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José Luiz Fiorin (org.) Introdu¢Go & Linguistica Il. Principios de andlise lef oe Estudos do discurso Diana Luz Pessoa de Barros 1. Semidtica discursiva todiscurso, ou seja, no seu ni texto e do discurso, com seus prineipios teéricos e metodo! pectivas diversas para seu exame. Hi, porém, um ponto de vista comum nesses caminhos dos estudos ¢ da palavra ou da frase e se preocupa com a organiza¢zo global as relagdes entre a enunciagio e o discurso enunciado ¢ entre o discurso enun« do € 0s fatores sécio-historicos que © constroem. Entre os diferentes estudos do nivel discursivo, serd examinade neste cay a porspectiva da semiética discur sa. He , neste Tivro, o ponto de vista dos estudos pragmiiticos, tratada em outro capitulo, No primeiro volume desta série, dedicado aos objetos tedricos dos estudos ‘um dos capitulos, elaborado por Luiz Tatit (2002 discursiva, Partiremos desse texto, pata que milo precisemos retomar as sremos um pouco mais sobretudo « no a palavra ou a frase, como seu objeto ¢ procura explicar os sentidos :o que. texto diz, e, também, ‘ou sobretudo, os mecanismas e procedimentos que constrorm os seu . 188 introdugso & Lingusticat Esses mecanismos ¢ procedimentos sto de dois tipos: a organizagio tica e discursiva do texto ¢ as relagdes com a sociedade e a hi palavras, o texto se organiza e produz senti to de significagto, ¢ também se constréi na relagto com os demais objetos culturais, pois es em uma sociedade, em um dado momento histéricoe € determinado por formagdes ideol6gicas especi fr ico-discursiva ¢ pelas determinagies sécio-histéricas, econstruido, portanto, por dois tipos de mecanismos ¢ de procedimentos que muitas confundem ¢ misturam, 0 texto, objeto da semi u, ainda, um texto em que se sincretizam diferentes expresstes, como nos quadrinhos, nos filmes ou nas canges populares. 2. Procedimentos lingUistico-discursivos A teoria somi6tica procura, portanto, explicar os sentidos do texto, Para tanto, vai examinar, em primeiro lugar, os mecanismos e procediment plano do conteiido. © plano do conterido de um texto &, nesse e850, metodologicamente, sob a forma de um percurso gerativo. 2.1, Percurso gerativo dos sentidos A nogiio de pereurso gerativo pode ser resumida como segue: a) 0 percurso io nivel, o narrativo, organiza-se a narrativa do ponto de vista . izagiio, ue completam 0 enriquecimento ¢ a concretizagio semantica jé mencionados. Estudos dociscuso 189 Na letra da cangao infantil A Gatinha, de Luiz Henriquez, Sérgio Bardottie Chico Buarque (1980: 41) pode-se observar como sto concebides o pereurso gora- tivo do sentido ¢ suas trés etapas. Todo ovo que eu choco de novo, ‘Todo ovo éaclaa doves. Mas fiquei Dlogueada agora de noite 6 oho por anos de choco ‘dei-he uma bicada fel mais abstrato ¢ simples, o das estruturas flndamentais, os senti- slo entendidos como uma categoria ou oposigdo seméntica, ct © considerados atraentes ou eufiricos ¢ rep) 2. negados ou afirmados por operagdes de uma sintaxe elementar; 3. representados visualizados por meio de um modelo ligico de relagdes denominado quadrado semidtico. 190 Introducdo. Lingiistica H ica fandamental & liberdade vs domi- nago (exploragao, opressao), que se manifesta no texto de modos diversos, mas que “resume”, de forma simples e abstrata, 0 contetido geral do texto. O termo liberdade & determinado como eufvrico © dominaedo como distéri- a, ou seja, no texto em questi, aliberdade é atraente ¢ a dominagtio, repulsiva, Em A Galina, a categoria sem: ‘As operagdes de negacio c afirmago no texto levam ao percurso que segue: (afirmaca0) (negagao) {afirmagao) dominagio > —ndo-dominago | > _liberdade (disforia) (niio-disforia) (cuforiay Cabem aqui trés observagdes: trata-se de um texto euforizante, ou seja, que vai da disforia & cuforia, isto €, de um texto que “acaba bet i mente de um termo (dominago) ao outro (liberdade), & es de negagio ¢ afirmacdo; a categoria férica, euforia vs disforia, relaciona-se com a categoria tensiva, tensio vs relaxamento, ou seja, @ sensagao de euforia corresponde & passagem & continuidade do relaxamento, ¢ a de disforia, & passa- gem a descontinuidade ou separagio tensa, como sera mais bem examinado no nivel narrativo. A anilise efetuada do nivel fundamental de A Galinha pode ser visualizada no modelo abaixo do quadrado semistico: liberdade euforia relaxamento nio-liberdade sndo-dominagio mBlocenfcla, ee eee no-disforia retensio distensio ee termos c termos c Se o texto examinado segue o percurso repr pela seta, podem-se prever outros textos que fagam 0 percurso contririo — liberdade > nfo-liberdade > dominagao—, como, por exemplo, em alguns textos sobre os indios brasileiros =, ou que determinem dle modo diferente os termos is categoria ~ liberdade como disfirica ¢ tensa, desde que sindnimo de bagunca, confusfo, desordem, e domi- nagio como euférica e relaxada, quando entendida como ordem e regra. Estudos do dscuso 191 ‘A segunda ¢tapa do percurso & a das estruturas narrativas. A conversio do nivel fundamental a0 narrativo pode ser sintetizada em trés pontos: 1, introdugo do sujeito ~ em lugar das operagdes logicas fundamentais, ocorrem transformagdes narrativas operadas por um suj as categorias seménticas fundamer io “inseridas” nos objetos com que lornam-se valores do sujeito € 3. asdeterminagées tensivo-foricas fundamentais convertem-se em modali- ‘zagies que modificam as agbes € os modos de existéncia do sujeito suas relagdes com os valores. ppatrdo opeta a transformagao que pie 0 sujeito Jo ea propria galinha realiza a ransformago que qual a galinha se ria de um sujeito em busca de valores. Para silo eles inseridos nos objetos. Os objetos, 10s valores e em busca desses valores deseja- portant, ¢ interferem um no outro. Assit, 0 conto popula ia de um menino e de interessados na bota de sete Léguas. ada uma das narrativas desdobradas tem uma organizag2o candnica em que tr8s percursos se relacionam por pressuposigao: 0 percurso da manipulagio, © da agto ¢ o da sangdo, sendo que a sangio pressupde a ago que, por sa Podem- angio. No sero mais bem desenvolvidas. lagi, um destinador propde um contrato a um dest) . aceitar o contrato ea fazer 3, Por sua vez, intenpre 192 introdugde & lingiisiea Estudosco ccuno 193 No percurso da sancio, o sujeito da ago procura convencer o seu destina- Resta ainda mencionar, no nivel narrativo, a questo do percurso passio- dor de que cumpriu o contrato, féz.0 que dele se esperava e que merece, portanto, nal que modula a organizagao narrativa. O percurso passional é, de forma ‘uma sangdo ou julgamento positivo. O destinador vai, ent, sancionar positiva ou ‘muito simplificada, uma organizagio de modalidades tais como © querer, © negativamente o sujeito da agdo, reconhecendo-o como cumpridor ou nao do con- poder, 0 crer e outras, que produzem efeitos de sentido de paixGes na narra- {rato estabelecido e atribuindo-Ihe uma recompensa ou uma punigio. tiva, Sio efeitos de amor, de Odio, de satisfacao, de tristeza, de confianga € EmAG ido.em duas partes (da linha 1821 ¢ da assim por diante. Essa organizacao de modalidades ¢ deter Finha 22 4G cada uma delas com um: tinuidade do percurso das paixdes. Dois tipos de efeitos de ss ‘a primeira parte, comecemos pela sangiio Esti velha, te perd6o, tu em forma de canja. O destinador patrio gio realizou a ago prevista no contrato, ou seja, nfo bota 0 que faz dela uma mé galinka ou uma galinha relagio a outros st pouco séria, que, portat srece ser punida (virar canja). “Em A Galintha, 0 texto mostra a infelicidade e a tristeza da galinha com a [A sanedo prossupde assim a ago de botar e chocar ovos, a ser realizada pelo ago rotineira de botar ¢ chocar os ovos-— Todo ovo que eu choco me toco de novo. sujeito galinha, e a manipulagao do destinador patrdo, que estabeleceu um acordo ‘Mas fiquei bloqueada e agora de noite s6 sonho gemada—, ‘com o destinatirio gafinha, para que cla a em relago a0 destinador que, mesmo depois de anos de a manipulagao, suas jas de persuasio ¢ de interpretaeao ou 0 contrato dela i ecorrente, mas sem a pressuposisio desse acordo no & possivel entender o texto, uma bicada e fugi, chocada—c, finalmente, a esperanga de Felicidade c confianga ‘A agiio aparece no texto de das formas: como da de botar e de Em outras palavras, uma galinha aparentemente satisfeita ¢ confiante com sua “vida de galinha”, torna-se infeliz com a rotina de botar ¢chocar ovos ¢ dar lucros, decepciona-se com 0 patrio que nflo aceita e pune scus anseios de liberdade, re- vvolla-se com a punigdo e passa a esperar que, com a liberdade, poss tornar-se realmente feliz No nivel discursivo, a ultima etapa do percurso gerativo do sentido, a nar- rativa vai ser colocada no tempo no espaco, 0s sujeitos, os objetos, os destina- | je objeto, ou seja, de de, tristeza, ete pela aquisigaio ou niio dos va~ es de confianga, decepeao, desconfianca, divida, em lente para a agto de botar e chocar ov0s, no caso teria dre ¢ os destinatirios da narrativa, ou seja, os actantes, vio tornar-se alores do cat, por idade ou bloqueio psicol6gico, 0 que tornow discursd Bragas a investimentos semanticos e de pessoa, 0s valores dos abjetos “fo ser dissemiados como temas e transformades, sensorialmente, em “Em A Galinha, varios procedimentos so empregados nessa discursi ‘do e produzem efeitos de sentido também diversos, embora todos eles fabrieatailusto de.verdade ©" Em relagio & categoria de pessoa, t's procedimentos foram empregados: projetou-se o diseurso em primeira pesso: 0 de subjetividade a Galinha que conta suas mazeles; projeton ; ra pessoa (A sa producio alarma 0 patrio) ¢ obteve-se 0 € dle que em qualquer lugar em que haja patrfo, e nfo apenas naquele escassa produgao causa alarme; deu-se a palavra, internamente, 20 patrdo,e (9, produzindo a ilusio de realidade, de fato acontecido ( 1a granja em forma de canja”). dois sujeitos aca o tempo, foram usadas também duas estratégias: o present iberdade no o efeito de proximidade da emunciaglo, com o seu passado (antes do p — dei-Ihe uma bicada e fugi chocada — ¢ 0 seu futuro (depois do presente impossivel a realizaglo de ago t ria vas sto sempre desdobrades, polemi- a aquisigio de liberdade peta dade do patrio¢ vice-versa, jé que 0 patrao perdéo tw <0 da galinha, S40, po! laque a concepgao do seja exatamente 194 intiodug&o & Lingdistico t cantar 0 presente gnémico, que produz 0 efeito de atemporalidade ou de eter- nidade, usado para criar a ilusdo de verdade geral eatemporal, como nos provér- bios (A escassa produgao alarma o patrdo). No espago, a io do tempo e da pessoa, niio se busca 0 efeito de proximidade da enunciago. © ponto de referéneia do espago € um a granja/ ‘meu pais, do qual a galinha foge. A Galiaha ¢ um discurso temitico-figurativo, pois desenvolve uma ou mais dade ov da dominagio e explorago do animal domés- tico pelo homem; b) tema socioeconémico do trabalho, que se mostra claramente em termos como produgo, patrao, férias, e que faz o texto dialogar com filmes como Os tempos modemos ou A classe operria vai ao paraiso; ©) tema socioeconémico da divisfo do trabalho entre homem e mulher e da domina¢o do iiomem, cabendo & mulher 0 trabalho rotinei tem crista (na crista da onda), @ galinha apenas cacare} 4) tema politico, da opressio politica no periodo da ditadura militar no Bra- 10s clara das leituras, desencadeada pelos versos finais pois um a mais 36 Fiz is feliz a grande gaiola do meu pais. Asleituras abstrata ss esto cont es ordens sensoriais, mas que criam as ovo, chocar, clara, gemada, granj dominagao e a liberdade usam tragos sensoriais diferentes: dominagao visual barmoniose (cantar) claro (anda, alt, yerial (rs auditivo (rst da ond) “ove, gemads) Estudosde discuso 195 que nos varios temas organizam coberturas figurativas também diferentes, fo da dominagdo ocorre como cacarejar na ico, como choro de crianga, na da mulher, como ruido rotineiro das maquinas da fabrica, na do trabalho, ou como silénci Serio a seguir examinados mais d ceursivo do percurso gerativo do sentido 2.2. Nivel narrativo: A partir sobretudo das propostas de Vladimir Popp (1970) ¢ da concepyio do texto como uma cena espetacular, a semiética desenvolveu seu modelo de or- ganizago narrativa, de que vimos, rapidamente, no item anterior, o esquema nar- rative canénico. Vamos agora examinar com um pouco mais de vagar e de deta- thes cada um dos trés percursos que compdem o esquema narrativo: percurso da ‘manipulago, percurso da ago, percutso da sancfo. Antes, porém, deve-se observar que cada percurso é constituido por uni- dades clementares mais simples, os enunciados narratives, organizados hierar- quicamente. Da organizagao de pelo menos um emunciado de estado ¢ um enunciado de transformagio surge 0 ‘Vejamos como a to que segue, uma not ograma narrativo, a unidade funcional da narrativa, isar esse espeticulo narrativo, ainda incompleto, no tex- de revi ini Sania cng do ett pn sme qc sad, na wo pum esperava numa moto. (VEIA, 24 de maio de 1995), 196 Introduce & Ungoisice A andlise do texto mostra varios enunciados narrativos organizados em pro- gramas: a) um enuneiado de estado de conjungio: o sujeito Vilamir esté em con- Jungto com o objeto relégio, }) um enunciado de estado de disjungao: 0 sujeito dois bandidos est em disjungo com o objeto selBgio, ©) um enunciado de estado de conjungio: 0 sujcito Vilamir esti em con- Junge com o objeto vids, 4) um enunciado de estado de disjungio: 0 sujeito Vilamir est em dis- jungao com 0 objeto vida; ©) um enunciado de transformagao em que o sujeito dois bandidos procura ‘ransformar sua relagao de disjungao com 0 objeto reldgioem relagao de ‘conjunc; ‘) um enunciado de transformagio em que o sujeite dois bandidos procura ‘ransformara relagtio de conjungao do sujeito Vilamircom 0 objeto rel6- ioem relagio de disjungio; (0 dois bandidos transfor- ir com 0 objeto vida em cenunciado de transformagiio em que 0: ma a relagio de conjungio do sujeito relago de disjuncao. Algumas conelusdes so possiv sobre os emunciados de estado, 9s bandidos transforma estados 10 (em fe g) ¢ estados de disjunga0 1) os enunciados de transformac: ‘como no texto acima em que os de conjungiio em estados de ‘em estados de conjungao (em e); 2) 0 sujeito transformador, 0 que operaa transformagao no programa narra- tivo, pode scr realizado pelo mesmo ator que tem seu estado transforma- do (em e) ou por atores diferentes (em fe g); 3) os programas nartatives podem resultar em conjungdes ou disjuns¥es, ou seja, poder ser transformagées de aquisiglo (em e) ou de privagtio (em fe g); ico da narrativa, pois duas transfor quando 0 sujeito dois bandivtos iré dele privado. adquire 0 relégio, 0 sujeito Vil Os percursos do esquema narrativo, que serdo examinados a seguir, sto, portanto, organizagdes hierirquicas de programas natrativos, concebides, por sua ‘vez, como organizagées de pelo menos um enunciado de transformago que opera sobre enuneiados de estado de conjuneao ou de disjunga0. Estusgoscodkcuso 197 (0 porcurso da manipulagdo deve ser entendido, assim, em primeito lugar, mnsformagdes de estado, mas de tipo particular. Para diferen- coperador seré denominado destina- dore o sujeito dos estados sobre 0s quais ele age, destinatirio. sador prope a0 destinatério um contrato, um acordo, com o objeti- vo de transformar a competéncia io ¢ levivlo, com is jeito operador da transformagak alguma coisa. Para ver fazer, a poder ea saber lazer. Vejamos cada etapa do percurso de manipu- ago, a partir de um cxemplo, um trecho de uma fibula, A morte da tartaruga (1975) de Millér Fernandes: , mas logo como a iar abor 1 voeé acorda 0 su pai". Mas 0 menino nfo prometew um carrinho, um estar mesmo profundsmet ‘Omenino manipula a mae para que compense, dealguma forma, a sua perdae >, procurarfazé-lo parar de ais explicitadonotexto. papel de destinador, propde um contrato ao menino, come estinatirio. Para isso, ela vai cslabelecer uma relagao de comunieagdo ou de ma- nipulago (toda comumicagao é uma forma de manipulagdo) com o menino: vai procurar persuadi-lo de que ela € confidvel como destinador, ou sea, de que ela ‘vai cumprir a sua parte no acordo, ¢ de que os valores oferecerido no contrato interessam ao destinatirio ou sio por ele temidos. No texto, varias es- jas so usadas para a persuasito: + intimidagfo (Cuidado, sendo vocé acorda o seu pai los valores que 0 destinador acha jo teme e quer e\ + tentagio (A mae disse que compra 7 n que so apresentados evitar a bronca do pai ou a surra, ¢, no segundo caso, a querer fazer, para obter 198 ntrodugdo & tingiisica coutratartaruga, um carrinho e um velocipede. A competéncia ¢ assim um estado em que 0s valores dos objetos so moda tengo da mae é transformar 0 estado de disjungio do filho com o objeto de valor dever ou querer parar de ‘chorar em estado de conjungao. Na perspectiva do des comunicagao ¢ a transform: também um fazer, isto é, atari, nfo se tem apenas a recepeo passiva da acreditar ou niio nele e em seus valores: se espera. No texto em exame, a manipulagao nao por duas razGes: 0 menino interpretou que a me ndo era confide (jé prometera surras ¢ presentes, em outras ocasides e ndo cumprira 0 prometido) e/ou que os valores oferecidos no eram tio desejaveis assim (outra tattaruga, por exemplo) cou poderiam ser obtidos de outras formas. A manipulaeao pode ser coneebida, portanto, como um fazer-crer, que determina os valores em jogo, e como um fazer fazer, responsével pelas transformagdes e pelos sentidos da narrativa. ‘Cabem ainda duas observag6es: a primeira, sobre as estratégias de persuasdo ‘ou de fazer-crer empregadas pelo de bre a interpretacao exercida pelo dest dor ¢ em seus val nservar as mesmas relagdes de manipulagio entre mae: cexemplos as tentativas de uma mae, cm hora de releigao, de fazer 0 Se voed comer tudo, voeé vai ganhar uma bicileta no seu sniversirio,(tentagz0) Se voeé nto comer, vacé vai ficar de cas ‘Voce que & um menino tobi Diivido que voed sejacapaz de impar © prato. Voe® no &capaz, € muito pequeno ainda (provacagsoy destinador oferece valores que ele acredita Se, para tentar desejados ou temidas pelo destnatrio, para seduzire provocar, 0 destinador apre- ‘que lhe ¢ proposto (nos exemplos, ‘Um tltimo exemplo, de sedugdo, extratdo de publicagdo da Folha de Sto ~ Paulo de partes do livro Zélia, uma paixdo (SABINO, 1991, p. 128): pportava eam a distineao de um gentleman. Fosse o rer agartela eleva ars 0 quaro, Em vez aso, possou a elogi-la com requintes de dosura, em palavras que Estudos do discuss 199 ‘cram de mel, para a sua alma to carente de compreensioe alto, Ela slegava que estava pond, com mel. Que sua vida ultimamente era preo- Fimo homer em sua viduaperceber que ela er rio interpretou a persuasio do destinadore acreditou nele om seus valores (E realmente a cativou). Trata-se de manipulagao por seducio, ou seja, em que 0 destinador Bernardo Cabral faz uma imagem positiva do desti- que so oferecidos vax mostra também que, ago ser bem sucedik lador tem do manipulado (Foi prin Em qualquer dos tipos d de obedigneia ou de falta de © si0 desejados ou t ‘mentirosos (parecem, ma: a foi transformada pelo destinador, no per- rensformador do pereurso da agao. ‘No percurso da aco organizam-se dois programas narrativos, vistos do ponto de vista do sujeito da ago: um programa narrativo de performance ¢ um vo de competéncia. O programa narrative de perférmance & con- mia transformagao a junco em um estado de conjungo, operada por um suj 1mador que é realizado pelo mesmo ator do sujeito que tem seu estado transformado, Além disso, na perférmance o valor do objeto & um valor descrit narrativa, No texto do ass uma performance: pro lor relégio em estado de conjungao. 200 inkodugdo & LingSitica Todo programa de performance pressup6e um programa de competéncia. © jo como uma transformagio de um do programa de necessario para 10 desejado. No ‘um objeto-valor de luxo, um relégio que pareci lo, Assim, 0 sujeito dois bandidos teve se valor querer-fazer (as: jungio, ea transformacéo foi snsformar seu estado de estado de conjungio. principal da n ‘guma forma, sua parte no r0urso, © pereurso da sangdo, é aq ou a punigtio dai decorrentes. Na propaganda do Ban lei, tem-se claramente ump percurso de sangao exp! Estudos da dscurso 201 ‘Nesse antincio, a selegio de vélei esté sendo reconhecida como cumpridora de seu contrato com os brasileires, pois 0 vélei brasileiro se consagrou como um ‘como recompensa, o abrago, 0 carinho de todos ios, representados pelo banco, As duas fases da sangao esto bem mar- a ow de reconhecimento de que o sujeito realizou bem a acto & assumidos, a da retribuigo ou da recompensa que por isso ‘comum nos textos o sujeito da agdo exercer uma. para persuadir 0 outro a bem sancioné-lo. O texto abaixo, de outro ant riosa no jogo, ct corganizagao do esque’ dais, que definem diferentes e 1m os objetos de valor, Em outras proibidos (dever nfo nihecidos (saber set) ou ignorados (saber nfo ser). No texto de pregame Wore 202 introducaoa Lngoiticaw © poema de Manuel Bandeira Belo belo (1961: 147-148) oferece bons e- xemplos de modalizagio do ser e do fazer: el belo minha bela “Tesho do que nto quero No tenho nada que quero Quero a solidi dos pincaros A fgua da fonteescondida ‘A rosa que floresost Quero quer tanta coisa Belo belo Mas basta de leroreco ‘Vida noves fora zero (© pocma apresenta, no inicio (Tenho tudo que niio quero. Nao tenho nada (Ora, um sujeito 56 esté em conjungo com valores forem obrigatorios (dever set) © 56 esté jungdio com valores desejaveis se eles forem proibidos (dever no ser) e/ou impos- siveis (ndo poder ser) e/ou desconhecidos (ndo saber ser). © poema prossegue cexplicitando essas modalizagées pressupostas, ou seja, mostrando que os valores indesejaveis ou temiveis séo obrigatorios [Nao quero éeulo nem tsse [Nem obrigagio de voto que os valores desejaveis sio impossiveis: ‘Qucra a solide dos piacaros ‘A gua da fonte escondiéa ‘A rosaque loresceu ‘Sobre a escapa inacessivel Estudordodicuso 203 ‘A modalizagio do fazer aponta também um sujeito virtual, que. quer fazer alguma coisa para ter os valores desejados ou para cvitar os temiveis, mas que no pode ou sabe fazer: (Quero dara volta 20 mundo ‘86 num navio de vela ‘Querorever Pernambuco ‘Quero ver Bagdad e Cusco A organizagao passional da narrativa, conforme organizagio das modalidades da narrativa ¢ modula a ma texto o efeito de continuidade. A signifi que seestabelecem entre unidades deseon se poder ter os valores desejad que vai da saisfagdo e alegria relaxadas da real acreditar poder insatisfagao ¢ fr de realizagaio assim, efeitos de dade da tensioe mencionada, prod r, decorrentes dos arr t (brasileiros em geral ¢ banco) esti em conjungo com o valor do (vtéria, premio), portanto, realizado e satiseito (quer ser, pode cr que cle o pord em conjungao com os valores desejades mente ocorre: facaio e do amor. ‘Analisar as paixdes €, portanto, examinar os arranjos modais e 0s efeitos de Jos que produizem, ¢ as modulagdes da narrativa que criam a ilusao de con- lade o de suspensio de sentido dessas paixbes, 204 introducao 8 Ungiisica I 2.1.3. Nivel discursivo No nivel discursivo, a organizagao narrativa é temporalizada, espacializada « actorializada, ou seja, a8 agdes ¢ os estados narratives so localizados e pro- zgramados temporalmente ¢ espacialmente, ¢ 08 actantes narrativos so investidos pela categoria de pessoa. Além disso, os valores do nivel narrativo sfo dissemina- dos no discurso, de mock (0, sob a forma de percursos teméticos, que, por sua vez, podem ser investidos e concretizados em figuras. Em relago ao tempo, ao espago eds pessoas do discurso, serdo a apenas duas répidas observagdes, jd que a questio esta bem desenvolvida no capitulo dedicado & pragmética. ‘A primeira observago &a de que o tempo, o espago €as pessoas instalados no discurso dependem dos dispositivos de desembreagem, por meio dos quais 0 enuncia- dor do texto, a0 temporalizar, espacializar ¢ actorializar o discutso produc, também efeitos de sentido de aproximagao € cenunciativa, quando o efvito &e ‘pessoa eu, co tempo presente do agora e do espaco do aqui, ou enunciva, quando se to de distanciamento da enunciagao, com o emprego da terceira pessoa ¢ 05 textos que seguem: ra do TCU (Tribunal de Contas éa Us emoragio do cantendrio do nascimento (Folia de 8. Paulo, 0702), (Monuel Bandera, 2. Oespago éodo xemplo, onascimento ea morte de Juscelino) ¢ um depois d a ado como o local da comemoracio. inte do espago da enuinciagao, figura Estudos do décuso 205 No segundo texto, ao contririo, as desembreagens sto enuneiativas: otem- po de referencia é agora, com o presente do indicativo, tempo de referéncia a partir do qual se organiza o antes (passado) ¢ o depois (futuro). A pessoa é a primeira pessoa ev. O espago nao esté explicitado, podendo-se recuperar 0 esparo do aqui. O discurso produz o efeito de proximidade da enunciagio e, portanto, de subjetividade, de envolvimento, ‘A segunda observago é a de que muito raramente os discursos apresentam ‘apenas um tipo de desembreagem e de efeito de sentido. O mais comum & que se misturem ¢ confundam os dispositivos, produzindo assim uma grande variedade de efeitos de sentido. Trés procedimentos sto os mais freqiientes, tal como estilo cexemplificados a seguir, com os “arranjos” das pessoas do discurso: 1a, desembreagem interna, que pode ser representada como voz, internamente, em primeira pessoa a um outro ator, como, por ex« texto que segue: ‘Dessa vez, chegue bem cedo tensa de Zé Cabala to cedo que ele dormindo, Bai palmase, depois do alguns instants, vi Gulliver Logo depois ele grit 'Nio, mestre, no 6 cara da cobranea ( grande guns recebeu-me de pijama e com os ofhosremslentos. (otha de. Paul, 01/01/02). iando pela festa da Esse tipo ce desembreagem procuz, no discurso, 0 efeito de realidade ou de teferente, pois reconstréi o espetaculo. © exemplo, por exceléneia, de desembrea- ‘gem interna é 0 de As mil e ume noites, b. desembreagens paralelas ou alternadas, representadas como 7~:: 0 dis- curso alterna, por exemplo, desembregens enunciativas ¢ enuncivas, como foi apon- tado em A Galinha (Todo ovo que eu choco ~ I" pessoa ~, A escassa produeio alarma o patrao ~ 3° pessoa). Bons exemplos sio A morte de Artémio Cruz, de Carlos Fuentes, em que um capitulo é em eu, um ¢m'tue outro em ele, ou Panta- edo c as visitadoras, de Vangas Llosa, em que se alternam desembreagens enunci- roduzido com desem- ‘a¢, sobre ela, como uma espécie de volta, ocorre uma embrea- em diferentes ocasides, disse: 0 inio candidat que nto se rendeu 20 poder dos bancos fi Garoinho. (Poth de 8, Paulo, 06/1072002. ‘Se hi alguém de mos limpas, esse € © Gatotinho, (Debate na Rede Globo, 03/10/2002) 208 —Inkoduedoé Lngtisticot [Nos exemplos acima, Garotinho produziu um texto em primeira pessoa, fui cur no primeiro caso, sou eu, no segundo caso, ¢ sobre a primeira pessoa, projetou a terceira pessoa ele, Garotinho. do espago e das pessoas do discurso, é necessétio, 3r qual foi o procedimento usado, ou seja, 0 tipo de desembrea- ‘ou se ocorre também embreagem, ¢ quais 3s revUSOS. 1940 ea figuratizago correspondem ao “enriquecimento” seman- 180 jd mencionado. Na tematizagdo ocorre a disseminagio no discur- i ivizagdo, esses tragos semanticos so “tecobertos” por tragos seménticos “sensoriais” (de cor, de forma, de cheiro, de s is nogio de isotopia-¢2-de reiteragao de tragos seminlicos que tomam o disen -amente coerente. Observer os textos que seguem ‘Agus [Nas praias do Nordeste, tudo padece ‘gue lavam area do liso edo vivo, (Joao Cabral de Melo Neto, 1975: 22) 0 samba do edueador doide ‘Uma prova inequvoca de ques assaciages corpoativas encaseladas no Estado brasileiro ‘ti acitando fim do mosiopdlio do sou poder ea adoga0 de um sistema multipart, sepultando eoncep96es to erGnicos essa entidade est dstribuindo aos professors universitirios do qual dofende exatamente aguilo que os so Vieticos esto enterrando com um enorme araso. (Esitril do Joma da Tarde, 09/0290) ‘A anélise da primeira estrofe do poema de Joao Cabral de Melo Neto mos- tra tratar-se de um texto temitico ¢ figurativo, ou seja, em que se disseminam os tragos seminticos abstratos dos temas e em que se reiteram os tragos semianticos Estudos do dscuso 207 “sensoriais” ou “coneretos” das figuras, criando no discurso uma ou mais isoto- _pias temitico-figurativas. Tomemos um dos temas possiveis, decorrente da dis sseminagio dos valores dos niveis fundamental e narrativo: 0 tema da vida softida, dificil, de lta do homem do nordeste brasileiro, que enfrenta.a seca, os0l, 0 calor, 1 falta de alimento. Repetem-se assim os tracos semiinticos de sofrimento (pa- doce, écidas para os olhos, carne nua, amoladas, Fumigando, desinfetante, lavam do vivo, ete) dificuldades (metal duro do céu, mar dure, peixe duro, mar citrico, etc), Esse percurso tematico, que costura, com as repetigdes. o texto todo, € re- coberto por um percurso figurativo, vento, arela, que usa diferentes ordens seisoriais (ti i ‘mento eas dificuldades sfo, assim, fi riais que seguem: ante, ofuscante, que fere @ os olhos, metal azulado, duraluminio, bri Misturam-se as ordens sensoriais, criando efeitos d tiagudo, o Acido e o brilhante-ofuscante, ou seja, 0 gos! ‘fusca ¢ ¢ cdo, a visio dura e dcida, Sio esses tragos do n ‘da praia que caracterizam, tino. O discurso tom, as ‘Osegundo texto, extraido de um ‘co, ou seja, em que a coeréncia semantica é dada apenas pela reiteraga0 do ‘No caso, o tema do atraso, do conservadorismo e do anacronismo dos professores universitirios ¢ de sua associaglo. Esse tema, abstratamente disscminado, reitera- do no texto, & concretizado, aqui e ali, por figuras ~ encastcladas, na contraméo, sopultando, enterrando ~, mas essas figuras ndo constituem no texto uma linha {sotépica, sto figuras ocasionais, esparsas, Pode-se dizer, assim, que hi discursos temético-figurativos, como o de Agulhas, apenas temiticos, como odo ‘editorial, embora, esses discursos tenham, em geral, figuras esparsas, pontuais. ‘Ainda sobre a figurativizagao dos discursos, deve ser dito que hi graus diferentes de figurativizagao. A tiltima etapa, a izagao, produz efeitos de realidade e de referente, como ocorre, por exemplo, na chamada pintura figurativa ‘ou na fotografia, em que reconhecemos figuras do mundo e que, por isso mesmo, criam a ilusio de “cépia do real”. No texto verbal, esses efeitos sio obtidos, entre ‘outros, pelo procedimento de ancoragem do tempo, do espago € datas, lugares e pessoas que 0 destinatério do texto reconhece como “reais”. Dai o recurso a nomes préprios, idade, profissio, no caso dos atores, dia, més, ano, hora, ‘minutos, para 0 tempo, local, enderego, em se tratando do espago, No texto que 208 Introdudo 8 Linguistica t explicou a desembreagem enunciva podem ser encontrados ancoragens dos trés tipos e os efeitos de realidade decorrentes: No iltimo dia 12 de setembro (ancora- ‘gem de tempo), 0 ex-ministro do TCU (Tribunal de Contas da Unio) Olavo Drum- silia (ancoragem de espago). Se © tro existe (tem nome e sobrenome) ganha realidade e credibilidade. ica isotopia ou serem pluri-isotépicos, como foi visto na andlise de A Gali sotopias de um discurso sao facil- ‘mente percebidas quando os textos rompem as leturas, como ocorre em geral nas piadas e, com has propagandas. Certos elementos, geralmente palavras do texto, funcionam, nesses textos de ruptura sobretudo e também nos literdrios, como conectores de isotopias, desde que a polissemia natural das pala- vas seja explorada: ‘No primeiro texto, a palavra adianta é usada em dois sentidos, produzindo dduas leituras: uma, redundante, que diz que reldgio que atrasa nfo adianta no tem- iroduzir um desencadeador de ixa mal em uma dada leitura tn tio, umn facad, No Fz nada di Viveram trés anos assim, da vez que Maria Flviraarranjava namorado, (Os amantes moraram no Esticio, Rocha, Catete, Rua General Pedr, Olria, Ramos, Ronsucesso, Vila Estudos codiscuso 209 fanqués de Sapuca, Niteri, Encantado, Rus vez no Esticio, Todos os Santos, Catumbi, Por fim na Rua de Constituigto, onde Misael, privado de sentidos ede intetigéneia, matou-a com ses ts, ‘ca poica foi encontri-laeaida em deetbito dorsl,ves- {ida de ongandi zal Uma primeira leitura 6, sem dvida, a do tema da traigio, um tafito machis- ta, em que uma mulher infil e mal-agradecida vai sendo perdoada por um marido complacente (Podia dar uma surta, um tiro, uma facada, Nao fez nada disso), até ‘o momento em que ele nvio aguenta mais e mata-a com seis tiros. O texto, porém, tem no seu final a frase vestida de organdi azul. Organdi é um tecido fora de moda hoje, transparente e engomado, préprio para saias franzicas e rodadas, babados lidades claras intes, de criangas e de primeira comunhio. Br esti, portanto, em desacordo tanto com her mal-agradecida, Esse desencadeador de isotopia nos obriga assim a reler o texto como a historia do desencontro entre uma mulher, jovem, a procura cde romance, de fantasia e nflo apenas de séguranga ¢ boa condigio de vida, e de um hhomem bem mais velho (com 63 anos de idadc) ¢ que no Ihe podia oferecer 0 romance ¢ a fantasia desejados (funciondrio da Fazenda). Observe-se ainda no texto um procedimento muito usado por Manuel Bandeira em textos © pocmas “extraidos” de noticias de jornal: 0 texto é fortemente ancorado em relagao 20s atores (nomes proprios — Misacl, Maria Elvira -, profissao ~ fancionério da Fa- zenda, prosttuta -, idade - 63 anos) e sobretudo aos espagos (Brasil, Lapa € os ingimeros nomes de bairros ¢ ruas conhecidos do Rio de Janeiro ¢ essa ancoragem ndo tem por fim produzir os efeitos de realidade e cre das iconizagdes, mas assume outros papéis na construgzo dos sentidos do 0, como vimos ocorrer com 63 anos de idade, por exemplo. 2.1.4. Além do percurso gerativo A semiética distingue texto e dis. 130 a iltima etapa da cons- trugio dos sentidos no percurso ger ico. F, nessa etapa que a signi- ficagdo se apresenta de forma mais concrete e complexa. O discurso pertence, — pportanto, ao plano do contetido dos textos. O texto, por sua'Ver-aisHMgUETE Uo Aiscusse porter Conteido (046 discurso) e expressd0. A expresso tanibemn se—J EuTSO que vai do mais simples a0 mais complexo. 210 introducaoé tingditice t © exame do plano da expressiio n2o deve, em principio, interessar ao estu- dioso do discurso, aquele que esti preocupado cm construir os sentidos de um (poesia e outros textos lista do discurso procurar estabelec etc), Nesses casos, deve novas que se constrafram ‘ga delas decorrentes. Vej de Guimarites Rosa, centre expressdo e contetido: ‘avia uma aldefaem algun lugar, nem maior nom menor, com velhos velhas que velha- ‘com uma fia verde inventada no cabelo. jndora-a, com um gest € um pote, & v6 que a amava, a uma ontra © quase {gualeihaaldea,Fita Verde part = "Vovorinha, que brags to may =f porque no vou poder nunca Mas o ave no estava ssl, sendo que demesiado ausene,@ no ser peo fio, iste eo repentina core, conto de Guimaries Rosa termina com fro, triste ¢ to repentino corpo, ‘ou seja, com a repetisto de um tipo de silaba (CCV ~ frio c triste), de consoantes sivas, sobretudo o [:], € com a passagem de vogais anteriores ou aguda ), sem praticamente usar a vogal [a]. No i ‘contrério, hé muita vogal aberta ent, estabelecer uma correlagao entre a silabas CCV ou a consoat expressiio e 0 conteiido no t Planoda —_sflaba CCV, consoante cexpressto do yogal agudaa grave Plano do cconteiio Essas relagées novas que se estabelecem entre expresso ¢ cor cchamadas pela semiética de relagdes semi-simbélicas. O semi-si {i jé apontado, oferece uma nova leitura do mundo, a.associar diretamente relagdes Estudos do discus 211 de som (ou de cores, de formas, ete, em outros tipos de textos) com relagdes de sentido e, dessa forma, sensibiliza os sentidos, isto & di som, cor, cheiro, gosto 08 sentidos. ‘As relagdes semi-simbélicas so, no fundo, relagdes entre ci 1uos e descontinuos ou como extensos intensos. plo, asilaba CCV ou a consoante {t] € as vogais, vogal aberta ss, da mesma forma que @ vida. de texto, o quadro de Van Gogh Os girass6is: Nele, estabelece-se uma outra correlagio: Plano da amarlo escwra, format expression sredondada _ Plnodo more conteido A determinagio pela continuidade vs descontinuidade ou pela extensio vs © amarelo escuro e as formas arrendodadas s80 morie, ¢ 0 amarelo claro ¢as formas pontiagu- forma que a vida, no texto de Van Gogh, ida que dura, enquanto a natureza morta de Van Gogh aponta 0 carter transitdrio e passageiro da vida. Em ambos 0s casos, houve uma sensibiliza- «0 dos sentidos pelo som, no primeiro texto, pela cor e pelas formas, no segundo. 212 Intreducdo a Lingtisica 2.2. Relagdes com a sociedade e a histéria Como vimos no inicio deste ca sentidos de um texto so de dois lo, os procedimentos que constroem os 1s procedimentos lingiistico-discursivos dade e a histéria, exame das relapses i textos com que dialogam. J4 mostramos, um pouco, Resta agora fazer algumas consideragBes sobre os bbelecem com outros textos, Em tiltima instincia, um texto dialoga com todos os outros textos em tem- pos cespacos diferentes, o que invia levada a ferroe a foz0, ‘a analise de um texto e & construgiio de seus sentidos, A analise de um texto s6 se tore possivel se fren reconheids its pontos: |. podem-se fazer recortes no cont alguns dos didlogos entre os textos, c logos que os textos esta- recortes do contexto podem ser efetu 3. mas, a0 mesmo tempo, no hi infinitas poss decorrénecia, de leitura de um texto, por duas razbes principais: o texto .o-discursiva coercitiva, que limita as lei- is, 0 texto traz pistas de certos recortes do contexto sécio- ‘a certas diregSes, o que testringe também as possibilidades verde no cabelo, de Guimaraes Rosa, j6 ce assim por diante. s didilogos de um texto com outro texto, de Estudosdociicuso 213, texto para com cle concordar ou dele discordar. Desse modo, se nos primeiros parigrafos do conto de Guimardes Rosa observa-se, como foi apontado, um did- Jogo de conformidade narrativa e discursiva com Chapeuzinho Vermelh ‘desenzolar notam-se desconformidades ¢ discordancias, O conto infant ~zinko Vermelho desenvolve sobretudo o tema da obediénei sentidos também nesse didlogo com o conto infantil, narelacdo infantil ea perda da inocéncia, operada pelo lobo-morte. Outros; novos elementos da insergao s6cio-histérica do conto de Guimariies Rosa, ¢ tam- ‘bém outros elementos de uma andlise semiética do discurso, Exercicios 1. Examine 0s tipos de manipulagZo do texto que segue. Explique 0 que voce entende por manipulagio, se ela funcionou ou nao no texto, ¢ quais as razbes do seu sucesso ou de seu fracasso, bandos o levaram para um matagal, onde 0 execu «i, o banda explienu por que matou o dentists amigos. Se folgnm comigo, 0s colega vo me gozat”. (EIA, 2490571999). 2. Aponte os percursos de manipulagao no texto Terezin (1980: 85-86). Explique. », de Chico Buarque luouxe um broche de ametsta re contow suas viagens (© segundo me chegou ‘como quem chega do bar taouxe um iro de aguardente 214 3. Mostre, no texto de literatura infant Introdugbo & Uingtisiea so amorga de tragar ‘ndagou o meu passodo ‘ebro minha comida ‘vaseulhou minha gaveta re chamava de perdida rie encontou to desarmada ‘que arranhou mew cora520, ‘as nao me enttegava nada ceassustada eu disse "n20”. (teres me chegou ‘eomo quem chega do nada cle nfo me trouxe nada também nada perguntou smal sei com cle se chara ‘mas entendo 0 que ele quer se deitou na minha cama ceme chara de mi foi chegando sorrateiro ‘quoantes que eu dssesse “no” ‘3 instaloa Feito poseiro entro do meu corago, Chapeuzinho Vermetho (GRIMM, 1989), pars ai fe Ho bem que a pequena no queria usar nenhuum outta por isso a chamavam de fama e estragaro boo, E a pobre da aver ‘eno te ponhas, primero, aol Vermello. erea de meia hora da vila. Quando cutisa, pelos eantes, ce fraca, ara jue CChapeuzinho Vermelio, onde ~ A um quart de hora aqui pelo bosque adento. A eas fea embsixo detrts grandes arvalhes i splicou Chapeuzinho Vermelho snsou: “Esta menina gordinba, macia, ¢ na cela, umn bocade saborosa, Sstudosdo dicuso 215 ‘Continvou andsndo por algum tempo 20 lado da meninae depos disse: — Chapeuzinho Vermelho, repara nes que fo ds uma olhads? Acho {que nem extis ouvindo o belo canto ‘Caminhas to compenetrada como se fosses para a escola, quando hi tanta diversdo aqui no bosque. ‘Chopeuzinho Vermetha levantou os olhos e, 20 ver dangar 0s ros do sol por ence as Jrvores etudo.em toro cheio de lindas flores, ponsou: “Se eu evorumramo Aavozinha, Ihe edo ainda e ehegaze a tempo”, E afastow-se do caminbo para entrar no de flores, Quando colhia ums, pa casa da avorinhae bate & porte. = Chapeuzntio Vermelho, que tz bolo e vino para ti. Abre! =E 35 toreeres 0 trnco — gritouaavozinha ~ estou milo fraca © no p ru 0 trineo @ a porta se abu, Sem dizer uma hae, do uma s8 vez, a devorou. Depeis, enfic ‘emeteu-sena cama, dessendo as cominas. Enquanto iso, Chapevzinho Vermclho coria atrés das flores e, depois de ter colhido tantas que ji nem podia eategé-as, lembrow-se da avozinba e refomou o caminho de sua quando entrou, tove uma sensagdo estan que a tad, eu que sempre me snto to bem em easa da spresentando um aspecto muito esquisto, ~Avorinha— ~ como esto grandes as tus orlhas! = £ para te ouvie melhor! = Avozinha, como estdo grandes 0s ex olhos! = E para te ver melhor. = F como exo grandes 35 tas mos! = E para te pegar melhor. = Mas, avin, que boce mais horivel fone, meteuse, novamente, na cama, adormeceu € comeyou a roncar. Pouce depo%s Um cogadr que passava pot ali, pensou: " Come sonca a velha senhora! Vou dar uma olhada para ver sees se sentndo bef”. Entrou no quacto e, ao aproximar-se da eam, vit 0 lobo ‘ent foralecka. A menira, estrada quando minka mBeo i 216 —inkredugood Lingtistico 1 4. Faca uma analise da agao narrativa no texto de Chico Buarque, A Rita 18), Em seguids, aponte alguns percursos passionais: ‘No sorriso dela, mew assunto Acrancou-me do pits E tem mais: Levou seu rerato Seu tape, eu prato, (Que papel! ‘Uma imagem de Séo Francisco ‘Um bom disco de Noe! ‘A Rita maton nosso amor ‘De vinganga nem heranga deixou ‘Meus pobres enganos (Os meus vinte anos © men comeio Eolém de wwdo Me deixou mado © vialdo 5. Analise os percursos de sangao da noticia que segue. Observe também os per~ bend que 0 ‘possuia uma arma, Viana earregava um 38 mum cokére amarrado & 1, 9.calgaselevantoue f revélver apareceu por cima dt mein. © bandido ficou iitado. “Voe® mentin para mim” ‘ritou, avangando sobre o comersiante. Viana sacoue disparos cinco trs ido tame ‘sof, o corpo eaido em cima do fiho, Morea (EIA, 24 de maio de 1995) 6. Napiada que segue, 0 na perspectiva da semi Dis pebes upoiados numa cere: = Voce acreita na reforms apria? ~ Fu io, mas meu compade que jé endow de disco voudor aredita 1e vod pode dizer sobre o fazer interpretativo e 0 crer, ” 7. Examine os programas de competéncia e de perfrmance no texto abaixo: a histéria de um galo chamado Rei ~ lindo de morrer— que um dia flea lou pra Langar vida de galo, Ele morava aum galinheio com quinze gainhas, mas ele era um eara muito Extucosdo dicuso 217 {al centto achavo que era galinha demas pra um galo sé Pacontar a verdae, ele viva até ‘umbocado sem eito de ser cafe de uma fami to esqusta assim. Eno cl resolve fugir do sliheiro. Masai di medo de toda 0 mondo fcat conta cle. F ent ele passa o romance ‘nrinbo naquela algo de foge, nto foge. Quando ehega bern no fim da histra, cle solve fo seguinte; 32 via dlc ra furad, cle inka mesmo que fugire pronto. E alee fog. (Lypia Bojunga Nunes, A bots amarela, 1983: 20) 8. 0 texto que segue produz efeitos de realidade ou de referente. Quais siio 08 procedimentos utilizados? sania de Drags, Xavier era um dos roprisdade de seu pi, x margeas do ro das Mortes, pero note premeture de seus pei, fol morat com um padbinio, o dentista Sebast Leite, e foi com ele que aprende o offcio de arancar dentes fazer proteses. Além da profssto, ganhow o apelid de Tiradentes, que fearia para o resto da vid, ‘9. Aponte no texto abaixo as diferentes projegdes da enunciagiio no discurso (de ator, de tempo e de espago) ¢ os efeitos de sentido que produzem: tempo. Pouco depois, new pai mori ‘mais novos, iste abundonado neste vale de ‘Na manha fia, inzenta © enevoada em que fiz Ste nos, mina mae me botow na mo do inka pobre mae, e seis inmtos por tua vida destino, Nao te dou um parao, te dou um mestre. Aprende com ele a ser gente e que Deus te abengoe. B, virando para o cego jf debulhada em lgrimas, conch "Eu dou, senhor, para seu criao. = Eu, senhors, 0 recebo para filo. (Edward Lopes, Tavess 1980:3) 10. Explique o que é um desencadeador de isotopias e um conector de isotopias em: GRAVE COM BASF e agus fbi (propaganda) No baralho da vida, pte por uma dama (Fase de pira-choque de camino) 11, Examine, nos versos que seguem, 0 estabelecimento de um sistema semi- [BU fago versos como quem ehora De desalento..de deseneano. Fecka 0 meu livto, se por agora [No tens motivo nenhum de pranto. (Carlos Prummond de Andrade, 1984) 218 Inkodugéed Ungtistical! Referéncias bibliograficas Sugest6es de leitura (obras de apresentagiio de conjunto da teoria semitica) panos, Diana Luz Pessoa de. Teoria do discurso. Fundamentos semiéticos. digo, Sao Paulo, Humanitas, 2002 (1* edigao de 1988). ‘A autora apresenta uma visto de conjunto da teoria, em que sto examinadas, entre outras questies, os processos de manipulacdo, a modalizagtio narrativa, a orga nizagao passional e as relagGes entre texto e contexto. Teoria semidtica do texto. Sao Paulo, Introdugio aos prineipios e métodos da teoria semi de andlise, 90. ‘com exemplos coneretos courris, J. Analyse sémiotique du discours. De |'énoncé d I'énonciation. Patis, Hachette, 1991. © autor faz uma boa apresentacdo dos fundamentos Enfase em questdes do nivel discursivo e nos pro«

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