sentou, parecia radiante e Hugh não pôde deixar de cogitar se
ela tinha ou não ouvido o suposto ato selvagem com a criada.
— Bom dia — Margareth falou, dando um sorrisinho simpático que não deixava
transparecer em nada seus sentimentos reais.
Talvez ela não tivesse ouvido.
— Vejo que acordou cedo e colocou a casa a funcionar como uma locomotiva.
— Colocar uma casa dessa proporção nos eixos não é tarefa fácil, ainda mais quando se
tem um evento a preparar — ela parecia satisfeita.
Dessa vez quem sorriu foi Hugh.
— Acho que em breve teremos que redecorar a casa inteira, mas por enquanto não temos
tempo, então farei o meu melhor. — Margareth declarou.
— Fico muito satisfeito com isso.
— Ótimo.
Mady apareceu na porta seguida por Aila, as duas curvaram-se e baixaram suas cabeças
para o chão.
— Vossa Graça — Mady falou.
Margareth virou bem devagar o corpo esguio e sorriu para sua criada. Gostava de Mady,
mas já odiava Aila. Uma conta simples. Faria o impossível para tratar aquela maldita abusada
como merecia, ou ainda pior e trataria Mady como merecia, com a cordialidade que ela sempre
nutrira pelas pessoas em geral.
—Mady, quem costuma recolher os penicos pela manhã?
Hugh engasgou com o chá.
— Eu ou alguma outra criada. A senhora Garden costuma determinar as nossas funções.
— Pois informe a senhora Garden que a partir de hoje, a responsável por esta tarefa será a
Aila. Estão dispensadas.
As duas jovens fizeram uma mesura e saíram.
— Ah, mais uma coisa, Aila. Certifique-se de limpar também os penicos da ala das
criadas.
Com certeza ela ouviu. Hugh teve certeza.
Aila arregalou os olhos, Mady ficou muda e o conde engoliu em seco. Era óbvio que ela
ouvira o barulho durante a noite passada e, se não podia se vingar dele, então, vingava-se da
criada. Pobre Aila, pensou Hugh por alguns instantes.
Mas os pensamentos em Aila foram afastados pelo sorriso meigo que Margareth deu-lhe
ao tornar a se virar para a mesa. Apesar do sorriso, Margareth só conseguia pensar em vingança.
— Amanhã a senhora Garden providenciará para que a lista de compras seja enviada às
devidas lojas em Londres. Você acha que devemos enviar convites antecipados dou será um
evento menos formal?
— Não sei — Hugh respondeu com sinceridade.
— Neste caso, acho melhor enviarmos. Depois pedirei à senhora Garden para conferir a
lista de convidados com você.
— Está bem.
Hugh estava atônito. Margareth era uma mulher linda, de olhar juvenil e meigo, mas por
dentro era um mistério, parecia dona de um ódio ferrenho, capaz até mesmo de humilhar uma
criada. Jamais imaginara que ela poderia ser aquele tipo de pessoa.
— Por que você fez isso?
— Por que fiz o quê?
— Por que chamou a criada aqui para dizer que vai limpar penicos?
— Ah! Desculpe, sei que devo passar essas coisas para a senhora Garden, mas ela está
muito ocupada com os afazeres da recepção.
— Não se faça de tola Margareth. Você fez de propósito.
— Agora você vai querer se meter nos afazeres domésticos também?
— Mas que diabos mulher, que tipo de pessoa é você? Uma megera?
Margareth eriçou um dedo na direção dos olhos verdes do conde.
— Escute bem, Hugh Ruthenford. Que esta seja a última vez que me chama de megera.
As criadas são minhas, eu faço o que bem entendo com elas. Mas será que nem mesmo pela
manhã podemos comer em paz?
— As criadas são suas, coisa nenhuma!
— Como não? Por acaso não sou a senhora dessa maldita casa?
— Não pragueje!
— Por quê? Você pode e eu não?
— Exatamente.
— Você é completamente louco.
— E você é uma abusada.
— A única coisa que fiz foi o meu dever, cuidar da casa do meu marido, minha casa.
— Minha casa — ele retrucou imediatamente, birrento como um menino provocado.
— Por que se casou comigo, conde? Se esta casa é sua, se as criadas são suas, se todo o
mundo é seu, por que você precisa de uma esposa? Pelo jeito não há lugar nesta casa para mim.
— Margareth ergueu-se, fazendo menção de deixá-lo sozinho.
— Eu não disse isso.
— Se a minha presença é tão desagradável, se tudo o que faço o atinge, se você queria
aquela criada imunda na sua cama, por que não a desposou ao invés de mim?
— Você só pode estar brincando. Como ousa dizer uma coisa dessas?
— Não me venha com essa conversinha de que sou o conde e blá blá blá... Toda Londres
já sabe que você é excêntrico. Acho que ninguém se importaria se tivesse se casado com a criada
ou mesmo com uma égua.
— Por que você não é como as outras mulheres?
— E por que eu deveria ser?
— Porque é o certo.
— Vamos começar com essa conversa outra vez? Acho que o senhor tem uma certa
afinidade com a violência contra as mulheres e não é a pessoa mais sensata para me dar lição do
que é certo ou errado.
— Eu deveria ter escolhido outra noiva.
— É, deveria mesmo... — Margareth silenciou-se por um momento, o rosto tomado por
um cansaço.
Hugh já achava que a discussão estava terminada quando um sorriso maroto brotou nos
lábios da condessa, um sorriso nada amigável.
— Aposto que Betsy espinhenta seria a esposa perfeita.
— Quem?
— Betsy espinhenta. Filha dos Rockfeller. Cabeleira de leão, espinhas por todo o rosto,
grande volume... — Margareth encheu as bochechas de ar e abriu os braços fazendo o contorno
de um círculo por seu corpo.
Hugh soltou uma gargalhada.
— Acho que o dote dela deve ser bem melhor que o meu — continuou ela.
— O pai dela de fato me fez uma proposta tentadora — Hugh admitiu, bebericando o chá.
— Aposto que agora você está arrependido, tenho certeza de que ela adoraria seus
beliscões e palmadas.
Hugh levantou os olhos verdes na direção dos dela e deu um sorriso charmoso, por dentro
Margareth sentia-se em êxtase. Não apenas por enfrentar o marido e pelo riso natural e honesto
dele, mas também por estar se divertindo pela primeira vez.
Aquela conversa absurda, a briga, tudo a levava a crer que ele era uma fera, egoísta e
brutal, mas aquele sorriso charmoso, aquele olhar... bem, aquilo dizia algo diferente. Algo em
que ela queria se apegar.
— Certamente ela faria tudo que eu mandasse.
— Imagino que sim. Ela é bem simpática para ser honesta, sempre tenta agradar, mas se
torna entediante depois de poucos instantes.
— Você por outro lado...
— Eu deveria ter nascido um homem.
Hugh se engasgou, cuspindo o chá para todo lado. Limpou os lábios com o lenço e lançou
um olhar confuso para ela. Nunca vira uma mulher falar daquele jeito e já tinha visto muitas
mulheres, inclusive as de baixa moral.
— Sempre gostei de correr, montar pôneis, subir em árvores e esfolar meus joelhos. Acho
que sou mesmo uma péssima dama.
— Jamais imaginaria isso de você. — Os olhos devoradores estavam lá outra vez e eles
varreram o corpo de Margareth, fazendo-a corar e esquentar do mesmo jeito que aconteceu
quando ele apertou seus seios.
Até que ela estava gostando da conversa. Era sincera sobre si mesma e ele parecia
apreciá-la. Mas esquecer o que ele a fizera passar nos últimos dias era um risco que poderia ser
fatal e ela tratou de se recompor tão logo lembrou-se dos gemidos da maldita criada.
— Bom, se me der licença vou para o meu quarto.
— Por quê? — Hugh pareceu alarmado.
— A casa é sua, lembra-se? Se não tenho nada a fazer o melhor que faço é me recolher e
não atrapalhar. Passe bem o dia, esposo.
Margareth saiu apressada, deixando Hugh com um nó na garganta. Não sabia bem o que
estava sentindo, se culpa por fazer a esposa sentir-se mal em sua própria casa, ou se vitorioso por
fazê-la pôr-se em seu devido lugar. Mas o que está acontecendo com você, Hugh? Pensou. Será
que está amolecendo?
— Você tem um plano e ela é apenas parte disso — ele falou consigo mesmo, depois
mergulhou um biscoito no chá e o comeu. — Isso e sendo um idiota completo, é claro.
É claro que Margareth não ia passar o dia todo remoendo trancada no quarto. Esperaria
apenas o conde sair para qualquer coisa que fosse e então voltaria a dominar a casa, antes que
perdesse as rédeas da criadagem e de Aila, que por sinal deveria estar furiosa. Teve o que
mereceu, pensou Margareth. Esse é o castigo para quem se deita na cama do marido alheio.
Assim que pudesse, que se sentisse um pouco mais confiante trataria de despachar aquela
maldita ruiva para bem longe. Não podia se livrar do marido, mas a criada era outra história.
Margareth se sentia mesmo uma jovem de coragem e tinha orgulho de defender sua
honra, mesmo que de uma forma nada convencional. Se fosse um homem, talvez tivesse
chamado Aila para um duelo à moda antiga, mas como era uma dama e nem mesmo poderia sair
aos tapas com a criada, tinha que armar um jeito de fazê-la entender quem era a senhora da casa.
E de mostrar a Hugh seu devido lugar.
A senhora Garden andava de um lado para o outro bufando. Margareth desceu as escadas
animada, logo após Mady avisá-la da saída do marido. Segundo ela, ele fora a um encontro com
homens do parlamento.
Margareth dera de cara com um olhar tenso da senhora Garden logo no sopé da escada,
mas ela estava de bom humor e sorriu para a governanta, tentando ser gentil, a jovem tinha um
espírito bondoso, apesar das pequenas maldades que vinha provando ser capaz nos últimos dias.
— Senhora Garden, pelo amor de Deus, abra um sorriso ou do contrário vai ficar velha
rápido demais.
A senhora Garden foi pega de surpresa por aquele comentário. Era muito incomum que
as ladies nobres e mulheres da alta classe tivessem mais do que um contato formal com os
empregados, mas essa menina parecia se importar bem pouco com as convenções e além de
deixar a casa toda em polvorosa, tinha o dom de surpreender a todos.
Margareth terminou de descer as escadas com dois pulinhos, passou os braços gordinhos
sobre os ombros fortes e duros da senhora Garden e a impeliu para a cozinha, soltando um
risinho meigo e jovial.
— Acho que a senhora precisa de um descanso e de um chá.
A senhora Garden não fazia ideia do que responder. Margareth era surpreendente, capaz
de encher cada cômodo do imenso casarão com seu sorriso, seu perfume, seus modos graciosos e
sua voz aveludada. Era uma menina mimada, de fato, mas havia uma doçura nela que não parecia
pertencer à alta classe. A governanta sentiu-se comovida com o gesto.
—Mady, sirva um bom chá para a senhora Garden e aqueles biscoitos amanteigados que
derretem na boca. Prepare uma bacia com água quente para descansar os pés dela.
Todos os criados ficaram atônitos, mas ela não parou por ali, sentando-se perto da
governanta e roubando um biscoito para enfiar na boca.
Enquanto isso, Hugh preferiu almoçar no clube com alguns outros nobres que estavam
passando alguns dias no campo, fumando charutos e falando sobre política, não que tivesse algo
importante a fazer, geralmente a nobreza não fazia mesmo nada, mas precisava começar a
colocar seus planos em prática, e estreitar relações com alguns daqueles senhores era inevitável.
O problema é que seus pensamentos ainda estavam em casa, em Margareth e seu jeito de
confundi-lo.
— Então, Hugh meu velho, pensei que não o veríamos aqui tão cedo... — falou Charles
segundo, filho do Duque de Paxton, um homem de nariz adunco, bigode feio e olhos imensos.
Um homem nada agradável e por quem Hugh não tinha a menor consideração.
— Tenho alguns assuntos que não podem esperar.
— É isso, ou será que você está velho demais para sua jovem esposa? — o homem
gargalhou, provocando risadas alvoroçadas nos demais.
— Não tão velho quanto essa sua barriga está grande... — Hugh provocou, já que tinha
apenas trinta e cinco anos e um corpo atlético, ao contrário da maioria dos nobres, inclusive os
Paxton.
Charles Paxton segundo era um maldito arrogante e seu pai um dos homens que estavam
na lista negra de Hugh. É claro que provocar o futuro duque de Paxton poderia ser arriscado, mas
Hugh tinha o temperamento forte e todos o conheciam o suficiente para saber que uma
provocação direcionada a ele poderia resultar numa resposta desagradável ou numa rinha de
homens. E apesar de ser um conde, Hugh era conhecido por ter punhos bons de briga, quase
como um desses homens de baixa estirpe que brigavam por dinheiro.
O filho do duque tinha menos de quarenta anos, um par de olhos de peixe morto, uma
papada sobre o pescoço e pernas que jamais se ajustavam às roupas elegantes e formais que ele
usava. Era o primogênito do duque.
Não que esse Paxton tivesse cometido algum crime contra Hugh, mas era filho do duque.
Se um teria de pagar, o outro também. Se um recebia o título do outro, também deveria receber
seus pecados e Hugh trataria de cobrar, tanto o pai quanto o filho.
Exatamente como Hugh imaginara, o almoço fora desagradável. Charles era o tipo de
nobre em que o povo adoraria colocar as mãos, era cruel com seus criados, frio com as pessoas e
se considerava tão importante quanto a própria rainha e seu consorte. Hugh fizera um tremendo
esforço para suportar aquela presença pedante.
O outro acompanhante do almoço, o jovem Leonard, por outro lado era o carisma em
pessoa. Com feições aristocráticas e maneiras impecáveis, depois de Hugh casar-se, havia se
tornado o solteiro mais cobiçado pela sociedade. De família nobre e próspera, cujas ligações
políticas e familiares se davam com o lado do consorte da rainha, não havia mãe que não
sonhasse em casar sua filha com ele.
Mas Leonard não parecia intencionado em se casar e gostava muito do que a vida podia
lhe proporcionar enquanto solteiro. Era jovem e ansiava em desfrutar da juventude. Hugh nada
tinha contra o garoto, achava-o um pouco imprudente, mas muito divertido, era sempre curioso e
estava sempre disposto a uma boa história.
Entretanto, tê-lo como aliado significava muito mais do que uma simples amizade,
significava um voto no parlamento. Um dia, o jovem assumiria o lugar do pai e Hugh poderia
precisar de sua ajuda para destruir aqueles que lhe deviam. Ele tinha algumas ideias de como
estreitar laços com o rapaz, mas tudo deveria vir com o tempo, sendo a recepção que daria em
sua casa uma delas.
Dando outra tragada no charuto e soltando a baforada em seguida, pensou: A derrocada
ainda está por vir.
— De fato, meu caro Leonard, se eu não tivesse obrigações reais, estaria em casa —
Hugh sorriu.
O rapaz arqueou as sobrancelhas com curiosidade.
— Sabe o que é melhor do se ter uma bela e linda jovem esposa à sua espera? —
perguntou e Leonard sorriu, curioso.
— O quê? Seios?
— Não seja tolo, isso você encontra em qualquer lugar.
Hugh percebeu que Charles prestava atenção.
— Quando você se casar, escolha uma bela mulher, que o ame e se derreta para você,
então entenderá — Hugh sorriu, vendo a decepção formar-se no rosto de Charles.
Os cavalheiros permaneceram em silêncio por alguns instantes.
— Ouvi alguns boatos... — falou Charles segundo, baforando seu charuto.
— Boatos?
— Sobre um certo casamento não ter sido consumado ainda... — o pedante provocou. —
Imaginem o escândalo...
Com toda certeza, alguma criada contara a outra e a história já havia se espalhado por
toda Londres. Além de humilhado em casa, agora também no clube. Margareth estava se saindo
um prejuízo maior do que ele poderia imaginar.
— Bom, não consigo imaginar como esse coitado deva se sentir... — falou Hugh, um
sorriso amarelo no rosto.
— Um casamento não consumado? — Leonard questionou. — Não sabia que isso era
possível.
— Dizem que algumas senhoras são tão frias que não deixam seus maridos tocá-las nem
depois do casamento — Charles falou com um olhar maroto para Hugh.
Hugh queria esganá-lo, mas manteve seus nervos e tentou pensar em algo que não fosse
descortês demais para dizer. Não podia perder a compostura e não era dado a expor suas
intimidades, fosse com quem fosse.
— Pensei que fofoca fosse coisa de senhoras...
Leonard gargalhou e Hugh o acompanhou.
— Bom, senhores, preciso me retirar — falou, soltando um risinho insinuante. — Sabe
como são os primeiros meses de casamento são ocupados.
— Hugh, por que você não viajou em núpcias? — Leonard questionou antes de se
despedir.
— Meu sogro precisa dos meus conselhos em alguns assuntos, e Margareth gosta muito
de Surrey Hall. Mas espero que em breve possa dar à minha esposa a viagem que ela merece.
— Por acaso estão sem dinheiro para a lua-de-mel? — Charles provocou, olhando para os
olhos verdes furiosos de Hugh. — Ou será que sua esposa só não quer correr o risco de ficar
muito tempo sozinha com você?
Aquilo era mais do que uma afronta. Era um desrespeito completo. Jamais um homem
entraria num assunto como aquele e jamais um homem desrespeitaria o outro daquela forma.
Hugh tinha todo o direito de acertá-lo ali mesmo, seria justificável, mas ao invés disso, engoliu
em seco para não voar aos socos e pontapés para cima daquele maldito. Tinha de ser frio e
calculista quando o assunto se tratava de seu segredo.
Pensou por um instante e então voltou a sentar-se.
— Sabe Leonard, acho muito indelicado falar sobre esse tipo de coisa, mas como você é
meu amigo vou contar como foi a minha primeira noite com minha esposa.
Hugh começou a narrar em detalhes, sem o menor pudor, como se tudo fosse normal.
Falou do corpo perfeito de Margareth, de como ele estava viciado em suas curvas, mas evitou os
detalhes mais diretos para não expor a esposa. Apesar de tudo o que vinha acontecendo, ele era
um cavalheiro.
Falou da inexperiência e da grata surpresa dele ao perceber o quanto ela é perfeita, e de
como ela ficara ansiosa quando ele a despiu, disse tudo o que fantasiara naquela manhã, sem
dizer exatamente nada, quase como um contador de histórias que envolve seus ouvintes com um
pouco de enrolação.
Quando acabou sua narrativa, Leonard estava constrangido e tentando esconder uma
ereção juvenil, Charles estava estupefato e Hugh com vontade de trucidar alguém.
Mesmo depois, no meio do caminho de volta para Surrey Hall, ainda tinha os punhos
cerrados e os nervos irados, a vontade de espancar o aspirante a duque era tremenda.
Mas o que realmente o preocupava agora é que teria de convencer Margareth a ser a
melhor das esposas com ele diante daqueles malditos porcos, principalmente dos Paxton. Se bem
que não convidaria Charles segundo, só o duque e sua esposa enfadonha. E isso porque era
absolutamente praxe para a alta sociedade, do contrário, não olharia nem na cara deles.
Quando chegou, se trancou na sala de fumar e ficou lá sentado em silêncio e no escuro.
Precisava pensar e ali era o melhor lugar que conhecia para isso.
Só não queria pensar nela, a esposa que o deixava louco.
Margareth estava sentada perto da janela, a lamparina iluminando o livro de Dickens que
presente de Hugh. Quando ele perguntara a ela o que poderia lhe regalar de casamento além das
coisas habituais que um homem pode ofertar como joias, ela, para seu espanto e o de toda
família, pedira um livro de Dickens.
— Entenda, Vossa Graça, meu pai não me deixa ler muito, ele acha que as mulheres
devem se ocupar com coisas mais adequadas, então se puder escolher, gostaria de um livro de
Dickens, ouvi dizer que é um bom autor.
— Mas qual deles a senhorita gostaria? — Hugh perguntara, instigado e fascinado pela
moça. Estava preparado para ouvir algo como: “o que o senhor achar melhor” ou “uma joia”
ainda seria plausível, mas ela pedira um livro e ele ficara bestificado.
— Ainda não li nenhum livro dele, então escolha aquele que mais o agradar. Ficarei
muito grata e vou lê-lo inteirinho.
Pensara tanto em Margareth nos dias que antecederam a cerimônia, que na hora de
escolher um livro para presenteá-la, não conseguiu decidir o que poderia ser ou não adequado
para uma jovem como ela, linda, inteligente e de boa família.
Lembrou-se então do que seu pai sempre dizia: “Uma pessoa instruída, Hugh, é uma
pessoa capaz de pensar por si mesmo”. No dia seguinte mandara entregar um baú na casa dela
com vários livros do autor e outros que ele mesmo havia lido quando era mais novo e que pegara
de sua própria biblioteca em Surrey Hall, a casa que tanto amava. No bilhete com a caligrafia
impecável dizia: “Você terá todos os livros que quiser”.
Naquele dia, Margareth sentira-se a mulher mais sortuda do mundo. Ela amava os livros
que ele lhe dera, e chegara a pensar que poderia amá-lo também, mas as coisas iam de mal a pior
e começava agora a achar que acabaria morta pelas mãos do marido insano ou presa por matá-lo.
Aila bateu na porta e entrou. Fez uma mesura silenciosa e esperou, com os olhos baixos,
que Margareth autorizasse sua fala.
— O que você quer?
— É que o conde me mandou aqui para prepará-la.
— Preparar-me para quê?
O sotaque cadenciado da criada titubeou um pouco, então ela se aproximou e disse:
— Ele virá ao seu quarto agora, me mandou deixá-la pronta.
Margareth não disse nada. Se o marido estava indo ao seu quarto para tomá-la, por pior
que pudesse ser, era sua obrigação como esposa ceder.
Seria também uma vitória, Margareth não implorara e ele é quem acabara cedendo. Se ele
fosse bruto, ela o acertaria com o candelabro e ponto final. Se fosse carinhoso, ela seria uma boa
esposa.
Se não gostasse do que aconteceria, faria como a mãe ensinara, fecharia seus olhos e
esperaria pelo final. A única coisa com a qual não se conformava era ele ter mandado aquela
maldita criada para prepará-la. Ele era mesmo um arrogante. Com um aceno um pouco
contrafeito, Margareth aceitou que a criada se aproximasse.
Aila tirou o camisolão de linho macio de Margareth, penteou seus cabelos, passou gotas
de perfume por seu corpo e a fez deitar-se de olhos fechados. Colocou um pano cobrindo seus
olhos e disse que as ordens do conde eram para que, em hipótese alguma ela os abrisse.
Margareth protestou um pouco, mas a criada dera de ombros, dizendo que só obedecia ao conde.
Margareth engoliu em seco, fechou os olhos, sentiu o tecido grosso comprimindo-os e
ficou em silêncio.
Alguns minutos depois, um par de mãos afastou suas pernas bem devagar. Um dedo
percorreu o contorno de sua intimidade, roçando de leve no tufo de pelos. Margareth sentiu um
arrepio percorrer a espinha e esquentar o ponto sensível. Não sabia se isso era correto, mas a
sensação do marido tocá-la era boa, tinha de admitir.
Algo molhado tocou-a entre as pernas e ela arquejou. Será que era o que ela estava
pensando? Será que era mesmo o que estava imaginando? À medida que os movimentos estavam
se tornando mais fluídos, ela sentia uma queimação intensa.
E teve certeza que eram os dedos de Hugh. Ela arquejou, levantando os quadris. Se aquilo
era consumar o casamento, ela queria mais, muito mais. Queria se jogar nos braços do marido e
pedir que ele colocasse dentro dela seu membro grande. Será que ele estava ereto como no dia do
casamento?
— Hugh... — ela gemeu. — Posso tirar a venda?
Ele não disse nada e isso a desapontou um pouco, mas ela não questionou, ele estava
sendo gentil e tocando-a de leve, isso era um bom começo.
Até pensara em abrir os olhos, mas as sensações de prazer a estavam deixando tonta e
extasiada ao mesmo tempo. Além do que, ele não queria que ela o visse fazendo aquilo. Talvez
sentisse vergonha ou talvez fosse mais um de seus joguinhos.
Margareth rendeu-se ao prazer do marido massageando o ponto mais secreto e sensível
do seu corpo. O movimento frenético a estava deixando louca, ela sentia um líquido fluindo da
parte interna e um desejo intenso de ser possuída por ele.
— Hugh, Ah, Hugh. — Gemeu.
O dedo continuou massageando mais e mais, mas de repente, ela sentiu que algo não
estava certo, o toque não parecia o mesmo de Hugh, não havia o jeito rude. Com o coração
palpitando forte, ela tentou se controlar, começando a sentir o suor brotar de suas costas.
— Hugh... Conde...?
— Mas o que diabos está acontecendo aqui? — a voz de Trovão de Hugh a fez abrir os
olhos em um rompante.
Hugh estava parado na porta de ligação do quarto, a expressão de confusão, fúria e
incredulidade misturadas no rosto bonito.
Margareth ergueu-se com dificuldade na cama, tirou o pedaço de pano de seu rosto e
gritou ao ver a cabeleira ruiva de Aila parada há dois palmos de pelos no meio de suas pernas. A
criada puxo o dedo e sacudiu no ar, rindo com escarnio de um jeito perturbador.
Não, aquilo não era possível.
Margareth sentiu o estômago embrulhar e uma vertigem tomar conta de sua visão.
— Mas eu pensei que fosse você... como? Mas que tipo de jogo é esse seu? — ela falou,
olhando com terror para Hugh.
Aila gargalhou.
— Gostou, vossa graça? — ela perguntou para Margareth que teve a visão turvada pela
sensação de pânico.
Hugh entrou como um furacão no quarto, agarrou a criada pelos braços e sacudiu com
força.
— Como você ousa?
Atordoada, Margareth pensou que ia desmaiar. Quando Hugh se aproximou, ela gritou
em choque.
— Não toque em mim. — Ela saiu correndo, nua.
Ao entender o que acabava de acontecer, Hugh deu uma bofetada em Aila que caiu a pelo
menos cinco passos de distância, iniciando um choro lamurioso, tentando justificar seu ato como
uma prova de amor, como prova de que a condessa não o merecia e não poderia ser boa para ele.
Depois de berrar com a criada e ameaçá-la, ele apanhou uma manta grossa de cima da
cama e saiu correndo para alcançar Margaret. Ela estava desvairada e poderia estar correndo em
qualquer canto da imensa propriedade. Provavelmente acabaria se machucando naquela
escuridão ferrenha e no frio cortante.
Além disso, ela estava nua.
Hugh sentia o coração acelerado enquanto apanhava uma lamparina a óleo e começava a
descer os degraus da entrada principal. Pensou em chamar os criados, mas imaginou o espanto
que causaria caso a encontrassem vagando pela propriedade, pálida e nua sob a lua imensa que
banhava com um brilho de prata todo o verde rasteiro dos primeiros pátios.
Por um bom tempo, ele correu feito louco pelos jardins e descampados da propriedade.
Não podia deixar que Margareth passasse a noite sob o frio pungente que seria capaz de extinguir
a vida de uma jovem tão despreparada.
Não a encontrou em canto algum. Deu a volta por um jardim lateral e atravessou por
entre um pequeno labirinto de flores. Olhou para a esquerda e viu a mata fechada. Não! Pensou.
Ela não pode ter ido por ali, não teria coragem. Mesmo assim, embrenhou-se na mata densa e
começou a chamar alto pela esposa.
— Margareth, por Deus, onde você está?
Não demorou para avistar uma silhueta quase translúcida de tão pálida, os cabelos louros
esvoaçando e um visível tremor. Hugh aproximou-se devagar, ouvindo os soluços fortes que
vinham da esposa. Tentou fazer o mínimo de barulho possível, mas pisou em um galho seco e a
sobressaltou. Margareth virou-se, sem se levantar do chão. Os olhos vermelhos de chorar e os
lábios levemente arroxeados pelo frio. Estava fora de si.
— Meu Deus, Margareth! — ele correu para envolvê-la com a manta. — Procurei você
por toda parte.
— Por quê? Por que você me humilhou assim?
— Eu não fiz isso — ele respondeu, tentando puxá-la para os seus braços para aquecê-la.
A princípio Margareth lutou, esbofeteou o marido e o arranhou, mas não demorou para
perder as forças e deixar a cabeça pender sobre seu peito forte. Desmaiou antes que ele
conseguisse dizer mais alguma coisa.
Gelada. Ela estava muito fria e os lábios carnudos estavam arroxeados.
Hugh passou os braços fortes em volta do corpo nu, alçou-a para junto de seu peito e a
cobriu com a manta. Caminhou com Margareth nos braços até à entrada dos fundos da mansão,
empurrou a porta e quando não cedeu, acertou-a com um pontapé, causando um baque forte que
a fez se chocar com a parede.
— Senhora Garden! — berrou, subindo as escadas em desespero ao ver que a esposa já
não reagia mais. — Senhora Garden, por Deus!
A senhora Garden apareceu seguida por mais três criados, sendo um deles Mady, que
grunhiu em choque quando viu o braço de Margareth pender para o chão.
— Faça alguma coisa! — ele berrou outra vez, estava terminando de subir as escadas e
rumou para o seu quarto. — Ela está congelando.
A senhora Garden subiu rapidamente os degraus, fechando o roupão de lã e escondendo o
corpo esguio. Com ela vieram os criados. Hugh colocou Margareth sobre os lençóis e a cobriu
com todas as cobertas que tinha na cama.
— Rosco, aumente o fogo da lareira — a senhora Garden tomou conta da situação. —
Mady, traga-me uma bacia com água quente e toalhas limpas. David, vá para a cozinha e peça à
senhorita Livenhows que faça chá forte.
Todos obedeceram imediatamente. Hugh que não conseguia pensar claramente, andava
de um lado para outro como uma fera ensandecida.
— Pelo amor de Deus, senhora Garden, se apresse.
— Talvez seja necessário chamar o médico, amo.
A velha senhora Garden cuidou por horas a fio para que a condessa recuperasse a
temperatura do corpo. Embora seus pensamentos perguntassem o que levaria uma jovem com
vida tão boa a sair correndo como louca pelo frio, não ousou dizer uma palavra sequer, afinal,
aquela gente nobre sempre tinha alguma esquisitice.
Ela gostava de Hugh, o vira crescer e conhecia todos os boatos que atormentavam sua
família, sabia também que apesar do jeito rude e nada convencional ele era um bom homem e
estava de fato preocupado com a jovem com quem se casara.
Hugh continuou ali, andando de um lado para o outro.
Quando Margareth acordou, o corpo estava tão quente que parecia estar em chamas. Ela
não conseguiu se mexer devido à grande quantidade de cobertores e mantas que estavam
empilhadas em cima de sua silhueta nua. Sentia um gosto amargo na boca e o estômago roncava,
mas fora isso, nenhum mal-estar ou ferimento, além da dignidade humilhada, é claro.
Hugh estava dormindo ao seu lado, meio sentado, com as costas sobre uma pilha de
travesseiros fofos de penas e uma mão pousada sobre ela.
Margareth olhou-o bem. Nunca tivera a oportunidade de observá-lo com tanta precisão e
de tão perto. Era incrível como, percebendo os detalhes, ele podia ser ainda mais bonito e
selvagem. Com um queixo quadrado e a barba por fazer, sem aquela moda ridícula de
bigodinhos ficava ainda mais atraente. As sobrancelhas grossas se ajustavam sobre um par de
cílios longos. A boca carnuda no meio e mais afilada nos cantos era muito sedutora e este foi seu
último pensamento, antes de voltar a cair em sono profundo.
Por três dias Margareth não saiu do quarto, fazendo suas refeições na cama e com um
silêncio perturbador. Hugh não a perturbara, respeitando seu momento e necessidade de espaço...
agora, estava decidida a tomar as rédeas de sua vida.
No quarto dia, levantou-se sentindo a raiva e a ira querendo explodir do peito. Tivera a
oportunidade de remoer e planejar por três dias. Mady bateu à porta e esperou segurando uma
bandeja com o desjejum da condessa. Margareth mandou-a entrar, falando num tom frio como a
noite que, por pouco, não a matara de hipotermia.
— Bom dia, Vossa Graça — Mady falou ao entrar no quarto de Margareth. — Trouxe o
seu café.
— Não será preciso, vou tomar meu café com meu marido...
Mady baixou a cabeça.
— O que foi?
— O amo foi para a cidade logo cedo.
— Tudo bem, deixe a bandeja aí e me ajude com o vestido.
Mady largou a bandeja sobre uma mesinha perto da lareira e apressou-se a tomar a roupa
da patroa nas mãos, com o maior cuidado. Margareth estava com um olhar gelado que colocaria
medo até no mais corajoso dos criados. Mady trabalhou em silêncio para deixar a condessa
impecável num vestido cuja manga mais justa a deixava elegante.
As flores pintadas por toda veste e o babado nos ombros eram um pouco demais, mas não
ousou comentar nada a respeito. Quando finalmente Margareth estava dentro de toda a
roupagem, ajeitou-se delicadamente diante da penteadeira e esperou que a criada a ajudasse com
o cabelo, prendendo-o num coque alto e deixando alguns cachos soltos.
A imagem que ela viu no espelho, ao final, era de uma jovem mulher bonita, inocente,
com lindos cachos sobre o colo, vestido de mangas bufantes um pouco mais justas e um olhar
azul... irado.
Margareth não tomou o café da manhã. Havia algo que queria fazer primeiro. Com toda a
elegância de que dispunha pelos anos de preparo, desceu a escadaria, vendo criado após criado
da casa curvar-se à sua passagem e abaixar os olhos em respeito. Quando entrou na cozinha, sua
postura autoritária não deixou dúvidas, era agora a dona da casa e ninguém jamais voltaria a lhe
faltar com o respeito.
Todas as criadas, inclusive a governanta, a senhora Garden, curvaram-se perante a
senhora de Surrey Hall. Margareth caminhou confiante até aquela que era seu alvo. Aila estava
parada diante de um imenso forno à lenha, os olhos voltados para o chão e as mãos sobre o
avental. A dona da casa não tinha a menor ideia de porque o marido a tinha mantido ali depois de
tudo que aconteceu, mas ia, ela mesma, resolver a situação.
— Olhe para mim! — Margareth ordenou.
Aila não se mexeu.
— Eu mandei olhar para mim!
A criada levantou os olhos bem devagar, num misto de raiva e medo. Em sua boca um
pequeno ponto vermelho escurecido, com o sangue coagulado da bofetada de Hugh. Margareth
ficou em silêncio por um instante, aspirando o cheiro da lenha crepitante e olhando com repulsa
para a ruiva, que não ousou desviar. Então, sem que a criada pudesse perceber a tempo,
Margareth meteu-lhe uma bofetada bem no meio do rosto. Aila grunhiu de pavor e cobriu a
bochecha avermelhada com as mãos.
— Agora, você já pode ir esvaziar os penicos.
Margareth virou-se, sentindo os nervos à flor da pele. Respirou fundo e saiu bem
devagar, perfilando entre os criados e esperando as reverências. Ninguém voltou a respirar até
que ela já estivesse longe dali.
Hugh estava quase ensandecido quando entrou na carruagem logo após o almoço. Parecia
um louco prestes a ter um ataque de nervos, com os cabelos revirados e os olhos vincados numa
expressão de ódio. Tudo em seu dia vinha dando errado, não, tudo em sua semana.
Não só as coisas com a esposa iam de mal a pior, como seus planos pareciam estar
definhando. Precisava encontrar uma forma de se aproximar daquele a quem desejava destruir
mais do que poderia querer qualquer coisa na vida. Mas todas as suas tentativas haviam sido
frustradas por Charles Paxton e o filho asqueroso.
Era como se aquela criatura horrenda estivesse sempre um passo adiante de Hugh. À
medida que a carruagem avançava, ele ia ficando mais e mais furioso, sem conseguir pensar
numa forma de derrotar de vez os malditos Paxton e aproximar-se de seu maior inimigo.
Quando entrou feito um furacão pela entrada principal e foi para a biblioteca, deu de cara
com Margareth vestida de forma espetacular, parada diante da janela, dando ordens a um lacaio.
O jovem criado estava em cima de uma escada, tentando desconectar a pesada cortina que
enegrecia o ambiente.
— Mas o que diabos você pensa que está fazendo na minha biblioteca? — Hugh berrou, a
voz de trovão pegando Margareth e o criado de susto.
Margareth pulou sobressaltada, pousando a mão no coração.
— Tirando as cortinas — respondeu depois de se recompor.
— Saia já daí moleque! — Hugh ordenou ao garoto.
O jovem criado começou a descer, sem jeito e com medo.
— Não saia! — Margareth esbravejou. — Essas cortinas precisam pegar sol, estão
empoeiradas.
O garoto imobilizou-se, sem saber o que fazer.
— Eu mandei descer. Mande-o descer imediatamente.
— Você ouviu o conde, desça daí e saia — Margareth dispensou o garoto com um gesto
de mão.
O menino desceu e saiu apressado, em meio a reverências desajeitadas e assustadas.
— Não compreendo — Margareth falou, deixando o corpo cair sobre a cadeira em frente
à mesa.
— O que é que você não compreende?
— Não entendo por que você deseja ter uma esposa.
— Mas era só o que me faltava — Hugh crispou os olhos verdes diretamente focados nos
dela.
— Vou para o meu quarto — Margareth saiu, um misto de fúria e frustração plantado no
rosto. Estava tão cansada daquilo tudo, ainda mais depois de ver que Aila ainda estava na
propriedade, depois de tamanho desrespeito, ele ainda a mantinha por perto.
Hugh afundou na poltrona e ficou em silêncio, os nervos em frangalhos. A senhora
Garden bateu à porta e aguardou. Quando finalmente Hugh permitiu sua entrada, ela depositou
sobre a mesinha perto do sofá, no centro do aposento, uma bandeja com chá e biscoitos. Ficou
parada olhando para Hugh.
— O que foi?
— O senhor precisa de mais alguma coisa?
— Não.
— Com licença — ela começou a se afastar.
De súbito, a senhora Garden parou, virou-se para Hugh e falou:
— Sabe, é difícil para uma mulher se sentir em casa quando não lhe deixam cuidar de
suas responsabilidades.
Satisfeita, virou-se e saiu, sem reverência, sem nada. Hugh passou o resto do dia
pensativo.
Margareth, por outro lado, estava furiosa. Quando saíra do quarto, no final da tarde para o
chá, sentia-se ressentida e pouco amigável. Em poucos dias, sua vida se transformara em um
verdadeiro inferno e agora ela só pensava num jeito de escapar da vida a que seu pai a
condenara. Foi então que algo lhe ocorreu.
Novamente foi à cozinha. Suas visitas ao ambiente começavam a ser frequentes demais
para uma dama de sua nobreza, mas naquele momento, ela pouco se importava e só pensava no
que faria. Três criadas de idades mais avançadas, braços fortes e jeito ágil poliam a prataria,
exatamente como ela mandara várias horas antes. Margareth olhou-as com atenção e falou:
— Podem parar com isso — seu tom agora era cordial. — Não é mais necessário polir
nada. Desculpem-me pela perda de tempo.
As mulheres olharam-na confusas. Mandar que parassem era uma coisa, pedir desculpas
era muito estranho e provavelmente nenhuma delas nunca vira um nobre fazer isso, mas... aquela
condessa era tão diferente quanto o conde, o que será que ainda estava por vir daqueles dois? A
senhora Garden pigarreou e as três mexeram-se rapidamente, devolvendo os objetos aos seus
lugares.
— Eu gostaria de um chá — Margareth falou, por pouco não se esquecendo de seu plano.
— Vou mandar servir imediatamente.
Margareth esperou por algum tempo, olhando ao redor e observando os imensos potes de
mantimentos que se espalhavam pelas prateleiras.
— O que é isto?
— Mel.
— E isto?
— Sal.
Margareth sorriu, pegou o pote e caminhou até o bule em que a senhora Garden acabava
de despejar chá. Virou uma boa quantidade e mexeu bem calmamente, diante dos olhos
arregalados de pelo menos oito criadas e da senhora Garden, que fechou o cenho, mas não disse
nada.
Hugh sentou-se à mesa de chá em silêncio. Estava atormentado com os problemas que
tivera com Paxton no clube, mais ainda porque tudo indicava que não obteria êxito em seu plano.
Esperara muito por isso e não podia falhar. Estava ainda mais atormentado pelo que acontecera
debaixo do seu teto.
Tinha que dar cabo da criada, só não tivera tempo hábil ainda para isso. Pra piorar,
Margareth estava indiferente, e isso podia ser muito perigoso.
Antes de ela acordar, ele mandara retirar os candelabros do quarto dela, para evitar de
tomar uma pancada enquanto estivesse cuidando dela.
Tinham sido dias difíceis e ele só se ausentara porque fora muito necessário, talvez
acordar sozinha depois de tudo e não ter como conversar sobre o ocorrido fosse o motivo dela
estar daquele jeito, ou talvez ela só não o quisesse mais por perto. De qualquer forma, tudo
indicava que ele logo descobriria.
Margareth chegou em seguida, sentou-se logo após o criado puxar a cadeira e sorriu para
o marido, deixando-o um pouco sem jeito. Ao ver o sorriso da esposa, o conde retomou os
pensamentos de horas antes, quando a senhora Garden lhe dissera, ao seu modo, para não intervir
nos assuntos da esposa.
Provavelmente a velha senhora Garden tinha razão. Quem sabe se ele parasse de implicar
com ela, talvez ela começasse a agir mesmo como sua esposa. Se bem que ainda estava bastante
complicada a situação desde que Margareth quase perdera a vida por causa do frio naquela noite.
E havia Aila, ele ainda não sabia o que fazer com aquela maldita criaturinha louca. Não queria
um escândalo por expulsá-la e ela acabar espalhando o ocorrido para toda Londres, também não
queria ter que aturá-la e por isso, teria de dar um jeito logo no assunto.
Hugh bebeu o chá num grande gole, distraído com os pensamentos. O sal desceu
grosseiramente por sua garganta e ele se engasgou, cuspindo a mistura sobre a mesa.
— Mas o que é isso?
Margareth permaneceu em silêncio por algum tempo, depois olhou-o com seu semblante
mais sereno e falou:
— Esse tipo de coisa acontece quando não se tem uma senhora para comandar as criadas
como se deve.
— Senhora Garden! — Hugh berrou.
— Você pode ser o dono desta casa, mas eu, como sua esposa, sou a dona. Então você
deveria começar a pensar em não se meter nos meus assuntos...
Hugh bufou contrafeito, jogou o guardanapo de linho na mesa e saiu, batendo as portas às
suas costas. A senhora Garden chegou instantes depois, sorrindo. Aquela era mesmo a mulher
certa para colocar o garoto nos eixos. E a velha estava se divertindo muito com a disputa que
travavam. Dali sairiam frutos fortes, ela pensava enquanto retirava as coisas da mesa.
— Eu sou mesmo uma megera — Margareth falou num tom quase melancólico.
— A senhora me permite dizer uma coisa?
Margareth assentiu.
— Só uma coisa coloca os homens no lugar deles.
— E o que seria? — Margareth quis saber, ansiosa e angustiada pelo que poderia ser dito
pela velha senhora Garden.
— Aquilo que eles esperam conseguir quando vão ao quarto da esposa à noite.
Nenhuma das duas disse mais nada. Era óbvio que todos sabiam o que ocorria dentro da
casa entre os patrões e, apesar do senso de humilhação que a perturbava, ela sentia-se contente
por ter algum apoio naquele lugar inóspito.
Margareth saiu para dar um passeio pelo labirinto de flores, acompanhada de Mady com
quem conversava animadamente, mesmo que a criada falasse o mínimo possível e sempre com o
maior zelo.
Ela gostava da garota e sentia-se grata por ter sua companhia. Era tão anticonvencional
quanto interessante se relacionar com outra jovem com idade próxima da sua e Margareth não
estava com nenhum ânimo para manter as convenções. A solidão era demais e tudo que tinha
acontecido naquela noite terrível ainda remoía na sua mente.
Se expulsasse Aila poderia haver um escândalo e toda Londres faria chacota da sua
vergonha e da de seu marido... mas algo precisava ser feito, ela só não sabia o quê. Afastou os
pensamentos de todo terror que tinha vivido e voltou sua atenção para os arredores, incitando a
jovem criada a contar mais coisas de sua própria vida. Era bom esquecer, mesmo que por um
momento, de si mesma.
Quando retornaram ao cair da noite, Margareth deparou-se com dois criados carregando
um grande rolo de pano escuro.
— O que é isso? — perguntou.
Os dois homens de meia idade curvaram-se rapidamente diante da condessa, que fez uma
careta de impaciência.
— As cortinas da biblioteca. Sua graça mandou que elas fossem retiradas. Amanhã
deverão passar o dia no sol. A senhora quer que retiremos mais alguma, Vossa Graça?
— Amanhã veremos — Margareth falou, de repente sentindo-se uma vitoriosa.
Se ele estava cedendo, ela também poderia, mas como...?
Margareth tomou um banho demorado, com água quente que dois criados carregaram em
bacias pesadas até sua sala de banho. A senhora Garden providenciou um óleo perfumado, que
Mady usou na água quente e que acabou impregnando a sala de banho com o cheiro adocicado
de rosas, assim como toda sua pele macia.
Era gostoso e a fez sentir bonita, por algum motivo que ela não compreendia.
Quando voltou para o quarto, a criada penteou seus cabelos, moldando os cachos louros
no final da cascata que parecia descer pelas costas da condessa.
Margareth vestiu a camisola branca de seda e ajustou os seios grandes e fartos, consciente
de que Hugh gostara deles quando a tocou na noite de núpcias.
Depois, ela se deitou na cama à espera do que deveria acontecer. Se Hugh havia cedido
com as responsabilidades da casa para que pudesse se tornar realmente a dona, provavelmente
iria querer visitá-la naquela noite, como recompensa e ela estava disposta a finalmente consumar
o casamento, desde que ele fosse gentil, é claro.
Mesmo muito tempo depois de Mady deixar o aposento, a condessa ainda se sentia tensa
e ansiosa. Se por um lado era inexperiente e insegura, por outro, era curiosa e agora que tinha
uma vaga noção do que esperar da consumação, mal podia se conter de vontade de sentir as mãos
dele em seu corpo. Será que o grande membro caberia dentro dela?
E se o conde quisesse repetir a cena da primeira noite, dando-lhe tapas e a agredindo
como ele sempre anunciava ser uma coisa típica dos maridos?
Olhou para o lado e não encontrou o castiçal que usou na primeira noite, aquele conde
selvagem tirara sua única forma de se defender e só agora ela percebia isso. Mas em que
momento ele conseguiu fazer isso?
— Será que isso é um sinal? — perguntou para si mesma, andando de um lado para o
outro e pensando no que poderia usar como defesa caso ele se excedesse outra vez.
Talvez o jarro de água...
— Isso é ridículo — resmungou, esfregando o rosto e bagunçando um pouco a cabeleira.
Ela voltou a se recostar sobre os travesseiros fofos. Respirou fundo e esperou.
Nada podia ser feito, ele tinha direito à consumação do casamento e ela teria que
aprender a lidar com isso, talvez fosse capaz de explicar a Hugh que ele precisaria ser mais
gentil... quem sabe até pudesse gostar daquilo, a criada parecia gostar...
A criada.
Será que ele estava com ela em algum lugar?
Como ele havia ousado fazer aquilo?
Que espécie de marido agia assim?
Suspirando, Margareth resignou-se a esperar. Hugh tinha dado sinais tão conflitantes nos
últimos dias que era difícil ter certeza do que ele estava pensando.
Brigavam como animais, mas olhavam-se como... quem estava prestes a se render. Será
que ela tinha entendido errado?
Então por que ele havia cedido com a questão da casa?
Só restava esperar e foi isso que ela fez por um longo tempo.
Mas nada aconteceu. Hugh não veio ao seu quarto e ela começou a ficar impaciente. Num
misto de ansiedade, medo e aflição pela espera, andou de um lado para o outro no quarto mais
uma vez e depois afundou na cama de novo já sem saber como agir e o que pensar.
Repetiu o gesto várias e várias vezes enquanto pensava se não deveria, ela mesma, tomar
a iniciativa e jogar-se na cama do marido.
Não! Ele é quem deve vir, é assim que as coisas são.
E, assim, continuava de um lado para o outro, roendo as unhas, mexendo nos cabelos e
remoendo os pensamentos.
Maldito conde que a deixava à beira de um colapso. Por que é que ele não podia apenas
facilitar as coisas entre eles?
Um barulho no outro quarto deixou claro que o marido estava no aposento. Ela
aproximou-se pé ante pé da porta de ligação e colou o ouvido na madeira sólida. Prendeu a
respiração na expectativa. Nada.
Margareth estava cansada, aquela situação a estava deixando louca. Ou daria um jeito
naquela noite, ou ela voltaria para a casa do pai e se enfiaria num maldito convento. Não passaria
o resto da vida em guerra com aquele homem.
Voltou para a cama e afundou no colchão macio, mas não ia conseguir dormir, estava
agitada demais, ansiosa e confusa demais. Pense Margareth, pense. Ela repetia incansavelmente.
Pense, droga!
Margareth levantou-se e andou pelo quarto outra vez, tocou na porta que ligava os
quartos, mas não teve coragem de abri-la, então olhou pela janela e soltou um longo suspiro.
A lua cheia banhava a noite com uma claridade sensual e ela sentiu-se tomada de súbito
pela necessidade de ser tocada pelo marido. Algo nos olhos verdes do conde despertava nela um
anseio por seu toque, por sua paixão. Algo na forma como ele parecia sempre um pouco louco
quando ela o enfrentava a fazia querer senti-lo aquecendo seu corpo e seus pontos mais secretos.
Pensando nisso, enrolou-se num xale de lã e ainda descalça saiu pela outra porta. Desceu
as escadas rapidamente e mergulhou na noite fria, passando antes pela cozinha principal.
Margareth andou pela grama, sentindo o orvalho sob os pés e tentando acalmar o coração.
Se Hugh a quisesse, viria até ela.
Apesar do susto de alguns dias antes, ela realmente gostava da propriedade, do cheiro de
umidade que vinha das plantas e do som dos animais noturnos.
Num lugar como aquele, a vida devia ser boa, gratificante, devia ser leve e não tão tensa e
tumultuosa como vinha acontecendo.
Enquanto admirava o céu, aspirou o cheiro da grama e continuou caminhando pelo
jardim. Margareth tinha certeza de que ele a ouvira sair do quarto, agora, só o que podia fazer era
tentar mostrar a ele que estava disposta a ceder também, assim como ele tinha feito.
Não demorou a sentir uma presença à espreita. Não olhou para trás, mas teve certeza de
que ele a estava seguindo. Hugh tinha essa aura pesada e densa e sua presença sempre ocupava
todos os lugares, ela reconheceria a mudança ao redor por causa dele em qualquer situação.
Pela primeira vez na vida, sentiu-se maravilhosa, dona da situação e capaz de tomar as
próprias decisões.
Continuou pelos jardins em direção à mata onde quase perdera a vida dias antes. Nesta
noite, o frio menos agressivo permitiu que ela se sentisse muito bem, com uma deliciosa
autonomia sobre seu corpo, leve, livre.
Minutos antes, Hugh estava andando de um lado para o outro, indeciso se deveria ou não
ir ao quarto da esposa. Estava com as energias acumuladas e seu corpo pedia pelo toque de uma
mulher, mas, embora tivesse cedido e passado o controle da casa para a condessa, não tinha
certeza se isso era suficiente para convencê-la a recebê-lo de bom grado.
Quando finalmente decidiu-se por cruzar a porta de ligação que os mantinha afastados,
descobriu Margareth saindo pela outra porta, descalça, com os cabelos esvoaçantes e deixando
um rastro de cheiro de flores.
Seguiu-a pelo quintal, absorvendo cada gesto seu. Linda... pensou ao vê-la banhada pela
lua, andando como se flutuasse sobre o verde rasteiro, despreocupada e livre.
Ele a seguiu como em um transe, até que ela entrou numa trilha que desembocava em um
riacho onde ele gostava de pescar no verão.
Perdeu-a de vista por alguns instantes e isso fez o medo começar a correr por suas veias,
acelerando o coração com a ânsia de encontrá-la à beira da morte novamente.
Hugh percebeu o xale de lã e a camisola jogados sobre um tronco oco que foi
abandonado em meio às folhas secas. Caminhou devagar para não fazer barulho e outra vez foi
surpreendido por ela.
Lá estava a condessa, sentada sobre uma rocha, molhando os pés na água gelada. Hugh
ficou imobilizado, envolto na aura sensual que fluía do corpo nu de sua esposa. Sentou-se no
chão e ficou observando.
Ela não demorou a entrar na água, mergulhando fundo e deixando o corpo emergir e
submergir várias vezes. Entre a preocupação de tê-la doente em seus braços outra vez e a
sedução de vê-la nadando nua, Hugh ficou parado no mesmo lugar por um longo tempo.
Hipnotizado.
Ela o estava seduzindo, do seu jeito inocente e selvagem, mas estava. E ele estava se
deixando levar, saboreando o momento como se fosse um menino em frente ao seu primeiro
brinquedo.
Margareth saiu da água bem devagar. O frio ameaçou esticar suas garras sobre seu corpo
miúdo, mas então ela viu Hugh, sentado num amontoado de folhas, o rosto afogueado e uma das
mãos sobre seu membro.
Ele estava como da primeira vez que ela o vira, ereto, grande e firme, envolvido pelos
dedos do conde que subiam e desciam devagar.
Ela prendeu a respiração, absorvendo cada detalhe do que ele fazia consigo mesmo e
desejando ser ela a tocá-lo. Por algum motivo que desconhecia, aquela imagem a fazia sentir
como se estivesse prestes a pegar fogo.
O corpo inteiro se arrepiou quando percebeu que ele estava se dando prazer perto de onde
ela estava nua.
Como as calças dele estavam levemente abertas e as mangas da camisa erguidas
Margareth teve uma boa visão do que estava acontecendo, inclusive das veias fortes nos
antebraços dele e de como suas mãos podiam ser ágeis e fortes.
Era o homem mais másculo e intenso que ela já vira. Forte, bruto, nada delicado ou cheio
de modos como os outros nobres que frequentavam a temporada da alta sociedade. Ela nunca
tinha percebido o quanto ele podia ser lindo até aquele momento.
Seduzida por vê-lo se tocando ali no meio da noite fria, ela deu alguns passos na direção
do marido, um pouco receosa, mas deixando-se guiar pelo próprio desejo.
Algo no meio de suas pernas latejou e Margareth compreendeu naquele instante que nada
do que a mãe dissera tinha importância. Ela queria ser tocada por Hugh, queria sentir o calor se
espalhar e descobrir o tipo de intimidade que consagrava um casamento.
Hugh percebeu que Margareth estava focada na forma como excitava o próprio pau e isso
o deixou num misto de surpresa e tesão.
Ele a queria muito, e agora começa a perceber que talvez ela também o quisesse, só que
nos próprios termos.
Até que fazia sentido, Margareth não era o tipo de mulher que se deixava guiar, era ela a
senhora da casa e da vida, ela dava as ordens.
Com um suspiro, ele fez menção de parar de se tocar, mas Margareth fez um gesto
negando e em seguida, enfiou os dentes de leve no lábio inferior, deixando-o ainda mais devasso.
Então, tomado por esse estímulo, Hugh aumentou a pressão no pau enquanto percorria
com os olhos o corpo da esposa, soltando um tipo de rosnado profundo e rouco. Se era assim que
ela o queria, seria assim que as coisas aconteceriam.
Margareth não disse nada e foi em sua direção, avançando com o corpo nu até bem perto
dele. Hugh virou as duas esmeraldas verdes na direção das imensas esferas azuis dela e ambos se
encararam em absoluto silêncio.
Margareth pegou sua mão que estava livre e com o coração acelerado colocou-a no tufo
de pelos claros em sua parte mais íntima. Hugh arquejou ao senti-la molhada.
— Melada pra mim — ele sussurrou, tirando o dedo melado da boceta dela e levando aos
lábios. — Tão gostosa.
Um gemido baixo escapou pelos lábios dela quando o viu lamber os dedos e depois voltar
a acariciar sua intimidade. Aquilo era diferente de tudo o que imaginou, mas era gostoso e ela
queria mais.
Como Margareth não sabia mais o que fazer, deixou que ele tomasse conta do que viria a
seguir. Deixou que ele a possuísse e a tornasse sua esposa de verdade.
Ela queria isso e pela primeira vez em toda sua vida, ela faria exatamente o que queria.
Com cautela, Hugh explorou a pele quente e as dobras, passando os dedos de cima para
baixo repetidas vezes, brincando com a boceta molhada sem chegar a penetrá-la com os dedos.
Os olhos dele, porém, não desviaram dos dela nem por um instante e cada vez que ela
piscava, arrebatada pelo prazer que estava sentindo, ele se deixava levar um pouco mais.
Margareth gemeu quando Hugh encontrou o botão sensível e o pressionou, começando a
acariciá-lo com movimentos circulares. Ela fechou os olhos e abriu as pernas, agarrando com
força os ombros de Hugh.
— Você é minha Margareth — ele sussurrou, deslizando um dedo até a fenda encharcada
e finalmente o enfiando dentro dela.
— Oh! — Ela se contorceu, sem conseguir lidar com a explosão de sensações. — Oh,
Hugh, isso é tão...
— É gostoso, não é? — ele perguntou, fazendo-a olhar com os cílios levemente turvados.
— Diga, Margareth, diga que gosta que eu a toque.
— Eu gosto — ela soltou baixinho, sentindo outro dedo dele estocar para dentro. — Eu
gosto muito.
— Então peça para que eu a torne minha, peça e eu te darei muito mais disso — ele falou,
a voz tomada pela necessidade de possuir cada parte do corpo dela.
— Eu serei sua, conde, mas quero que você seja gentil — ela falou, segurando o rosto
dele com as duas mãos e fazendo-o a mirá-la nos olhos. — Seja gentil e eu serei inteiramente
sua.
Hugh rosnou, domando a própria fera e assentindo.
Quando a boca dele finalmente encontrou os lábios carnudos da condessa, a sensação de
prazer que o invadiu o pegou completamente de surpresa. Na verdade, pegou a ambos. Nenhum
dos dois imaginava que algo daquela proporção existia, nada parecia capaz de superar aquela
sensação mágica e pecaminosa.
Margareth colocou as mãos por cima dos ombros dele e suspirou, apreciando o cheiro
masculino e o movimento da boca carnuda do conde.
Ele, por sua vez, precisou de todo o esforço do mundo para não bancar o brutamontes,
mas suas mãos não puderam se comportar tanto ele provocou-a com a ponta dos dedos, roçando
por sua coluna e pairando na base, logo acima da curva da bunda redonda e farta.
A onda de calor desceu desde a espinha até as bolas, que imediatamente se encheram de
tensão e desejo. O pau latejou quando ela pousou as mãos no seu peito e abriu mais os lábios,
roçando a língua na sua e entregando-se a um beijo cheio de força e profundidade.
Ele pensou em tomá-la ali mesmo, com a força arrebatadora que sentia explodir dentro de
si. Mas ao contrário de agir impulsivamente como fizera na primeira noite e que tanto lhe
custara, agora, Hugh continuou com os movimentos suaves, acariciando cada minúsculo
pedacinho de pele que encontrava e sendo o mais gentil que conseguia.
E Margareth reagiu ainda melhor do que ele esperava, estremecendo e gemendo em seus
lábios. Ela também o queria e quanto mais ele a provocava, mais ela começava a se render.
Hugh a puxou para mais perto ainda, colando os seios fartos no seu peito e finalmente
tirando a língua feroz de dentro de sua boca, ela choramingou quando ele rumou para o queixo e
mordiscou a pele, raspando a barba por fazer enquanto migrava para a curva do pescoço.
— Espero por esse momento desde que a vi a pela primeira vez, minha condessa —
sussurrou no ouvido dela, antes de chupar de leve o lóbulo da orelha e lamber a pele do pescoço.
— Você tem um gosto delicioso.
Hugh apalpou bem devagar um de seus seios e ela gemeu baixinho mais uma vez,
rendendo-se por completo àquela imensidão de sensações e deixando-o ainda mais deliciado.
Margareth então criou coragem e se esticou na ponta dos pés, passando a língua por seu
pescoço e arriscando com movimentos inseguros. Ele cedeu o pescoço e ela mordiscou-o,
raspando os dentes e passando a língua pela pele dele.
Hugh gostou da iniciativa, sua esposa era uma mulher voluntariosa, mas, ao mesmo
tempo, seu toque era inexperiente e tímido e isso o deixava louco de desejo.
Quando os dois se afastaram por um momento, Hugh estava ofegante e Margareth
excitada demais para se conter, então o puxou de novo, suplicando por sua boca e seu toque.
Mas o conde não voltou a beijá-la, apreciando o desejo ganhar o rosto dela e sentindo-se
muito poderoso. Era um conde, afinal, mas o que o mais fazia sentir seu poder era a capacidade
de enlouquecer a mulher que escolhera como esposa.
Depois de toda a confusão dos primeiros dias, finalmente ele tinha consciência do que era
de fato o casamento e de como seria estar casado com Margareth.
Quando ele se preparava para avançar sobre ela novamente, foi surpreendido pela mão
pequena e os dedos macios, que envolveram seu pau e começaram a roubar seu controle.
Margareth tentou imitar os movimentos que o viu fazer, mas sentiu-se desajeitada e
inibida. Apesar da vontade de tocá-lo, estava tensa e perdida, sem saber se era capaz de fazê-lo
sentir-se como ele fez com ela.
Ao perceber que ela se esquivava, Hugh cobriu a mão da esposa e começou a acariciar o
próprio pau, ensinando-a como subir e descer devagar, alternando a pressão.
O calor no meio das pernas de Margareth aumentou e ela viu-se gemendo e mordendo o
próprio lábio, desesperada pelas sensações de prazer.
À medida que Hugh deixou a cabeça pender e os olhos se fecharem por causa do prazer
ela sentiu-se prestes a explodir.
O conde passou os dedos por entre a cascata de cachos e segurou os cabelos de
Margareth, puxando sua cabeça e expondo o pescoço alvo, ali, plantou beijos molhados que só
terminaram quando chegou à boca dela e a invadiu com sua língua devassa.
— Vamos pra dentro? — ele perguntou, tentando não se deixar consumir por aquele
prazer todo.
— Eu quero que você me faça sua, Hugh, mas não quero me deitar na mesma cama que
ela... — ela parou de falar e baixou os olhos.
— Amanhã, vou mandar queimar nossas camas e colocar novas no lugar — ele declarou,
sentindo-se culpado.
— Mas não quero esperar até amanhã — Margareth confessou, tímida. — Quero hoje,
agora.
— Tudo bem, mas vamos fazer isso do jeito certo — ele declarou. — Vista-se por
enquanto.
Contrafeita, ela procurou a camisola e ele a ajudou a passar por seus braços, cobrindo-a.
— Vamos — ele a puxou para dentro da casa, passando pela cozinha e seguindo para a
biblioteca, sem dizer nada pelo caminho. — Não vou permitir que você fique doente ao relento
outra vez — determinou, todo mandão.
Margareth suspirou e se sentou na poltrona, esperando pelo que quer que ele estivesse
fazendo.
Hugh saiu da biblioteca e voltou alguns instantes depois, carregando mantas, almofadas e
um cobertor.
— Só falta o candelabro — Margareth brincou quando ele a puxou da poltrona e a fez
deitar sobre a manta que arrumou no tapete.
— Não me provoque, condessa, estou mesmo tentando ser gentil — ele replicou e ela
sorriu.
Seu sorriso iluminou um ponto escuro do coração de Hugh e ele sentiu, pela primeira vez
em todos os seus trinta e cinco anos, que as coisas estavam exatamente como deveriam.
— Você está se saindo bem, meu esposo — ela disse, tirando a camisola sem qualquer
preocupação.
— Ansiosa? — ele tirou a calça, expondo novamente o pau para ela.
Ainda estava duro, cheio de vontade de comê-la com força e em todas as posições
possíveis, mas também estava ciente de que teria de ser muito cuidadoso com a esposa virgem.
— Estou sentindo coisas que nunca senti antes — ela confessou, deitando-se e tocando os
seios grandes. — Não achei que pudesse me sentir assim.
— E onde você está sentindo? — ele perguntou e ela tocou-se de leve no meio das
pernas, as bochechas coradas de vergonha.
— Você nunca se tocou antes? — ele quis saber e ela negou. — Então você é
completamente pura. Pura e minha.
— Eu sempre soube que algo acontecia entre marido e mulher, mas nunca entendi o que
era ou o que eu teria que fazer.
Ele suspirou.
— E eu piorei tudo... — admitiu. — Mas agora, vou fazer o possível para não cometer o
mesmo erro.
— Então acho que vou ser realmente diferente das outras mulheres — ela declarou,
acariciando-se com a ponta dos dedos e descobrindo sua própria capacidade de dar prazer a si
mesma. — Acho que vou gostar muito da consumação.
— Então me mostre onde você quer que eu faça sentir prazer... — ele ordenou e ela
soltou um gemidinho baixo e ansioso. — Toque-se pra mim, Margareth.
Margareth tocou-se com os dedos de uma mão, enquanto a outra subiu instintivamente
até o seio e o apertou. A cena deixou Hugh atordoado.
Se por um lado era muito sexy ver sua esposa virgem se tocar, por outro, o toque inocente
e inseguro garantiam que ela pertenceria apenas a ele. Uma mistura de sentimentos o envolveu,
mas ele afastou os pensamentos e focou em Margareth e encontrar todas as zonas mais sensíveis
de seu corpo para explorar cada uma delas.
A primeira coisa que fez foi se meter entre as pernas dela e baixar o rosto até a fenda
molhada. Ela tirou os dedos e deu espaço. Quando Hugh passou a língua, Margareth gemeu alto
e sem controle.
Ele ergueu os olhos e a viu admirando-o, fascinada pelo movimento da sua língua na
boceta perfeita.
Margareth esqueceu qualquer inibição e abriu bem as pernas, dando todo o acesso que ele
precisava para levá-la por aquele caminho.
Hugh lambeu toda a boceta de Margareth, brincando com o clitóris enquanto ela gemia
cada vez mais, agarrando-se aos cabelos dele e choramingando de tanto prazer.
— Goza, minha condessa, goza na minha boca porque depois meu pau vai entrar fundo
em você.
Ele nem terminou de falar e enfiou dois dedos na fenda molhada, levando-a de vez para o
abismo do prazer. De olhos fechados e sentindo as ondas de prazer estremecerem seu corpo,
Margareth rendeu-se completamente.
Quando gozou pela primeira vez na vida, ela gemeu o nome de Hugh até perder as forças.
— Acho que agora entendi por que minha mãe me mandou deitar e fechar os olhos para
esperar você terminar... isso é tão bom — Margareth declarou quando Hugh tirou a boca do seu
corpo e se encaixou entre suas pernas, pairando com o corpo grande sobre o seu.
A forma irreverente como ela estava reagindo acabou provocando uma risada rouca em
Hugh. Aquele era um lado que ele nem sequer imaginava que a esposa teria, mas estava gostando
muito.
— Ainda não acabei — ele declarou, os olhos verdes faiscando e dilatados.
— Eu sei — ela retrucou travessa, contornando a cintura de Hugh com as coxas grossas.
— Já o vi em ação.
— Você é muito atrevida, esposa.
— E você é um selvagem, o meu conde selvagem.
Hugh roçou com a cabeça do pau na abertura melada de Margareth e ela suspirou.
— Acho que nunca mais serei uma moça de família... — sussurrou quando ele roçou
outra vez com o pau, estimulando-a mais.
— Por que diz isso?
— Porque estou gostando da consumação do casamento mais do que uma boa moça
deveria.
Quando ela terminou de falar, Hugh sentiu uma onda de preenchimento incomum, algo
que nunca experimentou antes e que o fez querer vê-la gozar de novo, chamando-o sem controle
do próprio corpo, mais do que qualquer homem deveria querer algo na vida.
Ele se impulsionou bem devagar para a abertura, fazendo-a retesar quando começou a
abri-la.
Ela soltou um chiado e ele parou, beijando-a de novo e de novo, até ela relaxar e ele
poder tentar de novo.
— Juro que estou tentando ser gentil — Hugh sussurrou e ela assentiu, começando a se
empurrar na direção do pau para ajudá-lo.
— Vamos juntos então, meu conde.
Ele tentou mais uma vez e a cada nova estocada a invadia um pouco mais, se ajustando
aos poucos e abrindo a esposa para recebê-lo.
Hugh insistiu outra e mais outra vez, mas Margareth era apertada e ele estava louco de
tesão, o que o deixava inchado e pulsante, difícil de acomodar no corpo virgem dela.
— Tudo bem, eu quero — ela disse quando ele fez menção de tirar o pau e fazer uma
pausa. — Não pare.
Hugh não resistiu aquele tom doce que ela usou e se empurrou mais uma vez para dentro
dela, devagar e lentamente, ganhando o espaço e urrando por conta da sensação incrível de
possui-la.
Ele estocou de leve várias vezes, antes de perder o controle e se enfiar com força,
arrancando um gemido dolorido de Margareth e um urro insano de si mesmo.
— Você é minha, condessa... você é minha — ele disse, ritmando o vai e vem frenético
que o fez chegar lá alguns instantes depois.
Depois de se desmanchar dentro da esposa, Hugh rolou para o lado e a puxou para os
seus braços, fazendo-a afundar no seu peito e começando a acariciar a cascata dourada de
cabelos.
— Me desculpe se a machuquei — ele sussurrou e ela ergueu os cílios grandes para ele.
— Não foi minha intenção.
— Foi uma mistura de bom e ruim — ela admitiu e isso o fez sorrir genuinamente. —
Acho que teremos de fazer outras vezes, até ser apenas bom.
— Você é um mistério pra mim. — Ele riu, contrafeito.
— Você preferia que eu fizesse como minha mãe mandou? — Margareth sentou-se e o
encarou intrigada.
— De jeito nenhum, eu gosto exatamente assim.
— Ótimo, agora você já pode colocar sua boca em mim de novo, quero fazer de novo.
— Condessa, condessa, você vai acabar comigo.
Quando Margareth abriu os olhos, ainda sonolenta, sentiu uma brisa fria percorrer seu
corpo. Estava aninhada no calor do peito de Hugh e os dois dormiam sobre as mantas e o tapete,
diante da lareira do quarto de Margareth.
Em que momento foram parar no andar de cima?
A sensação dolorida na parte interna de seu corpo suavizou, à medida que as lembranças
dos acontecimentos horas antes ressurgiram em sua mente e ela sentiu o estômago revirar de
excitação.
Uma pontada de alegria surgiu em seus lábios e ela foi obrigada a sorrir consigo mesma,
orgulhando-se de sua coragem e ousadia e ainda mais impressionada com a força do desejo que
possuía dentro de si.
Hugh mexeu-se bem devagar e ela sentiu o calor de sua respiração batendo em seu rosto.
Dormindo, a expressão selvagem suavizava, transformando-o em um homem incrivelmente
lindo.
Os cabelos revirados acrescentavam os ares sombrios, que a despertavam para a realidade
em que ainda estava metida. Casada com um homem que podia ser incrivelmente doce e ao
mesmo tempo, terrivelmente brutal. Era um labirinto confuso de sentimentos que a deixavam
perplexa.
Algo na batida compassada de seu coração a preocupava, mas ela afastou os
pensamentos, saboreando o poder do toque do conde sobre sua pele e do calor que a incendiava.
— Acordou, minha senhora? — ele perguntou com a voz rouca e ela suspirou.
— Como viemos parar aqui?
— Achei a biblioteca muito fria e nos trouxe pra cá.
— Você me carregou? — ela soou surpresa.
— Carreguei.
— Você subiu as escadas comigo?
— Por que a surpresa?
Margareth pensou por um momento e então admitiu.
— Bom, não sou exatamente como as outras ladys.
— Você é linda.
— É, é, eu sei, mas minha mãe sempre me disse que um bom homem, um jovem, bonito
e de boa família nunca ia querer uma garota como eu, ela me apertava tanto no espartilho para
diminuir meu corpo... além de reclamar dos meus braços gordinhos e...
— Agora você é uma condessa e ninguém vai ousar abrir a boca para criticá-la.
Suspirando, Margareth acenou.
— Além disso, eu gosto dos seus peitos grandes, Margareth, são deliciosos.
Ela soltou um risinho.
— Gosto do seu corpo também, ele me deixa... quente.
Hugh gargalhou, mais contente do que esperaria.
— Definitivamente você não é como as outras, minha senhora.
— Pois é, só que agora você consumou o nosso casamento e não pode mais me devolver
ou será um escândalo terrível.
— Eu não faria isso nem se a própria Rainha me pedisse.
— Não?
Hugh a olhou nos olhos como se uma imensidão pudesse se abrir diante dela, isso fez o
coração da jovem condessa dar um salto no peito e ela suspirou.
— Você é minha esposa, é minha mulher, ninguém mais vai colocar a boca nessa sua
boceta doce.
— Você é tão devasso... — ela soltou sem pensar.
— E isso a assusta?
— Isso me deixa com vontade de descobrir o que mais é capaz de me deixar quente.
Margareth afundou o nariz no peito de Hugh, aspirou devagar o cheiro dele e voltou a
olhar para a beleza selvagem que se delineava no rosto quadrado. Sem a menor pretensão de
voltar a dormir, tocou o queixo do marido e sentiu os pelos grossos da barba.
Com a ponta dos dedos, percorreu a linha da clavícula e desceu pelos ombros torneados e
levemente dourados. Totalmente diferente do que ela imaginava ser um nobre como ele.
Diferente de como era o irmão e o pai, molengas e pequenos.
Os dedos, um pouco hesitantes, seguiram pelo peito e desceram vagarosamente para a
região do umbigo, fazendo pequenos círculos e contornando a linha do osso pélvico de Hugh.
A mão forte do conde pousou sobre seus dedos e ela arregalou os olhos assustada, como
se tivesse acabado de cometer um erro terrível. Sem dizer mais nada, Hugh puxou-a para baixo
do seu corpo, fazendo-a perceber que já estava duro e pronto para invadi-la.
Margareth estremeceu com o contato e deixou-se levar pela mão forte e áspera do conde
que começava a percorrer delicadamente seus braços.
— Você é linda, Margareth. Uma megera linda e perfeita — disse e sua boca caiu sobre a
dela, arrebatando-a em um beijo que os inflamou como fogo.
Sem pensar, Margareth enganchou os dedos finos na parte de trás da cabeça de Hugh e
sentiu as pontas do cabelo entre eles. Hugh respirou ofegante, a mão descendo para o meio das
pernas dela e sentindo-a úmida e manhosa.
Margareth gemeu quando ele pressionou seu botão do prazer, abrindo-se para ele e
decidida a gostar ainda mais do que estava por vir.
Se sentir aquelas coisas era errado como a mãe dissera, então Margareth era mesmo a
pior das mulheres, pois à medida que os lábios do conde percorriam o caminho desde seu queixo
ao seu pescoço e depois aos seus seios, ela não conseguia pensar em desejar nada além daquilo.
Deitar e esperar que o marido terminasse?
Impossível, tudo o que ela queria era decifrar cada pedacinho do corpo dele, cada arrepio,
cada sensação. O que ele ia pensar a seu respeito, isso já não importava. Tudo o que sentia era a
ereção do marido de encontro com seu ventre, antes de penetrá-la com a força de uma fera.
E Margareth estava ansiosa por isso. Queria tanto o conde carinhoso quanto o conde
devasso e selvagem, capaz de fazê-la perder o controle de si mesma e explodir em sensações.
Margareth suspirou alto, deixando um gemido escapulir de sua garganta quando Hugh
estocou para dentro dela. Inebriante. Foi seu último pensamento lúcido antes de se deixar levar
pela sensação maravilhosa de ser arrebatada pelo prazer.
Instantes depois, tanto Hugh quanto Margareth gemiam, deliciados sobre o tapete felpudo
do quarto dela, diante da lareira crepitante.
A sensação de ter seu corpo colado ao de Margareth e vê-la com os olhos fechados e os
lábios comprimidos de prazer era indescritível. Hugh já tivera muitas mulheres em seus braços, a
maioria eram mulheres de pouca moral a quem ele pagava para satisfazer seus caprichos; outras,
criadas iludidas com a ideia de serem desposadas por um nobre e terem suas vidas
completamente transformadas em um conto de fadas. Coisa que nunca aconteceria.
Nenhuma delas, no entanto, um dia chegara a importar. E ele nunca quisera tanto
satisfazer alguém como sentia que queria agora, diante daquele corpo tão macio e delicioso que
se movia com o seu, gemendo e espasmando de prazer, e implorando por mais.
Ele nunca quisera tanto provar que era bom como queria com Margareth. Como ela tinha
feito isso com ele? Como tinha transformado a fera que lutava para se libertar em um
animalzinho de estimação?
Com esse pensamento, Hugh deixou-se levar para o prazer do ápice e estremeceu quando
percebeu que Margareth gozava ao mesmo tempo. Ele nunca imaginara que aquela garota
mimada e impetuosa poderia ser tão... tão feroz.
Assim que Margareth sentiu o prazer final, contorceu-se sob o corpo de Hugh, espasmou
uma última vez e relaxou. Foi então que percebeu os olhos verdes cravados nela, numa mistura
de adoração e transe.
Se ele estava sentindo o mesmo que ela, então definitivamente ser uma esposa valia a
pena. Era incrível como o simples toque, o encontro dos corpos podia provocar tamanha
explosão dentro dela.
A condessa de Surrey esperou que Hugh se deitasse ao seu lado para então olhá-lo com
bastante atenção. Hugh sorriu tranquilo, satisfeito e Margareth achou absolutamente lindo ver
seus lábios carnudos levemente curvados de satisfação.
Ela não conseguiu evitar e sorriu em contentamento.
Aquele homem era um mistério e uma surpresa e ela estava arrebatada pela sensação
incrível de ser dele.
E sim, Margareth agora era dele, não apenas uma posse, mas também uma esposa, mulher
e amante. Até que isso podia ser bom.
Hugh puxou Margareth para junto de seu peito e ela cedeu, colando a lateral do rosto nos
poucos pelos do peito dele. Com os dedos distraídos, ela deixou-se brincar na intricada carga
muscular que ele trazia no abdômen.
— Um castelo por seus pensamentos — Hugh falou, a voz branda.
— Uma vez vi meu irmão sem camisa por acidente.
Hugh sorriu. De tudo que ele esperava ouvir naquele momento, aquela era,
definitivamente, a única coisa que não havia passado por sua cabeça.
— A barriga dele era diferente... mole...
— Seu irmão não me parece um homem desajeitado.
— E não é. Muitas jovens caem de amor por ele. Definitivamente é um dos homens mais
bonitos que já vi, mas me refiro a isto.
Ela passou os dedos sobre a ondulação no ventre dele e Hugh compreendeu que se referia
aos seus músculos trincados.
— Meu irmão é magro, mas você é diferente...
— Hum.
Os dois mergulharam em um breve silêncio. Os dedos de Margareth voltaram a delinear
as ondulações no abdômen de Hugh, que suspirou de prazer.
— Isso agrada você? — ele perguntou, sentindo a ponta dos dedos dela descendo por
seus músculos trabalhados.
— Sim — ela admitiu com toda a sinceridade que possuía. Não estava com ânimo para
encenações dramáticas e enfadonhas. Naquele momento, tudo o que disponha era ela mesma.
— É o corpo de um homem que trabalha sem medo — declarou e ela concordou,
apreciando o tom dourado da pele quente sob seu toque.
— Nunca vi um homem nobre que trabalhasse. Minha família não tem títulos e meu pai
se esforçou para chegar aonde está, mas os nobres geralmente...
— Não fazem nada, não é mesmo?
Margareth olhou-o de soslaio e percebeu que ele assumira um semblante taciturno.
— Você é diferente, não é? Diferente de qualquer homem deste mundo.
— Você também não é igual a nenhuma mulher que eu tenha conhecido.
— E isso é bom ou ruim?
— Às vezes é terrível, você é bem irritante.
Margareth gargalhou e o som de sua risada natural encheu o quarto de energia. Hugh
prestou atenção em seus traços enquanto ela mantinha os olhos fechados e deixava o riso sair
sem nenhuma dificuldade. Linda, pensou. Linda, gostosa e minha.
— É difícil lidar com você também— ela falou num misto de diversão e sonolência.
— Eu sei.
Hugh respondeu, curvando-se sobre Margareth e despertando-a do sono.
— O que está fazendo comigo, condessa?
— Domando a fera? — ela perguntou, sorrindo e parecendo ao mesmo tempo inocente e
ardilosa. Um truque feminino muito sedutor, que o deixou rapidamente em chamas. Com as
mãos sobre o quadril de Margareth, ele beijou-a nos lábios e no pescoço.
— Definitivamente, a fera vai precisar ser domada muitas vezes ainda —Abocanhou o
mamilo de Margareth.
Ela gemeu alto e ele sugou com mais força.
— Tem algo que eu gostaria de experimentar... — ela deixou escapar enquanto prendia os
dedos nas costas de Hugh e sentia a queimação entre suas pernas mais uma vez.
Será que aquilo um dia ia acabar?
Ela esperava mesmo que não, porque era delicioso.
— Você não para de me surpreender.
Margareth estava atônita consigo mesma. Nunca se imaginou como uma mulher muito
empolgante e a mãe ainda fizera um ótimo trabalho ao deixá-la insegura com o próprio corpo.
Como se o fato de não ser tão pequena e delicada ou tão magra como as outras a diminuísse em
todos os sentidos.
Mas agora ela estava ali, experimentando coisas que nem sequer achou que fossem
possíveis. Experiências que provavelmente deixariam a mãe de olhos arregalados e as bochechas
muito vermelhas.
Jamais havia compreendido por que a maioria dos homens e mulheres de classe alta
dormia em quartos separados, pelo menos era que Doth sempre contava. A princípio achou que
havia descoberto quando se casou com Hugh e decidiu expulsá-lo na noite de núpcias. Agora,
porém, a dúvida voltava à sua mente. Se a consumação do casamento era algo tão gostoso, como
as pessoas poderiam querer ficar um segundo sequer longe daquilo?
Hugh gemeu e Margareth se sobressaltou. Ela segurava com firmeza o membro ereto do
marido e devagar o mergulhava dentro da boca, deixando a língua brincar com a glande, como se
estivesse saboreando um doce especial.
Era mais ou menos assim que ela se sentia, com uma verdadeira delícia na boca e assim,
ela o lambia e chupava devagar, aproveitando cada instante daquilo.
Margareth percebeu que os quadris dele estavam levemente erguidos da cama, os olhos
fechados com força e as mãos cravadas nos lençóis. Não conseguiu definir se ele estava gostando
ou não, mas tudo indicava que sim.
Com os olhos abertos, voltou a colocar o membro dele na boca, mergulhando até onde
sua garganta permitiu e isso fez Hugh estremecer, deixando outro gemido escapar. Então,
Margareth passou a língua pela ponta saliente, sentindo o gosto acre do líquido que escapulia
para os seus lábios.
— Estou fazendo certo? — perguntou e como resposta recebeu um urro selvagem que a
fez sentir a comichão no meio das pernas crescer.
— Quando meu pau estiver dentro de você, a farei gritar para que o mundo todo escute,
condessa. O mundo saberá que você gozou pra mim.
— Isso quer dizer que está gostando? — Ela quis saber, enquanto suas mãos desciam até
as bolas e ela as apertou de leve, sentindo a textura e a reação gutural do marido. Aquilo era
incrível, porque além de perceber que ele gostava, ela também se sentia mais excitada a cada
descoberta.
Experimentou passar a língua e chupar as bolas e isso o fez puxar com um pouco mais de
força seus cabelos, soltando outro dos seus grunhidos tão masculinos.
— Se continuar desse jeito, vou gozar dentro da sua boca, Margareth.
Margareth parou e esperou. Hugh, sentindo a falta da boca quente e macia no seu pau,
abriu os olhos e ergueu a cabeça para ver o que a fizera parar de chupá-lo. A esposa estava
parada analisando-o, sem saber bem o que fazer a seguir.
— O que foi?
— Você falou... gozar. Isso é ruim? Isso é bom, não é?
A ingenuidade e inocência de Margareth o deixaram atordoado de um jeito quase insano.
Saber que ela era pura era bom, mas saber que ele a estava guiando e ensinando e que ela sequer
compreendia o que era gozar, era ainda mais profundo e enlouquecedor. A garota tinha sido
criada protegida de tudo e a mãe sequer havia preparado-a para o sexo, não é à toa que ela tinha
reagido de forma tão assustada na primeira tentativa dele de consumar o casamento.
Se por um lado era desconcertante saber que ele não havia melhorado em nada a situação
dela, por outro, era como colocar mais brasa no seu fogo e saber que ela era tão pura e apenas
sua era o necessário para incendiá-lo.
— Quando eu a chupei, você gostou?
— Sim, foi muito bom — ela admitiu enquanto Hugh se sentava na cama e a fazia
encará-lo de frente.
— E teve um ápice? Um ponto mais forte e muito melhor?
— Sim, quase como se eu me jogasse de um abismo e sucumbisse... foi muito bom.
— Quando chegamos a esse abismo, chamamos de gozar. No meu caso, como sou
homem, vou me derramar dentro de você. E, acredite condessa, será muito bom pra mim.
— Então vou fazer você gozar pra mim — ela decidiu.
— Meu Deus, Margareth, você não tem ideia de como me deixa louco falando essas
coisas.
— Falando o quê? — ela piscou, provocando-o. — Fazer você gozar dentro de mim?
Impulsionada por seu desejo, ela o empurrou para trás na cama e subiu sobre Hugh, mas
não o deixou penetrá-la de imediato. Pelo contrário, ainda queria muito explorar o corpo dele e
tinha algumas ideias que não paravam de saltitar em sua cabeça.
Beijou-lhe, então, o peito definido e passou a língua bem devagar sobre as ondulações do
abdômen, deixando-o ainda mais excitado.
Com os lábios molhados percorreu o caminho oposto ao membro, subindo com sua
língua ao pescoço, onde mordiscou de leve várias vezes. Hugh remexeu-se instintivamente,
contendo a vontade de tomar a posse da situação.
— É a sua vez... — ela murmurou em seu ouvido, fazendo-o abrir os olhos verdes
faiscantes. — Sua vez de me chupar.
Hugh enganchou as mãos nos quadris de Margareth instintivamente e num gesto rápido e
uma manobra inesperada, girou-a de cima para baixo, sem desviar os olhos dos dela.
Deitou-a sob seu corpo e ela deu um gritinho encantado.
Os olhos dela pareciam surpresos com sua agilidade e deliciados com o prazer que isso
provocava.
Ele desceu os lábios de seu cabelo, passando a língua quente sobre o pescoço e
mergulhando os dentes devagar em seus seios. Margareth gemeu alto e isso o deixou ainda mais
motivado, sugando o mamilo intumescido repetidas vezes. Chupando e mordiscando de leve a
pontinha.
Com os dedos grossos, ele apertou o outro seio e depois desceu pelos quadris e coxas.
Enfiou a mão por baixo do corpo de Margareth e então deu um aperto de leve em sua bunda
firme. Ela resfolegou, aspirando o ar com dificuldade.
Hugh voltou a chupar o mamilo, enquanto sua outra mão percorria a lateral do corpo dela
e afundava bem no meio do tufo de pelos claros. Ele estava começando a gostar muito daquele
pequeno ponto e não via a hora de passar a língua por toda aquela boceta deliciosa.
Margareth estremeceu quando os dedos começaram a acariciar sua parte mais íntima,
passando de um lado para o outro em movimentos cada vez mais ritmados.
Em poucos instantes, ela já não conseguia mais pensar em nada, gemendo e erguendo os
quadris e suplicando por mais.
O conde desceu com a língua pelo ventre dela que se agarrou ao seu cabelo e puxou com
força. À medida que ele se aproximava da boceta molhada, ela comprimia com mais força os
quadris na cama e as mãos em seus cabelos e ombros.
Quando ele finalmente mergulhou a língua no ponto sensível, ela ofegou e chamou seu
nome.
Hugh passou a língua devagar pelas curvas, lambendo toda a extensão úmida. Sua língua
começou a subir e descer e, depois, com o dedo ele a penetrou. Margareth soltou um gemido alto
e ele colocou outro dedo, iniciando um vaivém lento.
Enquanto a língua chupava-a e lambia, os dedos entravam e saiam e ela sentia que não
tinha como ficar melhor, até descobriu que ainda era possível.
Não demorou para chegar ao ápice do prazer e gemer como uma verdadeira fera
enlouquecida.
— Hugh, ah, Hugh, assim, isso... vou gozar.
Hugh não conseguia deixar de pensar no que mais ela poderia esconder. Que mistérios
ainda descobriria em sua esposa? Quando ela finalmente deixou o corpo cansado pender sobre os
lençóis suados, ele voltou ao seu ouvido e disse:
— Sua vez.
— Minha vez — sussurrou e sorriu ao abrir os olhos, exibindo um brilho azul ousado.
Levantou-se ainda estremecida e começou a percorrer o corpo dele com a língua com
calma, passando as unhas no abdômen definido e cravando-as delicadamente nas coxas.
— Diga-me Margareth, o que você vai fazer com o meu pau? — Ele se apoiou nos
cotovelos para ter uma visão melhor da cabeleira que seguia na direção do pau.
— Vou colocar na minha boca.
— E se eu gozar e derramar minha porra em você?
— Eu posso engolir?
— Condessa, se você não me matar, com certeza vai chegar bem perto.
Satisfeita com a reação de Hugh, ela mergulhou os lábios com intensidade no pau, certa
de que poderia perder-se nas sensações que irrompiam dentro dela.
Com movimentos intensos e rítmicos, ela intercalou os lábios e os dedos, subindo e
descendo sobre o membro e arrancando suspiros avassaladores de Hugh. De vez em quando,
resvalava os dedos para as bolas e depois voltava a chupá-lo, como se nada pudesse ser mais
gostoso que aquilo.
Quando finalmente ele chegou ao orgasmo, Margareth sorria de prazer e satisfação,
sentindo-se tão poderosa e selvagem quanto o próprio conde.
A explosão que se seguiu a pegou desprevenida e ela assustou-se um pouco quando um
pequeno e viscoso líquido saltou do pau dele para sua boca, engoliu, engasgou-se um pouco e
tossiu.
Terei que me acostumar com isso. Pensou, limpando os lábios e lambendo os dedos.
Acho que vou gostar muito.
Hugh puxou-a para junto do peito, ainda com os olhos fechados, depois pegou as
cobertas, trazendo-as para cima dos dois, que mergulharam juntos num sono pesado sem dizer
mais nada.
Quando Margareth tornou a abrir os olhos, Mady a estava espiando, com ares de riso e
admiração. Com o dedo indicador sobre os lábios fechados, a criada fez um gesto de silêncio
para a condessa que esfregou os olhos e virou para o lado, certificando-se de que não era um
sonho a visão do homem forte dormindo ao seu lado. Ela não conseguiu conter-se e sorriu,
satisfeita consigo mesma.
— Traga o café para nós dois, aqui — cochichou para a criada que assentiu e saiu do
quarto aos pulinhos, sorrindo feito boba. Provavelmente logo a casa toda saberia que eles tinham
consumado o casamento.
Hugh sorriu quando abriu os olhos, confirmando para Margareth o que ela pensava desde
a noite anterior, seu sorriso era ainda mais bonito e terno e ainda mais avassalador.
— Bom dia — ela falou, curvando a cabeça para o lado e deixando a cabeleira loura
encaracolada cair sobre o ombro.
— Acho que ainda não é dia, volte para cá e vamos dormir mais um pouco — ele
resmungou bocejando.
— Meu estômago está roncando.
— Como você pode estar tão disposta? Eu me sinto acabado.
Margareth riu alto, compreendendo o cansaço dele por causa do esforço durante a noite.
Sorridente e cheia de energia, ela se deitou ao seu lado e começou a brincar com o abdômen
novamente, passando a ponta dos dedos em cada um dos gomos dos músculos.
— Você não se cansa, não é? — ele perguntou, arqueando uma sobrancelha.
— Não — ela admitiu, sentindo-se de repente um pouco inibida.
Margareth encolheu-se um pouco sem jeito e Hugh riu, puxando seu rosto e beijando-lhe
os lábios com ternura.
— Acho que você está querendo ficar viúva.
— Eu?
— Quer acabar comigo antes do café... — ele riu, passando as mãos sobre um dos seios
que começou a intumescer.
— Desculpe — ela resmungou, puxando o cobertor até cobrir parte do peito e dos
ombros.
— Não se desculpe. Gosto disso — ele confessou, tornando a beijá-la com mais
intensidade e já enfiando a mão grande e forte para o meio das pernas dela.
Margareth retribuiu o beijo, abrindo os lábios e deixando-o mergulhar a língua dentro de
sua boca. Ela gemeu de prazer quando ele colou seu corpo ao dela, roçando o pau já pronto para
tomá-la outra vez.
Os dois riram quando o estômago de Margareth roncou alto, acabando com o clima
sensual que tornava a tomar conta do quarto.
— Você está mesmo com fome — Ele rolou para o lado.
— Eu disse a você — respondeu, deitando-se sobre o peito do marido e fechando os
olhos. — Mas também estou com vontade de ser tocada por você. Fome de conde e fome de
comida.
Ele não disse nada.
— Nunca imaginei que pudesse ser assim — ela falou depois de um instante de silêncio.
— Assim como?
— Tão bom.
— Então deitar de olhos fechados e me esperar terminar não é mais uma opção?
— Nem pensar.
Hugh já estivera com mulheres fogosas antes, mas nenhuma chegara aos pés daquele
fogo natural e instintivo de Margareth, sua curiosidade e seu lado selvagem eram afrodisíacos
impossíveis de resistir.
— Você realmente gostou, não foi?
Ela arqueou as sobrancelhas pensando a respeito.
— Bom, no início doeu um pouco, mas depois... sim, gostei. Muito.
— Acho que não suportaria ficar casado com uma mulher que fechasse os olhos e
esperasse que eu fizesse tudo sozinho.
— Ótimo, pois tenho certas ideias...
Mady bateu à porta interrompendo-os. Margareth cobriu-se com o cobertor e Hugh
mandou a criada entrar. Ela vinha carregando uma bandeja com pães, frutas e chá. Fez uma
reverência perfeita quando entrou e colocou a bandeja sobre uma mesinha. Virou-se em silêncio
para a janela e abriu as cortinas, deixando a luz forte entrar no quarto.
— Devo voltar para ajudá-la a vestir-se, Vossa Graça? — a criada falou, com os olhos
voltados para o chão.
— Sim, mas antes preciso de um banho.
— Vou providenciar água quente. Com licença.
Quando Mady saiu batendo a porta, deu uma última olhada para a condessa e sorriu,
piscando discretamente para a jovem que enfiava um pãozinho na boca. Margareth retribuiu o
gesto terno e então tornou a olhar para Hugh que observava tudo em silêncio.
— Ela gosta de você, na verdade, todos os criados gostam.
— Nem todos — Margareth respondeu, fechando o cenho e lembrando-se de Aila.
Depois de alguns instantes sem dizer nada sobre a insinuação da esposa, Hugh
aproximou-se da mesinha e pegou o bule de chá, servindo-se de uma dose generosa.
Pensou em coisas para dizer para a esposa, sobre sua sensualidade, sobre sua deliciosa
entrega ao prazer e à descoberta, mas acima de tudo pensou em jurar-lhe que nunca mais
nenhuma outra mulher se deitaria em sua cama. Mas não disse nada daquilo. Tomou um gole,
apreciando o aroma forte do chá, depois pegou um pãozinho e mordeu. Estava macio e quente e
se desmanchou na boca.
— Acho que uma das melhores coisas que existem são esses pãezinhos — Margareth
falou com a boca cheia, de repente recuperada da lembrança de Aila e decidida a não se deixar
abalar mais.
— Isso e a torta de frango que a cozinheira faz.
— Hum... deve ser boa.
— Preciso pedir uma coisa a você — de repente ele se lembrou.
— O que é?
— Sobre a recepção que daremos nos próximos dias.
— Bem lembrado, tenho muito a fazer sobre isso...
Hugh olhou-a sério. Ela arqueou a sobrancelha desconfiada.
— O que o preocupa?
— Preciso que ela seja impecável. Meus negócios dependem muito do que acontecer
nesse dia.
— Então, será impecável.
Com um novo sorriso nos lábios, Hugh largou o chá sobre a bandeja e puxou Margareth
para junto de si. Ela entregou-se ao beijo com voracidade. Os dois fizeram amor com a mesma
intensidade da primeira vez, descobrindo as sensações e se deixando levar pelo prazer.
Quando finalmente Margareth desceu as escadas e foi à cozinha, perto do meio-dia,
estampava um sorriso grande e travesso e as faces ruborizadas. Hugh já havia saído para algum
evento da região e Mady andava de um lado para o outro na cozinha principal, cochichando,
rindo e dando pulinhos. Ao ver a condessa, todos se endireitaram e fizeram a rotineira
reverência.
— Bom dia — a condessa declarou simplesmente, deixando as saias farfalhantes
amassadas ao se jogar sobre o enorme banco de madeira que ficava um pouco afastado da mesa.
— A senhora precisa de alguma coisa, Vossa Graça? —Mady perguntou, sem esconder
sua alegria.
— Que você pare de rir feito uma maluca — Margareth respondeu, caindo na risada
também. — Meu Deus, Mady, você nem disfarça.
— Sinto muito, vossa Graça.
— Sei, sei... vamos fingir que acredito.
Seu humor reverberou pelas paredes e todos a olharam com extrema simpatia. Se ela de
mau humor já era bastante aturável, de bom humor então era simplesmente magnífica.
— Onde está a Sra. Garden?
— Foi à cidade encomendar as coisas que a senhora pediu para a recepção. Algumas
precisam ser pedidas com antecedência para evitar transtornos.
— Não tenho dúvidas de que uma encomenda do conde será atendida... — Margareth
ponderou. — Lembrou-se então de que esquecera o que tinha de falar com o marido, se bem que
não tinha mais importância, com certeza não precisaria se preocupar com a forma como ele a
trataria diante dos outros, agora, suas preocupações pareciam tão sem importância, parecia que
finalmente estava dando tudo certo.
Ela correu os olhos pela enorme cozinha e falou, os imensos olhos azuis muito sérios na
direção de Mady.
— Onde está Aila?
Mady arregalou os olhos.
— Mande-a arrumar meu quarto e limpar... bem, você sabe o quê.
— Não vai ser possível, Vossa Graça.
— Ora, não me diga que aquela criatura horrorosa ficou doente?
— Não, nada disso.
— Então o que foi? Pare de me enrolar e comece a falar.
— Ela não está mais aqui.
— O quê?
— Bom, a primeira coisa que o conde fez hoje cedo foi dispensá-la. Ela partiu há menos
de uma hora.
Margareth engasgou com o chá.
— Não me diga.
— Sim, ela chorou e implorou, mas o conde foi firme e a mandou partir imediatamente.
Cena lamentável.
— Mas que maravilha!
Mady sabia o porquê de a condessa odiar a criada. Na verdade, não havia na propriedade
quem não soubesse das visitas que ela fazia à cama do conde e mais, muitos sabiam da afronta
que Aila vinha fazendo à dona da casa.
Dispensá-la era só uma questão de tempo e apesar da cena ter sido bastante triste e
comovente, Mady achava que havia sido merecida. No lugar de Margareth, ela mesma teria
expulsado Aila e ainda lhe acertado várias bofetadas durante o processo, mesmo que isso
provocasse um escândalo por toda Londres.
Mas ela não era a condessa e Margareth, que apesar de exultante, tentou demonstrar ao
máximo alguma indiferença, embora ficasse nítido o que ela realmente sentia. Estava aliviada e
finalmente podia se sentir a esposa do conde e a dona da casa.
Mady a admirava, era inegável sua classe. Mas era ainda mais inegável sua força e
resiliência. Era mesmo a mulher perfeita para ser chamada de condessa, digna do dono
impetuoso da propriedade, à altura daquela luta. E se alguém podia vencer as barreiras do conde
e transformar a casa de campo em um lar, Mady tinha certeza de que essa pessoa era Margareth e
ela torcia muito por isso.
Nos dias que se seguiram, Margareth não poderia se sentir mais radiante. Sempre
sorrindo, esbanjava energia e vivacidade pela mansão, deixando todos contagiados pela frenética
movimentação em prol dos preparativos para a recepção. Pela primeira vez em semanas, desde o
casamento, Margareth sentia-se realmente a dona da casa.
Se a condessa era muito diferente da maioria das mulheres da nobreza, falando com os
criados, fazendo-os olhar em seus olhos e por vezes comendo perto deles, o conde não ficava
atrás, tão selvagem e cuidadoso com tudo. Enquanto ele comandava suas propriedades com
punhos firmes, sem depender de capatazes e criados, Margareth agitava as coisas na mansão
igualmente. E as noites... as noites ardentes vinham se tornando uma regra do casamento com o
conde.
A senhora Garden estava exaurida quando Hugh chegou. Sentada em um canto da imensa
cozinha, abanava o rosto avermelhado com uma das mãos e esfregava os pés um no outro, de
molho em uma bacia com água quente. Já era noite e Hugh achou a cena engraçada.
— Boa noite, Vossa Graça — ela falou, apressando-se a se levantar.
— Não se incomode — Hugh declarou, sempre tão condizente com a própria
personalidade e não com o título nobre. — Descanse seus pés, imagino que estejam precisando.
Ela corou.
— Foi ideia da condessa... ela acha que vai ajudar.
— Margareth? — ele surpreendeu-se, embora não devesse, afinal, ela era sempre assim,
sempre cheia de ideias e pequenas surpresas.
— Sim, a condessa é muito generosa, uma moça muito surpreendente.
— Realmente.
— O senhor deseja alguma coisa?
— Não, vou direto para o quarto... — respondeu e ela abriu um sorriso discreto e
passageiro, sabendo que o senhor da casa tinha praticamente se mudado para a suíte da condessa.
O bom humor de Hugh era outra novidade da casa. Desde que Margareth e ele haviam
finalmente consumado o casamento, não se passava uma manhã sequer que as criadas não o
encontrassem dormindo ao lado da esposa e sempre com o temperamento muito mais sereno e
calmo, ao que tudo indicava, a jovem condessa estava mesmo domando a fera.
Se por um lado a disposição da condessa as deixava exaustas, por outro, o bom humor do
conde era compensador. Nunca se viu um período de mais agitação e paz simultâneas naquele
casarão e todos estavam aproveitando.
Se durante o dia Margareth quase chegava a tombar pelo cansaço e peso das saias,
durante a noite, nua diante do marido, sentia-se revigorada e disposta a entregar-se às investidas
de Hugh e à própria curiosidade e desejo, deleitando-se com as novas e prazerosas descobertas.
E assim, os dois foram passando e tudo parecia estar entrando nos eixos, tudo parecia
funcionar com perfeição.
Hugh estava sentado diante de uma mesa do clube de cavalheiros de Londres, um charuto
entre os dedos e os pensamentos absortos nos contornos de Margareth, que insistiam em transitar
por sua memória. Aquilo o estava consumindo. Com tantas coisas em que pensar e tantos planos
a colocar em prática, como ele só conseguia pensar nela?
Leonard, o jovem nobre que o seguia para todo canto, chegou sorridente como sempre,
irradiando jovialidade e dispensando cumprimentos muito formais.
—Hugh, meu amigo conde — o rapaz praticamente cantarolou, ignorando qualquer tom
de etiqueta e beirando a vergonha pela intimidade. Hugh gostava do garoto.
— Leonard, como vai, rapaz?
— Melhor agora. Você está sumido. Tudo bem?
— Nunca estive melhor — Hugh soltou sem pensar e sua voz soou tão natural que
surpreendeu até mesmo ele.
— Pelo jeito, o casamento não é tão mau como alguns insistem em dizer.
— Não, não é. — Lembrou-se de Margareth gemendo na noite anterior enquanto ele
percorria seu corpo com a língua, o princípio de uma ereção o fez remexer no lugar e Leonard
sorriu, contrafeito.
— E como é ter uma senhora como companhia?
— Confesso que às vezes fico quase louco com tantas conversas, mulheres gostam de
conversar sobre tudo, mas todo o restante compensa. — Hugh deu um tapinha no braço do
jovem.
— Pois imagino. Não se fala em outra coisa nos chás da tarde.
— O quê?
— Pelo seu sumiço de Londres, todos esperam em breve um herdeiro dos Ruthenford.
Ele pensou por um momento. Se todos estavam falando dele, significava que seu
casamento havia provocado muita comoção. Exatamente como ele esperava. Agora, era apenas
uma questão de tempo até conseguir tudo o que queria.
Hugh teria sua vingança.
E se Margareth fizesse exatamente o que vinha dizendo que faria, uma recepção para
nunca ser esquecida pela Inglaterra da rainha Victória, seus planos se concretizariam antes do
que havia programado.
Na manhã da recepção, algumas semanas haviam se passado desde a cerimônia do
casamento e a casa fervia de expectativa enquanto os criados iam de um lado para o outro
terminando os preparativos.
Tudo parece estar correndo exatamente como devia.
Hugh estava ainda mais bonito em seu fraque com o peito estufado. Margareth pulava na
cama, ainda de camisola, os cabelos soltos caindo feito cascatas sobre os ombros e sobre as
costas. Sorria exultante. O rosto angelical apenas substituído pelo ar sedutor e desejoso.
— Você sabe que ainda é muito cedo, não sabe? — Tagarelou animada, mordendo o
lábio inferior e pensando em como poderia se fazer entender melhor. Será que precisaria tirar a
roupa?
Ele não respondeu de imediato.
— Hugh, você está bem?
— Desculpe-me, o que você disse? — perguntou, perdido em um turbilhão de
pensamentos.
— Eu disse que você podia voltar pra cama. Ainda temos o dia todo pela frente e não
estou pronta para encarar Londres ainda.
— Exatamente. Temos o dia todo. Acho que vou enlouquecer.
O conde começou a andar de um lado para o outro, mal havia na noite anterior e
Margareth percebia o quanto ele parecia cansado e tenso. Havia algo por trás daquilo, ela só não
conseguia perceber o que era. Ainda.
— O que o preocupa tanto?
— Essa maldita recepção.
— Ainda podemos cancelar. Quem se importa com esse bando de fofoqueiros e
preguiçosos?
— Não! — o conde adiantou-se, pegando a esposa pelos braços e olhando-a com
tormento. — Não cancelaremos e será perfeito.
Com um olhar determinado, Margareth desvencilhou-se das mãos do marido e passou os
braços em seu pescoço. Primeiro tirou a casaca de Hugh e em seguida apressou-se a despir seus
ombros do restante do fraque.
— Vai ser perfeito, meu conde — sussurrou, dominando-o com seu jeito doce. — Vai ser
tão perfeito quanto isso... — Quando finalmente o peitoral torneado e cheio de ondas apareceu,
ela sorriu.
Hugh ameaçou protestar, mas Margareth olhou-o de esguelha e arrancou a própria
camisola, deixando o corpo à mostra. No começo, se sentira inibida com o próprio corpo,
tentando lidar com a insegurança herdada por anos de discussões com a mãe por seu corpo mais
robusto.
Agora, no entanto, sentia-se feliz com o que tinha, Hugh adorava seus seios grandes e sua
bunda cheia, e suas palmadas já não eram assustadoras, pelo contrário, eram como brasa que a
acendiam.
Com carinho, a condessa pegou a mão do marido e colocou sobre seu seio, sentindo o
bico endurecer e a pele rosada ao redor ficar levemente mais firme e com pequenas veias
excitadas. No mesmo instante, o ponto entre suas pernas chiou, desejando-o.
Depois, ela o beijou no pescoço e puxou-o para a direção de sua virilha. Hugh gemeu,
meio consternado e meio excitado. Se ele chegava furioso da rua, ela tirava as roupas e colocava
seu pau nos lábios, deixando-o esgotado demais para ficar irritado.
Se ele chegava animado, ela deitava-se de costas e deixava-o penetrá-la como um
furacão, apertando sua bunda redondinha e gemendo em resposta aos apertos no seio. Naquele
momento, porém, ele estava tenso e confuso e ela, como vinha virando rotina, o estava seduzindo
e acalmando do seu próprio jeito.
Fizeram amor ali mesmo, meio sobre a cama nova que fora instalada apenas dois dias
depois de consumarem se casamento e meio de pé. No fim, Hugh estremeceu, os olhos fechados
entregues ao que Margareth quisesse.
Se naquele momento ela pedisse, ele desistiria de tudo. Mas ela apenas sorriu, aninhou-o
em seu peito e acariciou seu cabelo, ciente de que havia algo acontecendo dentro dele e que ela
não tinha como resolver até que ele permitisse.
— Quando você estiver pronto para conversar, estarei pronta para ouvi-lo — sussurrou,
brincando com os pelos do peito dele.
Estranhamente, aquilo acalentou o coração do conde e ele deu um suspiro pesado, o tipo
de suspiro que se dá quando algo muito pesado está sobre suas costas.
Ela sabia, pressentia que algo o atormentava e ao invés de enchê-lo de perguntas, preferiu
apenas deixá-lo ciente de que o compreendia e estava disposta a escutá-lo, se assim o desejasse.
Algo naquela mulher o deixava estarrecido e ao mesmo tempo envolvido e com esse
pensamento cutucando sua cabeça, ele relaxou e dormiu até perto da hora do almoço.
Margareth mandou servir uma refeição farta para o marido, com tudo que um homem
poderia desejar num dia como aquele. Depois, sentou-se silenciosamente à mesa e o
acompanhou. Hugh estava faminto e sentia-se, de repente, muito revigorado da ansiedade e
tensão, pronto para o que quer que tivesse de enfrentar.
— Já disse que você é uma megera? — Ele sorriu, acariciando os dedos da esposa e
bebericando uma taça de vinho.
— Algumas vezes. Mas a que devo a honra de mais este amável insulto? — ela retrucou,
pronta para desferir uma resposta à altura mesmo que em tom de brincadeira.
— Você sempre consegue o que quer, não é? — ele a provocou, olhando descaradamente
para seus seios sob o babado do vestido florido.
— Sempre — ela respondeu, aproximando-se dele e acariciando sua virilha. — E trate de
não me provocar, vossa graça, ou vou acabar querendo muitas coisas do senhor ainda.
Hugh alteou uma sobrancelha e sorriu. Não havia ato que esgotasse as energias daquela
mulher. Isso era excitante.
— E como estão as coisas para a recepção?
— Em ordem — ela respondeu com tranquilidade. — Não se preocupe, tudo vai correr
bem.
Margareth piscou os imensos cílios que cintilavam sobre o azul céu de seus olhos. Hugh
sentiu o desejo percorrer seu corpo mais uma vez, começando a acreditar que talvez estivesse
mesmo ficando louco e a única culpada disso fosse Margareth. Depois da rejeição na noite de
núpcias, ela praticamente se tornara sua objeção por um motivo, ele queria possui-la, estender
seus domínios por todo o corpo de prazer da esposa, mas agora tudo indicava que era ela quem o
possuía e ele não fazia sequer ideia de como tudo tinha se transformado tanto em poucas
semanas.
Já era noite quando os primeiros convidados começaram a chegar. Muita elegância
envolvia o ambiente. O salão de festa estava iluminado e um aroma de lavanda era dispersado
por um incenso que Margareth encomendou de um comerciante francês.
Uma orquestra tocava uma melodia suave quando o primeiro lorde e esposa cruzaram a
porta e foram anunciados pelo lacaio. O vestido da mulher era cheio de babados e o corpete
sufocante davam-lhe uma cintura muito fina.
Apesar da roupa elegante e do corpo todo delicado, ela exibia um olhar austero e julgador
que fez com que os criados se sentissem oprimidos pela primeira vez em muito tempo.
Sua senhora era muito diferente daquilo, ela esbanjava alegria e vivacidade e mesmo
quando estava irritada ou resmungando ainda era gentil e meiga. Pelo jeito, não seria a noite mais
fácil para ninguém ali.
Mesas se espalhavam pela lateral do ambiente e pequenos quitutes requintados começaram
a ser servidos tanto no jardim quanto no salão. Garçons cruzavam o ambiente discretamente,
abastecendo os copos que não paravam de surgir, à medida que a noite começou a avançar e mais
gente chegou.
Em algumas horas, o local estava cheio e abafado por falas animadas e cheiro de charuto.
Muitas mulheres permaneciam juntas, empoleirando-se com suas crinolinas e anáguas sobre os
assentos especialmente comprados para aguentar o peso dos vestidos e do humor.
A maioria cogitava em que momento o casal anfitrião deveria chegar. Claro que aquilo
era um tipo de afronta, os anfitriões não estarem no salão enquanto seus convidados chegavam e
muitos comentavam em baixo tom o quão desagradável podia ser a presença do conde, já que ele
era conhecido por seu jeito rude e nada amigável. Outros mensuravam a possibilidade de a jovem
esposa estar se recusando a descer para a festividade, assustada ou até mesmo machucada por
alguma briga com o marido que, na certa, deveria ser muito violento. Talvez ele a estivesse
espancando, ou mantendo-a presa em um tipo de calabouço. Tudo era sussurrado em vozes
baixas, contidas apenas pelo decoro imposto pela sociedade.
No quarto de Margareth, Hugh andava de um lado para o outro, os olhos afoitos e as mãos
suadas.
— Pelo amor de Deus, Hugh, pare de andar, você está me deixando tonta.
— Não consigo, isso vai ser um fracasso, já deveríamos estar lá embaixo. Pense o que
devem estar falando agora...
Margareth caminhou até Hugh e com seu sorriso mais doce acariciou o rosto forte e bem
delineado do conde.
— Deixe que falem. No momento certo, desceremos aquelas escadas. Você é um conde e
não um lorde qualquer. Vamos deixar claro sua superioridade esta noite e fazê-los entender que é
você quem dita como as coisas são.
Ele arqueou as sobrancelhas e ela sorriu.
Um criado bateu à porta instantes depois e cochichou que o duque Paxton já estava no
salão. Era assombroso como ela podia ser ainda mais feroz do que ele. Quem diria que partiria da
esposa tão doce e ingênua a ideia de afrontar um duque ao deixá-lo esperando... Hugh olhou para
a esposa, que assentiu
— Seria agora o momento?
Margareth caminhou bem devagar em sua direção, esperou que ele cedesse o braço e
pegou-o. Ela estava deslumbrante e, ao descer as escadas com o conde, arrancou suspiros por
todo o salão. Seu sorriso era incrível, e os dois se olhavam a todo instante. Com toda certeza
aquela entrada era espetacular, exatamente como ela havia planejado quando o marido
confessara, no meio da noite, que tinha um inimigo que queria derrotar, a família Paxton.
Hugh vestia um fraque e com elegância fenomenal deixou a cartola sair de sua cabeça para
as mãos do lacaio, que os recebeu ao pé da escada. Com os olhos verdes faiscantes, ele sorriu
para Margareth quando ela apertou seu braço de leve, antes de completar o trajeto da escada.
— Você está linda — ele cochichou ao seu ouvido, provocando um novo e honesto sorriso
na esposa. — Roçou os dedos sobre as luvas brancas de Margareth antes de cruzarem o salão
com a graça e a superioridade da realeza.
Algumas damas começaram a cochichar, evidenciando a beleza do vestido da condessa e
as joias caríssimas com que, provavelmente, o conde a havia presenteado. Sem contar que
Margareth parecia flutuar nos braços dele, como se nada no mundo existisse além de os dois.
A condessa de Surrey desfilou com seu lindo vestido drapeado em creme, com mangas
recatadas e babados sobre o peito farto. Os cabelos presos no alto deixavam algumas mechas
encaracoladas caírem revoltas sobre o pescoço longo, onde um colar com diamantes exibia a
riqueza do casal. Um deleite que atiçou até os olhos dos mais velhos.
A cobiça não demorou a aparecer, tanto nos homens quanto nas mulheres. Todos queriam
um momento com o conde ou com a condessa e todos queriam entender o que é que estava
acontecendo entre os dois, afinal.
Todos em Londres falavam que o casamento deles ia de mal a pior, cogitavam até mesmo
violência matrimonial, mas ali estavam rostos que desmentiam quaisquer boatos sobre sua união.
Ali surgiam sorrisos de prazer e alegria genuína e isso deixou a todos em suspenso.
Margareth não parou de sorrir, nem mesmo quando seus olhos cruzaram o salão e
depararam-se com o raivoso olhar do duque Charles Paxton. Ele fuzilava Hugh com intensidade
e, à medida que o conde exibia sua linda e jovem esposa, o homem parecia mais amargo e
rabugento, encolhendo-se em sua papada desproporcional, que o deixava tremendamente
malvestido no fraque.
Se o filho podia ser intragável e desgastante, o pai era ainda pior e Margareth não soube
identificar se o olhar de ódio do duque se dava porque toda a atenção dos convidados migrava
dele para seu marido, ou se havia algo mais ali, algo profundo e antigo, forte demais para ser
abafado pelo tempo.
Ela queria descobrir, mas não podia perguntar naquele momento, então apenas resmungou.
— Aquele duque horroroso não tira os olhos de você.
Hugh a enlaçou para a valsa.
— Deve estar com inveja — ele respondeu, olhando para Charles Paxton com desdém.
— E aquela esposa dele, por Deus, como alguém pode ser tão intragável?
— E feia.
Os dois riram com a maldade de seus comentários.
— Não sei o que há entre vocês, mas como desafeto da nossa família, faço gosto de deixá-
lo com mais raiva — Margareth declarou ao passar os braços pelos ombros do marido para a
dança.
A valsa começou e passaram a mover-se pelo salão com destreza, cochichando e falando
mal do duque e sua esposa, que parecia ainda mais zangada do que ele.
A valsa os deixou ainda mais em evidência, porque não havia nenhuma alma viva naquele
salão que não fosse capaz de perceber que aqueles dois estavam realmente aproveitando o
casamento.
No decorrer da festa tudo saiu com perfeição, exatamente como ela esperava que fosse.
Hugh, ao longe, sorria e fumava um charuto falando com um jovem de rosto ansioso e animado e
mais alguns cavalheiros que pareciam com inveja de seus ares juvenis.
Margareth bebeu um gole de vinho, admirando por mais alguns instantes o marido bonito e
sensual com quem vinha apreciando muito a vida de casada. Não percebeu quando uma dama se
aproximou e ficou encarando-a.
— Pelo jeito, ao contrário do que alguns entre nós poderiam imaginar, ser casada com o
conde de Surrey não é de todo ruim.
Margareth virou-se sobressaltada e quase cuspiu o vinho quando percebeu que a senhora
ousada que lhe dirigia a palavra era, na verdade, a esposa do duque Charles Paxton.
Definitivamente, de perto a mulher era ainda mais feia, com os olhos caídos e uma papada
grossa sobre a gola do vestido, os seios pareciam abaixo da linha correta e a protuberância de seu
ventre poderia ser facilmente confundida com uma gestação. Embora a idade dissesse que não.
— Não posso me queixar — Margareth respondeu de súbito, tentando organizar os
pensamentos e curvando-se numa reverência discreta e delicada, já que estava diante de uma
duquesa.
É claro que ela sabia que o marido não a repreenderia por algum pequeno deslize e como
ele também não suportava aquele duque e sua esposa, talvez, mas só talvez, ela pudesse se dar ao
luxo de responder como aquela verdadeira megera merecia.
— Algumas pessoas consideraram uma afronta vocês dois não estarem presentes quando
seus convidados chegaram...
— E a senhora, o que achou? — Margareth quis saber, aproximando o rosto da mulher, de
forma intimidante.
— Inexperiência e falta de prática em receber a sociedade.
— Oh, Mas a senhora me toma com muito carinho — a condessa dissimulou com um
sorriso inocente brotando em seu rosto.
A mulher não disse nada.
— Sabe, meu marido é um conde, ele só faz o que quer — Margareth deu de ombros. —
A senhora deve compreender muito bem isso, afinal, o seu é um duque.
— Sim, sei como é.
— Pois bem...
A duquesa já começava a dar-se por satisfeita, como se tivesse sido vitoriosa ao
confirmar a brutalidade e a selvageria do conde, quando Margareth tocou o rosto, fingindo corar.
— Posso confidenciar uma coisa à senhora?
A mulher assentiu, curiosa demais para se negar.
— Imagine que eu já estava pronta para descer e receber meus adorados convidados,
quando meu marido resolveu averiguar se eu estava vestida adequadamente — Margareth sorriu
e a mulher bufou, consternada.
A condessa apontou para onde Hugh, em toda sua boa forma e carisma, atraía mais
homens para a conversa.
— Imagine que descobri que meu marido tem um grande interesse pelas roupas íntimas
femininas. As minhas, em especial...
A duquesa avermelhou seu rosto inchado, perplexa demais para falar. Margareth tinha ido
longe demais até para ela mesma. Se todos já a chamavam de voluntariosa e ao marido de
selvagem, agora então tinha jogado o decoro para o diabo e aprontando uma das boas.
— Devo dizer que nunca imaginei que ser casada com um homem forte e bonito poderia
ser tão bom. Há semanas que mal durmo e é por isso que não estava aqui quando meus
convidados chegaram... estava ocupada com as vontades do meu esposo... e ele tem muitas
vontades.
— Oh! Garota insolente — a mulher resmungou, afastando-se com o rosto muito
vermelho.
— Velha bruxa — Margareth soltou baixo para que só ela mesma escutasse.
Uma dama, beirando não mais que vinte anos parou ao lado de Margareth logo que a
duquesa saiu bufando e reclamando. A garota tinha lindos olhos jovens e um corpo muito bonito,
apesar de muito magro. Fez uma reverência respeitosa e sorriu, esperando que Margareth
consentisse sua fala.
— É a festa mais bonita em que já estive — disse sonoramente.
— Isso é muito amável de sua parte — Margareth sorriu, reparando na honestidade da
garota.
A menina virou seus olhos caramelos na direção do jovem que conversava com o conde.
— Na certa você já dançou com muitos cavalheiros esta noite. Sendo tão bonita... —
Margareth começou a dizer, mas parou ao notar um suspiro de hesitação na jovem.
— Posso fazer uma pergunta sincera à senhora, condessa?
— Desde que você me chame apenas de Margareth...
A garota animou-se, encantada com o charme e a doçura de Margareth.
— Como a senhora fez para conquistar o conde? Sabe, ele é um homem muito importante
e eu cheguei a pensar que nenhuma moça jamais conseguiria levá-lo ao altar, mas a senhora
conseguiu e ele parece adorá-la.
Margareth pensou a respeito.
— Para ser sincera, não sei. Acho que no início tentei fazer o contrário.
— Gostaria de ter essa sorte.
Margareth se compadeceu da garota. Ela estava encantada com o jovem bonito que
seguia Hugh em direção às duas. Com as faces muito coradas, a garota encolheu-se quando os
dois pararam diante da anfitriã da festa. Margareth notou e pensou que talvez pudesse ajudar um
pouco e ela estava mesmo com humor para isso.
— Querida, deixe-me apresentá-la ao meu amigo, o jovem Marquês de Hartington – disse
o conde.
— Por favor, me chame apenas de Leonard, não gosto muito dessas formalidades.
— Leonard logo terá que se acostumar com essas formalidades, afinal, é o filho mais
velho do Duque de Devonshire.
— Oh! Por isso o reconheci. Como vai Leonard? — Margareth sorriu, reverenciando de
forma espetacular.
A jovem ao seu lado repetiu o gesto, com o rosto muito corado.
— Leonard é com certeza um grande amigo. — Hugh disse, o semblante sereno e
honesto que cativou ainda mais a esposa.
— E depois do meu esposo, o jovem mais bonito do salão.
Os dois homens sorriram, admirados com a delicadeza e destreza de Margareth que podia
elogiar daquela forma sem despertar nenhum tipo de crise social.
— Se o senhor, meu esposo, me permitir, preciso de uns instantes de sua atenção com
algo sobre a recepção.
Hugh alteou a sobrancelha e Margareth lançou um olhar de tédio que o alertou de sua
impaciência.
— Será que você me faria um favor, querida? — Margareth falou para a jovem de quem
nem mesmo se lembrava o nome. — Dê atenção ao amigo de meu esposo e seja gentil com ele
aceitando uma valsa. Ele é um convidado muito importante.
— Claro, vossa graça — a garota reverenciou, enquanto Margareth puxava Hugh pela
mão, sorrindo e falando sobre a beleza da noite.
Os dois jovens ficaram conversando e Leonard sorriu quando a garota, um pouco
encabulada, aceitou a valsa. Os dois logo deslizavam pelo salão, diante de muitos olhares
curiosos.
— O que foi? — Hugh puxou Margareth para um canto, os olhos preocupados.
— O que foi o quê?
— O que aconteceu? Você disse que precisava falar comigo...
— Ah... não foi nada, só queria dar espaço para os dois se conhecerem — ela respondeu,
dando de ombros.
Hugh não conseguiu conter o sorriso, passou os braços pela cintura da esposa e mesmo
sabendo que aquele gesto poderia ser mal-recebido pelos membros da sociedade, beijou-lhe o
pescoço e o rosto e afundou o nariz no seu pescoço, arrepiando-a por completo.
— Não fazia ideia de que além de uma excelente anfitriã, você poderia ser uma
casamenteira.
Ela retribuiu com outro de seus sorrisos largos que deixavam qualquer um à sua volta
desmanchado. Então, instantes depois, avistou o duque e a duquesa saindo da festa com ares de
ultraje. Apontou com a cabeça para o casal e fez um olhar de culpa.
— Acho que provoquei a partida deles — Margareth confessou.
— Por quê?
— Porque não resisti à provocação daquela bruxa e respondi à altura.
Hugh alteou a sobrancelha. Margareth suspirou e então contou de forma resumida o que
havia dito à mulher intragável, que ambos conheciam como duquesa de Paxton.
— Você sabe que ela falará mal de você por anos, não sabe? — ele disse, tentando conter
o riso. — Não importa o que tenha dito a ela.
— Não me importo, aquela mulher é horrenda. Não consegui evitar, me desculpe.
— Talvez eu tenha dito uma ou duas coisinhas sobre nós ao duque, também.
— Não sei qual de nós é pior, Hugh.
— Suponho que descobriremos quando os boatos começarem.
Sorrindo, os dois voltaram para a pista de dança, onde um lacaio indicou à orquestra para
tocar outra valsa. Dançaram arrebatados, esquecendo-se de tudo à sua volta.
Quando finalmente não havia mais nenhum convidado na casa, os dois deitaram-se na
cama, no quarto de Margareth, esgotados. Pelo menos até parte da manhã seguinte, quando já
haviam recuperado uma boa dose de energia e se esbaldaram um no corpo do outro.
Margareth acordou sentindo muito frio. Chamou Hugh e os dois enfiaram-se sob as
cobertas. A lareira não estava acesa e o frio poderia deixar qualquer sujeito forte doente. Ela não
precisava de outra noite à beira da morte pelo motivo que fosse, portanto, não fez cerimônia ao
colar o corpo ao do marido. Aninhada, não demorou a pegar no sono outra vez. Em semanas, foi
a primeira noite que dormiu sem qualquer preocupação, numa cama usada unicamente por eles.
Pela manhã, já estava recomposta e não o deixou sair da cama até a hora do almoço,
gemendo alto e gritando o nome de Hugh cada vez que ele a levava à loucura.
Quando desceu as escadas para a refeição, Hugh sentia-se quase tão cansado quanto
quando se deitara na noite anterior, depois da festa.
Margareth por outro lado, reluzia de felicidade e cantava dentro da banheira cheia de
água quente e óleo de flores que Mady, aos risos, preparara. Para qualquer um ali estava bastante
claro: quando Hugh estava com olheiras, estava de bom humor e Margareth era, sem sombra de
dúvidas, a única causa para isso. Se ela cantava, ele sorria e à noite, voltavam a dividir a mesma
cama. A conta era simples e todos na casa aprenderam a somar aqueles pontos.
Cerca de duas semanas se passaram desde a recepção que Margareth providenciara e que
havia sido simplesmente fenomenal. Desde então, não se passava um dia que não chegasse um
convite para chá, jantares e almoços em clubes, além de bailes. Não havia quem, na sociedade
britânica, que não sonhasse em ter o casal mais ousado e comentado do momento desfilando em
algum evento seu. Mas Hugh só pensava em uma coisa: Vingança.
Naquela tarde, ele se com elegância e foi para o parlamento. Há um bom tempo que não
cumpria com suas obrigações de conde e não podia adiar mais.
Embora ainda pudesse usar como argumento o recente casamento para ficar afastado,
queria e precisava voltar a participar das atividades da Câmara dos Lordes. Se tudo tivesse
corrido como esperado, sua popularidade com aqueles homens fúteis e egocêntricos teria subido
muito, graças ao sucesso da atuação de sua jovem esposa e da exuberância da recepção que
deram.
Havia apenas um empecilho a ser superado, a família Paxton.
A reunião de homens foi acalorada, com lordes que bufavam e gritavam, discutiam uns
com os outros e com o nada. As paredes do enorme salão do parlamento pareciam estar recuando
para o centro da sala e Hugh sentia-se à beira de sufocar.
Sempre gostara da vida ao ar livre e ser obrigado a ficar enfurnado naquele local, com
aqueles homens desagradáveis, que gritavam e fumavam seus charutos fedorentos, provocava
uma vontade enorme de abrir um buraco no chão e se esconder do mundo, até que tudo estivesse
acabado.
Para piorar ainda mais sua situação, Paxton estava com um excelente humor e não perdia
a oportunidade de irritar Hugh, jogando quantos lordes pudesse contra as aclamações do conde.
Na verdade, nada daquilo realmente importava, nada que aquele duque frustrado fizesse
realmente poderia atingir Hugh.
Por que a verdade era apenas uma: ele não tinha nenhum interesse real nas coisas ali, mas
aproximar-se daqueles homens, descobrir suas fraquezas e derrotá-los era um percurso longo que
ele tinha que trilhar ali.
Cada novo veto que Paxton conseguia contra Hugh, cada novo aliado roubado, era uma
linha tensa que se formava no rosto do jovem e selvagem conde.
Se as coisas continuassem daquela forma, só uma coisa poderia resolver o problema.
Hugh não era dado a desaparecer com pessoas, pelo menos não da forma como ele vinha
pensando em fazer com aquele duque maldito, que sempre se interpunha em seu caminho. Se o
momento em que isso fosse necessário chegasse, ele teria de ser cuidadoso.
Mas uma coisa Hugh não podia negar, adoraria apertar aquele pescoço papudo até que o
ar sumisse completamente das bochechas rechonchudas e suadas de Paxton. E ele tinha muitos
motivos para querer fazer isso. Motivos herdados pelo pai.
Hugh afundou no banco ao lado do jovem Leonard, que tinha seu primeiro grande discurso
naquele dia.
— Se não fosse por você, eu já teria dado o fora daqui — Hugh deixou escapar para o
garoto que misturava expressões de medo, ansiedade e alegria.
— Você não imagina como fico grato.
Hugh apenas sorriu, dando um tapinha de leve nas costas do garoto. Era um bom rapaz,
cheio de energia, vigor e um futuro brilhante pela frente. Uma pena Hugh ter que usá-lo para
conseguir alguns de seus propósitos.
O difícil seria suportar mais tempo daquilo.
— Está concluído então. Sua menção foi negada, Conde de Surrey — Paxton falou,
abrindo um sorriso maldoso e olhando diretamente para Hugh.
Hugh levantou-se furioso, bateu com os punhos na mesa e sentiu que sua cabeça ia
estourar. Vermelho, saiu furioso, deixando a reunião e uma porção de olhares confusos.
No caminho para casa, enquanto o cocheiro teimava com um par de cavalos bem nutridos
e lutava com os sacolejos provocados pela rua de chão batido que desembocava na imensa
propriedade de Hugh, o conde vinha completamente entretido pelos pensamentos irados
direcionados para o maldito duque Paxton, sem se importar com mais nada.
Aquela erva daninha parecia estar ciente de sua vontade de esganá-lo e por isso o
provocava ainda mais. Mas Hugh estava decidido, daria um jeito naquela maldita criatura feia e
desgraçada. Depois disso, tudo finalmente entraria nos eixos e poderia concluir seus planos.
O jovem lacaio abriu a porta da charrete e tossiu para chamar a atenção de Hugh.
Demorou alguns segundos para que ele compreendesse que já estavam em casa. Desceu
cambaleante e se pegou cobrindo o rosto com o braço, quando o sol avermelhado de final de
tarde o tomou de susto e o cegou.
— O senhor ainda vai precisar da carruagem? — o criado quis saber, baixando os olhos
para o chão e deixando os ombros penderem desajeitados.
— Não — Hugh resmungou, afastando-se do jovem, que soltou o ar dos pulmões assim
que o conde mergulhou na residência pela porta central.
Margareth abriu um sorriso terno ao ver o marido entrar na sala. Sua vontade era correr
para seus braços, mas não o fez ao perceber seu olhar quadrado, vincado numa expressão dura
que misturava desespero, angústia e fúria.
Resignou-se apenas a segui-lo pela escadaria enquanto ele bufava e suspirava pesado a
cada novo passo sobre os degraus. Não disse uma única palavra durante o trajeto curto que
fizeram até o quarto dele.
Margareth sentia-se inquieta e tensa. Já o vira furioso muitas vezes, mas nunca com uma
expressão tão forte como aquela. Havia algo mais ali. Algo que a desesperava pelo simples fato
de perturbá-lo. Ela queria perguntar, ansiava por aconchegá-lo em seus braços, acariciar seu
rosto e beijar-lhe os lábios, mas não o fez, permanecendo em silêncio, enquanto Hugh arrancava
as roupas com fúria.
Geralmente um lacaio se apressava a pegar a casaca e a cartola do conde quando este
chegava à residência, mas naquele dia ninguém ousou, sequer, fazer reverência quando o homem
irrompeu porta adentro, perdido em pensamentos e com a expressão mais assustadora plantada
no rosto.
Hugh jogou tudo no chão. Finalmente dirigiu um olhar torto e sombrio para a esposa que
prendeu a respiração. Como sempre, ele estava lindo. E nu, era uma visão ainda mais selvagem.
O peitoral cheio de gomos que balançavam levemente à medida que respirava. Os braços
desenhados como a imagem de um deus em um quadro ou uma daquelas estátuas que sempre
provocavam espanto nas jovens donzelas.
Margareth não precisou dizer nada. Ela sabia o que ele esperava dela e ansiava por
aquilo, mesmo que o desejo do marido fosse motivado apenas por sua necessidade de acalmar os
nervos.
Quando Hugh enlaçou-a nos braços fortes, Margareth já havia arrancado até a última
anágua, praticamente destroçado as fitas do espartilho e jogado suas roupas íntimas para longe.
Nua, era uma criatura ainda mais delicada e frágil, que poderia ser estraçalhada pelo
desejo selvagem de Hugh e com esse pensamento ele a tomou nos braços, beijou-lhe os lábios
com avidez e a deitou de bruços na cama.
— Preciso de você, Margareth — ele rosnou e ela suspirou, sentindo a umidade crescer
entre suas pernas.
— Eu estou aqui.
Margareth não conseguia pensar em nada mais. Seus nervos, seus sentidos, cada partícula
de seu corpo, tudo estava completamente concentrado nas sensações deliciosas que o toque de
Hugh provocava em sua pele. A condessa sentia como se suas intimidades fossem incendiar a
cada novo arrepio que o toque dele provocava.
Em poucos instantes, Margareth arquejava e gemia, sentindo as mãos brutas do conde
apertando seus seios e os lábios mordiscando seu pescoço. Ele estava tomado por uma
necessidade bruta e apesar da força como a buscava, ela não sentiu medo.
Quando passou o pau duro e quente na fenda em sua bunda e a jovem arfou. Era
inebriante e ela sentia-se entregue. Ele procurou o ponto sensível da esposa e o pressionou, o
toque firme a fez derreter e molhada, ela recebeu o pau dele quando ele encontrou sua fenda e
mergulhou dentro.
Hugh estava calado, mas seu rosto começava a relaxar à medida que sentia o corpo de
Margareth resfolegando em contato com o seu. Tivera muitas mulheres e já havia deitado em
muitas camas, mas em nenhuma delas havia encontrado sede maior do que aquela jovem rebelde
tinha. Jamais havia gostado tanto de satisfazer outra pessoa que não fosse ele mesmo.
O conde colou o corpo de Margareth ao seu. As costas da jovem prenderam-se ao seu
peito e as nádegas roçaram na pélvis, deixando-o ainda mais excitado. Margareth gemeu
novamente. Hugh passou a língua por seu pescoço, chegando à nuca, enquanto encaixava as
mãos outra vez sobre os seios firmes e apertava-os, fazendo o corpo da esposa estremecer e
arrepiar ainda mais.
Ela gemeu alto quando ele se empurrou com mais força, agarrando-se à cama para
conseguir se manter firme
Hugh estocou e estocou, e Margareth gostou daquele jeito selvagem e se viu pedindo para
que ele a tomasse ali, para que a fizesse gozar como ele gostava de dizer, jurando ser dele para
sempre.
Antes de chegar lá, porém Margareth virou-se de súbito e tocou o rosto de Hugh, beijou-
lhe os lábios com ternura e então o deitou sobre a cama macia, que ainda estava arrumada com
almofadas e travesseiros de plumas. Hugh obedeceu sem dizer nada. Os olhos tomados pelo
prazer.
Geralmente, o conde conduzia a relação, levando-a a momentos de intenso prazer e
ensinando-a como agradá-lo, mas naquele momento, mais do que nunca, Margareth sabia o que
tinha de fazer e desejava muito aquilo. Não apenas tomar as rédeas do ato, mas satisfazê-lo e
descobrir a si mesma. Aquela era sua missão.
Primeiro percorreu o peitoral delineado do conde com a língua, mordiscando os mamilos
e depois descendo bem devagar até sua coxa, onde passou os dentes bem devagar e arrancou um
gemido deliciado de Hugh. Depois, com delicadeza foi chegando o rosto mais perto do pau do
marido que já estava muito rígido e molhado por ter acabado de sair de dentro dela.
Ela poderia facilmente abandonar suas ideias e sentar-se ali, esquecendo o marido e
provocando seu próprio prazer, mas tratou logo de afastar o egoísmo sexual que surgia nela
sempre que estava diante daquela cena e molhou os lábios.
Os olhos de Hugh não tardaram a encontrar os seus e ela não desviou, ignorando qualquer
fagulha de vergonha que poderia nutrir. Baixou os lábios na direção do pau de Hugh e ainda com
os olhos cravados nele, mergulhou-o na boca.
Sentiu seu próprio gosto melado ali e suspirou, excitada demais para conter o próprio
desejo e levando um dedo ao meio das suas pernas, para se tocar enquanto o engolia pouco a
pouco.
Hugh arquejou no mesmo instante, olhando-a de um jeito muito profundo. Margareth
sabia que acabava de vencer a maior batalha de todas. Hugh, agora, pertencia a ela, sem qualquer
reserva e sem qualquer impedimento. Era seu do jeito mais verdadeiro que poderia existir, seu
para os momentos bons e para os difíceis.
Era seu e ela era dele.
Com movimentos lentos a princípio, Margareth percorreu a extensão dura com a boca,
molhando-o, beijando-o e sugando em seguida. À medida que Hugh mexia os quadris de
excitamento, ela ia intensificando os movimentos, apertando de leve as bolas enquanto lambia a
cabeça inchada e quente.
Hugh não demorou a chegar ao ápice e despejar seu líquido viscoso dentro da boca de
Margareth, que o sorveu em silêncio e com uma satisfação fenomenal. Ele era seu, para sempre,
ela não tinha mais dúvidas.
— Vire-se — ele rosnou poucos segundos depois de gozar na boca dela. — Empine essa
bunda pra mim, quero te ouvir gritar.
Ela não perdeu tempo, apoiando os joelhos na cama e empinando a bunda para que ele
pudesse ter o acesso que queria.
Hugh espalmou uma palmada suave que a fez gemer, depois, beijou as costas dela e
desceu lentamente com a língua, até chegar no ponto sensível no meio das pernas dela, onde
enfiou a boca e começou a chupar.
— Oh, Deus, Hugh, isso é demais pra mim — ela chorou quando ele enfiou o dedo na
sua fenda.
— Você tá tão melada, Margareth, tá pronta pra mim — ele sussurrou, encaixando-se ali
e posicionando a cabeça do pau na entrada molhada.
Ela choramingou quando ele se empurrou pela primeira vez, ansiosa pelo próprio prazer.
— Com força, Hugh, com força.
Ele rosnou e entrou com força, fazendo a esposa estremecer enquanto se empurrava para
dentro da fenda apertada.
Ela gemeu mais e mais, e ele começou a estocar com força, sem dó, sem cuidado, um
animal como se sentia naquele momento.
— Hugh, vou gozar... — ela gritou e ele apertou os quadris e se empurrou de novo,
rugindo feroz e se rendendo a outro orgasmo.
Quando Margareth amoleceu, dominada pelo prazer e desligada do mundo ao redor,
Hugh a amparou com o braço e aninou ao seu peito.
Não disseram nada por um tempo.
Ela levou alguns instantes para se recompor, mas o conde ainda não estava pronto para o
fim e não demorou nada para procurá-la de novo.
Ele precisava esgotar aquelas energias, precisava acabar com o que o atormentava e o
único jeito que vinha sendo eficaz era gozar fundo em Margareth, ouvindo os gemidos dela e
sentindo-a apertá-lo dentro da boceta.
Primeiro, ele ajustou as costas de Margareth na cama e com força abriu suas pernas. Ela
suspirou e sorriu, adorava aquela impetuosidade que ele tinha sempre que estava ávido por seu
corpo.
Sem demora, Hugh mergulhou o rosto no meio das pernas da esposa e com a língua
começou a acariciá-la.
Percorreu primeiro a parte superior, afastando os pelos e passando a língua pelo que lhe
pareciam lábios inchados. Depois, desceu até à cavidade mais úmida que se abria à sua espera.
Mergulhou a língua ali seguidas vezes, arrancando pequenos grunhidos de prazer de Margareth
que começava a agarrar com força os lençóis, pronta para uma nova rodada de prazer.
Hugh colocou um dedo bem devagar e Margareth suspirou em resposta. Depois, ele
começou a friccionar o dedo e logo em seguida passou a arremeter, como se fosse seu pau dentro
dela. Ao mesmo tempo, movimentava a língua de forma ritmada, subindo e descendo no botão
de prazer da condessa e fazendo-a perder o controle de suas sensações.
— Goza na minha boca condessa — ele rosnou uma ordem e ela se desmanchou,
maravilhada com aquela sensação.
Margareth mexia os quadris de forma ritmada, deixando-se gritar quando finalmente
alcançou o prazer máximo.
Hugh não esperou que ela terminasse de se contorcer e a virou de costas, penetrando-a
enquanto apertava seus seios outra vez.
A princípio seus movimentos foram lentos e delicados, mas logo ele estava novamente
tomado pela loucura do ato e começou a estocar com força, apertando os seios da esposa com
uma das mãos e puxando de leve seus cabelos na nuca com a outra. Margareth e Hugh chegaram
ao ápice quase ao mesmo tempo.
Cansado e livre de qualquer trava que o mantivesse distante e frio, Hugh deixou-se
envolver pelos braços gordinhos e convidativos de Margareth, aconchegando a cabeleira negra
nos seios e deixando o nariz roçar na pele macia e com cheiro de rosas.
Margareth acariciou os cabelos de Hugh sem dizer nada. Não sabia que palavras usar
para romper a muralha que ele parecia ter criado em torno de seus segredos, mas sabia que algo o
afligia e isso a perturbava ainda mais.
Hugh cochilou por alguns instantes, a respiração tensa. Margareth não se moveu,
deixando os olhos pesarem e as pálpebras cerrarem em seguida. Quando ela abriu os olhos, Hugh
estava sentado na cama, os cabelos desgrenhados e os olhos tristes. Olhava para ela com um
misto de espanto e curiosidade. Ela sorriu e fechou os olhos mais uma vez. Abriu-os um instante
depois e Hugh continuava daquela maneira, observando-a taciturno.
— Seja o que for, daremos um jeito — ela falou, ainda com os olhos fechados.
— O que você disse?
— Não importa o que for, estou do seu lado e vou ajudá-lo.
As palavras de Margareth pegaram Hugh desprevenido e ele não conseguiu mais resistir,
deixando a cabeça cair sobre seu corpo e a abraçando com desespero. Soluçou por horas,
enquanto narrava tudo o que guardava no mais absoluto sigilo e que fatigava sua alma de forma
tão arrebatadora e dolorosa, que o fazia sentir-se como uma fera brutal a maior parte do tempo.
Margareth chorou junto com ele. Abraçando-o, compadecida de sua dor. Mais do que
nunca compreendia a selvageria do marido e a ânsia por ser sempre o dono da situação. Era
mesmo um homem muito forte para suportar tamanha tristeza e ela sentia-se, mais do que nunca,
apaixonada. A história dele partiu e recolou seu coração mais de uma vez.
Tessie era uma jovem de cabelos encaracolados rebeldes. Tinha olhos verdes que
pareciam o céu noturno e uma boca muito vermelha. A pele era pálida e macia, embora ela
apanhasse sol quase todos os dias. As mãos não tinham sinais da labuta diária, mesmo que
trabalhasse o dobro da maioria das jovens da sua idade.
Era forte, ainda que tivesse o corpo pequeno e frágil. Era determinada e tinha a língua
feroz. Fora trabalhar com a família Ruthenford quando tinha quinze anos. Era a sobrinha da
governanta da casa do condado, em Surrey. Uma mansão arejada e uma das mais imponentes
construções de toda a Londres da rainha Victória.
Logo na primeira primavera que passara percorrendo a imensa propriedade, Tessie teve
certeza de que jamais conseguiria viver em outro lugar. Amava não apenas os animais que
corriam livres pelas léguas de terra e verde, mas amava a floresta fria que se alongava por toda a
extremidade lateral e seguia até o primeiro povoado muito longe dali. Amava o chiado do vento
à noite, que parecia dizer-lhe algum segredo e, acima de tudo, os imensos olhos castanhos do
jovem lorde, Rodolf.
Tessie vivia sorrindo, mesmo quando executava a pior de todas as tarefas domésticas.
Andava descalça sempre que podia e escarafunchava a terra enfiando rosas ou arrancando
escaravelhos para provocar as outras criadas, que se julgavam acima dela pelos mais bobos
motivos.
Ela tinha um espírito travesso e vivia metida em encrencas. Aos dezessete anos, já não
mais podia correr descalça e com os cabelos desgrenhados, pois era a assistente da tia, e sentia-se
orgulhosa por ter conseguido o cargo com seu mérito e eficiência.
Ainda que sentisse saudade da vida ao ar livre, ficava cada vez mais dentro da moradia e
executava tudo o que lhe era mandado. A perfeição era um traço forte de sua personalidade e
raramente era repreendida por cometer algum erro.
Não havia criado, lacaio ou pessoa naquela região que não a conhecesse e adorasse. Sua
fala forte e seu sotaque arrastado das classes inferiores era sempre ouvido à distância e suas
discussões sobre coisas tolas eram sempre arrematadas com piadas que as damas jamais
deveriam pronunciar. Mas Tessie não era uma dama, era apenas uma criada e já que tinha de
limpar penicos para sobreviver, não se importava de falar algumas bobagens no meio de outros
camponeses desbocados como ela.
O lorde Rodolf, filho único dos Ruthenford era muito diferente. Tinha belos olhos
castanhos e uma aparência muito aristocrática. Além de modos impecáveis que o tornavam não
apenas o próximo conde como também um dos mais indicados para assumir o parlamento como
primeiro-ministro. Era um jovem de vinte e três anos, de fala mansa e olhar perdido e estava
prometido à filha de um duque muito poderoso.
Mas Rodolf não gostava de Londres, do barulho das carruagens e das pessoas falando
horas e horas nas festas, chás da tarde e passeios de domingo. Ele gostava de sossego, do som da
correnteza ao longo de um rio e gostava do riso de uma jovem criada de cabelos negros
cacheados que andava pela casa cantarolando alguma canção das classes inferiores.
O futuro conde sabia que era imperdoável se deixar envolver pela beleza e encantos de
uma camponesa, uma criada sem classe, bens e título. Sabia que uma união seria impossível e o
máximo que poderia fazer era desfrutar de bons momentos com a garota, tentando evitar
desonrá-la para qualquer casamento, ainda que a maioria dos homens de sua estirpe fossem fazer
justamente o contrário sem se importar desde que ficassem satisfeitos.
Sempre que a via perambulando pela casa com seus modos impetuosos, ele sentia uma
dor no estômago. Queria, mais do que tudo, deitar-se na cama dela e mergulhar entre suas coxas,
mas não queria que, para isso, causar qualquer mal à garota.
Gostava dela e sempre acabava envolvido em discussões sobre bobagens da fazenda sem
se preocupar com as diferenças que os colocavam em condições tão desiguais. E Tessie sempre o
vencia.
Não porque seus argumentos fossem melhores do que os do jovem letrado lorde, mas
porque era um grande prazer vê-la sorrindo por ser a vitoriosa no debate. Perder uma discussão
para alguém como ela era um preço pequeno a ser pago pelo simples prazer de sua companhia e
riso. E ela ria muito, deixando-o atordoado e corado na maior parte do tempo.
Rodolf não era dado a grandes conversas sociais e mostrava-se rebelde sempre que a
temporada londrina se iniciava. Acreditava que os homens, mesmo os nobres, deveriam cuidar de
suas propriedades e fazer com que a riqueza crescesse, ao invés de viver no ócio, como a maioria
achava ser a forma correta. O jovem adorava andar pelas estradinhas de cascalho, observando os
homens trabalhando nas plantações ou cuidando dos animais.
Gostava ainda mais de ver a vida ganhar beleza a cada nova primavera, depois os
desfolhamentos ainda mais esplêndidos no outono. Tudo em Surrey era impressionante e ele se
via vivendo ali para sempre, assim que fosse o conde e não apenas o filho herdeiro.
E se via trabalhando na terra, sem medo, sem pudor, sem a preocupação social que dizia
que um nobre colocar a mão na terra era errado.
Seis meses antes da oficialização do compromisso com a jovem para o qual estava
prometido, Rodolf fora acometido por uma doença que quase tirou sua vida. Fora afastado dos
familiares, trancafiado em um quarto escurecido, fechado em Surrey Hall e deixado à espera da
morte, com uma febre que o fazia tremer e ranger os dentes. Os médicos já o haviam
desenganado e os pais, resolutos da morte do filho, já planejavam o funeral.
Mas havia alguém, uma única pessoa que não havia desistido e não cogitava a hipótese de
deixá-lo morrer: Tessie. Contrariando as ordens da tia, a criada passava noite e dia ao lado de
Rodolf. Trocava suas roupas empapadas de suor, banhava-o com água morna e quando estava no
ápice da febre, mergulhava-o, sozinha, dentro de uma banheira com água fria. Depois, vestia-o,
dava-lhe uma canja e o enfiava sob os lençóis, deitando-se ao seu lado e aconchegando-o sobre o
vestido de linho grosseiro, que prendia os seios fartos.
Passaram-se cerca de três semanas até que Rodolf desse qualquer sinal de melhora. Tudo
começara quando Tessie, cansada da escuridão e do cheiro úmido que impregnava o quarto e
mofava as paredes, passou a abrir as imensas janelas.
Mandara trazer mel e ela mesma criara uma infusão com chá de menta e leite. Ninguém
dizia nada para a garota, não porque seu humor estivesse ácido e rabugento com os maus
cuidados que eram dedicados ao rapaz desenganado; nem porque tivessem medo de que ela
estivesse doente por causa do constante contato com a doença, mas porque todos viam a luta que
ela travava pelo jovem a quem entregara seu coração.
Ninguém tinha coragem de dizer que era tudo em vão porque mesmo que ele tivesse um
milagre e sobrevivesse não poderia ser dela. Ninguém ousava afirmar que Tessie deveria desistir
e parar de lutar sozinha contra a morte certa do garoto. Ninguém tinha coragem sequer para lhe
dar bom dia.
A criada emagreceu muito e pouco se ajeitava naqueles dias. Andava sempre com os
cabelos enfiados na touca e o rosto avermelhado pelo esforço de cuidar sozinha de um rapaz que
tinha, no mínimo, o dobro do seu tamanho.
Numa manhã, Rodolf estava decidido a dizer tudo que tinha guardado no peito, antes de
morrer. Abriu a boca, mas a saliva grossa secou seus lábios. Ele engasgou e tossiu. Tessie
molhou a boca carnuda dele com um pouco de água e depois esmagou-os com uma colherada da
infusão doce que vinha enfiando goela abaixo há dias. Ele sorriu torto. Um sorriso amarelo e
triste.
Tessie deu-lhe água alguns momentos mais tarde e acariciou seus cabelos. Abriu as
cortinas e pegou um livro, colocando-o sobre seu colo. Ela não sabia ler, mas à simples menção
disso deixava-a muito envergonhada. Rodolf sabia, mas jamais ousaria confrontá-la com
qualquer coisa que causasse seu desconforto. Ele sempre sorria e afastava o livro, como se não
estivesse interessado na leitura. Passava a maior parte do tempo dormindo ou espasmando com
febre e no restante, tentando sorrir ou falar com Tessie, que sempre o impedia com gestos de
mão exagerados e resmungos autoritários de uma ama.
Naquela manhã ele estava decidido, diria ao menos obrigado. Antes que pudesse
conseguir, foi acometido pela febre mais forte desde o início da doença. Seu corpo sacolejava e
espasmava. E Tessie desesperou-se ao compreender como o cansaço e a pouca alimentação a
enfraqueceram a ponto de não conseguir sequer amparar o jovem para chegar à banheira. A
criada começou a gritar. Pedia socorro e implorava. Muitos lacaios e criadas se amontoaram na
porta rezando, mas ninguém ousava entrar no quarto do moribundo, aterrorizados pela ameaça da
enfermidade.
Tessie se viu em tamanho pranto e desapontamento que, entre o choro e os gritos, levou
Rodolf arrastado pelo quarto até à banheira no outro cômodo. Entrou ela mesma na água gelada e
puxou-o em seguida, deixando o corpo pesado do moribundo cair por cima do seu. Se ele
morresse, ela não se importaria de ir junto.
Mesmo que no fundo de seu coração soubesse que nutrir esperanças era quase como um
pecado e sabendo que provavelmente um dia seria a criada da esposa dele, ela continuava ali,
entregando todo seu amor e suas forças por sua vida. E ela o manteria vivo, nem que para isso
sacrificasse até o último suspiro.
— Por favor. Por favor. — Ela chorava. — Seja forte.
Enquanto arrancava a roupa de baixo de Rodolf e a camisa de linho empapada de água
gelada e suor, ela rezava, resmungava e xingava o rapaz, por estar sendo tão travesso.
Depois chorava e dizia o quanto o amava e o quanto estaria disposta a dar sua vida pela
dele. Logo que a febre baixou, Rodolf abriu os olhos castanhos cansados e sorriu, consciente da
situação constrangedora em que estava. Tessie ainda balançava o corpo aninhando-o em seu
peito. Choramingando uma cantiga de ninar da mesma forma que sua mãe fazia quando ela era
pequena.
— Obrigado —Rodolf gaguejou. — Também amo você.
Depois daquela tarde terrível, Rodolf pareceu recuperar-se com rapidez. Como se toda a
enfermidade não tivesse passado de um resfriado de poucos dias e agora já desse lugar a boa
saúde e a faces rosadas.
Logo ele recuperou as forças para andar, falar, ler e discutir com Tessie.
Numa noite gelada, poucas semanas depois de tudo, ele impediu que a garota fosse para o
seu quarto e a beijou com a sede de alguém que está preso no deserto por dias inteiros. Ela tentou
relutar, mas tomada pela paixão acabou deitando-se em sua cama e deixando que ele descobrisse
o fervor de seu corpo e o prazer de explorar a paixão que tinham.
No dia seguinte, o pai de Rodolf, o conde entrou pela porta de forma intempestiva. Tessie
arquejou de espanto quando este a arrancou dos braços do filho e a jogou no chão.
— Venho aqui para encontrar um filho que fez o milagre de se curar e o que encontro é
esta desavergonhada enganchada em você... — o homem berrava.
Tessie chorou, acuada em um canto do quarto. Rodolf tentava consolá-la, gritando em
resposta ao pai que ela seria sua esposa e ninguém poderia impedi-lo. O velho conde gargalhava
e gesticulava dizendo que, antes que isso pudesse acontecer, o mandaria para o inferno. Rodolf
se manteve firme, mas o velho também não se deixava dominar por ninguém.
Três dias depois, enquanto Rodolf ia conversar com o capitão de um navio e tentar
suborná-lo para fugir com a jovem criada para qualquer lugar do mundo, o velho conde deu uma
pequena e secreta recepção na propriedade.
Dispensando quase todos os criados, deixou apenas jovens lacaios para servir aos
convidados. Entre os selecionados estava o duque Paxton, um homem rechonchudo de pele
pálida e nariz arredondado, beirando os trinta e poucos anos.
Depois do jantar, o conde os levou uma sala que estava arrumada com esmero. Mandou
Tessie servir vinho aos cavalheiros e em seguida tirar suas roupas. Ela ficou aterrorizada e tentou
fugir. Dois criados a impediram, segurando-a de pernas abertas sobre a mesa cheia de louças
quebradas.
Tessie lutou, esperneou e chutou com força, mas como em um ritual de brutalidade, os
homens foram ajeitando-se numa obstinada fila e fazendo com que seus desejos carnais fossem
satisfeitos de forma grotesca sobre o corpo minúsculo da garota. Logo, Tessie estava jogada a
um canto da sala, inconsciente.
Um único homem que não quisera participar da cena brutal foi um rapaz que beirava os
vinte e poucos anos e tinha uma cabeleira loura arrepiada. Um jovem que seria conhecido, alguns
anos depois, como Duque, e mais de dez anos mais tarde teria um filho com uma esposa
espanhola a quem chamaria de Leonard.
Pior do que ver a cena brutal de como aqueles homens usufruíam do corpo da garota, era
ter de ficar calado e isso cobrou um preço muito caro para sua consciência. Depois do terceiro
homem apossar-se de Tessie e do choro desesperado da garota, o jovem não mais podia suportar
aquilo, tentou impedi-los, gritou, esmurrou o nariz de alguém, e quando não obteve êxito, saiu
feito um furacão, o rosto com hematomas da briga que tinha arrumado e batendo em um criado
com fúria ao cruzar sua passagem e tentar dissuadi-lo de deixar o local. Aquilo não era o tipo de
coisa que ele suportaria.
— Pode mandar esse conde de merda para o diabo! — o rapaz gritou perdendo a
compostura.
Sabia que a jovem acabaria morrendo pelo que lhe fora infringido, mas sabia mais do que
isso, conhecia bem a história de Rodolf, e depois de ver os lindos olhos verdes aterrorizados, só
tinha uma coisa que podia fazer: mandar um criado ao porto, interceptar Rodolf e deixar que o
rapaz traçasse seu destino. Nada bom poderia resultar daquela noite. E nada de bom podia ser
reservado pelo destino para homens brutais como aqueles.
— Meu Deus Hugh, não posso imaginar... — Margareth interrompeu a linha de
pensamento do marido que congelou por alguns instantes. Retomando a narrativa em seguida a
ela tocar-lhe as faces com ternura.
Rodolf encontrara Tessie apagada num canto da sala. Sua pele alva estava maculada por
sangue, vinho, e uma mistura de fluídos. Ela arquejou quando ele a tocou de leve, retesando de
pavor e medo.
Trêmula, começou um choro assustado, que escapava fraco pelos hematomas do rosto.
Rodolf olhou ao redor vendo o sorriso vitorioso do pai e muitos olhos afoitos, uma mistura de
excitamento, pavor e até repulsa pelo resultado final da festinha particular do conde de Surrey.
Um único homem sorria. E Rodolf jamais se esqueceria dos olhos malignos dele. Desmond
Coucex, o jovem duque de Canterburry e o pior de todos os seus inimigos.
— Cada um de vocês terá o que merece — Rodolf falou, antes de sair da sala de bebidas,
com Tessie quase morta nos braços.
Naquela noite, ele cuidou de seus ferimentos, a banhou, vestiu com uma de suas camisas e
zelou por seu sono cheio de dor de lamentos.
Na manhã seguinte, mandou que duas criadas, escoltadas por criados de confiança a
levassem para sua casa na cidade e dissessem à sua mãe que cuidasse pessoalmente dela, pois
seria sua esposa, e que a deixassem a par do que o pai de Rodolf tinha feito à moça sem poupá-la
de nenhum detalhe por pior que fosse.
Depois foi ao quarto do pai e encontrara o velho com sua bengala e cartola, se aprontando
para voltar a Londres.
Sem pensar muito, Rodolf enfiou uma faca no ventre do pai, sorrindo quando o velho
arquejou de dor e surpresa, um fio de sangue começando a correr pelos lábios murchos. Rodolf
mandou chamar o representante do pai e inventou uma história de que um lacaio enraivecido
entrara no local e acertara-o.
Disse que tentou lutar com o homem, mas que ainda não estava recuperado o suficiente e
por isso o sujeito que era sem dúvida muito forte, conseguiu escapar. A governanta, tia de Tessie,
teve um prazer sinistro ao confirmar cada palavra do novo senhor da casa.
Jamais voltariam a tocar no assunto, e como recompensa por sua força e aliança, foi
mandada para viver, custeada pelo jovem conde Rodolf, em uma casa no interior com conforto e
sem qualquer preocupação financeira, pelo menos, pelo tempo que conseguisse manter o segredo
da família, o que ela fez até morrer, décadas depois.
Investigações rápidas foram feitas e nada mais foi falado a respeito. A moral e a nobreza
do conde diziam que ele jamais mentiria a respeito e ninguém ousaria questionar aqui, ainda que
todos desconfiassem que fosse ele mesmo o assassino do pai.
Ninguém jamais questionou a história.
Quatro semanas foram necessárias para que Tessie conseguisse pensar com clareza e não
tivesse uma crise cada vez que Rodolf tentasse se aproximar dela. Os dois casaram-se em uma
cerimônia muito discreta e ninguém ousou interpelar a nobreza da jovem, ao vê-la vestida com
luxo, desfilando com a classe de uma dama.
Rodolf espalhou a história de que teria se casado com a filha de um nobre de uma parte
distante da Europa e por isso a garota ainda aprendia os costumes dos britânicos e tinha algum
sotaque.
Muito a contragosto, mas sem nunca se queixar, a mãe de Rodolf transformou Tessie em
Cecil, a filha mais nova de um lorde norueguês. Cecil era sempre a mulher mais bonita das
recepções e Rodolf esbanjava felicidade quando estava ao seu lado. Os dois sorriam mesmo
quando todos os outros estavam sérios.
O tempo foi passando e o casal nunca discutiu sobre o que acontecera, mas Rodolf se
culparia por toda a vida pela dor que seu pai impôs à mulher que tanto amava.
Os dois viajaram por mais de um ano depois do casamento e quando voltaram, traziam um
bebê com os cabelos negros e cacheados e os olhos verdes da mãe. Um bebê que seria a alegria
dos pais e o legado da família, apagando a maldade que traziam na memória e criando um lar
cheio de amor.
Hugh aprendeu a trabalhar porque Tessie insistia que um jovem precisava conhecer bem o
que tinha. Como Rodolf amava Surrey, passavam lá a maior parte do tempo e ele ensinava ao
filho todos os princípios que achava necessários e que qualquer outro fidalgo provavelmente
repreenderia como muito errado. Ele era um nobre, mesmo que ainda houvesse a possibilidade
de não ter o sangue Ruthenford nas veias. Isso não importava.
Hugh cresceu vendo a paixão que os pais tinham e a dor que o pai guardava no peito.
Havia algo ali, mas o homem jamais dizia coisa alguma, embora entristecesse o olhar de vez em
quando.
Tirando isso, eram como qualquer outro pai e filho. Discutiam às vezes, fumavam juntos
e pescavam também, provocavam Tessie, agora, Cecil e roubavam tortas da cozinha depois de
uma cavalgada no campo.
Sua mãe morreu quando Hugh tinha pouco mais de 18 anos. E ele e o pai choraram juntos
ao enterrá-la no cemitério da família. A avó, que pouco se fazia presente no seio familiar, veio no
dia do enterro e colocou uma flor no túmulo. Depois beijou o filho com ternura e olhou de
soslaio para o neto.
Ela nunca fora muito carinhosa com Hugh e se mantinha o mais distante possível do
garoto, mas gostava de Cecil, apesar de todas as circunstâncias e se sentia em dívida com ela por
conta do que o marido fez.
Não tinha como evitar, todos gostavam de Cecil. Seu riso incendiava a casa e sua voz
embalava o sono. Era sempre a encrenqueira que deixava o marido louco da vida. À noite, depois
que brigavam durante o dia inteiro, os dois gemiam e riam, anunciando que as pazes haviam sido
feitas.
Rodolf morreu cerca de seis anos depois, bêbado, sujo e desgrenhado. Por mais que o
médico dissesse que Cecil, ou Tessie, havia morrido por complicações cardíacas, o conde
afirmava que todo o mal que ela sofrera era sua culpa. Ninguém o entendia, até que duas noites
antes de ele mesmo deixar a vida, despejara toda sua história para Hugh, que nunca mais teve
paz.
A última coisa que ele podia fazer para o pai era prometer vingança. E vingança seria o que
ele faria contra todos que humilharam seus pais e maltrataram sua mãe.
Margareth passou o resto do dia com uma terrível náusea. Nenhum dos dois desceu para
as refeições e ela levou muitas horas para se recuperar do baque que foi ouvir a história de dor e
mágoas da família do esposo.
Tomaram banho na mesma banheira, acariciando-se em silêncio e depois comeram no
quarto, deitando-se em seguida com os braços sob a cabeça e os olhos fixos no teto. Não falaram
muito desde que Hugh abrira seu coração e contara tudo que o tornava o homem que era.
A princípio ele se preocupara se aquela história, sua história, não o tornava menos digno
de Margareth. Afinal, talvez ele não fosse filho de seu pai e nem o descendente dos Ruthenford.
Mas ela parecia preocupada com algo mais importante e conhecendo-a como conhecia, tinha a
impressão de que sua linhagem o tornaria ainda mais atraente para o espírito rebelde da esposa.
— Acho que precisamos nos mudar para a casa de Londres — ela falou depois de ficar
muito tempo em silêncio.
— Mas por quê? Achei que você gostasse daqui...
— Realmente gosto. Preferia viver aqui para sempre, mas se vamos nos vingar daqueles
desgraçados, precisaremos estar mais perto, e de um plano eficaz.
Hugh ergueu-se na cama sobre os cotovelos, olhando admirado para Margareth que
estava muito pensativa.
— O que foi? — ela pareceu surpresa ao perceber que era observada.
— Você é um mistério para mim — ele deixou escapar.
— Pensei que fosse vingança que você queria...
— E é, mas não pensei que você estaria disposta a me ajudar.
— Eu falei que fosse o que fosse eu o ajudaria e agora que conheço os motivos faço ainda
mais questão.
— Jamais imaginei que conheceria alguém como você.
Margareth sorriu.
— O que aconteceu hoje, no Parlamento?
— O velho Paxton. Toda vez que tento me aproximar do duque de Canterburry, ele dá um
jeito de me atrapalhar.
—Paxton o filho ou o pai? Quer dizer o... tal, sabe que...
— O Pai. O filho é só um imbecil que devia estar nas fraldas naquela época.
— E o que você pretende?
— Eu preciso me aproximar do duque de Canterburry, aquele maldito foi o pior de todos
com a minha mãe, e o velho ainda está vivo e feliz, gabando-se por ter se casado depois que a
primeira mulher morreu. Exibindo por aí uma garota que tem idade para ser neta dele.
— Então precisamos nos livrar do Paxton. Tanto do pai quanto do filho.
Hugh arqueou as sobrancelhas ao perceber a expressão insolente no rosto da esposa.
— Acho que tenho uma ideia — ela falou, sorrindo enquanto enfiava a mão por dentro da
camisa do marido e acariciava sua pele firme.

Os dois estavam instalados na propriedade de Londres há pouco menos de uma semana.


A casa era uma versão apenas um pouco menor de Surrey Hall e Margareth já estava adaptada à
nova moradia, embora sentisse falta das cavalgadas pelos campos, dos passeios pelos bosques e
do cheiro de natureza da mansão no condado.
Não tinha do que reclamar, Hugh fazia tudo que estava ao seu alcance para tornar sua
vida o mais agradável possível e isso incluía trazer a cozinheira e Mady.
A criada estava extasiada, havia sido escolhida entre tantas para acompanhar a condessa
para a cidade e isso significava usar uniformes melhores, conviver com pessoas mais elegantes e
comer comida ainda melhor. Andava pela casa como se fosse uma governanta e ninguém ousava
reclamar, afinal, ela era a criada pessoal da própria condessa.
A velha que cuidava da casa fingia não se importar com a petulância da jovenzinha, já
que isso a tornava ainda mais competente e interessada em deixar os patrões sempre muito
satisfeitos.
Com isso, governanta e criada logo se tornaram aliadas competentes e amigas íntimas.
Mady a colocara a par da situação em Surrey Hall, sobre a quase morte da condessa e sobre o
fato de o conde praticamente dividir o mesmo quarto com a esposa, não passando uma única
noite sozinho desde que os dois haviam finalmente se acertado.
Por achar conveniente, a criada guardou a história sobre Aila para si, deixando claro o
quanto admirava a condessa e sua gratidão por ter sido escolhida. Era uma moça jovem, da
mesma idade de Margareth e a condessa gostava de ter com quem conversar, discutir sobre
liberdade e até estava empenhada em ensinar a menina a ler, isso ajudava a manter as coisas
calmas na residência nobre e era bom para todos.
Mas a ida de Mady para a casa de Londres não era apenas para o conforto de Margareth,
ela confiava na jovem e sabia que sua ajuda seria útil quando ela e o marido começassem a traçar
seus planos vingativos contra aqueles que impuseram tanta dor aos Ruthenford.
Não havia sido completado ainda o ciclo de uma semana quando Margareth anunciou,
logo cedo, o que tinha em mente.
Hugh estava sentado à mesa, bebericando uma xícara de chá com leite e comendo um pão
macio ainda quente. Margareth chegou esbaforida, as mãos agitando-se no ar e o vestido meio
amarrotado.
— Você está bem? — Hugh alarmou-se, levantando os olhos de seu prato e iniciando um
sorriso maroto para a esposa.
Ela sentou-se com estardalhaço, dispensando o lacaio que os servia com um gesto
impaciente de mão.
— Enviei um recado logo cedo para os meus pais. Devemos tomar chá com eles hoje, à
noitinha.
Hugh gostava de fazer as refeições cedo, ao contrário da grande maioria da nobreza
britânica que dormia, acordava e comia tarde. Essas temporadas na cidade que incluíam visitas
para o chá num horário em que ele já estaria pensando no jantar o irritavam. Limitou-se apenas a
fazer uma careta.
— Também não estou com ânimo para olhar para a cara do meu pai. Como eu posso
admitir que ele estava certo em me casar com você? Logo depois de ter dito a ele que preferia
morrer em um convento...
— Você disse isso a ele? — Hugh sorriu, animado com o rumo da conversa.
— Isso e muito mais e nada foi ameno.
Hugh achou tudo aquilo cômico, mas preferiu não provocar a esposa por enquanto.
— Se eu chegar com essas bochechas rosadas, ele vai achar que está certo e que todos os
homens têm o direito de decidir sobre a vida de suas filhas. Isso é muito injusto.
— Bochechas coradas... isso porque ele não viu o que mais está corado... — o conde
declarou gargalhando.
— Oh!
Margareth ficou muito vermelha, sentindo as bochechas queimarem. Hugh olhou-a
impressionado. Para uma mulher com um apetite tão grande para o coito, ela ficava corada por
uma piada bastante amena, diga-se de passagem.
Deixou a imaginação vaguear por algumas lembranças em relação às coisas que faziam
no quarto e com esse pensamento logo sentiu uma ereção. Não tinha ideia de que uma mulher
pudesse exercer tamanho poder sobre ele e sorriu com a situação em que havia se metido sem
querer.
Primeiro escolheu a filha de um lorde falido e influente para tornar-se sua, também
achando que seus modos perfeitos a fariam uma esposa submissa perfeita, recatada e que sempre
cederia aos seus caprichos. Acabou casado com uma mulher que não levava desaforo para a
cama, que seria capaz de envenená-lo, enfrentá-lo com um castiçal, que corava de timidez, mas
que gemia feito uma leoa à noite. Sem contar que era também uma ótima aliada para os seus
planos.
Se tivesse encomendado uma noiva assim não teria dado tão certo e nem teria sido tão
prazeroso. Até o acaso o estava ajudando e ele gostava disso.
Depois de alguns instantes, Margareth rompeu o silêncio:
— No que está pensando?
— Em arrancar o seu vestido e levá-la para cama.
Ela riu, as bochechas corando novamente.
— Meu Deus, você é insaciável, senhor conde.
— Somos... a senhora não perde em nada pra mim, condessa — Hugh estava divertido,
olhando para o membro que se evidenciava na calça escura. — Mas afinal, do que vale ser um
nobre e não poder fazer aquilo por que anseia?
Margareth pensou por um instante, então, tomada por aquele desejo que a dominava
quando era provocada por ele, foi até o marido e ajoelhou-se no chão.
Aquilo era uma tarefa bem difícil com as anáguas por baixo daquele vestido de babados e
flores. Hugh deixou que ela o acariciasse por cima da calça, estremecendo quando por fim
arrancou a parte de baixo da vestimenta dele e mergulhou os lábios sobre o pau ereto. Quando
ela apertou suas bolas e lambeu-as ele rangeu os dentes, tomado pelo prazer e surpresa.
Margareth passou a língua por toda a extensão, arrancando suspiros e gemidos quase
silenciosos. Depois, como se aquele fosse seu merecido prêmio por algo que fizera, mergulhara-o
nos lábios, deixando-o aprofundar-se ao máximo e quase se engasgando.
Hugh gemeu novamente e ela sorriu, iniciando os movimentos ritmados que tanto o
excitavam. Quando chegou ao ápice, Hugh estava desorientado, meio sentado e meio caído sobre
a cadeira e com as pernas trêmulas. Como se não bastasse, Margareth tirou a roupa de baixo,
arrancando com dificuldade as anáguas e sentando-se sobre a mesa em seguida.
— Agora você me chupa, quero sentar em você e gozar — ela ordenou toda mandona,
fazendo-o abrir suas pernas num rompante e exibindo as dobras quentes e deliciosas.
Ele baixou o rosto e havia algo de selvagem brilhando nos olhos dele quando passou a
língua pelas curvas inchadas e quentes.
— Você é tão gostosa — assoprou contra a pele quente e molhada, enfiando a língua logo
em seguida e a fazendo perder as forças.
Margareth acabou desabando sobre o prato, xícara e tudo o que havia na mesa, tamanho
era o êxtase que as mãos e língua de Hugh provocavam nela. Não demorou muito para que ela
ansiasse por mais e começasse um choramingo manhoso que roubava o sossego do conde.
Hugh puxou-a para seu colo. Estava excitado demais para fazê-la gozar apenas em sua
boca, ele a queria em seu pau, rebolando e se contorcendo, apertando-o com a boceta.
Margareth sentou-se em cima do pau, mergulhando-o dentro boceta quente que pulsava
bem devagar. Com as mãos apertando firme a bunda de Margareth, ele a alçou, fazendo-a
comprimir-se contra seu peito sempre que ele a fazia subir e descer.
O ritmo não demorou a aumentar e Hugh não conseguiu se segurar, chegando ao ápice
um pouco antes de sua esposa. Depois, ele a ajudou, passando os dedos na parte íntima da esposa
da mesma forma que fazia com a língua. Ela desmanchou-se de prazer e deixou a cabeça pender
sobre o peito dele.
— Tem certeza de que precisamos ir à casa dos seus pais?
Margareth balançou a cabeça em concordância.
— Sim, é importante pros nossos planos.
No final da tarde, Margareth estava arrumada e pronta para encarar a mãe, uma mulher de
expressão austera que talvez um dia tenha sido bonita, mas que há muito era apenas mais uma
senhora com joias no pescoço e um ar de irritação permanente no rosto.
O pai os recebeu com um afetuoso abraço e sorria sempre que olhava para a filha. Se ele
estava preocupado com o casamento dela, com sua felicidade conjugal ou qualquer tipo de
violência que ela poderia estar suportando, não deixava transparecer, falando de amenidades
como qualquer outro lorde enfadonho de Londres.
Margareth e a mãe trocaram poucas frases de quase nenhuma importância sobre a casa,
decoração, convites para chá e a temporada londrina que logo chegaria ao fim e que,
provavelmente, os nobres deveriam voltar para suas casas de campo. Margareth não tinha o
menor ânimo para amenidades fúteis e sentia-se ressentida com os pais pelo pouco caso que
faziam em relação às suas vontades e felicidade.
Nunca tinha percebido como eles também eram fúteis e vazios, assim como todas as
outras famílias com posses que ela conhecera, mas agora estava feliz por estar casada com Hugh
e vivendo longe daquilo, livre para ser ela mesma, para ler seus livros de aventuras e ter suas
opiniões... e livre para ter muito prazer com o marido.
Hugh agira como sempre fazia diante de estranhos ou pessoas pelas quais não nutria uma
relação muito afetuosa. Era frio, educado e distante. Respondia às questões do sogro, mas não se
aprofundava nos assuntos e era reticente sempre que questionavam algo mais pessoal, mudando
de assunto após uma ou outra resposta seca.
Seu humor ia piorando quando percebia o quanto sua esposa parecia chateada e deslocada
também. Qualquer um com um olho mais treinado perceberia a insatisfação da garota diante de
uma família que parecia pouco se importar com o mundo além de seus umbigos.
O conde sabia que o pedido de corte e casamento que fizera ao sogro só foi aceito por
causa de sua fortuna, de seu título e posição social. E sabia os motivos que o haviam feito pedir
Margareth em casamento. No início, tudo parecia muito normal, casar-se com uma moça cujo pai
tinha os relacionamentos necessários para a execução de seus planos, mas agora, algo havia
mudado dentro dele.
Algo importante havia se transformado e não apenas sua necessidade de vingança
importava, mas os sentimentos de mais alguém. Alguém que havia se enraizado e se
transformado na parte mais importante de seu dia. Margareth.
Enquanto acompanhava a esposa para a mesa, ladeado por seu cunhado, pela esposa
chata cujos olhos pareciam saltados, a sogra e mais alguns convidados, Hugh só conseguia
pensar no desconforto que Margareth estava enfrentando apenas com o intuito de iniciar as
relações de que ele tanto necessitava e isso o fez sentir uma onda de sentimentos conflitantes.
Admiração, preocupação e algo mais que ele não sabia identificar.
Se ela ao menos lhe dirigisse o olhar, se pedisse uma vez que fosse, ele sentia que seria
capaz de sair porta fora e esquecer para sempre seus planos. Bastava que ela indicasse com
apenas um aceno.
Mas Margareth se mantinha controlada, os nervos afiados há muito contidos por rédeas
curtas e os modos mais elegantes. Hugh fez questão de ele mesmo puxar a cadeira e sentar-se
logo ao lado da esposa, mudando, desta forma, a combinação inicialmente arranjada pela sogra e
dominando o lugar com sua imponência de nobre.
Os homens iniciaram uma conversa sobre o parlamento, Hugh respondia com meros
resmungos e gestos sutis de cabeça. Margareth tocou sua mão por baixo da mesa, apertando de
leve os dedos dele, o que o deixou um pouco mais forte em suas convicções.
— Se você quiser, podemos dar o fora daqui — ele cochichou no ouvido da esposa.
Margareth sorriu e cobriu o rosto com um lencinho, fingindo estar corada com algo
sedutor que o marido tivesse dito. Imediatamente todos os olhos se voltaram para o casal,
curiosos.
Instantes depois, Margareth encontrou os olhos invejosos da cunhada e sorriu como se
indicasse a ela a posição de cada uma naquela família. Enquanto a cunhada não passaria jamais
de uma mera Sinclair, Margareth era a condessa de Surrey, esposa de um conde lindo, cobiçado e
selvagem. Por alguns instantes, a jovem condessa deixou-se vencer pela ironia do destino,
saboreando a satisfação que aquilo provocava.
— Mãe — ela disse, minutos depois. — Vamos dar nosso primeiro chá em dois ou três
dias, quem a senhora sugere que convidemos?
Hugh captou o plano e fingiu estar entretido com a conversa dos homens, deixando
espaço para que a esposa ganhasse campo e considerasse as opiniões e situações. Era uma
estrategista natural e ele estava gostando muito de vê-la em ação.
A mãe de Margareth fez uma pequena lista incluindo nobres e alguns lordes importantes.
Por algum motivo excluíra justamente as duas pessoas que mais Hugh odiava.
Depois do chá, os homens se retiraram para a sala de fumar e acenderam seus charutos.
Hugh esforçou-se para tolerar a companhia entediante e enfadonha enquanto Margareth
arrancava as informações que precisava.
Precisava arranjar um jeito de incluir os malditos Paxton no seu círculo, se livrar dele de
uma vez por todas e só então, ajudar o marido a destruir de vez aquele que teria sido o pior de
todos os homens. Aquele que por pouco, com sua brutalidade, não havia tirado a vida de Tessie.
Margareth teria adorado conhecê-la. Gostava de espíritos livres e personalidades fortes.
Foi então que lhe ocorreu, seu casamento com Hugh deveria ter sido justamente mais um passo
do conde em direção à sua vingança. Um nó em sua garganta se formou e ela teve de concentrar
as ideias, afastando aquele pensamento doloroso para o mais longe possível de sua mente. Ela
mesmo tinha sido uma peça dos movimentos estratégicos dele.
A insegurança pinicou a mente da jovem condessa por um momento, mas ela afastou os
pensamentos sombrios e focou em sua missão.
— Estive pensando em convidar o duque de Paxton e sua esposa. Eles estiveram em
nossa recepção em Surrey Hall...
A mãe de Margareth bufou.
— O que foi, mamãe? Acha que não devo convidar a duquesa de Paxton?
— Acho que você deve fazer o que quiser, só não vejo por que alguém quereria a
companhia daquela mulher.
Margareth também não via, mas isso não vinha ao caso. Ela precisava pensar e rápido.
— Se puderem me dar licença... — falou, levantando-se e saindo na direção de um longo
corredor. — Mamãe, se importa se eu for até meu quarto? Quero buscar um livro que esqueci.
A mulher apenas concordou, sem achar estranha a atitude da filha, afinal, Margareth era
sempre daquele jeito, impaciente com formalidades e por isso, ninguém ligava muito para os
modos da filha.
Mady seguiu a condessa, que instantes depois a puxou para um canto onde não pudessem
ser ouvidas.
— Preciso que você vá à sala de fumar e diga ao meu marido para ele ver a reação do
meu pai em relação ao duque P.
A princípio Mady pareceu um pouco confusa, mas então sorriu, fez sua reverência formal
e se afastou. Margareth voltou para a sala com um olhar simpático no rosto.
— Acho que devo ter deixado o livro em outro lugar. Talvez não o tenha visto em um dos
meus baús — falou, sentando-se em seguida à reverência das mulheres. — Andei muito ocupada,
devo ter deixado passar.
Lady Starlington era uma mulher beirando os 45 anos, tinha os cabelos muito bem
ornados num coque da moda, cujos cachos endurecidos por alguma pasta caíam duros nas
laterais do rosto, olhava impressionada para Margareth.
A jovem condessa sabia que aquilo só podia ser por causa dos títulos que agora dispunha
e de Hugh. Ele era, com toda certeza, um dos homens mais bonitos, ricos e cobiçados de Londres
e ela, justamente ela, uma moça sem título de nobreza, com temperamento forte, peitos e pernas
grossas e uma língua afiada, havia conquistado o interesse do conde.
Todas, inclusive sua cunhada, deveriam estar morrendo de inveja e curiosidade sobre sua
felicidade conjugal. No fim das contas, talvez as coisas acabassem sendo um pouco mais
divertidas.
Esquecendo-se um pouco de seus planos, Margareth deixou-se envolver por seu lado
mais maléfico e cogitou a hipótese de provocar um pouco as mulheres. Por alguns instantes ficou
na dúvida, mas até que Mady retornasse com sua resposta, ela não tinha muito que fazer.
— Então condessa, não nos deixe morrendo de curiosidade, como é a vida na família do
conde de Surrey? — Lady Starlington questionou, abrindo um sorriso torto que divertiu
Margareth.
Se ela repensava sua ideia de provocá-las, aquela pergunta não ajudava muito. Com um
sorriso maroto, Margareth moveu-se na poltrona, deixando o corpo mais ereto.
— Nunca imaginei que pudesse ser tão boa — Margareth cantarolou, dando uma
piscadela em seguida e arrancando da Lady um grunhido de satisfação.
— Ouvi dizer que o conde é uma fera, um homem terrível — a cunhada de Margareth
crispou com os olhos impregnados de raiva e inveja. — Pobre Margareth, deve sentir tanto
medo...
Margareth pensou muito bem nas palavras que ia usar.
— Em primeiro lugar, você deve me chamar de Vossa Graça como manda a etiqueta,
afinal de contas, agora eu sou uma condessa... E de fato, Hugh é uma fera com aqueles de quem
ele não gosta ou que merecem. Comigo ele é simplesmente maravilhoso.
A mãe de Margareth cobriu a boca com uma das mãos, abafando um pouco o som de
espanto, ao ouvir a maneira como Margareth tratava a outra e como tratava o marido.
Todo mundo sabia, não havia uma pessoa em toda Londres que não conhecesse a
personalidade implacável de Hugh e nos anos que haviam se passado desde a morte de seu pai,
ele só havia intensificado a fama de brutal, terrível e mau. Mas ninguém o conhecia de verdade,
não é mesmo?
Margareth queria gritar com aquelas pessoas, mandar que desfizessem aqueles olhares de
espanto e choque. Dizer que ninguém o conhecia e que ele era tudo menos a fera que adoravam
chamá-lo, inclusive ela mesma, na tentativa de convencer o pai de não a obrigar a se casar com
Hugh. Agora, pensando sobre isso, sentia-se amarga e culpada.
— Mas ele é bom para você? — Lady Starlington questionou, os olhos cheios de afeto e
pena de Margareth.
— Melhor marido não há nesse mundo — Margareth falou, abrindo um sorriso doce. —
Nunca vi homem mais gentil... Faz tudo por mim, os melhores presentes, agrados, delicadezas
que nunca esperei de um cavalheiro de sua linhagem. Sabia que ele mesmo me trouxe café na
cama hoje cedo? — Mentiu, embora ele já tivesse feito isso algumas vezes, não tinha sido
naquela manhã.
Lady Starlington sorriu, animando-se com o rumo da conversa.
— Quem diria... — a cunhada resmungou visivelmente irritada.
Margareth estava prestes a dar-lhe um tapa, mas recompôs-se quando Mady entrou
carregando um livro nas mãos. A criada se abaixou ao pé do ouvido da condessa e cochichou a
resposta para sua pergunta. Depois entregou o livro e saiu, reverenciando as senhoras. Margareth
sorriu mostrando a capa marrom do livro e largando-o de lado, direcionou um olhar fulminante
para a cunhada.
— Se eu soubesse que o casamento era tão bom...
— Oh! Nitidamente apaixonada. — A lady suspirou. — Lembra a mim, nos meus
primeiros meses de casamento.
— Mas não me diga que a senhora não está mais apaixonada pelo lorde Starlington. Não
consigo imaginar ninguém vivendo sem um amor como o meu e de Hugh. — Margareth falava
olhando para a cunhada, que fechou o cenho em uma carranca feia.
— Claro que estou, mas com o tempo as coisas se modificam um pouco, principalmente
depois dos filhos.
— Então acho que devo aproveitar ao máximo agora... — Margareth sorria e seu sorriso
era genuíno e travesso.
— E espero muitos netos — a mãe de Margareth obrigou-se a dizer, querendo participar
da felicidade da filha como se tivesse algo a ver com os sentimentos do casal.
— Não duvido que logo tenhamos alguma notícia desse tipo... — Margareth abriu um
sorrisinho maroto. — Hugh é do tipo que enche a casa com crianças. E algo me diz que não
haverá pai melhor.
Jane, a cunhada enciumada de Margareth, bufou, contrafeita com aquela simples sugestão
e toda aquela conversa. Ela não podia acreditar que Margareth, casada com o conde selvagem e
bruto pudesse realmente estar feliz.
Mas ela estava e isso era inegável até mesmo para a condessa.
— Mas e você, Jane, já não passou da hora de nos agraciar com algumas crianças
sorridentes? — Lady Starlington inquiriu, nitidamente desapontada pelos modos da esposa do
irmão de Margareth.
— Quando Deus quiser eles virão — a jovem resignou-se a dizer, tentando minimizar a
conversa.
— Talvez meu irmão precise ter uma conversa com Hugh, quem sabe meu esposo possa
ensinar algumas dicas... — Margareth provocou, arrancando outro grunhido de espanto da mãe e
um olhar de víbora da cunhada.
— Com aquele jovem conde, tão bonito, você deve ter as noites muito ocupadas mesmo
— Lady Starlington parecia alheia às alfinetadas das duas jovens e demonstrava-se admirada
com a condessa e com o amor. Era uma mulher romântica, Margareth concluiu e sem muitas
preocupações com aas formalidades.
— A senhora não faz ideia de quanto. Nunca, nem em um único dia sequer tenho paz nos
meus aposentos. Ele praticamente se mudou para o meu quarto — ela respondeu, sorrindo com
todos os dentes e falando a mais pura verdade.
Hugh deixara bem claro que não dormiria nem uma noite longe dela e praticamente
transformou os dois quartos em um único, acostumando-a cair no sono nos seus braços e
sentindo seu coração bater.
A mãe de Margareth parecia prestes a desmaiar, sabia que a insolência da filha podia ser
das piores, mas envergonhá-la assim, diante de uma das ladies mais influentes de seu meio, era
terrível.
Queria esbofetear Margareth, pedir que fosse para casa com seu marido arrogante, mas
não o fizera, resignando-se a escutar a conversa com o rosto avermelhado e suando.
Jane, por outro lado, vinha ficando cada vez mais furiosa. Não podia suportar que
Margareth, aquela jovem mimada, pudesse ser tão feliz. Na sua cabeça, aquilo deveria ser
fingimento, mas se fosse, era bem convincente.
Ouvira muitos boatos no início do casamento, sobre Margareth e Hugh se odiarem e
sobre a garota quase ter morrido numa floresta, mas então, os via juntos, e pareciam mesmo
apaixonados, com nada no mundo fosse capaz de mantê-los muito longe um do outro.
— Ouvi dizer que você esteve doente — Jane provocou, tentando espantar os
pensamentos odiosos e se concentrando em analisar a expressão no rosto de Margareth. Ela
queria descobrir a verdade e quando o fizesse, faria a cunhada pagar caro por sua insolência.
Margareth sabia exatamente como a história deveria ter repercutido e precisava pensar
rápido em uma resposta convincente. Negar, sabendo que o boato havia sido espalhado por
criadas, não era uma alternativa.
— Sim, é verdade — ela falou, como se estivesse pesarosa.
Jane sorriu, sentindo-se vitoriosa.
— Imagine a senhora, Lady Starlington...
— Ora, por favor, me chame apenas de Aurora.
— Pois bem. Imagine você, Aurora, que temos um lago lindo logo no início de um
bosque. Passei vários dias imaginando como seria passear por ali à noite. Aquele lugar foi
mantido para minha falecida sogra e é o lugar mais bonito de todo o mundo.
A mulher concordava animada, sorrindo sem qualquer formalidade. Margareth ajeitou-se
na poltrona como se quisesse melhorar sua posição, para narrar um fato longo e espetacular. As
ouvintes se prepararam.
— Bem, numa certa noite, Hugh e eu decidimos dar um passeio e a senhora pode
imaginar que andar de mãos dadas sob uma lua maravilhosa, conversa baixa, uma coisa leva a
outra e nós nos deixamos levar... — Margareth deu de ombros. — Peguei um resfriado muito
forte. Mas Hugh esteve todo tempo ao meu lado e ele mesmo cuidou da minha recuperação.
Acredite se quiser, mas nunca o vi mais preocupado, mal comeu por dias e depois que minha
febre baixou, uma das criadas até me contou que ele nem dormia a noite zelando por mim.
A lady quase pulou da cadeira, espantada, admirada e emocionada. Margareth sentia-se
um pouco envergonhada, ao mesmo tempo satisfeita por ver as caretas da mãe e da cunhada. Ela
não tinha mentido de todo, mas também não era uma verdade completa.
— A duquesa Paxton não pareceu muito animada com a sua festa — Jane despejou por
fim.
— Ora, aquela mulher não se anima com nada — Lady Starlington retrucou, rindo.
— Não se pode agradar a todos, infelizmente — Margareth concluiu.
— Minha sobrinha disse que você é a melhor e mais doce anfitriã.
Margareth ficou satisfeita.
— Graças a você, ela tem sido convidada constantemente para os chás do duque de
Devonshire.
— Ela é um amor de menina, gostei imensamente de conhecê-la. Muitas pessoas se
aproximam de nós por conta do nosso título e posses, mas ela foi tão doce e genuína... nunca
conheci garota melhor. — Margareth falou com sinceridade, lembrando-se da menina a quem
não perguntara o nome, mas que parecia derreter-se no evento, uma garota doce e romântica. —
Imagino que o jovem Leonard deve ter ficado muito encantado com a beleza e delicadeza da sua
sobrinha
— É o que espero.
— Bom, acho que já está tarde e Hugh gosta de se recolher cedo — Margareth abriu um
sorrisinho tímido.
Enquanto a carruagem do casal era chamada, Margareth deixou o marido trocando umas
últimas palavras com o pai, o irmão e lorde Starlington e chamou a mãe, levando-a para um
canto.
— Qual é o seu problema? — a mãe a inquiriu com autoridade.
— Qual é o meu problema? — Margareth repetiu com repulsa. — Você e o papai me
obrigaram a casar com um estranho, sem o menor direito de escolha e agora você faz essa cara
para questionar qual é o meu problema? Eu é que pergunto, qual o problema de vocês?
A mulher ficou contrafeita.
— Fizemos o melhor por você.
— E se ele fosse mesmo a fera que todos dizem?
— Mas pelo jeito não é, e você mesma disse que está bem.
— Não, não é. De fato, é um marido maravilhoso que me faz muito feliz. — Margareth
fechou o cenho entristecida. — Mas se fosse, a essa hora, eu poderia estar trancada numa
masmorra ou algo pior.
— Bom, se ele não é, então, tudo deu certo.
Margareth tinha vontade de chorar, esbofetear a mãe fútil e fraca, que preferia aceitar
tudo calada ao invés de lutar por qualquer coisa que fosse.
— Sabe, mãe, realmente Hugh me faz muito bem e me compreende como ninguém, sinto
muito por saber que você nunca vai sentir nada desse tipo.
— Oh! — a mulher reagiu perplexa. — Como você ousa falar assim com a sua própria
mãe? Eu sou sua mãe.
— E eu sou uma condessa, meça você suas palavras, senhora — Margareth fuzilou-a. —
Agora me diga o que há entre você e aquela duquesa Paxton.
— Não há nada, só não suporto aquela mulher.
— Por acaso, eu conheço você muito bem para saber que suportaria qualquer coisa para
conviver com gente como ela. Então, o que há entre vocês?
— O marido dela, aquele duque horrível, está tentando falir o seu pai. Nunca vi ninguém
tão repugnante quanto aquele sujeito. Usa de sua posição para nos intimidar com as questões de
importação do seu pai e as coisas vão de mal a pior. É claro que eu não deveria estar ciente de
nada, afinal, isso é assunto dos homens, mas as coisas chegaram a tal ponto que mesmo eu, uma
dama, percebi o que está ocorrendo.
Margareth conteve um grunhido de assombro e a mãe teve de cobrir o rosto com um
lenço para evitar de começar a chorar. A condessa jamais a viu tão fragilizada e assustada.
— Preciso saber como ele está fazendo isso.
— Eu não sei, só escutei umas poucas conversas entre seu pai e seu irmão.
— Mãe, eu posso ajudar, mas você vai descobrir todos os detalhes. Assim que você me
der mais informações, falarei com Hugh. Ele é um bom homem e vai nos ajudar. Você entendeu?
— Mas seu pai...
— Meu pai é teimoso e difícil, vai preferir perder o pouco que resta a pedir ajuda.
A mulher assentiu, recompondo-se quando o conde e os demais homens apareceram.
Lady Starlington fez uma reverência, adotando a postura exigida pelo decoro de sua classe.
— Minha sobrinha tinha razão, Vossa Graça é mesmo uma moça encantadora.
— Obrigada. Jamais imaginei que iria gostar tanto de uma amiga da minha mãe —
Margareth declarou, com naturalidade. — Você e sua sobrinha serão minhas convidadas de
honra no próximo chá.
As duas mulheres despediram-se e então Margareth partiu, seguida por seu marido, que
estava nitidamente mortificado e com um estado de espírito exausto. Os dois jantaram na
varanda, vestindo apenas as roupas de baixo. Margareth estava soturna e Hugh preocupado.
— Por que você queria saber como seu pai reagiria à menção a Paxton?
— Porque conheço minha mãe e sabia que algo a estava perturbando.
— E o que você descobriu?
— Que o duque está prejudicando as importações e tentando falir meu pai. Piorar o que já
está bem ruim.
— Você acha que ele quer nos atingir?
— Acho que ele quer alguma coisa, talvez alguma influência do meu pai no Parlamento
ou uma de nossas propriedades. De qualquer forma, teremos de descobrir e usar isso a nosso
favor. Vamos acabar com aquele sujeito.
— Alguém já disse que você pode ser uma megera quando quer?
— Meu marido me diz isso às vezes, mas como ele é uma fera selvagem não pode me
julgar muito.
— Julgar não, mas devorá-la sim.
O primeiro chá oferecido na luxuosa mansão dos Ruthenford ocorreu no final da tarde de
uma quinta-feira. Margareth estava delicada em um vestido novo feito sob medida com laços em
cor de vinho nas mangas, alguns bordados de flores no corpete que evidenciavam sua candura e
pureza, além do contorno perfeito do busto, enquanto ela mesma só conseguia pensar em
arrancar as anáguas e partir para cima do marido, tirando dele as roupas enfadonhas com as quais
perfilava pomposo pelo quarto, nervoso do mesmo jeito em que estivera na recepção em Surrey
Hall.
Hugh saiu do quarto de vestir com pressa, dizendo apenas que tinha que buscar algo.
Quando retornou, trazia nas mãos um lindo colar de safiras que parecia brilhar ainda mais posto
em contraste com a brancura da pele da condessa e as cores vivas do vestido.
Passou-o pelo pescoço da esposa e o prendeu. Margareth puxou os cabelos num coque
alto com pontas esparsas que caíam sobre os ombros. Cobriu-se com um xale, colocou duas
pulseiras delicadas de ouro e deu o braço para o marido, a fim de descer as escadas com toda a
classe e beleza de que dispunham. Antes que mudasse de ideia e ficasse nua, portando só o colar
sobre os seios e...
A maioria dos convidados já petiscava perto da mesa de quitutes, dois homens fumavam
perto da grande janela que dava para o jardim, enquanto quatro senhoras aglomeravam-se perto
da entrada em arco, conversando sob a luz de candeeiros ao estilo gótico. Assim que o casal
chegou à imensa sala de visitas, o silêncio tomou conta do lugar.
Chegarem depois dos convidados desta vez não pareceu chocar ninguém e Hugh, que
vinha sem cartola, sorriu para a esposa quando ambos deram conta da impactante imagem que
faziam, ao passar por um espelho adornado com marfim que ficava de frente para a porta da
varanda.
A sala de convidados era na verdade um ostentoso salão de recepção, com uma mesa
enorme que acompanhava toda a extensão da parede, cadeiras almofadadas na última moda
francesa, quadros nas demais paredes e vasos cheios de flores sob pequenas cristaleiras e
toucadores. Criadas ágeis e silenciosas abasteciam os pratos e as taças, não deixando um
cavalheiro ou dama sem algo nas mãos por um segundo que fosse.
Hugh congelou quando deu de cara com seu inimigo. Paxton estava vestido com um
fraque propício para o verão. Deixava sua bengala e cartola aos cuidados de um lacaio e puxava
a esposa com ares enfadados, quando se deparou com o olhar especulativo do conde.
A mulher, que se vestia como a maioria, sob babados e mais babados, não conseguiu
evitar um olhar enviesado para Margareth, resplandecente com as safiras que combinavam
perfeitamente com os olhos do marido. Não havia uma dama sequer na sala que não suspirasse à
passagem dos dois.
A jovem condessa cumprimentou o duque e a esposa com uma reverência formal e depois
sorriu para a duquesa, convidando-a para juntar-se às demais senhoras. O conde não disse muito
para o inimigo, deixando-o sozinho na primeira oportunidade e indo juntar-se ao jovem Leonard,
que não parava de tagarelar sobre uma certa senhorita que o havia deixado hipnotizado com seu
recato e inteligência.
Depois de quase uma hora circulando pelo aposento, exibindo sua melhor performance de
anfitriã, Margareth convidou a todos para a refeição. Muitos gracejaram sobre os petiscos terem
sido o suficiente para abastecer seus estômagos, mas ninguém se queixou ao ver a refeição
começar a ser servida.
Carnes frias, chás variados, leite, queijos, frutas, tortas e muitas outras iguarias de
diversas regiões. Tudo foi rapidamente passado para os pratos, deixando os convidados
deleitados com uma refeição, que segundo Margareth pensava, seria capaz de abastecer um
vilarejo pobre por semanas.
A conversa soou animada durante a refeição, a não ser por um ou outro olhar do duque,
que fuzilava a beleza juvenil e rebelde de Hugh, cujas mãos descontraidamente repousavam
sobre as da esposa. A duquesa pouco abriu a boca, deixando claro que só estava ali por motivos
sociais, mas a condessa por sua vez, conquistou cada senhora, exibindo sorrisos marotos e
sempre dizendo o quanto admirava cada uma das damas, perguntando sobre pequenos detalhes
de suas roupas ou vida, como se buscasse apoio na experiência das senhoras e valorizasse cada
novo conselho.
No fundo, queria que tudo chegasse ao fim o mais rápido possível para se ver livre das
roupas e poder se sentar no marido e não ao lado dele. Mas até que isso fosse possível, tinha que
se concentrar na missão.
E o tempo pareceu correr tão lentamente que tanto Hugh quanto Margareth se viram
cansados de forçar expressões de neutralidade e satisfação. Só muito depois sentiriam o alívio
que tanto precisavam.
—Paxton quer casar a filha com Leonard — Margareth contou, muitas horas mais tarde,
quando ambos já se preparavam para dormir.
— Mas achei que o garoto estivesse prometido à filha do conde de Canterburry.
— E está. Porém aquele duque feio não é bobo, sabe que o garoto é um ótimo partido. E
que as moças se derretem por ele.
— E você, se derrete por ele?
Margareth gargalhou.
— Acho que prefiro as feras do campo.
Dessa vez foi Hugh quem riu alto, puxando a esposa para junto do corpo e beijando-a
com intenções evidentes.
— O que você tem em mente? — ele perguntou, arrumando uma mecha rebelde do
cabelo louro dela e pousando o rosto entre seus seios para apreciar o delicioso cheiro de óleo de
rosas.
— Acho que Leonard ficaria muito bem com a sobrinha da lady Starlington.
— Você gostou mesmo daquela mulher, não é?
Margareth deu de ombros.
— Gostei da sobrinha também.
— Eu gosto do garoto, não queria envolvê-lo...
— Eu sei e sinto muito por isso, mas nesse momento ele é tudo que temos. E acho que
tive uma ideia.
Hugh encolheu os ombros, vencido. Margareth tomava a frente de seu plano, mais
determinada do que ele jamais pensara ser e, possivelmente, com menos escrúpulos e bem mais
eficiência.
Se ele havia se casado com uma jovem bem relacionada para se aproximar dos lordes do
parlamento, ela seria capaz de casar qualquer outro com ainda mais sucesso para ajudá-lo a
conseguir o que queria.
Ainda pensando sobre isso, Hugh deixou-se tomar pela esposa que ainda tinha energia
suficiente para convencê-lo de que estava certa. Depois do coito, com os olhos cerrados e
sentindo o cheiro do cabelo louro que se espalhava por seu peito, ele não tinha mais dúvidas de
que sua esposa faria o que bem quisesse e ele a seguiria ao inferno se fosse preciso.
Margareth faria compras com a duquesa de Devonshire numa manhã de quarta-feira.
Quando a hora chegasse e o dia quente estivesse em seu ápice, começaria a colocar seu plano em
ação, só precisava ser cautelosa e agir com a mente fria.
O verão vinha chegando e ela não via a hora de voltar para Surrey Hall. Desde o primeiro
chá dado em sua residência em Londres, o casal Ruthenford vinha sendo o mais requisitado para
as festas e eventos da nobreza da cidade. Muitos lordes sem títulos, mas com dinheiro o bastante
para adotar os costumes da nobreza, também insistiam na presença de Hugh e sua exuberante
esposa.
As semanas iam se passando com uma rapidez assombrosa e a condessa escolhia a fio os
eventos aos quais ela e seu marido iriam participar. Excluindo, propositalmente, os malditos
Paxton.
Naquela manhã, ela estava exultante. Sabia muito bem o que a família de Leonard
representava para seu marido e usá-los daquela forma não parecia a coisa mais certa a fazer.
Como não era uma grande estrategista e nem tinha conhecimentos suficientes para bolar planos
mirabolantes, tais como os livros que lia, ela simplesmente passou a fazer visitas mais constantes
à duquesa, cativando-a bem devagar. Dia após dia.
Margareth estava vestida com simplicidade, carregando uma sombrinha que combinava
com seu vestido sem mangas. A duquesa de Devonshire, por sua vez, vinha num lindo tom de
vermelho, sob um vestido de mangas curtas caindo sobre os ombros e uma flor no longo cabelo
crespo e negro. Era uma mulher beirando os quarenta e poucos anos, talvez cinquenta, mas com
uma expressão jovial e alegre, que facilmente fazia com que a jovem condessa se lembrasse de
Leonard.
Madelina era uma espanhola que nunca perdeu o sotaque e frequentemente se punha a
conversar em espanhol, como se esquecesse que vivia entre ingleses que não compreendiam uma
palavra sequer.
Para seu contento, Margareth aprendeu algumas palavras no idioma materno da duquesa,
o que divertiu as duas por horas e horas, atazanando os maridos inocentes que mal sabiam que
elas não paravam de falar palavras de baixo calão.
Hugh ia ficando mais próximo do duque e gostava cada vez mais do filho dele. Aquele
jovem tinha um ótimo caráter, que, com toda certeza, havia herdado do pai.
Seu espírito livre, porém, Margareth assegurava que vinha da mãe, a espanhola de sangue
quente, que conquistara o marido desafiando-o a domá-la. A duquesa, era sem dúvida uma
mulher muito elegante, acompanhava a moda, tinha sempre chapéus da melhor qualidade e
parecia feliz. Evitava ao máximo os círculos da elite e criara um filho apaixonado pela vida. Era
tão diferente da corja social de Londres quanto ela mesma e seu marido conde.
Enquanto Madelina escolhia uma das joias mais caras da joalheria, Margareth fingia
apreciar um broche pequeno, em formato de flor de lótus com um diamante na ponta. Seus
pensamentos, porém, não paravam um segundo, tentando descobrir uma forma de abordar o
assunto. Foi quando veio a ideia.
—Madelina, querida, veja esta peça aqui — falou, apontando para um colar bem
pequeno, cujo pingente parecia-se com uma gota de orvalho azulada.
— Um pouco sem graça para mulheres como nós, você não acha? —Madelina respondeu
sorridente.
— Sim, sem sombra de dúvidas, sem graça para qualquer mulher que tenha um pouco de
alma no corpo — Margareth falou, piscando e arrancando uma risada firme da outra.
Margareth pegou no braço enluvado da duquesa e cochichou ao pé de seu ouvido.
— Na verdade, acho que vi esse colar no pescoço da duquesa Paxton.
— Não é possível.
— Só entre nós? — Margareth puxou a mulher ainda para mais perto. — Se Hugh sonhar
que estou me metendo na vida alheia, ficará enlouquecido.
— Pobre de você, não consigo imaginar como deve ser difícil viver com um homem tão
terrível —Madelina falou, gargalhando sem o menor pudor e insinuando exatamente o que já
suspeitava sobre o casal.
— Ah! Pare, assim ficarei corada — Margareth retrucou divertida com a ousadia da nova
amiga. — Jamais imaginei que o casamento pudesse ser... assim... — falou por fim com toda a
sinceridade de seu coração.
— E não é para a maioria das mulheres da nossa classe. Mas para nossa sorte, não somos
como elas e nos divertimos muito com nuestros hombres[1]. E aquele rapaz hermoso[2] deve ser
mesmo uma fera... no bom sentido. — respondeu a duquesa com simpatia. — Mas o que era
mesmo que você ia dizer? Não se pode perder uma boa fofoca... precisamos estar sempre bem-
informadas.
— Você é muito curiosa. Bem, eu ia dizer que chegou aos meus ouvidos que a família
Paxton está por um triz de perder tudo. Parece que a duquesa está até penhorando suas joias. Não
me impressionaria nada se realmente este colar fosse a mesma peça que vi no pescoço dela dias
atrás, quando nos vimos em um chá na casa da lady Melborn.
— Santo Deus — Madelina cobriu a boca para reprimir as palavras de espanto e pesar. —
Coitados. Não que eu goste daquela mulherzinha enjoada, mas longe de mim desejar esse pesar a
alguém. Será verdade?
— Bem, eu não estava acreditando também, mas veja esse pingente, posso afirmar com
certeza que o vi no pescoço da duquesa. Sem contar que...
— Que...?
— Parece que o duque já tem tudo resolvido... ou planejado, pelo menos.
— Pelo amor de Deus, pare de rodeios, minha jovem.
Margareth deu de ombros.
— Parece que o duque está acertando o casamento do filho com a menina Starlington. A
sobrinha protegida do banqueiro.
— Sim, aquela bela jovem seria uma ótima solução. Além de muito bonita e bem-
educada, parece que herdou um bom dinheiro dos pais e vive sob os cuidados dos tios, que são
gente muito refinada, até onde sei.
— Exatamente. Só não é bom negócio para a jovem.
— Mas o jovem Paxton é bem aprazível, além de ter um bom nome, como pode não ser
um bom partido?
Margareth suspirou consternada, exalando seus ares mais inocentes e culpados.
— Creio que não posso dizer mais nada, minha amiga. O que sei, foi-me dito em
confiança por uma jovem cujo coração está preenchido de amor e prestes a se partir.
Madelina sorriu. Seu espírito vivo e animado estava sedento por uma boa e emocionante
história de amor jovem.
— E se eu prometer guardar para mim?
— Você juraria isso?
— Mas é claro, embora acredite não ser necessário. Mas ande, diga-me, quem poderia ter
conquistado o coração daquela bela jovem?
— O seu filho.
Madelina soltou um imenso suspiro de prazer e espanto. Ficou calada por algum tempo e
então declarou, por fim, satisfeita:
— Não posso dizer que fiquei surpresa. Meu filho é mesmo lindo e um excelente partido.
— Realmente, um belo jovem. E meu marido o aprecia muito.
— Pelo menos agora compreendo o motivo de você me contar toda essa história. Não tem
a ver com a falência dos Paxton, não é? Você está sendo alcoviteira.
— Que palavra terrível, estou apenas sendo uma apoiadora do amor.
— Sei, sei... mas uma lastima toda essa história. Os Paxton, a menina Starlington...
— Bom, de qualquer maneira, você não ouviu nada disso de mim, sou uma condessa
recém-casada com um conde muito malvado de quem todos têm medo. — Ela piscou e riu.
— Aquele seu conde é mesmo uma peça rara.
— Muito rara.
Enquanto as duas mulheres escolhiam suas joias e conversavam sobre outras coisas sem
importância, Margareth percebia o quanto aquela conversa havia perturbado a duquesa.
A mulher era esperta e, portanto, Margareth não voltaria a tocar no assunto, pois poderia
despertar suspeitas, mas uma coisa a jovem condessa não tinha dúvidas. Algo no que dissera
havia provocado uma mudança de postura e um semblante ainda mais astuto na companheira de
compras. Algo havia despertado o interesse da duquesa.
Cerca de uma semana depois, o duque de Devonshire ofereceu um baile extraordinário
que não deixava em nada transparecer ter sido feito de última hora. Mas Margareth, ao chegar à
festa e ver a linda senhorita Starlington em conversa com a duquesa e outras ladies, não teve
mais dúvidas. Sua conversa havia gerado resultados.
A grande maioria das mulheres nobres não suportava a presença pedante da duquesa
Paxton, mas ninguém jamais ousaria lhe dizer qualquer coisa. Em todo caso, Madelina parecia
adorada por todos, inclusive pela grosseira duquesa que fazia vista grossa aos gracejos
exuberantes da espanhola, tratando-a com a maior deferência e cordialidade.
— Acho que tudo está correndo como planejado — Margareth falou, apertando o braço
do esposo e sorrindo-lhe. — E algo me diz que teremos novidades em breve.
Os dois valsaram com a mesma paixão que faziam em todos os bailes, ignorando planos,
pudor ou qualquer resultado que a imagem do casal apaixonado poderia causar.
Eles gostavam daqueles momentos e sempre acabavam excitados e ansiosos para voltar
para casa.
Para espanto de todos, o duque de Devonshire e a esposa fizeram quase a mesma coisa,
dançando acaloradamente pelo salão e arrancando suspiros confusos e espantados de muitos.
Margareth tinha certeza de duas coisas, estava sendo aceita e admirada e estava sendo
provocada. Ela ficou ainda mais encantada com Madelina a partir desse dia.
— Vamos dar uma volta no jardim, condessa? —Madelina aproximou-se de Margareth
depois de rodar o salão em uma segunda valsa. — Está um pouco quente aqui, você não acha?
— Sim, por favor, adoraria dar uma bisbilhotada por sua propriedade. Descobrir se minha
casa chega aos pés desta imensa mansão e das suas flores. Já ouvi falar que você tem as flores
mais lindas da cidade.
— Não seja ridícula, pois ambas sabemos que seu marido tem mais dinheiro do que o
meu.
— Entretanto, o seu tem um título mais importante.
— Sem dúvidas.
— Mas o meu é mais bonito — Margareth provocou-a.
— E uma fama de dar medo.
— Oh! — Margareth cobriu os lábios com a mão, impedindo que um gritinho de
assombro escapasse por sua garganta. — Tudo bem, essa você ganhou, duquesa.
— Por acaso fiquei sabendo que ele se interessa muito pelas partes íntimas da senhora —
ela falou, gargalhando em seguida.
Margareth então compreendeu, lady Paxton já havia espalhado seu veneno invejoso.
— Você ficou sabendo da minha pequena maldade. Deus, aquela mulher me dá nos
nervos.
— Fiquei sim e devo dizer que achei bastante ousado, ainda que engraçado. Até você se
casar, pouco eu sabia de você, nada além de sua beleza espetacular e sua paixão por livros. Mas
então, eis que você se torna a condessa de Surrey e uma das mulheres mais interessantes desse
bendito país.
As duas sentaram-se em um banco no coreto de madeira. As flores espalhadas pelas
amuradas davam um ar angelical ao patamar. Madelina continuou segurando o braço da
condessa.
— Até então tudo, tudo estava nos conforme, O conde de Surrey escolheu uma esposa,
andava ocupado, mas eis que muitos boatos começam a circular pelos ambientes que frequento.
Primeiro, a estranheza de um jovem nobre se casar com uma moça sem títulos, o que facilmente
seria excluído, afinal sua beleza justificaria isso.
Margareth suspirou.
— O que foi querida?
— Nunca me achei muito bonita — ela confessou. — Não sou exatamente um modelo de
candura e meus espartilhos são maiores que o da maioria das senhoras.
— Não diga bobagens, você é uma das moças mais lindas que já e seu jeito é diferente de
tudo. Mas... será que posso continuar?
— Sim, por favor.
— Bom, os boatos começaram quando sequer houve uma viagem de lua de mel, alguns
falaram em casamento forçado por uma gravidez, mas você não apareceu grávida. Mas, além
disso, os dois se enfiaram na propriedade do campo e pouco se soube sobre o jovem casal, até
que veio a notícia de que você, por pouco, não teria perdido a vida.
Margareth não conseguia falar, estava perplexa com a astúcia e destreza da duquesa. Era
uma mulher sem igual e direta, e estava traçando sua linha de raciocínio para não deixar margem
de discussão. Ela falaria o que a estava incomodando e caberia à Margareth a convencê-la do que
quer que fosse.
— Então, vieram os boatos de que estariam tão apaixonados que o conde sequer pisa nos
próprios aposentos. Você sabe quanto os criados falam por aí, não é? Mas é um tanto quanto
contraditório, você não acha? Um dia se odeiam, no outro não dormem separados... — sem
esperar pela resposta continuou falando, os olhos amendoados faiscando. — E eis que a conheci
e, francamente, tirando uma ou outra exceção você é adorada por todas as mulheres que conheço.
Você não acha isso tudo intrigante?
— Vendo por este ângulo, devo concordar.
— Então, devo considerá-la como uma amiga ou alguém que se aproxima de mim por
outro motivo? Talvez um bom casamento para uma amiga...
Margareth suspirou. Havia subestimado a inteligência da duquesa e por isso precisava
mudar de estratégia. Mentiras só piorariam tudo. É claro que ela desconfiara de que Margareth
estivesse empurrando a senhorita Starlington para Leonard, sem sequer supor os reais motivos de
sua aproximação, mas de qualquer forma, isso poderia ser um problema, um revés para seus
planos. Talvez a verdade, ou um pouco dela pelo menos, resolvesse a situação.
— Posso confiar realmente em você, Madelina?
— Se não for algo que afete minha família, pode, é claro — a mulher respondeu com
extrema franqueza.
— Quando me casei com Hugh, eu o odiava. Odiava-o como nunca fui capaz de odiar
alguém. E odiava meu pai por ter me forçado a casar com um homem de dar medo, rodeado de
fama e boatos. Como prova de que pouco se importava comigo ou meus sonhos, fomos direto
para Surrey Hall e sequer tivemos uma lua de mel — Margareth falou, deixando-se transportar
para sua primeira noite de casada. — Veja, eu não tinha qualquer entendimento do que
aconteceria naquele quarto, na primeira noite como esposa de um conde. Por mais que tenha
implorado pra minha mãe, tudo o que eu aprendi foi que deveria deitar-me de olhos fechados e
deixar que meu marido fizesse o que bem entendesse com meu corpo. Sabe o quanto isso é
ultrajante?
— Sei sim. É o que a maioria das mulheres aprende — Madelina falou, suspirando. —
Mas suponho que você não seja do tipo que aceita isso.
— Claro que não, como posso não ser a dona do meu próprio corpo?
— Entendo.
— Acredite, as primeiras semanas foram terríveis. Eu me recusava a ceder aos caprichos de
Hugh e ele tornava minha vida um inferno naquela casa.
Madelina não disse nada.
— Então, uma noite fugi. Por muito pouco não morri naquele frio. Mas Hugh zelou por
mim até que estivesse recuperada e foi apenas uma questão de tempo para nos conhecermos
melhor.
— E agora você o ama, perdidamente — a espanhola afirmou, os olhos focados na
condessa.
Margareth nunca tinha pensado nisso, mas sim, ela o amava com todas as suas forças,
com todo seu coração.
— Amo — disse, sem precisar de mais palavras para que essa verdade enchesse o espaço
entre elas.
— Estava ainda decidindo que tipo de pessoa você é, quando me contou a história dos
Paxton. Mas é claro que já devia saber que estávamos nos preparando para unir nossas famílias
casando Leonard e sua garota quando me contou sobre os boatos...
Margareth concordou, decidindo ser o mais honesta que pudesse.
— Confesso que fiquei um pouco apreensiva naquele dia. Curiosa a respeito do seu
interesse pela duquesa. Sabe, meu filho admira muito seu marido. Ele o adora. Quando procurei
informações por aí, não fiquei sabendo de nada sobre a suposta dificuldade do duque, mas essas
coisas são facilmente escondidas de nós mulheres, você não concorda?
— Você é muito astuta — Margareth deixou escapar.
— E como você acha que conquistei meu marido? — a duquesa falou, gargalhando e seu
riso fácil encheu o coreto de eco. — Diga-me, os Paxton realmente estão em maus lençóis?
— É o que parece.
— E a menina Starlington, gosta do meu filho?
— Conheci-a na recepção que oferecemos em Surrey Hall. É uma boa moça e está
genuinamente encantada por Leonard, embora o tio esteja muito inclinado a dar sua mão ao filho
do duque de Paxton. Não menti para você, Madelina, não tenho motivos para isso e sou
realmente a favor do amor.
— Ainda mais se isso incomodar os Paxton — Madelina concluiu e Margareth corou.
— Não consigo imaginar uma vida mais miserável do que ser parente daquela duquesa
entediante.
Madelina observou atentamente a expressão de Margareth. Depois concordou com um
aceno de cabeça.
— Meu filho não fala em outra coisa que não seja essa bela jovem. Nunca o vi tão
interessado em alguém, mas romper um compromisso com outro duque pode ser complicado. E
veja, muitos esperam que meu filho se case com a filha do Canterburry, mas meu marido odeia
aquele homem desde que era bem jovem... depois começamos as negociações com a filha de
Paxton, que não é ruim, apesar dos pais que tem, ela parece uma garota graciosa e até que
ansiosa em agradar. Talvez seja um problema mexer com esse assunto.
— Imagino que sim.
— Mas quer saber, sou uma entusiasta do amor. Pode soar piegas, mas me casei por amor
e gostaria que meu filho pudesse fazer o mesmo. Adoraria que ele fosse feliz, como o duque e eu
somos. E no fim, a decisão será dele. Ele é dono do seu destino.
— Acho que é o sonho de toda mãe, que seus filhos encontrem a felicidade e que sejam
dono de sua própria vida.
— Discordo de você. A grande maioria que conheço tem os filhos como apenas uma
mera peça de xadrez, ferramentas capazes de tornar possíveis conexões e alianças que podem
mover o mundo e que sem a união de uma família, talvez não fosse possível.
— Nossa, isso é... terrível.
— É mesmo, mas é a verdade. Meu pai mesmo, só concordou que eu me casasse com um
estrangeiro por causa do título.
— Mas você o amava, não é?
— Ah sim, com a força de uma tempestade. E ele a mim. Mas tinha a fama de ser um
homem de muitas mulheres... Já contei a você que meu marido não gosta dos Paxton?
— Pensei que fosse o contrário.
— Este nosso mundo é muito complicado. Por isso, a maior parte das mulheres prefere se
manter na ignorância, pensando apenas em vestidos e joias.
— Você adora joias e vestidos — Margareth provocou-a.
— Mas que espécie de mulher eu seria se não gostasse?
As duas riram juntas.
— Não sei o que há, mas meu marido tem aversão à família Paxton. Entretanto uma
ligação entre os dois ducados seria um grande passo. E por isso não se opôs quando Paxton
apresentou a filha e disse, sem qualquer rodeio, que nosso Leonard deveria desposá-la.
— Entendo.
— Mas como eu disse, acho que todos nós deveríamos casar por amor.

Margareth estava com a mente em um turbilhão. Madelina havia se transformado numa


verdadeira surpresa. Nunca conhecera uma mulher mais mordaz e ousada, sem medo de falar o
que pensava. Mas agora estava feito, não tinha como voltar atrás e a duquesa jamais poderia
sonhar sobre os reais motivos pelos quais Margareth estava empenhada.
Ela havia transformado a mulher em sua aliada e um casamento provavelmente ocorreria
em breve. Agora só precisava saber como fechar ainda mais o cerco em relação ao casal Paxton.
É claro que não estavam falidos, mas deveria haver algo que pudesse ser usado contra ele e sua
esposa repugnante. Somente com o afastamento daquela criatura horrenda é que os Ruthenford
poderiam ter sua vingança contra o velho duque de Canterburry.
Naquela tarde, pela primeira vez, Margareth tomaria chá na casa dos Starlington e
conheceria o inimigo número um do marido. Um velho de aparência autoritária que exibia uma
esposa de não mais que vinte e um ou vinte e dois anos. Uma jovem de olhar triste que falava
pouco e ouvia distraidamente a conversa ao redor.
Acompanhada pelo casal, também estaria a única filha do duque, uma jovem quase da
mesma idade da madrasta, com cabelos louros e expressão angelical. Linda.
Naquela manhã, Hugh estava com um péssimo humor.
— Eu não quero ir.
— Mas Hugh, é a melhor forma de nos aproximarmos do Duque de Canterburry.
— Pois diga que estou doente.
— Nem pensar. Tenho dado duro para conseguir afastar Leonard das duas pretendentes e
colocá-lo no caminho de Charlote Starlington e para quê? Para você jogar tudo fora por causa do
seu mau humor?
— Você sabe o quanto eu odeio aquele homem. Por anos, venho bolando um jeito de
destruí-lo e a toda sua maldita família. Como poderei me sentar à mesa com aquela gente?
— Do mesmo jeito que tem feito com Paxton. Ignore-o se for preciso, mas nós vamos.
— Não vamos, não.
— Hugh, destruí qualquer chance do Paxton de roubar o pretendente da filha do velho e
estar lá hoje é fundamental. Só assim poderemos nos aproximar daqueles a quem seu pai
prometeu dar o troco. Além do mais, a vida da minha família também está em jogo.
Hugh arriou na cama, vencido. Margareth terminou de aprontar-se com a ajuda de Mady,
a quem mandou um lacaio chamar e então prendeu o chapéu e sorriu afetuosamente para o
marido rabugento.
Apesar do estado de espírito soturno, Hugh esbanjava beleza e sorrisos ao circular entre
os convidados do lorde Starlington, aceitando reverências e retribuindo com eficiente polidez.
Margareth, logo após sua chegada se tornara uma das mais festejadas senhoras, sendo
convocada para todas as conversas e debates femininos sobre moda, moral e o que mais surgisse.
Cerca de uma hora depois, o duque de Devonshire chegou acompanhado da esposa e do filho.
Todos vinham vestidos com esmero e responderam a cada mesura com educada formalidade.
Quando chegou a vez de Margareth, Madelina simplesmente esqueceu a pose de duquesa
e se atirou a um afetuoso abraço. As duas sorriram e muitas senhoras suspiraram de inveja e
admiração da relação das duas nobres.
Pouco a pouco, o grupo foi sendo perfeitamente ajustado à mesa de chá e servido com
delicadeza e esmero. Charlote Starlington estava sentada perto da tia, o rosto rosado e os lábios
carnudos se sobressaíam, em realce ao vestido com costura prateada. Leonard não desviava os
olhos da menina, que sorria tímida para o rapaz.
Depois da refeição, todos se reuniram na sala de jogos da família, conversando e
bebendo. Lorde Starlington mandou servir vinho do porto e o que mais interessasse aos
convidados. Quando não havia sequer uma pessoa cuja mão estivesse deposta de taça, anunciou
com sua voz de trovão:
— Caros amigos, hoje tenho a felicidade de anunciar que um grande momento chegou
para nossa família — ele tomou fôlego. — Para minha tristeza, há muitos anos, meu irmão e sua
esposa deixaram este mundo num trágico acidente. Muitos aqui devem se lembrar de como nossa
família ficou assolada pela tristeza. Agora, porém, anos mais tarde, nossa sobrinha e protegida
tornou-se uma moça adorável. De boa educação e moral impecável. Tamanhas são sua beleza e
graça, que nos deu a maior e melhor notícia de todos os tempos.
O homem olhou para o jovem Leonard que tinha as bochechas avermelhadas. Ergueu a
taça e sorriu.
— Hoje cedo fui agraciado pela visita do jovem Marquês, filho do meu amigo antigo e
Duque de Devonshire. Para nossa surpresa, mas não espanto, nossa amada sobrinha era alvo de
sua afeição e ele nos honrou com muita alegria, ao pedir nossa benção e permissão para desposar
Charlote. Não vendo impedimento e compreendendo a força do amor dos jovens, com muita
satisfação hoje brindo ao noivado de minha sobrinha com o marquês de Hartington. À felicidade
dos noivos.
Todos ergueram suas taças e brindaram. Margareth sorriu e Hugh apertou a mão de
Leonard que estava tímido. Os dois haviam sido empurrados um para o outro, a cada nova valsa
que Margareth insistia que dançassem, a cada nova conversa que travavam durante um baile que
pouco interessava a ambos ou a cada novo passeio pelos jardins a céu aberto com estrelas como
holofotes e a lua como madrinha.
Se Margareth tinha instruído Charlote a ser ela mesma, isso era verdade e provavelmente
tinha sido esse espírito inteligente e a alma leve que tinham feito todo o trabalho duro. Estavam
de fato apaixonados e felizes e isso era uma verdadeira vitória. Passaram o restante da noite aos
cochichos, trocando gracejos discretos e um beijo escondido.
Margareth se deixara levar pela conversa animada da amiga, a duquesa de Devonshire
sempre tinha algo interessante a contar, ainda que fugisse da temporada londrina antes mesmo
que essa despontasse ao ápice de bailes e recepções. A duquesa também tocou piano de forma
espetacular e cantou uma melodia em espanhol, arrancando risos curiosos das senhoras e olhares
cobiçosos de alguns senhores.
Apesar de tudo, Hugh estava se divertindo. Gostava da companhia sóbria do pai de
Leonard e da conversa animada da mãe. Gostava de ver sua esposa desfilando entre as mulheres
e se destacando com sorrisos marotos em sua direção. Imaginava-se tocando-a ali mesmo, mas
logo que sentia seu corpo dar sinais, afastava os pensamentos e voltava à comemoração de
noivado do jovem.
Um baile ostentoso foi dado, semanas depois, oficialmente anunciando o noivado do
casal. Foi nessa noite que Margareth teve certeza. Lady Elizabeth Coucex, a duquesa de
Canterburry, escondia um segredo.
Que a moça era muito jovem e entediada, ninguém tinha qualquer dúvida, mas havia algo
mais e Margareth não via a hora de descobrir.
Tudo transcorria na mais perfeita ordem, Margareth e Hugh desfilavam relaxados,
conversando com amigos e trocando beijos acalorados às escondidas, até que após uma valsa,
tentando tomar fôlego, Margareth viu-se em meio a uma conversa séria entre as duquesas
Madelina e Claire Paxton.
— Isso me parece uma calúnia de alguém que está com inveja — foram as palavras de
Madelina que chamaram a atenção de Margareth.
— É o que dizem por aí, não estou fazendo nada além de contar a você o que ouvi de
outros. — A duquesa Paxton exasperou.
— Fez bem, mas assim que escutar qualquer coisa do tipo, trate de abafar a besteira com
uma reprimenda, pois isso mancharia a reputação da duquesa.
Margareth fingiu estar distraída, prestando atenção aos casais que se espalhavam pelo
salão valsando, mas na verdade seus ouvidos estavam mais atentos do que nunca.
— Como sempre você está certa — Lady Paxton resmungou. — Uma pena não nos
tornarmos da mesma família.
— A mesma coisa tem me dito o duque de Canterburry e sua esposa. Mas o que podemos
fazer, não é? — a duquesa espanhola sorriu. — O coração dos jovens é impulsivo e anseia por
amor. É claro que nós preferíamos que a moça tivesse algum título, mas sendo ela tão graciosa e
recatada, não vejo como isso possa ser um problema. Além do mais, será duquesa um dia,
quando meu filho herdar o título do pai.
Claire não disse nada, amarrou um pouco mais sua cara inchada e afastou-se com um
meio sorriso furioso.
Naquele instante, Margareth sabia exatamente o que fazer.
— O que você acha do meu plano?
— Acho que é uma loucura, mas pode dar certo.
— E o que mais o garoto falou? — Margareth inquiria Hugh com determinação.
— Que a duquesa se encontra com um rapaz duas vezes por semana. Num quarto
discreto.
— Isso é ótimo. Acho que devemos começar a colocar essa ideia em prática o quanto
antes. Ainda mais porque tenho certeza de que aquela lady Paxton asquerosa está espalhando a
notícia o tanto quanto pode. Logo a moral da moça estará manchada e de nada nos servirá.
— Concordo.
— Ótimo, agora me ajude a tirar o espartilho.
— Mas você acabou de colocá-lo.
— Eu sei, mas estou com vontade de tirar.
Margareth sorriu, passando os dedos sobre o peito ainda nu do marido e virando-se de
costas. Deixou o pescoço pender para um lado e a cabeleira jorrar feito uma cachoeira. A simples
visão do pescoço e clavícula dela fez com que Hugh ficasse excitado, passando a puxar as fitas
do espartilho com pressa.
Quando a despiu, sentiu-se duro como uma maldita pedra e cheio de desejo.
— Por que você não vai providenciar o que combinamos e eu o espero aqui?
— E o que você vai fazer enquanto isso?
— Nada — ela fez uma expressão inocente.
— Conte-me — o conde sussurrou em seu ouvido.
— Vou deitar-me na cama completamente nua e me tocar até que sinta cada parte do meu
corpo úmida.
Hugh alteou as sobrancelhas.
— E se você demorar, não terei outra escolha, a não ser eu mesma satisfazer os meus
desejos. Mas saiba que será o seu sorriso e a lembrança do seu gosto que me darão prazer.
O conde sorriu com malícia, adorando quando sua esposa deixava transparecer seu
temperamento ousado e autoritário. Era uma delícia saber do que ela era capaz e de como isso o
deixava excitado. Saiu apressado para a biblioteca, voltando minutos mais tarde com um olhar
satisfeito.
Quando entrou no quarto surpreendeu-se com o que viu. Margareth estava realmente
deitada sobre os lençóis macios, completamente nua. Os dedos estavam dentro do tufo de pelos,
na parte íntima. Ela gemia, enquanto a outra mão apertava com volúpia um dos seios.
Imediatamente, ele sentiu a ereção se formar e uma queimação percorrer sua espinha.
Quando a jovem o viu, observando-a com o olhar em chamas, mordeu o lábio inferior. Virou-se
de costas, assumindo a posição com os joelhos sobre a cama e as nádegas levemente separadas.
Hugh arrancou suas roupas e penetrou-a com força, apertando seus seios e estocando com
brusquidão. Ela gemeu e ofegou, chegando ao ápice instantes depois. E ele logo em seguida.
Não satisfeita, Margareth passou a andar nua pelo quarto, cogitando o que mais podia
fazer para satisfazer sua necessidade. Hugh, deitado sobre as mãos, sorriu ao vê-la tão desejosa.
Tinha algumas ideias do que poderia impor-lhe...
— Você não se cansa? — Hugh inquiriu, com um brilho furtivo nos olhos.
— Não. Será que há algo errado comigo?
O conde gargalhou.
— Se tiver algo errado com você deve haver também comigo.
Com o mesmo brilho selvagem que arrancava suspiros de Margareth, o conde saiu do
quarto, nu. Passou pela porta de ligação entre o seu aposento e o da esposa e surpreendeu-se com
uma verdade. Há muito tempo não colocava os pés naquele local. Sorriu, contrafeito com sua
displicente entrega ao casamento e com a determinação de serem um casal tão feliz como seus
pais foram.
Foi até o armário que mantinha perto da janela. Com as mãos carregadas, voltou para a
esposa que ainda caminhava impaciente pelo quarto, nua, as mãos na cintura e os olhos aflitos.
— Tenho uma ideia — ele anunciou, sorridente.
Margareth não disse nada, deixando-se conduzir pelo marido. Ele pegou uma das cordas
que trazia e passou nas pernas dela, afastando-as completamente. Prendeu um dos pés à cama e o
outro à penteadeira, deixando-a de pé, despida e amarrada. Fez o mesmo com as mãos,
prendendo-as na trava da janela e na guarda da cama. Aquilo era uma novidade assustadora e
excitante, que fez com que Margareth descobrisse mais uma vez a fúria de seu desejo. Subjugada
pelas cordas, ela fez um esforço para continuar em pé, saboreando a ansiedade do momento.
Hugh saiu outra vez, voltando instantes depois com o óleo que ela mantinha no quarto de
banho, perto da banheira. Despejou um pouco nas mãos grossas e começou a espalhar pelo corpo
da condessa. Começou logo na nuca, fazendo movimentos leves e ritmados.
Foi descendo pelas costas, desviou para os seios e friccionou-os. Espalhando o óleo pelo
corpo quente. Desceu devagar e sedutoramente para o ventre e voltou para a bunda, apertando-a
e massageando. Margareth gemeu alto. Hugh voltou para frente e olhou-a com desejo. Um
desejo profundo e arrebatador.
De joelhos, chegou bem perto da intimidade de Margareth e tocou-a com delicadeza,
depois mergulhou o rosto entre suas pernas e a sugou com força, fazendo-a gemer alto.
Margareth continuou a gemer, cada vez mais alto. Puxou os braços e esticou-os, já sem forças
para manter o corpo em pé.
Hugh sorriu, porque adorava vê-la à mercê de sua vontade. Como um felino, contornou-a
e cravou os dedos em seus seios, colando o próprio corpo ao dela. Pingou mais algumas gotas do
óleo em suas mãos e esfregou na sua ereção.
Posicionou então o pau com cuidado e começou a penetrá-la por trás. Com uma das
mãos, Hugh acariciava um seio banhado em óleo, e com a outra friccionava as partes úmidas
entre as pernas de Margareth que a faziam gemer.
A princípio ela estremeceu, não com prazer, mas com a dor que a penetração anal
causava e isso o sobressaltou. Ele tentou novamente fazer com que o membro mergulhasse
naquele rabo apertado. Margareth grunhiu e se esquivou.
— Desculpe — Hugh sussurrou, desistindo.
— Por favor, passe mais óleo. E faça devagar.
— Você não quer que eu pare?
— Não, continue. Devagar.
Hugh colou novamente seu corpo ao de Margareth, pressionou seus seios com firmeza e
massageou. Depois, deixou uma das mãos deslizar novamente para o tufo de pelos, onde
começou um movimento ritmado que provocava espasmos de prazer na esposa. Ele levou-a até
bem perto de gozar e quando notou que ela estava bastante excitada, a penetrou devagar.
Acariciando-a sem parar. Margareth contorceu-se por alguns instantes e então relaxou.
Ele começou a estocar, primeiro sutilmente e depois com rapidez. Gemendo... Ainda acariciando
a boceta melada com os dedos, ele se derramou por inteiro dentro dela, curvando-se um pouco
para a frente e jorrando seu líquido viscoso. Não demorou, Margareth deu indícios que também
chegaria.
— Pela frente — ela sussurrou entre gemidos.
Ainda com os dedos acariciando-a freneticamente, ele a penetrou pela frente e a sensação
foi estarrecedora. Em poucos instantes, Margareth urrou de prazer e amoleceu.
Naquele momento, a condessa decidira que não poderia haver coisa melhor do que ser
casada com Hugh e, sorrindo para o marido murmurou:
— De novo.
Hugh piscou seguidas vezes, não conseguia manter seus olhos abertos e pouco captava da
conversa enfadonha à mesa. Margareth, por outro lado, não podia estar mais radiante, falando um
pouco com cada convidado.
Madelina, sua convidada principal também dispensava comentários, em seu vestido
vermelho vivo e flores negras. Tipicamente espanhola, sorridente, falando com seu sotaque
arrastado e deixando escapar umas poucas palavras em sua língua materna, fazia o marido sorrir
a cada gesto feminino. Havia uma paixão ali que inspirava a condessa. Juntas pareciam iluminar
a sala de jantar.
— Você está acabando com o coitado — a espanhola cochichou para Margareth, que
apenas sorriu.
— Eu deveria ter me casado com um homem feio — Margareth declarou por fim, ao ver
Hugh tombando as pestanas e retornando a abri-las com ares de assombro. — E sem músculos.
Madelina riu alto, fazendo com que vários pares de olhos se dirigissem para seu
semblante divertido. Com um aceno distraído de mão, dispensou os curiosos e voltou para
conversa com a anfitriã.
— Eu me perguntava se alguém, algum dia, conseguiria domar a fera.
— Oh! Não fale assim do meu marido — Margareth crispou os olhos com malícia. — Ele
não é uma fera... bom, talvez um pouco.
— Não me diga que você era alheia à fama do conde? — a outra inquiriu, com ares
brincalhões.
— Mas é claro que não. Você sabe muito bem disso — a condessa suspirou. — Mas ele é
a minha fera.
— O amor jovem... Não é mesmo uma coisa linda?
Margareth não respondeu, virando-se em seguida para explicar à mãe algo sobre a
prataria. A palavra amor, no entanto, ficou retumbando em sua mente. Definitivamente ela não
entendia nada de amor, assim como não entendia nada de coito e estava descobrindo. Mas ela
não tinha mais nenhuma dúvida, amava Hugh, o amava de verdade.
E mais do que isso, ela desejava com todas as suas forças que o que eles tinham fosse
mais do que apenas o prazer noturno e planos de vingança. Ela queria que ele a amasse e se
entregasse como ela vinha fazendo.
Depois do jantar suntuoso com mais de cinco pratos e uma sobremesa muito refinada,
lady Sinclair chamou a filha para um canto e baixou seu tom de voz ao máximo, para que
somente a condessa escutasse seus conselhos.
— Escute o que tenho a dizer... — começou com rodeios. — Normalmente, as mães não
falam esse tipo de coisa, mas depois do que você me disse em nosso último encontro, sinto-me
na obrigação de fazer um papel a mais em sua vida.
— Mas afinal de contas do que você está falando, mamãe? — Margareth falou alto
demais, alertando Hugh, que cochilava sentado em sua poltrona na sala de café.
— Fale baixo... — a lady repreendeu, tensa. — O que tenho a falar, diz respeito somente
a nós duas. Na verdade, eu nem deveria estar...
— Ora, pelo amor de Deus, pare de fazer rodeios.
— Quero dizer... bem, olhe para o estado do seu marido.
— E o que tem ele?
— Você precisa cuidar que ele passe mais tempo em sua cama e não em clubes de
cavalheiros.
— Como é?
— Como você espera gerar os herdeiros do conde, se ele estiver assim cansado por causa
das companhias indesejadas...
— Por que diabos você acha que ele anda em lugares assim? — Margareth estava
intrigada e até um pouco furiosa.
— Veja aparência de cansaço, mal falou duas palavras o jantar inteiro — a mulher
completou, os olhos vincados no conde, que voltava a cochilar diante do olhar divertido do
duque e sua esposa espanhola.
— Mamãe, em primeiro lugar, o que meu marido faz não é da sua conta — ela eriçou o
dedo zangado diante dos olhos enrugados da mãe. — Quem casou com o conde fui eu, então,
pode deixar que o tratarei exatamente como eu achar que devo.
A mãe cobriu a boca espantada e com o desapontamento brotando no rosto
imediatamente.
— E segundo, ele está cansado por que dorme todas as noites em minha cama. E eu o
mantenho bastante ocupado, ou seja, ele dorme pouco. Entendeu agora ou preciso ser mais clara?
— Por que você não pode ser como as outras moças?
A lady afastou-se da filha, a mão enluvada sobre os lábios. Margareth sorriu ao
contemplar o marido. Os cabelos bagunçados e o olhar totalmente exaurido. Percebendo o
desânimo para o restante das formalidades de um jantar londrino da nobreza, Margareth
cochichou para a duquesa.
— Como faço para que toda essa gente vá embora?
Madelina sorriu, compreendendo a situação em que sua jovem e audaciosa amiga se
encontrava. Com um abano de cabeça e um olhar divertido foi até o marido e murmurou em seu
ouvido. Passou os dedos sobre a manga de seu fraque e mordeu o lábio, provocando-o. Depois
veio despedir-se da condessa.
Assim que o casal partiu em sua carruagem elegante, os demais seguiram o exemplo,
finalizando as formalidades e indo embora. Margareth e a mãe não trocaram mais qualquer
palavra até a mais velha dizer adeus, ainda chocada com o que ouvira da filha.
O pai, pelo contrário, beijou a mão da condessa com displicente atenção e ao abraçá-la
desejou que fosse tão feliz quanto demonstrava. O gesto pegou-a de surpresa, enchendo ainda
mais sua mente de um sentimento conflitante, de um lado a raiva pelo que ele lhe fizera passar e
por outro, as preocupações em relação ao que ele deveria estar enfrentando com o maldito duque
de Paxton.
Hugh tirou as roupas e deitou-se apenas com a ceroula. Quando a esposa chegou ao
quarto, já despojada do vestido graças à eficiente e rápida ajuda de Mady, ele já estava
dormindo. É claro que ela se perguntava por que, se não tinha nenhum interesse, ele estaria ali,
em sua cama e não na dele. Por que ele insistia em dormirem na mesma cama mesmo quando
não rolavam entre os lençóis?
A palavra que a perturbaria pelos próximos dias ressoou no mesmo instante, como um
sino de catedral que retumba na hora da missa.
Será que Hugh a amava?
Como poderia ter certeza?
Pela manhã, Mady entrou no quarto com uma bandeja de desjejum avantajada. A condessa
acordou o marido quando a criada já estava longe. Os olhos cansados diziam que ele tivera uma
noite péssima, quando, na verdade, havia dormido horas seguidas sem qualquer interrupção.
— Você está se sentindo bem? — perguntou para o conde.
— Sinto como se uma manada de búfalos tivesse passado por cima de mim — ele declarou
de um jeito que a fez rir.
— Oh — ela cobriu a boca com os dedos gordinhos e animados. — Coitadinho.
— Você sabe que a culpa é sua, não sabe? — o conde retrucou, apoiando-se nos cotovelos
para vê-la melhor.
— E que culpa eu tenho se você não se alimenta como deveria?
— Eu me alimento muito bem, mas você consome todas as minhas energias.
— Então trate de comer mais.
E com um olhar sensual, levantou-se da cama, deixando as cobertas para trás e desfilando
nua pelo quarto. Abriu as cortinas e voltou a mirá-lo. Os olhos desejosos do marido a fizeram
sorrir.
— Vou me vestir, teremos muito o que fazer hoje.
— Ou podemos ficar por aqui e esquecer o resto de Londres.
— A manada de búfalos vai deixá-lo em paz hoje — ela provocou-o, cruzando os braços
sobre o peito firme. — Vá cuidar da vida, senhor conde.
— Tudo bem, mas só depois de você esgotar um pouco mais as minhas energias.
Depois de vestida e segurando sua sombrinha que combinava bem com o vestido
bordado, Margareth encontrou Hugh no vestíbulo. A cartola ajustava-se perfeitamente e ele
exibia seu melhor olhar. Totalmente recuperado.
— Minha mãe acha que você passa as noites numa dessas casas de más companhias.
Hugh olhou-a surpreso, enquanto ela passava seus dedos finos sobre seu braço,
enganchando-se a ele.
— Ela acha que devo manter você mais tempo em minha cama.
— Eu não fazia ideia de que vocês tinham esse tipo de conversa.
— Não temos.
— E o que você disse a ela?
— O que você acha?
Antes de os dois mergulharem no ar abafado que vinha tomando a cidade, o lacaio que
acompanhava a carruagem surgiu afoito diante dos dois. Fez uma reverência formal e pediu para
falar com o conde em particular.
— Diga logo, não há nada que minha senhora não possa saber.
Com os olhos envergonhados, ele baixou o tom de voz e anunciou.
— Aquilo que o senhor me pediu para cuidar. Está acontecendo.
O velho duque de Canterburry estava furioso. Com que tipo de pessoa aquele
homenzinho enfadonho e malvestido achava que estava lidando? Qual não foi seu espanto ao
receber o bilhete do petulante, afirmando que a duquesa estava faltando com a conduta correta de
uma dama. E que isso poderia se tornar um escândalo pavoroso.
Enfurnado na carruagem, seu couro cabeludo suava, suas mãos tremiam e sua voz soaria
enrolada, se conseguisse murmurar outra coisa que não: “mais rápido!”.
Apressando o cocheiro, o duque açoitava seus próprios pensamentos. E se fosse verdade?
E se sua bela e entediada esposa estivesse mesmo envolvida com algum rapaz? Não apenas sua
reputação estaria perdida, mas sua honra, sua dignidade e seu nome. Estaria, para sempre,
destinado à vergonha.
Se fosse esse o caso, ele mesmo seria capaz de matar a garota.
E que atitude tomaria quanto ao infeliz Paxton? Com toda certeza, o desgraçado o
chantagearia ou pior, espalharia para toda Inglaterra seu infeliz infortúnio. De qualquer forma,
estava em maus lençóis. Por que não havia batido nela mais forte da última vez? Por que não a
deixara mais tempo trancada no quarto com as penitências? Talvez agora não estivesse sujeito a
tão terrível dilema.
Enquanto as patas apressadas dos cavalos trotavam pelas ruas de Londres, os
pensamentos do velho só pioravam sua ira, sua ânsia pela violência com que tratava a menina
que desposara após ficar viúvo. Se fosse em outra época, nada disso estaria acontecendo e ele já
a teria ensinado a como ser uma esposa adequada para um homem como ele.
Em outras épocas, não precisaria enfiar seus dedos nas intimidades dela e obrigá-la a
tocá-lo em sua genitália quase morta, ao invés de enfiar o pau como se esperaria do casamento.
Em outros tempos, teria desfrutado daquele casamento de verdade e a comeria de todas as
formas possíveis, até que ela implorasse por um momento de paz. A garota não veria motivos
para procurar por outra companhia masculina. E se tentasse, já estaria debaixo da terra. Mas, se
fosse verdade, se ela estivesse nos braços de outro, ele daria um jeito de calar Paxton e então a
surraria até à morte. Porque ainda que estivesse velho e seu pau já não funcionasse, sua mão
ainda era pesada o bastante para arrancar os dentes daquela criatura nojenta.
O cocheiro fez com que os animais parassem bem diante da porta de um armazém barato,
na parte mais suja e pobre da cidade. O velho duque desceu da carruagem, soltando fogo pelas
ventas e balbuciando coisas ininteligíveis. Entrou no estabelecimento e ficou desnorteado pelo
forte cheiro de mofo misturado a tabaco. Mandou o lacaio esperar do lado de fora e fulminou o
atendente com um olhar aterrador.
Cruzou a porta dos fundos e deparou-se com um corredorzinho fedorento e cheio de
poças. Abriu a primeira porta e viu um jovem casal abraçado. Aproximou-se da mulher e então,
ao constatar que não era sua esposa, voltou para o beco fétido. O coração acelerado, a mente em
um turbilhão e as pernas começando a tremer.
A outra porta estava semiaberta. Canterburry entrou sem bater e deu de cara com uma
moça de classe baixa, terminando de amarrar suas botinas surradas. O homem que estava sentado
em uma cadeira dura, lendo à pouca luz que entrava pela janela embaçada, era jovem e bonito,
com linhas rústicas no rosto anguloso. Era da classe trabalhadora, sem dúvida, mas bem-
apessoado, com ares sonhadores.
— Quem é você? — o duque berrou para a garota que amarrava as botinas.
— Mady — a garota curvou-se respeitosamente.
Bufando o homem apoiou-se no batente da porta, respirou fundo e voltou para sua
carruagem. Um misto de melancolia e ódio invadiu seu peito.
— Tudo bem, senhor? — o lacaio questionou, os olhos para o chão e a mão esticada para
auxiliá-lo a retornar ao seu assento na carruagem.
— Sim, vamos para casa.

Quando Margareth e Hugh afundaram no couro macio da carruagem, o coração de ambos


palpitava com força. Aquela tinha sido a mais louca ideia que a condessa poderia ter tido.
Arriscaram muito deixando que as coisas chegassem até aquele último instante, mas não poderia
ser diferente, do contrário tudo poderia simplesmente não acontecer.
Mas e se o velho chegasse no momento errado? Era um risco que poderia gerar mais do
que apenas a desgraça de uma moça indefesa e solitária, poderia acabar em morte. Por fim, tudo
havia dado certo. Agora, precisavam correr contra o tempo para finalizar o que haviam
começado, quando o lacaio entrara no vestíbulo avisando o conde.
A bela jovem sentada diante de Margareth chorava, soluçando baixinho enquanto a
carruagem trotava.
— Você precisa se acalmar — Margareth foi dura. — E precisa me dizer se há alguma
criada que seja de confiança e confirme a história que iremos contar.
A garota anuiu com melancolia, enfiando o rosto entre os dedos e voltando a soluçar.
— Tudo bem, já passou. Vamos ajudá-la.
Hugh sentia compaixão pela bela jovem, devia ser insuportável a companhia daquele
velho brutal e arrogante. Em contrapartida, odiaria estar no lugar do homem e acabar
descobrindo que a própria Margareth estivera nos braços de outro. Seria capaz de algo terrível, se
isso ocorresse.
Com esse pensamento, o conde virou-se para a janela da carruagem e fixou seus olhos
nos passantes. Como se pressentisse os sentimentos que amarguravam o marido, a condessa
colocou a mão enluvada sobre seu joelho e acariciou de leve.
Quando chegaram à imensa propriedade do duque, o próprio lacaio do conde tratou de
estacionar o veículo num local que facilmente passasse despercebido pelos empregados da
residência. Assim que entraram pela porta da cozinha, a duquesa foi recebida por três criadas
afoitas. As senhoras, que beiravam a meia idade reverenciaram os visitantes e abraçaram a lady
da casa.
— Graças a Deus a senhora está bem, o que aconteceu Vossa Graça? — uma delas
murmurou nos ouvidos da duquesa.
— Estou bem. Graças a eles. Obrigada — murmurou para a condessa.
Margareth, ao ver o estado calamitoso da garota que deveria ter praticamente a sua idade,
tomou as rédeas da situação.
— Escute, você precisa se trocar, refazer o cabelo e esconder as marcas de lágrimas do
rosto. Eu vou ajudá-la. Enquanto isso, por favor, peça a alguém que sirva chá para nós duas na
varanda e um licor para o conde. Querido, você trouxe algum charuto?
Hugh assentiu.
— Então, acenda-o e espere-nos lá fora — Margareth virou-se para as criadas. —
Estivemos a tarde inteira aqui, vim devolver um broche da sua senhora e ficamos para o chá.
Vocês entenderam?
As duas anuíram conscientes do que a dama estava fazendo pela patroa.
— Pois então tratem de agir, o duque deve chegar a qualquer momento e vai estar num
estado de ânimo assustador, precisam agir com calma e cautela. Do contrário a vida da duquesa
estará em risco.
A mais velha cobriu os lábios com as mãos grosseiras e então se lançou para abraçar a
jovem duquesa. Para a sorte da garota, as criadas a adoravam e não tramariam nada que pudesse
prejudicá-la. E só por isso Margareth já sabia que ela não podia ser de todo ruim, ninguém que
fosse tão má assim seria capaz de alimentar esse tipo de sentimento, o de preocupação e cuidado.
Na verdade, aquela era só mais uma garota indefesa, obrigada a se casar com uma fera. Ao
contrário de Margareth, ela não tivera nem um pingo de sorte.
— Se há alguém que queira mal à lady, tratem de despachar dos arredores. Qualquer um
que for inquirido, deve assegurar o que foi combinado.
Momentos mais tarde, a carruagem chegou trazendo o duque assombrado. Hugh já estava
em seu segundo charuto e embora não fosse um fumante assíduo, desempenhava seu papel muito
bem, mantendo o olhar perdido no horizonte. Era bastante difícil estar ali, na propriedade do
homem que fizera tanto mal à sua mãe, mas agora não tinha mais volta.
Margareth tentava distrair a jovem duquesa, falando coisas bobas de seu cotidiano. A
garota tentava sorrir e sempre reagia com amargura quando a condessa a repreendia por deixar
seu estado de espírito transparecer.
— Seu marido está chegando, se ele perceber o que aconteceu, meu marido estará com
problemas e você na lama ou morta. Seja forte. Vai passar rápido. E se ele falar algo em relação
ao Paxton, você já sabe o que dizer.
— Sim, imagino que o duque esteja mesmo furioso com relação ao noivado do jovem
marquês.
— Não hesite, é a sua vida que está em jogo, não apenas dinheiro, mas sua vida. Você
entendeu?
— Não vou hesitar, aquele homem horroroso tentou... — ela encolheu-se. — E tentará
mais vezes. Não vou hesitar.
As duas concordaram com uma reverência discreta.
— Sorria, estamos conversando sobre vestidos e bailes. Somos duas nobres que amam
bailes.
O velho que subiu as escadas da entrada da frente com o apoio da bengala, ficou atônito
ao dar de cara com a esposa e mais, com o duque de Surrey e sua senhora, de quem tanto ouvira
falar. É claro que ele não ia com a cara do rapaz. Além da fama de ser um homem grosseiro, que
gostava de labutar no campo ao lado dos criados, era filho de Rodolf, aquele rosto nunca negaria
isso, e ele não havia se esquecido do passado e nem dos olhos verdes da mãe dele.
Ele tinha sorte de ser mesmo um Ruthenford, ninguém poderia negar pela aparência dele,
mas será que ele sabia do passado dos pais? Será que tinha alguma ideia do que acontecera
naquela noite, na fazenda da família?
Por mais que os anos houvessem transcorrido, por mais que o conde tivesse levado seu
segredo vergonhoso para o túmulo, o duque ainda se recordava da fera que havia em seu sangue,
quando tinha trinta anos. Se havia uma coisa em seu corpo que ainda parecia jovem, era a
memória, a mente afiada que não deixava passar nada. Nem a recordação deliciosa daquilo que
tornou as famílias Coucex e Ruthenford, das propriedades Canterburry e Surrey, inimigas. O que
aquele moleque estaria fazendo ali?
Os dois homens se cumprimentaram com as formalidades habituais aos títulos, as
senhoras reverenciaram o mais velho e Margareth abriu um largo e sedutor sorriso. Vendo o
semblante jovial e o olhar atrevido, o velho compreendeu por que a garota era tão requisitada nos
chás, e porque sua própria esposa, que detinha de um título superior, a admirara desde o primeiro
baile em que estiveram juntas.
Com uma mulher como aquela, ele próprio teria de ser uma fera. Na certa, seria capaz de
desafiar o marido e ser ardente como só uma criada era capaz. Aquele pensamento fez o velho
sorrir para a esposa do outro, que por sua vez, pigarreou, contrafeito, ao perceber os ares
cobiçosos.
— Que prazer em revê-lo, duque — Margareth iniciou o ritual que vinha ensaiando na
última hora. —Espero não sermos inconvenientes ao virmos sem avisar com antecedência
adequada.
— De maneira alguma — o tom brusco soou combinando com o rosto enrugado.
— Está tudo bem, esposo? — a duquesa questionou com ares distraídos.
— Mas é claro. Onde você esteve à tarde?
— Aqui mesmo — ela deu um sorrisinho encabulado, como se a preocupação do marido
a surpreendesse. — Vou pedir a Leonor que traga um licor....
A garota saiu com o rosto afogueado. Na cozinha, conseguiu recompor-se e mandou o
lacaio buscar a cartola e a bengala do marido, enquanto a criada mais íntima, Leonor, deveria
servi-lo com licor de alcaçuz e um charuto.
— Obrigada — murmurou para a companheira de confidências e ama.
— Não me agradeça, a vida seria muito pior sem a senhora aqui.
As duas trocaram um olhar terno e então a duquesa retornou à varanda. O semblante
renovado e a coragem assumindo o lugar do medo que fatigava a sua mente.
— Eu estava contando agora mesmo ao duque que passei alguns dias tentando descobrir a
dona do broche, felizmente Madelina o reconheceu.
— A duquesa? — o velho questionou, assumindo uma postura um pouco mais leve.
— Sim, a duquesa, que indiscrição a minha, é que somos tão boas amigas que às vezes
me esqueço das formalidades.
Hugh, que parecia soturno perto do corrimão, achou engraçado. Não conseguia deixar de
perceber o quão inventiva Margareth podia ser e se não conhecesse seu temperamento mais
íntimo, poderia questionar ele mesmo se suas ações, em casa, não faziam também parte de um
fingimento muito bem tramado. Por sua sorte, aqueles gemidos eram bem genuínos, isso e o
gosto do prazer de Margareth quando gozava em sua boca. Era inegável.
— Por fim... — a condessa continuou — a conversa foi se tornando tão animada que
acabamos nos estendendo além do adequado. Espero que não seja um transtorno termos vindo
tão inesperadamente e passado tantas horas tomando o tempo da duquesa.
— Pelo contrário — a garota anunciou, participando da encenação. — Tenho certeza de
que estamos a caminho de uma amizade longínqua e próspera.
— Não tenho dúvidas disso — Hugh riu. — Depois de praticamente discutirem a moda
inteira de Londres e Paris, não imagino alguém mais íntimo do que as duas senhoras. Já estava
me vendo louco aqui.
O velho duque assentiu satisfeito. Aquela era a conversa entediante de que as mulheres
mais gostavam. Ter certeza de que a esposa não estivera infringindo as leis do matrimônio e
passara sua tarde falando das trivialidades femininas lhe agregava algum ânimo.
Mais tarde, depois de alguma conversa amena com o homem, o casal de Surrey atentou
para o adiantado da hora e decidiu partir. A duquesa, que se sentia mais segura depois de toda a
história ser desenrolada, chamou a condessa para um canto no vestíbulo, abraçou-a com o
coração na mão e sussurrou:
— Serei eternamente grata a você.
— Não se preocupe, está tudo bem. Não se esqueça do que combinamos. Seja forte, um
dia você será dona de sua vida.
As duas sorriram e então Hugh e Margareth partiram. Uma única certeza retumbando na
mente, estavam cada vez mais perto de vingarem aqueles que haviam sofrido por causa da
monstruosidade de pessoas como o duque.
O mensageiro chegou por volta das onze da manhã. Entregou o bilhete nas mãos do
conde e saiu após receber sua gorjeta. Hugh analisou o envelopinho sem o selo de cera
tradicional das famílias mais nobres. A letra miúda que se desenrolava no bilhete não possuía
qualquer sinal de delicadeza, pelo contrário, era uma letra fria e totalmente desapegada das
palavras que se seguiam.
Margareth entrou na biblioteca com um sorrisinho maroto nos lábios, o marido admirou-a
por alguns momentos e então passou a correspondência para sua mão enluvada.
— O que é isso?
— Isso não, quem...
Ela lançou um olhar confuso em sua direção.
— Meu Deus, ele chegou? — cobriu os lábios com uma das mãos, num misto de
empolgação e medo.
— Sim, e já está em Surrey Hall.
— E o que você vai fazer?
— Ainda não posso fazer nada, vamos deixá-lo lá por mais alguns dias, depois veremos.
— E como você sabe que ele vai ficar, que não vai se meter em nenhuma confusão?
— Porque sei exatamente do que ele gosta e já providenciei...
Os olhos azuis de Margareth cintilaram de exultação. Tudo parecia correr dentro do que
se podia esperar. As coisas deveriam se desenrolar no Parlamento em breve e o primeiro a
tombar seria Paxton, depois o maldito duque de Canterburry. No final, não sobraria um nobre se
fosse preciso, nenhum daqueles que haviam feito tanto mal à família Ruthenford teria
escapatória. Todos estavam fadados à vingança de Hugh.
Margareth se asseguraria disso.
Quando o conde chegou ao Parlamento naquela tarde, ficou surpreso com a cena que já
fervia. O duque de Canterburry aos berros com Paxton. Uma disputa que aparentemente deveria
ser simples estava pegando fogo.
Os dois homens berravam muito mais do que o necessário. Hugh ficou algum tempo
observando, cogitando o quanto a coisa poderia piorar. Para espanto de todos que
acompanhavam a sessão, ficou muito claro, quando as coisas se acalmaram, que o duque de
Canterburry estava retirando seu apoio ao outro fidalgo.
Haveria muita agitação e murmúrio nos dias que se seguiriam e, com toda certeza, uma
grande leva de nobres seguiria o principal homem da sociedade inglesa. Hugh ficou satisfeito
com o resultado da astuta armação de sua esposa. Além de salvar a vida da bela duquesa,
também estava destruindo, pouco a pouco, os malditos Paxton. Aquela sensação era deliciosa.
— Não seja insensato, velho! — Paxton berrou para Canterburry, que bufou.
— E você me respeite, pois além de mais velho, sou também infinitamente mais rico do
que você, seu grande imbecil.
— Temos o mesmo título — o outro retorquiu.
— Título não significa honra ou posses, nem mesmo poder — o velho cuspiu, fazendo
Paxton corar de raiva.
— Você é um maldito ingrato.
— Diga mais uma palavra e darei, eu mesmo, uma surra em você...
Hugh cruzou os braços sobre o peito, esticou as pernas e recostou-se no assento.
Margareth adoraria escutar a cena em detalhes mais tarde. O conde esforçou-se para captar cada
mínima expressão dos dois duques que berravam diante de todos, como se se odiassem mais do
que qualquer coisa no mundo.
A melhor cena, no entanto, foi quando o duque de Canterburry, que tantas vezes repelira
as tentativas de aproximação do conde, aproximou-se de Hugh e apertou sua mão,
reverenciando-o e afirmando apoio em uma delicada causa sobre uma aliança comercial com a
Dinamarca. Aquela era, sem sombra de dúvidas, uma grande vitória para os Ruthenford.

Canterburry era um homem duro, seu rosto quadrado aterrorizava a jovem esposa, seu
pensamento ágil era difícil de ser enganado e por isso ela ficava muito grata pela companhia e
bondade da condessa. Nunca havia imaginado que uma estranha podia salvar sua vida sem pedir
nada em troca.
Margareth, que tomava chá pela segunda vez naquela semana com a duquesa, desta vez
em Surrey Hall, reforçou sua recomendação de que a garota esperasse mais alguns dias antes de
voltar a ver seu amante. Os riscos eram grandes, não apenas para ela, como também para o casal
que a ajudara com a farsa que salvara sua vida.
A jovem, que a princípio ficara muito assustada, agora tinha na condessa uma melhor
amiga. As duas conversaram pelas horas seguintes sobre a moda vitoriana, as classes inferiores,
o frio que destruía plantações, chás, louças de porcelana chinesa e tudo o mais que vinha
agregado às amenidades da nobreza, além de coisas mais pessoais.
A intimidade que crescia a cada instante levou a duquesa a abrir seu coração e declarar
seu sonho de fugir com o amante, um rapaz da classe trabalhadora que lhe jurava amor eterno e
que nunca a machucara como o duque fazia sempre que se sentia frustrado por não poder colocar
seu pau mole dentro dela.
— Você precisa ter paciência, minha cara, esse dia vai chegar. Seria melhor, é claro, que
você tivesse um herdeiro...
— Isso vai ser impossível — a garota murchou na cadeira.
Ambas olharam para o horizonte, apreciando o ar fresco que lhes arrebatava as faces. A
mesa, disposta no jardim perto da floresta onde Margareth quase perdera a vida, propiciava uma
deliciosa vista e um ar revigorante. A condessa lançou um olhar confuso para garota, que
esfregou o rosto com desalento.
— Até onde sei não há nada de errado comigo — ela apressou-se a dizer vendo a
expressão de desconfiança da outra.
— Mas seu marido tem uma filha, não é?
— Sim, mas ele é velho, não consegue mais consumar o casamento. Não da forma que
geraria um herdeiro, você entende?
— Que lástima. Como será difícil sua situação quando ele morrer... — Margareth
compadeceu-se.
— Não pode ser pior do que já é. Ele é um bruto, fica furioso por não conseguir... sabe...
deixar aquela coisa horrível dura o bastante para colocar dentro de mim, me espanca como se a
culpa fosse minha de ser tão velho e molenga e, ainda me obriga a fazer coisas que me dão asco.
— Que horror. Não imagino vida pior.
— Por isso não me importo de ficar na miséria, desde que fique livre.
— Isso não vai acontecer, vou ajudá-la. Acaba de me ocorrer uma ideia que pode dar
certo, mas que será tremendamente perigosa.
A duquesa suspirou.
— O que você quer dizer?
— Que você tem uma escolha: pode fugir carregando suas joias e viver bem por algum
tempo, caindo em miséria depois e com o nome difamado, ou pode ter coragem de ficar e me
ajudar a fazer seu marido pagar por todo mal que fez.
— E por que isso é tão importante para você?
— Porque quando me casei, quase tive o mesmo destino que o seu.
— Mas você e o conde parecem apaixonados.
— De fato, mas as primeiras semanas foram infernais, por pouco não perdi a vida nessa
floresta que agora embeleza o nosso chá.
— E como foi que resolveu sua infeliz situação?
— Ao contrário do seu marido, o meu consegue muito bem cumprir com suas obrigações,
então, aqui estamos — deu de ombros. — Além disso, ele não é violento e tem um coração bom.
Mas isso não vem ao caso, a verdade é que temos que nos apoiar, nós mulheres indefesas.
A duquesa insuflou o ar, deixando-o sair pesado e quente. Olhou com ares esperançosos
para a floresta e então deu um sorriso fraco para a condessa, que esperava com o coração
palpitando a mil.
— Naquela noite, depois que você e o conde partiram, meu marido foi ao meu quarto,
não me espancou, mas fez muitas perguntas. Quando eu o inquiri sobre o que tratava tais
questionamentos, ele acabou deixando escapar que o duque Paxton havia plantado a semente da
dúvida em sua cabeça. Que por pouco, ele não me matara. Senti tanto medo.
Margareth não disse nada, ouvindo com atenção cada palavra da duquesa.
— Nunca imaginei que aquele duque maldito Paxton pudesse ser tão maldoso, logo
comigo que nunca sequer levantei os olhos para a família dele. Mas depois de você me contar
que a duquesa estava espalhando sobre mim e Harry, me difamando sem ao menos ter certeza, eu
não pude evitar, senti tanto ódio que só queria me vingar. Se não fosse você, agora eu estaria
morta. Imagine só se outra pessoa tivesse escutado e ao invés de me salvar quisesse meu mal?
— E o que você fez?
— Exigi reparação. Depois, me deitei com meu marido e fiz todas as coisas que ele gosta
tanto. Senti muita repulsa, mas fiz. Na mesma noite, recebi a promessa de que eu seria vingada,
que ele cuidaria pessoalmente de dar uma lição ao Paxton e a sua família mesquinha. Além de
ganhar mais um colar como presente. Com o seu apoio sei que posso ser corajosa.
A condessa sorriu.
— O que devo fazer, condessa?
— Sabe as providências que você e o Harry tomam para não gerar uma criança?
A duquesa anuiu tímida.
— Pois agora você deve parar.
O céu azul claro estava riscado pelas primeiras linhas de laranja, o sol já baixava no
horizonte e o frio começava a penetrar pelas imensas janelas quando a carruagem do duque
Paxton entrou na propriedade dos Canterburry.
Charles primeiro foi anunciado, e o anfitrião, que já estava sentado em sua poltrona na
sala de fumar, com um charuto fumegando entre os dedos e uma taça pequena com licor sobre a
mesinha de mogno lustrado, apenas meneou a cabeça, assentindo sua aproximação.
— Você tem bastante coragem para vir aqui — o olhar frio do duque de Canterburry fez
com que Charles Paxton respirasse com esforço, começando a suar.
— Desmond, o que deu em você hoje?
— O que deu em mim? — a voz soou entrecortada de raiva.
A troca de olhares era dura. Paxton esperava que o velho Coucex, ou duque de
Canterburry, recuperasse o juízo, quem sabe se desculpasse e ambos voltassem às negociações e
tramas que impulsionavam o parlamento às decisões que mais enriqueciam suas famílias.
— Pelo amor de Deus, homem, tínhamos um acordo de cavalheiros.
— Que você jogou fora ao tentar abalar a honra da minha esposa.
— Mas eu apenas me preocupei com você, um escândalo teria sido desastroso para o seu
bom nome.
— Você estava tentando me humilhar publicamente...
—Tentar? — Charles explodiu. — Ela mesma fez isso, encontrando-se às escondidas
com um qualquer.
— Como você ousa macular a reputação de uma dama tão exemplar? — Desmond Coucex
estava à beira de um ataque. — E pior, como eu pude acreditar em tão vil criatura?
— Na certa você não viu pessoalmente, por isso ainda questiona a veracidade do que digo.
Fui apenas leal a um bom amigo, forneci ajuda em um momento terrível. E é assim que me
retribui?
— Sabe o que é pior, Paxton? — Canterburry cuspiu as palavras com repugnância. — É
que eu acreditei, duvidei da honra de Elizabeth para descobrir que, além de insultá-la, você ainda
a confundiu com uma maldita criada.
— Não é possível, tenho certeza do que vi. E porque você iria querer que eu averiguasse
tais fatos se já não tivesse suspeitas?
— Você só pode estar louco!
Os dois berravam.
— Eu, louco? Você é um maldito velho arrogante, que se vê acima de tudo, pede-me para
ajudá-lo e agora me acusa... Mas não deixarei isso assim, você não perde por esperar.
— Você está me ameaçando?
— Vou fazer o que já deveria ter feito há muito tempo: expor suas jogadas, seus acordos e
tudo o mais que me lembrar. Seu nome estará na lama e nem será por culpa da coitada com quem
se casou.
— Você não ousaria.
— Tem alguma dúvida?
— Seu maldito! — O duque de Canterburry gritou no exato momento em que apanhou
uma pequena réplica da Vênus de Milo do batente da janela. Num rompante, usou a estatueta
maciça e bateu com força na cabeça de Paxton, que surpreso, cambaleou.
Antes que Charles pudesse reagir, outro baque soou seco. Desmond golpeou-o mais três
vezes, até que seu corpo caísse inerte e completamente sem vida.
Não demorou muito para uma poça de sangue começar a se formar ao lado da cabeça do
duque de Paxton, que já não mais respirava. Uma criada que entrava na sala de fumar carregando
uma bandeja de chá, assustou-se com a visão do morto, derrubando tudo e gritando.
— Cale a boca, sua infeliz, vá chamar Saul e mais um lacaio.
Tremendo, a garota disparou porta a fora. Retornou minutos depois, acompanhada do
capataz e de um lacaio magro e silencioso.
— O senhor me chamou, Vossa Graça? — o homem reverenciou.
— Pare com essas bobagens, não temos tempo para isso. Preciso que você dê um fim nesse
porco imundo. Ninguém pode saber o que aconteceu aqui. Vocês ouviram?
Todos assentiram.
— Thomaz, me ajude aqui — o capataz falou para o garoto, que passou rapidamente pelo
duque e começou a puxar o corpo morto de Charles Paxton pai, o primeiro inimigo de Hugh a
cair.
Jordy, a criada, correu para o quarto de lady Elizabeth e despencou no tapete, chorando,
soluçando e narrando a cena que vira.
— Estou com medo, vossa graça, o duque pode querer se livrar de mim.
— Eu vou proteger você, Jordy, assim como vocês me protegem desse monstro. Escute
bem, nunca mais fale nada a respeito disso e passe o máximo de tempo longe das vistas do
duque, vamos esperar que ele esqueça de você.
— E se ele não esquecer do que vi?
A jovem duquesa suspirou profundamente e pegou a mão da criada com carinho.
— Homens como ele menosprezam a inteligência das mulheres, se você for esperta, ele
não se dará ao trabalho de tentar nada contra você. Mas escute bem, ninguém pode saber de
nada.
— Ninguém vai, eu juro. E juro mais uma coisa, minha senhora, serei grata pra sempre por
ter a senhora aqui pra me proteger, devo minha vida e pode contar que lembrarei disso pra
sempre.
— Então, a partir de agora somos mais do que senhora e criada, somos amigas e aliadas e
vamos nos livrar do perigo juntas.
O silêncio tomou conta do resto da casa. Nunca mais ninguém ousaria mencionar o nome
do morto dentro da propriedade Canterburry. E agora o destino estava traçado. A jovem duquesa
iria até o fim com o plano de sobreviver ao monstro que chamavam de marido, nem que para isso
precisasse matá-lo.
Hugh e Margareth estavam deitados no tapete do quarto, suados e sôfregos. Mady bateu
na porta e esperou que o conde assentisse sua entrada. Margareth se enfiou embaixo da colcha,
na cama, enquanto Hugh vestiu um chambre sobre o corpo nu.
A criada entrou e reverenciou-os com a mesma cordialidade de sempre. Colocou uma
bandeja com chá e biscoitos sobre a banqueta perto da cama e baixou os olhos para o chão.
Há mais de uma semana, a notícia do desaparecimento misterioso do duque Paxton e seu
cocheiro haviam causado furor na alta sociedade londrina. Ninguém conseguia imaginar que
malfeitor poderia ter causado tal sofrimento à família, mas Hugh, que tinha um instinto muito
forte, desconfiava de que o próprio velho Desmond Coucex, o duque de Canterburry, tivesse
algo a ver.
Não seria de surpreender, não é? Afinal, o homem era um maldito louco que não se
cansava de machucas as pessoas, principalmente as mulheres.
O olhar da criada anunciava informações.
— O que foi Mady? — Margareth inquiriu, esticando-se para beliscar os biscoitos do
prato e acalmar o estômago barulhento.
— Encontraram o duque Paxton.
— Então apareceu... — Hugh espreguiçou-se. — No mínimo, estava farreando em algum
bordel.
— Hugh!
— Com uma esposa daquelas, até eu...
Margareth deu um tapinha no ombro do marido, divertindo-se com o humor dele.
— Ele estava numa dessas casas de gente sem moral, Mady? — Margareth levantou os
imensos olhos azuis para a criada.
— Não, senhora.
— Então desembuche, criatura, estou morrendo de curiosidade.
— Ele está morto.
Margareth se engasgou.
— Co-como? Quando?
— Não sei ao certo, mas um lacaio me contou que acharam o corpo dele e do cocheiro
boiando no rio Tâmisa. As autoridades estão alvoroçadas.
— Você não acha que deveria ir até lá? — perguntou para Hugh.
— Eu? Nem pensar — Hugh encostou a cabeça no imenso travesseiro de plumas, cruzou
os braços atrás da cabeça e fechou os olhos. — Cada um recebe o que merece. E eu mereço ficar
aqui com a minha esposa.
— Obrigada Mady, qualquer novidade, por favor me informe.
— Sim, Vossa Graça. Com licença.
Com uma reverência discreta, a criada saiu do quarto, deixando Margareth com um olhar
taciturno e Hugh com um meio sorriso nos lábios.
— Por que você está rindo?
— E você ainda pergunta?
— Você não está achando que temos algo a ver com isso, está?
— Outra pergunta sem sentido.
— Hugh, pelo amor de Deus, isso é muito sério.
Hugh abriu os olhos verdes que cintilaram. Com um semblante sereno, aproximou o rosto
quadrado ao da esposa.
— Se não fosse o Paxton, seria a Elizabeth.
— Você acha que...
— É claro que sim, a essa hora ela estaria morta e enterrada e no mínimo o velho Charles
deu oportunidade para aquele louco pegá-lo de jeito. Arrogante como é, deve ter provocado.
— Oh, Deus! o que fizemos?
— Salvamos a vida da duquesa, o maldito Paxton não teve nada além do que o merecido.
Margareth cobriu o rosto com as mãos e suspirou.
— Não pensei que pudesse chegar a isso.
— Margareth, você precisa entender, aquele homem é um louco, ele gostou do que fez
com minha mãe e deve ter feito coisa pior com outras criadas durante todos esses anos, além das
coisas que você me contou sobre a esposa. Não é nossa culpa se ele é um monstro.
— Pobre Elizabeth.
Um misto de sentimentos envolveu Margareth. Era como se ela tivesse se tornado a
pessoa maquiavélica que destruía os demais. As mesmas pessoas más que ela conhecia através
dos romances que lia e que sempre se davam mal no final.
Não, ela não era como aquelas pessoas, era ainda pior, porque era de carne e osso. Era
uma mulher de verdade tentando e conseguindo destruir a vida de outras pessoas reais. Mas ela
tinha um motivo, um forte motivo. Com o coração machucado pela consciência de seus pecados,
a condessa passou o resto do dia na cama, com dor de cabeça e um estranho aperto no peito.
À noite, Hugh deitou-se ao seu lado sedento, mas ao contrário dele, ela não estava
disposta. Sentia-se angustiada e confusa. Com medo de tornar-se algo tão ruim que nunca fosse
capaz de voltar a ser a Margareth que um dia fora. Dormiu com ajuda de algumas gotas de
láudano e quando acordou, sentia uma dor de cabeça ainda pior.
— O que há com você? — Hugh parecia aflito, pela manhã.
— Sinto-me um monstro. Ajudei a tirar a vida de uma pessoa.
— Claro que não, não seria possível nem mesmo se você quisesse muito.
— Hugh, nunca mais serei uma boa pessoa. Sinto-me tão...
— Margareth, nem temos certeza de que foi o Coucex realmente que fez isso e, de
qualquer forma, o Charles sabia como era aquele homem, todo mundo sabe que eles se
beneficiam dos projetos aprovados no parlamento e usam as pessoas para ganharem mais
dinheiro. Além do mais, nenhum de nós o forçou a matar o outro. Não temos culpa.
— É claro que temos, se não tivéssemos interferido... ido tão longe. E foi tudo ideia
minha — falou, iniciando um choramingo.
— A ideia foi sua, mas quem escreveu aquele recado fui eu, então, se alguém tem culpa,
esse alguém sou eu.
— E você não sente um pingo de remorso?
— Mas é claro que não, a morte foi pouco para aquele desgraçado.
— Hugh...
— Margareth, eles machucaram minha mãe! Nada do que fizermos vai realmente
compensar... — ele a pegou pelos braços.
— Você está me machucando.
— Entenda. Eles são os culpados, não nós.
— Mas...
— Chega.
Largando Margareth sobre os lençóis macios, Hugh caminhou até a janela. O suor
começou a correr por suas costas, debaixo do traje habitual. Olhou pela janela, viu o sol
ganhando contornos expressivos no horizonte.
— Para ser minha esposa, você precisa ser a Margareth forte de sempre e não a que se
encolhe e chora por causa de um monstro.
— Para ser sua esposa preciso ser um monstro e não sentir remorso?
— Fazemos o que tem de ser feito.
— Pelo amor de Deus, veja só o que você está dizendo. Como você pode ser tão frio?
— Do mesmo jeito que foram com minha família, há trinta e tantos anos.
Depois de um silêncio perturbador, Hugh tornou a olhar para a esposa, que ainda parecia
amuada e triste.
— Estou indo para Surrey Hall, conversaremos mais quando eu voltar.
— O que você vai fazer lá?
— Vou cuidar dos nossos interesses.
— Mas não podemos continuar, Hugh, pessoas estão se ferindo por nossa causa.
— Chega, Margareth, o que está feito, está feito. Não há retorno, então, não devemos ter
remorsos. — Saiu batendo a porta.
Margareth tomou o café na cama, banhou-se tentando afastar a sensação desagradável
que se instalara em seu corpo e passou o resto da manhã cuidando dos assuntos da casa.
Com os pensamentos embaralhados, dera tantas ordens controversas para as criadas que
elas acabaram ignorando-a e cuidando de sua rotina por conta própria.
Era muito ruim se sentir parte de algo capaz de causar a morte de alguém, mas era ainda
mais doloroso recordar-se da forma como Hugh a olhou, como se ela estivesse sendo fraca pelo
fato de ter remorso e culpa, por ter sentimentos.
Talvez ele não fosse capaz de sentir nada mesmo, apenas o desejo de vingança e
Margareth não passasse de uma peça no seu jogo perigoso e assustador.
O que aconteceria quando ele se cansasse dela ou conseguisse sua tão almejada
vingança?
Por pior que fosse participar dos acontecimentos, Hugh tinha razão numa coisa, todos
sabiam como o duque de Canterburry era, sua fama de violento era murmurada em cada canto de
Londres e apesar dela e Hugh terem provocado a crise na ínfima amizade entre os duques, sabia
que, se ele realmente era o assassino de Paxton, isso se devia, pura e simplesmente, por sua
própria natureza.
Além do que tinham salvado Elizabeth, que apesar de adúltera, era uma boa mulher, uma
garota que sofrera de um infortúnio ainda pior que o dela mesma, ela sim havia se casado com
um monstro de verdade e não Margareth, embora não tivesse mais tanta certeza disso.
Não, ela não podia se culpar por aquilo, o monstro era ele, e não ela ou seu marido. Por
piores que fossem suas ações, ela salvara uma jovem que, assim como ela mesma, havia sido
obrigada a se casar com um estranho. Estava protegendo sua família e lutando para restaurar a
paz de seu marido, estava punindo àqueles que jamais receberiam o que mereciam, simplesmente
por causa do poder que exerciam.
O dia pareceu nublado e insosso para a condessa, que andou de um lado para outro até
boa parte da tarde. Como um animal perdido que zanza pelas redondezas em busca de um
punhado de carne velha, ela ficou totalmente perdida em seus pensamentos.
— Mady! Mady! — Margareth entrou na cozinha lustrosa aos berros.
— O que foi senhora, está tudo bem? — a garota correu até ela sem o cuidado das
formalidades, tamanho fora seu susto.
— Arrume nossas coisas, vamos para Surrey. Imediatamente.
— Sim, senhora.
Algumas horas mais tarde, a lua já reluzia no céu, iluminando as estrelas que se
espalhavam a pouca distância uma da outra. Margareth abriu a persiana da carruagem e deixou
que o cheiro cálido da estrada de terra acertasse seu rosto. Em poucos instantes cruzaram o
portão imponente da bela propriedade.
Um lacaio as recebeu com formalidade e ela subiu para o quarto do marido, a fim de lhe
fazer uma surpresa. Antes, porém, pediu que Mady avisasse a criadagem para servir o jantar mais
tarde, no quarto, e que a ajudasse a tirar seu vestido e as anáguas. Animada, a criada alvoroçou a
casa.
Hugh ainda estava no campo, inspecionando a ala oeste da plantação. Margareth estava
excitada e feliz, sabia que teria que dizer muitas coisas a Hugh, mas não tinha dúvidas de que
quando ele a visse, despida e sorridente, seria capaz de esquecer a discussão. Tão deliciosa era a
sensação de causar uma surpresa agradável ao marido que as escadas pareceram desaparecer sob
seus pés. Margareth nem se deu conta da distância percorrida até abrir a porta do quarto do
esposo e dar de cara com ninguém mais e ninguém menos que Aila, nua, dormindo sobre os
lençóis alvos.
— Mas... Mas... — começou a tremer, tentando digerir a cena. — Mas o que diabos você
está fazendo aqui?
Aila abriu as pestanas devagar, como se fosse acordada de um sono pesado.
— Hugh, meu amor, é você? — a garota falou, fazendo com que Margareth urrasse de
ódio.
— Sua desavergonhada, saia já dessa cama.
De súbito, Aila sentou-se, esfregou o rosto e pareceu surpresa ao dar de cara com a
condessa.
— Onde está Hugh? — Margareth crispou furiosa.
Aila deu de ombros com indiferença.
— Já mandei você sair da cama do meu marido.
— Só saio quando ele mandar.
Margareth então, tomada pela ira e mágoa, foi até à porta e chamou por Mady. Não
esperou a criada chegar e voou para cima de Aila, agarrando-se nos cabelos negros e puxando-a
para o chão. Assustada, a criada caiu ruidosamente sobre o piso de madeira encerada.
— Não toque em mim — Aila gritou. — Eu estou grávida, não machuque meu bebê, por
favor.
Margareth parou, prestes a esbofetear a outra. Seus olhos estavam tão atônitos que não
conseguiu formular exatamente o que dizer a seguir.
— É isso mesmo, estou esperando um filho do conde. O que você acha que ele faz
quando sai no meio da tarde?
— Sua... Sua desgraçada, saia já da minha casa.
Mady que chegava nesse instante surpreendeu-se com o que viu, a patroa enraivecida,
enxotando Aila do quarto do conde como se o mundo pudesse acabar a qualquer momento.
— Está tudo bem, senhora?
— Chame alguém para tirá-la daqui, quero essa desgraçada fora.
— Mas que gritaria é essa? — Hugh subiu as escadas e deparou-se com as criadas que se
amontoavam na porta de seu quarto.
Com ele, a senhora Garden vinha esbaforida.
— O que está acontecendo aqui? — Hugh conseguiu entrar e deu de cara com Margareth.
— Margareth, o que você está fazendo?
Ela riu alto, limpou os olhos que lacrimejavam e então o fitou com todo seu ódio.
— Estou descobrindo que meu marido continua a dormir com a maldita criada.
— Mas do que você está falando?
Margareth afastou-se da porta do quarto e seu vestido volumoso deu espaço para a
imagem de Aila, acuada perto da cama e nua.
— Mas... Não estou entendendo, o que ela está fazendo aqui?
— Ela, meu querido marido, ela estava dormindo na sua cama, esperando pelo pai de seu
filho e totalmente despudorada.
— Tirem essa mulher daqui — Hugh ordenou e então se voltou para Margareth, que
ainda o observava com uma expressão de profunda dor.
Depois que Aila saiu, os dois ficaram em silêncio por algum tempo, até que Margareth
suspirou pesado.
— Você me enganou direitinho, conde.
Hugh não disse nada, confuso, perplexo e totalmente frustrado.
— Como você pôde fazer isso comigo? — Margareth sentou-se na banqueta perto da
janela e cobriu os olhos com as mãos ainda enluvadas. — Achei que você me amasse, mas pelo
jeito, é ela quem você deveria ter desposado e eu não passo de uma peça no seu jogo.
— Margareth, eu... eu... não sei o que você está pensando, mas...
Com os olhos azuis tomados pela mágoa, Margareth olhou para Hugh de um jeito tão
profundo e doloroso, que ele sentiu um nó se formar na garganta.
— Nunca vou perdoar você.
Partiu para seu quarto, trancando-se em seguida e deixando Hugh desesperado do outro
lado da porta, golpeando a madeira e berrando para que ela o deixasse entrar.
Cansado de esmurrar a porta grossa, Hugh voltou para o quarto e arriou sobre a cama.
Aila não estava mais lá e a senhora Garden, que a tudo assistia em silêncio, mandou que as
criadas servissem chá para o conde.
— O senhor está bem?
— Eu não sei. Simplesmente não sei o que aconteceu aqui hoje.
Mady, que estivera os últimos instantes tentando convencer Margareth a deixá-la entrar
no quarto, retornou ao aposento do conde, reverenciou-o e então assumiu uma postura firme.
Nunca ousara falar com ele sem sua permissão, mas agora o faria, queria esclarecer tudo, gostava
da patroa e odiava o que o conde fizera com ela.
— Vossa Graça, a condessa veio para Surrey porque estava triste com a discussão que
tiveram, não sei ao certo o que ela queria dizer, mas estava ansiosa, feliz. Quando chegamos aqui
se deparou com Aila em sua cama, afirmando que espera um filho seu.
— Mas não é possível.
Mady deu de ombros.
— A senhora ainda vai precisar de mim? — Mady inquiriu a senhora Garden.
— Não, você pode ir e nenhuma palavra disso com os demais criados.
— Sim, senhora. Com licença — reverenciou o conde e saiu.
Hugh não dormiu, tentando vez ou outra convencer Margareth a abrir a porta para
esclarecer as coisas. Revirou na cama o restante do tempo e quebrou um vaso na parede,
deixando-o espatifado no chão junto com as flores e a água que encharcou o tapete.
Margareth, por sua vez, nunca havia chorado tanto na vida, nem mesmo na malfada noite
de núpcias. Uma dor profunda parecia perfurar seu coração e ela sentia que o mundo estava
chegando ao fim. Só conseguiu dormir quando o sono e o cansaço a venceram. Sem trocar de
roupa e com o rosto inchado, acordou com o pior de todos os humores.
Abriu a porta de conexão dos quartos e se deparou com Hugh levemente adormecido,
vestido com a roupa do dia anterior e os cabelos bagunçados. Ele despertou com a movimentação
dela pelo aposento.
— Margareth, graças a Deus, precisamos conversar — disse, caminhando em sua direção
mais estressado do que nunca.
— Não — ela se esquivou.
— Não entendo, como você pode acreditar que eu tive algo com ela?
— Não importa mais no que eu acredito ou não. Tenho apenas duas coisas a lhe dizer,
conde.
Ele a encarou frustrado.
— Não quero um bastardo seu andando nesta casa — a condessa crispou os olhos,
fulminando o marido. É claro que a criança não tinha culpa, mas ela jamais aceitaria ser
humilhada por aquela maldita outra vez. — Arrume um lugar bem longe para abrigar aquela
desgraçada, quando a criança nascer, faça o que quiser com os dois, mas mantenha-os longe de
mim.
— Você só pode estar brincando.
— Como sua esposa, esta casa também é minha, portanto tenho esse direito. E mesmo
que o seu filho um dia seja o conde, ainda serei a senhora de Surrey Hall.
— Mas ela não está grávida, não estava quando a mandei embora, não está agora. Você
precisa me escutar.
Margareth erigiu o dedo e continuou:
— Não me importa — fez um breve silêncio, engoliu em seco e olhou-o pela última vez
nos olhos. — Vou ajudá-lo a concretizar os planos que já combinamos, mas a partir de hoje
somos casados apenas por esse interesse. A porta do meu quarto estará fechada para sempre para
você e peço a gentileza de não tentar forçá-la.
— Você é minha esposa, está louca se acha que vou aceitar isso.
— Se quiser minha ajuda com sua vingança, conde, estes serão os meus termos.
— Margareth, me escute. Não tive nada com aquela mulher.
— Isso não está mais em discussão.
— É claro que está em discussão! — Hugh berrou, socando a parede com raiva.
Margareth virou as costas para Hugh, que ergueu o punho ensanguentado. Sem dar
atenção ao ferimento, ela saiu, deixando-o ali, urrando e furioso.
Depois de entrar no seu quarto, ela fechou a porta que dava para onde ele estava e deixou
o corpo cair ali mesmo, tornando a chorar a plenos pulmões. Antes de cair em sono profundo,
escutou o som de coisas quebrando. Hugh urrou e então tudo virou o mais absoluto silêncio.
Nunca mais ela haveria de entregar seu coração novamente. Nunca mais.
Dois dias se passaram antes de Margareth tornar a cruzar com Hugh. Com o vestido de
babados azul claro, ela desceu as escadas em sua melhor aparência. Hugh que se encaminhava
para a sala de jantar avistou-a e ficou calado. Os olhos faiscando num misto de raiva e
ressentimento.
Cumprimentaram-se com fria formalidade e seguiram, lado a lado, até a mesa. Em
silêncio, começaram o desjejum. Não tardou para que o visitante, até então desconhecido para
Margareth, surgisse diante dos dois.
Foram apresentados rapidamente e o homem, August, fez questão de sentar-se perto da
anfitriã, que não lhe disse mais do que meia dúzia de palavras nos minutos que se seguiram.
August era poucos anos mais jovem que Hugh, mas com um olhar tão jovial e sorridente que o
clima tenso, pouco a pouco, amenizou-se. Fazendo vários galanteios para a condessa, parecia
não se importar com os olhares de reprimenda do conde.
— O senhor é mesmo um homem muito galante — Margareth respondeu com um sorriso
tímido que rapidamente se transformou num olhar astuto e frio. — Mas não é a mim que deve
bajular, eu já sou uma mulher casada.
— Não estou bajulando a senhora, apenas sendo sincero.
— Pois use sua sinceridade com outra jovem.
Ele sorriu com exagerado afeto. Hugh bufou consternado.
— Você não acha que devemos voltar para Londres? — a condessa inquiriu o marido.
— Sim, de fato, é o melhor momento para darmos continuidade aos nossos negócios.
— Pedirei que a senhora Garden e Mady preparem nossa partida para o fim desta tarde.
Tudo bem?
— Para mim está bom.
Em Londres, o tempo parecia correr muito mais rápido e, também, mais triste e frio.
Margareth pouco saía do quarto, dispensando as refeições sempre que podia e evitando ao
máximo a presença de Hugh. Ele, por sua vez, estava cada vez mais arisco e bruto com criados e
convidados, que não tardaram a notar o clima gelado entre o casal.
Numa manhã fria, cerca de duas semanas desde o retorno dos Ruthenford para a casa de
Londres, Madelina chegou sem avisar. Seu jeito espalhafatoso logo encheu o ambiente e antes
mesmo de ela parar diante da porta do quarto de Margareth, a condessa já sabia de sua chegada.
— Mas afinal de contas, o que está acontecendo com você? — Madelina falou com um
olhar de advertência ao entrar no aposento e se deparar com a condessa sob as cobertas, os
cabelos revirados e um olhar profundo de lágrimas.
— Não posso ter um dia ruim? — Margareth retrucou com mau humor.
— Mas é claro que não, com a vida e o marido que você tem, no mínimo tem que acordar
cantando uma bela ópera.
— Ah! Por favor... me poupe. — Margareth cobriu o rosto com o travesseiro,
resmungando.
— O que foi que aquele belo rapaz fez para você ficar desse jeito? — a duquesa sentou-
se na cama, fazendo com que seu lindo vestido de camadas se transformasse num imenso
amontoado de tecidos lilases.
— Não quero falar sobre isso.
— Você não tem escolha — a espanhola sorriu com seus imensos cílios negros. — Você
sabe que não vou deixá-la em paz até que abra essa boca e coloque tudo pra fora.
Margareth sentou-se na cama, ajeitou as cobertas e esfregou o rosto, sentindo-se um
verdadeiro trapo.
— Uma maldita e imunda criada, você acredita?
— Ora, não me diga. E você tem certeza disso?
— Ela está grávida, pelo menos diz que está.
— E como você descobriu?
— Cheguei à Surrey Hall e ela estava deitada na cama dele, nua, dormindo.
— Mas que ousadia.
— Achei que ele fosse feliz comigo.
— Não se impressione querida, alguns homens são assim mesmo.
— Mas eu dei um basta, a partir de hoje, nosso relacionamento diz respeito apenas a
formalidades.
— Não diga uma bobagem dessas, Margareth. Logo as coisas se resolverão.
— Como? Explique-me, como ficarei com um homem que se deita com outra?
— Do mesmo jeito que todas as mulheres da nossa classe fazem.
— Duvido que você já tenha passado por isso.
— Eu não duvidaria. Se o duque faz, é muito bem escondido, é claro, mas eu não
colocaria minha mão no fogo.
Margareth deitou a cabeça no colo da amiga e chorou, deixando-a perceber toda a
vulnerabilidade de seu coração quebrado.
— Querida, torture seu marido por alguns dias e então faça as pazes, é melhor do que
ficar sofrendo.
A condessa não disse nada, se deixando envolver pelos carinhos que a outra dispensava
aos seus cachos louros rebeldes, exatamente como a mão jamais foi capaz de fazer. Recebia ali
muito mais de uma mãe do que a sua jamais fora capaz de dar. Havia um elo, uma amizade e
Margareth sentia-se grata por isso.
— Você soube o que aconteceu? — Madelina perguntou de súbito, após um momento de
silêncio.
— Não — Margareth voltou a se recompor, limpando as lágrimas do rosto.
— A família Paxton está em maus lençóis mesmo, você tinha razão.
— Não entendo, achei que eram apenas boatos de que estavam falidos.
— De fato — a duquesa respirou fundo. — Que fique entre nós apenas, mas parece que o
jovem herdeiro não é bom com as posses da família e tem péssimos hábitos.
— O que você quer dizer?
— Parece que ele gasta muito em cartas e o pai tinha certos interesses que gastavam
muito também.
— Não me diga — Margareth arregalou os olhos, surpresa. Nunca sequer imaginara que
seu boato inventado podia acabar virando realidade.
— Vim porque achei que talvez seu marido pudesse aconselhá-lo. Todos sabem que os
Ruthenford são excelentes administradores.
— Porque Hugh não tem medo de sujar as mãos — a condessa deu de ombros, achava
isso extremamente cativante, mas não queria ser cativada por isso agora. Naquele momento ela
queria odiá-lo. — Cuida de cada propriedade como se fosse a única pessoa capaz disso.
— Seria excelente se ele tivesse um padrinho, alguém que o ensinasse o valor das coisas.
— E por que você acha que Hugh aceitaria fazer isso?
— Porque ele é um nobre e estaria ajudando outro nobre em momentos de dificuldade.
— Você não pode ser tão inocente assim, Madelina — Margareth esbravejou. — Aqueles
Paxton são uns asquerosos, meu marido jamais aceitaria ajudar algum deles.
— Eu sei, são pessoas difíceis mesmo, mas veja, a maioria dos nobres o são. Apesar de
tudo, estou preocupada com a Lady e sua filha, a pobre jovem não conseguirá um bom
casamento se a família continuar nessa situação.
— Você tem um bom coração — Margareth disse, vencida. — Verei o que posso fazer.
— E aproveite para fazer as pazes com aquele belo rapaz, não há quem ainda não tenha
percebido o clima tenso entre vocês.
— Oh — Margareth cobriu o rosto e deixou a cabeça cair sobre os travesseiros. — Eu
odeio Londres, só tem fofoqueiros nesta cidade.
Mesmo em Londres, Hugh preferia fazer suas refeições cedo e preferia ficar na biblioteca
a acompanhar outros nobres aos clubes. Cada vez gostava menos da companhia dos homens da
nobreza londrina e a situação com Margareth piorava seu ânimo.
A vontade que nutria era a de subir ao quarto da esposa, derrubar a porta e tomá-la à
força, mas seu orgulho estava ferido, sua raiva inflamada pela falta de confiança da condessa e
isso era um veneno que o impedia de possui-la ainda que a desejasse com fervor.
Sem conseguir se concentrar na leitura, Hugh largou o livro que folheava em cima da
mesa e fechou os olhos, recostando-se na poltrona confortável. Não percebeu quando Margareth
entrou.
— Acho que sei como acabaremos de vez com os Paxton — a voz da condessa o fez abrir
as pestanas rapidamente. Os olhos verdes cintilaram sob a parca luz que banhava o ambiente. Ela
prosseguiu: — Cartas.
August apareceu no vestíbulo logo após a chegada de Margareth. Seria a primeira
aparição oficial do visitante como amigo íntimo da família Ruthenford. A condessa, que estava
vestida com luxo, admirou-se com a aparência elegante do homem, mas não falou muito a
respeito.
Hugh, com seu fraque de costura perfeita, parecia desajeitado e rabugento. Não amenizou
o olhar duro para o suposto amigo e estava com o pior humor de todos, rangendo os dentes cada
vez que o homem lhe dirigia a palavra ou lançando algum olhar cobiçoso para sua esposa.
Margareth e o marido não trocaram mais do que duas palavras formais no vestíbulo,
deixando bem claro que as coisas estavam indo de mal a pior.
A carruagem chegou e eles foram escoltados por dois lacaios que não levantaram os
olhos do chão. Direto para as garras do inimigo em um dos mais memoráveis eventos de
Londres, o baile na imensa propriedade dos Coucex, o ducado de Canterburry.
O trio chegou ao baile e foi recebido efusivamente pela jovem e bela duquesa, que
esbanjava luxo com joias caras. Hugh e o duque mal trocaram meias palavras e o conde passou
boa parte da noite bebendo vinho e licor num canto da sala e sem dar a mínima atenção aos
olhares alheios.
August não demorou muito a se tornar o centro das atenções das senhoritas e também dos
cavalheiros, com sua voz agradável e seus galanteios, além de suas perguntas inteligentes e seu
genuíno interesse pelas coisas da nobreza.
Fora apresentado como um amigo antigo de Hugh, da época em que frequentou a
universidade, e que agora estava hospedado com o conde de Surrey, com quem ficaria até sua
volta para o sul da França, onde assumiria uma propriedade herdada de família.
O sujeito passou a noite rodando de uma mesa a outra, dançando com jovens e velhas e
saudando os cavalheiros. Conquistou a todos e Margareth não demorou a pensar que ele tinha
realmente um grande talento para sua missão, aquela que os ajudaria a findar de vez a vingança.
Margareth conversou distraidamente com a anfitriã, notando a elegância do espaço e
dando dicas sobre o que ela deveria fazer em relação ao gênio duro do marido.
— Minha querida, você precisa dar um jeito, faça as coisas que ele gosta, finja que está se
divertindo, o importante é que ele consiga — a condessa frisou.
— Não sei como, já estou casada há cinco anos e nunca aconteceu. Não fica duro,
Margareth, nunquinha.
— Porque você era inexperiente, agora já sabe como ele é, deve perceber as coisas das
quais ele gosta, seja esperta e o faça pensar que essa criança que você carrega é dele. Isso
garantirá sua segurança e tranquilidade para o resto da vida, bem como a de um certo alguém.
— Vou tentar.
— Não, você vai conseguir, tentar é para mulheres fracas, nós duas somos fortes.
As duas sorriram, voltando a circular entre as outras senhoras pelo resto da noite.
O baile pareceu interminável, os assuntos desagradavam tanto à condessa quanto ao
marido e ambos não viam a hora de voltar para casa e enfurnar-se em seus aposentos,
esquecendo a situação que muito os importunava, a criança que Aila, estaria carregando.
E pensando nesse bebê, um bebê inocente, que não tinha culpa do que a vida havia
reservado, Margareth percebeu que ela mesma ansiava em gerar uma vida, em dividir seu tempo
e amor com alguém tão puro e indefeso e que a amasse incondicionalmente. Mas, se não havia
acontecido desde o casamento, talvez não acontecesse nunca, talvez ela não pudesse gerar vidas,
ou simplesmente Deus a achasse sem condições. Dormiu outra vez entregue às lagrimas,
sentindo o peso de tudo pelo que estava passando.
Hugh estava deitado na cama ainda vestindo o fraque, uma mistura de sentimentos
envolvia seus pensamentos já nublados e confusos pela quantidade de vinho e licor ingeridos no
baile. Poderia esquecer o assunto, ignorar Margareth e fazer sua vontade de nunca mais bater à
sua porta, nunca houvera escassez de mulheres em sua cama, mas não era isso que ele sentia.
Ele não conseguia ignorar aquilo. Era a segunda vez que aquela mulher petulante o
rejeitava. E Aila, grávida? Não, claro que ela não poderia estar esperando um filho seu. Hugh
achava impossível, afinal de contas, ela era esperta, sempre cuidadosa e ele também. Mas aquilo
o importunava, e se fosse verdade? E se estivesse mesmo esperando uma criança, um filho seu?
E por que diabos, Margareth simplesmente não podia acreditar quando dizia que não
estivera mais com a criada desde que ela tinha se tornado sua esposa de verdade?
Não conseguiu dormir, sentindo o quarto dar voltas e voltas toda vez que fechava os
olhos. Levantou-se e mergulhou na penumbra do corredor. Andando de um lado para o outro,
impaciente. Olhou seguidas vezes para a porta do quarto de Margareth, estaria trancada?
A porta de ligação de seus aposentos estaria fechada, sem dúvida, mas e aquela? A porta
do corredor estaria aberta? Será que ela faria um escândalo se ele tentasse? Aquilo o estava
enlouquecendo.
Aquela maldita mulher o deixava à beira do surto desde que entrara em sua vida. Seria
capaz de matar o primeiro que cruzasse seu caminho, apenas para descontar a ira e ardência que
queimava seu corpo. Abriu a porta, sem pensar. Se pensasse mais, voltaria para o quarto e
enfiaria a cabeça debaixo do travesseiro, para recuperar o juízo.
Mas àquela altura, ele não tinha mais qualquer pingo de juízo e só pensava em uma coisa:
Margareth.
Encontrou-a dormindo, ainda vestida com a roupa do baile, os olhos manchados por
lágrimas que feriam seu delicado rosto e traziam à tona uma mágoa que talvez não tivesse mais
cura. Hugh sentiu aquele nó perturbador se formar outra vez na garganta. Como podia causar
tanta tristeza à única pessoa com quem realmente se importava?
É claro que a culpa disso tudo era das suas ações, jamais dissera a ela como vinha se
sentindo ou em como ela foi capaz de mudar sua vida e a própria visão que tinha de si mesmo.
Jamais se desculpou por ter dormido com Aila na sua noite de núpcias e fingindo ter dormido de
novo em outro momento.
Ele tinha causado aquilo e agora era insuportável o peso de suas ações.
Hugh sentou na cama e suspirou, queria tocar o rosto de Margareth, dizer de seu
infortúnio por vê-la daquela forma, mas não queria correr o risco de ela despertar e o rejeitar
novamente. Tantas perguntas retumbavam em sua mente, tanta dor...
A condessa abriu os olhos bem devagar, piscando algumas vezes. Viu Hugh olhando-a e
ajeitou-se na cama, assustada e confusa.
— Margareth.
— O que você está fazendo aqui?
— Por favor, não me mande embora. Não esta noite.
Os olhos azuis da esposa do conde estreitaram-se. A dor que invadia seu peito era quase
tão violenta quanto o desejo de entregar-se à paixão que nutria por ele. Estava com saudade de
acalmar sua mente nos braços dele, com saudade de ser tocada, de dormir aconchegada.
— Não consigo perdoá-lo. Não posso.
— Eu sei, mas acredite em mim, não estive com ela, não estive com outra pessoa que não
você e isso é até engraçado, porque achei que nunca seria possível que alguém tivesse esse poder
sobre mim.
— E se ela estiver mesmo grávida?
Hugh engoliu em seco.
— Já não deveria haver uma barriga? Faz muitos meses desde que ela esteve na minha
cama e nenhuma depois de que você se tornou minha — ele falou, a voz minguando de tanta
tristeza. — Ela não pode estar grávida. Não de mim.
O conde aproximou seu rosto de Margareth, abriu seus lábios e preparou-se para beijá-la,
certo de que as coisas estavam resolvidas. Mas a condessa recuou, limpou o rosto e tornou a
olhá-lo.
— Eu gostaria de ficar sozinha.
— Não! — Hugh berrou e pôs-se de pé com brusquidão. — Será que você não escutou
tudo o que eu acabei de dizer?
— Escutei, mas ainda não sei se acredito.
Margareth saltou da cama, ficando frente a frente ao marido e olhando-o com
determinação.
— Como você pode dizer isso?
— Do mesmo jeito que você pôde se deitar com ela na nossa noite de núpcias.
Hugh engoliu em seco, sabia que merecia aquilo, mas era teimoso e não daria o braço a
torcer.
— Por favor, vá embora.
— De jeito nenhum. Você é minha esposa e eu exijo que aja como tal.
— Antes de me exigir qualquer coisa, você deveria começar por você mesmo. Dê o
exemplo, meu caro conde.
Os dois berravam.
— Sua megera — Hugh segurou-a nos braços e chacoalhou com força.
Margareth desprendeu-se e lançou a mão na direção de Hugh, ele não se defendeu,
deixando-a acertar-lhe bem no meio da bochecha, com toda a força.
Com os olhos fulminando, Hugh voou na direção dela, tomou seu rosto entre os dedos
fortes e olhando com intensidade para o par de safiras furioso, beijou-a. Um beijo ardente que
arrebatou a ambos.
Com a sede de uma fera presa ao deserto, Hugh envolveu Margareth em seus braços,
impedindo-a de lutar. E ela nem sequer ousou fazer isso, fechando seus olhos e mergulhando de
cabeça na paixão. Com brutalidade, o conde rasgou o vestido, puxou as anáguas que pareciam
intermináveis e deixou a esposa completamente nua diante de si numa fração de segundo.
Apreciou o corpo perfeito, enquanto a ajudava a tirar o resto de seu fraque, desesperados
por aquele contato, ansiosos. Nenhum dos dois ousou dizer nada, agarrando-se ao corpo do outro
com a força de um vendaval.
Hugh ergueu Margareth, que cruzou as pernas em volta de sua cintura e mordeu de leve
seu ombro. Ele puxou seus cachos para baixo e beijou seu pescoço, fazendo-a estremecer.
Encostou-a na parede, perto da janela e penetrou-a com força, apertando suas nádegas e beijando
seu pescoço. Margareth gritou ao chegar ao ápice, enroscada em Hugh e transtornada.
Fizeram amor até o dia raiar do outro lado da janela. Na manhã seguinte, porém, quando
Hugh acordou, Margareth não estava mais no quarto. O conde vestiu-se e desceu para o café,
dando de cara com a esposa aos risos. August retribuía o gesto, simpática e galantemente. O
conde olhou para os dois com desconfiança, assumiu seu lugar na cabeceira da mesa e tocou de
leve na mão da esposa. Margareth puxou os dedos e olhou-o com firmeza.
— Nada mudou.
Hugh sentiu seu sangue ferver. Queria estrangular Margareth ali mesmo e, mais, queria
quebrar a cabeça de August, que a tudo assistia com curioso divertimento.
— Você quer me enlouquecer, é isso? — Hugh berrou, levantando-se e fuzilando
Margareth com o olhar.
— Como você ousa falar assim comigo? — Margareth repetiu o gesto do marido.
— Ponha-se no seu lugar!
— Ponha-se o senhor no seu lugar e pare de dormir com as criadas.
— Já cansei de falar que não estou dormindo com criada nenhuma, com mulher nenhuma
além de você.
August arregalou os olhos, nunca antes viu mulher nenhuma desafiar o marido, ainda
mais alguém como Hugh, uma criatura quase animalesca quando atacada.
Aquela ali, sim, daria gosto de ter sob os lençóis. Se fosse tão ardente quanto era
atrevida... Bem, isso justificava muita coisa.
Ele nunca havia imaginado que Hugh pudesse se casar. Era um dos homens mais difíceis
com quem lidara e um dos poucos que conseguira desmascará-lo em seu truque.
É claro que o conde fora ainda mais esperto, deixara-o escapar impune de suas jogadas
contra a alta classe francesa, mas havia uma condição: August, para sempre, lhe deveria um
favor. E ali estava ele, pagando sua dívida com um dos homens mais perigosos que já conhecera
e o sujeito parecia prestes a ter uma crise histérica por causa de uma bela e atrevida jovem de
olhos azuis.
Como Margareth não disse nada, as sobrancelhas alteadas em desafio. Hugh jogou os
braços pra cima.
— Eu não estou dormindo com nenhuma criada e mesmo que estivesse, você seria a
última pessoa a ter o direito de me questionar sobre isso.
— Pois se é assim, o que lhe importa como ajo? — Margareth crispou os olhos. — Suas
necessidades serão atendidas sempre que desejar, Vossa Graça, se é isso que o preocupa.
— Tem razão... — Hugh disse depois de algum silêncio, com gravidade e ferocidade. —
Sendo assim, nada mais importa.
Margareth olhou-o estupefata, como se esperasse por algo que o conde não conseguira
alcançar. August, por outro lado, tinha absoluta convicção do que a bela condessa esperava, mas
não ousaria dizer uma palavra, nem mesmo se inquirido a respeito.
— Vamos, temos um assunto de ordem urgente a resolver.
August levantou-se de imediato e em silêncio, cumprimentando a condessa com
discrição.
Hugh tornou a olhar para Margareth, seu rosto inexpressivo e sob total controle. O
vermelho nas bochechas da condessa anunciava sua vitória na discussão. Atingira-a profunda e
dolorosamente e mesmo assim não sentia prazer ou satisfação.
Algo estava errado com ele, o conde tinha certeza, submeter aos outros à sua vontade
provocava-lhe sempre uma deliciosa sensação de poder, mas agora não havia nada. Nada além de
tristeza.
No restante do dia, Margareth passou trancada na sala de leitura, olhando pela janela,
vendo o dia nublado escurecer, os pensamentos perdidos e uma pontada de mágoa agulhando seu
coração.

Hugh respirou a fumaça dos charutos e soltou o ar com força. Bateu com as cartas na mão
e resmungou. A penumbra esfumaçada dava a austeridade necessária para que o conde abdicasse
da partida, sem revelar a ansiedade que sentia. Sabia que o suposto amigo, um golpista de
primeira linha – se é que essa nomeação poderia ser dada a alguém com tamanha desenvoltura e
desapego para com a sociedade e suas convenções – estava prestes a concluir com seu acordo. É
claro que Hugh tinha mais alguns planos para August e, para tanto, acrescentaria uma generosa
quantia em dinheiro à proposta. Por enquanto, porém, estava concentrado numa única ação. Falir
o último homem da família Paxton.
— Estou fora.
Os olhos de August brilharam, aquele era o sinal. Passara as duas últimas rodadas
deixando o imbecil beberrão à sua frente ganhar, instaurando assim a confiança necessária para a
derrocada final.
E esta estava prestes a acontecer, uma vez que o herdeiro do inimigo de Hugh estava
apostando até as calças naquela única partida. Uma ou duas rodadas de cartas, no máximo e ele
estaria resolvido para sempre na vida.
Com dinheiro suficiente para se manter bem por muitos anos, com luxo até, e o mais
importante, livre de Hugh e seu olhar mortífero. Esse segundo pensamento era, de fato, a
sensação mais importante naquele momento, se livrar daquele conde que parecia estar sempre
prestes a cortar suas vísceras e empalhá-lo feito um selvagem das colônias.
— E o grande duque, se acovardará ou tentará a sorte? — provocou, olhando para o
jovem Paxton, levemente embriagado.
— Pois eu quero ver — o rapaz disse, sustentando um olhar firme e convencido de que
deixaria o homem à sua frente sem um único centavo.
August puxou com agilidade felina a carta da derrocada, fazendo-a se lançar
discretamente do pulso da camisa para os dedos. A original, sumindo entre alguma parte de seu
casaco onde ninguém encontraria caso revistasse. August virou suas cartas e o rapaz
empalideceu.
A mudança de cartas havia sido sutil, o golpista desconfiava que mesmo os olhos astutos
do conde haviam deixado passar o movimento fugaz, treinado centenas de vezes, não havia quem
não estivesse questionando como August tivera tanta sorte ou como realizara a proeza.
— Não é possível — o duque berrou, levantando-se zonzo e assim sendo acudido, por
ninguém mais e ninguém menos, que o próprio conde vingativo.
Um mordomo elegante foi chamado e às pressas trouxe um copo de água e uma toalha
molhada, que depositou na testa do nobre. O filho de Charles Paxton, Charles Segundo, estava
pálido como se tivesse dado de cara com a visão do pai moribundo, apontando-lhe o dedo e o
acusando de arruinar de vez a família.
Muitas vezes perdera dinheiro em partidas de cartas nos clubes, mas jamais uma quantia
com a qual não pudesse custear ou choramingar ao pai para quitar. Desde que conhecera,
semanas antes, o amigo de Hugh, vinha tendo uma milagrosa sorte e naquela noite, diante de
muitos jovens de estirpe inferior à sua, elegantes herdeiros da classe trabalhadora dos bancos,
que venceram na nova fase da Inglaterra fabril, ele havia perdido dinheiro suficiente para
arruinar sua família.
Vomitou aos pés de um garçom que o atendia com a toalha e que, com uma folha do
jornal, abanava-o como se fosse resolver, com um pouco de brisa, a terrível situação em que o
garoto mesmo havia se deixado colocar.
— Isso não está certo... eu... estou falido.
— Fique calmo, garoto. Tenho certeza de que resolveremos tudo como cavalheiros —
Hugh deu um tapinha de consolo nas costas do rapaz, que revidou com um olhar furioso.
— Isso é tudo culpa sua. Saia da minha frente.
Cambaleando, empurrou Hugh diante de todos, provocando assim, a necessária quebra de
qualquer aliança e obrigação que o conde poderia ter com o outro de sua classe pelo pedido de
Madelina.
O herdeiro Paxton saiu, deixando na mesa a promissória que reivindicava um valor
estimado ao das duas principais propriedades da família. Não tinha como escapar, se não
remanejasse seus recursos com habilidade, estaria na completa miséria em menos de um ano.
Hugh tinha certeza de que isso era fato consumado, uma vez que o imbecil não via um
palmo diante do nariz e com a fúria e ânsia de recuperar a fortuna perdida, estaria se
embrenhando ainda mais em jogos, bebidas e mais dívidas. Em breve, o último a carregar o
nome Paxton estaria na miséria e Hugh teria, finalmente, dado a justiça que sua mãe merecia.
No percurso de volta para casa, deixou August diante da porta vermelha de um prostíbulo
famoso. O rapaz, que bebera um pouco além para comemorar sua felicidade na mesa de cartas,
ficou encostado no poste, bem abaixo da lamparina a convidá-lo para uma visita rápida à casa de
Madame Beouwet, uma rechonchuda mulher de meia idade, que mantinha vários quartos no
fundo da espelunca que gerenciava.
A casa era conhecida como um recanto para homens solteiros e casados, sedentos por
diversão de qualquer espécie. Hugh não era dado a bordéis, achava as mulheres imundas e
inescrupulosas, preferindo tombar criadas mais sonhadoras pelo pasto seco de alguma de suas
propriedades. Mas nem a lembrança de suas aventuras juvenis com o sexo oposto durante anos e
anos, conseguia amainar a ira que vinha incendiando seu peito e a culpa era dela. Margareth
tinha virado sua vida e sua cabeça.
Ele negou o convite e rumou para casa, irritado com Margareth sem nem saber por que,
afinal, ela tinha deixado claro que estava disposta a cumprir com suas tarefas como esposa e
evitar escândalo maior.
À noite visitou o quarto dela, a porta estava aberta e ela vestida apenas com o camisolão
de linho francês quase transparente que ele costumava arrancar com ferocidade.
Os cabelos espalhavam-se sobre o travesseiro de penas, o busto apertado contra a cama e
as pernas levemente dobradas num meio círculo convidativo. O conde sentou-se à beira da cama
e aspirou com profundidade o aroma adocicado que vinha da silhueta que dormia exausta.
Ressentiu-se consigo mesmo, por não ter dito as palavras certas logo cedo, quando
poderia estar um passo mais perto da conciliação. Mas também sabia que Margareth era uma
verdadeira megera quando queria e conseguia levá-lo ao ponto mais alto da irritação em poucos
instantes. Sempre compensava na cama, porém.
Agora, no entanto, as coisas pareciam irrevogáveis e Hugh, pela primeira vez, perguntou
a si mesmo por que isso era tão importante. Por que queria tanto que a mulher o aceitasse de bom
grado em sua cama ao invés de apenas ceder ao seu desejo? Por que precisava tanto que ela
acreditasse em sua palavra e delirasse ao seu toque?
Esse pensamento o levou ao assunto de Aila. Não, aquele maldito assunto não estava
resolvido. A criada atrevida iria pagar caro por aquela afronta.
Margareth gemeu, virou-se na cama e abriu os olhos bem devagar, despregando os
enormes cílios e deixando o azul cintilar à luz da vela que o conde depositara na mesa de
cabeceira ao lado da cama. Uma linha tensa se formou na testa da condessa ao dar de cara com a
expressão enervada do marido. Sentou-se na cama e então tocou por instinto na mão apoiada
sobre a colcha.
— Aconteceu alguma coisa?
Hugh acenou, fazendo-a respirar com profundidade e soltar o ar num longo e quente
suspiro.
— Foi tão fácil que chega a ser assustador.
— Nossa — Margareth cobriu os lábios com a mão pálida. — Sei que estamos fazendo o
certo, mas... Espero que tudo acabe logo.
— Você está bem? — Hugh alteou a sobrancelha. — A senhora Garden me disse que
você esteve indisposta.
— Já estou bem.
— Mas vejo que não tocou na comida — o conde apontou na direção da bandeja com o
jantar frio e intocado.
— Meu estômago está um pouco tenso, nada demais, amanhã estarei melhor. Obrigada
por perguntar.
— Desculpe-me — Hugh disse, pouco antes de se levantar contrafeito e sair, o olhar
consternado por não poder envolver a esposa em seus braços fortes e quentes e os nervos
sensíveis, por saber de sua grande parcela de culpa naquela confusão.
Se ela estava definhando de tristeza, ele era o responsável, mesmo que fosse inocente de
tudo que fora acusado. Com um nó se formando na garganta, Hugh alcançou a porta de ligação
dos quartos, antes de cruzá-la, porém, Margareth falou:
— Está quase no fim, não é?
Assentindo, o conde mergulhou no breu do seu próprio aposento, batendo de leve a porta
e afundando na cama com a mesma roupa que chegara. Nessa noite, sonhou com a morte e
acordou sentindo gosto de sangue.
Nas semanas seguintes, tudo transcorreu da forma exata como Hugh e Margareth haviam
planejado. O que era assustador e animador em igual forma. O duque Paxton, à beira de um
colapso nervoso, procurava constantemente August, implorando por uma revanche, coisa que o
falso amigo de Hugh deveria aceitar, caso fosse mesmo o cavalheiro que se dizia.
Tudo parte do plano, é claro. E fingindo-se relutante, o sujeito francês aceitava a
revanche, sempre implorando que o rapaz não o pelasse até às ceroulas desta vez e o estimulando
a acreditar que conseguiria vencer. Mas, ao invés de recuperar sua fortuna, Charles Segundo ia
endividando ainda mais o nome da família.
Numa quinta-feira gelada, pouco antes do final da temporada londrina, o rapaz foi
encontrado com uma corda no pescoço, pendurado no balaústre da varanda do quarto, no
segundo andar da casa, as pernas soltando leves espasmos, não pelo frio da noite, mas pelos
últimos suspiros antes da morte.
Uma semana depois, as damas restantes da família Paxton mudaram-se para a casa de
uma parente distante, a mais nova acabou indo viver sob o asilo de freiras, custeado pelo restante
das economias de seu dote, que o irmão não perdera nas cartas por força da sorte da jovem.
Nenhuma de suas prendas lhe valeu um casamento adequado, sem o valor em espécie que
seria reservado ao noivo e com a família arruinada. Fadada a viver sob a vergonha e solteirona,
preferiu a moça partir para o exílio, impelida pela mãe, é claro, que não suportava a humilhação
dos olhares de soslaio das outras senhoras.
A viúva enfadonha que tanto menosprezara outras da sociedade, agora passaria a viver o
restante de seus dias sob o jugo da família, padecendo dos luxos a que estivera acostumada a
desfrutar por décadas e remoendo a miséria a que fora lançada, quando seu marido, um homem
de fato desagradável, mas constante e estável, a deixara neste mundo para minguar à própria
sorte.
Depois de algum furor, tudo voltou ao normal e ninguém pareceu realmente sentir falta
daquela família da qual não restava sequer um título.
Margareth, que deveria regozijar-se pelo sucesso de boa parte de seu plano, viu o coração
se encher de tristeza e, apesar de tudo, compadeceu-se da viúva. Ninguém merecia destino tão
cruel, nem mesmo aquela mulher horrível.
Piorando ainda seu ânimo, a falta de apetite e a incansável vontade de chorar lhe davam
um aspecto cansado e ela até mesmo chegou a perder peso.
Apesar da frequente visita de Madelina, os constantes bailes nos quais sempre esbanjava
rara beleza e com as idas para sua amada Surrey Hall, a dama parecia prestes a cair enferma.
August, por outro lado, estava em sua melhor fase, ficara com quase todo o espólio que
arrancara do duque de Paxton e de outros nobres, cujos nomes eram de mais valia que a fortuna.
Frequentava os bailes e era adorado por jovens donzelas, que sonhavam com uma paixão ardente
em seus braços. Como se ao invés de golpista, ele fosse um homem de raras qualidades, um
verdadeiro príncipe encantado, que as roubaria a qualquer momento da vida tediosa de vestidos e
chapéus. Nada verdade, claro.
Antes da temporada londrina terminar e a maioria dos nobres partir para suas
propriedades de campo, August iniciara sua jogada final, acertada algumas semanas antes com o
conde. No último baile, colocaria em prática a cartada derradeira e depois tomaria o rumo
transatlântico.
Partiria para a nova terra, viveria sob a luz da nova era, seria importante, alguém de valor
e cheio de dinheiro. Teria uma casa com criados e uma bela esposa para satisfazer suas
necessidades, especialmente se fosse como a condessa, ardente e forte. Uma pena, pensava ele,
volta e meia, ao dar de cara com a jovem de olhos brilhantes, uma verdadeira pena ser ela a
esposa do conde. Fosse outra, arriscaria cada um dos centavos que havia ganhado, apenas pelo
desfrute de uma noite fortuita.
Conhecido, respeitado e popular no meio da nobreza, fora anunciado como convidado de
honra no baile anual da corte.
Nunca antes chegara a conhecer a rainha e seu consorte, apenas os nobres com título
importante tinham prestígio para tal e se não fosse Hugh um homem de princípios, apesar de
tudo, talvez frequentasse o seio real a partir daquele momento.
Mas a verdade é que o conde ficava afastado da realeza na maior parte do tempo,
apresentava a si e a esposa com a formalidade pedida quando convidado pela família real,
trocava algumas meras amenidades com os soberanos, ainda que o príncipe o visse com bons
olhos e tivesse prazer em sua conversa. Ambos eram homens que não tinham medo do trabalho e
valorizavam boas ações para com o povo.
Hugh não queria se expor, então fez August prometer se comportar e uma vez essa
promessa tenha sido feita, ninguém ousaria desafiá-lo e se arriscar.
O evento transcorreu com a maior tranquilidade, mas só muito tempo depois que o casal
consorte jantou e se retirou do salão principal é que o baile aconteceu, regado à música e bebida
de qualidade inestimável.
August dançou com diversas damas e se estendeu além da conta para com a bela e
delicada lady Coucex, a filha do duque de Canterburry. Apesar do olhar colérico, o velho não
dissuadira a filha da companhia de August, concentrando suas atenções na esposa, que exibia um
semblante cansado e bochechas vermelhas além do normal para a época do ano.
Margareth, apesar de mais magra e com um olhar fechado, estava bonita como nunca em
seu vestido de gala e crinolina armada. Encontrou a duquesa de Canterburry algum tempo depois
no jardim, sendo socorrida pela amiga espanhola.
As duas prestaram seu melhor atendimento, diante do que estava explícito: uma criança
estava a caminho. Depois de Madelina ser dispensada com uma desculpa qualquer, a bela
duquesa abriu seu coração e deixou que Margareth escutasse sua maior agonia, temia que o
marido descobrisse de sua condição e a machucasse, temia pela vida do bebê, temia por seu
amante.
— Seu marido é velho, é provável que não viverá o suficiente para ver a cor dos olhos da
criança. — Margareth sorriu, acalentando a jovem mãe aflita. — Não se aflija, cuide bem do seu
herdeiro e trate de se alimentar corretamente. Sempre poderá contar comigo.
No fundo de seu coração, tinha medo do que o destino reservava para a moça que já havia
sofrido o bastante, mas de qualquer forma, não podia agir com deslealdade, não colocaria seus
planos abaixo, mesmo que, às vezes, Hugh merecesse.
E como sentia falta do conde... Por mais que o marido a visitasse quase todas as noites, a
solidão contorcia suas entranhas e desanimavam-na por completo. Se não morresse pela falta de
forças no corpo, já que vinha comendo o mínimo e vomitando mais do que o estômago
conseguia dar conta de compensar, talvez definhasse de tristeza.
E com esse pensamento, se fechava ainda mais à dor e angústia que percorriam cada
minúscula partícula de seu corpo frágil. Talvez já estivesse definhando de fato.
Resignada, Margareth voltou para o salão do baile, onde viu August dançando novamente
com a filha do duque. Naquela noite, Hugh teria sua revanche contra o mais tirano dos tiranos.
Logo, poderia enfrentar o homem cara a cara e acusá-lo do mal que fizera à mãe. Pelo menos
isso trazia um pouco de paz para a condessa. Que a sogra que ela amava mesmo sem conhecer,
tivesse sua justiça.
E esse pensamento perduraria por dias a fio depois do baile, fazendo-a reunir as poucas
forças que sobravam para se manter firme nos planos.
Sentada em silêncio, em sua sala particular, tomando o ar fresco que penetrava pelas
imensas janelas abertas, Margareth viu o momento em que o golpista passou, carregando suas
malas. August parou diante da porta e acenou de relance para a condessa, que não disse nada, e
voltou a olhar para o jardim com o mesmo desânimo que vinha se tornando parte de sua alma.
O desaparecimento só seria notado no horário do almoço seguinte e aquele tempo teria
sido suficiente para que a filha do duque, levada pela paixão, estivesse longe e à própria sorte,
nas mãos de um homem que provavelmente a abandonaria depois de algumas noites. Quando
voltasse, cheia de vergonha, encontraria o pai que veria seu nome ser arrastado na lama. Mas não
antes de descobrir que não haveria herdeiro para levar seu nome, não um herdeiro cujo sangue
contivesse a maldita herança de maldade do velho. Hugh se encarregaria disso.
Um lacaio alvoroçado acordou a casa inteira. Embora estivessem na imensa Surrey Hall
por imposição de Margareth, que se via a minguar entre as paredes fechadas da casa de Londres,
o tumulto não deixou de ser ouvido por boa parte da criadagem.
— Mas o que está acontecendo? — Hugh berrava furioso, enquanto descia as escadas,
ainda vestido com as ceroulas.
Margareth, que já estava a par da situação, adiantou-se na direção do marido e anunciou:
— Precisamos ir à Canterburry, imediatamente.
Hugh e Margareth chegaram à casa de Londres dos Canterburry bastante tempo depois, a
noite ainda no pico da escuridão e o frio tomando as faces da condessa e empalidecendo seu
semblante já atormentado.
Não imaginavam pelo que estavam prestes a presenciar. O lacaio, que praticamente
invadiu a residência com os nervos afoitos, mal conseguira explicar o súbito ataque do duque à
esposa e de como o jovem rapaz escapou para buscar socorro com os amigos da moça, a pedido
da própria senhora da casa e pela pura lealdade para com alguém que a tratava tão bem.
Tudo havia acontecido em poucas horas, justamente porque o velho descobriu a fuga da
filha, que àquela altura, já estava desonrada diante de toda a sociedade britânica e em algum
lugar com August, sendo seduzida por ele.
— O senhor vai ajudar a minha senhora, não vai? O Duque vai matá-la, está tão furioso e
tão fora do juízo que se ela ainda estiver viva, será um verdadeiro milagre. — Repetia vez ou
outra o lacaio, que apegado à bondade e beleza da duquesa, receava por sua vida.
Margareth temia que não chegasse a ver a amiga viva, que o tempo e a distância que
percorriam na carruagem pelo campo e pelo percurso da cidade impedissem de salvar as duas
vidas que habitavam aquele corpo. Mãe e filho àquela altura poderiam já ter dado seu último
suspiro de vida.
O coração sendo açoitado pela dor e remorso de tudo que havia tramado contra a alma
gentil e sonhadora da garota, Margareth soluçava e rezava, pedindo a Deus perdão por seus
imensos pecados e clamando pela vida frágil da moça e do bebê em seu ventre.
Entretanto, quando cruzaram o pátio, entraram no calor da casa e subiram as escadas,
deram de cara com a criadagem amontoada diante da porta do quarto da duquesa, murmurando
entorpecidos pelos acontecimentos.
Hugh entrou logo após o lacaio afastar os empregados. A esposa o seguiu, instantes
depois, soltando um grito de assombro ao ver o corpo estirado no chão, agonizante. O conde viu
o sangue espalhando-se ao redor da silhueta e compreendeu: Aquele era o momento, se não
dissesse nada ali, nunca mais teria sua chance.
A duquesa tinha se defendido.
Pela primeira vez na vida, a frágil e indefesa esposa de Desmond tinha criado forças para
proteger a si e ao seu bebê e o duque estava à beira da morte por isso.
Enquanto Margareth corria para abraçar a duquesa, que ainda segurava um abridor de
cartas com as mãos banhadas em sangue escuro e tremendo, Hugh aproximou-se do velhote
desfalecido, que respirava com dificuldade, ele então pegou a mão enrugada e apertou:
— Há muitos anos espero por esse momento. E foi tão fácil... — falou o conde, fazendo o
outro arregalar os olhos de pavor. — Não fale, não vai adiantar, você não viverá para ver o sol
nascer. — Hugh continuou, o olhar de esmeralda implacável. — Hoje, eu selo a punição
merecida ao pior homem lançado neste mundo.
Foi nesse instante que o homem à beira da morte compreendeu. Abriu a boca para falar,
mas um fio de sangue o engasgou. Ele tossiu, tentou puxar o ar, mas só fez soluçar e cuspir mais
sangue. Hugh fez com que se calasse, os olhos frios saboreando o momento.
— Sua filha, a esta altura já está arruinada, uma pena que você não terá tempo de sentir a
humilhação... August Cleithon não passa de um golpista, muito bom por sinal, e demorará para
que ele devolva a jovem manchada para todo o sempre. Ela minguará por causa dos pecados do
pai. Assim como os Paxton... Você achou mesmo que o duque tivesse enlouquecido e perseguido
sua esposa por obra do acaso, ou para afrontá-lo? — Hugh riu, uma meia lua cruel se formando
nos lábios carnudos.
— Engraçado como um bilhete, um bilhete tão simples pode resolver tantas questões.
O homem apertou os dedos de Hugh, mas o conde não foi cordial, esmagando os dedos
do inimigo entre os seus e sussurrando em seu ouvido:
— Sua mulher, você já deve saber, espera uma criança. Mas não haverá ninguém neste
mundo para herdar seu sangue ruim, velho. Sua fortuna será gasta pelo amante de sua esposa e
pelo filho dele. E sim, Paxton não estava mentindo quando disse que você pediu que ele fosse
atrás de informações. Eu fiz isso, eu o fiz perseguir sua esposa e descobrir a verdade. E você o
matou, não é? Você não resistiu e acabou com o sujeito.
Os olhos agourentos do duque moribundo percorreram o ambiente à penumbra. Deu de
cara com a esposa que mantinha uma mão no ventre e a outra ainda segurava a ferramenta que
utilizara para se defender. Margareth a tinha envolvido em seus ternos braços e explicava, aos
cochichos, os fatos mais importantes da trama.
— Sabe o que é melhor? Ninguém sentirá sua falta, porque ninguém quer você por perto.
Nem mesmo encontrarão seu corpo para que uma cerimônia fúnebre seja prestada em sua
homenagem. Não haverá nada.
O velho Coucex agonizou, cuspindo sangue enquanto tossia com força assombrosa. Hugh
não desviou por um segundo sequer seus imensos olhos verdes do olhar mórbido do duque.
— Você sabe de quem eu sou filho?
O homem balançou a cabeça bem devagar, prestes a dar o suspiro final. Hugh sorriu com
maldade e então soltou a mão do velho, que não tivera sequer tempo de fechar olhos, morrendo
após afogar-se com o próprio sangue e saliva.
Apesar de abalados, os criados ajudaram a dar fim ao corpo do duque e exatamente como
Hugh dissera: não houve cerimônia fúnebre, ninguém sequer encontraria o corpo que afundaria
num rio longínquo da propriedade. Tudo seria resolvido com explicações simples. A lady
preservaria sua herança e, seu filho, embora fosse carregar o nome Coucex e receber o ducado de
Canterburry, jamais seria como aquele homem, a duquesa daria um jeito para que fosse assim.
Enquanto a criança, e todos esperavam que fosse menino, não soubesse, estaria livre dos
pecados do suposto pai. Se fosse menina, eles estenderiam seu zelo para com ela e Elizabeth,
responsabilizando por uma vida digna.
Uma história foi elaborada e seria contada aos quatro cantos de Londres. O conde e a
esposa instruíram a viúva e prometeram maiores e melhores explicações num futuro próximo.
Grata como estava, não questionou e passou o restante da noite treinando cada palavra.
Convencendo o inspetor encarregado do caso, tudo ficaria bem. Quanto mais simples a história,
mais convincente seria:
O duque, preocupado e triste pelo sumiço da filha, saíra enlouquecido, dizendo que
precisava providenciar para que a jovem fosse encontrada o quanto antes, planejava, inclusive,
proporcionar uma punição para o enamorado que roubara a jovem... talvez o desgosto o tivesse
feito tirar a própria vida, ou perder o juízo. De fato, por mais que passassem dias à procura do
homem, vivo ou morto, jamais o encontrariam. Jamais.
Hugh levou a esposa em estado de choque direto para Surey Hall. No caminho,
Margareth adormecera apoiada no ombro do marido, que fizera o mínimo de movimentação,
para deixá-la mais confortável.
Ela estava vulnerável e ele não queria piorar seu estado de espírito.
Por mais vitorioso que estivesse com a vingança, não conseguia se sentir feliz. Tinha
dado justiça à mãe e um desfecho à sua família, mas não estava exultante como acreditou que
ficaria quando isso acontecesse.
No fim, ele se sentia vazio, ávido por se acertar com Margareth e exausto de tudo.
Já estabelecidos novamente em seus aposentos, a condessa pediu que Mady preparasse
um banho quente. A moça o fizera com agilidade, pingando gotas de óleo de rosa e deixando o
vapor espalhar o delicioso e calmante aroma.
Margareth mergulhou na água morna até o pescoço, fechou os olhos e deixou que o corpo
fosse relaxando aos poucos. Cada pedacinho doía e tudo parecia tensionado e preso, sem contar
que os seios estavam maiores e doloridos. Como se até mesmo eles sentissem falta de Hugh, não
apenas do sexo, mas dele como um todo, como seu companheiro e dono do seu coração.
Nunca duvidara da violência e ódio de Hugh, mas aquele olhar mortífero e maligno
realmente a assustou. Pelo menos, tudo havia acabado ou assim ela pensava.
Sentiu uma mão tranquila mergulhando na água morna. Margareth não disse nada,
supondo, a princípio, que a criada estava ali para ajudá-la. Mas Mady era do tipo conversador e o
silêncio não era um traço seu, portanto, se não era a moça, só podia ser o marido. E o conde
deveria estar sedento por liberar a energia da vingança. Margareth sorriu, ainda como os olhos
fechados, talvez ela pudesse perdoá-lo, pelo menos durante a noite.
— Você pode entrar aqui se quiser.
— Prefiro matá-la daqui mesmo — a voz ferina alertou Margareth.
A condessa abriu os olhos e soltou um grito de assombro. Aila, com os olhos vidrados,
estava parada diante da banheira. Seu aspecto enlouquecido era aterrador, os cabelos suados e
pegajosos pareciam um ninho de pássaro, as roupas estavam sujas e uma bagunça.
Margareth tentou se levantar, mas a mulher puxou de dentro da blusa uma pistola
enferrujada, cujo cano havia sido cortado de forma grotesca, diminuindo assim seu tamanho e
aparência. Apontou direto para a condessa, que se esquivou instintivamente.
— Você achou mesmo que eu fosse deixar passar tudo o que me fez? —Aila proferiu
com a voz fria.
— O que você quer?
— O conde, é claro. Quando você morrer, ele não terá outra escolha se não ficar comigo,
então... — disse, dando de ombros.
— Ele jamais ficará com você.
— Tampouco com você — o sorriso maligno se formou no momento em que apontou a
pistola para o peito da condessa.

Hugh andava de um lado para outro no quarto.


Nunca chegou realmente a acreditar que conseguiria vingar a mãe, pensara muitas vezes
que passaria a vida correndo atrás daquilo e que, por fim, teria ele mesmo que tirar a vida dos
inimigos, mas o que havia acontecido foi surpreendente.
Por pior e mais maligno que ele tivesse sido, Hugh sabia que ainda poderia ser uma boa
pessoa. Esperava que sim pelo menos. Dedicaria sua vida a isso e a se entender com aquela
maldita mulher, que tanto o deixava à beira da loucura.
A mulher que havia se infiltrado em cada pedaço de sua pele, que se tornou a dona do seu
coração e da sua alma.
Tirou a casaca e deu mais alguns passos pelo quarto antes de se decidir por tentar as
pazes com a condessa. Talvez fosse mesmo o momento de abrir seu coração, de revelar aquele
sentimento que queria explodir no peito e o impedia de seguir adiante. A queria em sua cama,
mas acima de tudo em seu coração. Estava mais do que na hora de resolver as coisas.
Se as consequências de suas ações o atormentavam e ele temia se tornar uma pessoa
ainda pior que o inimigo morto, temia ainda mais que Margareth o odiasse, que o visse como um
monstro, e ele havia sido por conta da vingança, mas não queria continuar sendo assim.
Naquela noite não a queria por obrigação, desejava-a por amor.
Ele entrou no quarto de Margareth pela porta de ligação dos aposentos e não a vendo ali,
dirigiu-se para o quarto de banho, cogitando as palavras com as quais se aproximaria dela,
palavras que a desarmariam.
Faria o que fosse necessário, mas convenceria sua esposa e juraria todo o seu amor para
que ela entendesse que assim como ela era sua, ele era seu, completa e unicamente.
Sua surpresa foi tremenda. Margareth completamente nua, em pé na banheira, os olhos
assustados diante de uma pistola antiquada que poderia estourar a qualquer momento. Seu
coração espancou o peito com brutalidade, como se estivesse prestes a explodir junto com a
pistola que Aila empunhava, sob um sorriso torto de ódio.
— Chegou bem a tempo de ver a sua linda condessa pagar por todo mal que me fez. Só
assim nós poderemos ficar juntos, meu amor.
— Por favor, largue isso — Hugh manteve a calma, mesmo sentindo o coração explodir
dentro do peito. — Nós nunca poderemos ficar juntos.
Aila estalou a língua entre os dentes, sorriu raivosa e acenou para que o conde fosse se
juntar à esposa. Ele deu a volta na banheira e se posicionou o mais perto de Margareth que pôde.
A condessa não se moveu, observando a inimiga com extremo pavor.
Passando os braços no corpo de Margareth, Hugh sussurrou em seu ouvido:
— Amo você.
Margareth piscou devagar, sabendo que estava diante da morte certa.
— Desculpe-me — a condessa falou, olhando para a criada.
— Não vai adiantar se desculpar, sua garota mimada. Você vai morrer hoje.
— Não me desculpei com você — Margareth disse para a outra, que arregalou os olhos.
— Também amo você, Hugh.
O som do tiro ecoou pelo aposento de banho de Margareth. As fagulhas acertaram os
olhos de Aila e ela gritou, sentindo a pólvora queimar seus dedos. Largou o revólver e riu
histericamente ao perceber que havia sangue por todo lado. Um filete de sangue correu pela
banheira.
Mady ouviu o barulho de disparo do corredor, vinha trazendo um chá para sua senhora,
pois sabia que a condessa não vinha se sentindo bem há semanas. Tinha certeza de que o motivo
por trás das indisposições da lady dizia respeito a um bebezinho que crescia em seu ventre, já até
conversara a questão com Margareth.
A condessa pediu segredo, queria ter certeza antes de contar ao marido e antes de criar
esperanças de ter seu próprio filho nos braços um dia, e como Mady não fazia nada além de
cuidar com zelo da condessa fez o que ela pediu e ficou quieta.
Esperava ver o ventre crescer logo, quem sabe participar como auxiliar do parto e se
encarregar ela mesma dos cuidados do bebê. Era a criada favorita da condessa, sempre bem
tratada e companheira fiel da senhora, não via qualquer motivo pelo qual pudesse ser impedida
de compartilhar aquele momento especial da residência. E como era apegada à Margareth, seria
também ao seu bebê. Ou aos seus bebês caso tivessem mais depois de se reconciliar.
Seria uma nova fase de bons humores e olheiras cansadas para o conde, ela não tinha
dúvida, os dois só precisavam resolver a confusão que Aila tinha causado. Mady esperava que
fosse logo.
Quando o som do estampido a encontrou a meio caminho do quarto da condessa, Mady
deixou a bandeja com o chá e os biscoitos cair no chão. Correu para o aposento de banho e gritou
ao ver a cena. Aila de joelhos, rindo como louca, as mãos e os olhos chamuscados. Hugh, caído
entre a banheira e o chão, a água encarnada pelo sangue que respingara ali e Margareth,
tremendo dos pés à cabeça, tentando puxar o marido ferido para o seu colo.
O tiro acertou a parte de trás do ombro de Hugh, quando ele se postou na frente da esposa
só a tempo de protegê-la. Seu instinto havia sido rápido o suficiente para evitar que a condessa
recebesse a bala, mas não o bastante para impedir que encontrasse seu corpo.
Ele caiu sobre Margareth que recebeu o impacto e desequilibrou-se. Ambos estavam no
chão. A condessa precisou reunir todas as suas forças para deslocar o marido e estava tentando
protegê-lo, já que a agressora ainda estava ali e a arma estava em algum lugar também.
Hugh gemeu quando ela o moveu, forçando-se a sair debaixo dele e cobrir a ferida de
bala com a mão.
A primeira reação de Mady foi apanhar a arma ainda quente e jogá-la longe, depois,
gritou por socorro da porta do quarto e correu para acudir os patrões.
Juntas, Margareth e sua criada conseguiram arrastar Hugh. Ele tentou ajudar, impelindo o
corpo com dificuldade para ficar de pé, mas estava zonzo pelo ferimento e cambaleou, caindo
sobre o tapete onde tantas vezes havia deitado a esposa e proporcionado gritos de prazer. Agora
os gritos eram outros. De desespero e pavor.
As lágrimas dela banharam as costas do conde, que respirava com dificuldade enquanto
ela impunha toda a sua força para ajudá-lo a sobreviver.
— Chame ajuda, Mady — a condessa forçou-se a dizer. — Chame um médico.
Enquanto a criada se levantava nervosa e saía correndo do quarto, Margareth recobrou a
calma, conversou com o esposo, ajeitando a cabeça suada sobre suas pernas, tentando mantê-lo
acordado. Acariciou os cabelos negros com uma das mãos e pressionou o ferimento com a outra.
Quando o sangue começou a ultrapassar seus dedos finos, teve de colocar a outra mão junto e
impelir bastante força para tentar barrar o sangramento.
Vinha esperando o desfecho de seus planos maquiavélicos de vingança e um momento
ideal para dar a notícia a Hugh, mas agora, já não tinha certeza de que ele conseguiria aguentar.
Sabia o quanto uma arma de fogo era capaz de machucar um homem, tinha lido a respeito
das poucas pessoas que sobreviviam, e não queria aceitar que Hugh, o conde selvagem que a
desposou, perderia a vida ali, diante dela, que o amava com todas as forças.
O sangue corria a fio pelo tapete, manchando o corpo nu da condessa e ensopando o
chão. Ela puxou uma manta de sobre a cama e pressionou o ferimento outra vez, sentiu a
respiração pesada do marido ao gemer de dor. Apoiou-o melhor e sussurrou em seu ouvido.
— Aguente firme, não posso criar seu filho sozinha.
Devagar, Hugh abriu as pestanas, estava deitado, com a cabeça virada para a direção do
ventre dela. Deu um sorriso fraco, um novo gemido e fechou os olhos.
— Não, nem pense em fechar esses olhos. Vamos, seja a fera que todos temem. Abra
esses malditos olhos, Hugh!
A senhora Garden entrou no quarto como um furacão, indo direto para a condessa, que
chorava, ela a cobriu com uma manta e dois lacaios entraram já em seguida. Sem dirigir-se para a
senhora da casa, apoiaram o conde sobre os braços e deitaram-no na cama.
As ordens seguintes da governanta foram para que ajudassem a manter o ferimento
estancado enquanto Mady e um dos lacaios buscavam um médico. Margareth vestiu uma
camisola por cima do corpo ensanguentado, foi ao quarto de banho e deparou-se com Aila, ainda
rindo como se tivesse perdido o juízo.
Com toda a força de sua ira, a condessa agarrou a mulher pelos braços e a enxotou dali,
entregando-a a um lacaio que chegava naquele momento com mais toalhas limpas.
— Não a deixe escapar.
A movimentação frenética da casa fez com que uma grande comoção se desenvolvesse
em toda a propriedade. Apesar de tudo, o conde sempre fora um homem bom para os
funcionários, pagando-lhes conforme o combinado e metendo as mãos no trabalho duro quando
necessário. Não havia um que não pensasse em sua morte com pesar no coração.
O médico fez todo o atendimento ali mesmo, no quarto de Margareth, sob seu olhar
desesperado. Não havia como saber, talvez o conde sobrevivesse, talvez não. O futuro do senhor
de Surrey Hall era incerto e dependia da graça de Deus e da força do homem.
Aila foi entregue ao inspetor, que prontamente se dirigiu com seu grupo de apoio ao
condado de Surrey. Não tinha muito que se pudesse fazer, além de prender a moça ensandecida,
levá-la à justiça e rezar para que o conde sobrevivesse.
A condessa não saiu do lado do marido nem por um segundo nos dias que se seguiram,
baixando sua febre com banhos frios e toalhas molhadas na testa, aquecendo-o nas noites frias e
conversando durante seu sono profundo, pedindo que tivesse forças e sobrevivesse por ela e pelo
filho. Mal comia, mal bebia e pouco cuidara de sua própria higiene. Estava desnorteada e não
suportava a ideia de deixar Hugh morrer.
Foram os momentos mais difíceis que Margareth enfrentou na vida, além das visitas
incômodas de nobres curiosos e da própria família, que vinha especular acerca dos
acontecimentos. O quadro do marido piorava e ele, ao invés de se recuperar, vinha
enfraquecendo e minguando.
Ela já não estava certa da sobrevivência dele e chorava horas a fio. Exceto quando
Madelina vinha passar algumas horas para cuidar de Margareth, todo o resto do dia passava-se
como um borrão. Ela queria Hugh vivo e forte, feroz, temperamental e teimoso como sempre. O
queria ao seu lado, para brigar se fosse preciso e para amá-la como ela o amava.
Hugh tivera muitos sonhos enquanto dormia sob febre alta, vira a mãe cantando no
jardim, o pai convidando-o para uma pescaria, viu Aila rindo e viu os inimigos mortos a seus
pés. No entanto, quando via sua própria morte e um túmulo sem dizeres específicos era
interrompido pela voz de Margareth, que o acusava de estar abandonando-a.
Sonhava com uma criança de cabelos negros e olhos brilhantes, sentia o cheiro de rosas
do quarto e via a imagem da esposa, nua, à sua espera e de braços abertos.
A febre piorou de forma a fazer Hugh tremer durante uma madrugada inteira. Margareth,
que dormia a seu lado, acordou assustada quando o homem começou a delirar, chamando por seu
nome e se debatendo.
Ela lembrou-se da história dos pais de Hugh, do que a mãe fizera pelo pai e como o amor
da criada tinha salvado a vida do jovem fidalgo quase morto. Reunindo todas as forças de que
ainda dispunha, a condessa arrastou o marido pelo quarto com ajuda da senhora Garden e de
alguns criados.
Mady preparou um banho morno com os óleos da condessa e com a ajuda de um criado
forte, a condessa mergulhou na banheira com o marido, chamando-o à razão, chorando sem parar
e discutindo sobre a mania de dificultar sua vida em tudo.
— Se você morrer, vou odiá-lo para sempre — dizia entre soluços. — Não me deixe
sozinha neste mundo, não sobreviverei sem você.
Por toda a madrugada, Margareth suportou os baques que recebia quando Hugh
espasmava por causa da febre, acariciando seu corpo e esfriando sua testa.
Suas costas doíam como se queimassem, mas ela não desistiria até que ele estivesse bem
ou ela mesma estivesse morta a seu lado. Quando finalmente o corpo dele sossegou, a condessa
fechou os olhos sentindo a respiração fraca do homem que amava. Dormiu com a cabeça dele
pendendo sobre seus seios e acariciando de leve os músculos dos seus antebraços.
— Estou com frio — Hugh murmurou, acordando Margareth de susto muito tempo
depois.
— Oh, Deus, você está vivo!
— Você está querendo me matar com essa água fria? — ele perguntou com dificuldade,
abrindo um meio sorriso.
— Só se você resolver me deixar sozinha, seu maldito conde selvagem.
— Nunca vou deixá-la minha condessa, porque a amo mais do que a mim mesmo.
— Eu também te amo, Hugh, você e ao nosso bebê.
— Então eu não estava sonhando?
— Não, você vai ser papai e espero que este bebezinho seja apenas o primeiro, quero a
casa cheia de pequenos selvagenzinhos e megerinhas.
— Bom, então é melhor eu me recuperar logo.
Nos dias decorrentes do banho, Hugh teve uma melhora significativa e antes da semana
seguinte se encerrar, ele já estava de pé, dando ordens pela casa com sua voz grave e
caminhando pelo campo, alegando para quem quisesse ouvir que era ruim o bastante para
sobreviver a uma bala e que não o desafiassem pois nem a morte era capaz de vencê-lo.
É claro que a esposa era a principal responsável por sua sobrevivência e ele deixava isso
escapar com um misto de orgulho e provocação. Margareth era de longe a mulher que salvou sua
vida. Não apenas de um jeito, mas de muitas maneiras.
Fizeram as pazes muitas vezes seguidas quando ele já estava mais forte o suficiente para
dar conta de todas as investidas de Margareth.
Apaixonados, sem medo de finalmente viver a vida que sentiam que eram capazes, os
dois acompanharam a gestação da condessa com um misto de sentimentos. Orgulho, cuidado e,
principalmente, devoção.
Hugh não apenas se tornou a pessoa que podia ser, o marido companheiro e apaixonado,
leal e confiante como também se tornaria um grande pai, capaz de ensinar ao bebê que nasceria
em breve o valor do trabalho e do amor.
Na temporada londrina seguinte, o casal Ruthenford apresentava aos amigos um bebê
risonho, de pele pálida e bochechas rosadas, olhos verdes como os de Hugh e cabelos dourados
como a mãe.
— Sabe de uma coisa — ela sussurrou numa manhã preguiçosa, logo depois de ver que
Hugh já estava acordado, admirando-a. — Acho que me casar com você foi a melhor coisa que
me aconteceu.
Hugh ergueu as sobrancelhas, apoiando o cotovelo na cama e começando a brincar com
uma mecha de cabelo dourado.
— Porque eu sou melhor partido de Londres, é claro?
— É claro que você é, mas não é por isso.
— Então por que, minha condessa?
— Porque você nasceu para ser uma fera selvagem.
Surpreso e confuso, ele permaneceu em silêncio.
— E eu nasci para ser uma domadora de feras. — Ela tocou o rosto dele com carinho. —
Amo, você, Hugh, conde de Surrey.
— Amo você, minha linda condessa megera.
Se Margareth fosse descrever sua vida, diria que estava vivendo como nos livros que lia
antes de se casar, feliz para sempre, ou quase sempre, salvo quando estava em pé de guerra com
o marido, coisa que sempre se resolvia à noite, sob os lençóis ou em cima do tapete novo do
quarto da condessa.
E o quarto do marido? Haviam transformado num belo quarto de criança, com móveis de
madeira lustrosa, cortinas pintadas com nuvens fofas e um cavalinho de madeira que se mexia.
Porque, definitivamente, Hugh nunca mais dormiria naquele lugar sem sua linda e nada
submissa condessa.
Olá, Levada, tudo bem?
Espero que tenha gostado da trajetória de Hugh e Margareth. Por favor, não deixe de
comentar e dar algumas estrelinhas. Sua avaliação e opinião são muito importantes para mim. E
aproveite para conhecer outras histórias com personagens temperamentais e reviravoltas de tirar
o fôlego.
Te espero no meu Instagram para acompanhar as novidades e nos vemos no próximo
livro.
Me siga em: @gracirocha_autora

A seguir, reservei um bônus especial de um dos meus livros para que você se apaixone
por novas histórias e personagens cheios de paixão.
Divórcio é uma merda.
Não, não é pior do que ficar casado com uma traidora, mas ainda é uma merda.
Primeiro ela quer os pratos que ganhamos de presente de casamento, depois está exigindo
os quadros, os talheres e até a porra da lava-louça. Quer saber, que se dane, ela pode comer essa
porcaria toda.
— Não quero nada — digo, encarando o olhar magoado da mulher para quem jurei todo
meu amor.
— Mas Landon... — ela sussurra, só que meu olhar furioso deixa claro que não quero porra
nenhuma. Não quero absolutamente nada da minha ex-mulher. Só preciso que isso acabe logo.
— Fique com o que quiser, quero apenas que saia da minha casa.
— Nossa casa — ela revida, tentando arrumar briga.
— Minha casa. Comprada com o meu dinheiro antes de nos casarmos. Quero você fora até
semana que vem.
— Landon, por favor... vamos conversar. Eu... eu sinto muito.
— Devia ter pensado nisso antes de dormir com o maldito personal trainer. — É, bem
clichê, eu sei, mas foi exatamente isso que aconteceu.
Minha esposa, a mulher que jurou fidelidade diante do padre, me traiu com um instrutor de
ginástica com menos músculos do que eu.
— Você também... — ela fala, me fazendo erguer os olhos novamente na sua direção. Ao
sentir minha fúria silenciosa, ela respira fundo e molha os lábios. — Você também errou.
— Eu não traí você.
— Mas me excluiu da sua vida.
— Excluir você da minha vida é o que farei agora.
Assim que termino de falar, pego meu casaco na guarda da cadeira e saio. Não quero ficar
nem mais um segundo nesse lugar, diante da mulher com quem pensei que passaria o resto dos
meus dias.
Ela me traiu.
Nosso casamento acabou.
E o meu dia já começou terrível.
E ao que parece, não vai melhorar muito mais. É o que me dou conta ao chegar no
escritório e encontrar uma garota colorida na mesa onde, supostamente, deveria haver uma
secretária para mim.
Pequena, com cabelos compridos e ondulados que descem até as costas, ela parece se
harmonizar com o ambiente. Embora esteja usando uma calça verde escuro e uma blusa cor-de-
rosa.
— Boa tarde, senhor Scott, sou sua nova secretária. — Ela vem toda sorridente na minha
direção, estendendo a mão, que eu ignoro por pura impaciência.
— Quem é você? — pergunto, virando-me para a minha sala.
Escuto o som dos saltos vindo atrás de mim.
— Catherine Pierce — ela diz, depois que jogo meu casaco em uma cadeira e me sento
atrás da mesa.
— Você tem experiência como secretária?
— Não.
— Tem formação?
— Sim.
— Fala mais algum idioma?
— Três e meio... não sou muito boa em alemão.
— Qual seu último emprego?
— Trabalhei em um abrigo de animais — responde rapidamente, mas algo no seu tom me
diz que não quer se aprofundar no tema.
— E o que a fez mudar de ramo?
A secretária dá de ombros e suspira.
— Às vezes é bom mudar.
— Você não acha que passou da idade pra uma mudança de carreira? — pergunto e ela
alteia as sobrancelhas.
— E você não é muito velho pra ter uma babá? — retruca, deixando-me atônito pela
ousadia.
— Eu sou o chefe — declaro e ela sorri, mas não é um sorriso amigável.
— E mesmo assim eu tenho uma lista de tarefas que me fazem parecer sua babá — crispa
de volta, olhando-me no fundo dos olhos e sem qualquer medo. — Agora, se não tiver mais
motivos pra me chamar de velha, tenho que buscar seu sanduíche de tofu defumado. Seja lá o
que for isso.
Completamente sem reação, vejo a mulher bonita e atrevida sair da minha sala sem voltar a
me olhar, sacudindo a bunda empinada e a cascata que ondula nas costas.
Quando minha avó disse que eu teria apenas mais uma chance e que se eu infernizasse
outra secretária me colocaria em férias forçadas de um ano, não imaginei que ela estivesse
planejando se vingar de mim, mas ao que parece é isso que está acontecendo aqui. E Alexander,
o gestor dos recursos humanos, é o cúmplice da minha avó.
Algo me diz que essa última chance pode ser também a minha sentença final.
Antes de sair, dou uma olhada no espelho e suspiro. Talvez eu deva desistir, não é como se
eu precisasse trabalhar nem nada disso. Eu só estou cansada de estar em casa. Preciso me sentir
útil, preciso fazer algo diferente e com pessoas que não se impressionem por eu ser quem eu sou,
por quem eu fui.
Na verdade, o que eu preciso mesmo é de uma vida nova, de preferência uma em que
ninguém me conheça e sem cães indefesos que precisem ser salvos. Não consigo lidar com mais
nenhum babaca que machuca animais.
Meu telefone toca, o nome que pisca na tela é Kathleen, minha irmã mais nova e muito
mais temperamental.
— Você vai mesmo fazer isso? — minha irmã pergunta quando atendo o telefone.
— Vou — digo, mas minha voz sai incerta.
— Se quer voltar ao trabalho, nós podemos dar um jeito... podemos arranjar algo pra você,
sem que precise passar por essa bobagem toda de entrevistas.
Suspiro, ansiosa e tensa.
— Já passei na entrevista — resmungo e minha irmã faz um muxoxo. — Além disso, não
quero sua piedade.
— Não é piedade, Cathy, nós somos família. Você não precisa arrumar um emprego... você
já tentou isso.
— O abrigo de animais não conta, só durei dois dias lá.
Ela suspira pesado, porque é verdade, durei exatos dois dias no abrigo de animais e
praticamente fui expulsa depois de xingar um sujeito que queria um pet que fosse exatamente
igual a uma planta de plástico e não desse trabalho algum. Odeio gente cretina, ainda mais
quando dizem que devemos educar os cães e as crianças com disciplina e pancadas.
— Vamos, Cathy, você já fez tanto por mim, deixa eu fazer algo por você.
E, simples assim, minha irmã liga um bendito interruptor dentro de mim, aquele que faz a
minha determinação bater o pé e ir até o fim.
— Preciso disso, Kathleen. Preciso mesmo disso — respondo e ela não diz nada por algum
tempo. Então eu continuo com minha argumentação. — Tenho que fazer isso por mim, do meu
jeito.
— Então só me resta desejar boa sorte.
— Obrigada, sei que vai dar tudo certo.
Não vai dar nada certo.
Tenho certeza disso quando o babaca a quem chamam de senhor Scott me pergunta se não
estou velha demais para mudar de carreira.
Primeiro que não fiquei tempo o bastante no abrigo de animais para chamar de carreira e
segundo que ele não tem nada a ver com isso.
Nunca é tarde pra começarmos de novo.
Além disso, eu vou fazer trinta e dois anos, não é como se eu fosse uma centenária nem
nada assim.
Quem precisa de três idiomas e meio para buscar café puro e amargo e sanduíche de tofu
defumado? E quem é que come esse negócio? Credo!
Dou uma boa olhada no sanduíche, tendo certeza de que é o tipo de coisa que um protetor
dos animais comeria, e isso eu poderia respeitar, mas Landon Scott não faz esse tipo. Na
verdade, sua cara emburrada me faz pensar que ele é o tipo de cara que chuta os animaizinhos
indefesos que cruzam o seu caminho.
E se for esse o caso, talvez ele descubra que todo mundo tem um lado bom e um lado mau.
No meu caso, o meu lado mau pode ser um pé no saco.
Bato na porta da sala dele e entro.
— Com licença — falo, colocando um copo de suco e o sanduíche em um aparador, perto
de uma garrafa de whisky caro.
Landon ergue os olhos do computador e me focaliza. É a primeira vez que dou uma boa
olhada nele e acabo prendendo minha respiração. O homem é a versão empresarial de um Deus.
Grande, com os cabelos cheios e bagunçados que contradizem a imagem metódica e arrogante. A
barba grossa envolve um maxilar marcante e um lábio inferior carnudo onde uma garota poderia
se perder.
Os olhos escuros escondem alguma coisa e apesar de ele me encarar com uma expressão
carrancuda, com uma curvinha bem entre as sobrancelhas, é, sem qualquer sombra de dúvidas, o
homem mais marcante e sensual que já vi na vida.
Isso deveria ser proibido, é muito difícil odiar o chefe quando ele é uma parede de
músculos com um rosto astuto e perfeito. É praticamente um viking de origem turca.
Com o corpo pegando fogo, eu solto o ar com força e me controlo para não acabar dando
mais uma boa secada no grandalhão rabugento.
— Você escutou? — ele pergunta e eu volto a mim, engasgando com um susto.
— Desculpe, o que disse?
— Você sempre desliga assim do nada? — Landon pergunta, com uma atenção
perscrutadora que é quase invasiva.
— Não, só estava pensando se esqueci de alguma coisa... — minto descaradamente, mas se
ele percebe, não deixa transparecer.
— Você esqueceu o café, me trouxe suco.
— Ah, não esqueci, fiz uma troca estratégica — declaro, sabendo que ele não vai gostar
nada. — Suco natural tem vitamina C e o açúcar da fruta vai trazer energia para manter o ritmo
de trabalho. Ao contrário do café, que dá um pico de energia e depois rouba sua atenção e
humor.
— Mas eu pedi café — ele retruca.
— Café em excesso causa úlcera. — Cruzo os braços na frente do peito. — Ainda
mais em alguém estressado.
— Não sou estressado — ele resmunga, contrariado.
— Você quer dizer que não é pouco estressado e sim muito... — rebato, sem pensar duas
vezes, e me arrependo no instante seguinte, apertando os lábios para me impedir de continuar
falando.
— Tome cuidado com suas palavras, senhorita Pierce, eu sou seu chefe.
— Exatamente. E meu papel é zelar por você, não destruir sua saúde o entupindo de café
amargo e forte.
— Essa decisão não é sua.
— Mas você não pode me obrigar a compactuar com o seu plano de acabar com a sua
própria vida aos poucos... — Penso por um instante e então me viro, colocando minhas mãos na
cintura e o focalizando bem nos olhos. — Não me diga que você fuma também? Me recuso a
trabalhar com um suicida.
— Como é? — ele pergunta atônito.
— Você fuma?
— Não.
— Ótimo, então está tudo bem — respondo, saindo da sala.
— De onde foi que você saiu? — ele pergunta mais pra si mesmo, mas como não sou do
tipo que segura a minha língua, eu me viro com um sorriso no rosto e respondo.
— De um abrigo de animais.
Isso só pode ser uma brincadeira de mau gosto, uma conspiração entre minha avó e
Alexander. Não tem outra explicação.
A secretária atrevida mal começou no cargo e já me retrucou várias vezes, trocou meu café
por suco e ainda me chamou de suicida.
Aperto o botão do elevador, mas antes que a porta abra, vejo Catherine vindo na minha
direção, numa corridinha engraçada que a faz parecer uma pequena maratonista.
— O que eu digo se perguntarem por você? — ela solta um gritinho, acenando. — Segura
a porcaria da porta, preciso falar com você.
— Fecha. Fecha. Fecha. — Aperto o botão de fechar a porta do elevador, torcendo que a
tecnologia do edifício seja mais rápida do que minha nova secretária.
A porta está prestes a se fechar completamente quando vejo a mão pequena de unhas pretas
atravessando. A maldita porta se abre por causa do sensor de movimento.
Engulo um suspiro impaciente quando a vejo cruzar os braços na frente do peito e empinar
o queixo na minha direção, encostando-se no metal frio e impedindo o elevador de me tirar do
alcance de suas respostas atrevidas.
— Então, o que eu digo se perguntarem por você?
— Diga que eu morri — crispo irritado.
— Tá bom. — Ela dá um passo para trás, deixando que a porta recomece o processo de
fechar.
Algo no olhar diabólico que ela me dá, apenas um instante antes de eu ficar fechado no
elevador, me diz que ela vai realmente dizer que eu morri.
Preciso dar um jeito nessa criatura antes que acabe ainda mais com o meu dia.
Assim que paro no andar do RH, os recursos humanos, todos os olhares se voltam para
mim. É claro que eu já vim aqui antes, especialmente para gritar com Alexander e obrigá-lo a
demitir minhas secretárias, então, é basicamente isso que todo mundo espera.
Sigo até a sala dele e não espero que a secretária me anuncie, na verdade, o olhar que ela
me dá é de medo puro e não faz menção nenhuma de se mexer para me impedir de passar.
Abro a porta num rompante, pronto para explodir.
— No que diabos você estava pensando? — pergunto e congelo no lugar ao ver quem está
sentado na frente dele.
Quem está sentada.
— Vovó — falo, engolindo em seco.
— Landon, querido, já ia subir para vê-lo...
Vou até a minha avó e ela se levanta, passando os braços ao meu redor e me puxando para
um abraço exagerado. Do jeito que ela sempre gostou.
— Você está lindo como sempre — ela diz, segurando meu rosto entre suas mãos. —
Mesmo com esse vinco entre as sobrancelhas.
Ela toca a linha tensa entre minhas sobrancelhas e eu sorrio, desconcertado. Minha avó
sempre foi espontânea e viva, sempre disse o que pensa e nunca mediu esforços para cuidar da
família. Ela sabe bem como me desmontar e não precisa de grandes gestos para isso.
— O que aconteceu? — ela pergunta e eu desvio do seu olhar inquisitivo.
— Não aconteceu nada.
— Você sempre mentiu muito mal, querido, fale, o que há de errado?
— Minha secretária é... irritante.
— Mas ela acabou de começar... não é possível que já tenha cometido algum erro... —
Alexander fala e minha avó alterna entre o olhar divertido do seu homem de confiança e o meu
olhar contrariado.
— Ela trocou meu café por suco e disse que não é minha babá.
Alexander solta uma risada barulhenta que me faz bufar.
— E você veio fazer queixa dela como uma criança que reclama da babá por não fazer suas
vontades? — Minha avó me encara com uma expressão impaciente.
— Eu vim avisar ao Alexander que deve demiti-la imediatamente.
— Ah, que ótima notícia. — Vovó abre um sorriso grande. — Quer dizer que decidiu tirar
um ano sabático para descansar e desestressar? Está pensando em viajar?
— Não vou tirar sabático nenhum — resmungo.
— Então não vai demitir a moça — vovó é incisiva.
— Essa deveria ser uma decisão minha, vovó. A senhora está querendo me castrar nos
negócios?
— Meu querido, se o problema fosse o seu... — Ela olha na direção dos meus países baixos
e sorri. — Eu ficaria feliz de resolver, mas o problema é o seu temperamento ruim.
— Vovó...
— Escuta, Landon, sofremos dois processos por causa dos seus surtos, não vou permitir
que a empresa que lutei para construir fique marcada como um lugar ruim para mulheres
trabalharem. O único jeito de você demitir essa secretária é tirando um ano para descansar e
tratar sua raiva, do contrário, só se ela colocar fogo no prédio.
— Ela nem é uma boa secretária, acabou de começar e já implicou com meu sanduíche,
minhas coisas... — tento argumentar, mas minha avó não amolece o olhar.
— Trocar o café por suco pode ser uma decisão muito saudável, você deveria agradecer a
ela.
— Vocês só podem estar querendo me enlouquecer — resmungo e a minha avó me puxa
para outro dos seus abraços expansivos.
— Amo você, querido, só quero o melhor pra você e nossa família.
— Vou acabar ficando maluco.
— Espero que sim.

[1]
Nossos homens em espanhol.
[2]
Lindo em espanhol.

You might also like