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hed . INDIGENAS NA GEOGRAFIA DE MINAS GERAIS Ee 1 ir aa “Nomes Indigenas na Geografia de Minas Gerais”, do Prof. Sal- vador Pires Pontes, é um traba- Tho que custou cérea de vinte anos de estudos e pesquisas ao no- Bre mestre de Minas. Esta bene- ditina paciéncia significa, antes de tudo, amor & gente de sua terra. Este amor e esta persistén- cia reunem-se num livro que se tornaré fonte obrigatéria de con- sulla para os contemporaneos e porvindouros. Edmundo Dantés Passos, outro dos nossos mais dis- tinguidos tupindlogos, soube ver no livro de Salvador Pires Pontes © valor que éle, de fato, possui. Pesquisador amoravel e minuci- 0:0, o escritor Pires Pontes ergueu com éste trabalho uma dessas obras que fazem o leitor de pron- to respeitar e querer bem ao seu autor. Por mais descuidado ou apressado que seja o manuseador déste “Nomes Indigenas na Geo- grafia de Minas Gerais”, éle in- tuira logo ésse amor e essa pes- quisa_e dai o seu respeito e ad- miragio. Além da catalogacio paciente e diuturna, o Prof. Salvador Pires Pontes precedeu éste vigoroso tra- balho com diversas consideracoes esclarecedoras sébre a origem das linguas indigenas e sdbre o viver de nossos indios. Autoridade na matéria, respei- tado em todo o Brasil como in- discutivel mestre em_assuntos in- digenas, Salvador Pires Pontes exerceu. durante largo tempo o cargo de inspetor de ensino em Minas. Sébre o assunto foi con- sultado sempre por eminentes fi- guras do magistério nacional. Este livro, escrito em linguagem limpida e ‘objetiva, coroa mais uma vez a autoridade do mestre mineiro Euclides Marques Andrade NOMES INDIGENAS NA GEOGRAFIA DE MINAS GERAIS SALVADOR PIRES PONTES FARMACRUTICO E INSPETOR SECIONAL DO ENSINO Da Acctemia ttseicipalista de Letras de Minas Cerals NOMES INDIGENAS NA GEOGRAFIA DE MINAS GERAIS i BELO HORIZONTE 1970 Conceitos de varios autores. Nomes de lugares e as assembléias ou nhomonguetd. O Indigena. Principais nagées e tribos. Vocabuldrio de usos e costumes. A lingua dos indios e a catequese dos jesuitas. O Dia do fndio. Aguas-emendadas de Minas Gerais. Itiguapira. Vordbulos tupis e guaranis derivados de pedra, terra, dr- vore, mato, animal, ave, peixe, fogo, abelha, dgua, serpente, mosquito. Topénimos. Etimologia. Notas histéricas. “Se fizermos um excurso pelo mapa da nossa terra, loparemos com um sem-conto de nomes tupis, denuncian- do acidentes geograficos, cidades, vilas, povoados e até fa- zendas e sitios.” (Gladstone Chaves de Melo, A Lingua do Brasil). Agradecimento Ao Dr. PAULO CAMPOS GUIMARAES, Diretor da Imprensa Oficial. A meméria de meus queridos pais ANTONIO PIRES DA SILVA PONTES JUNIOR e MARIA VALERIANA PIRES LAGE Agradecimentos a Professéra EPONINA FERREIRA LEITE pelo desenho da capa; ao meu genro PAULO LIMA SOUZA GOYATA pelo trabalho de datilografia. ADVERTENCIA O presente trabalho, realizado durante cérca de vinte anos nos vagares de minhas fungées de Inspetor de Ensino, provém de estudos e pesquisas referentes & etimologia e identificacdo histérica de nomes primitivos tupis e guaranis existentes na geografia de Minas Gerais dados pelos indi- genas e bandeirantes ou formados pela administracéo piiblica. Leis votadas pela Assembléia Legislativa, por ocasido de novas Revisées Administrativas do Estado, tém altera- do os topénimos de diversas localidades, com o fim de fazer cessar a homonimia ewistente que tem acarretado con- fusées prejudiciais ds relacées de ordem administrativa, comunicacées postais, telegrdficas, ferrovidrias ete. s O amor & Pétria, ao nosso idioma e ao estudo das linquas indiqenas, constitu’ a nossa preocunacéo e 0 de- sejo de homenagear a nossa terra e oferecer éste trabalho a mocidade brasileira para predispé-la, no dizer de Arman- do Levy Cardoso, em AMERIGENISMOS, a “ésse entusias- mo de cada vez mais estudar, para cada vez menos desco- nhecer, ésse mundo maravilhoso que sGo as nossas linguas indigenas”. Que outros, com mais capacidade ¢ recursos, tomem a si éese trabalho e 0 ampliem no elevado propésito de en- riquecer a nossa lingua e a cultura de nossa gente. Adoto a ortoqrafia recomendada pela Conferéneia de Geografia de 1926. : Belo Horizonte, 3 de abril de 1968. SALVADOR PIRES PONTES ABREVIATURAS Alt. — Alteragao B. C. — Batista Caetano B. J. S. — Bernardino José de Souza Com. — Comarca Cont. — Contrac&o Corr. — Corruptela Est. — Estagao Form. —- Formacao Loc. — Localidade Mun. — Municipio Reg. — Registra Seg. — Segundo Th. S. —- Theodoro Sampaio Top. ext. — Topénimo extinto Voc. — Vocabulo Vol. — Volume Vv. — Veja CONCEITOS DE VARIOS AUTORES “Nenhuma lingua primitiva do mundo, nem mesmo o sans- crito, ocupou tao grande extensio geografica como o tupi e seus dialetos. Em uma extensio de milhares de léguas, estio nos nomes dos lugares, das plantas, dos rios e das tribos indigenas, os im- perecedores vestigios dessa lingua.” (GENERAL COUTO DE MA- GALHAES, “O SELVAGEM”). oe ® “O conhecimento das linguas é o mais seguro guia para 2 compreensao intima das nagdes.” (L. R. LEPSIUS, DE BERLIM) . “Se tivéssemos autoridade para aconselhar, diriamos que na ordem dos nossos estudos de humanistica deveria ocupar lugar de honra o estudo da lingua arabica e de algumas linguas americanas, principalmente o tupi-guarani.” (JOKO RIBEIRO, ESTUDOS FILO- LOGICOS) . “A toponimia nasceu no Século XIX.” (PIERRE CHESSEX, L’ORIGINE DES NOMS DE PERSONNES). ee ® “Os topénimos constituem, segundo M. Brunhes, preciosos fosseis, os mais seguros ¢ talvez os tnicos testemunhos das forma- ces lingiiisticas desaparecidas.” (ALBERT DAUZAT, LES NOMS DE LIEUX). — 18 — “A Lingua Tupi faz parte do palriménio nacional brasilei- ro.” (CONSTANTINO TESTEVIN, GRAMATICA DA LINGUA TUPI). “B preciso estudar o Brasil com os seus encantos ¢ as suas. tristezas, para amé-lo conscientemente: -~ estudar a terra, os ani mais, a gente do Brasil.” (ROQUETE PINTO. CITA AGENOR MACEDO E VASCONCELLOS EM 0 INDIO BRASIL Segundo recentemente concluin a Academia de Ciéncias de Paris, existem no mundo cérea de 3.000 linguas ¢ outros tantos dialetos. — (O CRUZEIRO DE 25-MAIO-1957) . A lingua Tupi é irma da Quichua do Peru, o tronco prin- al de tédas as linguas americanas, do Sul. cip No mapa-mtindi, os acidentes geograficos assinalam, indele- velmente, os rastros pré-histéricos das: Mnguas Quichua-Tupi. A prioridale da lingua Tupi, sobre tédas as linguas hum: nas, é magistralmente sustentada no “Brasil Pré-histérico”, de Ul ses Penafort, que mostra, em linguagem convincente, no ci dessa obra, a afinidade das linguas americanas com as hebraicas, sanscrito, grego, egipcias. ¢ outros dialctos asiasticos (AMAZONIA CYCLOPICA, DE JORGE HURLEY). Existe a possibilidade de parentesco lingiifstico, e é muito provavel certo ponto de contato cntre 0 tronco austriaco e 9 ibe- tano-chinés, e ainda mais entre a linguagem coreana ¢ 0 tronco indo-europeu, na linguagem egipcia ¢ 0 tronco bantu, e em muitas linguas americanas tidas, e como isoladas. (L’UNITA DEL GENERE UMANO, DE F. MICHELE SCHULIEN) Milhares de anos antes do ni: nossos antepassados habitavam o pla cimento de Jesus Cristo, os ato de Tran. na Asia Central, —19 — e falavam o sanscrito, do qual se derivam tanto 0 grego como o latim, e quase tédas as linguas modernas da Europa e do Oeste e Sul da Asia. (LIGOES DE MORAL, DE CHARLES W. ARMSTRONG). + ee Ha uma correlagio remota entre éste idioma (o guarani) selvagem e os indo-europeus, mais estreita com o Castelhano que com o Francés, e com o Latim mais do que com o Grego. (GRA- MATICA GUARANI, DE JUAN DE BIANCHETTI). + * ® ce hoje fora de duvida que o sAnscrito forneceu cérca mil raizes ao Quichua. de dua Das linguas indigenas brasileiras, parece que a Guaicuru tem alguma afinidade com o sanscrito. (QO SELVAGEM, DE 0 GE- NERAL COUTO DE MAGALHAES). ee Em muitos pontos, coincidem os fatos da lingua indigena do Brasil com os das linguas indo-européias E assim parece que, em téda a parte, tém as Ifnguas tecida a sua trama sob a inspiracio do mesmo Espirito que, separando, No espago, os povos, tende, ao mesmo tempo, a uni-ics nos destinos. (PORTUGUES DA EUROPA E PORTUGUES DA AMBRICA, DE CLOVIS MONTEIRO) . eee “Confrontando, pois, a lingua latina com a portuguesa, e pro- curando conhecer o modo por que aquela degenerou e se converteu nesta, acharemos que na maior parte das alteragées que sofreram seus vocabulos, assim na troca de umas em outras letras, como na formacéo das novas desinénci: se da certa “regularidade” que é, sem divida, “o primeiro caracteristico” que assinala o genio da Lingua Portuguésa. Ja Duarte Nunes do Leao observara que uma das causas da corrupgio dos vocdbulos latinos era devida 4 troca uniforme de umas em outras letras.” (GENIO DA LINGUA PORTUGUESA, POR FRANCISCO EVARISTO LEONI). — 20 — A linguagem nunca foi empregada pelos povos selvagens co- mo espelho de seu pensamento, mas, como a expressio das suas necessidades de trabalho, dos atos de que dependia o bem-estar de sua vida. (TRATADO DE SEMANTICA BRASILEIRA, SILVEIRA BUENO). Os nomes toponimicos, quase sem excecio, contém, além da voz propriamente técnica, geografica, um clemento que designa um acidente caracteristico do terreno, 0 ar, a agua, 0 fogo, e, as vézes, se reduzem a éste unico vocdbulo. ste elemento tem, como 6 facil compreender, um grande valor geografico, histérico ¢ so- cial. — A voz primitiva foi mal ouvida, mal transmitida ou mai pronunciada por pessoas que nao entendiam o guarani. (EL GUA- RANI EN LA GEOGRAFIA DE AMERICA. — A. JOVER PERALTA Pag. 25 e XXXVI). Recalcadas pelas linguas de flexdo dos conquistadores e dos colonos europeus, as linguas aglutinantes dos amerindios refugiam- -se em territérios cada vez mais escassos. O vale do Guaporé, no extremo noroeste da Rondénia, é um babel de residuos idiomaticos indigenas, sendo faladas sete linguas diferentes entre 0 dominio dos povos Nambiquares e Panos. A Europa Central é uma babel de linguas de flexao. Até a Inglaterra tem idiomas de sobrevivéncia dos celtas (GEOGRAFIA HUMANA DE VERISSIMO VARZEA E ACQUERONF). Adolfo Varnhagen sustenta a teoria de que o tupi e 0 guarani derivam do egipcio, ¢ néle encontraram raizes russas Rivet fala no parentesco do patagon com dialetos austra- lianos. © abade Molina extrai vozes radicais aracuanas de assom- brosa analogia com o grego e o latim. O aimara é lingua esquecida e anterior ao quichua. (IDIG- MAS ABORIGENES — CARLOS ABREGU VIRREIRA). — 21 — TOPONIMOS No Brasil ¢ fora déle, o estudo dos nomes de lugares tem sido um campo aberto as investigagdes da “historia” da “filosofia”, da “etimologia”, da “literatura”. Lendas, mitos, tradigdes, usos e costumes, revivem muitas vézes, 4 simples evocagio da origem etimolégica de um simples to- ponimo, na aparéncia insignificante ou inexpressivo. | (NELSON DE SENNA). Nos tempos do Império, os nossos dois soberanos da di- nastia de Braganca compareciam a solene sessio de abertura do Parlamento, para lerem a “Fala do Trono”, revestidos do colorido ¢ imponente “manto de papos-de-tucano”, que Ihes aumentava o ar majestoso. Tal como o faziam os tuxauas, que, em solenes ret- nides da tribo, se cobriam com o “manto de réde” da iniadba. (A INFLUENCIA DO {NDIO NA LINGUAGEM BRASILEIRA. — NEL- SON DE SENNA) “A respeito dos nomes de plantas, -— por indoléncia, os in- dios, para se verem livres déles (os viajantes Marcgrav e seu com- panheiro Wilhelm Piso) Ihes davam qualquer nome que Thes chegava & meméria”. Gragas & grande dispersio do povo tupi e sua mistura com outros povos de racas diversas, explica-se hoje por que os nomes dos vegetais sofreram tanta modificagio e por que sao transferidos muitas vézes de um objeto ou espécie para outra mais ou menos parecida ou mesmo afim. Seria duplamente admiravel se assim nio tivesse sucedido. 0 indio, por indole natural, por indiferenca e preguica, nao leva muito a sério o uso das palavras; éle troca silabas, vogais e consoantes, ora por génio natural da sua lingua ou pelo modo de falar, ora por mera comodidade. Com isso explicam-se muitas alteragées por que passaram alguns dos primitivos nomes da lin- gua tupi. (Nomina Plantarum in Lingua Tupi (1858), Carlos Fre- derico von MARTIUS,, citagio de F. C. HOEHNE em Botanica e Agricultura no Brasil — Século XVI). Brasiliana, 1937. NOMES DE LUGARES E AS ASSEMBLEIAS OU NHOMONGUETA Os indigenas sabiam dar nomes com som idéntico a varios Iugares na mesma regido, tendo significado d rente. Na escolha ¢ formagio de nomes de localidades c cousas, tinham muito cuidado, tendo em vista a designa- cho dos caraeteristicos fisicos dos acidentes geograficos, dos animais, vegetais ou objetos. Esses nom sembléias noturnas. cram aceitos apés deliberagdo em as- Os portuguéses, desde o descobrimento, verificaram a utilidade das denominacées indigenas, exprimindo o ma ximo dos caracteres da terra no minimo de silabas, segun- do Plinio Salgado. O Padre Ivo d’Evreux, na obra “Viagem ao Norte do Brasil”, nos anos de 1613 a 1614, diz que os indigenas faziam essas reunides ou “nhomongueté (noonga-monhan- gacta)”, falarem uns com os outros, reunido de consulta con- selho, conforme a formacio de “noonga”, juntar-se, reu- nir-se; “mongueta,” falar a, conversar com “eta”, muitos, — quando tinham de dar nomes a rios, lagos, montes e ou- tros lugares na mesma regifio, na escolha dos quais dis- cutiam questées lingiiisticas. Os guatés, ndo obstante serem republicanos, tinham chefes hereditarios que promoviam reunides, uma vez por ano, em determinados sitios. Essas assembléias duravam dois dias ¢ se realizavam em lugares pelos quais éles tinham uma espécie de venera- cio, tais como os cimos da Serra dos Dourados, a oeste do Paraguai e nas entradas da Lagoa de Uberaba, conforme Walpaeus, em Geografia Fisica do Brasil. No Amazonas, os indios reuniam-se em “conselho ao qual compareciam o “tuxaua” ou “morubixaba”, chefe temporal das tribos, “caciques”, “o maioral”, e bem assim, o pajé ¢ mais alguns velhos. Sua finalidade era manter yivas as tradicdes e cos- tumes, sendo que nas reunides festivas, um déles era en- carregado de contar e instruir os mocos acérca das lendas e dos usos dos seus maiores. Isso era feito antes de tomarem o “caapi (cad, plan- ta erva; pi — contragéo de pinima — colorida, pintada), bebida dela extraida, de que os indios da regido do Uaupé e Icand, afluente da direita do Rio Negro, se servem para embebedar-se a modo do épio, e para completar a bebe- deira do “Caxiri” (bebida alcodlica feita de beiju-acu, em Agua e fermentada). “Caxiri” é vocdbulo de origem caribe. Somente os velhos e os homens adultos a usavam, com exclusio dos mogos e das mulheres. Essa bebida produ- zia-lhes prostagio em meia sonoléncia, visées e sonhos en- cantadores. ~~ Em Minas Gerais, conhecemos a lenda de que os diamantes de Diamantina provinham da carbonizacéo da “acaiaca” — 0 cedro — Aarvore gigantesca que abrigava téda a taba da tribo dos indios Puris que habitavam primi- tivamente aquéles sitios. Essa lenda foi belamente desenvolvida num romance com o titulo de “Acaiaca” pelo insigne escritor, 0 falecido senador e jurisconsulto, Dr. Joaquim Felicio dos Santos, autor das interessantes “Memérias do Distrito Diamantino”. Como era costume, os indios realizavam suas reu- nides ou assembléias, geralmente debaixo de grandes ar- vores, onde escolhiam 0 nome a ser dado a uma localidade, de acérdo com a opiniaio de todos. O INDIGENA — PRINCIPAIS NACOES E TRIBOS — USOS E COSTUMES — VOCABULARIO O Brasil, quando foi descoberto, ja era habitado por indigenas a que se deu o nome de indios por pensarem que nossa terra era uma parte da fndia. Segundo Joao Ribeiro (Histéria do Brasil), os indios do Brasil podem ser classi- ficados em alguns grupos: 1 — Os tupis e guaranis sio os mais civilizados, mais fortes e industriosos, e ocupavam o litoral de sul a norte c¢ as margens dos grandes rios Paraguai, Parana, Amazo- has: — tupis, guaranis, munduructis, jurunas, apiacas, ta- maios, omaguas, maués (fabricantes de guarana) ete. 2 — Os gés (sig. pai; cran, sig. filho) ou tapuias, como Thes chamavam os tupis, rudes, cacadores, presumi- dos descendentes do “homem de Lagoa Santa,” em geral des- conheciam a navegacio e a ceramica; botucudos, aimorés, suids, habitavam o centro do pais. 3 — Os Nu-Aruaks: moxdés, aruaks, paumaris, bau- rés, passé etc. Os Aruaks eram um povo de civilizagdo bastante adi- antada, ja agricutores e ceramistas. Os passés sio con- siderados os mais belos indios do Brasil. 4 — Os Caribas: os naucas, bacairis, palmelas, pi- menteiras. (Do rio Xingu para o norte). Os bakairis pa- recem ser os mais antigos pelo estado puro e rude da lin- gua e da cultura. Os bakairis mansos, no dizer de Von Den Sttein, levam uma vida idilica ¢ buedlica. Ao contrario, os — 26 — bakaris bravios andam nus e miseravelmente, de arco ¢ flecha. Algumas tribos de importancia ndo podem entrar nes- tes grupos gerais e ficam 4 parte: carajd, boréros, guai- curus, goitacds (que parecem extintos) . Eram tupis os tupinambés do Paré e Maranhio, os potiguaras do Ceara e Rio Grande do Norte, os tabajaras ¢ caetés da Paraiba, Pernambuco, Alagoas e Scrgipe, os tupi- niquins, tupinambas e tupinaens da Bahia ¢ Ihéus, os to- miminés do Espirito Santo, os tamoios do Rio de Janeiro, os tupiniquins ¢ os guaiands de S$. Paulo, os carijés do Pa- rand e Santa Catarina, os tapes (antiga tribo guarani do Rio Grande do Sul). Eram tapuias os cariris do interior do Nordeste, os aimorés de Pérto Seguro (Espirito Santo cte.), e, de modo geval, quase todos os indios do sertao brasileiro, depois agru- pados sob a designacio de g Os nossos indios nado possuiam escrita, embora sou- bessem desenhar. Deixaram inscricées rupestres encontra- das nas lapas de varios estados do nosso Pais. les pos- suiam capacidade estética rudimentar na arte plumaria, nas tatuagens, na decoracéo dos maracas c tangapemas, nos adornos e na ornamentacao dos vasos ¢ utensilios A louga de Maraja (Amazonas) na opiniaio do mon- ge Gaspar de Carvajal, companheiro de Orellana, “era a melhor que se ha visto no mundo” e as mais helas do Névo- -Mundo, As mulheres é que se dedicavam ao fabrico da louga. As oleiras de Marajé eram Aruas. Possuiam apura- do gésto artistico em desenhar os mais finos e hem combi- nados ornatos de ceramica indigena, na opinidéo de Anibal de Matos. Pena é nao terem os nossos silvicolas inventado a roda ou térno do oleiro (fulcra) . O abanheenga (abd-nheenga) — a fala ou lingua de gente, o tupi da Costa, era a lingua geral. ar O avé-nheenga, © guarani, dialeto tupi, é falado no sul do Brasil, na Bolivia, Argentina e Paraguai, onde é con- derado como lingua nacional; os guaranis sio povos tupis dos sul. O nheengatu (nheenga-catu), lingua boa, bonita, do Amazonas. Havia linguas travadas ou nheengaibas dos ta- puias. ‘As linguas de todos os grupos brasileiros ¢ idiomas americanos pertencem a categoria das chamadas aglutinan- tes ou holofrasticas, isto é, holéfrase é a incorporacdo dos principais elementos de uma frase num s6 yocdbulo; sao verdadeiras frases descritivas, exemplo: para se dizer “fa- ca-de-pedra”, ligam-se apenas essas duas palavras, ita-quicé (a semelhanca do inglés stone-knife e do alemao Stein- messer. VOCABULARIO PAJE — (pa-yé) — aquéle que diz o fim; feiticeiro, curandeiro, chefe espiritual. O pajé, vibrando apenas o “maraca sagrado” (um chocalho todo ornamentado), dis- punha de mais prestigio sébre os indios do que 0 tuxaua e os morubixabas. pajé vivia numa tapera (habitacio abandonada) e daya suas respostas ao som do “ma- raca”. Atualmente, estéo muito desacreditados os pajés. TUBIXABA (tibi-ecaba) — vigilancia da terra, chefe temporal, principal; comandayva o seu povo nas lutas, nas cacadas, nas pescarias; presidia as reunides (nheengaba) de- cidia sdébre declaragio de guerra, mudanga de aldeia.. Ti- nha, ainda, os nomes de morubixaba, tubixaua, tubixa, tu- xaba, rubixa, enfim, individuo que exerce a funcio de go- vérno da tribo, o maioral, o cacique. TACAPE (taca-pé) — galho cortado = clava de ma- deira; era a arma, pode dizer-se, sagrada ec nacional dos tupis e guaranis; as vézes, ornamentada, como as dos tu xauas e morubixabas. IBIRAPARA (ibira-apara) — 9 arco (curvo, vergado), ou uirapara, guirapé, muirapara. UIBA (oib = éle se eleva) uiba = cana brava, cana de flecha . TABA (tab = ficar, 0 que fica, o imével) — aldeia, povo, pouso, o lugar onde pousavam muitos. Cada tribo contava diversas aldeias; a taba era um conjunto de pa- Ihocas (ocas) dispostas circularmente, & beira de um rio ou lago, ou Ionge-perto do mar. Em chilli, tavu, casa, rancho. — 30 — OCA (og-tapar, cobrir) — pathoga, morada. MALOCA (mar-r-oca) — a casa de guerra, a casa forte para a luta (mari). Uma ranchada para indios bravios. OCARA — praca, patio. CAIGARA (cad-igara) — forte cérea de pau a pique. Form. caaé — mato, arvore; ica, igara — tronco, galho, estaca. TAPERA (taba-era) -- aldeia extinta, ruina. Form. era, velho, extinto, passado. A aldeia durava cérca de quatro anos; devido & falta de alimento nas aguas ¢ matos vizinhos, era imprescindivel a mudanga para outro ponto; os tupis eram némades. ACANGATARA (acanga-tara) — 0 que orna a cabeca = cocares. ARAGCOIA (ara-agoiaba) — 0 anteparo contra o tempo, o chapeu. URUCU (i-rucu — liquido de arvore — vermelho; urucu (bixa orellana) para pintura de guerra. Ab-rucu = pinta pernas. JENIPAPO (jani-paba) — 0 fruto de esfregar, que serve para pintar. Iandi = dleo ou Agua de fruta; ibi-paba = fruto da extremidade que dé suco. TEMBETA (tembé-ita) — pedra de beigo. QUICE — faca, instrumento cortante feito de pedras polidas. ITAJI (ité-ji) — machado de pedra JUL (ju-i) — pequeno espinho, agulha, Jucara = agulha. PINDA (pin-nda) — fisga rijo anzol. Form. pi = pele; pin: fisga; nd, rijo. Os anzéis eram feitos de espi- nhos de palmeiras ou espinhas de peixe. —31— IGARA (ig-ara) — dona dagua, a canoa, barco, embarcacio. IGARITE (igara-eté) — canoa verdadeira ou principal. IGARACU (igara-acu) — canoa grande; navio. IPKIGARA (ip. igara) — canoa de casca de arvore (jatoba). UBA — canoa de casca de arvore. MANI -- mandioca. ABATI (aba-ti) — milho; roga de milho; aba = cabelo; ti = branco. CAUIM — vinho, bebida, licor fermentado. CUL — farinha, pé, de mandioca. BEJU (mbeiju) — 0 cnroscado, beju, de mandioca. TAPIOCA — residuo de suco de mandioca. TUCUPI — tempéro ¢ métho de caldo de mandioca. JERIMUM (juru-m-un) — 0 pescogo escuro — abobora. CAMBUQUIRA (cad-ambiquira) — a planta grelada, grelos. MENDOBI (mand-ubi) — feixe enterrado, 0 amendoim. JIQUITATA (juqui-tai) — 0 que é picante; o mélho; a formi- ga urente; juqui-sal; taia, picante, ardente. PIRA (pi-ra) — peixe de pele. AGARA (aca-ra) — 0 escamoso, 0 cascudo. ITANHA (ita-nha) -- a bacia de pedra, 0 vaso, a pancla. IGACABA (ig-acaba) — talha de fazer cauim, cantaro para Agua. CAMUCI (cambu-ci) — fonte, manancial, cAntaro para agua; urna funeraria. URU ~~ 0 césto, certo tecido de félhas de palma. URUPEMA —-~ (uru-pema) — césto razo, a pencira. — 32 — QUIGABA — o ninho, o lugar de dormir. MORANGATU — muito belo, lindo, formoso, bom, mui grato. PUGA — réde pequena de pescar; atolado, introduzido. JIRAU (Y-u-ra) s, prateleira junto ao teto das ocas ou ranchos para guardar comidas e utensilios. estrado de var PARI (iba-ri) — 0 cercado de varas para pesca; o curral de peixe. JEQUI (i-iqué-i) — césto ou balaio de taquara ou de cipé para pesca; aquéle em que se entra, cévo — jequi MUNDE (mo-ndé) — armadilha, alcapio, mundéu; fazer sobrepor. URUPUCA (uru-puca) — césto que desaba, armadilha para apanhar passaro. GUAINUMBI (gua-nu-obi) — o individuo préto azulado, 2 beija-flor. TUPA (tu-pa) — 0 golpe ou baque estrondante; génio do trovaio e do raio; Deus. TUPA (sumunga) — estrondo, trovao. TUPA (heraba) — 0 raio, relampago. ANHA ou ANHANGA (a-nhi) — a alma crrante, o génio andejo, 0 diabo. JURUPARI (juru-pari) — a béca fechada. Nome de um génio da mitologia selvagem. GUARACI (guara-ci) — 0 sol, mae dos viventes. JACI (ia-ci) — a lua; a mae das frutas, dos vegetais, o més. JACI-TATA estréla, fogo ou luz da lua. SAMBAQUI (també-qui) — a jazida de ostra, depdsito de ostra. — 33 — TORO (tog-r-6) a cobertura espessa, a casca grossa, tatu canastra de cuja cauda faziam os indios 0 toré ou boré. BORE — flauta, feita de taquara ou de cauda de tatu. UATAPU — ou iatapu (id-ata-pt) — 0 que soa alto buzina de biizio. Os indios do Para supdem ter a virtude de atraiar 0 peixe. MIMBI — gaita, flauta, 0 que sopra. INUBIA (ia-nu bid) — 0 que soa agradavel —— trombeta de guerra. GUARARA -— o tambor usado pelo gentio. POCEMAS (po-cema) —- 0 batimento de mios, 0 bate pal- mas; festas ruidosas. JEROQUI -— danca guerreira. PORA-ACE danga; reuniio de povo para folguedos. CURURU — 0 roncador, sapo grande roncador. ZARABATANA — tubo para impelir setas com 0 s6pro. MUIRAQUITA — (muira-quité) — né de madeira, amuleto, talisma. COMBUCA (cuia-mbuca) — a cabaca furada. CUT — vaso de beber, vasilha, cuia = metade da cahaca. CUITE (cui-cté) vaso verdadeiro, cuité. MARACA (mara-aci) — a cabeca de fingimento ou de ficgao. Instrumente feito de cabaga cheia de pedri- nhas (chocalho) o qual se agita par trair as cri- ani c usado nas festas pelos paj No cuité do maraca, os indios pintavam cabelos, olhos, narizes ¢ béca. Tinham o costume de dar forma humana ao “chocalho” . CUMA, panela de barro. — 34 — INDOA — pil&o, caixa de guerra IARA — senhora dagua, m&e dagua, screia, dono, domi- nador. PIQUIROBI (piquira-obi) — peixinho verde. Nome de. um chefe indigena paulista. ANHANGUERA (anha-guera) — 0 espectro, 0 fantasma; um diabo velho. Era o apelido de Bartholomeu Bue- no da Silva, bandeirante descobridor de Goias. CARAMURU (caré-muru) — peixe dagua, salgada, mais conhecido por moréia. ABA — indio, homem, pessoa. CUNHAMUCU — menina, gardta, brotinho. CURUME ou Cunumi — menino. CURUMIGUAGU ou Cunumignacu — mégo. QUIRI — pequeno, pouco. QUIRA — névo, verde. GURI OU GUIRI ~~ variedade de bagre. ¥ tratamento que, no Sul do Brasil, dio aos meninos. CURUPIRA nome de um duende da mata; o chagado. SABIA (sod-bia) — o animal aprazivel, mavioso. IGUACABA (yg-agaba) — vaso dagua, pote, tina. Form. YG, agua; ACABA — tempo, modo, de tomar, apanhar, receber; to- mada. Utilizada, também, para conseryar fermen- tadas certas bebidas, ou como urna funcraria. CAMOTIM (cam-yotim) — urna funeraria; form. —~ CAM, CAN, cantaro. YOTIM — enterrar, Segundo Armando Levy Cardoso, em “Amerigenismos” e “Toponimia Brasilica”, 0 étimo “Camoli” provém do aruaco e tem a significacio es- — 35 — pecifica de “urna funerdria”, c¢ possivelmente deriva do arua, o linguajar aruaco das célebres oleiras de Marajé. Diz, ainda, Armando Levy Cardoso que, “da mesma maneira que a palavra “Igagaba”, que é um puro tupinismo e significa, primordialmente, — jar- ro, 0 pote, o cantaro para agua, aparece, ds vézes, com a significagéo de urna funeraria; 0 vocabulo “Camo- tim”, que tem o siginificado especifico de “urna fu- neraria”, aparece, algumas vézes, também, com o de vaso, pote, jarro. 0 vocabulo “camucim” quando aparece com o significado de vaso, pote, cintaro, nada mais é do que um puro tupinismo, derivado de “Cambuchi”, de “Camussi” ou de “Camusi”. 0 “Di- cionario Brasileiro da Lingua Portuguésa” de Mace- do Soares menciona a seguinte etimologia de “Ca- moci” “Camocim”: CAMBU — mamar, chupar, soorver, beber + CI, — fonte, manacial, 0 que d& de beber, pote, vaso dagua. CAMOTIM encerra os seguintes étimos: — CAM ou CAN, cantaro, talha de barro, vaso grande e bojudo’ (do aruaco) NOTY — enterrar (Montoya). JOTIME —- enterrar (Frei Onofre) . TYMA (nho) — enterrar (A. Lemos Barbosa). TIM, TI, TY, — enterrar, sepultar, plantar (Bat. Caet.). JU- TIMA, IUTIMA — enterrar, plantar (Stradelli). * Oe OK CURARE (uird-e6-ry) — liquido para matar passaros — veneno das flechas. — Curare é corruptela de GUY- RA-EO-RY, com a significagio de GUYRA ou UYRA, passaro; EO, morrer, morte, desmaio, paralisia (par- cial): RY, agua, liquido. ART, em aruaco, significa dgua, liquido, rio. — 36 — Na lingua Ticuna, URA, flecha de matar peixe. © ilustre naturalista ec ctndlogo brasileiro de Minas Gerais, Dr. Jodo Barbosa Rodrigues, que con- viveu com os nossos indigenas do Amazonas ¢ falava corretamente a sua lingua — é 0 mais abalizado para esclarecer a origem do yocabulo Curari que tem, ain- da, os sinénimos de urari, uraire, uairari ¢ outros Segundo ésse cientista, 0 verdadeiro nome é UIRA- EORY, que o indio pronuncia “Uiraéry”, e pela pro- nincia e cdérrup¢dio transformou-se em “Uirary” ou, finalmente, “Curare”, “Curara”. Segundo Adaucto Fernandes, Gramatica Tupi, — Curare, em sanserito, significa “veneno”, Também, em Macdonell, Sanskrit Dictionary, encontro “Gara- -la”, veneno, Colla, em aimara — “veneno”. FinaJmente, Armando Levy Cardoso, em Ameri- genismos, esclarece que Curare é de origem caribe e tem para étimo URARI. — No estrangeiro, ja se ocuparam do Curare — Humbolt, Martius, Schomburgk, Claude Bernard c outros. Entre nds, é vasta a literatura sobre os ingredi- entes e a preparacéio désse veneno, Além do magis- tral trabalho de Barbosa Rodrigues que esclareceu os efeitos e defesa do enyenenamento do Curare — cien- tistas como Nuno de Andrade, Domingos Freire, Ca- minhoa, Peckolt e muitos outros se ocuparam dessa substancia. Barbosa Rodrigues, em experiéncias realizadas diante de uma comisséo de cientistas, provou ser 3 sal de cozinha (cloreto de sédio) 0 antidoto infalivel contra o envenenamento do Curare, 0 que foi confir- — 37 — mado por Humbolt, Bouchardat e muitos outros quela época, na- Curare é © principio ativo de vegetais pertencen- tes A familia das Logomiaceas, género “Strynos” que compreende cérca de 350 espécies existentes no Ore- noco ¢ Amazonas ¢ usadas pelos indios para cnvene- nar suas flechas. obtido da decocc&o das cascas e entrecascas do vegetal, as quais fio contudidas c fervidas em agua até ficar 0 decocto reduzido a um extrato espésso de cér castanho-escura que é conservado em cabacas ou vasilhas de barro. F yeneno violentissimo que atua por desequili- brio neuromuscular, quando aplicado por via intra- -muscular ou endovenosa. Esta demonstrado que o curare no é absorvido pelas vias digestivas. O cura- re, diferente dos demais venenos ¢ virus, nfo é ab- sorvido senao quando se pée diretamente em contac- to com o sangue, ou quando se introduz nos pulmécs. A aye ou outro animal abatido morto com a flecha envenenada pode ser usado como alimento, sem nenhum inconveniente, por ser indcuo 0 Curare desde que nao se ponha em contato com o sangue. Humbolt, viajantes ¢ missiondrios usaram comer car- ne de galinha morta com a picada de uma flecha en- venenada pelo Curare “Em 1935, King demonstrou que o principio ati- yo do Curare era uma base quartendria, a “d-tubo curarina ou tubocurarina. Em 1942, foi experimentada esta substancia como relaxador muscular, na suplementagio da anestesia, por seu efcito paralisante, embora nao seja um anes- tésico. soe Em 1946, Mac Ityre demonstrou que a intoxica- c&o pela tubocurarina pode scr combatida com éxi- to pela injec&o venosa de ‘uma solugio que contém o seguinte: brometo de eserina, sulfato de atropina e sulfato de efedrina. Também se emprega o Tensilon. (John C. Krantz e C. Jelleff Carr, Os Fundamentos Farma- colégicos na Pratica Médica) . A LINGUA DOS INDIOS BRASILEIROS E A CATEQUESE DOS JESUITAS Em companhia de Tomé de Souza, 1.’ governador do Brasil (1549-1553), além das mil pessoas trazidas, vieram seis padres jesuitas sob a diregéo do Padre Manoel da No- brega. Vinham, no dizer de Joo Ribeiro, para converter 05 indios e prestar & colénia os servicos de religiao e dos bons costumes. Na catequese dos indios, 0 primeiro obstaculo foi a lingua. Os padres jesuitas que cram Manoel da Nébrega, Leo- nardo Nunes — o primeiro mestre-escola da terra paullista, Joao de Azpicuelta Navarro —- 0 primeiro a manejar, como instrumento de civilizacio, o abanheenga (aba-nheenga, lin- gua ou fala de indio, de gente) e precursor dos bandeiran- tes, Anténio Pires ¢ os novicos Diogo Jacome ¢ Vicente Ro- dvigues, depois ordenados. Em menos de quinze dias da chegada d primeiros jesuitas, ja daya sua primeira “aula de ler, escrever © re- zav” © Padre Vicente Rodrigues. A histéria consagra-o como “o mais antigo mestre- cola do Brasil”, que étimos frutos colheu durante cingiien- ta anos de labor e sofrimento. Os padres jesuitas, partindo do conceito de que para o selvagem, “aquéle que fala a sua lingua é um seu paren- te, um seu amigo” comecaram por aprender a lingua dos indios, e educando os meninos, ensinavam-lhes a lingua por- — 40 — tuguésa juntamente com a tupi para a nio esquecerem ¢ servirem de intérpretes, facilitando a compreensio mitua. O Padre Manoel da Nébrega, em 1550, fundou na ci- dade do Salvador 0 “Colégio dos Meninos de Jesus”, que, em 1556, passou a instituto canénico sob a denominacao de “Colégio de Jesus”. Em Sao Vicente, Sio Paulo, em 2 de fevereiro de 1553, regularizou o colégio iniciado pelo Padre Leonardo Nunes, sob a denominag&io de “Colégio dos Meninos de Je- sus”. Em 1554, ésse Colégio foi transferido para Piratinin ga que oferecia melhor clima e por amor dos indios. Depois, outros colégios foram fundados pelos jesui- tas no Rio de Janeiro, Pernambuco, Maranhao, Para, Ihéus, Espirito Santo, Pérto Seguro, Paraiba e Ceara. O de Piratininga foi inaugurado por Nobrega a 25 de janeiro de 1554, dia do apdstolo Sao Paulo, e deu origem & atual cidade de Sio Paulo. Além de outras matérias, cnsinavam também a misi- ca; com a musica e a harmonia, dizia Anchieta, atrevo-me atrair a mim todos os indios da América. Conforme assevera 0 Padre Serafim Leite em a His- toria da Companhia de Jesus, a instrugio, ministrada pela Companhia de Jesus, durante os seus dois séculos de ma- gistério no Brasil, era Oficial, Ptiblica ¢ Gratuita nos trés graus, popular, médio e superior. Segundo ésse historiador, os jesuitas vieram por man- dado do Rei D. Joao III, a custa da Coroa Portuguésa, par servirem de professéres oficiais e catequizarem os brasil! enses. Por ordem do rei, ganhavam Padre Nébrega ¢ seus companheiros, em 1551, 2§400 réis, um cruzado por més, ou quatro centros réis cada padre. Recebiam ainda, azeite, vinho para missas, vinagre, arroz, milho, vestuario, tudo a custa da Coroa Portuguésa.

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