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Reabilitação Psicossocial

Brasília-DF.
Elaboração

Rose Paula Fernandino da Silva

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário

APRESENTAÇÃO.................................................................................................................................. 4

ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA..................................................................... 5

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7

UNIDADE I
REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL................................................................................................................ 9

CAPÍTULO 1
A CRÍTICA AO MODELO MANICOMIAL...................................................................................... 9

UNIDADE II
O MODELO PSICOSSOCIAL.................................................................................................................. 23

CAPÍTULO 1
ATITUDE PSICOSSOCIAL........................................................................................................... 23

UNIDADE III
MODELOS DE GESTÃO......................................................................................................................... 46

CAPÍTULO 1
ARRANJOS ORGANIZACIONAIS E GESTÃO COMPARTILHADA.................................................... 46

PARA (NÃO) FINALIZAR...................................................................................................................... 61

REFERÊNCIAS................................................................................................................................... 63
Apresentação

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se


entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela
interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da
Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos


conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da
área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que
busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica
impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo


a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na
profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

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Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em


capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos
básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar
sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para
aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de
Estudos e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Praticando

Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer


o processo de aprendizagem do aluno.

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Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Exercício de fixação

Atividades que buscam reforçar a assimilação e fixação dos períodos que o autor/
conteudista achar mais relevante em relação a aprendizagem de seu módulo (não
há registro de menção).

Avaliação Final

Questionário com 10 questões objetivas, baseadas nos objetivos do curso,


que visam verificar a aprendizagem do curso (há registro de menção). É a única
atividade do curso que vale nota, ou seja, é a atividade que o aluno fará para saber
se pode ou não receber a certificação.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

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Introdução

O presente Caderno de Estudos e Pesquisa visa direcionar o aluno para uma leitura
no tema da “Reabilitação Psicossocial”. Este caderno reúne conceitos, abordagens e
referências nessa área em articulação com a Saúde Mental e o processo da Reforma
Psiquiátrica. Deste modo, temos aqui uma leitura de diversas disciplinas do saber e da
prática profissional que visam compreender e inter-relacionar perspectivas e métodos
de cuidado e tratamento em saúde, vinculados a uma prática social.

Nesse âmbito, apresentamos uma perspectiva da reabilitação psicossocial de modo


amplo e contingente, em consonância com a visão de um trabalho íntegro e integrado
na área da saúde – equipe, profissionais, usuários e gestores.

Atentamos para o fato de que esse caderno propicia um direcionamento ao aluno,


de modo que ele tenha uma referência de conduta e pesquisa na área, e que assim,
possa construir seu próprio caminho de estudo e aprendizado, e também de prática e
abordagem profissional em saúde.

Na primeira unidade, abordaremos a reabilitação psicossocial: A crítica ao modelo


manicomial, conceitos e fundamentos da reabilitação psicossocial, clínica ampliada.
Todos aqui visam uma compreensão e aplicação do tema abordado na área, de modo a
estarem articulados num processo de desenvolvimento e integração.

Na unidade II, vamos direcionar a compreensão dos principais conceitos e práticas


clínicas para o contexto social de um modelo, um posicionamento e uma atitude de
trabalho em saúde: Atitude psicossocial, o trabalho em equipe interdisciplinar, campos
e núcleos do saber e estigma e discriminação.

Na unidade III – unidade final – buscamos integrar o conteúdo e a postura de um


trabalho no campo da saúde coletiva com seus modos de gestão e organização na área:
Arranjos organizacionais e gestão compartilhada.

Para concluir nosso caderno – ou para (não finalizar) - apresentamos também algumas
considerações finais do tema reabilitação psicossocial no âmbito da saúde mental,
coletiva e da gestão em saúde, articulados com o processo de elaboração deste conteúdo,
e com referências cruciais e importantes em saúde.

No final, apontaremos as principais referências de nossa conduta profissional e de


nossa pesquisa conceitual em saúde mental.

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Desejamos a todos uma boa leitura, e um ótimo aproveitamento do curso e do conteúdo
dessa disciplina.

Bom trabalho a todos!

Objetivos
»» Apresentar uma compreensão do tema “Reabilitação Psicossocial” no
campo da saúde mental.

»» Contextualizar a área da saúde mental no âmbito da Reforma Psiquiátrica


e do processo de desinstitucionalização ou da luta antimanicomial.

»» Apresentar os principais conceitos e práticas em saúde vinculados ao


processo de reabilitação psicossocial.

»» Apresentar o conceito de clínica ampliada em saúde mental.

»» Promover uma conduta ética assim como uma atitude psicossocial de


trabalho em saúde mental.

»» Apresentar e articular o trabalho em equipe na área da saúde.

»» Apresentar os principais campos do saber vinculados à prática em saúde


mental.

»» Apresentar e promover modelos de organização e gestão em saúde coletiva.

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REABILITAÇÃO UNIDADE I
PSICOSSOCIAL

CAPÍTULO 1
A crítica ao modelo manicomial

“ TRADUZIR-SE
Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte delira.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte, linguagem.
Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?”
(FERREIRA GULLAR)

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UNIDADE I │ REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL

O homem como pura negatividade e possibilidade de escolha, que nasce


sem natureza certa e habita um mundo infinitamente aberto ao seu
engenho e arte, deve se preocupar, desde o momento em que nasce,
sobretudo com isso: sua liberdade e sua destinação. (Luís Cláudio
Figueiredo, em “A invenção do psicológico”, 2002).

No contexto da invenção humana ou possibilidades de sua subjetivação, temos a


questão da sua constituição de identidade singular assim como de sua convivência
social. No âmbito de seus modos de constituição subjetivos, lidamos com a temática da
“loucura” e seus meios, modos e modelos de cuidado e tratamento - diante do cenário
sócio-histórico e contemporâneo.

A História da Loucura pode ser considerada como paralela, ou mesmo


intrínseca, à história da humanidade (...). Considerando a loucura
enquanto um fenômeno essencialmente humano, podemos pressupor
que sua peculiar estranheza esteja acompanhando o Homem desde os
tempos mais remotos, desde o início do reconhecimento pelo homem
da própria existência. (PACHECO, 2009, p.36)

Nesse contexto, reflita sobre as seguintes questões:

1. Como você compreende a loucura?

2. Que relações podem ser estabelecidas entre loucura e saúde mental?

3. O que você entende por reabilitação psicossocial?

A crítica ao modelo manicomial


A Reforma Psiquiátrica é processo político e social complexo,
composto de atores, instituições e forças de diferentes origens, e
que incide em territórios diversos, nos governos federal, estadual e
municipal, nas universidades, no mercado dos serviços de saúde, nos
conselhos profissionais, nas associações de pessoas com transtornos
mentais e de seus familiares, nos movimentos sociais, e nos territórios
do imaginário social e da opinião pública. Compreendida como um
conjunto de transformações de práticas, saberes, valores culturais
e sociais, é no cotidiano da vida das instituições, dos serviços e
das relações interpessoais que o processo da Reforma Psiquiátrica
avança, marcado por impasses, tensões, conflitos e desafios. (MS,
2005, p.06)

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REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE I

Para um aprofundamento do processo da Reforma Psiquiátrica, recomendamos


as seguintes leituras:

»» “A Reforma Psiquiátrica brasileira, da década de 1980 aos dias atuais:


história e conceito.” (TENÓRIO, 2002)

»» “Loucos pela vida: a trajetória da Reforma Psiquiátrica no Brasil.”


(AMARANTE, 1995);

»» “O homem e a serpente. Outras histórias para a loucura e a psiquiatria.”


(AMARANTE, 1996);

»» “Reforma Psiquiátrica e Política de Saúde Mental no Brasil” (MS, 2005);

»» “Reforma Psiquiátrica, uma realidade possível: representações sociais


da loucura e a história de uma experiência” (PACHECO, 2009).

A proposta da Reforma Psiquiátrica e o Movimento da Luta Antimanicomial


estabelecem-se como precursores fundamentais em prol de transformações do modelo
médico-hospitalocêntrico ou do modelo manicomial de confinamento dos “doentes
mentais”. Neste contexto, abordaremos neste capítulo aspectos relacionados ao
processo da desinstitucionalização e à clínica antimanicomial.

O compromisso ético na construção dos novos cenários político e clínico,


no campo da Reforma Psiquiatra, tem como um dos pressupostos básicos
a transformação dos modos de relação estabelecidos entre a sociedade e a
loucura. Nesse sentido, é importante ressaltar as transformações dos valores,
preceitos éticos que se modificam de acordo com o momento histórico de cada
sociedade, de forma que são reconstruídos novos códigos acordados entre o
sujeito e a sociedade, para que possam dar suporte às transformações sociais,
científicas e culturais no indivíduo e na coletividade. (FREITAS, em Lobosque,
2007, p.97)

Segundo Rotelli (1990), o percurso da desinstitucionalização propõe uma


reforma ou uma transformação da instituição psiquiátrica que envolve todo um
processo social, com seus paradigmas, conceitos, atos e ações socioculturais
e políticas. Neste âmbito, a própria ação terapêutica torna-se um recurso de
transformação institucional. Diz o autor:

“... podemos afirmar que a desinstitucionalização é um trabalho


prático de transformação que, a começar pelo manicômio,
desmonta a solução institucional existente para desmontar (e
remontar) o problema. Concretamente se transformam os modos
nos quais as pessoas são tratadas (ou não tratadas) para transformar

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UNIDADE I │ REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL

o seu sofrimento, porque a terapia não é mais entendida como a


perseguição da solução-cura, mas como um conjunto complexo, e
também cotidiano e elementar, de estratégias indiretas e mediatas
que enfrentam o problema em questão através de um percurso
crítico sobre os modos de ser do próprio tratamento.” (ROTELLI,
1990, p. 29)

Neste intuito, a desinstitucionalização é compreendida como um processo social


geral e cotidiano que mobiliza e envolve todos os seus participantes ou atores sociais
– gestores, técnicos, profissionais da saúde, usuários ou pacientes – nesta meta de
transformação institucional.

Esse processo caracteriza-se por três diretrizes que, segundo Rotelli (1990), vão tomando
corpo à medida que o manicômio vai sendo destituído – e que assim representam seus
pilares de sustentação e fundamentação para um trabalho antimanicomial em saúde
mental:

1. A construção de uma nova política em saúde mental.

2. A multiplicidade das relações sociais, como centro do trabalho terapêutico.

3. A construção de novas estruturas externas, totalmente substitutivas da


internação manicomial.

Segundo Furtado e Campos (2005), o processo da Reforma Psiquiátrica no Brasil


exige uma reestruturação da atenção em Saúde Mental, que implica(rá) em profundas
alterações de ordem política, ideológica e ética – no que tange à abordagem e ao
tratamento à loucura – o que implica também em mudanças na concepção de clínica e
reabilitação psicossocial:

Um dos pilares do Movimento de Reforma Psiquiátrica no Brasil


será a luta pela desinstitucionalização, tanto em senso estrito como
em outros sentidos gradativamente ampliados. Isso significa que o
movimento buscará a superação das condições dos muitos internos
cronificados em hospitais públicos e conveniados, mas também a
transformação dos modelos assistenciais, dos paradigmas e das ações
corporativas centradas no manicômio e suas práticas. (FURTADO;
CAMPOS, 2005, p. 3)

Deste modo, no que tange a uma prática antimanicomial, podemos destacar que a
desinstitucionalização requer um movimento não meramente clínico, mas também
social e político – de reconstituição de uma cidadania –, culminando em um movimento
da luta que congrega todas as suas dimensões e todos os seus aspectos – da reforma.

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REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE I

Conforme Furtado e Campos (2005):

Aqui, ‘política’ é entendida como um conjunto de ações governamentais


condicionadas e “enformadas” por certos objetivos, para a consecução
de determinados fins. Podemos localizar aí importante questão a ser
considerada: a transformação de novas iniciativas em saúde mental, da
reforma psiquiátrica, numa política de governo ou “políticas de saúde
mental”. (FURTADO; CAMPOS, 2005, p. 2)

Em termos de Políticas Públicas, o Brasil tem avançado na publicação de leis e portarias


que asseguram o direito à saúde do sujeito portador de transtorno mental – que teve como
marco fundador o Movimento Nacional dos trabalhadores em Saúde Mental, em 1978 – que
origina o Movimento da Luta Antimanicomial – e que, a partir da década de 90 ganha mais
vigor, principalmente a partir da publicação da Lei Paulo Delgado – lei no 10.216/2001, que
reitera o processo da Reforma Psiquiátrica e a assistência em Saúde Mental.

Consulte na íntegra a Lei no 10.216/2001 e as Portarias em Saúde Mental no site:


<www.saude.gov.br>.

Segundo Amarante (1995), a desinstitucionalização implica em uma noção de cuidado


e tratamento não mais pela exclusão ou pelo confinamento, e sim pela criação de
possibilidades concretas de sociabilização e subjetivação. O tratamento passa a
considerar o sujeito em sua realidade social:

O tratamento deixa de ser a exclusão em espaços de violência e


mortificação para tornar-se criação de possibilidades concretas de
sociabilidade a subjetividade.

O doente, antes excluído do mundo dos direitos e da cidadania,


deve tornar-se um sujeito, e não um objeto do saber psiquiátrico.
A desinstitucionalização é este processo, não apenas técnico,
administrativo, jurídico, legislativo ou político; é, acima de tudo, um
processo ético, de reconhecimento de uma prática que introduz novos
sujeitos de direito e novos direitos para os sujeitos. (AMARANTE,
1995, p.4)

Nesse contexto, cabe uma diferenciação entre desinstitucionalização e desospitalização:

“... desinstitucionalizar não se restringe e nem muito menos se


confunde com desospitalizar, na medida em que desospitalizar significa
apenas identificar transformação com extinção de organizações

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UNIDADE I │ REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL

hospitalares/manicomiais. Enquanto desinstitucionalizar significa


entender instituição no sentido dinâmico e necessariamente complexo
das práticas e saberes que produzem determinadas formas de perceber,
entender e relacionar-se com os fenômenos sociais e históricos.”
(AMARANTE, 1995, p. 49)

Uma clínica ampliada ou antimanicomial é realizada buscando uma lógica da


reconstituição e inclusão social, inviabilizando qualquer comportamento, ação ou atitude
de exclusão. Segundo Lobosque (1997), alguns princípios podem ser estabelecidos nessa
prática, a saber:

1. Princípio da singularidade: concepção da singularidade que não se


confunde nem com o privado nem com o individual. Aqui, a coletividade
pode ser compreendida como um atributo de um coletivo que funciona
como tal, como coletividade.

Não se trata de obter o grande coletivo, e sim de produzir um coletivo


de grande expressividade, constituído pela articulação de diversas
singularidades entre si (...). Trata-se de perceber que o sujeito não é
único nem idêntico a si mesmo, residindo o singular de cada qual não
em sua realidade suposta, mas numa discordância fundamental; trata-se
de interpelar tal singularidade, convidando o sujeito a sustentá-la com
o estilo que é o seu. (LOBOSQUE, 1997, p.22)

2. Princípio do limite: aqui são entendidos como excludentes todos os


limites que uma construção cultural impõe ao que a loucura representa
de excessivo ou desordenado. Aqui, a clínica é convocada a intervir
tomando a colocação de um limite não como um imperativo moral ou
com um viés da autoridade, e sim como um exercício ou uma prática do
“fazer caber”; de modo que se busque um contorno e não uma exclusão
na intervenção clínica ao sujeito:

Assim, ‘fazer caber’ o louco na loucura é também ao mesmo tempo


convidar a cultura a conviver com certa falta de cabimento, reinventando
ela também seus limites (...): pensar, propor, sustentar formas de contrato
social nas quais não seja mortífera a presença da loucura, é algo que faz
parte de uma clínica antimanicomial. (LOBOSQUE, 1997, p. 23)

3. Princípio da articulação: aqui cabe ao processo de transformação social


um trabalho de transformação econômica, política e ideológica também.
O que exige um trabalho articulado, interdisciplinar, e em parcerias como
os demais movimentos sociais em prol da cidadania.

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REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE I

Uma tal clínica deve manter uma interlocução interdisciplinar, ou


seja, deve manter-se atenta às descobertas mais recentes de diferentes
disciplinas, sem confundir-se ou subordinar-se a elas. (LOBOSQUE,
1997, p. 24)

Contudo, tal interlocução e articulação demandam um trabalho não somente no plano


teórico, mas sim e principalmente no plano prático e singular de construção de uma
clínica ampliada, a qual considere esses três princípios em uma prática de atenção à
saúde mental em prol da reinserção social ou da reabilitação psicossocial.

Como tais princípios – Singularidade, Limite e Articulação podem ser viabilizados


em sua prática clínica ou em saúde mental? Busque articular esses princípios com
as ações e serviços em Saúde Mental. Exemplifique com ações e intervenções
em sua prática profissional.

Conceitos e fundamentos da
Reabilitação Psicossocial

Segundo Sarraceno (apud PITTA, 2001), a Reabilitação social impõe-se como


necessidade e exigência Ética no campo da Saúde Mental. Implica mudança de postura
política dos próprios serviços em saúde, envolvendo todos os profissionais, atores e
usuários do processo saúde-doença-reabilitação. O processo de reabilitação social
constitui-se assim como um processo de reconstrução da cidadania e contratualidade
em três áreas – “habitat”, rede social e trabalho com valor social.

No seu sentido instrumental, a Reabilitação Psicossocial representa


um conjunto de meios (programas e serviços) que se desenvolvem para
facilitar a vida de pessoas com problemas severos e persistentes (...) o
processo enfatizaria as partes mais sadias e a totalidade de potenciais
do indivíduo, mediante uma abordagem compreensiva e um suporte
vocacional, residencial, social, recreacional, educacional, ajustados
as demandas singulares de cada indivíduo e cada situação de modo
personalizado. (PITTA, 2001, pp. 19-20)

Mais adiante, Pitta (2001) descreve que, para a OMS, a Reabilitação Psicossocial é
definida como:

o conjunto de atividades capazes de maximizar oportunidades de


recuperação de indivíduos e minimizar os efeitos desabilitantes da
cronificação das doenças através do desenvolvimento de insumos
individuais, familiares e comunitários. (p. 21)

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UNIDADE I │ REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL

E mais:

... Reabilitação Psicossocial é uma atitude estratégica, uma vontade


política, uma modalidade compreensiva, complexa e delicada de cuidados
para as pessoas vulneráveis aos modos de sociabilidade habituais que
necessitam cuidados igualmente complexos e delicados. (PITTA,
2001, p. 21)

Nesse contexto, o processo de reabilitação psicossocial insere-se previamente no campo


da prevenção terciária em saúde e posteriormente no campo da reinserção social –
num âmbito coletivo e individual –, de modo a permitir novos modos e abordagens de
cuidado ao portador de sofrimento ou incapacidade mental.

Segundo Hirdes e Kantorski (2004),

a reabilitação psicossocial aponta para prover o ótimo nível de


funcionamento de indivíduos e sociedades e a minimização de
incapacidades e desvantagem física ou mental, acentuando escolhas
individuais em como viver prosperamente na comunidade. (p. 217).

Essas autoras enfatizam as principais abordagens e os métodos acerca da Reabilitação


Psicossocial, de modo a envolver todos os indivíduos – profissionais e usuários – visando
desenvolver suas competências e habilidades dentro de uma rede relacional e social.

Ainda segundo Hirdes e Kantorski (2004), esses métodos desenvolvidos em reabilitação


psicossocial são meios que favorecem a maximização do cuidado, do tratamento e das
intervenções em saúde, visando aumentar a capacidade dos indivíduos e reduzir a tensão
excessiva destes, otimizando sua participação social e econômica, e evitando recaídas.

Segundo fundamentos de pesquisa dessas autoras, podemos estabelecer uma distinção


conceitual entre tratamento e reabilitação, a saber:

... a origem histórica da reabilitação é o desenvolvimento de recursos


humanos, reabilitação vocacional, reabilitação física, terapia centrada
no cliente, educação especial e abordagens de aprendizagem, enquanto o
tratamento se origina nas teorias psicodinâmicas e na medicina voltada
para o cuidado do corpo. (HIRDES; KANTORSKI, 2004, p. 219)

Portanto:

A reabilitação psicossocial consiste em um processo complexo, uma vez


que necessita da articulação de várias instâncias, políticas específicas
voltadas para a área e, sobretudo, capacitação técnica dos profissionais.
(HIRDES; KANTORSKI, 2004, p. 218).

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REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE I

A reabilitação psicossocial está incluída nas ações e atitudes no âmbito do processo


da desinstitucionalização em saúde mental como um todo, assim como na formação
e desenvolvimento dos recursos humanos. De forma que os serviços em saúde mental
– numa perspectiva da Reforma Psiquiátrica – podem ser considerados, de um modo
geral e coletivo, como práticas reabilitadoras.

O profissional de reabilitação psiquiátrica acredita que todas as pessoas


têm o direito da autodeterminação, incluindo a participação em todas as
decisões que afetam suas vidas; acredita na dignidade e valor de todos
os seres humanos (...); assume que todas as pessoas têm capacidade
de aprender e crescer; é sensível no respeito individual, cultural e
diferenças étnicas de cada consumidor. (HIRDES; KANTORSKI, 2004,
p. 220)

A Reabilitação Psicossocial torna-se um processo que envolve capacitação, aprendizagem,


formação de vínculo e investimento, satisfação e desenvolvimento profissional, dentre
tantos.

Segundo Pitta (em HIRDES e KANTORSKI, 2004), existem variáveis relacionadas aos
resultados da reabilitação que podem ser compreendidas em dois níveis – macro e micro:

O micro está relacionado à afetividade, à continuidade, ao vínculo real


estabelecido entre paciente-profissional e ao tempo gasto na relação. O
nível macro está relacionado à organização do serviço...a sua relação com
a comunidade e a satisfação de seus usuários e profissionais. (p. 220)

Nesse contexto, tais variáveis são consideradas determinantes no processo de reabilitação


dos pacientes, isto é, o programa, o serviço e os profissionais de saúde influenciam
o processo de cura e reabilitação. Valores e aspectos sociais tais como autonomia,
subjetividade, responsabilidade tornam-se decisivos nesse processo. Desta forma, faz-se
necessária e é estabelecida uma clínica ampliada.

Clínica ampliada

O que você compreende como clínica ampliada?

Como pode conceituá-la dentro de sua prática profissional?

A clínica, na perspectiva do SUS e da Reforma Psiquiátrica, implica em


criar um conjunto de intervenções que traduza, de forma criteriosa,
a coerência existente entre os princípios, conceitos e o modo de
atuação, ou seja, o espaço de agenciamento de encontros, de produção

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UNIDADE I │ REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL

de subjetividades individuais, coletivas, estabelecidos nos diversos


cenários, em via de mão dupla entre os universos externos e internos.

A construção dessa clínica é um trabalho de tecelagem que convoca a


todos. Convoca todos os autores e atores, cada um no seu lugar singular,
a ser um agente ativo nesse processo de fiação em que o usuário sai
da posição de anulado e de passivamente assistido para a condição de
sujeito, ser pensante, desejante, criativo, um cidadão. Estes espaços,
lugares de tecimento do cuidado, devem ser formados a partir dessa
contratualidade contínua, seja entre equipes, os usuários, os familiares,
redes sociais e todos que estão envolvidos. O desenho terapêutico exige
um traçado impulsionado pelos princípios intercessores que circulam
em movimento contínuo, dinâmico, interligando o processo de fiação
que atravessa os diversos cenários da rede de cuidados... (FREITAS
apud LOBOSQUE, 2007, p.98)

Assim, uma clínica ampliada tece-se e é tecida numa rede social ampla e articulada
entre profissionais e usuários em prol do cuidado em saúde mental. Mais uma vez,
singularidade, limite e articulação são evocados como princípios e principalmente
como recursos de atenção e cuidado.

Nesse contexto, uma nova prática clínica faz-se vigente. De acordo com Garcia (1997),
um novo posicionamento ético faz-se necessário nessa “clínica do social” – que presta
atenção aos sujeitos portadores de sofrimento psíquico:

... Há hesitação (no Movimento da Luta Antimanicomial, nos serviços


de atenção psicossocial, de Reabilitação Social) entre uma estratégia
mais técnica dirigida precipuamente para uma rápida inserção
social do portador de sofrimento mental e outra estratégia aqui
nomeada ‘clínica’ (...). O tempo de nossa prática bate em função do
acontecimento (Ana se refere a Badiou ), acontecimento no registro
do amor na sua fenomenologia do encontro, desencontro, segregação,
exclusão, violência, não bate com o tempo do livro de ponto, nem
com a grade dos itens da boleta administrativa e burocrática. (...) o
processo é clínico, político, social. (GARCIA apud LOBOSQUE, 1997;
Prefácio, p.12-13)

Aqui, o autor nos convoca a uma clínica do acontecimento que se oferece no presente,
naquilo que ocorre no cotidiano de nossa prática em saúde mental – como conteúdo e
recurso de cuidado e tratamento. Configura-se como uma estratégia mesmo da clínica
antimanicomial.

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REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE I

Bezerra Jr. (2007) contextualiza a clínica ampliada – pós cenário da luta antimanicomial
– conforme algumas perspectivas: clínica propriamente, psicopatológica e política:

Creio que um dos aspectos mais interessantes da clínica desenvolvida


no campo da luta antimanicomial, nos lugares onde ela é mais bem
sucedida, é o êxito em superar a querela tradicional entre concepções
organicistas e concepções psicológicas do sofrimento psíquico ou da
doença mental. (...) A clínica no campo antimanicomial, justamente
por se dirigir ao sujeito inserido no conjunto múltiplo de suas
relações, e não se restringir a aspectos específicos de seu universo
subjetivo, tende a se desfazer do enquadre tradicional, deixando
de lado oposições entre mente e corpo, indivíduo e ambiente, e
entre psíquico e social. (BEZERRA Jr., apud LOBOSQUE, 2007,
p. 24)

Nesse contexto, emerge a noção de subjetividade – reconhecida pela perspectiva


psicanalítica – num contexto da diversidade cultural que acolhe conflitos e contradições
humanos - no âmbito do cuidado e tratamento em saúde mental.

Nessa linha histórica de diversas mudanças e re-significações, a teoria


psicanalítica tem uma influência impactante na relação na saúde
e doença, mudando o foco da doença para o ser humano. Ou seja, o
discurso freudiano contribui para desfocalizar a problemática da
loucura em torno do sintoma, buscando dar um sentido, ressignificando
o sofrimento psíquico, em que o paciente busca compreender melhor a
sua existência, pela subjetividade, elaborando o mal-estar, os conflitos
psíquicos e sociais vivenciados por ele. (FREITAS apud LOBOSQUE,
2007, p. 98)

A propósito do mal-estar do homem em sua constituição subjetiva e situação


social, recomendamos a leitura do seguinte artigo: “O mal-estar na civilização”
(FREUD, 1856-1939).

Freud (1856-1939) introduz seu artigo sobre o mal-estar do homem em sociedade, com
um paradoxo existente entre os ‘pensamentos’ das pessoas e suas ações ou atitudes.
O pai da psicanálise introduz aqui um conflito subjetivo entre o indivíduo, o desejo
pulsional e as exigências sociais (para dizer de modo sintético) que inaugura a questão
do sofrimento psíquico. Isto é, o homem constitui-se desde sua origem em uma situação
paradoxal ou conflituosa que precisa ser vista e cuidada.

19
UNIDADE I │ REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL

É um sujeito que se constitui em seu meio sócio-político, sujeito único e singular, que
aparece nesta mais recente perspectiva de uma clínica ampliada. Trata-se de uma
experiência peculiar e subjetiva:

A experiência subjetiva – e a loucura é uma de suas modalidades


possíveis – pode ser vista como resultado de uma complexa rede de
elementos biológicos e psicológicos, individuais e coletivos, conscientes
e inconscientes, idiossincráticos e sociais. Ela é composta tanto
de significados que podem ser compartilhados quanto de sentidos
encarnados – nem sempre exprimíveis ou acessíveis à consciência
porque inscritos numa dimensão pré-reflexiva ou pré-verbal. Ela é algo
que surge como resultado das interações entre o organismo e o meio
que ele habita, entre o corpo e o ambiente físico e simbólico, entre o
indivíduo e o universo humano que o acolhe e o constitui como sujeito.
A fonte da vida subjetiva deixa de ser vista como estando exclusivamente
na fantasia inconsciente, no cérebro ou nos traços sociais que inscrevem
o indivíduo numa totalidade, e passa a ser compreendida como
emergindo da ação no mundo, que engloba todos esses aspectos sem se
reduzir a nenhum deles. (BEZERRA Jr. apud LOBOSQUE, 2007, p. 25)

Assim, a loucura ou a “doença mental” também é reconhecida como uma experiência


do sujeito e, deste modo, pode ser abordada, compreendida e cuidada.

Em outras palavras, tratar de um indivíduo significa lidar com o


campo total de sua experiência – que, como vimos, engloba aspectos
biológicos, psíquicos e sócio-históricos concomitantemente. Deste
modo, a clínica que queremos se sustenta no intuito de oferecer
condições para que o sujeito, na medida de suas possibilidades, consiga
lidar com seu sofrimento de um modo que lhe permita libertar-se
do constrangimento imposto à sua normatividade pelo sofrimento
que lhe acomete. Não apenas pela obtenção do alívio de suas dores e
aflições, mas pela transformação desse mundo vivido, que pode vir a se
tornar mais aberto, mais estimulante, mais rico. (BEZERRA Jr. apud
LOBOSQUE, 2007, p.29)

Os fundamentos principais de uma clínica ampliada estão centrados no caráter de


sua singularidade que reconhece o sujeito em tratamento, amplia o cuidado para uma
relação interdisciplinar de saberes articulados, considera o sujeito em sua convivência
social de identidade e ambientação cultural, assim como sua cidadania enquanto um
sujeito político. Político no sentido de um sujeito ativo que transforma e é transformado
pela situação em que vive.

20
REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE I

Segundo Lobosque (1997):

Conservando a ideia de que a política é transformação, Badiou assim


propõe defini-la: A política consiste em designar certas possibilidades na
situação, possibilidades que não se limitam ao que já existe. (LOBOSQUE,
1997, p. 44)

Um sujeito de direitos que transforma e é transformado por seu contexto:

A construção da clínica antimanicomial encontra-se, desde seu início,


articulada ao campo da cidadania. Era como direito que a mesma
viria a se constituir, devendo, perseguir, como sua meta prioritária, a
reconstrução do campo dos direitos para os loucos. (ABOU Yd apud
LOBOSQUE, 2007, p. 53)

Segundo Delgado (2007):

Outra dimensão desta clínica é a inclusão social. A clínica da Reforma


Psiquiátrica é necessariamente uma clínica da inclusão social. Se assim
é, não existe outra possibilidade senão, permanentemente, termos
uma intervenção direta na produção da inclusão social. Nesse sentido,
a discussão sobre clínica e política acaba subsumida por essa questão
fundamental. Ora, a inclusão social é matéria da política. A inclusão
social é essencialmente uma démarche política, num país desigual,
estruturalmente desigual. E se essa clínica é da inclusão social, e se ela
se dá num território e no plano da política pública, da saúde pública,
essa clínica é, necessariamente, uma política. (DELGADO, apud
LOBOSQUE, 2007, p. 62)

Logo, a clínica ampliada configura-se com as seguintes características:

1. Clínica da desinstitucionalização, em caráter da luta antimanicomial,


como processo e produto deste movimento da reforma.

2. Clínica que reconhece uma subjetividade ampliada e, ao mesmo


tempo, singular e diferenciada, que respeita a constituição e experiência
subjetivas de cada qual em suas idiossincrasias e peculiaridades.

3. Clínica da reabilitação (psico) social que reconhece um sujeito em


relação e em formação com o social em que convive.

4. Clínica política da inclusão social, que supõe e reconhece um sujeito


de direitos – um cidadão.

21
UNIDADE I │ REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL

5. Clínica de uma ética singular, que reconhece o sujeito em tratamento,


assim como a importância da formação e capacitação dos profissionais
em saúde.

Consulte também o seguinte Caderno de Saúde Mental – “A Reforma Psiquiátrica


que queremos: Por uma Luta Antimanicomial” (LOBOSQUE, B.H., 2007)

No que tange ao aspecto ético de uma clínica ampliada, queremos destacar a função
transformadora de uma prática em saúde mental, que utiliza seus recursos e instrumentos
técnicos em prol de um cuidado e tratamento do sujeito humano – que constitui-se como
um indivíduo integrado e singular.

Na compreensão de Lobosque (2003), tal prática em saúde mental define-se como uma
clínica em movimento – em convivência com a loucura – gerada por ações e estratégias
sócio-políticas que exigem transformação a partir da proposta da reforma psiquiátrica
e do movimento antimanicomial:

Ora, na perspectiva desta transformação que acabo de defender, a clínica


não tem lugar central, não é de forma alguma o eixo diretor de nossas
ações ou estratégias: estas ações e estratégias são de ordem diversas,
levando-nos a intervir no âmbito da política, do direito, das legislações,
da cultura, do trabalho. (LOBOSQUE, 2003, p. 18)

Nesse contexto, a prática clínica em Saúde Mental sofre repercussões e transformações


na própria relação e constituição com a loucura, assim como em sua gestão:

Trata-se, dentre outras frentes de ação, de retirar a clínica da Saúde


Mental de sua tradicional função de controle social, feita em nome de
ditames técnicos e científicos, para coloca-la a trabalho da autonomia e
independência das pessoas. (LOBOSQUE, 2003, p. 20)

A clínica ampliada é, portanto, uma clínica do acontecimento e do movimento, ambos


articulados numa prática de atenção cotidiana e social.

Que mais funções ou estratégias de intervenção você pode descrever para


a clínica ampliada? Estabeleça relações da clínica ampliada com sua prática
profissional em saúde ou/e com os serviços de atenção em Saúde.

22
O MODELO UNIDADE II
PSICOSSOCIAL

CAPÍTULO 1
Atitude psicossocial

A história da luta antimanicomial coincide com a história do movimento psicanalítico,


no sentido do que Freud aponta como conceito de resistência (FREUD, 1914). Neste
sentido, reforçamos que o movimento e a atitude psicossocial aqui coincidem com um
posicionamento ético de transformação social e cuidado em saúde mental.

Foi como obstáculo à elucidação dos sintomas e à progressão do tratamento


que a resistência foi descoberta. ‘ A resistência constitui no fim de contas o que
entrava o trabalho (terapêutico) (2a). Freud irá procurar vencer inicialmente
este obstáculo pela insistência – força de sentido contrária à resistência – e
pela persuasão, antes de reconhecer nele um meio de acesso ao recalcado e
ao segredo da neurose; de fato, são as mesmas forças que vemos atuar na
resistência e no recalque. Neste sentido, como Freud insiste nos seus escritos
técnicos, todo progresso da técnica analítica consistiu numa apreciação mais
correta da resistência, isto é, desse dado clínico segundo o qual não bastava
comunicar aos pacientes o sentido dos seus sintomas para que o recalque se
dissipasse. (LAPLANCHE; PONTALIS, 2008, p. 459)

Atitude psicossocial
Na área da saúde mental, a abordagem psicossocial possibilita articular ciência,
práticas clínicas e sociopolíticas, compreendendo os atores em seu cotidiano, o
que envolve as dimensões psíquicas, sociais e culturais por meio das quais os
protagonistas, individual e coletivamente, se posicionam. (...) Assim, o sentido da
intervenção psicossocial, no espaço da saúde mental, busca superar a dualidade
sujeito/objeto, saúde/doença, individual/social, questionando a verticalidade do
tratamento e o poder biomédico. Nessa dinâmica, a clínica ampliada na saúde
mental realiza intervenções com vistas à promoção de espaços de invenção e

23
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

criação, objetivando trabalhar a desinstitucionalização dos usuários de serviços


de saúde mental. (ALVES; FRANCISCO, 2009)

Uma clínica ampliada exige uma atitude ética diferenciada, que compreendemos como
atitude psicossocial – no contexto do movimento de transformação social. Segundo
abordagem de uma psicologia social, devemos compreender o indivíduo na trama de suas
relações e situações sociais. Assim, uma clínica social com tal atitude e posicionamento
ético revela-nos uma rede de relações e cuidados situados numa dinâmica social e coletiva.

Conforme Bendassolli e Soboll (2011), a psicologia social clínica tem interesse pelo
vínculo social e suas variações – intersubjetivas e relacionais – e manifestações ou
expressões sociais, isto é, conflitos, dominação, exclusão, solidariedade, cooperação,
aliança, troca, dentre outras.

Nessa orientação, o vínculo social é examinado de uma dupla perspectiva,


a perspectiva das transformações sociais e dos rearranjos psíquicos
operados pelos indivíduos. Aqui o social não é somente um conjunto de
determinações e de constrangimentos. Ele não é dado, mas construído
em dinâmicas coletivas. A psicologia social clínica visa, portanto, a
investigação das reciprocidades do individual e do coletivo, do psíquico e
do social. (BENDASSOLLI; SOBOLL, 2011, p. 26)

Nesse contexto, destacamos a importância de compreender o social como uma rede


dinâmica de relações e transformações entre os sujeitos envolvidos ou seus atores
sociais. Enfatizamos aqui a noção de sujeito em seu caráter ativo, intersubjetivo e
relacional, que assim é constituído e forma sua identidade sociocultural.

Ressaltamos aqui também a noção de grupo e coletividade, nesta trama de constituição


e organização social:

A noção de organização designa um conjunto estruturado de papéis, de


relações de poder, de normas, estabelecido para responder a objetivos
de produção de bens e serviços. (...) Mas uma organização pode também
ser retratada como a colocação conjunta de recursos individuais tendo
em vista a realização de uma ação coletiva. (BENDASSOLLI; SOBOLL,
2011, p. 28)

O grupo social veicula o sentido de uma expressão coletiva assim como as instituições
que são formadas a partir de seus valores, costumes, atitudes e comportamentos sociais:

As abordagens psicossociais se respaldam em campos teóricos


diversificados que consideram o lado empírico, o histórico, o cultural
e o científico dos agentes sociais. Elas procuram conhecer a realidade

24
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

desses agentes em busca de possibilidades para uma escuta mais


analítica e atenta, e, ainda, interagem, refletindo e objetivando os saberes
da realidade atual, porquanto o mundo interno e suas expressões se
constroem nas relações sociais. (ALVES; FRANCISCO, 2009)

Conforme Bendasolli e Sobol (2011) o social é caracterizado não somente pelo conjunto
de seu imaginário social ou pelo sistema simbólico de troca, mas sim e principalmente
pelo conjunto dinâmico de suas relações de transformação da realidade, ou seja, de
construção social.

Nesse contexto, todas as relações estabelecidas na rede de cuidado e atenção em


saúde mental também se transformam e podem ser compreendidas numa organização
dinâmica e interativa, sejam nas instituições, sejam nos serviços, seja na relação
profissional-usuário em Saúde.

As intervenções nesse campo, na perspectiva de Enriquez (1997),


baseiam-se nos seguintes elementos: as palavras, as representações e as
condutas, bem como as relações intersubjetivas, pois esses expressam,
no cotidiano, tensões que afetam e confrontam o individual e o coletivo.
A abordagem psicossocial contempla, portanto, articulações entre o que
está na ordem da sociedade e o que faz parte do psíquico, concebendo
o sujeito em suas múltiplas dimensões. Assim, ela considera a
multidimensionalidade da clínica, em que estão envolvidos aspectos
de interação entre o físico, o psicológico, o meio ambiente natural e o
social. Em outras palavras, essa abordagem compreende que a nossa
história de vida é marcada pelas relações em rede, cujas estruturas
social e familiar, bem como as experiências culturais, se manifestam no
dia a dia; concebe, pois, o sujeito como um todo que afeta e é afetado no
mundo, enfatizando a interação e a interdependência dos fenômenos
biopsicossociais e buscando pesquisar a natureza dos processos
dinâmicos subjacentes que compõem o homem em sua vivência.
(ALVES; FRANCISCO, 2009)

Nesse contexto, temos que a prática profissional do psicólogo também engendra e é


engendrada por esta abordagem ou atitude psicossocial – o trabalho do psicólogo evoca
uma ação e um posicionamento éticos diferenciados, que compreende e inclui um
sujeito em permanente desenvolvimento humano e transformação – que, ao mesmo
tempo é constituído em sua sociogênese única e fundamental.

(...) o psicólogo procura, para além do intrapsíquico, caminhar – de


forma cautelosa e comprometida com o político e o ser sujeito em sua
singularidade e coletividade –, alicerçando ações capazes de romper a

25
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

individualização. Além do mais, tal visão concebe o homem como ser


histórico, perpassado e, ao mesmo tempo, porta-voz de sua “época”,
um ser autônomo-dependente que reconhece sua cultura e a reconstrói,
criando e recriando dispositivos constitutivos das relações humanas e
institucionais. (ALVES; FRANCISCO, 2009)

Assim, temos a ação do psicólogo em Saúde Mental no contexto de uma prática multi e
interdisciplinar que possa acolher e congregar todas as áreas de formação, assim como
os campos de saber e as abordagens de atenção e cuidado:

A perspectiva psicossocial – no campo da saúde mental – reafirma a


subjetividade como construção a partir de um campo de forças, assim
como a aproximação com ações horizontais na relação entre técnicos
e instituições. Tal prática indica pontos relevantes que norteiam
a interdisciplinaridade, a relação com o usuário e suas implicações
subjetivas e socioculturais; além disso, indica a necessidade de
estimular a família e de criar meios a fim de que a sociedade
compreenda o sujeito com transtorno mental e se responsabilize pela
atenção e apoio a ele. Nessa abordagem, os profissionais assumem
a assistência comprometida e envolvida com ações dirigidas para
a atenção ao sofrimento integral, o que requer o questionamento
de posições excludentes voltadas exclusivamente para a atenção
biológica e direcionadas para as perspectivas fisiopatológicas do ser.
O cuidado deve fundamentar-se em uma visão que supere a dicotomia
corpo/mente e outras tantas cisões perpetuadas ao longo de muitos
anos, configurando-se como uma prática apoiada em perspectivas
em que a interdisciplinaridade seja um desafio constante. (ALVES;
FRANCISCO, 2009)

Coloca-se em questão aqui uma relação interdisciplinar entre a clínica e o saber da


psicologia, por exemplo, e uma atitude psicossocial da prática em saúde mental.

Nesse âmbito, temos três desafios numa prática de atenção psicossocial que são
lançados – a seguir - como tópicos de reflexão e exercício profissional:

1. Conforme Safra (2004), “O ser humano é a singularização de toda


história da humanidade. Cada pessoa é única e múltipla, pois, ao
mesmo tempo em que se individualiza, o faz presentificando seus
ancestrais e aqueles com quem compartilha a sua existência (p. 25)”
(ALVES; FRANCISCO, 2009 ).

26
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

2. “Conceber o homem em movimento é uma das metas da abordagem


psicossocial, na consideração de que a consciência e a identidade
constituem elementos importantes para a expressão da condição
humana”. Gaulejac (2001) refere-se ao homem como um complexo
de histórias simultâneas construídas a partir da existência singular
e social. Questionar o lugar desse sujeito, o limite de sua autonomia
e liberdade, é desafio permanente, e constitui uma das questões
fundamentais no campo da saúde mental (ALVES; FRANCISCO, 2009).

3. “Conceber o sujeito como protagonista de sua história – aqui


tomada como o que constitui o lado humano na dimensão cultural,
influenciado pelos símbolos, pela língua e, em consequência, pela
sociedade – é mais uma das tarefas a que se propõe a abordagem
psicossociológica. Acredita-se que o homem, ao assumir a própria
historicidade, cria e recria mudanças no mundo interno e externo,
gerando relações de sentido e de responsabilidades compartilhadas.”
(ALVES; FRANCISCO, 2009).

Apresenta-se nesse contexto,então, o aspecto do humano e seu engendramento


no contexto das relações psicossociais. A questão do desenvolvimento humano
e seu aspecto dinâmico torna-se fundamental na constituição das relações em
rede social, assim como na atenção e cuidado em Saúde.

Que agentes ou atores sociais estão implicados nessa rede de relações


estabelecidas numa prática de atenção e cuidado em saúde mental? Que mais
você pode evocar e articular de sua experiência profissional nesse sentido?
Exemplifique.

O trabalho em equipe interdisciplinar

“O campo hoje multiprofissional da psiquiatria, fundado pelo gesto inaugural de


Pinel de se interessar pela lógica da loucura e propor para ela uma terapêutica,
representa a relação sistemática, não de técnicos, mas da sociedade com a
loucura (relação que a reforma pretende tornar mais inclusiva). A clínica, portanto,
situa-se no rol das respostas sociais à loucura e tem aí um lugar privilegiado, de
possibilidade singular de trabalho.” (TENÓRIO, 2002)

Temos que o trabalho em equipe numa Clínica Ampliada em Saúde Mental retoma
alguns requisitos fundamentais, tais como:

27
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

1. Os serviços de saúde são organizados de modo que os atores sociais


tornam-se os próprios agentes do fazer cotidiano.

2. A referência no serviço de saúde passa a ser usuária deste, visando um


cuidado humanizado.

3. O atendimento acontece num âmbito de atuação multidisciplinar e


multiprofissional, favorecendo o trabalho em equipe interdisciplinar.

4. A atenção em saúde mental acontece em rede social, em prol de uma


relação cooperativa entre seus usuários.

5. As diretrizes do SUS direcionam os serviços e as relações entre


profissionais, usuários e unidades de saúde.

A prática da Psicologia dirigida para a saúde mental e os princípios


norteadores do Sistema Único de Saúde (SUS) se constituem a
partir da relação de intercessão com outros saberes. Como menciona
Ribeiro (1996), o exercício profissional em saúde mental tende a
dialogar, de forma a criar espaços para aproximações. É no entre que
a criação acontece, é no limiar do poder que os saberes podem revelar
contribuições e reconstruir caminhos. (ALVES; FRANCISCO, 2009)

Logo, no contexto dos entre e inter-saberes, temos que o serviço oferecido em


Saúde requer um trabalho em equipe multi, inter e até transdisciplinar. Tal trabalho
interdisciplinar em Saúde Coletiva requer:

1. uma troca de saberes especializados – uma atitude social e profissional;

2. um desenvolvimento de características humanas para um


trabalho em equipe;

3. um diálogo permanente entre os profissionais e suas disciplinas


de formação e prática profissional.

Conforme Vilela e Mendes (2003), em seu trabalho sobre a interdisciplinaridade e o


trabalho em equipe, temos que:

A interdisciplinaridade é fundamentalmente um processo e uma filosofia


de trabalho que entra em ação na hora de enfrentar os problemas e
questões que preocupam cada sociedade. (TORRES; SANTOMÉ J., 1998)

Partindo do conceito de disciplina como “uma maneira de organizar e delimitar


um território de trabalho, de concentrar a pesquisa e as experiências dentro de
um determinado ângulo de visão”, podemos estabelecer diferentes níveis de
interdisplinaridade, conforme o grau de integração das disciplinas que são reagrupadas
em um determinado momento.

28
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

Vários autores têm estabelecido classificações diferentes para expressar as modalidades


possíveis de interdisciplinaridade. Dentre elas, a mais conhecida é a distinção realizada
por Erich Jantsch, que consta de cinco níveis, a saber (TORRES; SANTOMÉ, J., 1998):

Multidisciplina: justaposição de disciplinas diversas, com a intenção


de esclarecer os seus elementos comuns, mas desprovidas de relação
aparente entre elas.

Pluridisciplina: justaposição de disciplinas, mais ou menos vizinhas,


nos domínios do conhecimento, visando à melhoria das relações entre
elas. Ex.: Física e Química.

Disciplinaridade cruzada: abordagem baseada em posturas de força,


em que a possibilidade de comunicação está desequilibrada, pois uma
das disciplinas predomina sobre as outras.

Interdisciplinaridade: interação existente entre duas ou mais


disciplinas, em contexto de estudo de âmbito mais coletivo, no qual
cada uma das disciplinas em contato é, por sua vez, modificadas
e passa a depender claramente uma(s) da(s) outra(s). Resulta em
enriquecimento recíproco e na transformação de suas metodologias
de pesquisa e conceitos.

Transdisciplinaridade: é o nível superior da interdisciplinaridade, em


que desaparecem os limites entre as diversas disciplinas; a cooperação
é tal que se fala no aparecimento de uma nova macrodisciplina....
(VILELA; MENDES, 2003)

Nesse contexto, torna-se fundamental a dinâmica do desenvolvimento humano em sua


interação e integração. Isto é, a atitude e o posicionamento disciplinar e profissional
de uma equipe de Saúde requer disponibilidade e capacitação de seus profissionais em
prol de uma interdisciplinaridade que integre: que vise uma prática e um saber íntegros
e integrados.

Saúde como integridade não permite a fragmentação em saúde física,


mental e social e, portanto, parte-se de uma visão holística que supõe
entendê-la na interface de grande diversidade de disciplinas. Essa
diversidade torna-se mais complexa quando a realidade da saúde
ultrapassa a dimensão individual e passa para a esfera coletiva (NUNES,
1995, apud VILELA; MENDES, 2003).

Segundo Souza (2010), as equipes podem ser definidas como multi, inter ou
transdisciplinares - conforme seu modo de organização, configuração, dinâmica de

29
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

funcionamento, distribuição de tarefas e funções, propósito e objetivos, dentre outros


aspectos. Assim, temos:

1. Equipe multidisciplinar – “pode-se dizer que uma equipe


multiprofissional de saúde, por exemplo, não necessariamente comunica-
se entre seus pares, e a plena execução de sua tarefa não depende ou está
atrelada à comunicação entre os membros dessa equipe. Ela simplesmente
constitui uma equipe multidisciplinar, ou seja, que dispõe ou é composta
por múltiplos profissionais de diversas áreas ou de áreas afins”. (SOUZA,
2010, p. 18)

2. Equipe interdisciplinar – “uma equipe interdisciplinar se define


inicialmente tal como uma equipe multidisciplinar, onde múltiplas
disciplinas e saberes atuam e estão organizados para a execução de
determinada tarefa. No entanto, há aqui um diferencial que se caracteriza
pela interdisciplinaridade, inter-relação, intersecção, inteiração ou
qualquer ato de relacionar e relativizar as múltiplas disciplinas envolvidas
e/ou atuantes na tarefa em comum àquela equipe”; (SOUZA, 2010, p. 19)

3. Equipe transdisciplinar – “uma equipe transdisciplinar, decorre


portanto de uma equipe que já se constitua interdisciplinar, pois o
diferencial ocorre no transcender da comunicação, do compromisso e
do resultado decorrente desta forma de interação entre seus membros,
processo este que mobiliza fortemente sentimentos de coragem, parceria,
responsabilidade e prazer, o que retro alimenta a conduta de permanecer
transcendendo, em suas tarefas, naturalmente.” (SOUZA, 2010, p. 21)

Nesse âmbito, temos um desafio na prática em equipe de Saúde que é estipulado pela
complexidade e diversidade de suas áreas de formação profissional, no sentido de
congregar e integrar tais práticas num único campo de exercício e serviço de atenção e
cuidado em saúde coletiva:

A interdisciplinaridade na área da Saúde Coletiva coloca-se como


exigência interna, uma vez que seu objeto de trabalho - a saúde e a
doença no seu âmbito social - envolve concomitantemente: as relações
sociais, as expressões emocionais e afetivas e a biologia, traduzindo,
por meio da saúde e da doença, as condições e razões sócio-históricas
e culturais dos indivíduos e grupos. (MINAYO, M. C. S, 1991, apud
VILELA; NUNES, 2003)

Nesse contexto da atenção e do cuidado em equipe interdisciplinar em Saúde Mental,


retomamos alguns desafios para que a integração em equipe aconteça, tais como:
30
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

»» Rede de acolhimento.

»» Formação de vínculo equipe de saúde/profissional – usuário/família.

»» Cuidado humanizado.

»» Autonomia e participação do usuário.

»» Articulação e interação da equipe em rede.

Disponibilidade interna é então uma posição específica frente a situações muito


complexas, mas ainda mais frente a indivíduos fortemente acometidos por
um sofrimento mental que lhes é singular e ao mesmo tempo plural, pois traz
consigo uma avalanche de múltiplos sentimentos e pensamentos, oriundos de
muitas fontes ou de nenhuma que seja inteligível a olhos nus, ou a explicações
preconcebidas e que requer de seu interlocutor no caso o profissional da equipe
de saúde mental uma capacidade singular de ‘estar com’ simplesmente. (SOUZA,
2010, p. 39)

Nesse contexto, consulte as seguintes publicações do Ministério da Saúde:

“Humaniza SUS” (MS: Brasília, janeiro de 2004);

Reforma Psiquiátrica e Política de Saúde Mental no Brasil (MS, 2005).

Segundo o MS (2004), a humanização constitui-se como um processo de mudança


assim como uma política em saúde coletiva, que pode ser entendida conforme os seguintes
parâmetros:

1. Valorização dos diferentes sujeitos implicados no processo de produção


de saúde: usuários, trabalhadores e gestores.

2. Fomento da autonomia e do protagonismo desses sujeitos.

3. Aumento do grau de corresponsabilidade na produção de saúde e de


sujeitos.

4. Estabelecimento de vínculos solidários e de participação coletiva no


processo de gestão.

5. Identificação das necessidades sociais de saúde.

6. Mudança nos modelos de atenção e gestão dos processos de trabalho


tendo como foco as necessidades dos cidadãos e a produção de saúde.

7. Compromisso com a ambiência, melhoria das condições de trabalho e


atendimento.

31
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

Vimos - mais uma vez – reiterados, com o processo da humanização- aspectos e questões
levantados no trabalho de uma clínica ampliada que envolve uma atitude psicossocial.

Para tanto, para que um cuidado humanizado seja possível e posto em prática, alguns
critérios são estabelecidos pelos SUS, a saber:

1. A troca e a construção de saberes.

2. O trabalho em rede com equipes multiprofissionais.

3. A identificação das necessidades, desejos e interesses dos diferentes


sujeitos no campo da saúde.

4. O pacto entre os diferentes níveis de gestão do SUS (Federal, Estadual


e Municipal), entre as diferentes instâncias de efetivação das políticas
públicas de saúde (instâncias da gestão e da atenção), assim como entre
os gestores, trabalhadores e usuários desta rede.

5. O resgate dos fundamentos básicos que norteiam as práticas de saúde no


SUS, reconhecendo os gestores, trabalhadores e usuários como sujeitos
ativos e protagonistas das ações de saúde.

6. Construção de redes solidárias e interativas, participativas e protagonistas


do SUS. (MS, 2004)

Vimos então que uma prática interdisciplinar em Saúde torna-se fundamental e


necessária. O trabalho em rede envolve impreterivelmente o trabalho em equipe que
articule e inter-relacione saberes, formações e disciplinas na área. Constituem-se como
princípios e fundamentos do próprio SUS.

Seguimos então com propostas de trabalho em equipe multi e interdisciplinar, que


envolve necessariamente articulação, interação e integração de uma prática em Saúde
Coletiva.

Segundo Matos, Pires e Campos (2009), podemos considerar que:

1. “A atuação em equipe, para se dizer interdisciplinar precisa aproximar-


se da prática do trabalho desenvolvido em uma ‘equipe integração’ no
qual se produziriam relações com base na interação dos agentes e na
articulação dos saberes e fazeres. Interação é entendida como uma
prática comunicativa que se caracteriza pela busca de consensos entre
os/as envolvidos/as no processo de trabalho em saúde, de modo que
estes/as possam argumentar, reciprocamente, em relação ao trabalho
cotidianamente executado e construir um projeto comum. A articulação
representaria as conexões entre os diferentes saberes e fazeres envolvidos
32
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

no cuidado à saúde, conexões que se dão de modo ativo e consciente,


sendo evidenciadas pelo agir dos/das profissionais (PEDUZZI, 1998)”;

2. “A articulação e a interação dependem do modo de produção do trabalho


em saúde, de como os/as trabalhadores/as gerenciam e aplicam os
conhecimentos e técnicas próprias de cada profissão na produção das
atividades necessárias à atenção em saúde, de como se estabelece o
encontro entre os/as profissionais e destes/as com os usuários, dos
consensos e conexões produzidas neste encontro”;

3. A articulação e a interação na equipe interdisciplinar acontecem


considerando a assimetria das relações sejam elas entre os/as
trabalhadores/as ou entre trabalhador/a e usuário. No âmbito profissional
estão envolvidos conhecimentos e práticas distintas, reconhecidas e
valorizadas diferentemente no conjunto do trabalho em saúde. Nesta
perspectiva ouvir o/a outro/a, considerar cada contribuição na definição
do trabalho a ser realizado é parte da constituição de um trabalho de
natureza interdisciplinar. (MATOS; PIRES; CAMPOS, 2009)

Sobre a questão da complexidade e sua problemática interdisciplinar, você pode


consultar as seguintes referências:

»» “A cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento.”


(MORIN, 2000);

»» “O ponto de mutação: a ciência, a sociedade e a cultura emergente.”


(CAPRA, 1998);

»» “A questão da interdisciplinaridade no estudo da saúde coletiva e o


papel das ciências sociais” (NUNES, 1995);

»» “Interdisciplinaridade: uma questão que atravessa o saber, o poder e o


mundo vivido” (MINAYO, 1991).

Em sua prática de Saúde cotidiana, que desafios ou dificuldades comparecem


com mais frequência para um trabalho em equipe interdisciplinar?

Que soluções você pode apontar?

Campos e núcleos do saber

É preciso considerar a complexidade da área da saúde, uma vez que seu


objeto tem base conceitual situada em campos bastante distintos como

33
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

a Física, Epidemiologia, Ecologia, Biologia, Sociologia, Antropologia,


Psicologia, História, Ciência Política, Economia, Administração, Ética,
Genética, Educação etc. (NUNES, 1995) (VILELA; MENDES, 2003)

Temos que a Saúde Pública ou Saúde Coletiva constitui-se como um campo de saber
diversificado e complexo, isto é, são várias as disciplinas, ciências e experiências do
saber que contribuem para a formação da Saúde (Mental) no Brasil. No campo que nos
interessa aqui podemos citar a Psiquiatria, a Enfermagem, a Psicologia, a Sociologia,
a Epidemiologia, a Ciência Política, a Economia, a Ecologia, a Educação e a Ética –
dentre tantas mais, como ciências que se preocupam com a Saúde Coletiva.

Forma-se então um novo campo do saber que é a Saúde Mental:

A saúde mental, é uma especialidade dentro de especialidades pois


incorpora os conhecimentos da ciência médica psiquiátrica, da
sociologia, da psicologia, da antropologia, das ciências políticas, das
ciências ocupacionais e de enfermagem, dentre outras, tamanha é sua
complexidade. (SOUZA, 2010, p.13)

Assim como tais disciplinas, temos também nossas ações e políticas públicas que são
constituídas e avançam em prol de uma saúde pública digna no Brasil, que têm como
instrumento principal o SUS, suas diretrizes e serviços de atenção em saúde. Nesse
contexto, emerge a Saúde Mental no país e suas repercussões socioculturais.

Com a questão da Reforma Psiquiátrica e seus meios de articulação e (des)


institucionalização, temos a questão das instituições de Saúde que são avaliadas e
reconsideradas. O que advém aqui é o conceito de instituição e suas intervenções e
consequências.

Segundo uma abordagem que congrega a Psicologia e a Sociologia – formando uma


Psicossociologia ou uma Clínica Social, podemos viabilizar uma compreensão das
funções institucionais e seus propósitos, assim como seu campo de estudo e ação.

Conforme Bendassolli e Soboll (2011):

(...) A psicossociologia busca, dessa forma, investigar as reciprocidades


entre o individual e o coletivo, o psíquico e o social. A psicossociologia
contribui também para a compreensão dos processos grupais (dentro e
fora das instituições), das organizações e das instituições, oferecendo
importantes dispositivos de análise da mudança social. (...)

Considera ainda que os grupos, as organizações e as instituições são


mediadores da vida pessoal dos indivíduos e são criados, regidos e
transformados por eles. (p. 11)

34
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

Nesse contexto, notamos que os grupos e as organizações sociais são formados pelas
próprias pessoas e pelos profissionais envolvidos com determinada disciplina do saber
e assim podem transformá-los.

A Clínica Social – ou a Clínica Ampliada como vimos - assim pode ser desenvolvida e
articulada conforme saberes e experiências de cada profissional ou disciplina do saber,
em cada serviço ou instituição de saúde.

O que queremos ressaltar aqui é a peculiaridade com que cada área do saber constitui
sua perspectiva sobre o sujeito e sua rede de relações. Aqui, em Saúde, temos os usuários,
os profissionais, as equipes - todos envolvidos numa rede complexa e única de atenção –
formando um trabalho multi, inter e transdisciplinar.

Temos também a Epidemiologia como disciplina do saber diretamente vinculada ao


controle da saúde, pois estuda o processo saúde-doença, de modo a estabelecer uma
análise de seus fenômenos determinantes e condicionantes, e suas intervenções na
população humana:

A Epidemiologia é a ciência que estuda os padrões da ocorrência de doenças em


populações humanas e os fatores determinantes destes padrões (LILIENFELD, 1980).

(...) Saúde e doença como um processo binário, ou seja, presença/


ausência, é uma forma simplista para algo bem mais complexo. O que
se encontra usualmente, na clínica diária, é um processo evolutivo entre
a saúde e a doença que, dependendo de cada paciente, poderá seguir
cursos diversos, sendo que nem sempre os limites entre um e outro são
precisos. (MENEZES, pp. 1/2)

Na própria definição da Epidemiologia, vimos também a importância da consideração


dos fatores determinantes e condicionantes da saúde, assim como a noção de um sujeito
singular e coletivo:

Epidemiologia é o estudo da frequência, da distribuição e dos


determinantes dos estados ou eventos relacionados à saúde em
específicas populações e a aplicação desses estudos no controle dos
problemas de saúde. (J. LAST, 1995, em site: Saúde e Cidadania,
Vigilância em Saúde Pública, Livro 7)

Apresente e descreva uma situação de sua experiência profissional ou de seu


conhecimento em que foi aplicada a Epidemiologia para a intervenção em
Saúde. Como essa Ciência e Experiência podem contribuir para a formação dos
indicadores de Saúde?

35
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

No que tange às experiências e ciências do saber, temos também uma distinção que é
estabelecida – por alguns autores - entre Campo e Núcleo do Saber. Segundo Campos
(2000), essa distinção pode ser assim compreendida:

A institucionalização dos saberes e sua organização em práticas se


daria mediante a conformação de núcleos e de campos. Núcleo como
uma aglutinação de conhecimentos e como a conformação de um
determinado padrão concreto de compromisso com a produção de
valores de uso. O núcleo demarcaria a identidade de uma área de saber
e de prática profissional; e o campo, um espaço de limites imprecisos
onde cada disciplina e profissão buscariam em outras apoio para
cumprir suas tarefas teóricas e práticas (CAMPOS, 2000).

Temos que essa distinção concerne dois conceitos fundamentais que são:

1. formação de identidade profissional;

2. espaço ou campo de intersecção dos saberes.

O núcleo do saber diz respeito à identidade da prática profissional, enquanto que o campo
delimita uma área de exercício profissional que é multideterminada ou multidisciplinar.
São dois conceitos que se articulam aqui: identidade e campo de atuação profissional.

Deste modo, retomamos aqui a complexidade da formação e atuação na área da Saúde,


que se presta a uma diversidade de disciplinas e saberes em sua constituição de identidade
social e campo científico. A Saúde é assim uma área multidisciplinar por excelência. Uma
área que visa uma ação de complementaridade e integralidade, como bem indicada e
proposta nos princípios e diretrizes estabelecidos pelo SUS.

Segundo Campos (2000):

As práticas sociais, todas elas - a clínica, a saúde pública, a pedagogia,


a gestão e a política, poderiam produzir a infinidade de matizes entre
controle social (seres dominados) ou autonomia (cidadãos com liberdade
relativa). Essas práticas operam, em potencial, tanto em prol de reduzir
pessoas à condição de objetos sujeitados a algum poder, quanto no sentido
de multiplicar as possibilidades de sujeitos viverem mais livremente.
Essa liberdade significaria que, embora condicionados ao contexto e a
compromissos, estariam aptos a lidar com autonomia relativa diante da
objetividade das coisas e das relações sociais. (CAMPOS, 2000)

Nesse contexto, retomamos questões introduzidas pela Reforma Psiquiátrica em Saúde


Mental, tais como:

36
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

»» autonomia do sujeito;

»» controle e participação social;

»» cidadania e reinserção psicossocial;

»» (des)institucionalização.

Ainda conforme Campos (2000):

A saúde seria, pois, o resultado de um processo de produção. Um efeito


algumas vezes desejado e buscado, com o sentido dado por Sartre (1963)
ao termo, um vir-a-ser, um devir, um bem a ser conquistado conforme
bem o precisou Cecília Minayo (1991). Indicando um processo sobre o
qual intervêm práticas sociais, está relacionado tanto a necessidades
sociais quanto a práticas de intervenção e controle. A clínica e a saúde
coletiva produzem sempre saúde e controle. E o objeto sobre o qual se
intervém indica o compromisso assumido pelas práticas sanitárias.
No caso dos sistemas de saúde este objeto é representado pela doença ou
por situações que a potencializem, quer digam respeito ao indivíduo ou
ao meio. O objetivo, o fim, ou a finalidade desses serviços é a produção
de saúde. (CAMPOS, 2000)

Nesse contexto da potencialidade do indivíduo e do seu meio social, temos a posição


da Psicologia Genética e até da Ecologia como ciências que se preocupam com a
relação do homem com seu meio de convivência. A psicologia genética aborda
a questão do desenvolvimento humano e sua relação com o meio, assim como a
Ecologia preocupa-se com a situação e a interação da espécie humana – e os seres
vivos em geral – com a natureza e meio ambiente.

No campo da Ecologia em interação com a Economia, temos também a articulação


do homem com suas relações de produção e de trabalho, nas diversas áreas de sua
formação e elaboração. No que concerne como abordagem sistêmica aplicada à saúde,
temos que, segundo Capra (1998):

A concepção sistêmica de saúde baseia-se na concepção sistêmica de


vida. Os organismos vivos são sistemas auto-organizadores que exibem
um alto grau de estabilidade. Essa estabilidade é profundamente
dinâmica e caracterizada por flutuações contínuas, múltiplas e
interdependentes. Para ser saudável, tal sistema precisa ser flexível,
dispor de um grande número de opções para a interação com seu mio
ambiente... Seja qual for a natureza da flexibilidade – física, mental,
social, tecnológica ou econômica -, é essencial para a capacidade do
sistema que se adapte às mudanças ambientais. Perda de flexibilidade
significa perda de saúde. (p. 316)

37
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

Em relação à Economia propriamente, podemos dizer que, ainda conforme Capra (1998):

De acorda com a concepção sistêmica, a Economia é um sistema


vivo composto de seres humanos e organizações sociais em contínua
ação entre si e com os ecossistemas circundantes de que nossas vidas
dependem. Tal como os organismos individuais, os ecossistemas são
sistemas auto-organizadores e auto-reguladores (...). ( p. 381)

Logo, nesse contexto vimos a importância do funcionamento das organizações em


Saúde, assim como a questão da flexibilidade e adaptação do indivíduo em suas relações
e psicodinâmicas sociais.

Retomando então as ciências e experiências do Saber em Saúde Mental, temos uma


definição importante – que pode ser concebida no campo da Ética (em articulação com
a Ciência Política e a Economia, por exemplo) – do processo de trabalho em saúde que,
segundo Silva e Fonseca (2005), pode ser assim compreendido:

O que guia o processo de trabalho em saúde é um conjunto de


determinantes (EGRY, E. Y. 1996) de ordem:

a. estrutural – a lei orgânica da saúde, os princípios do SUS,


regulamentações, diretrizes e políticas públicas para o setor;

b. particular – a função do serviço na rede local de atenção, os


dispositivos de interdependência ou colaboração das ações no sistema
de saúde; e

c. singular – a forma de organização do serviço, modelo de atenção


operado institucionalmente e a capacidade do serviço produzir
saúde (nível de satisfação de clientela e trabalhador, resolutividade,
previsibilidade de ações, disponibilidade e capacidade de absorção
de demanda espontânea ou produzida nas ações interinstitucionais).
(SILVA; FONSECA, 2005)

Segundo a abordagem de Edgar Morin – precursor da Complexidade


– no Campo da Ética de um modo geral - temos que: “Como um ser
humano sintonizado com seu tempo, Morin reflete sobre o papel da
Ética nas sociedades a partir da própria experiência (...).

Morin sugere a urgência de constituição de uma identidade humanitária, de uma


consciência planetária, da ideia de Terra pátria, que significa a matriz fundamental
para a ciência com consciência e o sentimento de pertença que estabelece a ligação
entre a humanidade e a Terra.

38
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

(...) A contradição e atitude dialógica de Morin diante de sua caminhada


permitem-nos conhecer sua história de vida e compreender a produção
dele no campo das ciências, assim como a gênese do pensamento
complexo”. (SANTOS; HAMMERSCHMIDT, 2012, p. 562)

Nesse contexto, é introduzido o paradigma da Complexidade como visão da rede de


relações que se estabelece num contexto de uma organização de saúde, por exemplo, e
assim precisa ser compreendida e operacionalizada. São introduzidos dois princípios
fundamentais, dentre outros:

1. Princípio Sistêmico ou Organizacional: a Teoria dos sistemas traduz


outro princípio da Complexidade eleito por Morin, que é o Princípio
Sistêmico ou Organizacional, que permite ligar o conhecimento das
partes com o conhecimento do todo e vice-versa. Sabe-se que, de um
ponto de vista sistêmico-organizacional, o todo é mais do que a soma de
suas partes. (SANTOS; HAMMERSCHMIDT, 2012, p. 563).

2. Princípio da Auto-eco-organização: autonomia/dependência,


pois o conceito de autonomia só pode ser concebido a partir de uma
teoria dos sistemas ao mesmo tempo aberta e fechada; um sistema
que funciona precisa de uma energia nova para sobreviver e, portanto,
deve captar essa energia no ambiente. A autonomia se fundamenta na
dependência do ambiente, e o conceito de autonomia passa a ser um
conceito complementar e antagônico ao da dependência. (SANTOS;
HAMMERSCHMIDT, 2012, p. 563).

Conforme esses princípios supracitados, através do pensamento de Morin, temos que a


complexidade é condição e fundamento de uma prática interdisciplinar:

Assim, o pensamento complexo visa mover, conjugar, articular


os diversos saberes compartimentados nos mais variados campos
do conhecimento, sem perder a essência e a particularidade de
cada fenômeno, religando matéria e espírito, natureza e cultura,
sujeito e objeto, objetividade e subjetividade, arte, ciência, filosofia.
Considera igualmente o pensamento racional-lógico-científico e o
mítico-simbólico-mágico. O pensamento complexo se estabelece
como requisito como exercício da interdisciplinaridade. (SANTOS;
HAMMERSCHMIDT, 2012, p. 563).

39
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

Portanto, na reflexão da prática propriamente em Saúde, Santos e Hammerschidt (2012) –


em seu artigo sobre a complexidade e a relação dos saberes interdisciplinares – articulam
o pensamento de Morin com seu trabalho em Enfermagem, do seguinte modo:

A complexidade incita à construção da complexidade na Enfermagem/


Saúde, para a prática de inter-relação, de interdisciplinaridade e
interação, articulando os conhecimentos das diferentes áreas. Implica em
reflexão-ação-reflexão, um constante construir, descontruir e reconstruir,
que pode trazer contribuições para a evolução e inovação das práticas
profissionais como ciência e disciplina reconhecidas. (p. 565)

Vimos assim como todas essas práticas do saber estão interligadas e entrelaçadas numa
rede organizacional única e complexa de atenção e cuidado.

Compreendemos, portanto, que a prática interdisciplinar em Saúde (Mental) pode


integrar uma série de disciplinas e experiências do Saber, todas com uma exigência
Ética fundamental de consideração do sujeito humano e revisão da noção de cuidado e
atenção em Saúde Coletiva.

Como você articula sua prática em Saúde Mental com sua identidade profissional
e espaço ou campo do Saber? Eles se encontram em sua experiência profissional?

Estigma e discriminação
“Liberdade de expressão

Libertas quae sera tamen (Virgílio)

Seria livre expressão direito de manifestar

não importa o lugar em qualquer situação?

Seria o direito de pensar com ou sem paixão e também indagar


uma sutil intuição?

Deus nos livre do preconceito que tenhamos o direito de expressar


o pensamento

independente do momento.

Livrai-nos do macarthismo e também do fanatismo que matam a


criatividade

e o sonho de liberdade.”
(Ceciliano Ramos, 2010)

40
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

Estigma é um termo presente na sociedade desde a Grécia Antiga,


porém, é a partir da década de 1960 do século XX, com Goffman, que
lhe foi atribuído conceitos que tomam a sociedade como participante
do seu processo de formação. Estigmas: notas sobre a manipulação
da identidade deteriorada (1975), de Goffman, é o fundamento e o
estímulo de diversos outros trabalhos na intenção de conceituar e
refletir estigmas. (CIQUEIRA; CARDOSO, 2011)

Estigma e discriminação são abordagens conceituais e práticas em Saúde Pública e


Coletiva, tratadas como Campanhas e Temas – por exemplo – a serem trabalhados no
direcionamento da atenção e cuidado em Saúde, isto é, como diretrizes.

Segundo a Psicologia Social, existem valores e crenças – heranças culturais – do homem


que determinam a sua atitude assim como o seu comportamento em grupo:

A distinção, pois, entre psicologia social e outros setores da psicologia,


parece-me suficientemente clara, desde que atentemos para o fato de que
o que identifica uma determinada área da psicologia é a ênfase posta no
estudo de certos fenômenos psicológicos. No caso da psicologia social, o
que caracteriza é a ênfase colocada na influência de fatores situacionais
do comportamento interpessoal. (RODRIGUES, 1994, p. 29)

Nesse contexto, as definições de atitude e valor tornam-se fundamentais, pois determinam


o comportamento do indivíduo:

»» Atitude: “... definimos atitude como sendo uma organização duradoura


de crenças e cognições em geral, dotada de carga afetiva pró ou contra um
objeto social definido, que predispõe a ação coerente com as cognições e
afetos relativos a esse objeto.” (RODRIGUES, 1994, p. 359);

»» Valor: “Valores são categorias gerais dotadas também de componentes


cognitivos, afetivos e predisponentes de comportamento, diferindo das
atitudes por sua generalidade.” (RODRIGUES, 1994, p. 354);

»» Comportamento: “...O comportamento não é apenas determinado pelo


que as pessoas gostariam de fazer mas também pelo que elas pensam que
devem fazer, isto é, normas sociais, pelo que elas geralmente têm feito,
isto é, hábitos, e pelas consequências esperadas de seu comportamento.”
(TRIANDIS, 1971, p.14; apud RODRIGUES, 1994, p. 349)

Deste modo, podemos compreender o estigma e a discriminação como atitudes/


comportamentos resultantes de certos valores culturais. Em Saúde Pública, o que se

41
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

coloca é a necessidade de buscar e fomentar modos e meios de enfrentamento dos


processos de estigmatização e discriminação entre grupos sociais.

Goffman (1975) afirma que o estigma pode ocorrer devido a três circunstâncias:
abominações do corpo, como as diversas deformidades físicas; culpas de caráter
individual, como: vontade fraca, desonestidade, crenças falsas; e estigmas
tribais de raça, nação e religião que podem ser transmitidos pela linguagem.
Em todas essas tipologias pode-se encontrar a mesma característica sociológica:
“um indivíduo que poderia ser facilmente recebido na relação social quotidiana
possui um traço que se pode impor atenção e afastar aqueles que ele encontra,
destruindo a possibilidade de atenção para outros atributos seus” (GOFFMAN,
1975:14) (SIQUEIRA; CARDOSO, 2011).

Segundo Parker (2003), em Maksud (2014), tais conceitos – estigma e discriminação –


podem ser entendidos como processos sociais relacionados a estruturas específicas de
poder e dominação. Isto é, são atitudes que surgem nesse contexto de desigualdade
social. E, assim, podem ser compreendidos numa articulação – ou num trabalho
integrado – entre Saúde Coletiva e Direitos Humanos.

Parker identifica como os primeiros grandes esforços acadêmicos a


publicação dos livros de Gordon Allport (A Natureza do Preconceito,
de 1954) e de Erving Goffman (Estigma, de 1963). (Parte dos autores
da coletânea voltará a fazer menção a essas obras, em maior ou menor
grau). Parker nos mostra que, ao longo dos anos, a produção de
conhecimento relacionada a preconceito e discriminação esteve ligada
a questões ligadas ao racismo, ao passo que a maior parte das pesquisas
sobre estigma se deu em relação a várias doenças e, a partir da década
de 80, incrementou-se com a epidemia de HIV/Aids. (MAKSUD, 2014)

No contexto que nos interessa aqui, cabe avaliar as relações de trabalho que ocorrem
nas equipes e entre os profissionais de saúde, assim como entre usuários e profissionais,
e também entre gestores e profissionais na área. Sobre tais relações ou vínculos
de trabalho, precisamos estar atentos também aos processos de estigmatização e
discriminação ou violência simbólica que possam ser gerados. Segundo Maksud
(2014), Octavio Bonet – antropólogo social – levanta uma questão a esse respeito:

[...] como lidar com o paradoxo que se apresenta em relação a esses dois
modos de violência, estrutural e simbólica, nas politicas e programas
de APS como a ESF, que ao mesmo tempo que ajudam a diminuir as
desigualdades de acesso a saúde, e portanto a violência estrutural –
evitando que se produzam mortes evitáveis, por exemplo –, instauram

42
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

uma violência simbólica que se manifesta nos relacionamentos


cotidianos entre os profissionais da saúde e as populações alvo das
políticas e dos programas? (p. 50). (MAKSUD, 2014)

Notamos assim – mais uma vez–, que no contexto da atenção e cuidado em Saúde
Mental, precisamos estar atentos a tais processos sociais de estigmatização e
discriminação que tantas vezes, no histórico dos manicômios e instituições fechadas,
acontecem e se repetem e que são, veementemente, os motores ou instrumentos da luta
antimanicomial. Mais precisamente, conforme a compreensão que nos aponta Parker,
trata-se nesse caso mais de uma questão de estigmatização da doença mental, já que a
discriminação está mais associada ao racismo.

[...] estudar a discriminação como potencial agravo à saúde é um objetivo


social e cientificamente válido. Para que se possa alcançá-lo, contudo,
é preciso considerar alguns requisitos: a necessidade de trabalho
efetivamente interdisciplinar ao longo de todo o processo, desde o
desenho inicial até a análise dos resultados; a incorporação teórica
rigorosa da tradição de pesquisa social adotada; a participação, sempre
que possível, de indivíduos afetados pelo tipo de discriminação que se
deseja estudar, mas que também possam dialogar de modo próximo
com os pesquisadores (idealmente, que sejam eles próprios parte das
equipes de pesquisa); a constante vigilância contra a reificação de
categorias adotadas para estudo, que tenderia a reforçar precisamente
aquilo que se deseja evitar; a adoção de múltiplas técnicas de pesquisa,
adequadas aos diversos níveis de abrangência dos fenômenos estudados.
(MAKSUD, 2014)

Isto é, o estigma social surge aqui como um dos desafios a serem avaliados e
implementados – enquanto recurso de enfrentamento em prol da saúde mental – no
trabalho em equipe interdisciplinar e em rede social.

Ao reunir autores com perspectivas teórico-disciplinares variadas, o


intuito de Simone Monteiro e Wilza Villela de contribuir com o campo
da Saúde Coletiva brasileira com o desenvolvimento de pesquisas e
políticas voltadas para o entendimento do estigma e da discriminação
associados à saúde foi alcançado com enorme êxito. Com base na
integração de diferentes campos disciplinares, reconhecendo as
conexões – e desconexões – entre produção acadêmica da Saúde
Coletiva e as práticas que correm nos serviços de saúde ou na gestão,
as autoras sustentam que a compreensão entre condições de saúde,
estigma e discriminação deve “ir além da descrição das experiências

43
UNIDADE II │ O MODELO PSICOSSOCIAL

individuais e levar em contar os marcadores sociais da diferença que


historicamente produzem desigualdades, como classe social, gênero,
cor/raça, etnia, diversidade sexual, entre outros” (p. 17).” (MAKSUD,
2014)

Trata-se aqui então dos conceitos e representações histórico-sociais que foram gerados
e que permanecem sendo formados a respeito da doença mental e do sujeito portador,
sua abordagem e seu tratamento em saúde mental.

(...) Por fim, Bastos faz uma observação sociológica afirmando que, no
mundo social, o estigma se repete, se atualiza e se reinventa, demonstrando
a persistência de diferenciações e hierarquias nas sociedades. (MAKSUD,
2014)

»» “Estigma, Discriminação e Aids” (PARKER; AGGLETON, 2003);

»» “Estigma e Saúde” (MONTEIRO; VILLELA, 2013);

»» “O conceito de estigma como processo social: uma aproximação teórica


a partir da literatura norte-americana.” (SIQUEIRA; CARDOSO, 2011)

Curiosidade: princípios fundamentais:

I. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da


liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano,
apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos direitos
humanos.

II. O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de


vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de
quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violència,
crueldade e opressão.

III. O psicológo atuará com responsabilidade social, analisando crítica e


historicamente a realidade política, econômica, social e cultural.

IV. O psicólogo atuará com responsabilidade, por meio do contínuo


aprimoramento profissional, contribuindo para o desenvolvimento da
Psicologia como campo científico de conhecimento e de prática.

V. O psicólogo contribuirá para promover a universalização do acesso da


população às informações, ao conhecimento da ciência psicológica, aos
serviços e aos padrões éticos da profissão.

44
O MODELO PSICOSSOCIAL │ UNIDADE II

VI. O psicólogo zelará para que o exercício profissional seja efetuado


com dignidade, rejeitando situações em que a Psicologia esteja sendo
aviltada.

VII. O psicólogo considerará as relações de poder nos contextos em


que atua e os impactos dessas relações sobre as suas atividades
profissionais, posicionando-se de forma crítica e em consonância com
os demais princípios desse código.

(CÓDICO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO; agosto de 2005)

Quais recursos terapêuticos ou propostas de intervenção você pode viabilizar


em seu trabalho com a Saúde Mental no intuito de romper estigmas sociais? Que
relações existem entre tais recursos e sua formação e condutas profissionais?
Exemplifique.

45
MODELOS DE GESTÃO UNIDADE III

CAPÍTULO 1
Arranjos organizacionais e
gestão compartilhada

A organização das Nações Unidas vem incentivando essa visão de desenvolvimento


centrada no ser humano, por meio de conceitos como igualdade de oportunidades,
potencial do ser humano, segurança humana, eliminação das discriminações de
gênero, etnias, credos e culturas, de condições sócio-econômicas, de idade, de
deficiências, de respeito aos direitos da criança e do crescimento com equidade.

A ONU visa a três objetivos com respeito ao desenvolvimento: o crescimento, a


equidade social e a sustentabilidade... (BARRENNE; ETIENNETTE; ZURINGA, 2004)

Arranjos organizacionais
A instituição e gestão em Saúde Mental, assim como seus serviços e tratamentos,
também são revistos e rearranjados a partir do movimento da reforma psiquiátrica.
No cerne desta questão encontra-se o saber médico como núcleo centralizador
do trabalho em equipe em saúde e que, com novas propostas de gestão coletiva e
organização, também é transformado e assim descentralizado; modificando também
o processo do trabalho em equipe.

Partindo do fato de terem sido as equipes de trabalhadores, liderados


por grandes e influentes líderes dentre os próprios trabalhadores,
que efetivamente realizaram grandes mudanças no tocante à forma
de cuidar em saúde mental, ou seja, no tocante à forma de tratar os
doentes mentais, associados aos mendigos, desempregados, aos
marginalizados de toda sorte, percorre-se o fato de que tais equipes
não foram previamente planejadas, organizadas e montadas, mas, em
função de serem extremamente bem lideradas, cumpriram sua função.
(SOUZA, 2010, p. 13)

46
MODELOS DE GESTÃO │ UNIDADE III

Temos também a questão da formação e especialização de profissionais na área de


saúde que evoca as propostas de Educação em Saúde e Educação continuada, ambas
articuladas com as políticas públicas de atenção à saúde no SUS. Trata-se aqui de
uma questão de formação, desenvolvimento e competência profissional em recursos
humanos, que exige uma nova postura, assim como novo posicionamento diante de
uma equipe de trabalho.

O que se está trabalhando é com a ideia de investir-se também em


mudanças da estrutura gerencial e assistencial dos serviços de saúde,
criando-se novos arranjos que produzam outra cultura e outras
linhas de subjetivação, que não aquelas centradas principalmente
no corporativismo e na alienação do trabalhador do resultado de seu
trabalho. Tratar-se-ia de inventar uma nova ordem organizacional que
estimulasse o compromisso das equipes com a produção de saúde, sem
cobrar-lhes onisciência ou onipotência, e permitindo-lhes, ao mesmo
tempo, sua própria realização pessoal e profissional (CAMPOS, 1998,
1999).

Nesse contexto, evoca-se a constituição e formação de um sujeito singular e de uma


cultura peculiar que precisa ser atendida e avaliada. Alguns contrapontos podem ser
aqui ressaltados nesses rearranjos organizacionais:

1. Trabalho cooperativo entre os profissionais de uma equipe.

2. Parcerias que são estabelecidas entre serviços, instituições e profissionais


de saúde.

3. Equipe de referência – estratégia inovadora que surge com o processo da


desinstitucionalização em saúde.

4. Gestão coletiva de uma equipe multi, inter ou até transdisciplinar, e não


de um único profissional.

Deste modo, um dos arranjos organizacionais que acontece nas equipes de saúde é
a equipe de referência em Saúde, que se articula em torno da noção de vínculo
terapêutico:

Parte-se da suposição de que uma reordenação do trabalho em


saúde segundo a diretriz do vínculo terapêutico entre equipe e
usuários estimularia a produção progressiva de um novo padrão de
responsabilidade pela coprodução de saúde. Isto articulado, as diretrizes
de gestão colegiada (Campos, 1998) e de transdisciplinaridade
das práticas e dos saberes, possibilitariam uma superação de aspectos

47
UNIDADE III │ MODELOS DE GESTÃO

fundamentais do modelo médico hegemônico, conforme analisado


por uma série de autores clássicos (DONNANGELO, 1975; MENDES
GONÇALVEZ, 1979; LUZ, 1988).

Um novo arranjo que estimulasse, cotidianamente, a produção de


novos padrões de inter-relação entre equipe e usuários, ampliasse o
compromisso dos profissionais com a produção de saúde e quebrasse
obstáculos organizacionais à comunicação. (CAMPOS, 1999)

Trata-se então de um novo sistema de referência entre gestores, equipe de profissionais e


usuários em Saúde. Acontece a valorização do vínculo terapêutico como recurso condutor
de um trabalho em equipe em saúde, que está ligado a uma matriz organizacional ,
proposta do seguinte modo:
»» “no sentido vertical dispor as equipes de referência;

»» e no horizontal (linha de apoio matricial), os distintos profissionais com


a lista de atividades e de procedimentos oferecidos por cada um. Esta
disponibilidade deveria ser de conhecimento geral, e as indicações para
utilização destas atividades dependeriam da concordância trilateral: do
terapeuta de referência, do profissional que oferece a atividade matricial
e do próprio usuário.” (CAMPOS, 1999)

Temos aqui então um arranjo organizacional que viabiliza uma articulação entre
equipe, profissionais e usuários em Saúde, de modo a propor um trabalho conjunto
e acordado entre todos – uma concordância trilateral, no mínimo. Tal arranjo,
contudo, funciona como um dispositivo de conduta e trabalho, isto é, um recurso
transitório que visa introduzir um processo novo, com a instauração de novas técnicas
de funcionamento a favor da promoção e tratamento em saúde.

A distribuição de trabalho entre profissionais-referências (centralmente


medido pelo número e complexidade dos pacientes sob responsabilidade
de cada equipe) e aqueles dedicados ao apoio matricial horizontal
(números de procedimentos e horas despendidas em atividades
distintas) dependeria de um eterno ajuste e de uma negociação perene
entre a equipe e dela com seus coordenadores e supervisores.

Note-se ainda que este sistema matricial que combina referência


(trabalho mais polivalente) com oferta horizontal de serviços (trabalho
mais específico e especializado) permite valorizar todas as profissões
de saúde, tanto conservando a identidade de cada uma delas, quanto
empurrando-as para superar uma postura muito burocratizada, típica
do modo tradicional de organizar os serviços de saúde. (CAMPOS, 1999)

48
MODELOS DE GESTÃO │ UNIDADE III

O que acontece nesse arranjo é uma combinação de fatores e aspectos que viabilizam o
reconhecimento e o tratamento do sujeito em sua singularidade existencial e circunstancial.
Isto é, todos são considerados em suas peculiaridades de sofrimento, desenvolvimento
humano e especialização profissional, assim como dentro de uma proposta de integração
de disciplinas, saberes e responsabilidades.

O vínculo terapêutico como diretriz que reorganiza o trabalho em saúde entre equipe e
usuários – segundo Campos (1999) – dispõe assim de alguns aspectos fundamentais:

1. Novo padrão de responsabilidade.

2. Coprodução da saúde.

3. Gestão colegiada.

4. Transdisciplinaridade.

A Saúde, deste modo, é promovida por todos – todos assumem a responsabilidade de


seu cuidado e de sua produção, visando assim uma participação e gestão colegiadas.
A transdisciplinaridade – nesse contexto – surge como um desafio ainda maior do
que a multi e a interdisciplinaridade, pois precisa viabilizar um dispositivo de troca
de saberes e funções num único contexto de ações e intervenções em saúde. Segundo
Campos (1999):

“a transdisciplinaridade implica na abertura e articulação de campos


disciplinares e de campos de responsabilidade distintos.”

Portanto, esse novo arranjo institucional encontra a proposta de uma clínica ampliada
em saúde mental, por meio de práticas de atenção a uma saúde integral do ser humano.

A organização do serviço de saúde, nos termos de equipes básicas de referência –


segundo Campos (1999) – se dá conforme alguns critérios:

»» objetivo de cada unidade de saúde;

»» características de cada local, território ou região; e

»» disponibilidade de recursos.

Neste sentido, cada território tem certa autonomia de organização e gestão de seus
serviços e equipes de referência. Como por exemplo, a Estratégia Saúde da Família –
ESF – é uma estratégia de ação e gestão em saúde que cresce e articula-se com êxito nas
unidades básicas de saúde.

49
UNIDADE III │ MODELOS DE GESTÃO

Conforme Campos (1999), a organização da rede de saúde nesses serviços viabiliza


ainda mais recursos, tais como:

»» amplia a composição interdisciplinar dos projetos terapêuticos dos


usuários;

»» enriquece o próprio projeto terapêutico;

»» aumenta o cardápio de atividades matriciais (da rede de serviços


matriciais de apoio às equipes de referência);

»» cria mecanismos de aproximação e comprometimento entre pacientes e


equipe de referência;

»» permite maior visibilidade da qualidade do trabalho de cada equipe.

Com o objetivo principal de criar um modelo de atendimento – a cada usuário – mais


singularizado e personalizado, assim como potencializar o papel terapêutico do vínculo
entre equipe-profissional(is) e usuário(s). Possibilita ainda que cada profissional em
Saúde tenha um acompanhamento mais eficiente do processo saúde-doença-intervenção
de cada usuário.

Contudo, tais recursos também se apresentam como desafios à equipe e a cada instituição
ou unidade de saúde, pois – segundo Campos (1999) – depende de alguns quesitos,
tais como:
»» Acolhimento que viabilize aproximação entre usuário, família e profissionais
de referência.

»» Instituições de práticas individuais e coletivas.

»» Concordância trilateral entre terapeuta de referência, profissional que


oferece a atividade matricial e usuário.

»» Disposição da matriz organizacional no sentido vertical – de dispor de


equipes de referência, e no sentido horizontal, de dispor de distintos
profissionais em saúde.

»» Decisão de diagnóstico e intervenção terapêutica em equipe.

»» Estrutura organizacional tradicional em saúde não estimula a troca


interdisciplinar dos serviços e saberes, impedindo a construção das relações
transdisciplinares.

Segundo Campos (1999), algumas contribuições teórico-prático-conceituais


em Saúde contribuem para a implantação e funcionamento desses novos arranjos e
dispositivos organizacionais em Saúde Mental, tais como:
50
MODELOS DE GESTÃO │ UNIDADE III

1. A abordagem freudiana da noção de sujeito e inter-relação sujeito-sujeito


nos processos terapêuticos, através da dinâmica da transferência, instituída
por Freud como recurso técnico de análise – ou da psicanálise.

2. A contribuição conceitual de Pichon-Rivière do vínculo na clínica ESF –


no âmbito das relações de grupo.

3. As equipes de saúde e a noção de equipe de referência ESF – que institui


um vínculo cotidiano e corriqueiro nos serviços de saúde.

4. O movimento de Balint na Medicina Psicossomática em valorizar as


inter-relações nas práticas em saúde. (CAMPOS, 1999)

Sigmund Freud – na constituição das suas obras completas em Psicanálise – estabelece


uma noção de sujeito única e peculiar, que vai de encontro com o cuidado em saúde
mental de considerar o sujeito em sua singularidade. O sujeito em psicanálise é um
ser que acontece em transferência e que se constitui no decorrer de seu processo de
desenvolvimento ou subjetivação - como o próprio Freud trata, por exemplo, em seus
artigos “A dinâmica da transferência” (FREUD, 1912) e “Construções em análise” (1937),
dentre outros.

Nesse contexto, a Psicanálise traz em seu bojo teórico e prático os fundamentos e


instrumentos de uma clínica ampliada, conforme tratamos anteriormente. A Psicanálise,
conforme seu fundador é instituída como uma clínica, uma metapsicologia e uma
economia psíquica (ou psicodinâmica). Nesse contexto, a transferência estabelece-se
como um recurso técnico e terapêutico:

A transferência é classicamente reconhecida como o terreno em que


se dá a problemática de um tratamento psicanalítico, pois são a sua
instalação, as suas modalidades, a sua interpretação e a sua resolução
que caracterizam este. (LAPLANCHE; PONTALIS, 2001, p. 514)

A transferência define-se assim como recurso técnico analítico que viabiliza o surgimento
de um sujeito que precisa ser visto e tratado em suas experiências subjetivas peculiares.

Segundo Birman (1997):

A problemática do sujeito em psicanálise é fundamental, na medida em


que a experiência psicanalítica se realiza através da interlocução entre
sujeitos. (...)

Neste contexto, a prática psicanalítica pretende realizar a decifração


da verdade singular de uma individualidade, supondo que exista uma

51
UNIDADE III │ MODELOS DE GESTÃO

verdade latente no psiquismo que fundaria as apresentações patentes


do indivíduo. (p. 15)

“...o que se impõe na experiência psicanalítica não é primordialmente


o ideal de cura, mas a finalidade de constituição de um estilo para
o sujeito, que seria regulada nos registros ético e estético.” (BIRMAN,
1997, p. 12)

No que concerne à área da Medicina Psicossomática, a contribuição de Balint – em


termos gerais - também agrega uma compreensão dinâmica do funcionamento de um
processo saúde-doença e da relação profissional-paciente: “A visão psicossomática
coloca a doença como dimensão da vida (...)”.

Pode-se acrescentar que adoecer é, muitas vezes, como o grito dos órgãos no silêncio
do sujeito.
A medicina psicossomática é a medicina bio-psico-histórico-social, ou
‘medicina da pessoa’. Os seres vivos são seres históricos, no sentido de
que representam o resultado de uma longa sequência de modificações
estruturais.” (GERALDO CALDEIRA, “Relação Médico-paciente na
visão psicossomática”, em site: Psiquiatria Geral)

O espaço terapêutico é ampliado assim como a relação profissional de saúde e paciente


ou usuário, através da compreensão e abordagem desse vínculo terapêutico. Retomamos
aqui a importância do vínculo que é constituído entre profissionais, equipe e usuários
do serviço de saúde.

Num contexto de grupo, temos recursos técnicos que viabilizam a compreensão e


dinâmica do próprio funcionamento e da organização do grupo:

Pichon Riviére traz uma contribuição importante à dinâmica do trabalho em


grupos através do seu conceito e prática de Grupo Operativo, inclusive na área
da Saúde. Neste âmbito, sugerimos que consulte a seguinte obra: “O processo
grupal” (PICHON, RIVIÈRE, 1998).

Nesse contexto, temos a organização do trabalho em grupo conforme temas comuns,


que funciona como uma modalidade de grupo operativo em Saúde, nas unidades ou
serviços de Saúde, por exemplo. Conforme Soares e Ferraz (2007): “Na década de
1970, os grupos denominados operativos ganharam a atenção dos profissionais de
saúde pelo seu grande potencial de aplicabilidade e pela sistematização que traziam
para o processo grupal”.

A organização de grupos como modalidade de atenção coletiva à população tem sido


cada vez mais frequente nos serviços de saúde, o que se pode verificar pela participação
de muitos clientes em vários grupos nos centros de saúde.
52
MODELOS DE GESTÃO │ UNIDADE III

Em geral, esses grupos têm como critérios organizadores o tipo de


doença, a idade e outros. Dentre os benefícios dessa modalidade
de atendimento destacam-se: maior otimização do trabalho com a
diminuição das consultas individuais, participação ativa do cliente no
processo educativo e o envolvimento da equipe de profissionais com o
cliente. (SOARES; FERRAZ, 2007)

Deste modo, podemos destacar o grupo operativo como mais uma modalidade
organizacional do processo de trabalho em Saúde. Nesse caso, o grupo reúne-se em
torno de um tema ou tarefa comum, de modo a viabilizar a elaboração de conteúdos
psíquicos no grupo, como objetivo de mudança ou realização de uma tarefa proposta:

Foi Pichon-Rivière (1998), psiquiatra e psicanalista argentino, quem


elaborou, na década de 1940, a teoria do grupo operativo. Ele definiu
o grupo como um conjunto de pessoas, ligadas no tempo e espaço,
articuladas por sua mútua representação interna, que se propunham,
explícita ou implicitamente, a uma tarefa, interatuando em uma rede
de papéis com o estabelecimento de vínculos entre si. Assim, a teoria
dá grande importância aos vínculos sociais, que são a base para os
processos de comunicação e aprendizagem, considerando que o ser
humano é essencialmente um sujeito social. O grupo se põe como uma
rede de relações com base em vínculos entre cada componente e todo
o grupo e vínculos interpessoais entre os participantes. (SOARES;
FERRAZ, 2007)

Deste modo, os grupos operativos – ou coletivos – em Saúde também funcionam como


reforçadores dos laços ou vínculos sociais entre aqueles usuários que passam por
experiências de vida – ou de doença – comuns:

Os processos vividos no grupo geram uma ressonância, ou seja, o


processo individual entra no campo grupal provocando identificações
e reações em cadeia, conforme a distância psíquica entre os membros.
Assim, um membro serve de suporte para processos psíquicos de outros
membros e do grupo.

Consequentemente, o trabalho com o grupo visa à integração de duas


dimensões: a verticalidade, que se refere à história de cada participante,
e que o leva a uma reatualização emocional no grupo e a um processo
transferencial; e a horizontalidade, que se refere ao campo grupal,
consciente e inconsciente, que vai sendo modificado pela ação e
interação dos membros. (SOARES; FERRAZ, 2007).

53
UNIDADE III │ MODELOS DE GESTÃO

Deste modo, podemos articular aqui o trabalho de grupo com o trabalho da equipe
de Saúde, visando uma construção coletiva que reintegre as dimensões vistas neste
capítulo – verticalidade e horizontalidade - de um arranjo organizacional dinâmico
e dinamizador:

(...) Esses processos do grupo não são estanques e nem lineares. Há


um constante ir-e-vir entre os momentos. Para Pichon-Rivière (1998),
são aspectos do processo grupal que interatuam de forma dinâmica
permitindo mudanças no seu desenvolvimento. (SOARES; FERRAZ,
2007)

Mais um exemplo de arranjo organizacional em Saúde Mental que podemos citar aqui é
o modelo da atenção básica, articulado em torno da Estratégia Saúde da Família – ESF:

A articulação da atenção básica a uma rede substitutiva de cuidados à


saúde mental tem se estabelecido como uma das diretrizes históricas
para a consolidação da reforma psiquiátrica brasileira, que reitera a
centralidade da constituição de dispositivos de base comunitária e
territorial enquanto equipamentos importantes para que se supere a
iatrogenia da assistência à saúde mental hospitalocêntrica. (VECCHIA;
MARTINS, 2009)

Deste modo, a ESF estabelece um eixo organizacional que articula gestão e prática de
atenção à saúde, através de equipes multi e interdisciplinares, fortalecendo o vínculo
institucional e terapêutico.

Com a adoção da Estratégia de Saúde da Família (ESF) como eixo


para a reorganização da atenção básica em novas bases assistenciais,
consolidada mais recentemente na Política Nacional de Atenção
Básica, as equipes têm sido instadas a atuarem frente a questões
como dependência química, depressão e violência doméstica, de alta
prevalência na população em geral. Na medida em que a adscrição da
clientela em base territorial é um dos princípios operacionais da gestão
do processo de trabalho na estratégia de saúde da família, o vínculo e
a continuidade do cuidado tendem a gerar um confronto cotidiano dos
profissionais atuantes neste nível de atenção com questões relacionadas
a tais demandas. (VECCHIA; MARTINS, 2009)

Que novos serviços, arranjos organizacionais ou propostas em Saúde Mental


você conhece? Quais são os desafios que você encontra na efetivação ou
implantação desses serviços em seu trabalho em Saúde Mental?

54
MODELOS DE GESTÃO │ UNIDADE III

Gestão compartilhada

Organização de pessoas para um serviço determinado constitui uma


das definições de equipe, e é exatamente a forma de organização de um
grupo, que o tornará uma equipe.

Existem várias formas de equipes, pois, conforme são organizadas terão


um formato específico, que não estarão definidos apenas por configurações
protocolares, mas organizacionais, de liderança e propósitos.

Isto posto, considera-se ainda que uma equipe pode ser denominada
como multidisciplinar, interdisciplinar e transdisciplinar... (SOUZA,
2010, p.17)

Como introduzimos no capítulo anterior, a gestão em Saúde – assim como os serviços


prestados e os arranjos organizacionais – também passam por um processo de mudança
e descentralização: que reconhece uma equipe colegiada como gestora, assim como a
singularidade específica que é gerada a partir de novos modos institucionais em Saúde
Mental. O que se configuram são novos modos de subjetivação contemporâneos a um
modelo de desinstitucionalização da atenção e do cuidado, da reforma psiquiátrica e da
descentralização do poder e do saber nas mãos de um único profissional da saúde.

Como visto, as equipes começam a funcionar dentro de um esquema que congrega e


transversaliza verticalidade e horizontalidade, de modo a potencializar e reconhecer
todos os saberes e todas as especialidades profissionais num mesmo campo de atuação
integrado. Inicia-se uma cadeia transdisciplinar de saberes e contribuições à saúde do
indivíduo e do coletivo.

A Política Nacional de Humanização (PNH) reconhece claramente o


princípio da democratização como um dos requisitos da humanização
em saúde. A PNH, entendida como uma política que atravessa as
diferentes ações e instâncias gestoras do SUS propõe a transversalização
destas instâncias, reafirmando o exercício da descentralização e da
autonomia da rede de serviços e dos coletivos que integram o Sistema
Único de Saúde (SUS) (BRASIL 2006, 2004a). (TRAD; ESPERIDIÃO,
2009)

Aqui, a proposta de uma gestão compartilhada pertence aos domínios da política, da


ética e do contexto contemporâneo social. Segundo Trad e Esperidião (2009), a proposta
de uma democratização requer participação social e responsabilização dos indivíduos
em coletividade, visando a integração de unidades, serviços e relações cotidianas em
saúde numa rede única de atenção.

55
UNIDADE III │ MODELOS DE GESTÃO

Benevides e Passos (2005a) defendem a ideia de que a aposta da


humanização do SUS se faz pela produção de subjetividades, e esclarecem
que tal proposição não pressupõe a busca de uma equivalência ou
indiferenciação entre os múltiplos atores presentes no campo da saúde.
Eles refutam esta hipótese apoiados na convicção de que a posição
diferenciada que ocupa o conjunto de sujeitos da saúde resulta em
subjetividades díspares e conflitivas que produzem a realidade e são
produzidas por ela. Ao entender que as subjetividades são produzidas,
estes autores propõem que o trabalho de explicitação do plano de
produção do instituído deve ser acompanhado por um outro trabalho,
que é o de criar condições para a emergência de efeitos-subjetividades
compatíveis com as mudanças das práticas de saúde preconizadas pelo
SUS. Advertem ainda que a predeterminação daquilo que se espera
alcançar em termos de ação inventiva dos sujeitos envolvidos com o
processo de produção de saúde, dificulta o processo de valoração
dos processos de autonomia, protagonismo, corresponsabilidade ou
cogestão. (TRAD; ESPERIDIÃO, 2009)

E ainda mais:

Benevides e Passos (2005a) sugerem a ampliação do grau de


transversalidade das práticas e relações em saúde, o que permitiria
uma comunicação multivetorializada construída na interseção dos
eixos vertical (que hierarquiza os gestores, trabalhadores e usuários)
e horizontal (que cria comunicações por estames). O conceito de
transversalidade adotado pelos autores deriva de Guattari (1981) e diz
respeito ao grau de abertura que garante, às práticas, a possibilidade de
diferenciação ou invenção, a partir de uma tomada de posição que faz
dos vários atores sujeitos do processo de produção da realidade em que
estão implicados. (TRAD; ESPERIDIÃO, 2009)

Conforme Morin e Aubé (2009, apud SOUZA, 2010), as equipes podem diferenciar-se
conforme seus propósitos e objetivos – que são distintos – e assim os comportamentos
de seus membros podem ser agrupados em sete dimensões:

1. Cooperação.

2. Apoio psicológico.

3. Administração de conflitos.

4. Planejamento-organização do trabalho.

56
MODELOS DE GESTÃO │ UNIDADE III

5. Gestão dos recursos.

6. Apoio à inovação.

Dimensões essas que podem ser arranjadas em duas dimensões maiores: Gestão do
trabalho e Apoio interpessoal:

Quando os objetivos da equipe assumem um contorno com significado


para todos estabelecendo inclusive propósitos para o trabalho dos
seus membros, quando o ambiente para a equipe é favorecido por
seu líder, ou seu regente, a equipe se transforma num espaço para
que cada um dê sua forma de contribuição individual, pelo coletivo,
estabelecendo comunicações que darão suporte de volta à própria equipe,
formando um elo interligado, interdisciplinar, num crescem rumo à
transdisciplinaridade, então ao alto desempenho. (SOUZA, 2010, p. 23)

Conforme Carmello (2013), nossos gestores contemporâneos precisam transformar


estratégia em ação. Neste âmbito, temos um planejamento estratégico articulado
e integrado que precisa ser efetivado e posto em prática nas equipes de saúde e na
sua relação com a gestão e com os usuários. Isto é, os desafios da gestão colegiada,
da transversalidade e da inter ou transdisciplinaridade precisam encontrar caminhos
práticos de acontecer com eficácia, cumprindo com o objetivo de cada unidade e
organização em saúde.

Gestão da singularidade é a capacidade que uma organização e seus


gestores têm de maximizar seus resultados por meio da melhoria de
performance e inovação de sua equipe, construindo estratégias distintas
para talentos em níveis diferentes de performance, engajamento e
conhecimento. (CARMELLO, 2013, p. 12)

Entramos aqui com conceitos organizacionais e da formação dos recursos humanos,


que são aplicados também a uma equipe e à gestão em Saúde. Nesta gestão do singular,
precisamos reconhecer cada sujeito em sua individualidade e especialidade pessoal e
profissional, para distinguir talentos e oportunidades de atuação e exercício profissional.

Carmello (2013) ressalta três características fundamentais para a gestão, que precisam
estar conectadas e articuladas entre si:

1. Orientação – orientar é oferecer aos talentos a direção a ser percorrida.


O gestor representa a bússola, o farol, o norte.

2. Engajamento – engajar é explicitar as regras, as condutas, os valores e


os princípios necessários para competir com ética e eficácia.(...) Engajar

57
UNIDADE III │ MODELOS DE GESTÃO

também é minimizar ou eliminar os bloqueios e barreiras de performance


que impedem a equipe de manifestar autonomia, excelência e foco no
propósito estratégico.

3. Capacitação – é acompanhar e treinar funcionários. É também atualizar


constantemente as equipes para que possam aprender novos procedimentos
e tarefas nos momentos de mudança.

Neste contexto, a Educação em Saúde - assim como a Educação Continuada – surgem


como recursos de desenvolvimento de uma equipe em saúde, por exemplo. Se tomarmos
como modelo a equipe de referência em saúde, podemos maximizar e estender tal
capacitação para toda e qualquer unidade e organização em saúde.

Em todo sistema de serviços de Saúde, são os trabalhadores (profissionais


de nível superior, técnicos e auxiliares na área), junto aos usuários, que
efetivamente definem os serviços que serão produzidos, quando, onde,
em que quantidade serão consumidos e, portanto, o impacto que terão
esses serviços sobre a condição de saúde das pessoas. Por isso, o êxito
das ações de saúde depende, em grande parte, da efetividade e qualidade
da gestão do próprio processo de trabalho de cada um dos trabalhadores
da área. (BARRENNE; ETIENNETTE; ZUNIGA, 2004, p. 21)

Nesse âmbito, a Educação Permanente surge como mais uma estratégia em Saúde –
política adotada pelo próprio governo federal – que tem como meta a reestruturação
das práticas de formação, gestão e controle social nesse setor:

A discussão sobre a educação permanente dos profissionais passa a ser


fundamental e estratégica para a consolidação do Sistema Único de
Saúde (SUS). O plano de reordenação política de recursos humanos no
SUS preconiza a educação permanente no trabalho visando alcançar
perfis profissionais orientados pelas necessidades da população, em
cada realidade regional e em cada nível de complexidade. Aponta que
esta qualificação se dá frente a ações concretas do mundo do trabalho.

A educação permanente parte do pressuposto da aprendizagem significativa.


Os processos de capacitação do pessoal da saúde devem ser estruturados a
partir da problematização do processo de trabalho, visando à transformação das
práticas profissionais e a organização do trabalho, tomando como referência
as necessidades de saúde das pessoas e das populações, da gestão setorial e o
controle social em saúde.

58
MODELOS DE GESTÃO │ UNIDADE III

A educação é o processo pelo qual a sociedade atua constantemente sobre o


desenvolvimento do indivíduo, no intuito de integrá-lo ao modo de ser vivente. É um
processo político situado no tempo e no espaço. Um verdadeiro processo de educação
não pode ser estabelecido se não por meio de uma análise das necessidades reais de
determinada população.

O trabalhador, para conseguir uma melhor qualidade de vida, é obrigado


a trabalhar ao mesmo tempo em que se educa. Assim, o desenvolvimento
com uma educação que corresponda às necessidades das pessoas
durante a vida, atrai pessoas comprometidas com a sociedade em que
vivemos. Para tal feito, o fenômeno da educação permanente atraiu a
atenção de numerosos educadores. (TAVARES, 2006)

Temos aqui, portanto, a articulação da Saúde com a Educação em seu aspecto prático e
contingente no SUS, de modo a caracterizar a Educação Permanente como:

»» uma estratégia política de ação;

»» uma qualificação e capacitação profissional;

»» um modelo ou um recurso da educação e desenvolvimento humano; e

»» uma educação continuada em Saúde.

Portanto, o que a gestão coletiva em saúde nos viabiliza aqui é uma gestão que compartilha
seus principais aspectos de direcionamento e funcionalidade do processo de trabalho de
uma instituição, de uma equipe de trabalho e seus gestores, assim como de seus usuários,
a saber:

1. Corresponsabilidade dos atores sociais.

2. Autonomia e participação social.

3. Descentralização do poder ou da coordenação.

4. Reconhecimento do sujeito e geração de subjetividades distintas e


peculiares.

5. Transversalização da atenção e transdisciplinaridade.

6. Democratização das relações e valorização da cidadania.

7. Promoção da igualdade na atenção e humanização do cuidado em saúde.

8. Gestão colegiada.

59
UNIDADE III │ MODELOS DE GESTÃO

Todos esses aspectos passam a integrar o “modus operandi” do sistema de saúde como
um todo – de tal maneira que todos são responsáveis pelo seu bom funcionamento e
pela sua gestão. De uma rede social integrada, coletiva e autônoma. Todos precisam
estar capacitados e articulados nessa rede.

Quando se menciona a rede que, necessária, deve amparar as ações das equipes,
se remete a um sistema que irá se constituir em áreas e setores distintos entre si
em características e objetivos, mas interligados compondo um todo complexo.
(SOUZA, 2010, p. 68)

Que mais aspectos você pode evocar numa rede de atenção à saúde? Como esses aspectos
são implementados em seu trabalho profissional e cotidiano em saúde mental?

60
Para (não) Finalizar

As equipes de saúde mental estão escrevendo na história da humanidade uma


nova maneira de ser equipe, e de alta performance; estão, porém, pagando um
alto preço por isso. À medida que no exercício horizontal e não mais vertical
de organização, condição novíssima de atuar (TANURE; EVANS; PUCICK, 2007), e
crescer, se expõe e se diferencia, mexendo com os velhos temores e inseguranças
humanas, que precisa manter sob rigidez de normas e condutas, tudo quanto não
domine, e faz isso não para prevenção do sofrimento e da responsabilidade com
o que é público ou de outrem como cabe a um cientista, mas para a prevenção
e proteção de si próprio, e de seus próprios medos e dores. (SOUZA, 2010, p. 44)

No contexto da Reforma Psiquiátrica e formação e atuação das equipes e do trabalho


em Saúde Mental, consideramos o conceito e o cuidado em Reabilitação Psicossocial,
de modo a conceber uma clínica ampliada em Saúde, que acontece nos campos social,
político e ético – macro – assim como nas áreas clínicas – micro; de uma rede social.

Vimos assim que aspectos tais como identidade, subjetividade, diversidade


tornam-se cruciais e imprescindíveis no âmbito dessa prática ampliada em Saúde
Mental; considerando como princípios fundamentais desta prática a singularidade,
o limite (ou contorno) e articulação – que se constituem nesse processo de
desinstitucionalização.

Nesse âmbito, apresentamos uma rede relacional de práticas e saberes vigentes em


Saúde Mental e do desenvolvimento humano. Vimos que a atenção em Saúde Mental
exige uma atitude psicossocial diferenciada e articulada com diversos campos do saber
e da prática profissional, visando uma abordagem interdisciplinar e integrada.

Precisamos enfatizar aqui a contribuição da Psicologia como ciência e prática em


Saúde Mental, articulada como os demais saberes, assim como instaurando um
novo posicionamento ético de conduta e abordagem na área da Saúde e no cuidado
humanizado – da subjetividade humana: seus laços sociais, enlaces contextuais e
heranças conceituais.

Destacamos também a contribuição da psicanálise em prol de um novo posicionamento


ético no tratamento à doença mental e consequente transformação social na atenção e
cuidado em rede social.

61
PARA (NÃO) FINALIZAR

Nesse intuito do cuidado humanizado e de uma prática integrada em Saúde, vimos


também a constituição de equipes interdisciplinares e a importância de sua atuação
em rede social, em consonância com os princípios do SUS e recursos dos serviços e
instituições em saúde mental e clínica ampliada.

Destacamos então a importância de uma prática inter ou transdisciplinar em Saúde,


que alcance aspectos tais como autonomia, responsabilidade, cooperação, coletividade,
dentre tantos que visem e integrem uma atitude profissional de desinstitucionalização.

Nesse contexto, vimos também a questão da estigmatização e discriminação social


como um fator social que precisa ser revisto, reconhecido e transformado na prática de
atenção aos transtornos mentais - aos usuários em sofrimento ou inabilidade mental.

Por fim, destacamos as organizações sociais, a formação dos recursos humanos e a


gestão coletiva em Saúde Mental em conformidade com o desenvolvimento das equipes
e dos serviços em saúde, de modo a acolher todos os saberes e práticas numa dinâmica
ou constituição que integre os sujeitos numa única rede social e compartilhada.

62
Referências

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