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\ (GS Pr ROwor' Os desafios do ensino de Historia Os principais desafios apresentados ao professor do ensino fundamental na drea de Histéria sao: Cc NSDAS ~* conceber o aluno como sujeito histérico; — “Ti abideclu tee fO. Me * partir da realidade do aluno para ensinar Hist6riasQu.oin Ro acer | colaborarcom aformagéo do pensament rin spe os estudanes: J + educar para a construcio da cidadaniay ANE Qh. + educar para desenvolyer a solidariedade entre os alunos ¢ ha com [dade em que vivem: Dare. Browenryenscd) Reo) Firelesidek + trabalhar com temas transversais e com as novas temdtieas (direito das ctiangas, adolescentes e idosos; Historia e cultura afro-brasileirae indigena). Neste primeiro capitulo, compreenderemos melhor o significado de cada um desses desafios e veremos como 0 professor pode lidar com eles no seu dia a dia ao ensinar Histéria para criancas. CONCEBER O ALUNO COMO SUJEITO HISTORICO A compreenséo do aluno como sujeito no processo histérico & uma exiggn- ia encontrada nas propostas pedagégicas do estado de Sao Paulo, desde a 10 ENSINO DE HISTORIA PARA O FUNDAMENTAL 1 js, desde 1996. Ey wo . ionais, des Tae década de 1980, ¢ nos Parimetros Curriculares Nacio pode contribuir par, . istorico . nto hist’ er? Quer dizer que | pode ajuda-la g ciéncia de seus parte da constatagio de que o conhecime 0 desenvolvimento da identidade. Mas 0 que ensinar Historia par sso quer diz fFundament® a tomar con em que Vives € Conhe: de onde veio, ela tem : ef uma crianga no ensine Isso represen o ambiente Pensar sobre sua propria historia habitos, comprecnder melhor a cultura ¢@ amy" Ae cera realidade de seus colegas. Ao descobrir quem ¢ condigées de projetar para-onde vaiz Uma forma de levar a crianga a CO! la a observar semelhangas € diferengas, PO maior dai, ela descobre que todos possuem histdria. © ara localizar a crianga ne se Teco umano de: torna-la capaz de se reconhecer como ser hi o longo do tempo. 4 : de Histéria no nivel fundamental | sca realidade que a cerca éestimulg- ncaa se mudangas. A partir potencial do ensino de seu contexto €, assim, ntro de um sistema de permanéncia Histéria & pois, contribui relacées sociais que foi formado ao I Contudo, a importancia do enstom cue afeta também a sociedade, ultrapassa 0 ambito do aluno individual, ja cl anclemos que a educacio é sendo uma forma de educar para acidadania. F ee eeeeene tum desafio continuo que vai além das competéncias rel ps cos const dos excolares eabrange a questao dos direitos e deveres ¢ a convivéncia social Em relagio aos conteiidos escolares, hd instrumentos de avaliacao o| iciais que sinalizam os problemas ¢ as conquistas. No entanto, quanto & cidadania, nado temos instrumentos precisos de andlise, mas temos termémetros que demonstram o desconforto social, a indignacdo diante das injusti¢as, a percep- sao das dificuldades causadas por manifestagdes de desrespeito e violéncia, a consciéncia dos problemas ligados 4 desigualdade social. Diante disso, nao ha como negar a importancia de se proporcionar, na escola, situagdes capazes de Promover comportamentos favordveis ao respeito mtituo e atitudes que visem o bem comum. Na escola, e particularmente nas aulas de Histéria, também é possivel levar os alunos a avaliar as consequéncias das agées humanas ¢ a prezar a conquista de direitos, entendendo as lutas empreendidas para que eles fossem socialmente reconhecidos. Conceber 0 aluno como sujeito histérico também implica sen em relacdo as suas responsabilidades sociais, que tendem a crescer com 0 tempo. Para isso, é preciso que ele aprenda a Tespeitar o “outro” especificidades culturais e experiéncias de vida. A Historia é cap: ilizd-lo_ » com suas pe az de levar a crianca a se colocar na pele das outras pessoas ea perceber pontos de vista OS DESAFIOS DO ENSINO DE HISTORIA. 14 alternativos, nao sé de seus contemporaneos, mas também de gente que viveu em outras épocas ¢ lugares. E ébvio, portanto, que ndo estamos falando aqui daquela Histéria pobre e esquemitica na qual os fatos sio abordados isoladamente, ¢ os alunos nao passam de meros expectadores. Falamos, sim, da Histéria capaz de aproximar os alunos da compreensao das dindmicas dos fendmenos sociais. Além disso, se 0 aluno nao se enxergar como alguém integrado a um contexto ¢ com um papel relevante a desempenhar, nado poderd participar ativamente da vida em sociedade e nao reconhecerd as necessidades das pessoas que o cercam, os problemas de sua comunidade (em sentido micro ¢ macro) ea importancia das lutas pelos direitos humanos. O rcn de Histéria (Brasil, 1997a: 7) & bem claro nesse ponto, pois coloca entre os objetivos gerais: [ud compreender a cidadania como participagio social e politica, assim | como exercicio de direitos € deveres politicos, civis ¢ sociais, adotando, no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperacao € reptidio as injustigas, respeitando 0 outro e exigindo para si o mesmo respeito. Conhecer asi mesmo as identidades individuais, sociais e coletivas € um dos primeiros passos no Zaminho que leva 3 cidadania plena, Para que o professor do ensino funda- imental corresponda a essa proposta ele deve partir da realidade do aluno ¢ ajudar o estudante a formar um pensamento critico, considerando sempre a dade dessa crianca ¢ as possibilidades de ago € reflexao que ela possui. PARTIR DA REALIDADE DO ALUNO Partir da realidade do aluno para ensinar Hist6ria significa tomar o coti diano dos alunos como a primeira referencia. Como isso pode ser feito pelo professor? Ele deve primeiro conhecer 0 universo sociocultural especifico_ dos garotos para quem da aula, seus valores, seu modo de | Talar, sua visio de mundo: Para isso, entre outras coisas, € necessario perguntar as criangas © que elas pensam e, em seguida, considerar suas respostas como ponto de partida para novas perguntas. Obtém melhores resultados aquele professor que ouve os alunos do que aquele que simplesmente “passa a materia” como. se apresentasse um mondlogo diante de uma plateia silenciosa ¢ apatica, Na primeira etapa do ensino fundamental, os alunos tém entre 6 anos. Durante essa épaca da vida, as intervengbes pedagdgicas mais of Kapa) ou seja, estimulam os alunos a participar atiy aprendizado. Em outras Palavras, os alunos aptende imaginar, pesquisar, analisas, compa sio as que aay mente do processo melhor quando sao levados a pensar, suas ideias com as dos colegas. ae Ao longo deste livro sao apresentadas diversas sugest6es de trabalho, y fessor resolve levar os j priticos. Por hora, basta comentar que, S€ © PFO! 98 alunos atividade bem antes da vis, a um museu, por exemplo, pode comegar a a Visita, levantando em classe e anotando em um local para que todos vejam (pode ser em uma cartolina, ou na lousa...) as ideias dos alunos sobre “museu”, ¢ ele fizer uma tabela com 3 colunas, pode intitular a primeira com “o que sabemos sobre museu” e as outras duas com “o que vimos no museu” € “o que descobrimos com a visita ao museu”, respectivamente, para serem preenchidas apés a visita. Dessa maneira, estard partindo do que os alunos sabem (valori- zando com isso seu conhecimento prévio sobre o assunto) para, em seguida, ampliar seu repertério, levando em consideracao o que eles puderam observar e, finalmente, o que descobriram de significativo depois da experiéncia. Nessa etapa do trabalho, portanto, é muito importante prestar aten¢4o ao que eles tém a dizer. A seguir, um exemplo de uma tabela preenchida com ideias de uma classe que visitou um museu brasileiro com objetos do século xix. [0 que sabemos sobre museu_[O que vimos no museu ‘O que descobrimos * O museu é um lugar de coisas |* Tem um lugar para cada coisa. |* Eu descobri coisas de pessoas velhas. * Escé organizado. que viveram em outras épocas. + Nele tem coisas que nao se usa] * Uma pessoa explicou como as} * Que os escravos eram presos mais, pessoas antigamente usavam a| com ferros e devia doer. * Omeu pai doou uma maquina] _carroga. * As coisas que esto 14 foram de para o museu. * Eu vi as algemas dos escravos| pessoas como a gente. + Eu nunca fui 20 museu. € pareciam ser muito pesadas. E, depois de ouvir os alunos, qual o passo seguinte? E ajudar as criancas -a.reconhecer que cada. uma-delas também tem uma historia e que esta his- t6ria est relacionada com a de outras Pessoas: a sua, a de seus pais, a de sua fami : un 2 cidade, estado, pais e mundo, _ mplo da visita a0 museu, o ambito da atividade pode ser ampliado com o professor pedindo aos alunos que busquem com ae objetos que guardam hd muitgs anos. Nesse contexto, eles podem fi t : xt vor va De Sed cau cds uate EOS. osvesarios po ensinooeHistoRIA 4 3 igar os motivos que levaram as pessoas a guardar aqueles objetos € as ve jucmidtias que suscitam em sua familia, O professor pode incentivar cada aluno a escolher um objeto para guardar com 0 objetivo de ter, no futuro, algo que o lembre de uma época de sua vida que oajude a contar (para amigos, familiares, seus proprios filhos) parte de sua histdria (um brinquedo preferido, um presente de alguém muito queri- do...). Nesse trabalho simples, entre outros ganhos pedagégicos, 0 professor mostra que valoriza o patrimdnio sociocultural do educando. Osalunos podem ser estimulados a fazer, na escola, sua prépria exposigao de objetos, cada um deles acompanhado de um pequeno cartéo explicando asua origem. E possivel, ainda, criar coletivamente critérios de classificagao dos materiais coletados a partir de orientag6es simples sobre catalogacao de documentos. A caracterizagao dos objetos pode ser ampliada dependendo da faixa etdria dos estudantes, sendo interessante incluir dados sobre a época em que foram produzidos e comparé-los a objetos similares que existem atu- almente. Os desdobramentos provocados por esse tipo de atividade acabam atribuindo novos significados ao conhecimento prévio dos alunos e facilitando sua percepcao de outras realidades, mais “distantes” do seu cotidiano. ‘Ao serem capazes de reconhecer que eles préprios t¢m uma histéria, os alunos esto prontes para, com 0 auxilio do professor, desvendar as relagdes entre a sua realidade e 0 patriménio cu cultural da bumanidade (Pinsky e Pinsky, 2003). Para isso, o professor deve trabalhar simultaneamente com esses dois universos culturais. Dessa forma, estard ajudando os alunos a organizar repertérios culturais que possibilitam a compreensio do tempo e do espago nos quais estao inse- tidos, aprendendo, por exemplo, a interpretar cada histéria individual como resultado de um passado, 9 que requer compreender os habitos, a cultura, os valores, as tradic6es, a tecnologia de uma época, e também entender como as pessoas que a viveram agiram em fungio desse contexto. O aluno, entio, sera capaz tanto de estabelecer uma identidade com as pessoas no passado, percebendo, em sua humanidade, em qué 1é cle e elas podem ser er semelhantes, quanto perceber suas s di iferengas, aprendendo a detectar, no estudo comparativo entre passado e presente, a ocorréncia « de mudangas. Nas palavras da proposta curricular, a construgao da Histéria implica em considerar os diferentes sujeitos que so dotados de vontade e que estio situados em diferentes presentes (Brasil, 1997a). Essa ideia pode ser passada 14 ENsINO DE HISTORIA PARA O FUNDAMENTAL 1 iras ¢em varios momentos de sua vida escolar 1e a realidade na qual clas e: cultivam, 0 transporte que para as criangas de muitas mane! Se o professor conseguir faze-las perceber qu amizades que resenta apenas uma pequena fragio de ando um grande passo. Ao mostrar, ruas pelas quais as criangas ri que as limpa, inseridas — a vida que levam, as em que moram... — FeP! utilizam, aca ja estard d s possibilidades de viver, infinie a existencia ea conservagio d ra a escola tém a ver com 0 gal dos habitantes, a organizagao considera (ou nao) os riangas para um mais complexas anterior. Com o por exemplo, que passam todos os dias ao ir pa as necessidades de locomogao administragao publica que o professor chama a atengao das c ‘éncia de relagées sociais urbana, a coleta de impostos, as agées da problemas da populagio, universo mais amplo e para a exist ram capazes de identificar num momento ; fessor em boas aulas de Histéria, os alunos 5 de uma construgao dinamica es maneiras de viver € que as que elas € tempo € 0 investimento do pro! poderio compreender que a histéria € fruto das relagGes entre as pessoas, que acolhe as diferentes m Se o professor se empenha em mostrar que passado ¢ presente nao consegue fazer com que 0 didlogo entre ue saberao estabelecer relagdes conviver. “ocuipam compartimentos estanques, ambos fique mais evidente para os alunos, 4 entre tempos, espacos, trajetérias, causas € consequéncias. No primeiro ciclo do ensino fundamental, osalunos iniciam uma longa cami- hada no sentido de, aos poucos, ir percebendo que todos sao atores da hist6ria: homens, mulheres, alunos, negros, indios, lavradores, operdrios, empregados... E comecam a compreender a capacidade do ser humano, em todas as épocas, de criar (e destruir), organizar-se e viver em sociedade. Vale lembrar que tudo isso nao ocorre de um momento para 0 outro, trata-se de um processo. E, nesse processo, 0 aluno precisa de atividades nas quais ele nao receba o conhecimento passivamente, pois nao é a organizacao curricular que dard ao aluno o “sentido de mundo”, e sim a. capacidade de interagir com as informag6es que esto a sua volta, Isso s6 se conségiié com estimulos desafiadores esituagées em que ele possa pesquisar, comparar, classificar, analisar, imaginar, criar ¢ se expressar (por escrito ou de muitas outras formas, e por meio de diversas linguagens). Atividades e sugestées praticas como as que ja foram apresentadas podem ier encontradas a partir da segunda metade do capitulo “O saber histérico ‘0 ensino de Histéria”, Elas foram especialmente elaboradas para que © trabalho com a realidade do aluno supere a fase i see icial de “o que vocé sabe obre isso? sibili i : 5 » possibilitando descortinar um mundo de descobertas pela agio. Ses FORMAR O PENSAMENTO CRITICO~}5 i i A os vesarios oo ensino ve HisToRIA 15 A . Ari Seg Gib Gy Ther Cnr {5 row 46 Em muitos manuais € livros teéricos, lemos que um dos papéis do amente € que essa tarefa é professor é cusinar aos seus alunos a pensar er ginda mais importante quando a matéria é Histéria. Pois bem, 0 que muitos textos nio falam € 0 que isso quer dizer concretamente quando tratamos de etiangas dos cinco primeiros anos do ensino fundamental. Sera possivel realizar essa proposta com gente de tio pouca idade? Acreditamos que sim e apresentamos aqui nossas sugestes-para os professores que se dispoem a liderar essa empreitada, > -Cf{U , olan Gpek Quaid ren de Histéria Brasil, 1997a: 8) alseteene objetivo do ensino que o aluno seja capaz de “questionar a realidade formulando-se proble- mas e tratando dé resolvé-los, utilizando para isso 0 pensamento légico, acriatividade, a intuigao, a capacidade de andlise critica, selecionando procedimentos € verificando sua adequagio”. Esse objetivo pode ser resu- mido na expresso “formar o pensamento critico”. O pensamento critico exige capacidade de reflexio, ¢ isso s6 se adquire com amadurecimento e muito treino. Porvanto, é fundamental apresentar aos alunos, desde os primeiros anos da escolaridade basica, situagées simples que os levem a exercitar esse pensamento critico. Como fazer isso com criangas? Propondo-lhes perguntas estimulantes. Estando atento as suas respostas (é bom lembrar que a opinido emitida é baseada no que 0 sujeito conhece sobre o assunto em pauta, estando impli- citos, também, os valores que a pessoa possui). E, a partir delas, elaborando novas perguntas. Por exemplo, diante de uma noticia de jornal sobre algo que possa in- teressar aos alunos (levando em conta sua pouca idade), o professor pode perguntar-lhes: “O que o repérter descobriu?”, “Como o repérter sabe tanta coisa?”, “Quantas pessoas ele entrevistou para escrever a matéria?”. Ou diante de uma pequena narrativa em que um personagem toma uma atitude: “Por que sera que ele fez isso?”, “O que ele poderia ter feito para resolver melhor a situagao?”. E bom lembrar que, nesse caso, o professor deve evitar a tentacao de apontar um culpado ou simplesmente impor uma “ligio de moral”, pois, © a intengao é estimular o pensamento critico, é bom que as conclusées ; _ + dg Partam dos prdprios alunos, cabendo ao professor a tarefa de ajuda-los a clatear os caminhos. QW OEE x 16 ENsINODEHISTORIA PARA 0 FUNDAMENTAL 1 No trabalho com alunos de 1° e 2° ano que haviam lido a obra Alice no pats das maravilhas, 0 professor pediu para que escrevessem sobre a person. gem da Rainha de Copas, elencando suas caracteristicas, habitos e condutas (ao que alguns alunos responderam: “Ela gosta de rosas cor de carmim’”, “E), é ma’, “Ela joga croquet”, “Ela ordena que cortem a cabega [daqueles que a desagradam]”). A partir dai, se 0 professor quisesse avangar na discussag (sempre no sentido de formar 0 pensamento critic), caberiam as perguntas: “Por que a rainha pode mandar dessa forma?”, “Por que os outros personagens a temem?”, “Ela é obedecida?”, “Os outros personagens gostam de jogar com ela?”, “Existe outro modo de governar (ou jogar)?”. Outro exemplo: alunos do 2° e 3° anos leram uma reportagem sobre a polui¢ao do rio de sua cidade e discordaram dela porque, para cles, 0 rio estava limpo, uma vez que nao viam nenhum “entulho” em suas margens. Liat wes es “aayt ose Ct is 2 Criangas ea L meio Posteriormente, receberam na escola a visita de um técnico do Depar- tamento de Agua e Esgoto que lhes explicou em linguagem acessivel como 0 nivel de poluicao da 4gua podia ser avaliado tecnicamente. Com isso, 0s alunos puderam ampliar os conhecimentos a respeito do assunto, percebendo também que uma “opiniao”, especialmente uma “ideia” inicial sobre algo. deve ser testada (por meio de uma investigagao mais apurada) para que s¢ possa falar com mais propriedade sobre o tema. Tudo isso contribuiu para que percebessem que a critica que haviam feito 4 reportagem ndo era adequada € que, naquele momento inicial, eles nao tinham elementos suficientes pa" sustentar seus argumentos. Ee OSDESAFIOS DO ENSINODEHISTORIA 17 Para alunos de 4° © 5° ano, uma proposta interessante no sentido de estimular o pensamento critica é pedir que observem uma imagem {Atividade 1- OBSERVANDO OBRA DE RUGENDAS — Tndicadores de anilise: 1, 4, 5, 6]' como, por exemplo, a Derrubada de uma floresta de Johann Moritz Rugendas, ¢ respondam perguntas como: “O que 0s personagens retratados estio fazendo?”, “Por qué”, “O que provavel- mente ocorrerd no lugar da floresta derrubada?”, “A atividade retratada (dercubada de uma floresta) é muito antiga?”, “A interferéncia do homem na natureza também ocorre nos dias de hoje?” Derrubada de uma floreta, Johann Morivz Rugendas, 1820, litografia sobre papel. Uma atividade desse tipo propée uma série de aces mentais para o aluno: descrever a cena, elaborar hipéteses sobre a agdo que observa, ou seja, a partir do seu conhecimento de mundo, ele é solicitado a apresentar suas opinides numa argumentagao coerente; imaginar as consequéncias dos atos que estéo sendo observados no quadro; reconhecer a existéncia de situagdes semelhantes; ampliar o conhecimento sobre a histéria do Brasil; analisar um documento (0 quadro). Sea atividade for ampliada com outras propostas como, por exemplo, comparar a imagem com fotografias atuais sobre o mesmo assunto (derrubada de drvores) ou fazer um texto ou um desenho para responder “O que aconte- cerd com o lugar?”, proporcionaré ao aluno a oportunidade de pensar sobre a interferéncia do homem no meio ambiente e as suas consequéncias. Com relagio aos alunos do ensino fundamental, fazer do estudo da His- toria um exercicio de investigagéo, de andlise e critica, além de levantamento de hipoteses sobre o acontecido, significa que as criangas podem ser introduzidas desde cedo nas agées de: 48 _ ENSINO DE HISTORIA PARA O FUNDAMENTAL 1 ricos (em sentido amplo) do, o aluno perceba que existem muitas fontes passado, sobre tempos € espagos que thes slo narrativas, textos escritos, MUsicas, de encontrar esse ificar documentos histé Buscar informagaes ¢ ident fe importante que, desde ce: deinformagio sobre o presente € 0 objetos, monurt bém dev nentos, ; e-se ter uma ideia de on + feitas a ele para obter mais informagoes, ou nao familiares: fotografia, entre outros. Tam : material e que tipo de perguntas podem se Organizar informagoes com critérios definidos Os critérios de classificagao das informag6 nologica,a relevancia, os significados atribufdos po es podem respeitar a ordem cro- 1 outras pessoas, entre Outros, ou seja, aprender a analisar Biuabelecer relagies ¢chegar a conclusdes, isa ae peréncias funda- Nesse ambito, relacionar e comparar sio tarefas € com mentais para a organizacio das informagées ¢ sua posterior andlise. Construir narvativas coerentes a partit da organizagio das informagées ¢ de sua contextualizagio ‘A contextualizacio ¢ importante para evitar que o aluno misture tempos hist- ricos (anacronismo), mas principalmente para perceber que cada época possui suas especificidades e que acontecimentos, habitos, costumes, mentalidades, objetos da vida material, tudo isso tem historicidade. Traduzindo para 0 cotidiano da sala de aula: um professor que estimula os alunos com perguntas do tipo “Qual 5 10 do Brasil nao havia avies?”, “Por que o cavalo era muito utilizado? E nos dias de transporte seus avés usavam para viajar?”, “Por que na época da colonizag hoje?” ajuda as criangas, mesmo num nivel bem basico, a contextualizar, Questionar. O ensino de Histéria nos primeiros anos do fundamental jé é capaz de ajudar bie a identificar preconceitos, observar injusticas, duvidar de determinadas , . “Sunn” 5 cs rm fine dtinadasa degualifar 0 ‘outro’, o “diferente”. Com a orientacio do rofessor, os aluno: - ie : pe Seemed se capazes de questionar afirmacées do tipo “a cultura » as Meninas sdo ‘inos” como por queso mes menos capazes que os meninos”, e mostrar F ex: istéri ‘por exemplo, em que momento histérico elas 'm). O passo seguinte nese longo ropriedade é reconhecer mecunismus entender como ¢ quando lo a discriminaga asao. E, finalmente, lutar contra eles. O8 ocsari0s oo eNsino DE HISTORIA, 19 Tambéa é importante que os alunos aprendam a compreender, por exem= plo. as dificuldlades de locomayao dos cadeirantes ou dos idosos nas ruas da Mjale, Fa sce solidhirios com o proxiane mesmo que ele tenha necessidades expesia’: fale Com OULTO sotaque, tenha outta aparéncia, siga Outros padlroes culturais, apresente dificuldades intelectuais ou se sobressaia de algum modo. Desa forma, cles passam a entender a importincia social de se valorizar as Jjerengats em perder de vista 0 principio da igualdade, EDUCAR PARA A CONSTRUGAO DA CIDADANIA Em primeiro lugar, é importante definirmos cidadania para que um con- ccito tio importante nao seja confundido com “boas maneiras”, “caridade” ou “tolerancia’, como tem sido comum em certos ambientes escolares. Entio, © que € cidadania? Cidadania é a garantia de direitos civis, politicos e sociais. Como explica o historiador Jaime Pinsky: V Peder cod che. ecofs do rk. or cdadkio & rire A Vidar Aliberdade, 3 propriedade, & igualdade peran- tea lei: é, em resumo, ter direitos civis. E também participar no destino da socicdade, vouar, ser vorado, ter direitos politicos. Os direitos civis e politicos no asseguram a democracia sem os direitos sociais, aqueles que garantem a participagao do individuo na riqueza coletiva: 0 direito & educagao, ao trabalho, ao sakirio justo, &saiide, a uma velhice tranquila, (Pinsky, 2003: 9) ( A. Questa’, Corre dy Auchoees E como o ensino de Historia colabora para uma melhor compreensio do que é cidadania? Mostrando que cidadania é “um conceito histérico”, “o que significa que seu sentido varia no tempo € no espago” € pode softer alteracées: a cidadania pode ser ampliada para um numero maior de pessoas como resultado de reivindicacées e lutas sociais) ou restringida (em momentos de retrocessos autoritirios, perseguicdes etc.). Porém, ao longo da histéria, é possivel reconhecer um processo evolutivo com a difusio da crenga de que a cidadania deve ser garantida a todos os seres humanos (Pinsky e Pinsky, 2003). E na escola? Vejamos o que diz o historiador Holien Gongalves Bezerr: © conjunto de preocupagées que informam 0 conhecimento histérico € suas relagdes com o ensino vivenciado na escola levam ao aprimoramento de atitudes e valores imprescindiveis para 0 exercicio pleno da cidadania, como © exercicio do conhecimento auté: i riza thecimento aut tizagio de si mesmo 20 _ENSINO DE HISTORIA PARA O FUNDAMENTAL 4 fomo sujcito responsivel da Hist6ria; respeito as diferengas [...] evitandy : jc qualquer tipo de discriminag os busea de celui poss spar oping sae ssa comunidad, de Forma individual ecoletiva; ataio Fig dancin contra qualquer tipo de injustiga e menttas socials; valorizag, do patriménio sociocultural (..J5 valorizagio dos direitos conquistados (...} sepeocos espectivos deveres,sejam dos individuos, dos grupos dos pove, wna busca da consolidagio da democracia. (Bezerra, 2004: 47-8) py ecw > E’com relagao aos primeiros anos do ensino fundamental? Na proposta curricular do pcn de Histéria (Fonseca, 2003: 33-5) para o ensino funda- mental, destaca-se a necessidade de o aluno vir a “ser cidadao conhecedor da organizacio politica, social e econdmica da sociedade, da pluralidade de fontes aa cultura, e a influéncia de varios fatores num contexto compreensivel”, Nessa etapa da vida, a crianga jé é capaz de compreender que precisa “fazer a sua parte” e que, se ela tem direitos, tem ambém deveres. Além disso, ela pode (e deve) aprender que nao basta compreender, ¢ preciso ajudar.a melhorar © mundo em que vive no sentido de torné-lo um lugar com oportunidades iguais para todos. Esse aprendizado passa necessariamente pelo “respeito & d= ferenga, & diversidade, ao espirito democratico, & tolerancia e & solidariedade” (Fonseca, 2003: 33-5). O professor deve conduzir seu trabalho no sentido de levar 0 aluno a considerar 0 ponto de vista dos outros e compreender o ser humano em todas as suas manifestagoes, sejam elas culturais, étnicas, politicas, emocionais, sociais, entre outras. Na pritica, o trabalho inicia-se com 0 pro- fessor selecionando contetidos que podem contribuir para o desenvolvimento do conceito de cidadania, lembrando-se que a op¢io por temas especificos ou cixos teméticos € mais apropriada a faixa etdria da primeira etapa do ensino fundamental (veremos adiante isso com mais detalhes ¢ exemplos). Para as criangas deste nivel, 0 rcN defende, entre seus objetivos gerais: [...] desenvolver 0 conhecimento ajustado de si mesmo ¢ 0 sentimento de confianga em suas capacidades afetiva, fisica, cognitiva, ética, estética, de inter-relagéo pessoal ¢ de insergao social, para agir com perseveranga em busca de conhecimento e no exercicio da cidadania. (Brasil, 1997: 8) Dando aqui um destaque para o trecho que fala do “conhecimento ajustado de si mesmo € 0 sentimento de confianca em sua capacidade afetiva”, aponta- mos a necessidade de o professor refletir sobre Praticos € quais so seus limites competéncias com relacdo a essa questao. Maric o divine. cocky © que isso significa em termos m. a TTT Os dEsAFIOS Do ENsINO DE MsTORIA 21 c “ Owner ep taro, ae PELE «8s PuUtorurndn FS alka Por conta do griu de maruridade, os alunos do ensino fundamental (e da until também) necessitam de ajuda para aprendera rabalhar com os proprios sentimentos ¢ para entendero que significa r&peitar as Outras pessoa Aug as Criangas compreenderem 0 significado dé do conceito de cidadania, uny longo caminho deverd ser percorrido. Portanto, nao adianta o professor chegar logo de inicio com definigdes prontas ou ligdes de moral acabadas. O enten- dimento do significado de direitos (e deveres) pana todos deve set o resultado de um processo em que 0 desenvolvimento da capacidade de reflexio por parte da crianga exerce um papel imprescindivel. Percepgdes simples do tipo “se eu choro € outra crianga também chora; os motives podem ser diferentes, mas a dor éa mesma” levam a uma identificagio com_o coleguinha, sentimento ete que pode ser trabalhado (com a ajuda do professor) para encamin! aga para a seguinte conclusio: “é preciso respeitar 0 outro”. | - har a crianga Fica claro, portanto, que no caso de um conflito entre colegas, 0 primeiro passo é antes mesmo de conhecer os motivos do outro, cada aluno entender 0 que ocorre consigo proprio. Cabe ao professor, em seguida, incentivar as crian- gas.a resolverem os conflitos que surgem com seus colegas (para mais detalhes sobre essa questo, sugerimosa teitiira de obras de Haim Ginott, 2004, Nancy Samalin ¢ Catherine Whitney, 1992; Adele Faber ¢ Flaine Mazlish, 1985, 2005). Em uma situagao concreta, 0 profi sor pode perguntar aos alunos “Quais io os sentimentos que uma crianga pode ter2”. Raiva, medo, angiistia, inseguranga, injustiga, rancor, magoa, tristeza — “sentimentos negativos” ~ provavelmente fario parte das respostas. Mas uma crianga também pode sentir seguranga, amor, carinho, alegria, gratidio ~ “sentimentos positivos”. A crianga deve ser capaz de identificar tanto os do primeiro tipo quanto os do segundo ¢, entio, é fundamental que aprenda a se controlar e a utilizar as palavras (endo tapas, mordidas, ofensas, chutes, gritos...) para manifestar— scu desagrado. Enconttar saida para o problema de um aluno que bateu no colega ja é uma ligo de cidadania. Incentivar aquele que apanhou a explicar a scu agressor que estd sentindo dor € nao gostou de apanhar é outra. Trabulhos também podem ser desenvolvidos na escola com o objetivo de € pertencimento ao local em que se vive, e, se for 0 caso, uma relacao de afeto com exe apace, A Sonstruvio da identidade € 6 sentimento de pertenciiniento suo importantes para

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