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XIV Congresso Brasileiro de Sociologia

28 a 31 de julho de 2009, Rio de Janeiro

Grupo de Trabalho: Sociologia da Cultura (GT 25)

Corpo, Consumo cultural e construção da aparência:


Estudo comparativo acerca da relação de diferentes grupos juvenis com a
com a moda.

Ana Lúcia de Castro –Universidade Estadual Paulista/UNESP/ Araraquara


Ana Luiza S. Capelaro – Centro Univ. SENAC
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Corpo, Consumo cultural e construção da aparência:


estudo comparativo acerca da relação de diferentes grupos juvenis com a
com a moda.

Ana Lúcia de Castro


Ana Luíza de Souza Capelaro
INTRODUÇÃO

O espetáculo é o momento em que a mercadoria ocupou totalmente a vida


social. Não apenas a relação com a mercadoria é visível, mas não se
consegue ver nada além dela: o mundo que se vê é o seu mundo.
(Guy Debort, A sociedade do espetáculo).

Este artigo apresenta e discute os resultados de pesquisa de campo realizada em duas


escolas – uma pública e uma particular – da Zona Sul da cidade de São Paulo, buscando
contribuir para a discussão sobre o papel da moda, enquanto instância societária, na vida social
de grupos jovens na cultura contemporânea. Os jovens pesquisados são estudantes do ensino
médio, de ambos os sexos, cuja faixa etária situa-se entre 14 e 21 anos.
Como instrumento de pesquisa foi utilizado o formulário de auto-preenchimento, não
identificado, contendo 41 questões abertas e fechadas, havendo uma maior predominância de
questões fechadas.
A escolha do ambiente escolar como universo para a pesquisa ocorreu devido à
facilidade de encontrar um maior número de jovens dos grupos sociais equivalentes em um
único ambiente e por este ser propício ao preenchimento de um questionário que contém um
número considerável de questões, que exigem concentração para a leitura e preenchimento.
Dos 210 jovens que compõem a amostra, praticamente a metade (101) são
freqüentadores da Escola Estadual Prof. Andronico de Mello, localizada no bairro Morumbi e
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receptora de moradores da favela Guetsemany e Colombo, bem como moradores de outras


localidades do bairro. A outra metade que compõe a amostra (109 entrevistados) é proveniente
do Colégio Madre Alix, localizado no bairro Jardim Paulistano, cuja mensalidade média está
em torno de R$ 1.300 e recebe jovens moradores de diversos bairros da zona sul de São Paulo.
Embora o critério para composição amostra tenha sido a seriação (alunos do primeiro, segundo
e terceiro ano do ensino médio), a distribuição dos entrevistados por sexo ficou bastante
equilibrada (101 do sexo masculino e 109 do sexo feminino).

O instrumento de coleta de informações nos permitiu mensurar e visualizar o nível


sócio-econômico de ambos os grupos estudados. Informações como grau de escolaridade dos
pais, faixa de renda familiar, posse de carro e eletroeletrônicos, casa própria, etc... nos
permitiram perceber uma diferença significativa, como supúnhamos, de universo sócio-
cultural que separa os dois grupos de estudantes analisados.

Na produção sócio-antropológica sobre consumo, pode-se destacar duas perspectivas


analíticas. A primeira parte da premissa de que a expansão da produção capitalista de
mercadorias deu origem a uma vasta acumulação de cultura material na forma de bens e locais
de compra, o que teria conduzido à predominância cada vez maior do lazer e das atividades de
consumo nas sociedades ocidentais contemporâneas. Para alguns, tal fato é visto com
otimismo, pois resultaria em democratização do acesso ao consumo e aumento da liberdade
individual; para outros, é visto como estimulador da manipulação ideológica e controle
sedutor da sociedade, dificultando a organização e mobilização social.

O desvendamento e a crítica da lógica implacável da mercadoria a serviço da


dominação e do controle tem o marxismo como matriz de pensamento, que se opõe à
perspectiva da economia clássica, na qual o objetivo de toda produção é o consumo, com os
indivíduos maximizando suas satisfações a partir da aquisição de um elenco de mercadorias
em constante expansão. Partindo dessa idéia, os teóricos da Escola de Frankfurt afirmam que a
expansão da produção e consumo de bens implicará na ampliação das possibilidades de
consumo controlado e manipulado.

A indiferenciação entre realidade e ilusão constitui-se numa importante premissa da


análise frankfurtiana. Num mundo em que a realidade tecnológica envolveu a todos, vida
social e alienação, realidade e aparência se confundem, se transformam numa única coisa. Na
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visão de Theodor Adorno, um dos – senão o principal, ao menos do ponto de vista oficial –
representantes da Escola: O fictício que hoje deforma todo e qualquer atendimento das
necessidades é inconsistentemente percebido sem questionamentos; provavelmente contribui
para o atual mal estar na cultura.(Adorno, 1986:71).

Uma segunda vertente, complementar à primeira já referida, entende que a satisfação


propiciada pelo consumo deve-se ao fato de os bens proporcionarem prestígio social. As
pessoas usariam as mercadorias para criar vínculos ou para estabelecer distinções sociais,
demarcando grupos e estilos de vida. Roland Barthes (1980) foi um dos primeiros teóricos a
apontar o duplo aspecto no consumo: satisfazer as necessidades materiais e carregar estruturas
e símbolos sociais e culturais, aspectos que considera inseparáveis.

Jean Baudrillard (1985) aborda esta mesma problemática a partir da Semiologia,


ajudando a compreender os nexos da questão. Entendendo que o consumo supõe a
manipulação ativa de signos e na sociedade capitalista tardia o signo e a mercadoria teriam se
juntado para formar a mercadoria-signo, afirma que a distinção entre imagem e realidade é
gradativamente abolida pela reduplicação infinita de signos, imagens e simulações por meio
da mídia. Preocupado em denunciar o consumo como o elemento central e redutor das
sociedades capitalistas, Baudrillard considera beleza corporal um signo com valor de troca. A
ética da beleza, que também é a da moda, pode definir-se como a redução de todos os valores
concretos e dos „valores de uso‟ do corpo (energético, gestual e sexual), ao único „valor de
permuta‟ funcional que, na sua abstração, resume por si só a idéia de corpo glorioso e
realizado (Baudrillard, 1985:141). A evidência do corpo na vida social, por ele denominada de
redescoberta do corpo, estaria associada às necessidades de consumo: Da higiene à
maquiagem, passando pelo bronzeamento, pelo desporto e múltiplas „libertações‟ da moda, a
redescoberta do corpo passa antes de mais nada pelos objetos. Parece que a única pulsão
verdadeiramente libertada é a „pulsão de compra‟ (Baudrillard, 1985:143).

Para Bourdieu (1988) - um dos principais representantes desta segunda vertente


explicativa sobre o consumo - o gosto é classificador e classificatório, classificando o
classificador. Os sinais das disposições estéticas e esquemas classificatórios revelam a origem
e a trajetória de vida da pessoa e se manifestam na forma do corpo, altura, peso, postura,
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andar, conduta, tom de voz, estilo de falar, desembaraço ou desconforto em relação ao próprio
corpo.

Embora o fluxo constantemente renovado de mercadorias torne mais complexo o


problema da leitura do status ou da posição hierárquica do indivíduo, a noção - proposta por
Simmel e desenvolvida por Bourdieu - de estilo de vida pode ainda ser entendida como
importante chave analítica nos estudos sobre consumo cultural e, portanto, nesta nossa
reflexão. Para Bourdieu (1988), o estilo de vida está estreitamente associado às diferentes
posições ocupadas pelos indivíduos na sociedade, como a retradução simbólica de diferenças
objetivamente inscritas nas condições de existência (Bourdieu, 1983:82)

Ou seja, o estilo de vida, no âmbito da cultura de consumo, pode indicar


individualidade, auto-expressão e consciência de si estilizada. O corpo, as roupas, o discurso,
os entretenimentos de lazer, as preferências de comida e bebida, a casa, o carro, a opção de
férias, etc. de uma pessoa são vistos como indicadores da individualidade, do gosto
(Featherstone, 1995:128).

É consensual, dentre os autores que discutem as sociedades contemporâneas, a idéia de


que a esfera do consumo vem, cada vez mais, se sobrepondo à esfera da produção, ou seja,
para entendermos melhor o mundo que nos cerca, temos que lançar o olhar para a forma como
as mercadorias são consumidas e os sentidos conferidos à vida, via consumo, uma vez que a
sociedade, que antes girava em torno da esfera da produção, passa agora a produzir-se na
esfera do consumo. Como aponta Featherstone:

Usar a expressão cultura de consumo significa enfatizar que o


mundo das mercadorias e seus princípios de estruturação são centrais
para a compreensão da sociedade contemporânea. Isso envolve um foco
duplo: em primeiro lugar, na dimensão cultural da economia, a
simbolização e o uso de bens materiais como “comunicadores”, não
apenas como utilidades; em segundo lugar, na economia dos bens
culturais, os princípios de mercado - oferta, demanda, acumulação de
capital, competição e monopolização - que operam dentro da esfera dos
estilos de vida, bens culturais e mercadorias (Featherstone, 1995:127).
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A antropóloga Mary Douglas e o economista Baron Isherwood se debruçaram sobre a


questão, lançando luzes para se pensar o consumo como forma de dar sentido à vida. Segundo
os autores, ao contribuir para a estabilização de significados, reforçar laços de solidariedade e
realizar marcações temporais, o consumo poderia ser compreendido como atividade ritual no
mundo contemporâneo. Nas palavras dos autores:

Se vem sendo dito que a função essencial da linguagem é sua capacidade


para a poesia, assumiremos que a função essencial do consumo é sua
capacidade para dar sentido. Duvidemos da idéia da irracionalidade do
consumidor. Duvidemos de que as mercadorias servem para comer,
vestir-se e se proteger. Duvidemos de sua utilidade e tentemos colocar
em troca a idéia de que as mercadorias servem para pensar.
Aprendamos a tratá-las como meio não verbal da faculdade criativa do
gênero humano.( Douglas & Isherwood, 1990:77)

Bastante inovadora foi a visão sobre o consumo apresentada por este livro, publicado
na segunda metade dos anos 70. Dela nos interessa reter a idéia de que o consumo nos permite
pensar a maneira como os indivíduos buscam tecer suas relações sociais, posicionando-se no
mundo e dando sentido às suas vidas.

O antropólogo norte-americano Marshall Sahlins vem contribuir para este debate, ao


apontar para a necessidade de considerarmos o conjunto dos objetos modernos como um
código que deve ser apreendido na sua relação com a ordem social burguesa. O autor propõe
que se abandone a perspectiva analítica que considera os objetos como portadores de
qualidades intrínsecas, e se considere que a utilidade dos bens, uma combinação indissociável
entre praticidade e simbolismo, é elaborada - e permanentemente reelaborada - na estrutura
das trocas de um grupo social específico. Embora por caminhos diferentes, conduz a uma
perspectiva analítica próxima à de Baudrillard (1985), ao deslocar o foco do marxismo
clássico e destacar a importância do valor de uso, afirmando que se os bens materiais não têm
uma utilidade em si, seu valor de uso, ou seja, os tipos de uso que as pessoas farão dos
mesmos, é tão social quanto seu valor de troca.
Desde as reflexões de Baudrillard (1985) e Sahlins (2003), pioneiras no campo do
marxismo, tem se tornado cada vez mais consensual, dentre os cientistas sociais
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contemporâneos, a idéia de que o consumo é um processo social produtor de sentidos e de


identidades, construídos pelo valor simbólico socialmente atribuído às mercadorias, e não ao
seu valor de uso.
Nas sociedades contemporâneas, contudo, a popularização dos bens de luxo,
juntamente com o comércio pirata, vêm complexificando a leitura dos signos de status, que
passa a se configurar muito mais pela legitimidade e conhecimento sobre as maneiras de se
usar um determinado bem, do que pelo próprio bem que se está usando.
A moda, sem dúvida, é o grande dispositivo do consumo moderno. Ao contrário da
pátina, que valorizava o ciclo de vida mais longo do objeto, conferindo-lhe tradição, nobreza e
status, a moda representa a curta duração, pela valorização do novo e do individual. Como
aponta Lipovetsky (1989), ela é o “Império do Efêmero”, possui como princípio regular e
constante o gosto pela novidade, esta por sua vez, apresentada à sociedade dos tempos atuais
de forma globalizada e unificada.
Partimos do pressuposto de que o consumo é o principal elo de ligação do jovem com
a sociedade e o que aparentemente possa parecer uma simples compulsão ao consumo no
ambiente jovem, tem um amplo significado simbólico de pertencimento a um determinado
grupo. Para o adolescente, ser aceito em um grupo constitui uma necessidade tão crucial,
quanto é para um adulto estar empregado. Segundo Marinho, é por causa disso que eles
precisam muito mais de símbolos de estilo do que nós (adultos). Assim, “uma calça cara pode
ser, aos olhos do adolescente, menos uma extravagância de consumo do que uma espécie de
senha para que ele consiga se integrar à sua turm (PADILHA, 2006:5). Neste sentido, refletir
acerca da moda como instância social que fornece modelos de referência aos jovens que, por
sua vez, vivenciam um momento transitório de construção de identidade e auto-afirmação,
torna-se um desafio instigante, uma vez que ao contribuir para estimular as emoções e
fantasias humanas, ela assume um papel importante durante esta fase da vida.
Atualmente, um jovem não mais se contenta em ostentar apenas roupas da moda. O
universo de símbolos sob a forma de mercadorias exploradas pelo mercado cresceu de forma
significativa. Os jovens se interessam por produtos e serviços que traduzam modernidade e
estilo. Segundo o Instituto Ipsos, 71% dos jovens das classes A e B e 48% das classes C, D e
E, compram em shopping center delimitando-o como um lugar para exercer sua identidade e
independência. Lazer e alimentação lideram os gastos, seguidos de moda, sendo vestuário
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como principal item, e na seqüência a tecnologia, traduzida em produtos como celulares,


computadores, jogos, ipod, MP3 players e webcam, entre outros. Além de comprar mais, o
jovem dos dias de hoje troca os produtos com mais rapidez, no intuito de manter-se na moda.
Em pesquisa recente, realizada pelo Observatório de Tendências Ipsos, 1 revelou-se a
freqüência que jovens utilizam a internet, bem como a freqüência de compras feitas por este
meio. Na faixa etária dos 16 aos 24 anos, nas classes AB, 62% utilizam a internet, pela qual
20% fazem compras para uso próprio. Na classe C, 42% utilizam a internet todos os dias e
10,2% compram, já nas classes DE, 25% navegam todos ou quase todos os dias e 5,6% fazem
compras.
Além dos produtos de moda já mencionados como vestuário e tecnologia, apareceram
nas pesquisas uma grande demanda por produtos de higiene e cosméticos, direcionados
especialmente ao público jovem, como também cirurgias plásticas e procedimentos estéticos,
sugerindo que os jovens acreditam que pessoas bonitas têm mais chances na vida.
Ao analisar a relação do jovem com a roupa, Crane (2006) afirma que

[...] estilo e aparência estão entre os principais elementos da


identidade subcultural. Para adolescentes e jovens que não pertencem a
força de trabalho, o vestuário é um aspecto da vida que eles podem
controlar com relativa facilidade e que podem utilizar para afirmar-se a
si próprios e a sua postura diante do ambiente social. Apropriando-se de
estilos existentes e combinando-os de novas maneiras, eles misturam
objetos, vestuário e penteados de forma a definir uma identidade que
evidencie suas experiências pessoais e a situação de um grupo em
particular. (CRANE, 2006, p.

Portanto, roupas de marca (legítimas ou não), celulares, computadores, programas de


televisão, ídolos, tênis (legítimos ou não), a freqüência a shoppings, lugares considerados in,
acesso ao mundo virtual, entre outros, fazem parte do campo simbólico capaz de integrar o
jovem ao seu grupo, que por sua vez é o porto seguro na construção de sua identidade.

1
Jovens e Hightech: Os mitos. Disponível em: www.e-thesis.inf.br.
Fonte: Observatório de Tendências Ipsos.
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Construção da aparência e relação com as influências da moda.

“A obsessão com a identidade pessoal, característica de


alguns estilos de vida, mas não de todos, pode ser em parte
explicada como conseqüência de uma sociedade e de uma
cultura cada vez mais complexas e difíceis de ser
interpretadas. Os mais jovens, cujas carreiras são menos
estáveis, que são também os consumidores mais ativos da
cultura e da mídia, acham difícil ter um sentido claro do que
é a sociedade contemporânea e de seu significado para eles.
Mudanças tecnológicas e organizacionais no ambiente de
trabalho levaram a uma situação em que históricos de
emprego são menos previsíveis e uniformes em termos de
geração e origem social. Grupos etários e sociais não mais
compartilham das mesmas experiências, como educação,
primeiro emprego, casamento, e criação de filhos, tornou-se
mais imprevisível. A preocupação com a identidade pessoal
é um modo de se adaptar a novas formas de desorganização
social e cultural. A moda contribui para redefinir
identidades sociais ao atribuir constantemente novos
significados aos artefatos.
Diana Crane

Ao serem questionados acerca da posse de dois de seus objetos de desejo -


equipamento de som (ipod, MP3 ou MP4) e celular, os jovens confirmaram a condição de
fetiche que tais aparelhos gozam dentre eles. Do universo dos jovens que não tem o
equipamento de som 75% são da escola pública. No entanto, estes produtos foram citados
como um dos principais sonhos de consumo, quando solicitado pela pesquisa. 85,32 % dos
jovens da escola particular possuem pelo menos um dos equipamentos. Quanto ao celular, é
objeto praticamente indispensável, expresso pelo alto índice de posse. Do total da amostra,
88,10% o possuem. Porém, se tomarmos apenas o universo dos alunos que não têm celular, os
da escola pública somam 92% contra 8% da escola particular.
Outro indicador de grupo sócio-econômico, o cartão de crédito, aparece em número
muito reduzido dentre os alunos da escola pública, enquanto no grupo de estudantes da escola
particular, ele atinge índice bastante significativo. De todos os alunos que possuem cartão de
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crédito, 80% são da escola particular, enquanto 91% dos estudantes da escola pública afirmam
não possuí-lo.

Tabela 01 – A posse ou não de televisão no quarto, segundo a escola freqüentada:

TIPO DE ESCOLA SIM POSSUEM TV NO NÃO POSSUEM TV NO TOTAL


QUARTO QUARTO
Nº % % Nº % % Nº %

JOVENS ESCOLA PÚBLICA 82 51,57 (81,19) 19 37,25 (18,81) 101 (100)

JOVENS ESCOLA PARTICULAR 77 48,43 (70,64) 32 62,75 (29,36) 109 (100)

TOTAL DA AMOSTRA 159 100 (75,71) 51 100 (24,29) 210 100

É curioso percebermos que, assim como o celular, a posse de outros equipamentos ,


como a televisão, vídeo-game ou computador no quarto, já não são mais grandes divisores de
água, indicativos contundentes de condição sócio-econômica.
Há muito tempo os Censos demográficos vêm apontando que no Brasil o número de
aparelhos de televisão por domicílio supera o de geladeiras, nos levando à reflexão sobre o
papel central cumprido por este aparelho na ocupação do tempo de lazer na sociedade
brasileira contemporânea. Percebe-se, pela observação da tabela 01, que a posse de televisão
no quarto é, inclusive, mais referida dentre os estudantes da escola pública, o que talvez
indique uma compensação em relação a posse do computador e do videogame, que aparecem
em menor índice. Os percentuais que indicam a posse de computador e vídeo-game (tabelas 02
e 03) por sua vez, apresentam diferenças muito pequenas entre os dois universos sócio-
culturais investigados.

Tabela 02 – A posse ou não de computador no quarto, segundo a escola freqüentada:

TIPO DE ESCOLA SIM POSSUEM PC NO NÃO POSSUEM PC NO TOTAL


QUARTO QUARTO
Nº % % Nº % % Nº %
JOVENS ESCOLA PÚBLICA 58 47,54 (57,43) 43 48,86 (42,57) 101 (100)

JOVENS ESCOLA PARTICULAR 64 52,46 (58,72) 45 51,14 (41,28) 109 (100)

TOTAL DA AMOSTRA 122 100 (58,10) 88 100 (41,90) 210 100


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Tabela 03 - A posse ou não de videogame no quarto, segundo a escola freqüentada:

TIPO DE ESCOLA SIM POSSUEM VG NO NÃO POSSUEM VG NO TOTAL


QUARTO QUARTO
Nº % % Nº % % Nº %

JOVENS ESCOLA PÚBLICA 32 43,24 (31,68) 69 50,74 (68,32) 101 (100)

JOVENS ESCOLA PARTICULAR 42 56,76 (38,53) 67 49,26 (61,47) 109 (100)

TOTAL DA AMOSTRA 74 100 (35,24) 136 100 (64,76) 210 100

A análise destas tabelas nos permite, ainda, cotejar a idéia de que o jovem
contemporâneo tende a isolar-se no interior de seu quarto, cercado de aparelhos eletrônicos,
que o mantém conectado à sua turma, ao seu universo.

Tabela 04 – O hábito de ter roupas separadas para ir à escola e para usar no final de semana,
por sexo, segundo a escola freqüentada:
SEXO TEM ROUPAS JOVENS E. PÚBLICA JOVENS E. PARTIC. TOTAL DA AMOSTRA
SEPARADAS?
Nº % Nº % Nº %
SIM 18 17,82 18 16,51 36 17,15
MASCULINO
NÃO 33 32,67 32 29,36 65 30,95

SIM 31 30,69 36 33,03 67 31,90


FEMININO
NÃO 19 18,82 23 21,10 42 20,00

TOTAL 101 100 109 100 210 100

Percebemos, através desta tabela, que a maioria dos meninos, tanto da escola pública
quanto da particular, não costumam ter roupas separadas para ir à escola e para o final de
semana, em oposição às meninas, que em ambas as escolas, costumam ter roupas separadas.
Este fato, de forma geral equilibra a amostra, podendo-se assim concluir o hábito de designar
roupas para ocasiões especiais, está mais ligado a uma questão cultural, envolvendo os
gêneros, do que à desigualdade social.
Como aponta Diana Crane:
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[...] as mulheres, mais do que os homens, são socialmente educadas para


prestar atenção à aparência e a moda, elas parecem investir
emocionalmente em uma aparência atraente, mas, ao mesmo tempo,
assim como os homens , tendem a resistir aos ideais da moda. (CRANE,
2006:407)

Quadro 1 – Roupas mais citadas, como usadas no dia-a-dia pelos jovens, conforme o sexo,
segundo a escola freqüentada:

JOVENS ESCOLA PARTICULAR JOVENS ESCOLA PÚBLICA

SEXO FEMININO SEXO FEMININO


- Al l STAR, CAÇLA JEANS, BABY LOOK, CAMISETA, - Al l STAR, CAÇLA JEANS, BABY LOOK, CAMISETA,
CALÇA DE MALHA, CALÇA LEG, REGATA, BLUSINHAS, CALÇA DE MALHA, CALÇA LEG, REGATA, BLUSINHAS,
TENIS, CALÇA JEANS COMUM, CASACO DE MOLETOM. TENIS, CALÇA JEANS COMUM, CASACO DE MOLETOM.

SEXO MASCULINO
BERMUDA, CAMISETA, CALÇA JEANS, CAMISA, TENIS, BERMUDA, CAMISETA, CALÇA JEANS, CAMISA, TENIS,
SHORTS, CAMISA POLO, MOLETON, BONÉ. SHORTS, CHINELO, MOLETON, BONÉ.

Ao solicitarmos aos jovens que citassem três peças de roupas que usam no dia-a-dia,
foi possível verificar a similaridade entre os alunos das duas escolas, os quais se vestem de
forma bastante semelhante no que diz respeito ao estilo, sem levar em consideração marca,
qualidade e preço.

Quadro 2 – Roupas mais citadas, como usadas no final de semana pelos jovens, conforme o
sexo, segundo a escola freqüentada:
JOVENS ESCOLA PARTICULAR JOVENS ESCOLA PÚBLICA

SEXO FEMININO SEXO FEMININO


- BLUSINHAS DECOTADAS, CALÇA JEANS COM - BLUSINHAS DECOTADAS, CALÇA JEANS COM DETALHES,
DETALHES, SAIAS, VESTIDOS, SHORTS, SALTO ALTO, SAIAS, VESTIDOS, SHORTS, SALTO ALTO, CAMISETA,
CAMISETA, BATA, SANDALHA, CALÇA CAPRI, ETC. BATA, SANDALHA, CALÇA CAPRI, ETC.

SEXO MASCULINO SEXO MASCULINO

-CAMISETA, CALÇA JEANS, CAMISA POLO, BERMUDA, -CAMISETA, CALÇA JEANS, CAMISA POLO, BERMUDA,
SHORTS, TENIS, HAVAIANA, BONÉ, MOLETOM. SHORTS, TENIS, HAVAIANA, BONÉ, MOLETOM.
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Da mesma forma, o quadro 3 demonstra um mesmo perfil de comportamento de


moda entre os jovens de ambas as escolas, ao citarem o mesmo tipo de roupas usadas para sair
nos finais de semana.
Sendo assim, os quadros acima mostram de uma forma sucinta, as roupas mais usadas
pelos jovens no dia-a-dia e nos finais de semana. Foi possível observar, durante a coleta de
dados, que, ao se comparar as duas escolas investigadas, não há distinção quanto ao tipo de
roupas usadas pelos jovens. Há sim, uma uniformidade de comportamento frente à moda. O
que chamou a atenção, no entanto, foi uma nítida mudança no estilo de vestir das meninas no
final de semana, priorizando um look mais trabalhado, com detalhes nas blusas, nos decotes,
no jeans mais detalhado e no salto alto.
Portinari e Coutinho, ao analisar as relações entre o jovem e a moda, afirmam que
“[...] a moda que o jovem segue nunca é propriamente a moda oficial, e sim a verdadeira
moda, aquela que circula sem se anunciar como tal”.
Segundo as autoras, essa relação oscila muito facilmente, ao mesmo tempo que há um
certo conformismo, há a experimentação, pois aos jovens, quase tudo é permitido. E colocam:

O conformismo é facilmente verificável, mas ele remete mais a uma teia


intrincada de modismos do seu grupo, ao qual são incorporados
elementos do mercado, do que à moda veiculada na mídia como tal.
Jovens que freqüentam um mesmo ambiente nunca deixam de
impressionar o observador pela uniformidade de roupas, acessórios,
penteados, gestual, vocabulário e entonação – chegando até, muitas
vezes, a apresentar os mesmos tiques verbais e corporais. Ao mesmo
tempo, não parecem propriamente um exército de clones, conseguindo
apresentar-se como indivíduos claramente diferenciados entre si, graças
a variações, às vezes mínimas, introduzidas por cada um em seus
“uniformes”. (PORTINARI & COUTINHO, 2006 , p.66)

Tabela 05 – O grau de importância que a moda está para o jovem, segundo a escola
freqüentada:
É IMPORTANTE É IMPORTANTE
EM 1º LUGAR, MAS EXISTEM MAS PRIORIZO
TENTO COMPRAR COISAS MAIS CONFORTO, PREÇO
TUDO O QUE ESTÁ IMPORTANTE DO NEM LIGO PARA E MEU GOSTO
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TIPO DE ESCOLA NA MODA QUE GASTAR COM MODA PARTICULAR TOTAL


COISAS DA MODA
Nº % % Nº % % Nº % % Nº % % Nº %

JOVENS E. PÚBLICA 7 63,64 ( 6,93) 30 51,72 (29,70) 26 44,07 (25,75) 38 46,34 (37,62) 101 (100)

JOVENS E. PARTIC. 4 36,36 (3,67) 28 48,28 (25,69) 33 55,93 (30,27) 44 53,66 (40,37) 109 (100)

TOTAL AMOSTRA 11 100 (5,24) 58 100 (27,62) 59 100 (28,09) 82 100 (39,05) 210 (100)

Tabela 06 – Preferência do jovem em vestir o que está na moda, mesmo que não goste muito,
em detrimento de que realmente gosta de vestir independente da moda, segundo a escola
freqüentada:
VESTE O QUE ESTÁ NA VESTE O QUE REALMENTE
TIPO DE ESCOLA MODA INDEPENDENTE DO GOSTA, INDEPENDENTE DA TOTAL
GOSTO MODA
Nº % % Nº % %
Nº %
JOVENS ESCOLA PÚBLICA 5 55,56 ( 4,95) 96 47,76 (95,05) 101 (100)

JOVENS ESCOLA PARTICULAR 4 44,44 (3,67) 105 52,24 (96,33) 109 (100)

TOTAL DA AMOSTRA 9 100 (4,28) 201 100 (95,72) 210 (100)

A observação das tabelas acima nos permite problematizar a idéia de que os jovens
constituem-se em vítimas ou escravos da moda. Embora considerem a moda importante,
afirmam priorizar a sua individualidade e gosto pessoal, o que indica, ao menos, uma relação
tensa com o universo da moda e suas influências homogeneizantes.
De forma geral, o gosto pessoal, conforto e preço foram indicados como os principais
fatores decisórios para a compra de vestuário, em detrimento do fato de a peça estar em
sintonia com as últimas tendências de moda. Evidentemente, para além do plano do discurso
do entrevistado, poderíamos lembrar que só pelo fato de estar na vitrine, de alguma maneira, a
peça a ser adquirida já guarda uma relação com tendências de moda, ainda que não com as
mais atuais e que, consciente ou inconscientemente, os consumidores estão previamente
cooptados e suas ações condicionadas pela lógica do sistema da moda. Contudo, vale lembrar
que esta mesma lógica se alimenta da incorporação de elementos estéticos e estilísticos
retirados da rua, a partir de observações sistemáticas realizadas pelos produtores de moda e
pelos escritórios de tendências. (ERNER,......) Não devemos, portanto, descartar a idéia de que
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o estilo é construído neste terreno escorregadio, incerto e dinâmico, no qual ocorre o jogo
entre subjetividade e objetividade, bem como apontou, pioneirmante, Geog Simmel ( )

Tabela 07 – A percepção do jovem quanto ao que influencia seus amigos no momento da


compra de vestuário, segundo a escola freqüentada:
AS ROUPAS QUE ESTILO
ESTÃO SENDO O QUE OS O QUE OS PAIS AS PRÓRPIO OU
USADAS POR
TIPO DE AMIGOS SUGEREM NOVIDADES GOSTO TOTAL
ARTISTAS DA TV
ESCOLA USAM Nº % % DA VITRINE PESSOAL
Nº % %
Nº % % Nº % % Nº %
Nº % %

J. E. PUBLIC 33 78,57 (32,67) 24 38,09 (23,76) 1 16,67 (0,99) 32 51,61(31,69) 11 29,73 (10,89) 101 100

J. E. PARTIC. 9 21,43 (8,26) 39 61,91 (35,78) 5 83,33 (4,59) 30 48,39 (27,52) 26 70,27 (23,85) 109 100

TOTAL 42 100 (20,00) 63 100 ( 30,00) 6 100 ( 2,86) 62 100 (29,52) 37 100 (17,62) 210 100
AMST.

Os dados da tabela 07 mostram uma acentuada diferença nas respostas entre os


alunos da escola pública e particular, em relação à percepção que têm quanto ao que
influenciam seus amigos a comprar roupas. Nota-se que 32,67% dos alunos da escola pública
dizem que o que mais influencia seus amigos, são os artistas da TV, contra 8,26% dos alunos
da particular. Ao isolarmos aqueles que escolheram esta opção no total da amostra, 78,57%
são da escola pública. Em contrapartida, chama a atenção o percentual dos alunos da escola
particular ao citarem que o que mais influencia seus colegas, é “o que os amigos usam”, assim
como o “estilo próprio e gosto pessoal”, opções que aparecem com percentuais bem mais
altos, se comparado com os alunos da escola pública.

Tabela 08 - O que mais influencia o jovem no momento da compra de vestuário, segundo a


escola freqüentada:
AS ROUPAS QUE ESTILO
ESTÃO SENDO O QUE OS O QUE OS AS PRÓPRIO OU
USADAS POR
AMIGOS USAM PAIS NOVIDADES GOSTO TOTAL
ARTISTAS DA TV
TIPO DE SUGEREM DA VITRINE PESSOAL
Nº % %
ESCOLA Nº % % Nº % % Nº % % Nº % % Nº %
J. E. PUBLIC 12 70,59 (11,88) 7 38,89 ( 6,93) 7 70,00 ( 6,93) 37 56,92 (36,63) 38 38,00 (37,63) 101 100

J. E. PARTIC. 5 29,41 (4,59) 11 61,11 (10,09) 3 30,00 (2,75) 28 43,08 (25,69) 62 62,00 (56,88) 109 100

TOTAL DA 17 ( 8,09) 18 8,57 10 100 ( 4,77) 65 100 (30,95) 100 100 (47,62) 210 100
AMOSTRA
16

Esta tabela demonstra que, ao serem questionados acerca das influências sofridas por
eles próprios no momento da aquisição de vestuário, os entrevistados declaram uma percepção
diferenciada. Nota-se que os alunos da escola pública atribuíram como maiores fatores de
influência em suas compras, as novidades da vitrine (36,63%), e o estilo próprio ou gosto
pessoal (37,63%), este último contra 10,89% em relação à percepção que têm quanto aos
amigos (Tab. 07). Diminuíram consideráveis pontos nos percentuais da opção “o que os
amigos usam”, em relação à tabela anterior, sugerindo que admitem que os colegas se deixam
influenciar mais pela turma do que eles próprios. Da mesma forma, ao referirem-se a si
próprio, os alunos da escola particular, atribuíram maior peso nos fatores de influência: “as
novidades da vitrine” e “estilo próprio e gosto pessoal”, sendo este último bastante
significativo (56,88).

Tabela 09 – Comparação das percepções quanto as influências sobre os amigos/outros e sobre


si próprio no momento da compra de vestuário, segundo a escola freqüentada:

TIPOS DE ESCOLA PÚBLICA ESCOLA PARTICULAR TOTAL TOTAL GERAL


INFLUÊNCIAS
OUTROS SI PROPR. OUTROS SI PROP. OUTROS SI PROP. OUTROS SI PROP.

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº

ROUPAS QUE
ESTÃO SENDO
USADAS POR 33 (55,93) 12 (20,34) 9 (15,25) 5 (8,47) 42 (71,19) 17 (28,81) 59 (100)
ARTISTAS DA TV

O QUE OS AMIGOS
USAM 24 (29,63) 7 (8,64) 39 (48,15) 11 (13,58) 63 (77,77 18 (22,23) 81 (100)

O QUE OS PAIS
SUGEREM 1 (6,25) 7 (43,75) 5 (31,25) 3 (18,75) 6 (37,50) 10 (62,50) 16 (100)

AS NOVIDADES DA
VITRINE 32 (25,20) 37 (29,13) 30 (23,62) 28 (22,05) 62 (48,82) 65 (51,18) 127 (100)

ESTILO PRÓPRIO
OU GOSTO 11 (8,03) 38 (27,74) 26 (18,98) 62 (45,25) 37(27,00) 100 (73,00) 137 (100)
PESSOAL

TOTAL
101 101 109 109 210 210 420

A tabela 09 nos permite uma melhor visualização das percepções que os jovens
investigados têm em relação aos fatores externos que influenciam na forma de vestir, tanto dos
amigos quanto de si próprio.
17

Percebe-se que, do total dos alunos que indicaram que o que mais influencia as
decisões de compra são “as roupas usadas por artistas da TV”, 55,93% são alunos da escola
pública que atribuem esta alternativa aos outros, enquanto para si próprio, apenas 20,34%
admitem este como o fator de maior influência. Já dentre os alunos da escola particular,
apenas 8,47% admitem deixar-se influenciar pelos artistas, e 15,25% dizem ser esta a maior
influência para seus amigos.
Entre os jovens que apontaram como maior fator de influência “o que os amigos
usam”, 29,63% advem da escola pública, os quais admitem esta influência ao se referirem aos
outros, e 8,64% admitem para si. Quanto aos alunos da escola particular 48,15% atribuíram ser
este o aspecto que mais influencia seus amigos a decidir suas compras, enquanto 13,58%
admitiram esta influencia para si.
Das 127 respostas que indicaram “as novidades da vitrine” como maior influência na
decisão de roupas da moda, 29,13% provem de alunos da escola pública, que admitem esta
influência para si, enquanto 25,20% deles indicaram para os amigos. Entre os alunos da escola
particular, 22,05% admitem para si, enquanto 23,62% para os amigos.
O que mais chamou a atenção no entanto, foi o quesito “estilo próprio ou gosto
pessoal”, que soma um total de 137 respostas. Destas, 27,74% são dos alunos da escola
pública, os quais admitiram ser este o que mais os influencia a decidir suas compras de moda,
enquanto apenas 8,03% atribuíram este motivo para os outros. Já entre os alunos da escola
particular, 45,25% disseram ser este o motivo que mais os influencia, contra 18,98% para os
outros.
Nota-se, portanto uma significativa disparidade de opiniões entre os alunos das duas
escolas no que se refere “ao deixar influenciar-se pelos elementos externos”. Os alunos da
escola particular, notoriamente dão mais ênfase ao estilo próprio ou gosto pessoal, enquanto
que, os da escola pública, admitem dividir esta alternativa com as influências exercidas pelos
artistas de TV, e pelas novidades da vitrine.
Como hipótese explicativa para tal achado, podemos aventar a idéia de que os jovens
da escola pública, ao disporem de menos recursos financeiros, não podem correr tanto o risco
de errar, por isso preferem se apoiar em modelos pré-estabelecidos de moda. Além do que os
jovens da escola particular têm maior dificuldade em assumir que estão imitando modelos pré-
estabelecidos, apoiando-se em elementos presentes em seu universo cultural – como viagens e
18

contatos com universo artístico, por exemplo - que lhes forneceriam uma relativa segurança
própria, que os permitiriam arriscar na construção de looks.

Tabela 10 – Preferência de compra do jovem em relação à roupas e marcas da moda ao ter um


valor restrito em dinheiro, por sexo, segundo a escola freqüentada:
PREFEREM PREFEREM
LEGITIMIDADE VARIEDADE
TIPO DE ESCOLA SEXO (COMPRAR POUCAS (COMPRAR VÁRIAS TOTAL
PEÇAS DE ROUPAS PEÇAS DE ROUPAS
QUE ESTÃO NA MODA QUE NÃO ESTÃO TÃO
E DE MARCAS NA MODA E DE
FAMOSAS) MARCAS MAIS Nº %
POPULARES)
Nº % Nº %
MASC. 24 23,76 27 26,73 51 50,49

JOVENS ESC. PUBLICA FEM. 16 15,84 34 33,67 50 49,51

MASC. 26 23,85 24 22,02 50 45,87


JOVENS ESC. PARTICULAR
FEM. 20 18,35 39 35,78 59 54,13

TOTAL DA AMOSTRA 86 40,95 124 59,05 210 100

Nota-se nesta tabela que as meninas, tanto da escola pública quanto da particular,
afirmam apostar mais na variedade de peças do que na legitimidade conferida pela marca, ao
contrário dos rapazes, que apresentam quase os mesmos percentuais de respostas para ambas
as respostas.

Tabela 11 - A importância que o jovem atribui aos acessórios, conforme o sexo, segundo a
escola freqüentada:

SUPER COMPRA SÓ DE NEM LIGA


TIPO DE ESCOLA SEXO IMPORTANTES, VEZ EM QD.,NEM PARA TOTAL
COMPRA
SEMPRE USA ACESSÓRIOS
SEMPRE QUE
Nº %
PODE
Nº % Nº %
Nº %
19

MASC. 15 14,85 23 22,77 13 12,87 51 50,49


JOVENS ESC. PUBLICA
FEM. 28 27,72 20 19,80 2 1,99 50 49,51

TOTAL ESC. PÚBLICA 43 42,57 43 42,57 15 14,86 101 100

MASC. 6 5,50 14 12,84 30 27,53 50 45,87


JOVENS ESC. PARTICULAR
FEM. 18 16,51 32 29,36 9 8,26 59 54,13

TOTAL ESC. PARTICULAR 24 22,01 46 42,20 39 35,79 109 100

TOTAL DA AMOSTRA 67 31,90 89 42,38 54 25,72 210 100

Nota-se, na tabela acima, uma maior preocupação com os detalhes da moda e suas
implicações por parte das meninas, em ambas as escolas, assim como uma alta concentração
de respostas que apontaram os acessórios como “super importantes” dentre os jovens da escola
pública (42,57%). Talvez para esses jovens, os acessórios venham a constituir uma forma mais
acessível de inovar as roupas que já têm e criar novas combinações com um menor custo.

Tabela 12 – O modelo de jeans que o jovem prefere, conforme o sexo, segundo a escola
freqüentada:

OS OS COM QUALQUER

TIPO DE ESCOLA SEXO TRADICION DETALHES UM DESDE Q. QUALQUER tOTAL


RASGADO E
AIS DIFERENCIA UM SERVE
CINTURA
DOS
BAIXA
Nº %
Nº % Nº % Nº %

MASC 18 17,82 21 20,79 0 0 12 11,88 51 50,49


JOVENS E. PUBLICA

FEM. 15 14,85 26 25,74 3 2,97 6 5,95 50 49,51

TOTAL ESC. 33 32,67 47 46,53 3 2,97 18 17,83 101 100


PÚBLICA
MASC. 23 21,10 8 7,34 3 2,75 16 14,68 50 45,87
JOVENS E. PARTIC.
FEM.
29 26,60 14 12,84 9 8,26 7 6,43 59 54,13

TOTAL ESC. PARTIC. 52 47,70 22 20,18 12 11,01 23 21,11 109 100


20

TOTAL DA 85 40,48 69 32,86 15 7,14 41 19,52 210 100


AMOSTRA

Através desta tabela, é possível novamente constatar uma nítida preocupação dos
jovens da escola pública em vestir uma roupa mais diferenciada, neste caso, o jeans com
detalhes. Os jovens da escola particular preferem de forma geral os jeans tradicionais, havendo
um índice ainda maior neste grupo entre as meninas.

Para encerrar a pesquisa, foi solicitado aos jovens, que falassem sobre a importância
da moda em suas vidas e que citassem seus sonhos de consumo. Devido ao volume extenso
das respostas apresentadas, selecionamos os depoimentos mais significativos, apresentados a
seguir:

QUADRO 5 - DEPOIMENTOS DOS JOVENS DA ESCOLA PÚBLICA EM RELAÇÃO À


IMPORTÂNCIA DA MODA:

JOVENS ESCOLA PÚBLICA


È IMPORTANTE ( 27 ALUNOS DECLARARAM IMPORTANTE : 26,73 %)
- “ A moda é extremamente importante, ainda mais que estou afim de lançar minha grife de roupas. A moda está ligada à
sociedade compondo o estilo da cidade”. ( Masculino, 16 a, 2ª série).
- “ A moda é importante para mim para me sentir bem”. (Masculino, 15 a. 1ª série).
- “ É algo extremamente importante em meu cotidiano, não gosto de sair de casa “mal arrumada”, estou sempre antenada com as
tendências. A moda é fundamental”. ( Feminino, 16ª, 2ª série).
-“A moda é importante para a gente se sentir bem com o que usamos e estarmos nos renovando sempre, para ficarmos mais
bonitas, feminina, feliz, etc. Mas temos sempre que adaptar a moda à nossa identidade”. ( Feminino, 17 a, 2ª série).
- “ A moda é importante, pois quando a pessoa está na moda, ela se sente melhor, mais bonita, mais confortá vel algumas vezes”. (
Feminino, 17 a, 3ª série).

IMPORTÂNCIA RAZOÁVEL ( 38 ALUNOS ASSIM DECLARARAM : 37,62%)


- “ A moda não é muito importante para mim, eu tenho meu estilo e visto o que eu gosto, não fico esperando sair novidades na
loja”. ( Masculino, 15 a; 2ª série).
- “ Eu não curto muito seguir a moda, para mim as roupas indicam a sua tribo, a sua classe social”. ( Masculino, 16ª; 2ª série) .
- “ Apesar de não ligar muito para moda, acho que sua importância é pouco necessária em minha opinião, pois não ligo muito.
Ligo apenas para meu conforto e bem estar”.( Feminino, 15 a. 1ª série).
- “A importância na verdade é se sentir bem com a roupa que uso e não importa de onde seja. As vezes faz bem ficar mais bonita
para sair, mas acho que a moda se transmite pelo seu interior”.( feminino, 16 a. 1ª série)
- “ Não faço dela uma preocupação, acho importante sempre estar arrumado e bem vestido, mas não fazer disso uma regra ou
norma”.( Feminino, 17 a. 3ª série).
NÃO É IMPORTANTE ( 31 ALUNOS DECLARARAM NÃO IMPORTANTE : 30,69 %)
21

- “ Para mim a moda não tem importância, você usa o que você pode e o que está ao seu alcance, para mim não é a roupa que faz
a pessoa e sim o seu caráter”. ( Feminino, 17 a. 2ª série).
- “Nenhuma, a moda para mim não é nada, gosto de usar o que me faz sentir bem.” ( Masculino, 17 a. 2ª série).
- “Ela não me diz nada”. ( Masculino, 16 a,1ª série).
- “Nenhuma importância, uso o que gosto, o que me atrai e o que me deixa à vontade”. ( Feminino, 16ª, 1ª série).
- “ Nenhuma, a moda faz com que as pessoas se importem mais com ela, do que com seu próprio estilo”. ( Masculino, 15 a. 1ª
série).

OBS: 5 alunos não responderam (4,95 %)

QUADRO 6 – DEPOIMENTOS DOS JOVENS DA ESCOLA PARTICULAR EM


RELAÇÃO À IMPORTÂNCIA DA MODA:

JOVENS ESCOLA PARTICULAR


È IMPORTANTE ( 21 ALUNOS DECLARARAM IMPORTANTE : 19,27 %)
- “ É importante, costumo associar a moda ao meu conforto e gosto, mas procuro me acostumar com a moda”. ( Masculino, 16ª, 3ª
série).
- “ Na vida se vestir bem é importante, independente de marca e preços. Uma pessoa com bom gosto consegue se vestir bem e
pagar um preço justo”. ( Masculino, 17 a; 3ª série).
- “ Acho a moda muito importante, pois é a primeira coisa que uma pessoa vê. Gosto de me vestir bem. Não sou chata, mas gosto
de coisas de marca: sevem jeans, Balenciaga, Gucci, Marc Jacdos, Emilio Pucci, porque querendo ou não, são de bom gosto e
qualidade”. ( Feminino, 16 a., 3ª série).
- “ A moda é importante para nós termos um estilo legal. Um estilo que os jovens usam e que não nos sentimos mal, mas cada um
tem um estilo”. ( Feminino, 15 a., 1ª série).
- “ Me importo muito com moda, pois gosto de andar arrumada, gosto de me sentir pelo menos um pouco mais bonita com o uso de
determinadas roupas, apesar de não achar a moda a coisa mais importante.” ( Feminino, 16 a., 3ª série).
IMPORTÂNCIA RAZOÁVEL ( 47 ALUNOS ASSIM DECLARARAM : 43,12%)
- “ É um pouco importante, uso a moda de acordo com meu estilo “. ( Masculino, 16ª., 2ª série).
- “ Não acho muito importante, tem coisas mais importantes que isso. Sou básica e uso coisas que me faz bem”. ( Feminino, 16 a.,
2ª série).
- “ Não ligo muito, mas gosto de roupas bonitas” ( Masculino, 17 a., 1ª série).
- “ A moda é interessante, mas eu uso o que me favorece e é confortável acima de tudo. Adoro, mas não sigo, para mim moda é
você quem faz e ponto. O resto: tendências, modinhas de momento, são apenas para movimentar mercados e agitar a vida de
pessoas supérfluas, que fazem parte de uma minoria”. ( Feminino, 14 a., 1ª série).
- “ A moda para minha vida não é muito necessária, mas procuro estar confortável com minhas roupas”.( Feminino, 17 a., 3ª série).
NÃO É IMPORTANTE ( 34 ALUNOS DECLARARAM NÃO IMPORTANTE 31,19 %)
- “ Pouco me importa, visto o que faz meu estilo. Básico, chego até ser desleixada” ( Feminino, 16 a., 2ª série).
- “ Não ligo para ela, moda é uma coisa para pessoas fracas, sem estilo próprio que é influenciada por coisa medíocres”. (
Masculino, 15ª., 2ª série).
- “ A moda não exerce nenhuma influência na minha vida”. (Feminino, 17 a., 2ª série)
- “ Nenhuma, não ligo para moda. O importante é não estar “estranho” Gosto de ser normal.( Masculino, 15ª., 1ª série.
- “ Não é importante, o importante é o meu próprio estilo. ( Masculino, 17 a., 3ª série).

OBS: 7 alunos não responderam (6,42%)


22

Tabela 13 – Importância da moda para os jovens entrevistados, segundo a escola freqüentada:


NÃO NÃO
TIPO DE IMPORTANTE RAZOÁVEL IMPORTANTE RESPONDERAM TOTAL
ESCOLA Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
J. E. PÚBLICA 27 56,25 (26,73) 38 44,70 ( 37,63) 31 47,69 (30,69) 5 41,67 (4,95) 101 100

J. E. PARTIC. 21 43,75 (19,27) 47 55,30 (43,12) 34 52,31 (31,19) 7 58,33 (6,42) 109 100

TOTAL DA 48 100 (22,86) 85 100 (40,48) 65 100 (30,95) 12 100 (5,71) 210 100
AMOSTRA

A observação da tabela 13 revela uma resistência por parte dos jovens entrevistados em
atribuir declaradamente um alto valor de importância à moda. Dentre os alunos de ambas as
escolas a maior concentração de respostas encontra-e na categoria razoavelmente importante, e
cerca de um terço do conjunto dos entrevistados declararam que a moda não é importante. É
interessante ressaltar que, dentre os alunos que afirmaram que a moda é importante, 56,25%
são da escola pública.
A observação do quadro abaixo, revela a similaridade dos sonhos de consumo dos
jovens pertencentes aos dois universos pesquisados. A partir da listagem das respostas abertas,
construímos duas grandes categorias: os sonhos objetivos e os subjetivos.

QUADRO 7 – DECLARAÇÕES SOBRE SONHO DE CONSUMO.: ESCOLAS PÚBLICA E


PARTICULAR
JOVENS ESCOLA PÚBLICA
SONHOS OBJETIVOS SONHOS SUBJETIVOS
- Bolsa e sapatos - Comprar tudo o que quiser
-Câmera digital -Fazer faculdade
-Celular com câmera -Ser médica
- Celular mais moderno -Vida mais estável
- Celular -Faculdade no exterior
-Videogame -Ganhar muito dinheiro
-Play Station -ter mais opções de roupas
- iPod -Participar do BBB
-Carro -Ser jogador de futebol
-Casa própria -Um cartão de crédito sem limites
-Mustang 89 -Ser modelo
-Escova progressiva -Ser rica
-Um carro, uma casa, um computador, um videogame. -Ser feliz
JOVENS ESCOLA PARTICULAR
23

SONHOS OBJETIVOS SONHOS SUBJETIVOS


- Um Audi - Ser milionário
- Um BMW - Ter uma vida independente
-Uma casa em Bahamas - Viajar
-Uma bateria - Morar na Itália
-Uma Ferrari - Fazer um mochilão pela Europa
-Um Lamborguini - Que o mundo seja justo
-Moto - Surfar todos os dias
-Ter várias bolsas Prada, Lui Vitton, Valentino, Dior - Trabalhar e viver com sucesso
-Um armário de tênis - Ser quem sou
-Uma Halley Davison - Cartão de crédito sem limites
-Um Porche -Viajar para Disney e conhecer Mickey Mouse
-Carro importado -Viajar para todos os lugares do mundo
-Um carro irado -Viajar para lua

OBS: Do total da amostra:

- 90 citaram sonhos objetivos


- 63 citaram sonhos subjetivos
- 10 citaram nome de pessoas, como artistas.
- 20 declararam não ter sonho de consumo
- 27 não responderam.

É interessante salientarmos a similaridade dos sonhos objetivos para os dois grupos


de entrevistados, sendo que a única diferença é que no caso dos jovens da escola particular são
citadas marcas e grifes reconhecidas. Os sonhos de consumo subjetivos remetem ao universo
do impalpável, da utopia e da experiência/vivência e revelam, mais do que o desejo e a posse
de bens palpáveis, o universo cultural do entrevistado: ser jogador de futebol, participar do
“BBB” (escola pública), ou viajar para todos os lugares do mundo e morar na itália (escola
particular).

Considerações finais

É importante ressaltar que a análise aqui emitida, não tem a pretensão de generalizar a
questão das diferenças sociais entre os jovens, as quais atingem alto grau de complexidade,
que vão muito além das questões relacionadas à moda. Contudo, as informações coletadas nos
24

permitem, ao menos, construir hipóteses que colaboram para uma reflexão especulativa sobre
a relação moda e juventude, de maneira mais geral.
Embora fosse possível perceber as diferenças relacionadas ao potencial de posse entre
os jovens das duas escolas, percebeu-se que os interesses, desejos e os vestuários são os
mesmos, ainda que destoando em relação à legitimidade.
As preferências quanto ao tipo de roupas que usam, seja na escola ou final de semana,
são as mesmas. Nesse aspecto, notou-se um comportamento diferenciado em relação às
meninas de ambas as escolas, as quais demonstraram uma maior preocupação com o visual,
em estarem bonitas, arrumadas, diferenciadas e na moda nas ocasiões de passeio. A isso,
atribui-se uma questão cultural, herdada de séculos passados, quando a mulher
obrigatoriamente tinha de estar bonita, atraente, impecável, e que ainda perdura na sociedade
atual (embora em menores proporções), como condição para galgar a escala do sucesso.
Ao serem questionados quanto à legitimidade das marcas, a grande maioria não deu
ênfase a esse ponto, preferem variedade à legitimidade.
Lipovetsky novamente nos ajuda a justificar tal constatação:

A nova distribuição do guarda-roupa testemunha do mesmo modo o


impulso dos valores hedonistas e psi próprios às nossas sociedades. Um
número crescente de pessoas prefere comprar freqüentemente a comprar
caro, prefere comprar pequenas peças a “grandes roupas” – esta é uma
expressão de vestuário típica da nova era do individualismo. Com a
compra de pequenas peças, não sé temos ocasião de exercer e escolha
mais freqüentemente, como também nos damos prazer mais vezes. Mudar
freqüentemente pelo prazer da mudança, pela festa do disfarce e da
metamorfose de si, não pelo desejo de ostentação. A compra do vestuário
com certeza não é estritamente egocêntrica, está sempre ligada à relação
com o Outro, ao desejo de sedução, mas uma sedução em dia com a
cultura hedonista democrática. O objetivo do status se eclipsa em favor
da renovação lúdica, do prazer da mudança. Uma renovação de guarda-
roupa comandada cada vez mais pelo que se ama mas também pelo
desejo de “mudar de pele”.(LIPOVETSKY, 1989, p. 149)
25

Muitos, de forma objetiva ou não, referiram-se aos seguidores incondicionais da


moda, como pessoas fracas, fúteis e sem personalidade. Em relação às influências recebidas do
meio externo, observou-se uma pequena alteração na predisposição do jovem da escola
pública, quando comparado com os demais, em seguir modelos de moda que estão na mídia. A
este fato podemos atribuir a questão da dificuldade financeira, que tende a impulsionar
atitudes no sentido de que não ocorram erros de escolha e conseqüentemente perda de
dinheiro, com isso preferem se apoiar a um modelo garantido de moda.
Também podemos arriscar a hipótese de que, por outro lado, o jovem da escola
particular teria uma “segurança” de si maior, um maior encorajamento a apostar numa
“originalidade”, visto que tem uma auto-imagem mais positivada, percebendo-se como
diferenciado. Percebeu-se, de modo geral, que os alunos da escola particular têm uma noção
de si mais “estilizada”, ou mais “individualizada”. É como se “filtrassem” mais as influências
da mídia e da moda, apresentando uma “segurança de si” relativamente maior, se comparado
aos da escola pública, o que não significa dizer que estejam imunes às tendências da moda.
Quanto aos sonhos de consumo podemos constatar alguns desvios na uniformidade
de comportamento entre os jovens de classes distintas. Percebeu-se que os jovens da escola
pública, almejam produtos e mercadorias que circundam o cotidiano do universo jovem, como
roupas, sapatos, aparelhos de som, celulares, videogames e quantidades maiores de coisas que
já tem. No campo do subjetivo, sonham em conseguir condições financeiras a fim de alcançar
os sonhos objetivos, seja através de uma faculdade, que os garantam uma profissão, seja
sonhando ser modelo, jogador de futebol, ganhar na mega sena ou participar do “BBB”2.
Os jovens da escola particular, por sua vez, buscam produtos mais específicos,
citando marcas de status, carros importados, casa em Bahamas, Ferrari, Halley Davson e
outros. No campo subjetivo, mencionam situações que possam ser aproveitadas no momento,
como morar na Itália, surfar, ter uma vida independente, viver com sucesso, que o mundo seja
justo, e outras manifestações que não indicam o grande desejo por coisas materiais.
No entanto, percebeu-se que o jovem que freqüenta a escola particular, obteve
experiências culturais - como viagens, aperfeiçoamento através de cursos extras, contato com
pessoas de alta cultura entre outros - apresenta uma maior familiaridade no contato com

2
“BBB” é um programa de reality show, anualmente exibido pela rede Globo de televisão, onde os
participantes são pessoas comuns, que pela exposição tornam-se reconhecidas como celebridades.
26

marcas legítimas de produtos de alto custo e lugares específicos, envolvendo recursos


financeiros, observados nos relatos de seus sonhos de consumo e nos locais que
freqüentemente compram roupas da moda; apresentam uma maior segurança em investir mais
em “estilo próprio” do que copiando modelos da mídia. Em oposição, os jovens da escola
pública demonstraram uma maior preocupação com a moda do que os demais, utilizando mais
os recursos da mídia como inspiração para copiar modelos e looks. Nos relatos sobre seus
sonhos de consumo, citaram produtos que fazem parte de seus cotidianos, almejando maior
quantidade e qualidade dos mesmos.

A despeito das diferenças entre os dois grupos de jovens entrevistados, foi possível
entrevermos através dos depoimentos e informações coletadas que a idéia de “estilo” vem se
impondo mais do que a de “moda”, fazendo valer o que detectou Diane Crane no seu trabalho
sobre o papel social da moda na contemporaneidade:

No século XX, o vestuário havia perdido gradativamente sua importância


econômica, mas não simbólica, com a enorme propagação de roupas
prontas de todas as faixas de preço. A oferta de roupas baratas significa
que aqueles cujos recursos são limitados podem encontrar ou criar
estilos pessoais que expressem a percepção que têm de suas identidades,
em vez de imitar estilos originalmente vendidos aos mais ricos. Se há
registros, no passado, de um estilo de rua informal entre trabalhadores,
a proliferação de estilos de rua representando diversas subculturas
dentro da classe operária só ocorreu nos últimos cinqüenta anos.
Teoricamente, a moda é acessível às pessoas de todos os níveis sociais,
tanto para a criação de estilos que expressem sua identidade, quanto
para a adoção de estilos criados por empresas do ramo de vestuário.
A natureza da moda mudou, assim como as maneiras pelas quais as
pessoas respondem a ela. A moda de século XIX consistia num padrão
bem definido de apresentação largamente adotado. A moda
contemporânea é mais ambígua e multifacetada, em concordância com a
natureza altamente fragmentada das sociedades pós-industriais. Suzan
Kaiser, Rivhard Nagasawa e Laura Hutton referem-se à “gama
complexa e à infinidade de estilos de roupas e apresentação pessoal „que
27

estão na moda‟.[...] a variedades de opções no mercado contribui para


um estado de confusão que beira o caos”. As opções de vestuário
refletem a complexidade de maneiras pelas quais percebemos nossa
ligação com os outros nas sociedades contemporâneas. (CRANE, 2006, p.
29)

Embora possamos ter percebido uma resistência à admissão da influência da moda


em seus modos de vestir, principalmente dentre os entrevistados da escola particular, ela se fez
presente no momento da pesquisa em que o entrevistado foi remetido ao universo do sonho e
do desejo. Marcas legitimadas e reconhecidas foram citadas como sonho de consumo
justamente nesta parcela dos entrevistados, o que nos remete às reflexões de Pierre Bourdieu
acerca dos gostos e consumo culturais. Para o autor, as práticas culturais estão associadas ao
capital cultural, definindo o padrão de gosto e incluindo o conhecimento da cultura, bem
como, a capacidade crítica para avaliá-la e apreciá-la. Esses atributos são adquiridos durante a
infância, no seio da família e no sistema educacional.
Por fim, podemos afirmar que jovem atual se relaciona com a moda contemporânea -
a qual contempla um leque de possibilidades bem mais amplo, no que toca a apresentação
pessoal e criação de estilos - de forma homogênea. As diferenciações que se apresentam em
relação à moda jovem atualmente, estão, visualmente, muito mais ligadas às questões
ideológicas (tribos, grupos), de gênero e de faixa etária (considerando o momento em que
entram para o mercado de trabalho), do que para condições socioeconômicas. Atualmente, as
roupas oferecidas no mercado jovem e divulgadas pela mídia, envolvem uma grande variedade
no que diz respeito a modelos, qualidades, marcas e preços. Além disto, o crescente aumento
da circulação de informações sobre moda e estilo vem tornando o consumo de imagens de
moda mais acessíveis para todos os segmentos sociais, que consomem e usam as referências
de moda homogeneamente, na busca da diferenciação através da construção do estilo pessoal.

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