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O Poder Dos Milionários Mais Discretos de Portugal: Como Gerir O Dinheiro em Tempo de Crise
O Poder Dos Milionários Mais Discretos de Portugal: Como Gerir O Dinheiro em Tempo de Crise
SEMANAL
A NEWSMAGAZINE MAIS LIDA DO PAÍS WWW.VISAO.PT
POUPANÇA IMOBILIÁRIO
AS NOVAS
COMO GERIR APOSTAS
PARA A CLASSE
O DINHEIRO MÉDIA
EM TEMPO
. 2/1AA4/11/2020
ENTREVISTA
KEN FOLLETT
DE CRISE E O REGRESSO
. 29/10
À IDADE
Nº 1400
DAS TREVAS
Nº 1443
JOÃO EDUARDO
SERRENHO RANGEL
Tintas CIN Grupo Rangel
AVELINO HUMBERTO
GASPAR PEDROSA
Lusiaves Barraqueiro
GRÁTIS
FERNANDO
CAMPOS NUNES
Visabeira
GUIA
com esta edição
TUTORIAL APRENDA A TIRAR
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As suas marcações Ler
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BIB
35 / 132
A EVOLUÇÃO
DUAS OPÇÕES FORÇADA
DE LEITURA DA REVISTA Uma investigadora
portuguesa está a estudar a
Pode escolher resposta dos animais para se
adaptarem às mudanças
como prefere ler provocadas pelo
aquecimento global
a edição semanal: LUÍS RIBEIRO
em formato de texto, sua extinção, seja por que razão for, não
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33 / 102
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MPRE DIMEN
EMPREENDIMENTO ARRISCADO
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VISÃO
29 OUTUBRO 2020 / Nº 1443
12 Entrevista:
Maria João Gregório
RADAR
16 Raios X
18 A semana em 7 pontos
20 Holofote
21 Inbox
GETTY
22 Almanaque
23 Transições
24 Próximos capítulos
26 Oceano de esperança
50 EUA: o momento da verdade
Com o adversário em vantagem e os EUA numa encruzilhada, Donald
28 Imagens do mundo Trump chegou à sua última linha de defesa, antes da batalha final
VAGAR
78 Entrevista com Ken Follet 42 Poupança (es)forçada
Face à incerteza de um futuro próximo, a poupança dos portugueses
84 VISÃO Fest Verde aumentou para novos máximos, nos últimos meses. A maior parte do
dinheiro tem sido canalizada para depósitos que rendem perto de zero por
VISÃO SETE cento. Será essa a melhor opção para os aforradores e para a economia?
OPINIÃO
8 Mia Couto
10 Mafalda Anjos
Online W W W.V I S A O . P T
Últimos artigos na BOLSA DE ESPECIALISTAS VISÃO
25 José Manuel Pureza
72 Hugo Santos Ferreira
77 José Carlos de Vasconcelos
90 Capicua
114 Ricardo Araújo Pereira Rui Couceiro Manuel Delgado Sara Filipe
EDITOR ADMINISTRADOR HOSPITALAR GESTORA DE COMUNICAÇÃO
Investir nos livros O papel do setor “Diz à tua mãe que
Interdita a reprodução, mesmo parcial, e na leitura privado em tempos eu a amo muito”
de textos, fotografias ou ilustrações sob de pandemia
quaisquer meios, e para quaisquer fins,
inclusive comerciais.
Todos os dias, um novo texto assinado por um dos 28 especialistas convidados
Contactos
visao@visao.pt
As cartas devem ter um máximo
de 60 palavras e conter nome, morada
e telefone. A revista reserva-se
o direito de selecionar os trechos
que considerar mais importantes.
NOVA MORADA
FORTUNAS EMERGÊNCIA “MADE IN CORREIO: Rua da Fonte da Caspolima
Os 25 mais ricos CLIMÁTICA PORTUGAL” – Quinta da Fonte,
do País Desafios, soluções, Tecnologias que Edifício Fernão Magalhães, 8,
heróis salvam o mundo 2770-190 Paço de Arcos
Uma história
quase infantil
POR MIA COUTO
T
odas as tardes, o pequeno Gustavo ia brin- deviam surgir com a bola vermelha que assinala os
car para o jardim público. O pai ficava na programas com cenas de crueldade e de violência
janela vendo-o cruzar a estrada. O filho gratuita. Mas não havia escolha. É difícil cuidar sozi-
herdara dele a congénita inaptidão para nho de um filho, sobretudo naquela idade. Por isso,
ser criança. O menino caminhava com os Gustavo passava horas sentado frente à televisão, os
ombros arqueados, antecipadamente can- olhos escancarados, os pés balouçando sem tocarem
sados. Parecia o outono pisando flores. no chão. A cada dia parecia mais e mais leve. De cada
Não tardava a regressar a casa, o corpo vez que regressava do trabalho, o pai receava encon-
ILUSTRAÇÃO: SUSA MONTEIRO
inclinado para a frente com pressa em trar o filho levitando de encontro ao teto.
fugir da luz. Sentava-se na penumbra da Certa vez, numa rara ocasião em que se demorou
casa, a televisão ligada. Não assistia a programas no jardim, o menino entrou em casa trazendo um
infantis. Sintonizava os noticiários internacionais. embrulho nas mãos.
O pai preocupava-se: hoje em dia, os noticiários – O que trazes aí? – perguntou o pai.
E
squerda, direita; esquerda, direita – dizer, desde março, as principais indicações
1
eram centenas de militares alinhados da DGS e das autoridades, contribuindo para
a desfilarem impecáveis pela aveni- desorientar ainda mais as pessoas, quando o
da. No meio da parada, só o João não que era preciso fazer era informá-las com o
conseguia acertar o passo. Tropeça- estado da arte da ciência, que também está a
va nos próprios pés, enganava-se no descobrir uma realidade completamente nova.
compasso. Mas na assistência, os pais O terceiro grupo são os negacionistas
do rapaz, orgulhosos do seu rebento, libertários. Aqueles anarquistas tardios, que
bradavam para os outros: “Então, organizem- recusam a obrigação do uso da máscara como
-se! Não veem que estão todos mal?! O João é quem nunca ultrapassou o trauma de ser
que vai bem!” obrigado a comer a sopa em pequenino. Para A capa desta
Esta história de caserna é o que me quem a vida em sociedade só tem direitos e edição mete várias
ocorre quando olho para a crescente vaga nenhuns deveres, e pensar no bem-estar e na figuras: são os
de negacionistas da Covid-19 que, à medida proteção dos outros é algo tão distante como novos grandes
que a fadiga da pandemia se instala, alastra Vénus de Marte. O que importa é o seu umbi- empresários,
nas redes sociais como um vírus devorador go e o que bem o seu dono quiser fazer com discretos e
de neurónios. Vaga esta atrás da qual vão as ele, e os outros que se danem. poderosos.
pessoas que gostam de ser do contra, alguns Esses libertários andam normalmente de
internautas desprevenidos e os adeptos das mão dada com os negacionistas ignorantes.
teorias da conspiração. Eu conheço vários,
estou certa de que o leitor se deparará com
Os que por sistema recusam as conclusões
da ciência, quando as evidências científicas 2
outros tantos. não são inteiramente consentâneas com o seu
Há vários níveis destes negacionistas. conforto ou com a manutenção da sua forma
No topo da escala estão os negacionistas arcaica ou obtusa de fazer as coisas. São deste
alucinados. São os que veem em tudo forças grupo os que também recusam as alterações
escondidas para dominar o mundo, como nos climáticas, como se a ciência fosse uma ma-
maus filmes de ação ou de ficção científica. téria de crença ou de fé. No que toca à Covid,
Os que dizem que tudo isto é muito “suspei- estes negacionistas recusam o perigo do vírus,
to” e imaginam que a pandemia foi obra da alinhando com Bolsonaro e Trump na cantiga
China – um vírus criado em laboratório para da “gripezinha”. Sublinham que a mortalidade
arrasar e dominar de seguida o mundo. Ou os não é muito elevada – coisa que é um facto
que acham que as vacinas em estudo trarão –, sem perceberem que o perigo está na fa- Esta solução de
um chip localizador para nos vigiar e localizar. lência dos sistemas de saúde que geraria uma fotomontagem
Ou que com a Covid só se quer confinar as potencial mortalidade enorme. Desvalorizam fica demasiado
populações para se instalarem antenas 5G os números, comparando-os com outras artificial.
por todo o mundo, torres estas que por sua maleitas, quando estes números têm por base
vez enfraquecem o sistema imunológico do um mundo inteiro que se confinou e planos
indivíduo. Não vamos elaborar sobre os di-
versos estágios de alucinação aqui envolvidos,
de contingência apertados. Nunca param para
pensar na mortandade que seria se deixásse- 3
estarão ao nível dos terraplanistas em matéria mos o vírus à solta, fazendo o seu caminho
de morfologia da Terra. Adiante. sem quaisquer medidas de contenção.
Depois, há os negacionistas chicos-es- Estes negacionistas ignorantes enchem as
pertos. Aqueles que encontram no discurso caixas de comentários, formam grupos “pela
“aqui há gato” a única forma de darem nas verdade” ou “Sairdecasa” e até convocam
vistas, porque no campeonato da inteligência manifestações sem distanciamento e sem
e do bom senso ninguém lhes liga nenhuma. máscaras. Se Portugal e o SNS fossem
Alguns desses, além de dizerem disparates organizados à medida do seu egoísmo, da
vários nas redes, onde lançam o caos com sua desumanização e da sua insipiência,
desinformação, preconceitos e suspeições mereciam uma pulseira branca para as
totalmente infundadas, têm mesmo espaço urgências Covid, que os colocaria algures Vamos optar por
de opinião com amplificação em órgãos de no fim da lista da assistência e das vagas um fundo liso, que
comunicação social. Há neste grupo perfis nos ventiladores. Felizmente, não é. O SNS resulta melhor.
diferentes de pessoas: colunistas patetas e quando nasceu foi para todos, mesmo para É só uma questão
frustrados, mas também médicos, e esses são os idiotas e para quem não faz nada para o de escolher a cor
mais perigosos. Alguns entretiveram-se a des- merecer. manjos@visao.pt que se destaca
mais em banca.
A crença de que os
alimentos são uma via
de transmissão do novo
coronavírus fez com que
muita gente alterasse
comportamentos alimentares,
reduzindo o consumo
de produtos frescos
LUÍSA OLIVEIRA DIANA TINOCO
DA CHARNECA
E DA LEZÍRIA DO TEJO
+INFO
GERAL@CM-CHAMUSCA.PT
WWW.CM-CHAMUSCA.PT 249 769 100
RAIOS X
M A N U E L B A R R O S M O U R A mbmoura@visao.pt
Escala de Gravidade
do Índice Global da Fome (IGF)
O IGF é uma ferramenta para medir
e acompanhar de forma abrangente
18,2
Este é o grau de fome em todo
o mundo, o que representa um
37
O IGF deste ano destaca os níveis
alarmantes de fome (o segundo mais grave
a fome a nível global, regional nível moderado e contrasta com do índice) de três países: Timor-Leste,
e nacional. As pontuações baseiam-se a situação grave (28,2) que Chade, Madagáscar. A falta de dados
numa fórmula que considera três se registava há duas décadas. completos deixam também Burundi,
dimensões da fome – ingestão Ainda assim, há ainda um número República Centro-Africana, Camarões,
calórica insuficiente (subalimentação), demasiado alto de pessoas República Democrática do Congo, Somália,
subnutrição infantil, e mortalidade a passarem fome a nível global: Sudão do Sul, Síria e Iémen entre os países
infantil. O índice foi adaptado quase 690 milhões estão em pior situação. O relatório de 2020,
e desenvolvido pelo Instituto subnutridas; 144 milhões de apresentado na quarta-feira, 28, destaca
Internacional de Pesquisa de Políticas crianças sofrem de raquitismo; que, “em muitos países, a situação está a
de Alimentação, dos Estados Unidos 47 milhões de crianças sofrem melhorar lentamente”, mas ainda háalguns
da América, e publicado pela primeira de emaciação (perda de massa casos em que está a piorar. As projeções
vez em 2006, em conjunto com muscular); e, em 2018, do IGF mostram que há 37 países que não
a Welthungerhilfe, ONG alemã. 5,3 milhões morreram antes conseguirão atingir o objetivo da Fome
Desde 2007, a irlandesa Concern dos 5 anos, em muitos casos, Zero fixado pelas Nações Unidas e que visa
Worldwide. Em Portugal, conta como resultado da subnutrição. atingir níveis baixos até 2030.
com o apoio da Ajuda em Ação.
O IGF classifica e ordena
os países numa escala
de 100 pontos, em que
0 é a melhor pontuação
(sem fome) e 100 é a pior.
36,6
36,0
31,0
29,5
28,2
27,8
26,0
25,4
20,5
18,2
18,5
17,0
15,5
15,0
13,5
13,3
12,0
13,1
11,0
10,4
9,2
9,2
8,4
8,3
7,5
5,8
2000 2006 2012 2020 2000 2006 2012 2020 2000 2006 2012 2020 2000 2006 2012 2020 2000 2006 2012 2020 2000 2006 2012 2020 2000 2006 2012 2020
MUNDO AMÉRICA LATINA EUROPA ÁSIA OCIDENTAL ÁSIA ORIENTAL SUL DA ÁSIA ÁFRICA
E CARAÍBAS E ÁSIA CENTRAL E NORTE DE ÁFRICA E SUDESTE ASIÁTICO AO SUL DO SARA
CONTRIBUA
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7
PONTOS DA SEMANA
POR
RUI TAVARES GUEDES*
GETTY IMAGES
UM VOTO NA FLÓRIDA
PODE MUDAR O MUNDO?
Querem um bom exemplo para per- tem dúvidas de que muita coisa
ceber como as eleições para a presi- teria sucedido de modo diferente.
dência dos Estados Unidos da América Sabemos, por exemplo, que os EUA,
são, de facto, realmente importantes então a única superpotência global,
para o mundo? Recuem até ao ano teriam enveredado por um caminho
2000, àquela época de “paz e abun- completamente diferente em matéria
dância” em que alguns adivinhavam o de ambiente e liderado o mundo no
“fim da História”. A época em que se combate às alterações climáticas. Tudo
consolidava, aparentemente, o triunfo o que Al Gore fez depois dessa derrota
dos sistemas democráticos ocidentais não deixa margem para grandes
sobre os escombros da antiga União dúvidas sobre qual teria sido o seu
Soviética, em que se iniciava a gran- caminho nessa matéria. E o mundo
de revolução tecnológica e em que a estaria, hoje, certamente melhor, sem
União Europeia era o “clube” para o tantos anos perdidos pelo caminho.
qual todos queriam entrar. Sabemos também que os EUA, com Al
Nesse ano, numas eleições Gore no comando, teriam continuado
presidenciais com grande polémica a apoiar o papel das Nações Unidas
na contagem dos votos – e que serão, e promovido o multilateralismo nas
certamente, muitas vezes recordadas grandes decisões internacionais, até
nos dias a seguir ao próximo 3 de como forma de cimentar o domínio
novembro –, Al Gore ganhou no voto americano, em vez de embarcar em
popular (tal como Hillary Clinton em aventuras como a invasão do Iraque,
2016), mas perdeu para George W. sem a concordância da ONU – como
Bush no Colégio Eleitoral, depois de o fez George W. Bush, ateando um
Supremo Tribunal ter ordenado o fim incêndio que deixou toda a região
da recontagem dos votos na Flórida. num caos, que ainda hoje continua e
Sabemos o que aconteceu aos EUA e que ninguém sabe quando terminará.
ao mundo depois dessa eleição. Não Em 2000, a diferença de uns poucos
sabemos, no entanto, o que poderia ter votos na Flórida mudou o poder nos
acontecido se Al Gore tivesse mesmo EUA e teve um impacto tremendo
chegado à Casa Branca, após os oito em todo o mundo. Em 2020, grande
anos passados como vice-presidente parte da sorte do planeta está também
de Bill Clinton. dependente do que os americanos
Não sabemos, com rigor, o que decidirem. Com consequências
poderia ter acontecido, mas ninguém marcantes para o futuro.
*Diretor-executivo
rguedes@visao.pt
DE FÓRMULA 1,
Portugal chamou
nascido a 7 de as atenções.
Lugares
janeiro de 1985
em Stevenage, PERMITINDO QUE Recordes
Numa época
completamente
com história
Portugal não é,
Reino Unido, brilha
nas corridas. Foi PORTUGAL VOLTASSE e causas
Foi também por um
atípica, por causa
da pandemia, o
definitivamente,
um país
campeão em
quase todas as
A SER PALCO DE ponto que, no ano
seguinte, chegou
campeonato só se
iniciou em julho,
umbilicalmente categorias por que UM GRANDE FEITO ao título mundial, o será o mais curto
NA HISTÓRIA DO
ligado à Fórmula 1, passou e chegou primeiro de seis que dos últimos anos
mas a verdade é à Fórmula 1 com já leva no currículo e e as corridas
que foi em solo
português que
apenas 22 anos,
em 2007. Nesse AUTOMOBILISMO que fazem dele o se-
gundo mais titulado
começaram
por não contar
se registaram ano, bateu o da história, à frente com público
MANUEL BARROS MOURA
dois momentos recorde de piloto de Juan Manuel Fan- nas bancadas.
marcantes com mais pontos gio. Este ano, tudo se O circuito de
da história da na época de estreia encaminha para nova Portimão foi
modalidade. (109) e só não vitória no mundial apenas o quarto da
Em 1985, foi no foi campeão do de pilotos, o que lhe temporada a poder
Autódromo do mundo por um permitirá igualar a ter assistência.
Estoril que o mítico ponto, e por causa melhor marca de Estiveram
Ayrton Senna de uma avaria na sempre, que é ainda previstas 45 mil
venceu o primeiro última corrida da de Schumacher. pessoas, mas
Grande Prémio temporada. Um registo notável o agravamento
da sua carreira. para aquele que con- da situação
Agora, depois de 24 tinua a ser o único sanitária obrigou
anos de ausência, piloto negro a singrar as autoridades a
com o regresso da na F1. Um “recorde” reduzir a lotação
Fórmula 1, desta de que não gosta, máxima para 27,5
vez no Circuito de mas que faz questão mil lugares. Ainda
Portimão, o nosso de usar para se bater, assim, as imagens
país volta a ser pública e ativamente, mostram inúmeros
palco de um feito pelos direitos da casos em que o
único: o britânico comunidade negra e distanciamento
Lewis Hamilton contra o racismo. físico parece não
conseguiu, ter sido respeitado,
ao volante de o que fez surgir, de
um Mercedes, imediato, um coro
conquistar a de críticas.
92ª vitória em
Grandes Prémios,
ultrapassando
a marca que
pertencia ao
alemão Michael
Schumacher.
M O D É S T I A À PA R T E
Fui
Nunca caímos
na tentação
perseguida
de ostentar um por um ovni.
estilo de vida
de estrelas rock Tenho a
FERNANDO RIBEIRO
O líder dos Moonspell
acha que “muitos
colegas não se
certeza do
geriram tão bem e
estão aflitos” com os
efeitos da pandemia
que vi. Mas
também
pode ter sido
da erva que
fumei...
MILEY CYRUS
Putin foi apanhado Cantora conta que viu
algo que parecia
com uma arma “um limpa-neves voador”
fumegante apontada
à minha cabeça
e, depois de falhar
o alvo, disse: FRASE DA SEMANA
“Não fui eu”
ALEXEI NAVALNY
O líder da oposição na Rússia Os homossexuais
continua a acusar o Presidente
russo de ser o mandante
do ataque com a substância
têm o direito de
neurotóxica Novichok
de que foi alvo
C H O Q U E F R O N TA L
constituir família.
São filhos de Deus
PAPA FRANCISCO
O Governo devia ter Sumo pontífice defendeu a necessidade
de “uma lei de união civil” para defender
forte coragem para os casais do mesmo sexo
fazer um plano de
inverno não centrado
na Covid-19
JORGE TORGAL
O médico especialista em No dia em que se Um bandido
saúde pública frisa que “o mais
preocupante são as outras dedicar à medicina, será sempre um
patologias sem resposta” Frederico Varandas bandido. E, no final,
presta um grande será recordado
serviço ao Sporting como um bandido
As festas nos clubes JORGE NUNO FREDERICO
noturnos acabaram! PINTO DA COSTA VARANDAS
Presidente Presidente
STEFAN LÖFVEN do FC Porto do Sporting
O primeiro-ministro da Suécia
anunciou a limitação
a 50 pessoas nas discotecas
Fontes: Interview Maganize, O Jogo, Blitz, CNN, Público, Diário de Notícias, The Independent
29 OUTUBRO 2020 VISÃO 21
ALMANAQUE
NÚMEROS DA SEMANA
22
A Humanidade consumiu, nos
últimos 70 anos, mais energia
do que nos 12 mil anteriores
com uma “mudança radical”
que começou na década de
1950. Pelos cálculos do Grupo
de Trabalho do Antropoceno
da União Internacional
de Ciências Geológicas,
o consumo de energia desde
GETTY IMAGES
€7 milhões
O ministro da Educação,
A Amazónia brasileira concentrou, de
janeiro até ao passado dia 22 de outubro,
89 604 focos de queimadas, ultrapassando,
central do Brasil responsável pelas políticas
de proteção ao meio ambiente, mandou
retirar os cerca de 1 400 bombeiros que in-
Tiago Brandão Rodrigues, nesse dia, o número de incêndios registados tegravam as suas brigadas contra incêndios,
anunciou na quinta-feira, 22, em todo o ano passado (89 176), segundo alegando falta de recursos. Isto porque, o
um investimento adicional de dados do Instituto Nacional de Pesquisas ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles,
sete milhões de euros para
Espaciais. Em 2019, o número de incêndios vem reduzindo gradualmente os recursos
garantir máscaras e outros
na Amazónia brasileira já tinha sido em do Ibama desde o ano passado e chegou a
equipamentos de proteção
30% superior aos de 2018, de acordo com anunciar a sua intenção de o fundir com
individual às escolas,
no segundo período letivo. dados de satélite recolhidos pelo mesmo outros órgãos ambientais. Enquanto tudo
organismo governamental. Se esta não fosse isto acontece, o Presidente, Jair Bolsonaro,
já uma situação dramática, mais assustadora classifica como “falsas narrativas” as in-
11 mil
fica quando se sabe que ela é conhecida no formações sobre os grandes incêndios que
momento em que o Instituto Brasileiro do devastam a Amazónia e o Pantanal, e afirma
Meio Ambiente (Ibama), órgão do Governo que “a floresta tropical não arde”.
Mais de 11 mil casos de
violência doméstica foram
registados pela PSP nos
primeiros nove meses do
ano, segundo dados hoje V I S I TA N T E AT E N T O
divulgados que apontam para
uma diminuição de cerca
de 9% face ao mesmo período
Quadro perdido de Jacob Lawrence
do ano passado. encontrado 60 anos depois
Uma pintura de Jacob Lawrence que não era vista em público
2 700%
O número de deslocados
há 60 anos, foi encontrada, a tempo de integrar a exposição de
30 peças da obra do artista americano que está, por estes dias,
patente no Metropolitan Museum of Art (Met), em Nova Iorque.
A exposição da série Struggle: From the History of the American People, completada em meados
internos em Moçambique dos anos 50 pelo pintor negro, está, desde o passado dia 29 de agosto, em exibição no Met, com a
cresceu 2 700% em dois anos peça desaparecida, conhecida como painel 16, representada por uma moldura vazia. E foi um visi-
e representa hoje 1,4% da tante que se lembrou, ao ver a exposição, de que uns vizinhos seus tinham em casa uma pintura de
população do país, destaca Lawrence. Suspeitando de que poderia tratar-se da obra em falta, encorajou os proprietários a con-
um relatório do Centro tactarem o museu de Nova Iorque. Confirmou-se que o quadro fazia parte desta série e, de acordo
de Integridade Pública, com o New York Times, já foi acrescentado à exposição, que está patente até dia 1 de novembro, e
ONG moçambicana. juntar-se-á, em 2021, à exposição itinerante que o Peabody Essex Museum vai organizar.
VITÓRIA
O ciclista Ruben Guerreiro,
da equipa Education First,
tornou-se o primeiro
português a vencer o prémio
da montanha numa das três
grandes voltas ciclísticas
do mundo, garantindo a
camisola azul do Giro de
Itália, prova que decorreu
durante três semanas
e terminou no domingo,
25, em Milão. Inédita foi
também a classificação
de João Almeida, da
Deceuninck-QuickStep.
O português foi quarto
classificado na geral, o
melhor lugar alguma vez
conquistado por um ciclista
nacional numa grande volta,
e passou 15 etapas com a
camisola rosa de líder.
PERISCÓPIO
LUSA
analogias entre privados. “O SNS
espécies de árvores está preparado para
e figuras públicas, foi isso”, diz a ministra,
ELEIÇÕES NOS AÇORES
desafiado a definir mas vamos lá ver se
Q
uem disse que “o Estado não vai ser tórios; e o Estado está obrigado a financiar o Fundo
chamado a pagar eventuais prejuízos do de Resolução até 850 milhões de euros por ano sem-
Novo Banco”? O leitor, influenciado pelas pre que, para fazer essas injeções, o Fundo não tenha
discussões dos últimos dias sobre o Or- recursos próprios suficientes.
çamento do Estado, dirá que foi António A tudo isto, os seguidores presentes de Maria Luís
Costa ou João Leão. Injustiça pura. Não Albuquerque juntam duas juras. A primeira jura é a
foi nenhum deles. Foi Maria Luís Albu- de que, desta vez, não vai ser o Estado a emprestar ao
querque. Fundo de Resolução, mas sim um consórcio de ban-
Mas faça-se justiça à injustiça do lei- cos. Sim, mas então, para que tudo seja sem impacto
tor. António Costa, aquando da venda do no défice das contas públicas, porque não assume
Novo Banco ao Lone Star, declarou: “A venda não o referido consórcio diretamente a capitalização do
terá impacto direto ou indireto nas contas públicas Novo Banco? Porque tem de passar pelo Fundo de
nem novos encargos para os contribuintes.” E Mário Resolução? Em síntese, porque é que a responsabi-
Centeno acrescentou: “Não haverá garantias do Es- lização do sistema bancário tem de gerar impactos
tado no Novo banco.” A injustiça diretos ou indiretos nas contas
do leitor é, afinal, fundamentada públicas e, por isso, ser suprida
em conhecimento de causa. A se- O spin dos pelo pagamento do emprésti-
melhança entre o que disse Maria mo bancário com dinheiro dos
Luís Albuquerque e o que disse
governantes e contribuintes, pela enésima vez?
António Costa é indesmentível. dirigentes socialistas A segunda jura feita pelos émulos
No debate do Orçamento do
Estado para 2021, os governantes
para seduzir a atuais de Maria Luís Albuquer-
que é que só é assim porque tem
e dirigentes parlamentares do PS opinião pública é de ser assim, porque a legislação
decidiram, a uma só voz, voltar a um malabarismo e comunitária e o contrato de ven-
assumir Maria Luís Albuquerque da à Lone Star dizem que tem de
como sua inspiradora e a clamar
imita as afirmações ser assim. Mas a esse argumento
como mantra que “não há um de Maria Luís formal, a sensatez manda que
cêntimo de dinheiro público no
orçamento para o Novo Banco”.
Albuquerque se responda com uma pergunta:
deve um contrato ser cegamen-
Têm-no dito com ênfase, com te cumprido quando há indícios
tom perentório e vezes sem conta, mais que fortes de que uma das
para que não reste sombra de dúvida sobre essa de- partes tem um desempenho típico de administração
cisão de não haver nova injeção de dinheiro público ruinosa que gera prejuízos só suportáveis com a ga-
no Novo Banco. As almas inquietas de quem des- rantia de cobertura por dinheiro público?
confia das sucessivas proclamações há anos seguidos Sim, esta crónica é sobre o Orçamento do Estado
podem, pois, ficar sossegadas, tão cheia de garantias e sobre a responsabilidade de ter sobre ele uma po-
é a proclamação socialista. sição. Por estes dias, ouvi muita gente dizer que não
Mas vai-se a ver e o spin dos governantes e diri- viabilizar o orçamento é um ato de irresponsabili-
gentes socialistas para seduzir a opinião pública para dade. Na esmagadoríssima maioria dos casos, essa
a proposta de orçamento é um malabarismo e imita crítica não veio apoiada numa única palavra sobre
as afirmações de Maria Luís Albuquerque não só o conteúdo concreto da proposta de orçamento.
no teor, mas, mais que tudo, no alcance: esse spin é Sobre o Novo Banco, por exemplo. E a pergunta que
falso. É falso que não venha a haver dinheiro público vai ser inevitável daqui a poucos meses, quando os
para o Novo Banco no próximo ano orçamental. bancos vierem exigir o pagamento do que empres-
Isso decorre do esquema perverso que o contrato de taram ao Fundo de Resolução e, de novo, se decidir
venda à Lone Star fixou: o Fundo de Resolução está que é o dinheiro de todos nós que servirá para isso,
obrigado a injetar dinheiro no Novo Banco sempre será também sobre ser responsável: quem terá sido
que haja necessidades de capital para impedir que de novo responsável por mais uma sangria do erário
novos prejuízos ponham em causa os rácios obriga- público para o Novo Banco? visao@visao.pt
Oceano de Esperança é um projeto da VISÃO em parceria com a ROLEX, no âmbito da sua iniciativa Perpetual Planet, para dar
voz a pessoas e a organizações extraordinárias que trabalham para construir um planeta e um futuro mais sustentáveis
É impossível ignorar a baleia na sala, até porque se trata de um lho no resto da Europa, sendo que muitos “não se limitavam
esqueleto com dez metros de comprimento, feito exclusiva- a apanhar o lixo. Traçavam-lhe a origem, as rotas, emitiam
mente de plásticos brancos apanhados na praia. Uma peça de alertas quando as mesmas peças surgiam em pontos diferentes,
“artivismo” apontada ao problema do plástico nos oceanos que, sinal de que tinham caído contentores em alto-mar”, ideia que
apesar de todas as campanhas, continua a crescer à razão de apelou à sua formação científica. “Percebi que o lixo tinha uma
mil toneladas por hora, o equivalente a um camião TIR cheio história para contar, que podia ser catalogado, e foi assim que
de plástico por minuto. Todos os minutos. “Uma atrocidade a angústia deu lugar à determinação e desta nasceu, em 2015,
contra o planeta e contra a espécie humana”, comenta à VISÃO a página Plasticus Maritimus, no Facebook. Dava assim início
Ana Pêgo, bióloga marinha e coautora desta Baelena Plasticus ao trabalho de identificação de exemplares desta terrível es-
que, depois de cumprido o trabalho em muitas exposições, pécie invasora, provenientes dos EUA, do Canadá, e de todo o
repousa agora no quintal desta investigadora e educadora ex- mundo, mas muitos também de Portugal, onde tem algumas
traordinária: “Gosto muito de misturar ciência, arte e biologia irritações de estimação, como é o caso das placas de Alerta de
para tentar fazer com que as pessoas conheçam e gostem dos Arriba em Perigo, colocadas pela própria Agência Portuguesa
oceanos, porque só assim vão estar predispostas a protegê-los.” do Ambiente (APA). “Essas placas são de plástico, e quando
Nascida e criada junto à Praia das Avencas, na Parede, estu- chega o mau tempo caem e partem-se. Já foram alertados vá-
dou Biologia Marinha na Universidade do Algarve e trabalhou rias vezes, por mim e por outras organizações, e nada mudou.
dez anos como investigadora no Laboratório Marítimo da A APA já deveria ter percebido que não pode continuar a fazer
Guia, em Cascais, antes de enveredar por esta área da Educa- sinaléticas em plástico.”
ção Ambiental. Plasticus Maritimus foi também o nome escolhido para o
Ana Pêgo admite que despertou para o problema dos plás- belíssimo livro editado pela Planeta Tangerina em 2018, cujo
ticos por volta de 2011: “O plástico já ali estava, mesmo à minha impacto ultrapassou as nossas fronteiras. Traduzido em dez
frente, só nunca tinha feito esse clique.” Mas desde então que línguas, chegou longe, a países como a Coreia do Sul e, bre-
se dedica de corpo e alma a esta luta: “Comecei a limpar a praia vemente, a China. O livro contém muita informação sobre a
compulsivamente. Chegava a ir de noite, e a minha família já relação entre o plástico e os oceanos, descrita de uma forma
se interrogava se eu não teria enlouquecido.” Era uma luta lúdica, e inclui até um guia para preparar idas à praia, com o
naturalmente inglória, e o entusiasmo acabou por dar lugar à objetivo de colecionar e analisar exemplares desta espécie. Tor-
angústia e à indignação: “Como era possível que mais ninguém nou-se, aliás, uma das ferramentas preferidas de professores
estivesse preocupado com este problema?!”, perguntava-se. e alunos para abordarem o tema nas escolas, ao ponto de Ana
“Claro que havia quem estivesse, como a professora Paula Sobral ter conhecido em Coimbra dois irmãos gémeos que sabiam
(presidente da Associação Portuguesa do Lixo Marinho, já aqui de cor várias frases do livro. Mas o melhor estava guardado
entrevistada), e outros que também apanhavam lixo na praia. para o fim, quando uma das crianças lhe disse que tinha dois
Mas éramos muito poucos, e nem sequer estávamos ligados.” ídolos no mundo: “Eu e a Greta Thunberg. Até fiquei sem jeito.
Começou então a descobrir grupos que faziam esse traba- Elevou-me a um patamar muito alto.” visao@visao.pt
O DILEMA DE
ABRIR OU FECHAR
Com o crescimento do número de casos de Covid-19, cada
vez mais cidades optam por impor medidas restritivas e de
recolher obrigatório, nem sempre bem aceites pelos residentes
MELBOURNE, AUSTRÁLIA
Milhares de pessoas manifestaram-se contra a continuação das medidas de
confinamento, depois de a cidade australiana conhecer, há várias semanas,
uma diminuição do número de novos casos de Covid-19
PARIS, FRANÇA
O encerramento
de um café na
capital francesa,
uma das nove
cidades do
país onde foi
decretado
o recolher
obrigatório entre
as 21 e as 6 horas,
como forma
de combater a
pandemia
BARCELONA,
ESPANHA
Os bombeiros
tentam apagar
os incêndios
acionados pelos
manifestantes que,
durante a noite,
protestaram nas
ruas da cidade
contra as medidas
de confinamento
VISÃO 29
IMAGENS
HATTINGEN, ALEMANHA
O outono cria sempre cenários magníficos nas zonas de floresta,
lembrando, nesses momentos, como é importante proteger a Natureza
e como as árvores são fundamentais para a nossa vida na Terra
SAN VICENTE, GUATEMALA
A erupção do vulcão Pacaya, a cerca de 45 quilómetros da capital do país,
levou as autoridades a aumentar as medidas de segurança e a monitorizar
o avanço da lava, como forma de proteção das populações
SÃO PAULO,
BRASIL
Um tributo ao
80º aniversário
de Pelé, num dos
muitos murais
que o artista Luis
Bueno, conhecido
como “Bueno
Caos”, espalhou
pela cidade
brasileira
VISÃO 31
OS DISCRETOS
DONOS DE CINCO
IMPÉRIOS
FAMILIARES
VIERAM DO NADA, CRIARAM NEGÓCIOS
MILIONÁRIOS E TÊM GRANDE
INFLUÊNCIA NOS BASTIDORES.
MAS VIVEM COM TOTAL DISCRIÇÃO.
DUAS DESTAS FAMÍLIAS SALTARAM
AGORA PARA A RIBALTA COM
A ENTRADA NO CAPITAL DA TVI.
AS HISTÓRIAS POR DETRÁS FERNANDO
DE CADA FORTUNA
CAMPOS NUNES
Visabeira
C ATA R I N A G U E R R E I R O
EDUARDO
RANGEL
Grupo Rangel
AVELINO
GASPAR
Lusiaves
HUMBERTO
PEDROSA
Barraqueiro
JOÃO
SERRENHO
Tintas CIN
N
Nunca deu uma entrevista na vida, são raras
as fotos suas a circular e pouco se sabe sobre
ele. Mas é um dos portugueses com mais po-
der nos bastidores financeiros e até políticos.
“Não há presidente de um banco no País, nem
político ao mais alto nível, que não o conhe-
ça e não o leve em conta”, garante o antigo
ministro socialista Jorge Coelho, seu amigo
de longa data. Fernando Campos Nunes, 65
anos, é dono de uma das maiores fortunas do
País. Só em participações empresariais, tem
um património de 803 milhões de euros, se-
gundo a última avaliação da revista Exame. A
Visabeira, a holding que criou para as áreas das
telecomunicações, tem crescido sem parar e é, FERNANDO
atualmente, das que têm maior peso nacional.
Como ele, também João Serrenho, o dono
CAMPOS NUNES
64 ANOS
das Tintas CIN que se tornou, recentemente, Criou, com os irmãos,
acionista da TVI, Avelino Gaspar, que dirige a a Visabeira, em 1980,
maior empresa nacional de produção de aves, e depois de virem de
cujos filhos decidiram também comprar ações África. Atualmente, está
da Media Capital, Eduardo Rangel, que lidera presente em 16 países e
comercializa os produtos e
o grande negócio de logística na Península serviços para mais de 116
Ibérica, e Humberto Pedrosa, que controla a
Barraqueiro e que é acionista da TAP, preferem
EMPRESAS
atuar nos bastidores.
Partilham os lugares na lista dos mais ricos Grupo Visabeira,
do País ao lado de clãs como os Amorim, os Vista Alegre, Bordallo
Pinheiro, TV Cabo Fernando Campos Nunes aposta,
Queirós Pereira, os Viola ou os Mello, mas são
Angola, TV Cabo desde sempre, em telecomunicações.
raras as suas aparições e vivem em grande Na foto, um trabalho da empresa na
Moçambique, hotéis,
discrição. Estão sempre entre os convidados Ponte 25 Abril, no início dos anos 90
imobiliário
das comitivas presidenciais e ministeriais nas
visitas ao estrangeiro, têm todos títulos de PAT R I M Ó N I O
comendador ou de grande-oficial, atribuí-
dos por serviços prestados ao País, mas não
gostam de holofotes e são desconhecidos de
muitos portugueses. Todos eles montaram
€803 MILHÕES
verdadeiros impérios familiares que mantêm
Valor das participações
empresariais
ANTES DE COMPRAR
com mão de ferro. A VISTA ALEGRE,
São obcecados com o trabalho, conhecidos
como bons negociadores e considerados ho-
CAMPOS NUNES
mens que subiram a pulso. Nos bastidores, têm PEDIU A OPINIÃO
sido muitas vezes decisivos para desbloquea-
rem importantes questões nacionais: Hum-
A AMIGOS, DEPOIS
berto Pedrosa, acionista da TAP, foi o elemento FEZ O CONTRÁRIO
34 VISÃO 29 OUTUBRO 2020
FESTAS E CONVIDADOS DE ELITE
Fernando Campos Nunes promove, todos os anos, uma festa em que reúne
políticos, empresários e banqueiros. Costuma ser num dos seus restaurantes.
O filho faz eventos no The Day After, uma discoteca que pertence ao grupo
da famosa discoteca The Day After que pertence ao grupo. Os pais, Fernando
Campos Nunes e a mulher, estiveram entre os cinco mil participantes.
Para este ano, estavam previstas novas festas, mas a pandemia levou ao
adiamento dos eventos sociais.
€320 MILHÕES
é o cérebro de tudo, dizem os mais próximos.
O seu feitio low-profile levou, aliás, alguns a
pensarem que, quando o irmão morreu num
Valor das participações acidente de viação em 1986, a empresa pudesse
empresariais sofrer um revés. Mas isso não aconteceu: “Ele é
predestinado para o negócio, antecipa o que vai
acontecer”, nota Nuno Terra Marques.
Move-se nos mais altos círculos nacionais,
entre políticos, governantes e empresários,
garante, por seu lado, Jorge Coelho que, re-
centemente, passou a integrar o novo órgão da
empresa: o Conselho Geral e de Supervisão.
Este foi criado para que Fernando Campos
Nunes pudesse ir passando a gestão executiva
e ficasse apenas a supervisionar. Isto porque,
segundo tem confessado aos amigos, quer-
-se reformar daqui a dois anos. E aí promete
dar a primeira entrevista da sua vida, na qual
conta com uma condecoração com o grau de
grande-oficial da Ordem do Infante D. Hen-
rique, em 2000.
Poucos acreditam que se afaste. “Não o vejo
a parar”, afirma Jorge Coelho. Apesar disso,
está a preparar o futuro. “Alteramos o governo
do grupo”, frisa Nuno Terra Marques, expli-
cando que Campos Nunes saiu do Conselho
de Administração (CA), passando para aquele
Conselho de Supervisão. O que levou, em ja-
neiro deste ano, o filho mais velho, Fernando
Daniel, de 23 anos, a entrar para o CA do gru-
po. Agora, ele é um dos homens que comanda
JOSÉ CARLOS CARVALHO
€362 MILHÕES
administrador-delegado. Os meus filhos são
TANTO HUMBERTO acionistas, mas prefiro ter uma administração
PEDROSA COMO Valor das participações
profissional”, explica. David tinha, como ele,
assento no Conselho de Administração (CA)
AVELINO GASPAR empresariais de Avelino
e de Paulo Gaspar
da TAP – empresa da qual se tornou acionista
maioritário, em 2015, no âmbito do consórcio
COMEÇARAM OS SEUS com o brasileiro David Neeleman. Saiu ago-
NEGÓCIOS QUANDO ra de presidente do CA da companhia aérea,
com a entrada do Estado, para evitar possíveis
TINHAM 20 ANOS conflitos de interesse, uma vez que é acionista
do grupo Barraqueiro que tem contratos esta- OS JERVELL como o próprio Humberto Pedrosa lhe chama
– foi ainda maior. O líder da Barraqueiro, que
tais, como a concessão ferroviária da Fertagus. tinha 80 autocarros, havia marcado para o dia
Dona do grupo Nors, a
Este negócio da companhia aérea já lhe va- família Jervell tem um
25 de abril de 1974 uma escritura para comprar
leu guerras, como, por exemplo, com Miguel património de €361 a Arboricultora, com uma frota de 100. Porém,
Pais do Amaral, em 2015, com quem esteve milhões. O império o dono da empresa optou por adiar. Pouco
para se juntar na corrida à compra da TAP, e empresarial foi criado depois, decidiu-se que as empresas com mais
também algumas críticas sobre o seu envol- por Tomaz Jervell, de 100 autocarros seriam nacionalizadas. Ou
vimento na empresa. que morreu este ano, seja: falhar a escritura salvou a Barraqueiro
Apesar das dificuldades atuais, Humberto com 76 anos. O filho que, assim, não ultrapassou o limite. À sorte,
Pedrosa garante: “Não estou arrependido.” Tomás é o CEO do diz Humberto, juntou-se o otimismo constante
Tomou a opção de entrar no negócio, depois grupo Nors. Nele está e a capacidade de arriscar. Apesar das crises de
de ter sido contactado por um banco que ainda o outro filho, 1974, 1980 e 1998, “arrisquei muito”. Na época
precisava de um acionista nacional. “Gosto de João. Presente em das privatizações, comprou empresas caras e
projetos à volta dos transportes. Mas, de facto, 17 países, a empresa algumas cheias de problemas, como a Rodoviá-
nunca me passou pela cabeça ser um dos acio- tem um volume de ria do Alentejo. Hoje, a Barraqueiro tem 4 200
nistas da TAP”, diz, explicando que tinha pena negócios superior a autocarros, alargou a ação para o transporte de
de que a empresa fosse parar a mãos estran- €1,6 mil milhões. São combustível e de automóveis, e está a investir
geiras. “Se não houvesse pandemia, não tenho totalmente discretos A no Brasil, onde tem quatro empresas. Antes
dúvida de que, em 2022, a TAP teria resulta- empresa desenvolve a de começar a pandemia, estava envolvido em
dos positivos.” Agora, diz, a recuperação será sua atividade através projetos no metro no Brasil. Nos tempos livres,
de marcas como a Auto
mais lenta. Porém, continua “a acreditar” na gosta de caçar e de juntar a família, os dois fi-
Sueco, a Ascendum, a
empresa, garante. Foi, aliás, com esta postura, lhos, as noras e os seis netos, cinco rapazes e
Civiparts, a AS Parts, a
conta, que conseguiu construir o seu império Vitrum, entre outras.
uma rapariga.
empresarial. Aos 20 anos, ficou “sozinho” a Com 73 anos, continua a trabalhar, todos
gerir a empresa de transporte de passageiros os dias, e mantém a ambição. Hoje, o comen-
que o pai, Artur, comprou à família Jerónimo, dador (que recebeu a comenda da Ordem do
OS RODRIGUES
que vivia na Malveira, na mesma zona onde Mérito Empresarial das mãos do Presidente da
residiam os Pedrosa. Certo dia, o médico de República, em 10 de junho de 2013) controla a
família chegou a casa deles e, sabendo que os holding Barraqueiro, possui a Rede Nacional
Jerónimo não tinham descendência, olhou O Grupo Simoldes, Expresso e detém algum imobiliário e diversas
para o pai de Humberto e disparou: “Ó senhor fundado por António herdades. Mas, como o próprio diz, continua
Silva Rodrigues, um
Artur, tem de comprar aquela empresa.” Artur de olho em oportunidades. Agora, com um
empresário de Oliveira
Pedrosa, que já era dono de um negócio de património que vale 320 milhões de euros,
de Azeméis, continua
transporte de mercadorias, acabou por ad- a crescer. No próximo
não está sozinho como aconteceu aos 20
quirir a Barraqueiro, que tinha 11 autocarros, e ano, deverá atingir anos. Parte da sua holding é, até, detida pela
entregou-a ao filho. “Aos 20 anos, geria aquilo uma faturação de mil Arriva, uma empresa do Deutsche Bahn, mas a
100% sozinho”, recorda Humberto. milhões de euros, maioria da holding, 70%, é da família Pedrosa.
Os primeiros tempos não foram, porém, tendo em conta o
fáceis. Houve acidentes, como o de 1967, em investimento que O CRIADOR DE PINTOS
que uma cheia, em Olival de Basto, danificou está a fazer em novas Já Avelino Gaspar, de 63 anos, dono da Lusia-
quase toda a frota da empresa, que se encon- unidades industriais. ves, não abdica do facto de a empresa ser 100%
trava numa garagem naquela zona. E houve Já passou parte do da família. Os Gaspar são acionistas e muitos
alguns entraves como os que foram impostos negócio ao filho Rui trabalham na empresa. A mulher, Susana Pau-
pela regulação dos transportes, estipulada pelos Paulo Rodrigues. A la, é vice-presidente do grupo e gerente de
governantes de então. “Não se podia aumentar empresa tem as suas várias empresas. É o número dois de Avelino
uma carreira ou um horário”, recorda Humber- origens em 1959, que ocupa o cargo de presidente. O filho mais
to, sublinhando que, na época, tinha a linha que quando o empresário se velho, Paulo, dirige outros tantos negócios. A
ligava Turcifal a Lisboa e que qualquer acrescen- juntou ao avô e os dois filha do meio, Mariana, de 27 anos, que até se
to era proibido pelo Estado que queria proteger fundaram a Simoldes casou durante a pandemia, entrou em janeiro
os caminhos de ferro. Mas Pedrosa montou uma Aço. deste ano para a empresa e está já a desenvol-
estratégia: virou-se para o transporte escolar ver vários projetos. O mais novo, Francisco,
e apostou fortemente no turismo. “Passamos de 19 anos, está ainda a estudar, durante parte
MARIA CRUZ
Pombal, onde tirou o curso. Passou pela cons-
trução civil, fez o liceu e, aos 17 anos, foi para um
escritório de comerciantes de rações. Em 1975,
decidiu investir parte do dinheiro na compra
daqueles pintos e, uns tempos depois, aven-
turou-se no seu primeiro aviário, um espaço
com 400 metros quadrados, onde criou quatro
mil frangos. Chegou a dedicar-se ao imobiliá-
rio, tendo feito negócios com o cunhado, mas
investiu na agropecuária todo o dinheiro que
ganhou. Em 1986, criou a Lusiaves e tornou-se
EDUARDO RANGEL
67 ANOS
o maior produtor de aves nacional. Hoje, produz
Era despachante numa
mais de 100 milhões, todos os anos.
empresa na Alfândega
do Porto, quando
O DESPACHANTE
decidiu despedir-se e
Foi também a ousadia em jovem adulto que montar uma empresa
levou Eduardo Rangel, de 67 anos, a montar o que se tornou uma
seu império empresarial. Trabalhava como des- gigante da logística
pachante, num escritório que tinha uma sala na O despachante Eduardo Rangel
Alfândega do Porto, quando sentiu que tinha de EMPRESAS montou a sua empresa com
arriscar. Despediu-se e deixou o colega e amigo 27 anos. Na foto, a construção
Grupo Rangel, uma
para trás. “Foi a pior noite da minha vida. Não da sede, na Maia
holding com 18
dormi nada”, conta, recordando que, no dia
empresas
seguinte desse mês de setembro de 1980, com
27 anos, abriu a sua empresa aduaneira na Rua PAT R I M Ó N I O
da Restauração, no Porto. Para o ajudar, levou
um amigo, Alberto Pires, e o irmão José Rangel,
dez anos mais novo. Vinham de uma família
modesta em Valadares. O pai era sapateiro, e
€300 MILHÕES
Volume de negócios do
MUITOS POLÍTICOS
a mãe costureira. “Ele modelava sapatos e ela grupo TRATAM EDUARDO
fazia vestidos para as vizinhas e amigas”, expli-
ca. Eduardo era um dos quatro filhos e, aos 16 RANGEL POR
anos, começou a trabalhar como praticante de
despachante. Hoje, é dono da maior empresa COMENDADOR, MAS
de logística da Península Ibérica, a Rangel, e
tem, diz orgulhoso, um império com um vo-
ELE PREFERE NÃO
lume de negócios de 300 milhões de euros, 2 USAR O TÍTULO
40 VISÃO 29 OUTUBRO 2020
100 funcionários e uma área logística de 400 são na comunicação social já tinha começado,
mil metros quadrados cobertos. A sua holding porém, antes, sendo um dos acionistas do
de 18 empresas tem como CEO o filho, Nuno, jornal ECO.
de 41 anos. Decidiu passar-lhe a pasta há qua-
se dez anos, mas Eduardo ainda se mantém NEGÓCIOS João Serrenho, de 68 anos, herdou a lide-
rança do negócio de família do pai, António,
a supervisionar. “Continuo a tomar decisões,
em especial quando são negócios avultados”, EM NÚMEROS que tem hoje 96 anos. Foi ele quem, depois
de ter entrado na empresa em 1950, passou a
165
explica. Sempre disse aos filhos que “só seriam acionista e a tornou líder do mercado nacional.
líderes se demonstrassem competências”, senão Hoje, o império familiar é gerido por João que
apenas seriam acionistas. A filha optou por ser acumula uma riqueza de 230 milhões de euros.
dentista e não está no negócio. Já com Nuno Foi ele o sucessor, apesar de ser o mais novo
fala várias vezes por dia. “Eu sou mais emocio- de quatro irmãos. O mais velho, António Fran-
MILHÕES
nal, e ele mais racional.” Sempre lhes explicou cisco, nunca quis dedicar-se ao negócio das
também que só deviam manter a empresa se tintas, e as duas irmãs, gémeas, Maria Francisca
desse resultado e se não gerasse discussões e Maria João, apesar de acionistas, optaram por
na família. Caso contrário, devia-se vendê-la. O valor em euros do outros caminhos. Uma delas era dona de uma
EBITDA registado pela
Eduardo sempre trabalhou muito. “Pelo menos farmácia até há muito pouco tempo.
Visabeira é, segundo
15 a 16 horas, aos sábados e domingos.” Em João Serrenho entrou para a empresa do
a empresa, um
tempos, chegou a ter um hobby, o golfe, mas comportamento
pai, em 1976. Na altura, “estava desempregado”,
desistiu já lá vão 25 anos. “Um dia, tive um jogo histórico e representa contou no livro sobre António Serrenho, O
durante a semana e perdi um encontro com um um crescimento Senhor das Tintas, de José Alberto Magalhães.
cliente. Nunca mais.” Sempre foi líder absoluto de mais de 16%. A mesma passagem de testemunho parece es-
do grupo. Recebeu o título de comendador das tar a fazer agora com o filho mais velho, João
mãos de Cavaco Silva, em 2008, mas não gosta Luís, que entrou neste ano para o Conselho
610
de o usar. “Valorizo-o, mas não o adotei.” Ad- de Administração. Mas este seu herdeiro pro-
mite, porém, que muitos políticos que conhece mete ser mais mediático: João Luís Serrenho é
gostam de tratá-lo por comendador. Apesar de vice-presidente do partido Iniciativa Liberal.
gostar de discrição, é comum estar rodeado de Já o pai não gosta de aparecer. Nem tem vida
gente influente. Muitos estiveram presentes no social, garantem os mais próximos. É adepto
MIL M2
Brasil, no casamento do filho com a blogger do Futebol Clube do Porto e faz listas com coi-
brasileira, Ione Omena, em 2013. sas de que não se pode esquecer. É licenciado
Eduardo já é avô e, nos tempos livres, É a dimensão coberta em Engenharia Química e, em 2012, recebeu
gosta de conviver. Mas continua a saber que dos pavilhões de do então Presidente da República o título de
foi o trabalho duro que o levou ao topo deste produção avícola da grande-oficial, por mérito industrial.
império familiar. Quanto começou, lembra, o empresa Lusiaves Além de serem discretos, donos de comen-
País era pouco desenvolvido tecnologicamente, das e de medalhas, todos estes empresários
e ele decidiu apostar na tecnologia. “Foi uma garantem que arriscaram muito. Foi o que fez
decisão estratégica importante que nos tornou Avelino Gaspar, em 2003, perante a ameaça dos
22,5%
competitivos”, diz, recordando que desenvol- nitrofuranos em frangos, perus e codornizes.
veu a “primeira tecnologia aduaneira para ligar Em vez de suspender a produção de aves e de
as alfândegas”. deitar fora as que tinha, como fez a maioria das
Como sabia que nos anos 90 iriam ocor- empresas, ele optou pelo aposto: decidiu con-
rer mudanças na Europa, alargou as áreas de gelar milhares de aves e continuar a produzir.
A participação que
atuação e, além da atividade aduaneira, passou Humberto Pedrosa
Quando as análises pedidas pelo Estado deram
a dedicar-se ao setor transitário. Pelo meio es- detém na TAP negativo, estava pronto para pôr tudo no mer-
creveu um livro sobre as alterações que a União cado. Já Humberto Pedrosa, perante o controlo
50
Europeia ia desencadear nos procedimentos do Estado no transporte de pessoas, apostou
aduaneiros. De Portugal, expandiu os negócios no turismo, e Eduardo Rangel, por seu lado,
para Angola, Moçambique e Brasil. Agora, 40 antecipou-se às consequências do mercado co-
anos depois, está a apostar em áreas como a mum e alargou os negócios para os transitários.
farmacêutica. O irmão é chefe de compras no Fernando Campos Nunes decidiu, contra tudo
grupo e outra irmã está na área administrativa. e contra todos, comprar a Vista Alegre quando
O seu desejo é que, daqui a 40 anos, a Rangel
tenha crescido para o dobro. Para isso, diz, PAÍSES esta estava na falência. O feeling do empresário
de Viseu, conta o atual presidente do CA, Nuno
há apenas um segredo: “Distribuir pouco os A marca de tintas Marques, fê-lo arriscar em pegar numa empresa
lucros. O que é preciso é investir.” portuguesas CIN está que perdia milhões de euros e em transformá-la
presente pelo mundo, num “caso de sucesso”. “Também eu lhe disse
COMPRADOR DA TVI nos vários continentes para não comprar”, confessa Jorge Coelho que
Foi exatamente um dos últimos investimentos não tem dúvida de que o amigo nasceu para
dos Serrenho que os trouxe para o mediatismo. ser um empresário cheio de poder, mesmo
João Serrenho, dono das Tintas CIN, decidiu sem exposição pública. “Há muita gente que
tornar-se acionista da Media Capital, dona da tem muito poder no País e ninguém ouve falar
TVI, comprando 5% da empresa. A sua incur- dela.” cguerreiro@visao.pt
12
0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
DEVERÃO
continuar a motivar a poupança por
motivos de precaução”.
MANTER-SE Enquanto persistir a incerteza so-
bre o que ainda nos reserva esta crise
DEVIDO pandémica, o mais provável é que se
À INCERTEZA
tente evitar ao máximo desfazer os
fundos de emergência que foram sen-
SOBRE do reforçados nesta crise e que a li-
quidez continue parada nos cofres dos
A EVOLUÇÃO bancos em vez de fluir para projetos e
DESTA CRISE
investimentos que possam puxar pela
recuperação, via crédito. visao@visao.pt
AMÉRICA
O MOMENTO
DA VERDADE
COM O ADVERSÁRIO
EM VANTAGEM
E A NAÇÃO NUMA
ENCRUZILHADA,
DONALD TRUMP
CHEGOU À SUA ÚLTIMA
LINHA DE DEFESA, ANTES
DA BATALHA FINAL
M O L LY B A L L , E M O C A L A , F L Ó R I D A *
D
discurso conciliador sobre cuidados da economia, de como ele está a con-
de saúde, um comício drive-in num seguir uma maioria no Supremo Tri-
parque de feiras, em Detroit, posan- bunal, e pouco mais.” Em privado, até
do para selfies (com máscara), com os assessores de Trump admitem que,
um coro juvenil. Mas o que Biden faz mais do que uma verdadeira estraté-
é quase irrelevante. As eleições de 3 gia política, os seus comícios servem,
de novembro não são sobre Biden, e sobretudo, para manter o Presidente
todos – incluindo o próprio Biden – ocupado e satisfeito emocionalmente.
sabem disso. São sobre Trump. Este é Tanta coisa tem acontecido e, to-
o derradeiro referendo a uma Presi- davia, nada parece mudar desde 2016:
dência que não respeita normas; é o indignações, escândalos, tumultos,
clímax de um colapso nervoso nacio- centenas de milhares de mortos e
nal, o último acerto de contas. Desde milhões de desempregados devi-
que se candidatou que Biden descreve do ao SARS-CoV-2. A proibição de
a sua campanha como uma “batalha entrada no país de cidadãos de paí-
pela alma da nação”, e, por mais banal ses muçulmanos; a investigação do
De início, a voz do Presidente parece que isto possa soar, é difícil discordar. procurador Robert Mueller sobre a
estar rouca, até que ele se põe aos gri- Esta é uma campanha que assenta num ingerência russa em 2016; filhos de
tos. “Vamos obter uma grande vitória e contraste emocional – confiança, in- imigrantes em gaiolas; Stormy Da-
ponto final”, proclama Donald Trump. clusão – e num apelo a um recomeço, niels [a atriz de filmes pornográficos
“E mais, sabem porquê? É mais outra a um regresso a tempos normais. a quem Trump pagou para não reve-
derrota e eles acabarão por aceitá-la.” “Toda a gente sabe quem é Trump”, lar um caso extramatrimonial] e Kim
Ouve-se um murmúrio entre a declara Biden, no Michigan. “Agora Jong-un [o ditador norte-coreano que
multidão jubilante e suada que enche é preciso que eles [eleitores] saibam Trump considera um amigo]. Injeções
este centro de criação de cavalos, a quem nós somos.” No entanto, como de desinfetante contra a Covid-19,
noroeste da cidade de Orlando, na Ca- Trump não se cansa de realçar, se o recomendadas por Trump durante
lifórnia. Há milhares de pessoas con- normal de outrora era assim tão bom, uma conferência de Imprensa. Os
centradas na pista do aeroporto, sob então ele jamais teria sido eleito. emolumentos de governos estran-
um sol escaldante de outubro. Quase Um Trump combativo, insistindo geiros [que violam a Constituição]; a
toda a gente enverga uma t-shirt ou um em que os institutos de sondagens impugnação aprovada na Câmara dos
boné com slogans de Trump, e quase estão enganados, um caos em rede- Representantes...
ninguém usa máscaras faciais. Eles [a moinho: em muitos aspetos, parece Os últimos quatro anos têm sido
assistência] vão ganhar a Flórida mais uma repetição das eleições de 2016. um sonho político febril, uma história
uma vez, assevera Trump. Vai haver no- Alguns republicanos, angustiados, de um homem que morde um cão,
vamente [como aconteceu nas eleições receiam que Trump esteja em queda sem que ninguém concorde em que
de 2016] uma grande onda vermelha [a e a arrastar com ele o partido. campo está o cão e em que campo está
cor do Partido Republicano]. Recentemente, o senador republi- o homem. Uma grande parte dos nor-
Numa outra versão da realidade, cano Ben Sasse, do Nebraska, acusou te-americanos convenceu-se de que
o cenário é muito menos promissor o Presidente de ser um “indivíduo os democratas estão em conluio com
para o atual inquilino da Casa Bran- narcisista obcecado com a televisão”, um culto de pedófilos que adoram
ca. A maioria das sondagens indica que “bajula ditadores”, “maltrata mu- Satanás, e Trump não diz se acredita
que o seu adversário, o democrata lheres” e “troça dos cristãos evangéli- nessa teoria de conspiração, porque
Joe Biden, está numa posição de li- cos” [a sua principal base de apoio]. É esse eleitorado o ama.
derança na Flórida, um estado sem o claro que Trump arrasou com Sasse, Tudo deu errado, e tudo pode ainda
qual é quase impossível a reeleição de no Twitter. acontecer. Esta é a maior diferença
Trump e onde mais de 16 mil pessoas relativamente a 2016: embora todos
morreram de Covid-19. UM SONHO FEBRIL os dados pareçam apontar para uma
O Presidente norte-americano está Os estrategos da campanha de Trump derrota de Trump, os analistas, que
na defensiva nos chamados estados gostariam que ele os ouvisse e se há quatro anos tantas certezas tinham
battleground [decisivos na determi- comportasse bem, em vez de, por quanto a uma vitória de Hillary Clin-
nação do vencedor], que ele ganhou exemplo, continuar a sua vendetta ton, mostram-se agora cautelosos.
há quatro anos, e depara com dificul- contra Anthony Fauci, o mais popular
dades até mesmo nos estados onde a cientista do país, ou de disseminar
vitória seria certa, como no Ohio e na
Geórgia. Numa altura em que os pro-
relatórios duvidosos que muitos sus-
peitam tratar-se de uma campanha de TRUMP ESTÁ NA
blemas do país são urgentes e óbvios, desinformação russa, sobre o antigo DEFENSIVA ATÉ NOS
ESTADOS ONDE DEVERIA
o argumento final de Trump é uma trabalho de Hunter Biden [filho de
embrulhada de teorias da conspiração Joe], na Ucrânia.
e de queixumes pessoais.
Enquanto, na Flórida, o Presidente
Trump “deve parar de se quei-
xar que as pessoas o atacam ou que TER UMA VITÓRIA CERTA,
congregava os seus apoiantes, no Mi- estão a tentar roubar-lhe a eleição”, COMO NO OHIO
E NA GEÓRGIA
chigan, Joe Biden dedicava-se a coisas recomenda o estratego republicano
normais para qualquer candidato: um Charlie Black. “Deveria falar apenas
44 42,8%
42
40
JAN. FEV. MAR. ABR. MAI. JUN. JUL. AGO. SET. OUT.
O tremer do chão
Estendeu os seus negócios a quase todo o
tipo de atividades, desde a siderurgia à banca,
passando pelos cimentos, os seguros e a
agricultura, entre muitas outras. No entanto,
era na indústria que se sentia vivo: “Quando
entro na fábrica, sinto o tremer do chão se
as máquinas estão a trabalhar bem. Quando
entro no banco, não sinto nada.” Gostava de
acompanhar todos os processos, desde a
construção da fábrica até ao momento em que
esta iniciava a laboração. Teve um método
de trabalho que seguiu à risca: levar cada
um dos investimentos até ao fim, para não
se “dispersar por pequenos negócios” que
o desviassem dos “objetivos essenciais”. Foi
assim também no final da sua vida. Talvez pela
experiência que sentiu no caso da herança
Sommer, fez questão de transformar todos os
seus bens patrimoniais em dinheiro ou ações,
fáceis de transacionar, evitando qualquer tipo
de conflito na distribuição da sua fortuna pelos
seus herdeiros.
A magia de África
Apesar de ter herdado, do lado da sua mãe, minas de cobre no Nordeste de Angola e algumas fazendas em São
Tomé, a sua verdadeira incursão por terras africanas começou com a compra, ao BNU, da fábrica de cimentos da
Matola, em Moçambique, negócio que acabaria por dar início ao caso da herança Sommer. Em poucos anos, António
Champalimaud iria tornar-se um dos maiores produtores de cimento e aço de África, beneficiando da pujança do
investimento em obras públicas que existia nestes dois países, nomeadamente a construção da barragem de Cahora
Bassa. Mas este continente foi para António Champalimaud mais do que uma mera oportunidade de negócio: “Nem
queria acreditar nos meus olhos. A magia de África foi para mim um repto sensorial único.” Homem de paixões, tinha
as mulheres como “a coisa mais fantástica da criação de Deus” e a caça como um dos seus passatempos favoritos.
Este fascínio levou-o a comprar duas coutadas em Moçambique onde família e amigos se dedicavam a esta atividade
e que, mais tarde, se tornaram uma das zonas mais protegidas da vida animal daquele país. “Deixei de caçar quando
percebi que a fauna era um bem limitado, que se estava a dizimar e que precisava de ser protegido.” O continente
africano acabaria também por marcar a sua via após o exílio de Portugal. Quando lhe perguntaram o porquê da
escolha do Brasil, respondeu: “Talvez tenha sido, também, a nostalgia de África.”
Homens de aço
Apesar do seu namoro com a Junta de Salvação
Nacional, os focos de tensão fizeram-se desde
logo sentir nas suas empresas, entre as quais
a Siderurgia Nacional, que, para António
Champalimaud, era uma espécie de bastião
do império. Já com um caderno reivindicativo
preparado –, que exigia saneamento de
administradores, aumentos salariais e
participação nos lucros –, os trabalhadores
exigiam falar com o “patrão” antes de entrar em
greve. Apesar do clima de tensão que se alastrava
FOTOS: D.R.
À MEDIDA DOS
FORTERA
ISRAELITAS INVESTEM
NO NORTE
O grupo israelita Fortera
investiu cerca de €200 milhões
em mais de uma dezena de
projetos, todos a norte, entre
Porto, Gaia, Espinho (na foto)
e Braga. O público-alvo é
o mercado doméstico e os
valores médios do metro
quadrado situam-se nos €3
200. Em nenhum deles, garante
o CEO do grupo, foi sentido o
efeito da pandemia nas vendas.
renos da Efanor. Localizado em Mato- muito valorizadas, como as varandas de mas este segundo edifício vai ter mais
sinhos, no epicentro de uma série de 28 metros quadrados ou os 28 mil me- 145 unidades e contamos arrancar com
projetos Sonae (como o Norteshopping tros quadrados de área verde privativa, a construção em meados do próximo
ou o Porto Business School), o empreen- temos registado ainda mais procura”, ano. Acreditamos que o mercado vai
dimento Jardins Efanor tem já em fase conta Sandro Mota Oliveira, CEO da continuar a ter interesse neste tipo de
de finalização o primeiro edifício (de Invest&Co, empresa especializada na produto”, sublinha ainda o responsá-
vários que vão ser construídos num total gestão e promoção de ativos imobiliá- vel da Invest&Co, acrescentando que
de 400 casas) com 62 apartamentos e rios e que está a fazer a coordenação dos os portugueses representam 80% das
preços a partir dos 150 mil euros para Jardins Efanor, um empreendimento do vendas do primeiro edifício.
os T0. Cerca de 75% já foram vendidos, promotor Prédios Privados, que adqui-
a maioria este ano, em plena pandemia. riu os terrenos à Sonae. HOTÉIS RECONVERTIDOS
“Não sentimos qualquer impacto Com o ritmo de vendas a encorajar A menos de meia hora de distância de
negativo devido à atual situação, bem o investimento, a empresa prepara-se Matosinhos, mais especificamente em
pelo contrário… Tendo em conta as para lançar o segundo edifício em breve. Gaia, o grupo Fortera, de capitais is-
características do projeto, atualmente “Ainda estamos a definir as tipologias, raelitas, vai lançar o Skyline, um projeto
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I M O B I L I Á R I O / E N T R E V I S TA
Miguel Saraiva
“A mobilidade dos jovens vai ter
mais impacto do que a pandemia”
O fundador do maior atelier de arquitetura do País fala dos efeitos da Covid-19
no mercado da habitação, deixando o aviso: “Vamos sair dos nossos espaços
privados e vamos querer um espaço público que responda aos nossos desafios”
E
MARISA ANTUNES
68
6 8 VISÃO 29 OUTUBRO 2020
Portugal, e não tanto pelos Vistos Gold Antes da pandemia, falava-
ou pelo programa dos Residentes Não se muito da tendência a nível
Habituais, mas muito pelo estilo de mundial para a construção de
vida que o País permite. Os estrangei- casas mais pequenas. E agora?
ros puseram o foco em Portugal por Poderá haver uma inversão devido
questões de segurança, de clima, de
estilo de vida e por ser um País bastante
AS à questão do confinamento?
Sim, é um contraciclo. Nós andámos a
desenvolvido. Ao contrário do que es- INTERVENÇÕES desenhar casas mais pequenas devido
EM LISBOA
tamos sempre a dizer, temos um País ao custo das mesmas e a pandemia
desenvolvido e com infraestruturas hoje grita, exige, mais área porque as
bastante recentes. Já em termos de
hotelaria, notou-se o impacto. É na- FORAM pessoas, ao confinarem-se em casa,
querem mais espaço. A grande conse-
tural. Nós tivemos dois projetos fora
de Lisboa que deixaram de ser hotéis
CENTRADAS quência desta pandemia tem muito que
ver com a baixa qualidade espacial que
para serem edifícios residenciais. Os
restantes hotéis que estamos a desen-
NAS PESSOAS foi desenvolvida ao longo destes anos.
As pessoas negligenciaram aquilo que
volver, a maioria em obra, mantiveram QUE HABITAM andaram a comprar, negligenciaram
o seu uso. Seria muito oneroso alterar
o objetivo inicial. Mas temos perfeita A CIDADE E NÃO o nível de exigência que puseram nos
projetos. E hoje as famílias, ao estarem
consciência de que há uma insegurança
enorme no setor. Não se sabe o que NAQUELAS confinadas, deparam-se com casas, não
diria obsoletas, porque são recentes,
vai ser o futuro e é evidente que isso
vai ter um impacto grande também
QUE A VISITAM mas com áreas muito pequenas e com
funcionalidades duvidosas, em que o
na encomenda privada dos ateliers, espaço de estar está paredes-meias
principalmente em Lisboa e no Por- com o espaço privado de cada uma
to. Nestas duas cidades, o impacto é das habitações. A pandemia veio alertar
gigantesco, a insegurança é enorme. para uma série de situações que, ainda
Vamos ver. Acho que os hoteleiros vão assim, não creio que venham a ter um
estar muito expectantes nos próximos impacto futuro tão grande ao nível da
dois a três anos. habitação e na forma de habitar.
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Diria então que o efeito da tadas. A situação deriva de dois motivos: existe hoje entre os clientes de 2008/09
pandemia não irá refletir-se na por um lado, nestes países registou-se e os clientes que vieram em 2015/16 é
conquista de mais espaço interior uma quebra enorme ao nível da en- que estes últimos são muito mais pro-
(de qualidade)? comenda privada. Por outro lado, são fissionais e muito mais estruturados.
Acho que vai ser o espaço público a países muito desestruturados, onde a Neste momento, o mercado nacional
responder muito mais a isso, até por- questão social, nestas circunstâncias, pesa cerca de 85% da nossa faturação.
que o nível de exigência das pessoas é muito dura para as pessoas e para as E qual é o peso dos promotores
aumentou nesse aspeto. Se as varan- empresas, até porque não existem gran- estrangeiros?
das são o espaço exterior, por defeito, des mecanismos de suporte à socieda- Absorvem 80%, é impressionante. A
das nossas habitações, temos também de em si e não há uma rede de saúde Saraiva & Associados faturou cerca de
de exigir que o espaço público seja o estruturada como existe em Portugal 15 milhões de euros em 2019.
prolongamento das nossas casas. Va- ou na Europa. Além disso, estamos a Há 12 anos publicou um livro sobre
mos sair dos nossos espaços privados reposicionar o atelier em geografias a habitação a custos controlados
e vamos ter de ter jardins, passeios, diferentes, em países mais estruturados. mas especializou-se, entretanto, no
um espaço público que responda aos E que peso essas filiais tinham na imobiliário de luxo…
nossos desafios. O grande proble- vossa atividade? Especializei-me ou o mercado obri-
ma da cidade é que, durante anos, o Chegaram a representar 60% das en- gou-me a especializar-me… Olho para
espaço público foi negligenciado e a comendas do grupo, se recuarmos a construção de luxo como olho para a
única coisa que nos interessava era cerca de cinco anos. Atualmente, a construção a custos controlados: res-
o espaço privado. A pandemia veio faturação no estrangeiro representa peito o desenho, respeito as cidades,
alterar o paradigma. Os promotores, entre 15 e 18 por cento. Começámos respeito quem vai habitar. Evidente-
juntamente com as entidades públi- a nossa internacionalização em 2008, mente, são programas que respondem
cas, têm de concentrar esforços não ainda com bastantes encomendas em a necessidades diferentes, até porque
só nos seus edifícios, mas também no Portugal, mas já com o sentimento de uma responde aos desafios de quem
espaço envolvente dos mesmos. Tem que as coisas iam complicar-se por cá. desenvolve projetos no centro da ci-
de haver aqui, no pós-pandemia, um Passado o período mais negro da dade e outra na periferia. É natural
foco de interligação entre os privados anterior crise, quando começaram que assim seja porque o custo do solo
e o público, no sentido da valorização a sentir que o mercado nacional dificilmente permite que os custos
dos espaços que são confinantes às voltava a ganhar atratividade? controlados estejam dentro da cidade.
nossas intervenções. De 2014 para 2015, sente-se o merca- Já começam a surgir em Portugal
Como vê a transformação de do nacional a reagir à crise em termos investidores institucionais a
Lisboa e do Porto nos anos mais imobiliários. Principalmente com a che- apostarem na habitação a custos
recentes? gada de investimento estrangeiro, com controlados para o mercado de
Conheço melhor Lisboa. Penso que as fundos imobiliários de grande escala. arrendamento. Como acompanha
pessoas, já com algum distanciamento, Foram cinco anos de um crescimen- esta tendência?
começam a perceber que a cidade de to extraordinário, junto a operadores Não temos um mercado de arrenda-
Lisboa foi pensada como um todo, que internacionais. A grande diferença que mento por dois motivos: um é cultu-
as intervenções foram centradas nos ral – as pessoas preferem mesmo ter
habitantes da cidade e não simples- a sua habitação em vez de arrendar; o
mente naqueles que a visitam. Hoje outro motivo assenta na questão dos
a cidade tem uma qualidade urbana juros que são realmente muito baixos
que é incomparavelmente superior e, sendo tão baixos, são concorrenciais
àquela que existia. Os últimos 12 anos aos valores do arrendamento. Mas
trouxeram bastante valorização no que hoje sabemos que os jovens olham
diz respeito à criação de espaços de para o mercado de trabalho como um
estar, de viver e de partilhar, coisa que mercado global. Nessa tendência, os
durante tantos anos foi negligenciada.
Mas é evidente que isto, ao acontecer,
AS OBRAS DE jovens vão optar mais pelo mercado
de arrendamento porque as novas
suscita tensões naturais.
Fundou o seu atelier em 1996 com
CONSTRUÇÃO gerações querem ter diferentes expe-
riências profissionais, querem mobi-
apenas dois arquitetos. Quantos EM ALTURA SÃO, lidade, e isso leva-as a viajar e a mudar
tem agora?
Sim, o atelier está quase a fazer um NORMALMENTE, de cidade com grande facilidade. Na
minha perspetiva, essa, sim, vai ser
quarto de século… Atualmente tem
120 colaboradores em Lisboa, mais 20 OBJETOS uma alteração profunda do paradigma
na área da habitação e dos promotores
colaboradores externos. Da rede dos 11
ateliers no estrangeiro que tínhamos,
DE GRANDE imobiliários. A mobilidade dos jovens
vai ter muito mais impacto na habita-
fechámos a China e parqueámos o Pa- QUALIDADE ção do que a própria pandemia. E isso
ARQUITETÓNICA
namá, a Venezuela, o México e a Malásia. deveria ser monitorizado e analisado,
Encerraram devido à pandemia? não só pelos privados como pelo pú-
Foi um misto de oportunidade. Dos 11, blico. Vai haver uma alteração muito
temos seis a funcionar… Na China não profunda na forma de habitar neste
foi bem fechar, temos as portas encos- âmbito… visaoimobiliario@visao.pt
ESTREIA
DIA 27 OUTUBRO - 22h
IMOBILIÁRIO / OPINIÃO
D
DE PROMOTORES E INVESTIDORES IMOBILIÁRIOS
epois de tanta contrainformação, mensagens “Aumenta os preços”: De acordo com todos os dados
(propositadamente?) mal passadas, ou mes- consolidados, a emissão de vistos na Área Metropolitana
mo falta de conhecimento sobre os temas, do Porto e mesmo no Porto foi completamente irrelevan-
urge clarificar os mitos criados à volta do te (0,9% e 56 vistos totais). Do mesmo modo, a emissão
programa de Autorizações de Residência para de vistos na Área Metropolitana de Lisboa foi global e
Investimento (ARI, vulgo “Golden Visa”): igualmente insignificante (menos de 2% de todas as tran-
“Bruxelas quer o fim do Golden Visa”: sações imobiliárias). Mais: por cada mil imóveis transacio-
Não corresponde à verdade, uma vez que as nados, apenas sete foram dedicados ao ARI (3 por cento).
ações e os processos instaurados contra Chi- “Facilita o branqueamento de capitais”: Muito se
pre, Malta e Bulgária dizem respeito a pro- fala deste risco, mas o facto é que, até ao momento, não
gramas de concessão de cidadania, não tendo nada que foram detetadas situações anómalas de relevo. O bran-
ver com o Programa ARI português, que apenas concede queamento é uma possibilidade latente em muitos ou-
autorizações de residência (para investimento) temporá- tros sistemas importantes e credíveis. Da mesma forma
rias por cinco anos, mediante comprovativo de manu- que não seria sensato acabar com esses sistemas para
tenção do investimento realizado. evitar esse risco, também não o
“Não cria emprego”: Só quem seria terminar com o programa ARI
pretende induzir as pessoas em erro
pode fazer uma afirmação destas. É
Estes investidores têm só porque a ameaça existe. A legis-
lação em vigor obriga promotores
óbvio que um programa que, isola- sustentado toda uma imobiliários, bancos, mediadores,
damente, desde 2012, já captou €5,5 fileira da construção notários, advogados a denunciar
mil milhões de investimento; que é e a evitar esta ameaça. Porém, se
um dos principais responsáveis por
e do imobiliário que, dúvidas ou brechas surgirem, o que
permitir que investidores estran- nos últimos anos, se espera é que, no exercício das
geiros anualmente tenham vindo a
investir na fileira da construção e
representa 17,4% do suas competências, e caso seja ne-
cessário, o Estado exerça um maior
do imobiliário outros tantos €5 mil PIB e que alberga controlo no interesse de todos.
milhões; que em 2019 foi ainda capaz cerca de 600 mil “Leva à deslocação de pessoas
de atrair €700 milhões e, desde 2020 para os centros urbanos”: Há inú-
até agora, €550 milhões de inves-
postos de trabalho meros estudos internacionais ela-
timento, não só cria riqueza a um só na construção borados por insuspeitas instituições
País ainda descapitalizado como gera de elevada reputação que demons-
benefícios diretos a toda uma fileira, tram que, até 2050, há uma clara
ocasionando também efeitos indiretos em muitos outros concentração das populações junto dos centros urbanos.
setores de atividade, como a grande indústria dos mate- As razões desse movimento derivam da procura de me-
riais de construção, o turismo, o comércio, os serviços e, lhores oportunidades de vida, nomeadamente emprego.
portanto, é gerador de emprego. Ou seja, estes investi- Em países como Portugal, que dispõem de amplas zonas
dores têm sustentado toda uma fileira da construção e costeiras, é normal a crescente procura pelos grandes
do imobiliário que, nos últimos anos, representa 17,4% centos urbanos localizados no litoral, que, em geral, ofe-
do PIB e que alberga cerca de 600 mil postos de traba- recem mais oportunidades.
lho só na construção. Mais: 17 vistos ARI foram emitidos “Leva à escassez de habitação acessível”: São seg-
a cidadãos estrangeiros que criaram, de forma concreta, mentos de mercado completamente diferentes. De acor-
pelo menos 170 postos de trabalho efetivos. do com os dados divulgados, o valor médio do investi-
“Tira os habitantes a Lisboa”: De acordo com os mento rondará os 575 mil euros. Ora, considerando o
Censos 2011, Lisboa perdeu cerca de 260 mil habitan- poder de compra médio dos portugueses recorrendo a
tes. Ora, o programa ARI foi criado em 2012, pelo que crédito, por um período não inferior a 35 anos, o valor
a perda de habitantes, nomeadamente para concelhos máximo do crédito a uma taxa de esforço de 33% deverá
adjacentes, deveu-se a outros fatores que há décadas rondar os 350 mil euros – logo, bem inferior ao valor
ocorrem na cidade e que nada têm que ver com isto. médio verificado no programa ARI. visaoimobiliario@visao.pt
Orçamento
“Para os males
nos cuidados
extremos,
só são eficazes
os remédios
intensos”
intensivos
Marcelo pressionou o Governo para
Hipócrates que os hospitais privados entrem no
Médico grego
(460 a.C. - 377 a.C.) combate à pandemia. PS volta
a dividir-se entre moderados e radicais
quanto às políticas de Saúde. Tensão
condicionou negociações com
o Bloco, tendo em vista a viabilização
do OE para 2021
FILIPE LUÍS
H
dia do debate orçamental
ORÇAMENTO NO VENTILADOR
Para os negociadores do executivo, o
SNS foi um pretexto “conveniente” para
o Bloco justificar a sua decisão política,
há muito tomada, de votar contra o or-
çamento. O BE teria escolhido uma causa
especialmente sensível para a opiniao
pública, sobretudo em tempo de pan-
demia. Ora, o beneplácito provisório do
PCP não é tido como uma questão de
“favas contadas” para a aprovação final.
Um elemento do gabinete do primeiro-
-ministro admite que, na especialidade,
a negociação com os comunistas – ainda
por cima, estribados no facto de serem,
agora, o principal “parceiro de dança”
do Governo – será dura. Mas o eventual
acordo pode ter, nos bastidores, algumas
garantias extraorçamentais, como o de-
sinvestimento do PS, nas próximas au-
tárquicas, em municípios-emblema para
os comunistas… Com tantas dificuldades Catarina Martins O divórcio,
– incluindo a hipotética dependência de no seio da Geringonça, teve por
duas “limianas” deputadas não inscritas, pretexto a diferença de perspetivas
Joacine Katar Moreira, ex-Livre, e Cris- nas questões da Saúde
tina Rodrigues, ex-PAN –, o orçamento
12 565,4
fica ligado ao ventilador, durante a dis-
cussão na especialidade. um seu antecessor do mesmo partido,
Na terça-feira, dia em que se iniciava conduz “a política de Saúde mais mar-
a discussão orçamental, no Parlamento, xista dos últimos anos”. Esta tensão, que
Marcelo Rebelo de Sousa recebia dois é histórica e cíclica, está a acompanhar
ex-ministros da Saúde, Paulo Macedo, a pandemia, na escalada rumo ao pico.
do governo de Passos Coelho, e Adal-
berto Campos Fernandes, antecessor de LEVAR A CARTA A GUIMARÃES
Marta Temido no primeiro governo de Para aumentar a confusão, o bastonário da
M I L H Õ ES D E EU RO S
António Costa. Adalberto é tido como Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães,
Para a Saúde, no OE 2021
um dos críticos das políticas seguidas até encabeça a lista de assinaturas de uma
4
este momento. A lei de bases de Maria de carta de antigos bastonários, criticando as
Belém – outra figura ligada aos setores políticas do Ministério da Saúde, e aler-
socialistas da Saúde “não marxistas” – tando, em tons alarmistas, para a rutura
foi encomendada pelo ex-ministro, mas, do SNS. Em resposta, um grupo de qua-
com a remodelação de outubro de 2018, tro dezenas de conhecidos e prestigiados
acabou por não ver a luz do dia. No en- clínicos, a começar pela ex-ministra Ana
tanto, a possibilidade de recurso ao setor Jorge, respondeu, no Público, com uma
privado manteve-se na letra da lei, que foi “contracarta”, em que desautorizam o seu
aprovada pelo próprio Bloco de Esquerda. M I L H Õ ES D E P O RT U G U ES ES bastonário: “Não nos sentimos representa-
O ex-ministro socialista Correia de Têm acesso aos hospitais dos.” E lembram que o recurso ao privado
Campos, cuja visão da saúde pública se privados já acontece, como comprova um artigo ali
2
situa num campo geralmente considerado citado, do Jornal de Negócios, em que se
“mais à esquerda”, admite que há várias diz que 41% do orçamento do SNS já se
tendências no seu partido e que “há mes- destina a pagar a privados.
mo socialistas, ou antes, pessoas inscritas Estes números correspondem, na
no PS” que defendem o setor privado, e verdade, a contas feitas ao peso do setor
outros que são demasiado radicais para privado em Portugal. Um responsável
admitirem, sequer, um recurso limitado do Grupo CUF comenta que o Ministé-
aos privados. De facto, no PS cabem fi- rio se chama “da Saúde e não do SNS”.
guras que vão desde Germano de Sousa, Entre seguros privados, seguros por via
homem forte dos laboratórios com o M I L H Õ ES D E U T E N T ES de contratos coletivos de trabalho, sub-
mesmo nome – que estão na linha da DO SNS sistemas vários e ADSE, cerca de quatro
frente das encomendas dos testes Covid São considerados pobres, antes milhões de portugueses já podem utilizar
– a… Marta Temido, que, nas palavras de das transferências sociais os hospitais privados, sem um rombo no
1
gias. É que, dos restantes seis milhões
de cidadãos, dois milhões correspondem O percurso para a viabilização assim impedindo de ser o PSD a re-
a estratos populacionais em situação de do Orçamento do Estado (OE), cusá-lo primeiro, como espero faria
pobreza (antes das transferências sociais, em particular quanto às rela- corrigindo o grave erro, este de Rio,
pensões, RSI, etc.) e outros dois milhões ções PS-BE, e o resultado das quando há tempos não afastou em
estão acima desse patamar por uma eleições nos Açores evidenciaram absoluto essa possibilidade.
3
questão de meia dúzia de euros mensais as negativas consequências do que
de rendimento. Cidadãos que, portanto, aqui considerei dois notórios erros A informação parece, entre nós,
não têm qualquer alternativa de trata- políticos de António Costa, entre o cada vez mais limitada. Assim,
mento fora do sistema público. Restam, muito mais em que tem acertado. A não li, vi nem ouvi nenhuma
finalmente, dois milhões que, com mais saber: a) o PS ter recusado liminar- notícia sobre um acontecimento
ou menos sacrifícios, poderão escolher mente a disponibilidade do BE para da maior importância para o Chile e
alternativas ao SNS. celebrar um acordo de legislatura, bem relevante no contexto da região
Ou seja: recusando qualquer tipo de como aconteceu na anterior − se era e até do espaço ibero-americano a
acordos mais amplos com o setor priva- possível ou não levá-lo a bom termo que também pertencemos. Refiro-
do, o Estado falha na cobertura aos mais depois se veria...; b) a forma como -me ao referendo, que o governo
vulneráveis. E este é o principal argumen- amiúde se relacionou com o PSD de se viu “forçado” a promover após
to que tem sido explanado pelos especia- Rui Rio, maxime quando disse que grandes manifestações populares,
listas ouvidos em Belém. Mas Ana Jorge o Governo acabava no dia em que a sobre elaboração ou não de uma
justificou que a sistemática transferência sua subsistência (leia-se: a aprova- nova Constituição, para substituir a
de doentes para os hospitais privados vai ção do OE) dele dependesse. que ainda vem do tempo de Pinochet
afastar, “primeiro os doentes, depois os O erro face ao e permite ou pro-
recursos e, finalmente, os profissionais”. BE justifica parte move tremendas
No fundo, defendem os setores mais à do que está a suce- O resultado injustiças sociais.
esquerda do PS, o que se paga aos priva- der. Mas não tudo, das eleições nos E o resultado foi
dos devia ser investido nas melhorias do em especial o voto Açores, não sendo “sim”, com uma
SNS. Era esta a posição do Bloco. do BE contra o OE, esmagadora maio-
Correia de Campos explica à VISÃO na generalidade, transponível para ria de 78,3%, e
que o financiamento dos privados, nos em vez de se abs- o todo nacional, 79% dos votantes
acordos celebrados pelo Estado, não pode ter e deixar o voto pode sinalizar uma a optarem ainda
ter por base os custos suportados pelos
hospitais públicos. Deve ser inferior,
final dependente
do que resultar da tendência, mormente pela futura Cons-
tituinte ser forma-
porque os privados não têm obrigações discussão na espe- na correlação da apenas pelos
como a investigação e a admissão dos cialidade − posição de forças PS/PSD para o efeito elei-
estudantes estagiários, podem escolher com eventuais cus- tos e não por estes
especialidades mais lucrativas em detri- tos para o partido e serem metade e
mento de outras e podem, até, selecionar mesmo para Marisa Matias nas pre- a outra metade deputados do atual
os seus doentes. Foi o que aconteceu, sidenciais. O erro face ao PSD além Parlamento. Mais, na Constituinte
conforme lembra a carta coassinada por do mais tirou espaço de manobra ao haverá igual número de homens e
Ana Jorge, no início da pandemia, quando Governo nas negociações para via- mulheres. O que é extraordinário,
os privados transferiram grávidas infeta- bilizar o OE e tirou ao PS qualquer sobretudo atendendo a que ali, por
das com Covid-19 para o SNS. Correia de autoridade moral para criticar o PSD exemplo, o divórcio apenas é possível
Campos recorda que o comportamento pelo seu sentido de voto. há 16 anos e o aborto há três − e só
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dos privados, nessa altura, lhes trouxe nos casos de risco de vida da mulher,
“danos reputacionais de que querem, O resultado das eleições nos Aço- inviabilidade fetal e estupro.
agora, recuperar”. E outro ex-responsável res, não sendo transponível para Tudo isto na pátria de Gabriela Mis-
pela pasta da Saúde defende que, por isso o todo nacional, pode sinalizar tral, Pablo Neruda e Salvador Allende,
mesmo, o Estado tem, agora, obrigação uma tendência, ou tendências. onde António Costa esteve em 2017
de negociar com os privados prestações Mormente na correlação de forças em visita de Estado e se garantiu o re-
de serviços “a preços sociais”. PS/PSD, e mostrando a necessidade forço de relações entre os dois países,
Em Belém, o Presidente da República de um diálogo aberto e sério entre integrando o Chile, como observador,
está mais ativo do que nunca, a ouvir eles. A solução de governo a en- a CPLP, para ele exportando mais de
toda a gente e a pressionar o Governo. contrar não é fácil. E foi pena que o 400 empresas nacionais e sendo o
E, desta vez, a discussão não é só sobre a Chega se tivesse adiantado a recusar nosso terceiro “cliente” na América do
declaração, ou não, do estado de emer- a hipótese de entendimento com um Sul − tudo isto não é sequer “notícia”
gência. fluis@visao.pt partido do “sistema” − o PSD, claro −, em Portugal?... visao@visao.pt
“Se o homem
falhar em
conciliar a justiça
e a liberdade,
então falha
em tudo”
Albert Camus
Escritor
(1913-1960)
FOTOS: GETTY IMAGES
KEN
FOLLETT
O regresso à cidade das catedrais
TRINTA ANOS DEPOIS DE OS PILARES DA TERRA,
O AUTOR DE BEST-SELLERS, COM MAIS DE 170 MILHÕES
DE LIVROS VENDIDOS NO MUNDO, VIAJA À IDADE MÉDIA
NO NOVO ROMANCE KINGSBRIDGE: O AMANHECER
DE UMA NOVA ERA. EM ENTREVISTA À VISÃO, OLHA,
TAMBÉM, PARA AS TREVAS DO PRESENTE
S Í LV I A S O U TO C U N H A
29 OUTUBRO 2020 VISÃO 79
Triunfante Ken Follett fotografado em
N
E N T R E V I S TA Madrid, em 2019, na apresentação de
um espetáculo musical baseado no seu
grande best-seller: Os Pilares da Terra
OS TRIBUNAIS”
coisas muito piores do que aquilo que
religioso, acreditavam que uma vida de estamos a viver agora. scunha@visao.pt
N
Graça Freitas e Bagão Félix:: Botânica como escape
em o plano de con-
tingência apertado
nem as muitas me-
didas de seguran- Graça Freitas teve uma rara oportunidade para descansar da pandemia e falar
ça impediram que sobre o assunto que a faz sorrir com gosto: orquídeas. A seu lado, esteve António
a festa se fizesse Bagão Félix, que a acompanha no fascínio pela Botânica. Foi uma conversa
na Estufa Fria, que deliciosa. A diretora-geral da Saúde contou que a sua paixão por plantas nasceu
abriu portas, neste aos oito anos. “Fui à Madeira, onde tinha família, e havia um jardim de uma tia
fim de semana, aos mais de 750 visitan- minha com muitas orquídeas.” Foi amor à primeira vista. Hoje, o cansaço não a
tes que ali acorreram, ao longo das seis deixa sequer cuidar das suas amadas orquídeas caseiras: “Chego a casa, olho
sessões, para ouvir os mais de 30 orado- para elas à distância e percebo, pelas folhas, que estão mal. E custa-me estar
res convidados. Pelo palco, ou pelo ecrã sentada no sofá, absolutamente estafada, e não conseguir levantar-me para ir
digital, passaram pensadores, investiga- tratar delas.” Já Bagão Félix tem um fascínio especial por árvores. “Tenho 500
dores, cientistas, artistas, ativistas e go- e tal, de 105 espécies. Faço muitas experiências, umas vezes com sucesso,
vernantes, todos com um intuito comum: outras com insucesso.” Era, aliás, a Botânica que lhe dava ânimo e o ajudava
a recarregar baterias nos tempos mais conturbados de governação. No fim, o
incentivar uma partilha de ideias sobre o
moderador pediu a Bagão Félix para dizer que árvore é para si Graça Freitas.
ambiente. E, em última análise, incentivar
“Romãzeira”, disse o ex-ministro, sem grandes hesitações. “Porque é uma árvore
à mudança – tanto nas pequenas coisas delicada e tem os bagos, as sementes unidas em comunhão. E é assim que eu
do dia a dia como nas grandes opções vejo o seu trabalho hoje, nesta pandemia, ao unir os esforços de todos.”
estratégicas e políticas ambientais.
O VISÃO FEST Verde fez parte da pro-
gramação oficial da Lisboa Capital Verde
Europeia 2020, parceira desta iniciativa
que, este ano, teve uma forte componente
digital, tendo em conta a versão reduzida
da plateia. Todas as intervenções foram
emitidas em streaming, no site da VISÃO,
no Facebook e no Instagram, e foram
acompanhadas por muitos milhares
de pessoas. Todos os vídeos, incluindo
os dos workshops, estão agora também
disponíveis no site da revista. É preciso
ter VISÃO, e é preciso pensar verde!
“Portugal pode
ser o campeão
da proteção
marinha”
EMANUEL GONÇALVES
FUNDAÇÃO OCEANO AZUL
Mensagens
pelo planeta
Os visitantes
puderam deixar
mensagens
e ideias para
mudar o mundo,
e fotografar-se
numa réplica da
capa em tamanho
gigante da revista
VISÃO
“Não podemos
continuar a
querer crescer
sempre, temos
algo mais
importante
pela frente:
sobreviver”
EUNICE MAIA
MARIA GRANEL
“Já estão
a existir
alterações
no oceano
que, se nada for
feito, daqui a
uma ou a duas
décadas
terão custos
enormes”
JOSÉ XAVIER
BIÓLOGO
E CIENTISTA POLAR
ELISA FERREIRA
COMISSÁRIA EUROPEIA
E
u sempre quis repensar o Natal, mas nunca pensei
que fôssemos repensá-lo por causa de uma virose.
Mais: sempre detestei redações sobre o Natal e
aqui estou eu a fazer uma redação sobre repensar o
Natal, o que é, no mínimo, deprimente. Ainda assim,
menos deprimente do que repensar a praia que,
felizmente, ninguém teve de repensar. E nada precoce,
P O R C A P I C U A / Rapper se pensarmos que 2020, como se diz nos memes,
resume-se a Janeiro, Fevereiro, Covid-19, Dezembro.
O Natal é aquela altura do ano em que estamos com as pessoas de
Repensar
quem gostamos e com as pessoas que só vemos uma vez por ano. Este ano,
vai ser o ano em que não vamos estar com as pessoas de que gostamos,
precisamente porque gostamos delas, nem com as pessoas que só vemos
o Natal
uma vez por ano, o que faz com que este ano seja o ano em que nem essas
pessoas veremos. Resumindo, isto de repensar o Natal, quando finalmente
acontece, é para pior. E olhem que havia muito mais por onde repensar.
Ocorre-me logo o bolo-rei, que tem o epíteto de rei precisamente por-
que ninguém votou nele, ninguém clamou por ele, toda a gente o trocaria
por qualquer outra sobremesa, mas está lá porque todos os seus antepas-
sados já lá estavam. E, apesar de todos questionarem o espaço que ocupa
na toalha, há sempre a desculpa da tradição e da preservação do simbo-
lismo do Natal. Em síntese, o monarca dos bolos é como a monarquia
nos países democráticos: há que repensar. Até porque se o mantemos por
uma questão de iconografia, poderíamos envernizar um exemplar e man-
tê-lo, de ano para ano, como as árvores de Natal de plástico. Assim como
assim, metade da sua constituição já é fruta cristalizada.
Outra coisa a repensar é o esgotamento feminino com a logística
natalícia. Gerações e gerações de mulheres, juntas ou sozinhas na
cozinha, esgotadas, exauridas, exangues, fazendo sonhos, fritando
rabanadas, assando perus, cozendo bacalhau, nos dias que antecedem,
nos dias em que decorre e nos dias após o Natal, até um de janeiro.
Numa repetição de rotinas, gestos e rituais, que se habituaram a ver
nas suas mães, e que fazem questão de reproduzir porque, afinal, isso
é que é o Natal. Elas são a produção, vivem a tradição dos bastidores e
se, para os outros, o Natal é estar à mesa, para elas é estar na cozinha,
numa missão hercúlea, muitas vezes autoimposta, que representa a mais
inculcada forma de exploração do patriarcado – o serviço à família. O
que se estende por todo o ano, na dupla jornada, exacerba-se nos dias
em que o estar em família também se exacerba, e as mulheres, numa
espécie de clímax da sua condição, fazem a alquimia de tornar festa e
celebração, o que é (quase sempre) servidão.
Por falar nisso, já repensávamos o excesso de comida, de desperdício,
de consumo e de prendas para as crianças. Podíamos comer na mesma,
oferecer na mesma e fazer as crianças igualmente felizes, sem exagerar,
sem gastar tanto e sem deitar tanta coisa fora. Restos, embalagens,
papel e todas essas dionisíacas manifestações de uma abundância que,
na realidade, não vivemos e que, para bem do planeta, nem deveríamos
simular. Podíamos repensar esses excessos, por toda a antecipação que
implicam, num frenesim de compras e trânsito nas semanas anteriores, e
também pela quantidade de tralha que as crianças levam para casa, quase
toda em plástico. Até porque, na bebedeira do excesso, nem chegam a
prestar atenção aos brinquedos, e é maior a ansiedade de rasgar papel de
Este ano, vai ser o ano embrulho do que propriamente a alegria.
em que não vamos Agora, há coisas no Natal que gostava de não repensar. As histórias
do Tio Zé, sobretudo as mais impróprias para contar à mesa. A aletria da
estar com as pessoas Tia Cristina. A roupa-velha que queria comer no dia vinte seis, mas que
de que gostamos, quase nunca se faz. Ir a Vila do Conde. Ver os amigos emigrados que vêm
à cidade para as festas. E o ritual pós-Natal, de sortear entre amigos a
precisamente porque pior prenda do ano. Isso e saúde para todos (!), porque para viver o Natal
gostamos delas é preciso muita saúde. visao@visao.pt