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Ch GAO 1904 Richard J. Ladle Robert J. Whittaker Editores BIOGEOGRAFIA e PRESERVAGAO AMBIENTAL Tradugao Dra. lara Fino Silva Prof. Durval Dourado Neto v¥%,_ORGANIZACAO ANDREI EDITORA LTDA. wre Tel: (14) 3229-6111 - Fax.: (11) 3221-0246 ~ Sao Paulo editora-andrei.com.br 14 — Capitulo 8 Biogeografia de Ilhas Kostas A, Triantis'” e Shonil A. Bhagwat? | Grupo de Biodiversidade dos Agores, Universidade dos Acores, Terceira, Portugal. 2 Escola de Geografia e Meio Ambiente, Universidade de Oxford, Oxtord, Reino Unido, 8.1-INTRODUGAO Quando uma reserva natural posta de lado, els esié, destinada a tomar-se uma tha em um mar de habitats modificados pelo homem. (WILSON; WILLIS, 1975, p. 525) As ilhas desempenharam um papel central no desenvolvimento da teoria de conservagio. Em particular, a Teoria do Equilibrio de Biogeografia de [has (TEBI) (MACARTHUR; WILSON; 1963; 1967; WILSON; 1969) desem- penhou um papel furdamental em diversas éreas, tais como na teoria de projeto de rede de areas protegidas ¢ de previsao de taxas de extingdo, A TEBI é um modelo de equilibrio dinamico, que postula que 0 nlimero de espécies de um dado grupo texonémico encontrado numa ilha serd 0 produto de forgas opostas que conduzem respectivamente ao ganho e perda de espécies, resultando numa rotatividade continua das espScies presentes em cada ilha ao longo do tempo. 'sto esta presente no famoso modelo grafico de MacArthur e Wilson, em Que taxa de imigragao diminui exponencialmente e a taxa de extingdio aumenta exponencialmente conforme uma ilha, inicialmente vazia, ela enche até o seu valor de equilibrio de riqueza (mostrado pela interseco; Figura 8.1). A curva de taxa de imigragao achata com o aumento do isolamento da ilha e a curva de taxa de extingdo achata com o aumento da area, gerando assim uma familia de curvas 340 - BIOGEOGRAFIA E PRESERVACAO AMBIENTAL que proporcionam combinagdes unicas de riqueza e rotatividade para cada combinagao de area ¢ isolamente. E Grende Nimero de eapécles presentes Figura 8.1 - Modelo de equillbrio de biogeogratia de ihas ¢ as implicagses_da fragmentag&o do habitat (setas am negrito). Um numero de especies em equilibrio (S) € definido por dois processos opostos, imigrag&o (I) ¢ extingdo (E). A taxa de imigragdo diminui e a taxa de extingfo aumenta com o aumento da riqueza: a taxa de imigracao chega a zero, quando todo o conjunto (P) de espécies potenciaimente imigrando chegaram. Nas ilhas distanies (Ifar) do conjunto fonte S40 esperadas texas de imigragao mais baixes do que aquelas nas ihes préximas (I,near). Espera-se que as taxas de extingéio sejam maiores em ilhas pequénas (E,small) que em ihas grandes (Ei large). Assim, diferentes nimeros de equilfbrio de espécies s80 estabelecidos com base na area @ no isolamento das ilhas (Su: Sx: Sr; Sq), € tanto 0 equilibrio de riqueza de espécies quanto as taxas de rotatividade de espécies (T) devem variar de acordo com a combinagdo de texas de imigracdo e exting4o que caracterizam uma dada ithe (por exemplo, Ts; Ts). Setas em negtito mostram a diregdo das mudangas pravistas pelo modelo para fragmentar umia extensao mais cu menos continua de habitat em manchas pequenas, isoladas. Figura modificada de MacArthur e Wilson, 1967, Figura 8. p. 22. A influéncia da TEI ¢ marcada no apenas pela pesquisa que inspirou, mas também pelas teorias ¢ aplicagdes que gerou ¢ influenciou (por exemplo, @ BIOGEOGRAFIA DE ILHAS - 344 teoria de energia para espécies, a teoria da metapopulagio, a teoria da montagem de ilha, a teoria neutra e teoria estocdstica de nicho; revisadas em WHITTAKER; RNANDEZ-PALACIOS, 2007). Depois de alguns anos da publicagao, a aplicagdo da TEBI no campo da conservagdo estava sendo vigorosamente debatida por académicos, Uma das ideias-chave foi a constatagao de que as reservas terrestres ¢ parques nacionais podiam ser vistos simplesmente como um outro tipo de ilha (“ilhas de habitat”) rodeada por um "mar" de paisagens antrépicas. Conclui-se, logicamente, que essas reservas se com- portariam como ilhas isoladas do continente pelo aumento do nivel do mar, ou seja, elas perderiam espécies conforme “relaxassem em diregdo a0 equilibrio” (Figura 8.1; DIAMOND, 1975a; WILSON; WILLIS, 1975). No contexto do discurso da "crise" da ciéncia da conservagao a partir da década de 1970, varios proeminentes cientistas da conservagao voltaram-se para a teoria de ilha em busca de um guia cientifico geral “disponivel” sobre o projeto de sistema de areas protegidas para ajudar tanto na defesa quanto na implantagio. Se cada 4rea protegida pode tomar-se, com o tempo, uma ilha rodeada de habitats modificados pelo homem (WILSON; WILLIS, 1975. p. 18), ¢ uma 4rea total finita pode ser reservada para a conservagiio a medida que uma paisagem natural esté sendo convertida para outros usos, uma das questes basicas ¢: “Qual a configuragao de reservas que os conservacionistas deveriam defender?” De acordo com Margules e Pressey (2000), as reservas tém duas fungdes principais: elas devem amostrar ou representar a biodiversidade de cada regizo e devem separar essa biodiversidade de processos que ameagam a sua persisténcia, © quanto as éreas protegidas cumprem esse papel depende de quao bem elas se ad¢quam a dois dos objetivos do projeto de reserva. O primeiro € a representagdo,-um odjetivo ha muito estabelecido, referindo-se @ necessidade das reservas de incorporarem toda a variedade da biodiversidade na regiao, de preferéncia em todos os niveis de organizacao (Capitulos 2, 5 ¢ 6). O segundo é a persisténcia. As reservas, uma vez estabelecidas, devem promover a sobrevivéncia em longo prazo das espécies e outros elementos da biodiversidade que elas contém, mantendo os processos naturais e as populagdes vidveis, ¢ excluindo as ameagas (Capitulo 7). Para atingir estes objetivos, os planejadores de conservag%o nao sé devem projetar sistemas de reservas que levam em considerag&o os padrées fisicos e biolégicos naturais, mas também tomar decis6es sobre tamanho, co- nectividade, replicacao e alinhamento das fronteiras de reserva (MARGULE: PRESSEY, 2000; WHITTAKER ef al., 2005). Tudo isso precisa ser feito ‘em conformidade com as restrigdes orgamentarias e, geralmente, com fortes restrigdes politicas © socioecondmicas sobre o tamanho ¢ a localizagtio das reservas. 342 - BIOGEOGRAFIA E PRESERVACAO AMBIENTAL A teoria de biogeografia de ilhas fornece a estrutura tedrica para muitas pesquisas sobre fragmentagaio e tem sido invocada como fonte de principios gerais para projetos de rede de reserva (DIAMOND, 1975a; WILSON; WILLIS, 1975; HAILA, 2002; veja Figura 8.2). PIOR MELHOR fa) Reserva grande Reserva pequena @ Reserva nao fragmanetada ‘baw na Efeitos de rovers Ge rican bords menos elevados “Maior conectividade (corredores) Major conectividade _ttrompoting)_ ©) Reservas Protego completa ‘Aumento ca diversidade uniforme de habitats i : ) Perspectva, @ @ | “. perspectiva focal °@] i )/ regionat So "Sirenos N@® | & excluidos integragao huma. 2 ne (zones ‘tampio) Figura 8.2 - Diretrizes de projeto para teservas, iniciammente derivadas de teov biogeografia de.ilhas ¢ estendida por contribuigées posteriores a teoria (por exemplo, Veja HARRIS, 1984: SHAFER, 1997). Retirada de HUGGETT (2004, Figura 18.3. p. 362), BIOGEOGRAFIA DE ILHAS - 343 Os exemplos incluem: + uma reserva grande é superior a uma pequena, * uma reserva grande tiniea é methor do que varias reservas pequenas com a mesma area total, + quando dues ou mais reservas sao inevitéveis para alguns habitats ou espécies especificos, a distancia inter-reserva deveria ser a menor possivel, * 08 corredores entre as reservas so recomendados para aumentar a migracao/dispersao inter-reserva, € + uma reserva circular é superior a uma linear, por causa dos problemas potenciais criados pelos efeitos de borda bidticos e abidticos, isto é, a mudanga das condigbes bioldgicas e fisieas que ocorrem quando, por exemplo, uma reserva de floresta est rodeada por uma matriz nfo ‘lorestal (veja DIMOND, 197Sa; WILSON; WILLIS, 1975; DIAMOND; MAIO, 1981). Muitos destes "principios" derivados da TEBI tém sido objeto de intenso debate. Por exemplo, enquanto os corredores entre reservas (aumento de conectividade) certamente podem aumentar a imigragao, facilitar o fluxo génico e reduzir extingdes locais através do efeito de resgate, eles também podem facilitar a disseminagao de doengas, incéndios e espécies exdticas. Assim, as decisées sobre os corredores devem ser espectficas para cada caso (veja WHITTAKER; FERNANDEZ-PALACIOS, 2007)'. Um dos tépicos de conservagio mais acaloradamente discutidos nas décadas de 1970 e 1980 foi o chamado debate SLOSS (Single Large or Several Small), que fez a seguinte pergunta: "Diante da oportunidade de colocar um percentual fixo de terras em uso para conservagiio, é melhor optar por uma itnica reserva grande ou varias pequenas? Em um extremo esta a criagio de uma grande reserva Unica; a alternativa ¢ optar por varias pequenas reservas que tém rea equivalente, mas que estao espalhadas por toda a paisagem. ‘A resposta para a pergunta SLOSS nao € de modo algum simples Fundamentalmente, depende da inclinagdo da curva da area da espécie, a proporg&a de espécies comuns mas pequenas reservas e o gradiente de habilidades de colonizagao entre as espécies no conjunto disponivel de espécies Na verdade, tanto as analises tedricas quanto as evidéncias empiricas sugerem que, em algumas circunstancias, varias reservas pequenas podem conter mais espécies do que uma Unica grande. Isio é devido as vantagens compensatérias, tais como: maior representagdo geral de habitats raros; representagao mais eficaz dos diferentes elementos biogeograficos ao longo de uma regiao; efeitos 1 Enquanto que na biogeografia tradicional corredor & 0 terme dado a uma ligaglo que permite a passagem essencialmente live de uma bio particular (veja Capitulo 7, ¢ veia também LOMOLINO ef ai., 2006), a pesquisa dentro do atual quadro de referéncia dos corredores de habitats ecologicos pode se referir a caracteristicas de conexao muito estreitas, que podem ser aliamente seletivas em termas das espécies que patlem se mover ao longo deles 344 - BIOGEOGRAFIA E PRESERVACAO AMBIENTAL competitive envolvendo a existéncia de diferentes "vencedores" em manchas diferentes; propagag%o menos eficaz de doengas e espécies exéticas; e mais habitat para espécies de borda (por exemplo, SOULE; SIMBERLOFF 1986; ZIMMERMAN; BIERREGAARD 1986; GODEFROID; KOEDAM, 2003). Além disso, 0 debate inicial sobre SLOSS geralmente negligenciou a complexidade da dindmica da diversidade de especies, Fatores como a popu- lagéio minima vidvel (PMV) para espécies raras/ecologicamente importantes, a 4rea minima necesséria para sustentar uma PMV e a area minima dinamica para manter a integridade do ecossistema também devem ser considerados em questbes relacionadas com:a conservagdo da natureza (SOULE; SIMBERLOFF, 1986; SHAFER, 1990; WU; VANKAT, 1995). E agora geralmente aceito que a relacdo entre espécie ¢ area ¢ a teoria do equilibrio da biogeografia de ilhas — em parte, uma tentativa de explicar as variagdes sistematicas na forma da relagao entre espécie e Area - so incapazes de fornecer solugio final para a questdo SLOSS. Existem varias explicagdes amplas para a dificuldade de extrair generalizag6es a partir do estudo de iJhas de habitat e talvez a mais importante Seja que as respostas para perguntas como SLOSS s&o propensas a apresentar dependéncia de escala. Por exemplo, os mamiferos de grande porte, com suas grandes amplitudes de habitat ou territérios ¢ sua vulnerabilidade a caga humana, devem exigir reservas muito maiores do que so necessérias para apreender populagdes vidveis de borboletas. Os primeiros séo também propensos a ter requisitos de habitat menos especificos do que os ultimos, de modo que os sistemas de reserva destinados para um tendem a ser de qualidade inferior para o outro. Outro aspecto da escala € a variedade de tamanhos e distancias inter- -reserva, Imagine que vocé estava distribuindo reservas ao longo do Condado de Lincoln oriental (uma parte de baixa altitude ¢ bastante plana do Reino Unido). A gama de tamanhos de reserva e as distincias envolvidds nestas paisagens geralmente agricolas seriam pequenas, ¢ no se esperaria encontrar conjuntes de espécies diferentes. Imagine, em contrapartida, que estava distribuindo as reservas ao longo de um gradiente biogeogrifico em grande escala, como a zona de transig¢&o mexicana, ou seja, a zona de transigdo entre as regides nedrtica ¢ neotropical. Aqui podemos estar contemplando reservas bem maiores © distincias potencialmente muito grandes entre elas, ¢ diferentes reservas podem conter proporgées contrastantes de espécies, em ultima andlise, derivedas de diferentes regides/provincias biogeograficas. A falsificagéo do pressuposto de um conjunto tinico de espécies que ¢ inerente a TEBI prejudica a aplicagao desta teoria para resolver SLOSS em tal escala, Em vez disso, podemos recorrer as andlises diretas de dados de distribuigo de espécies discutidas nos dois capitulos anteriores para o BIOGEOGRAFIA DE ILHAS - 345 planejamento da rede de reserva em tal contexto, Assim, embora alguns autores tenham tentado aplicar a analogia de ilha nessas escalas muito gros- seiras (por exemplo, BROOKS ef al, 1997, 2002), como demonsiramos a seguir, @ biogeografia de ilhas ¢ essencialmente uma estrutura para aplicacao local em escalas de paisagem (WHITTAKER, FERNANDEZ-PALACIOS, 2007). Q debate SLOSS ilustra que, embora TEBI fornega um modelo conceitual basico para a compreenséo da fragmentag&o do habitat, além de uma série de generalizagdes que sdo em grande parte ecoldgicas de “bom-senso” de qualquer maneira (por exemplo, muitos grandes refiigios mantém espé- cies importantes que os pequenos nao o fazem, refigios ecologicamente heterogénecs tendem a manter mais do que os homogéneos, a conectividade do habitat muitas vezes pode ser benéfica em termos de riqueza de espécies), gerar orientagao politica relevante de uma teoria macroecoldgica abrangente nao ¢ simples. Neste capitulo, vamos rever alguns dos temas mais interessantes den- tro da biogeografia de ilhas, comegando com a questo geral mais basica: realista esperar que ilhas de habitat comportem-se de acordo com os mesmos principios que as ilhas reais? Para responder a esta pergunta, vamos rever criticamente a aplicagao de ideias derivadas de biogeografia ecolégica de ilhas para os problemas de conservacao e sugerir uma série de diregSes futuras em que a teoria de ilhas pode potencialmente orientar quest3es de conservacao aplicada. 8.2 - IMPLICACOES DA PERDA DE HABITAT E FRAGMENTACAO: DA TEORIA A PROVA Uma tcoria ¢ mais impressionante quanto maior for a simplicidade de suas premissas, quento maior for 0 ntimero de coisas diferentes relacionadas com ela € mais extensa for a sua area de aplicagao. (Albert EINSTEIN, 1949, a partir de SCHLIPP, 1973, p. 33) 8.2.1 - Autilizago de relagdes entre area e espécie na conservacao Uma regra basica empirica derivada da teoria de ilhas ¢ que, se um habitat ¢ reduzido em 90 por cento, entdo, espera-se que cerca de $0 por cento das espécies sejam extintas. Nesse e no capitulo seguinte, vamos explorar essa 246 - BIOGEOGRAFIA E PRESERVACAO AMBIENTAL regra empirica ¢ considerar até que ponto se pode confiar em tais generalizagoes simples. A telagio espscie-area (SAR do inglés = Species - érea relationship) nao & simplesmente um dos padres mais gerais de ecologia, mas também foi um dos primeiros a ser descoberto, Ele também tem uma profunda importincia para biogeografia da conservacao. Desetigdes da SAR sao conhecidas jé a partir de 1778 (Johann Reinhold Forster) ¢ 1820 (Augustin de Candolle) (veja LOMO- LINO, 2001, para mais detalhes). O primeiro trabalho conhecido relacionando espécies com area foi feita por Hewett Cottrell Watson em 1859 (veja ROSENZWEIG, 1995), 0 mesmo.ano em que Darwin publicou sua obra magna A Origen das Espécies, Watson apresentou a relagéio entre espécies de plantas area, comecando com o municipio mais rico, Surrey. e depois construiu para toda a itha (veja Figura 8.3), De acordo com Rosenzweig (1995, p..9), "6 0 mais antigo exemplo empitico conhecido do mundo de um padrio ecoldgico”. 33 f a Geaseasnee 2 31 een i i : $29 i reverse 7 £279 ° © ream sorode Swear 25 “ 2 6 Lee area Figura 8.3 - Primeira curva de area de espécies conhecidas, com base no numero de espécies Ge plantas da Inglaterra (WATSON, 1859), Retirada de Rosenzweig (1995, p. 9) Em 1920, dois botanicos, Olof Arthenius (1921) e Henry Allan Gleason (1922) expressaram essa relagHo em termos matemdticos. Arrhenius introduziu a relagao como um modelo de poténcia: S=c.d? engtianto Gleason (1922) sugeriu um modelo semilogaritmico. S 2k + log (4) em que S € 0 numero de espécies, A é a Area (ilha), @ ¢, 2, ke d sto constantes. A quantificagao foi um avanco critico, aguardado com antecedéncia, BIOGEOGRAFIA DE JLHAS - 347 principalmente porque permitiu investigagdes cientificamente rigorosas de curvas de area de espécies, permitindo assim que os biogedgrafos e ecologistas usassem métodos comparativos para pesquisar e avaliar explicagdes causais. Em litima andlise, esta descoberta permitiu que biogedgrafos de conservacgo moderns aplicassem modelos de espécie-area para fazer previsdes ¢ de- senvolver estratégias para a conservagio da diversidade biolégica (veja LOMO- LINO, 2001). Hoje, mais de 20 modelos matematicos foram propostos para a descri¢go da SAR, com o modelo poderoso de Arrhenius sendo ainda o mais comumente aplicado ¢ frequentemente 0 mais cficaz (veja CONNOR; MCCOY, 1979; TIJORVE de 2009; ¢ veja WILLIAMS ef a/., 2009, para uma abordagem abran- gente de todos os modelos disponiveis e seu uso apropriado). O prdximo avanco fundamental foi feito pelo engenheiro e naturalista Frank Preston, que propos uma explicagao mecanicista para o padrao espécie- ~4tea ¢ para os valores que a inclinagdo da relago deve tomar em um espaco logaritmico. Seu ponto de partida foi uma consideracao tedrica da distribuigao de abundancia das espécies, que segundo ele, normalmente,: seguia uma distribuigdo log-normal (PRESTON, 1948, 1962). A teoria afirma que as espécies mais numerosas sto as de abundancia média, enquanto que as espécies com muito poucos individuos so tao raras quanto espécies com um grande niimero de individuos, originando uma curva de log-normal. Preston mostrou que uma série log-normal de abundancia deve dar origem a uma SAR com uma inclinacdo (2) com o valor de cerca de 0,263 - no sentido da extremidade inferior do intervalo de valores contecidos naquele momento de ilhas € acima das manchas continentais (para detalhes veja ROSENZWEIG, 1995, p. 268-276). Estas diferengas apontaram para um papel de isotamento via migragiio da populagao. Preston também foi um dos primeiros a perceber que a inclinagio da relac&o espécie-area (z) muda com a escala geogréfica. Ele publicou uma figura tastreando o aumento da diversidade de aves de um lote de casa para um do mundo inteiro, mostrando como as relagdes mudam de forma de escalas finas para escalas espaciais grosseiras (Figura 8.4; PRESTON, 1960). Esta ideia foi posteriormente elaborada por Rosenzweig (1995, 2001. 2004), que sugeriu que padriio espécie-area” ¢ na verdade composto de trés relacionamentos diferentes entre espécies e area, em que os processos operam em diferentes escalas espaciais e temporais (SCHMIDA; WILSON, 1985; CRAWLEY; HARRAL, 2001) fevando a diferentes valores de z (Figura B8.1a, Tabela 8.1). Em escalas locais, dentro e entre habitats em regides (“reas de amostra”), 0 acumulo de espécies é uma fungao de distribuigdes de abundancia relativa e diversidade beta (englobando aspectos de heterogeneidade de habitats e rotatividade de espécies entre locais), Os valores de 2 normalmente 348 - BIOGEOGRAFIA E PRESERVACAO AMBIENTAL observados para areas de amostra situam-se entre 0,1 € 0,2. Ao longo de ilhas ou habitats diferentes dentro de uma regiao (a “categoria arquipélago”), a riqueza de espécies por ilha/habitat 6 afetada pelo aumento da limitagao de dispersao. quer devido as distancias espaciais entre as manchas de habitat semelhantes (por exemplo, ilhas de um arquipélago) ou a diferengas ecol6gicas entre habitats (por exemplo, onde as distribuigdes de frequéncia de espécies diferem muito entre habitats na regio). Os valores de z normalmente observados para areas intraprovinciais/arquipélago situam-se entre 0,25 e 0,55. Nas maiores escalas, 0 actimulo de espécies com area crescente é devido & adig&o de espécies de provincias bidticas separadas (a “relacdo espécie-Area interprovincial”). Os valores de z normalmente observados para Areas interprovinciais tam uma margem inferior de z de 0,6 e alcance crescente, com a maioria se situanda em torno de 0,9-1,0 ou valores ainda mais altos (Tabela 8.1; ROSENZWEIG, 1995, 2001, 2004; Figura B8.1a). 4 ming 3 | 42 pen TTS z 1 0 ° 2 4 é a 10 12 Lor de hes vs) Figura 6.4 - Curva espéce-érea paia 2s aves com inicio no nordeste dos EUA. em trés escalas espaciais diferentes. Mocificag&o segundo Presion (1980) e Rosenzweig (1995). O trabalho de Rosenzweig (1995, veja também 2001, 2004) ofereceu uma percepedo dinamica mais sutil da SAR e do significado biolégico de suas inclinagdes, Fundamentalmente, o z nao € apenas uma indicacae do isolamento do sistema em estugo - uma percepcdo que dominou o campo da biogeografia de ilhas ha mais de 40 anos (PRESTON, 1962; MACARTHUR; WILSON, 1967), mas reflete o estabelecimento de processos dominantes nos padrdes de rigueza de especies. Como Rosenzweig (1995, p, 278) sucintamente afirma: "a inclinagao da curva espécie-area reflete a escala de tempo que a determina’, Estas escalas de tempo variam de horas/dias para as curvas de areas de amostra BIOGEOGRAFIA DE ILHAS - 349 pequena, a milénios de tempo evolutive para as curvas entre diferentes pro- Vincias biéticas (Quadro 8. 1) Tabela 8.1 - Trés escalas biologicas de curvas espécie-érea, 0 processo dominante de adigéo de espécies em cada escala € a respeciiva faixe de valores de inclinagdo (2) conforme proposto por Rosenzweig (por exemplo, 2004). Para uma discuss&o mais aprofundada, veja Quadro 6.1 Escala de SAR (doingiés: __-Procasso(s) dominante(s) de _intervalo de valores de 2 species atea relationship) __adigo de especies _ intraprovincial Heterogeneidade'de habitat, 0, 1-0,2 ~ abundancia de espécies Disporedo Especiaga Quadro 8.1 - Escala 0 a relagao espécie-area (SAR) Quadro preparado por R.J. Whittaker @ K.A. Triantis - extraido e ligeiramente modificado de Triantis, Mylonas e Whittaker (2008). Escalas ¢ tipos de SAR As ralagbes ospécies-drea (SAR) - 0 aumento do niimaro de espécies com 0 aumento da area € um dos padrBes gerais mais bem documentados em biogeografia e ecologia; ainda persiste a controvérsia sobre @ melhor forma de descrever o relacionamento e sobre a forma precisa de diferentes tipos e/ou escalas de SAR SAR s&0 geraimente descritas utilizando fungfes de poténcis em que o expoante (isto é, a Inclinago da relacao 1og-areailog-riqueza) 6 comumente referido como 0 parametro z. © pardmatro z tem uma interpretagSo matemétice simples: ¢ a taxa & qual as espécies se acumulam com o aumento da area, No entanlo, no hd consenso sobre a inter- prelagao bioidgica e dependéncia de escala (por exemplo, em que as escalas espaciais de processos evolutivos e ecolégicos particulares predominam) da SAR, Come discutido no texto, Rosenzweig (1996, 2003, 2004), argutentou que o "padrao espécie-area" 6 composto de trés relagdes espécies-area diferentes (ou quatro, se a escala de ponto é incluida, o que depende do esforgo de amostragem), segundo as quais os processos que operam em diferentes escalas espaciais e temporais levam a diferentes valores de z (Figura 88.1 a). Na pratica, © esquema de Rosenzweig engloba cenjuntos de dados de duas estruturas diferentes. A primeira forma emprega uma estrutura de amostragem aninhada @ resuita em curvas de acumulagao, de espécies (SAC do inglés: species accumulation curves) em duas escalas: a escala de ponto (ou seja, locel) ¢ a escala intraprovincial (ou seja, regional). A segunda forma ¢ onde a varidvel independante é 2 4rea (em diferentes graus) de massas de terra geogiaticamente disiintas e isoladas, € a varidvel dependente ¢ 0 mimero de espécies nativas encontradas dentro de cada area. Novamente, existem duas escalas em seu esquema: 4 de arquipéiago (ou seja, um conjunto de ilhas agrupadas geograticamente) e a interprovincial (ou seja, entre as regSes). 350 - BIOGEOGRAFIA E PRESERVACAO ANBIENTAL Whittaker @ Fernéndez-Palacios (2007, Quadro 4.8, p. $4) denominaram essas felades arquipeligicas e interprovinciais de relagSes espécie-drea de ‘lhas (ISAR do inglés: island species-area relationships) "verdadeiras’ para cistingui-las das SAC fenomenologicamente cistintas decorrentes dos planes de emostragem aninneda, & nesses valores de z das verdadeirss ISAR que agora focamios Para ilhas reais, MacArthur © Wilson (1967) relataram vaiores de z para ISAR arquipelagicas normaimente caindo dentro de uma gama compreendida entre 0,2 € 0,35, enquanto Williamson (1988) relatou uma gama muito mais ampla de 2, dé 0,05-1, 132. Em sua revisdo, Rosenzweig (2004) apdia essencialmente MacArthur € Wilson, informando que os valores geralmente ficam entre 0,25 © 0,45. Por outro lado, valores de z normalmente observados pata ISAR interprovinciais tém uma margem inferior de 2 = 0,6 @ faixa ascendente, com a maioria ficando em torn de 0,8-1,0 (ROSENZWEIG, 2004) e alguns excedendo @ 1,0 (ROSENZWEIG, 1995, 2004). Essas observacées tém um significado muito importante para a ciéncia da conservacdo, conforme os seres humanos continuam a alterar a extensdo e conectividade de habitats tanto local como globalmente. Assim, é importante tes- tar a robustez © explorar as propriedades do modelo padréo espécie-area de Rosenzweig keoprovnoa SAR Log mepécies Figura B8.1a - Trés escalas biologicas de curvas espécies-area, como propesto por Rosenzweig (por exemplo, 2004), (a) O padrao de espécies-area de Rosenzweig inciui quatro escales, mas a escata de Ponto n€o esté iustada no grafico. As escalas de ponto e intraprovincial compreendem as curvas de acumulagao de espécies a partir de um sistema de amostragem aninheda, ao passo que as escaias interprovincials © arquipelagicas (aqui denominados ISAR, para relages espécie-érea em ilhas) sho parcelas do niimero de espécies encontradas em unidades discretas de espaco. (b) A ISAR interprovincial e a relagao de drea SIE (Single.island endemics = endemias de ilhas individuais) apresentam valores de z (inclivagio) semelhantes, de acordo com os resultados aqui relatados, Apesar das diferenges na escala espacial e no numero de espécies envoividas, os dois sistemas apresentam tendéncias andlogas com um aumento no numero de especies com a Area, ja que em ambos a especiagdo 6 Principal procasso de adic&o do osnécies. BIOGEOGRAFIA DEILHAS - 351 Um teste da forma de ISAR interprovinciais de ithas fortemente isoladas ‘As ISAR arquigelagicas 1ém sido estudadas em ilhes © habitats reais para. diversos txons em numerosos estudos ao longo de varias écadas, e suas propriedades so, portanto, razoavelmente bem conhecidas. Em contaste, as generalizagbes sobre as. formas de ISAR interprovinciais derivam de relativamente poucos conjuntos de dados. Provincias oidticas (regioes) podem ser definidas como areas autonomas que, para o téxon alvo, so relativamente independentes do ponto de vista evolutivo (ou seja, onde a maiora das espécies & endémica para estas provincias) Nesta analise, vamos nos concentrar na forma ou ISAR de endemias em ilha unica (SIE = single-isiand endemics), explorando a ideia de que para essas espécies restrtas a iihas individuals, 2s iihas em questao podem ser corsideradas como provincias. Usendo essa abordagem, e centrando-se sobre estes sstemas, podemos estudar a contribuigao evolutiva para ISAR @ obter insights importantes sobre os padrées que surgem quando a especiacdo é uma fonte significativa cu a principal fonte de civersidade, como acontece no caso das provincias/regies bidticas continental Nosso primairo objetivo 6, portanto, explorar a consisténcia di forme de relagdes de area SIE nos téxons € arauipélages de diferentes proporcdes de SIE. Nosso segundo objetivo ¢ utilizar os dados de SIE para testar a rebustez da generalizagao de que as ISAR interprovinciais $80 significativemente mais. acentuadas do que as ISAR arquipelagicas, produzindo’ velores de z geralmente entre 0,8-1,0, e 0,25-0,45, respectivamente, Fazemes isso comparando valores de z para SIE com os de todas as espécies nativas para-os mesmos téxons, utlizando 43 conjuntos de dados diferentes do Caribe, Fiji, Haval, lihas Canérias e Grandes Lagos africanos, e usando co modelo de poténcia (log-fog). Para mais informagées sobre as propriedades do conjunto de dacos e métodos de anélise, consukar 0 documento de origem. As principals conclusOes das andlises foram as seguintes: Onze das ‘elagées de area-SIE foram estatisticamente significatives, explicando elevadas proporgSes da varidncia em nimeros SIE (R’ 0,57-0.95), as cuas excegdes: so para as lihas Canarias, nas quais a inclusdo das duas ilhas mais antigas reduz 0 aluste dos modelos tradicionais espéce-drea (veja WHITTAKER et al, 2008). Os. valores de. 7 das relagées estatisticamente significativas de SIE-Srea variaram de 0.47-1,13, com um valor médio de 0,80 (DP 0,24}, Todos os sistemas de ilnas em que SIE representam > 50 por cento de espécies exibiram valores de z mals elevados para as SAR de espécies nativas do que os considerados tipicos de SAR arquivelagicas. Além cisso, para os trés casos em que a percentagem de SIE é igual ou superior 2 90 por cento, o valor médio de z € a-unidade (1,00 + 0,21). Os resultados, deste modo, aproximam-se do esquema mostiado na Figura B8.1b. Portanto, os resultados do presente trabalho fornecem um suporte significative para a proposigao de Rosenzweig de que os velores de z de ISAR interprovinciais devem ser muito elevados, apraximando-se da unidade. 1sso deve ocorrer nao s6 na escala de fegives biogeograficas mundiais reconhecidas, mas também em todo o sistema em que 2 especiacao € 0 processo principal, Naturalmente, escalas temporais em que as espécles evoluem e se extinguem podem diferir entre sistemas insulares e provincias biogeograficas giobais. No entanto, parece que os dois tipos de sistema exibem padrdes andlogos de acumulacae de espécies com a érea, Portanto, os estudos de dinémica evolutiva em relagio @ area, empreganéo dados: pata endamias de iha tinica, seram bem valiosos para pesquisar em outros téxons & regides, uma vez que poderiam ser usacos como sistemas modelo para testar: 352 - BIOGEOGRAFIA E PRESERVACAO AMBIENTAL 1 variagdo de tamanhos criticos de ilha, abaixo dos quais a civersificagdo dentro de ilha no ocorre, 2 como estes limites variam de acordo com taxons e grupos de jthas. 3 quao cons'stentes as formas de ISAR interprovinciais 340. 4 sua capacidade para prever a diversidade futura, & @ eles também podem ser utllizados para reconhecer @ analiser a influéncia de fatores adicionais, tais como clima, produtividace, etc. Esses estudos podem oferecer grendes insights sobre questOes désicas da bio- geografia da conservacao, tais como 0 impacto potencial da ragmentagso, perda e homogeneizacéo do habitet sobre a diversidade bioldgica Estas abordagens macroecoldgicas para os dados de ilha, gerados pelo estimulo da teoria de MacArthur-Wilson, promoveram a ampla utilizagao de curvas espécie-drea para fins de conservacdo. Estes incluem a previsto de risco de extingdo de espécies global, regional e localmente (MCDONALD; BROWN, 1992; TILMAN et al., 1994; PIMM; ASKINS, 1995; Brooks; BALMFORD, 1996) como fungéo de perda e fragmentacéo do habitat, elaborago de princfpios gerais de concepgao de reserva (DIAMOND, 1975a; WILSON: WILLIS, 1975), ¢ identificagao de alvos de conservagio para tipos de habitats especificos (DESMET; COWLING, 2004), Entre os usos mais polémicos da relaglio espécie-drea baseados implicitamente na TEBI, estd sua aplicagdo na previso de futuras extingdes de espécies em fungao da perda de habitat devido a fatores como o desmatamento (por exemplo, BROOKS e¢ al., 1997, 2002) ou nas futuras mudangas climéticas (por exemplo, THOMAS et al., 2004 veja Quadro 7.3), Extingdes projetadas com base em modelos de espécie-drea envolvern varias incertezas (HEYWOOD er al., 1994; WHITTAKER; FERNANDEZ- PALACIOS, 2007) ¢ nunca podem substituir completamente as avaliacdes de nivel de espécie para a identificagao de ameaga de extingao (por exemplo, KOTIAHO et ai., 2005). No entanto, para muitas espécies de importancia para a conservag’o, a coleta de informagées adequadamente detalhadas é uma meta irreal. E vital, portanto, que os biogedgrafos de conservagao desenvolvam medidas indiretas ¢ projegdes tedricas de extingdo mais realistas, com base em um conjunto de suposigdes 0 mais pragmaticas possivel (MAY ef all, 1995; LAURANCE, 2007). As grandes variagdes nos resultados podem ser vistas a partir de esforgos para estimar provaveis extingdes decorrentes do desmatamento tropical. Os resultados das taxas atuais e futuras de desmatamento tém variado radicalmente, desde perdas alarmantes (por exemplo, EHRLICH; WILSON, 1991) até mais modestas (mas ainda significativas) (WRIGHT; MULLER-LANDAU, 2006), afetando fortemente as projegdes de perdas futuras de espécies BIOGEOGRAFIA DE ILNAS - 353 Recentemente, Wright e Muiler-Landau (2006) observaram que as estimnativas de taxas liquidas de desmatamento tropical durante a década de 1990 diferem em 250 por cento (veja sua Tabela 2). Usando uma série de critérios, eles consideraram 45 paises tropi midos que suportam 89,6 par cento de todas as florestas tropicais fechadas existentes e 89,9 por cento de toda cobertura potencial de floresta tropical. Eles concluiram que a taxa de desmatamento vai diminuir 4 medida que o crescimento da populacao dirninui, ¢ que uma area muito maior do que estudos anteriores sugerem, continuard a ser floresta, Tais incertezas, juntamente com as diferengas decorrentes da escolha de suposigdes sobre a persisténcia das espécies em habitats degradados, desde previsdes de alta sensibilidade até incerteza ou erros nas inclinagdes espécie- ~rea ¢ desde grandes incertezas sobre ambos os totais de espécies globais e a distribuiggo geografica da biodiversidade, significa que todas as previsdes atualmente disponiveis de perdas futuras possuem inerentemente grande incerteza (veja Tabela 8.2, € Capitulo 7 © LAURANCE, 2007, 2008, WILLIS; BHAGWAT, 2009, para discussdo geral). Embora & mais recente das estimativas apresentadas na Tabela 8.2 tenha sido feita cm 1992, consideramos que a informacao seja util para apontar os problemas de prever as extingdes globais que podem surgir através de diferentes suposigées sobre uma série de questdes criticas, Em suma, a taxa de extingto estimada com base em projecdes espécie- ~frea envolve muitas incertezas (HEYWOOD ef al, 1994), A forma precisa da relapao que descreve a perda de espécies de um habitat original, como uma fungdo da area de habitat remanescente, é ainda uma questio em aberto, Ha duas questWes principais associadas. Em primeiro lugar, muitas espécies no estto restritas ao seu habitat "nativo” © podem persistir em certos habitats antrépicos. Em segundo lugar, a inclinagdo da relagao area-espécie utilizada para a perda de rea total de um habitat ¢ ainda incerta, no ha uma justificativa tedrica ou empirica convincente para a utilizagéio de um valor de inclinagéo "global" de z= 0,25 (ou qualquer outro valor unico). Whittaker ¢ Fernandez-Palacios (2007) tém criticado 0 uso de SAR como um meio de previsio de espécies ameagadas de ou comprometidas com a ex- ting@o, observando “a mancira como os modelos de espécie-drea sao utilizados & conceitualmente dissociada da teoria de ilhas da qual aparentemente deriva” Bles argumentam primeiro que um z de 0,25 € um valor subjetivo "medio" para se escolher (vaja discussto acima sobre 05 valores de z das diferentes categorias de SAR). Segundo, e mais importante, esse valor de z foi derivado de andlises de isolados verdadeiros. Isso descreve aproximadamente quantas espécies sto mantidas em cada um de uma série de isolados/ilhas de tamanhos diferenites, No entanto, em varios esiudos recentes, o valor de z & aplicado no em fragmentos separados, mas a uma regitio inteira (por exemplo, BROOKS; BALMFORD, 1996, © veja também a Quadro 10.2, p.272-273 em WHITTAKER; FER- NANDEZ-PALACIOS, 2007). 354 - BIOGEOGRAFIA E PRESERVACAO AMBIENTAL Tabela 8.2 - Algumas estimativas globais de verde de espécies, devido zo desrmatamento tropical os principais pressuposios (adaptado ce KRISHNAMURTHY 2003; veja no artigo, para raferéncias) “Fonte Estimativade Total de Perda de Extingaolperda oxtingao espécios floresta de area tropicals tropical (milhes) Ipor cento Tespéceihora —5-10/40-70% 248.000 50% das Myers em 2000 kmi/ano especies (1979) extintas quando resta 10% da area 33-50% de todas 3-10/25% 50% de curva de Lovejoy as espécies desmatamento _espécie-Area (1980) enve 1970 em 2000 odncava 2000 1 milhdo de 410% 33% de floresta 50% das Myers espécies em remanescente especies na grea (1986) 2000 destruida serdo extintas 10% de todas 2s 4-5/50% 2% de 50% das Raven espécies em desmatamento) espécies na rea (1988) 2000; 25% em ano serdo extintas 2015 17.500 10/50% 0,7% de 50% das, Wilson espéciesiano desmatamentc/ especies na area * (1988) ano serdo extintas BB%detodas 3-10/25% 12.3% de curva de Lugo a8 espécies em desmatarento espécia-area (1988, b) 2000 entie 1980e cdncava 2000 5-38% de todas 10/>50% 0,8-1,6% de Espécie-drea,z Reid as espécies desmatamento = 0,15. 0,35 Miler, entre 1990 lano 1989) 2000 27.000 106m 18% do Espécie-area,z Wilson espéciesiano —_florestas desmatamanto = 015 (1992) tropicais Jano umidas Tal como ira ser discutido na sega sobre aninhamento abaixo, dependendo do grau de espécies compartithadas entre diferentes ithas de habitat, € possivel que proporgdes relativamente baixas ou muito altas das espécies originais encontradas em uma regiao sejam representadas em series de ithas de BIOGEOGRAFIA OE ILHAS - 355 habitat, Poranto, tratar o que so realmente arquipélagos de is de habitat, como se fossem uma dnica ilha em anilises de ameaca de extingao, € uma simplificagao potencialmente crucial ~ que ¢ uma das raz6es pela quais nao podemos coniat com a generalizacdo “90 por cento de perda de Area = 50 por cento de perda de espécies” “com a qual comecamos esta segao” Como mais uma nota de cautela, é importante ressaltar que, embora a relag&o espécie-rea seja de fato um padrio muito geral, a Area raramente explica toda variagdo interpretavel na ricueza de espécies, com alguma variagao residual atribuivel nao sé ao isolamento do sistema, mas a outras variaveis, tais como a diversidade de habitat, elevaco de alcance, regime de perturbaciio, ete (WHITTAKER; FERNANDEZ-PALACIOS, 2007; TRIANTIS et a/, 2008), Segue-se que a SAR so pode fornecer uma aproximagéo grosseira para uso no planejamento de conservagao. Assim, como foi observado por Whittaker ef al (2005), a aplicagao da relacdo espécie-drea para orientar a cigncia da con- servagao é uma area dentro da biogeografia de conservagio, onde a teoria parece exigir mais trabalho. 8.2.2 - Relaxamento e o débito de extingao has recém-emergidas apresentam novo habitat ¢ ao longo do tem- po acumulam espécies através da imigragéo. Em contraste, considera-se geralmente que as ilhas de habitat eriadas através do isolamento pelo aumen- to dos niveis de agua ou pela destruigo do habitat (por exemplo, o des- matamento), apoiem um conjunto completo de espécies locais em sua for- mado. Isto é, espera-se que elas contenham ambas as populacdes de ori- gem (com o crescimento positive da populagao no interior da prépria drea) € diminuiggo ou populagdes casuais que estavam presentes no momento do isolamento, mas que ndo apresentam crescimento positive da populagdo no interior da prdpria area. Apés isolamento, estas ilhas estdo entto "su- persaturadas" em um trecho de sua nova area reduzida e com maior isola- mento, Com © tempo, estas ithas perdem espécies, um fenémene chamado relaxamento de espécies (DIAMOND, 1972; WILCOX, 1980). A imizragao (a uma taxa menor do que antes) e a exting%io (a uma taxa maior do que antes do isolamento) devem continuar durante o periodo de relaxamento e, posteriormente, voltam ao equilibria: a esta altura, a ilha encontrou o seu nivel novo, mais baixo de equilibrio de riqueza (Figura 8.1). O tempo necessario para que 0 relaxemento ocorta & referida como o “tempo de atraso” € a eventual perda de espécies antecipada é denominada “débito de extingao” (veja EWERS; DIDHAM, 2006). J56 - BIOGEOGRAFIA E PRESERVAGAO AMBIENTAL Dois exemplos clissicos de relaxamento so apresentados na Figura 8 O primeiro exemplo assume a forma de um conjunio de dados dos mamiferos que vivem em florestas de montanhas altas isoladas do sudoeste dos EUA (BROWN, 1971). A mudanga radical no clima apos o fim do ultimo periodo glacial resultou nestas populagdes de mamifferos que se tomaram isoladas umas das outras pelo aumento da aridez dos vales em torno delas. O segundo exemplo é de mamiferos das ilhas Sunda da Indonésia (WILCOX, 1980). Essas ilhas, interligadas durante o ultimo perfodo glacial, foram isoladas pelo oceano conforme as geleiras derreteram e elevaram 0 nivel do mar. Assim, ambos estes sistemas tornaram-se isolados em torno do inicio do Holoceno (c. 10 ka) ¢, desde ent&o, supdem-se que progressivamente perderam especies. Biogedgrafos e ambientalistas tém se interessado em trés questdes gerais relacionadas ao relaxamento de espScies, Em primeiro lugar, como é que 0 relaxamento procede? Em outras palavras, qual a forma da curva de perda de espécies a0 longo do tempo? Em segundo lugar, quanto tempo é necessArio entre a fragmentag&io e a extinglo (tempo de atrasa)? Em terceiro lugar, e de forma critica, quantas espécies terao saido apds o relaxamento estar completo? Por outro lado, quantas e quais espécies acabarao por se extinguir? Supdem-se que o relaxamento apés a perda e a fragmentagfio de habitat normalmente avanga em uma sequéncia de etapas (seguhdo WILCOVE, 1987): * Estagio 1. Exctusdo inicial. Algumas espécies serao perdidas da paisagem, simplesmente porgue seus alcances originais nao incluem nenhuma das manchas remanescentes. + Fase 2. Exterminio devido a falta de recursos essenciais. Espécies variam muito em seus requisitos de recursos e muitas necessitam de areas muito grandes e/ou recursos muito raros. Assim, a probabilidzde de que todos os requisitos de recursos de uma espécie possam ser satisfeitos diminui & medida que diminui a 4rea remanescente. + Fase 3. Perigos associados com populagdes pequenas, Pequenas populagdes siio muito mais suscetiveis a uma série de problemas, demogréficos, genéticos e estocisticos. A medida que a area total das manchas remanescen- tes diminui e a capacidade de sustentar grandes populagdes decresce, estes problemas tornam-se cada vez mais graves (por exemplo, FRANKHAM e7 al, 2002). + Fase 4, Efeitos deletérios do isolamento. Algumas populagées podem ser resgatadas da exting&o pela migrapao ¢ recrutamento de individuos de outras populagées, A probabilidade de (ais efeitos de resgate diminui a medida que aumenta o isolamento. + Estagio 5. Desequilibrio ecoldgico, A maioria das espécies € fortemente influenciada pelas interagdes com outras espécies, A perda de uma espécie durante qualquer uma das fases de relaxamento acima mencionadas BIOGEOGRAFIA DE ILHAS - 357 pode resultar na perda subsequente dos seus predacores, parasitas, mutualistas ou comensais (por exemplo, KOH et ai, 2004), Alsm disso, a perturbagio do habitat ¢ redugdes na diversidade da comunidade durante os estagios iniciais de relaxamento podem facilitar 0 estabelecimento de espécies introduzidas, provocando uma cascata de exterminios subsequentes. Tem sido argumentado que pode levar varias geragdes para que os processos que causam relaxamento ocorram ands a destruigaa ¢ fragmentacao do habitat, 0 que significa que hé um tempo de defasagem considerdvel entre o estimulo inicial e final do processo de perdas de espécies (TILMAN ef al., 1994; EWERS; DIDHAM, 2006; VELLEND e al, 2006). Isso cria uma “divide de extingo" — um futuro custo ecoldgico da desiruigao do habitat que pode nao ser inicialmente aparente em estudos feitos logo apés a ocorréncia de fragmentacdo de habitat. De fato, ha a hipdtese de que, mesmo ha milhares de anos apds o isolamento, as assembleias de mamfferos de Brown (1971) estelam em processo de relaxamento de suas ilhas de habitats no topo de montanhas relativamente grandes (Figura 8.5; veja uma discussdo mais aprofundada im LOMOLINO er al., 2006). = 03 02 Ot Log as ten en Figura 8.5 - Diversidade de mamiferos nas ithas de Sunda (circulos) eno cumes das montanhas no sudoeste dos EUA (losangos). Estes 'solados comecaram a se formar por volta de 10,000 anos atrds, no final do Pleistocene. Em ambos os erquipélagos, as ilhas Maiores. sofreram proporcionaimente menos extingdes. As estimativas acima séo baseadas em dois pressupostos gerais, Em primeiro lugar, presumo-se que as taxas de extingdo sao comparaveis. Rosenzweig (1995) considera que, a medida que o mesmo grupo texondmico ¢ estudado, ¢ dado que os dois sistemas foram formados cevido a0 mesmo evento (a mudanca da interglacial atual) €, portanto, comegaram a perder espécies aproximadamente ao mesmo tempo, podemos supor uma taxa semelhante de extingdes. Em segundo lugar, considera-se que © numero original de espécies para cade ilha pode ser estimada a partir de uma drea do continente {continente Malasio para Iihas de Sonda e Sierra Nevada para os cumes de montanhas dos EUA) do mesmo tamanho da ilha. Redesenhado sagundo Rosenzweig (1995, sua Figura 6.5). j | SEES et Nio se sabe se esses tempos de resposia prolongada so tipicos, mas parece bastante provavel que os verdadeiros eustos ecoldgicos da historicamente recente onda de perturbagao, destruicao e fragmentagao antrépica de habitat, em todo © mundo ainda esto para ser realizados (veja, por exemplo. a Figura 8.6) Deve-se também salientar que, embora a maioria das extingdes de espécies registradas desde 1600 d.C. tenia ocorrido em ilhas ocednicas, as previsdes de aumento do ntimero de extingdes futuras sugerem ume mudanga significativa para as areas continentais (A valiagao Ecossistémica do Milénio, 2005). Emingdes por mii espéctes por miénio 109,000 10,000: Tex de extngo future projlnd dex vezes ma a 1,000. Z que 2 taxa etual Texa de extngio ald até ri vezes Texa do exingdo om 9 ¢@ wngo Fraz0 Espace Mamileron Mamiteron Ayes Anthos Tadas 98 ‘racine epics Figura 6.6 - Extinces passadas e fuluras. "Passado distante’ refere-se a taxas de extingdo médias calculadas a partir do regisiro féssil, "Passado recente” relere-se a laxas de extinggo calculades @ partir de extingdes de espécies conhecdas (esimativa mais daixa), durante os ultimos 100 anos ou extingSes de espécies conhecicas muito provavelmente extintes’ (limite superior). Extingdes “futuras’ s20 estimativas derivadas de modelos usando uma varedade de técnicas ¢, em geral, referem-se a futuras perdas de espécies resultantes de rrudancas de habilat. As técnicas envclvidas para modelagem de extingdes futuras s4o: modelo de espécie-area; taxas em que as espécies sho mudadas para categorias crescantes de ameaga; probabilidades de exlingdo associadas com as catagories de ameaca da IUCN; imoactos de perca de habitat projetado sobre espécies atualmente ameagadas com perda de habitat; e correlacdo de perda de espécies com consumo de'energia De acordo com os autores da avaliagSo, as estimativas de limite inferior para as fuuras extingSes modeladas sao estimativas de baixa certeza, € as estimativas de limite de superior s20 especulativas (cu seja, certeza ainda menor). Acaptado da Avalagac Ecossistémica do Milénio (2005) BIOGEOGRAFIA DE ILHAS - 359 © desenvolvimento de métodos para quantificar a magnitude e a distribuigdo taxonémica do deficit de extingdo € claramente de importancia vital para o planejamento e priorizacad da conservagao efetiva. No entanto, este objetivo nao é de forma alguma simples de aleangar. A avaliagao precisa das taxas de extingao e sua extrepolagdo para o futuro requer boa qualidade de dados em longo prazo sobre ocorréncias de espécies - dades que geralmente sao carentes, especialmente para espécies menos evidentes e/ou numericamente de taxons muito mais ricos. Esta falta de conhecimento adequado (Capitulo 4) levou a uma dependéncia inevitavel em medidas indiretas e projegdes tedricas do deficit de extingdo, Estas incluem: modelos de espécie-drea: taxas as quais espécies conhecidas estio mudando para categorias cada vez mais ameagadas de interesse de conservagéo; probabilidades de extingao associadas com as categorias JUCN de ameaca’ os impactos da perda de habitat projetados sobre as espécies atualmente ameacadas pela perda de habitat, e a extrapolagdo de correlagdes de perda de espécies com as mudangas climaticas (por exemplo, MCDONALD; BROWN, 1992, MACE; KUNIN, 1994; PIMM; ASKINS, 1995; THOMAS ¢ al., 2004 - para uma discusstio mais aprofundada veja LADLE, 2009). Um dos mais conhecidos exemplos empfricos de relaxamento em uma escala de tempo ecolégica ¢ a perda de espécies de aves da ilha de Barro Colorado, no Panama. A ilha era uma antiga colina em uma area de floresta tropical de planicie neotropical continua, mas de repente tornou-se uma ilha de 15,7 km? quando a se¢ao central da Zona do Canal do Panaind foi inundada para fazer Lago Gatun em 1914. Das 208 espécies de aves que se estima terem vindo se reproduzir na ilha Barro Colorado, imediatamente apés 0 isolamento na década de 1920 ¢ 1930, 45 no esiavam mais presentes em 1970 (WILSON; WILLIS, 1975). No entanto, apenes uma minoria dessas perdas foi atribuida diretamente aos processos estocdsticos de relaxamento. As outras podem ser atribuidas a mudangas ecoldgicas, tais como regeneracio da floresta seguindo abandono da atividade agricola, que reduziu a disponibilidade de habitats abertos ou predagao por mamiferos terrestres (veja revisdo em WHITTAKER, FERNANDEZ-PALA- CIOS, 2007) Por exemplo, muitos dos passaros perdidos eram tipicos de crescimento secundario ou da borda da floresta, 0 que sugere que a regeneragdo da floresta apés o abandono da atividade agricola deve ter reduzido a dispo idade destes habitats mais abertos. Além disso, algumas espécies que nidificam no solo provavelmente foram climinadas por seus predadores mam(feros terrestres, que se tornaram abundantes apés o desaparecimento dos carnivoros maiores com requisitos de area grande. Este efeito de aumento do niimero de omnivoros menores e predadores, devido a auséncia de grandes, tem sido denominado

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