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Combate de Conversin Ejercicios Espirituales en 40 Das - PT
Combate de Conversin Ejercicios Espirituales en 40 Das - PT
EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS DE
COMBATE À CONVERSÃO EM 40
DIAS
Traduzido de: COMBATE DE CONVERSIÓN EJERCICIOS ESPIRITUALES EN 40 DÍAS
Rhomeo Porto
combate a la conversion
EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS DE
COMBATE À CONVERSÃO EM
40 DIAS
Rhomeo Porto
combate a la conversion
Original Paper
Abstrato
INTRODUÇÃO
A oração preparatória consiste em pedir graça a Deus Nosso Senhor para que todas as
minhas intenções, ações e operações sejam puramente ordenadas no serviço e louvor à sua
divina majestade. Santo Inácio
O objetivo deste livro é dar uma olhada na espiritualidade de Santo Inácio e nos seus
exercícios após 500 anos de escrita e testes nos cinco continentes, com excelentes
resultados não só pela Companhia de Jesus, mas por muitos outros crentes cristãos
católicos.
O livro é composto por 8 capítulos, com 5 tópicos, cada capítulo pensado para ser feito
em 40 dias seguidos em preparação para a Quaresma ou o Natal ou qualquer época do ano.
Oração inaciana
Na espiritualidade cristã existem diferentes formas e sugestões para apoiar a oração.
Todos são válidos, porque depende de cada pessoa e da situação em que se encontra. O
importante é entrar na presença de Deus Pai; O resto, os modos de oração, são apenas uma
ajuda para entrar no processo de oração.
TRADUÇÃO 2
A oração não é tanto uma busca, mas uma espera. A espera sublinha a chegada do
outro. A atitude de espera exprime o próprio desamparo, a própria pobreza, a própria
necessidade do outro. É difícil para todo ser humano esperar, mas um está disposto a fazê-lo
se o outro for importante para ele. Portanto, orar é esperar em Deus. Esperar ensina a ser
contemplativo porque quem espera aprende a olhar com atenção para ver o outro chegar.
Muitas vezes insiste-se na utilidade da oração por diversos motivos: Deus escuta o
pedido, a oração dá sabedoria, a oração dá paz e dá força nos momentos difíceis. Tudo isto é
verdade, mas não explica a verdadeira natureza da oração, porque a oração não pode ser
entendida em termos de utilidade.
A oração é abandonar-se completamente nas mãos de Deus sem querer lucrar com isso.
Sempre chega um momento em que sentimos que a nossa oração não é ouvida, quando a
oração é considerada uma perda de tempo, quando não sentimos absolutamente nada na
oração. Portanto, as razões apresentadas não servem de muita utilidade. A oração é uma
perda de tempo ou, melhor ainda, uma perda de si mesmo.
Obviamente, a oração autêntica produz frutos, mas estes não são o propósito da oração.
Neste caso, Deus seria usado para se sentir bem, para encontrar paz e encorajamento.
Voltamo-nos para Deus para alcançar a Sua paz, mas não nos voltamos para o Deus que dá
paz. O meio se confunde com o fim, o efeito com a causa, o fruto com o Doador. E usar Deus
é matá-lo.
Muitas dificuldades na oração surgem do fato de não querermos nos entregar, de não
haver entrega, de as mãos não estarem abertas. A verdadeira dificuldade está no estilo de
vida e não na oração em si. O estilo de vida diário não combina com a oração. Como é
possível orar quando você não está disposto a dizer sinceramente que seja feita a Tua
vontade?
Reconheça o desejo
Num tempo de desencanto, a ausência do desejo diminui o horizonte da vida, encolhe o
coração e torna a existência humana medíocre. Outras vezes, limitar o desejo ao sexo e ao
sucesso reduz a motivação humana ao imediato e à quantidade. Os sonhos não estão na
TRADUÇÃO 4
moda, mas também não está o desejo de mudar a sociedade para criar um lar de melhor
qualidade para todos.
Na trajetória da oração autêntica o rumo do desejo se torna porque é o próprio Deus Pai
quem sai ao nosso encontro e é Ele quem busca e espera. A coisa é pensar em Deus porque
pensar em si mesmo é assunto de Deus. Orar é sentir que a vida de alguém é
responsabilidade do Outro.
Maria Madalena procura Jesus entre os mortos. Ela está angustiada porque procura um
cadáver e não consegue encontrá-lo. Ele lamenta uma ausência profunda em sua vida. Só no
momento em que se abre ao Mistério (a possibilidade de Vida) é que reconhece Jesus.
Tomar consciência das próprias buscas, com sinceridade e coragem, revela os próprios
desejos. O que alguém realmente quer? O que é que você está perseguindo? Quais são os
objetivos do seu próprio projeto de vida? Na oração reconhecemos os nossos desejos mais
profundos, diante do Senhor e sem julgamento ou censura.
Este é o ponto de partida da pessoa que ora; O ponto de chegada é a obra de Deus Pai
que saberá purificar e endireitar esses desejos. Maria Madalena procurou de forma errada,
mas de forma sincera e autêntica, porque procurava o Vivente entre os mortos. Foi Jesus
quem tomou a iniciativa aproximando-se, perguntando e chamando pelo nome.
Repetidas vezes Jesus aparece nos Evangelhos fazendo a pergunta “você quer ser
curado?” (cf. Jo 5, 6 – dirigido ao doente do tanque de Betesda) ou “tu acreditas em mim?”
(cf. Jo 9, 35 ao cego de nascença depois da sua cura). É uma pergunta que depende de uma
TRADUÇÃO 5
afirmação anterior: se você acredita em mim, então o que quer que eu faça por você? Jesus
aborda o desejo humano.
Porém, muitas vezes, por falta de fé ou simplesmente por cansaço e decepção com a
vida, não se expressa o desejo que está no coração ou, talvez, resta apenas o mínimo desejo
de sobreviver para não se tornar vulnerável. contra outras possíveis frustrações. Mas quando
os desejos são pequenos e os pedidos poucos, é ao próprio Deus que fica reduzido.
Pelo contrário, grandes desejos expressos em forma de pedido refletem a fé num Deus
infinito e misericordioso. É a situação do leproso que implora de joelhos a Jesus: “se
quiseres, podes limpar-me”; ao que Jesus responde: “Eu quero, fica limpo” (cf. Mc. 1,[40][41]
[42]. Neste sentido é necessário despertar o mundo dos grandes desejos como sinal de
confiança em Deus, o Pai, porque quem pede recebe, quem procura encontrará e quem bate
será aberto (cf. Lc 11, 10).
Docilidade e alegria
Cada um sabe da graça que mais necessita. Uma possibilidade é pedir a graça da
docilidade e da alegria no ministério sacerdotal.
Estes dias de oração podem ser um momento de profunda alegria, quando colocamos o
nosso cansaço nas mãos de Deus Pai e voltamos ao mais essencial da vocação cristã:
Jesus chama a estar com Ele (Mc 3,13). Somente desta intimidade com Jesus o Senhor
TRADUÇÃO 6
também vem o chamado para ir pregar em Seu nome. Se você não estiver com Ele por tempo
suficiente para conhecê-Lo profundamente e amá-Lo com ternura, você também não pregará
em Seu nome.
Alma de Cristo
No texto autógrafo, Inácio encabeça o livro dos Exercícios Espirituais com a oração da
Alma de Cristo, uma antiga oração medieval (já aparece em vários códices do século XIV) à
qual Inácio tinha uma devoção muito especial.
Esta oração pode ajudar o praticante a se situar em sua realidade para que a partir daí se
prepare para iniciar o processo dos exercícios espirituais.
Ó bom Jesus, ouve-me! Problemas de oração, isto é, quando a própria oração se tornou
um problema porque a verdade é que não se acredita completa e completamente, ou porque
não se sabe rezar, ou porque se sente que Jesus não escuta, ou porque não se ouve não
acredite em misericórdia. Então, oh bom Jesus, ouça-me!
Na hora da minha morte, chama-me e ordena-me que vá até Ti para que com os Teus
santos eu Te louve para todo o sempre. AMÉM Com o coração aberto e vulnerável, com a
coragem que vem de se conhecer na presença de um Misericordioso Pai, talvez em meio às
dúvidas que deixam a alma inquieta, coloque-se diante de Deus, sem procurar respostas ou
TRADUÇÃO 8
Leituras bíblicas:
Gênesis 22, 1-18: O sacrifício de Abraão 1 Samuel 3, 1 -18: O chamado de Deus a
Samuel Salmo 23: O Senhor é meu Pastor Salmo 42-43: Sede de Deus Salmo 63:
Busca de Deus Salmo 139: Senhor, Tu me conheces Lc 11, 1 -13: Senhor, ensina-nos a
orar Jo 20, 11 -18: Maria Madalena procura Jesus Perguntas:
1.-Ore a partir da sua própria realidade (não é possível fazê-lo fora dela) Qual é a minha
situação atual? Estou entediado, triste, irritado ou melhor, calmo e feliz? Estou feliz em meu
ministério? Tenho algumas preocupações que estão me pesando? 2.-Tornar consciente o
meu desejo mais profundo + O que eu quero nestes dias? O que vou pedir? O que vou pedir
às pessoas com as quais estou comprometido apostolicamente?
3.-Ordenar os dias de oração + como vou organizar meu tempo de oração e descanso
Santo Inácio sugere que uma vez que o exercitante estabeleça seu horário, então ele deve ser
fiel a ele sem encurtar o tempo por qualquer motivo de aridez ou cansaço (demonstração de
total disponibilidade à ação de Deus sem condições)
O livro que você tem em mãos é uma adaptação para a Colômbia da obra de Tony
Mifsud 1 da Companhia de Jesus de 2000 intitulada: “Em tudo para amar e servir”, que
originalmente era um retiro espiritual de 8 dias para sacerdotes do sul do continente
americano, foi adaptado, revisado e preparado para ser feito em 40 dias de combate
espiritual e humano neste caminho de conversão que todos nós trilhamos.
+ In Memoriam
1* Malta 1949 + Chile 2022. Destacado pensador na área de Ética e Moral. Ao longo de
sua vida religiosa, o doutor em Teologia Moral foi diretor da revista Mensagem e pesquisador
do Centro de Ética e Reflexão Social da Universidade Alberto Hurtado. No campo da pastoral,
o jesuíta recentemente falecido trabalhou em diversas paróquias e acompanhou as
comunidades de Vida Cristã (CVX), sendo um destacado pregador de Exercícios Espirituais.
Também trabalhou durante alguns anos no Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam),
especificamente no seu Instituto Teológico-Pastoral para a América Latina (Itepal), do qual
foi seu diretor. Na época, o Itepal era o Centro de Treinamento Celam, obra que o Cebitepal
continua até hoje.
TRADUÇÃO 9
Existem pessoas profundamente felizes na vida, ou seja, pessoas que acertaram o rumo
da própria vida e que estão em paz consigo mesmas; Portanto, tais pessoas irradiam
significado, alegria, paz. Cada um pode evocar momentos da própria vida em que se sentiu
bem inserido na existência, respirando uma paz profunda por estar certo com o que tem de
melhor, por fazer o que quer e ao mesmo tempo cumprir a vontade de Deus.
No Novo Testamento encontramos o Samaritano (Lc 10, 25 -37) e Maria de Betânia (Lc
10, 38 -42) que sabiam perfeitamente o que deviam fazer porque eram motivados por um
desejo claro e, portanto, podiam escolha corretamente na vida diária. Em ambos os casos,
Jesus confirma o seu comportamento: “Vá e faça o mesmo” (no caso do Samaritano) e
“Maria escolheu a melhor parte”.
A atividade e a corrida de um lugar para outro fazem parte da vida moderna. No espaço
de oração vale a pena perguntar se essa corrida tem uma direção. Às vezes você corre, mas
esquece por que está correndo. A própria vida tem um centro? Outras vezes tudo parece
urgente, mas é preciso se perguntar se tudo tem a mesma importância. Urgência é definida
por aquilo que se considera importante. Somente a partir do que é importante na vida é que
se pode priorizar o que é urgente.
Dia 2: Colocar ordem na própria vida Santo Inácio propõe como finalidade dos Exercícios
Espirituais preparar e dispor a alma para tirar de si todos os afetos desordenados e, depois
de retirados, procurar e encontrar a vontade divina no disposição da alma, vida para a saúde
da alma (Anotação nº 1).
Portanto, para fazer os Exercícios Espirituais são necessárias três condições básicas:
+ desejo sincero de abrir-se a Deus, de deixar espaço na própria vida para acolher nela a
sua Palavra; + um desejo sincero de ordenar a própria vida, que não se limita a fazer uma boa
confissão, mas à disposição interna para se colocar na perspectiva do Evangelho; nas
palavras de Inácio “superar-se e ordenar a vida sem ser determinado por nenhum afeto
desordenado” (Anotação nº 16); + e um desejo sincero de, por um lado, buscar a vontade de
Deus e, por outro, aceitá-la.
Desta identidade mais básica surge a questão da busca da vontade de Deus sobre a
própria vida. É uma questão radical porque consiste em devolver a Deus o protagonismo da
vida. Consciente das condições sociais, culturais e tradicionais, e assumindo o desgaste
emocional, bem como a resposta fácil de “sempre foi feito assim”, sai o apelo ao confronto
com o Evangelho, para além do próprio confortos, costumes e falta de criatividade.
Durante estes dias de oração é necessário não subestimar este desejo. Portanto, sugere-
se que a pessoa se coloque na presença de Deus Pai a partir da sua condição de criatura,
para que a própria vocação não seja um obstáculo para uma resposta muito rápida.
TRADUÇÃO 11
O homem foi criado para louvar, reverenciar, servir a Deus nosso Senhor e, através disso,
salvar sua alma; e as outras coisas na face da terra foram criadas para o homem e para
ajudá-lo na busca do fim para o qual foi criado. Disso se segue que o homem deve usá-los
tanto quanto eles o ajudam em seu propósito, e ele deve livrar-se deles tanto quanto eles o
impedem de fazê-lo. Por isso é necessário tornar-nos indiferentes a todas as coisas criadas,
em tudo o que é concedido à liberdade do nosso livre arbítrio e não lhe é proibido; de tal
forma que não queremos da nossa parte mais saúde do que doença, riqueza do que pobreza,
honra do que desonra, vida longa do que curta e, consequentemente, em tudo o resto;
apenas desejar e escolher o que melhor nos leva ao fim para o qual fomos criados.
A pessoa humana, na sua escolha fundamental de ser coerente com a sua condição de
criatura, deve adquirir uma profunda liberdade interior face a tudo o que foi criado, para poder
caminhar em direção ao Criador. Esta indiferença cristã é bastante radical porque Inácio a
apresenta em termos de saúde e doença, riqueza e pobreza, honra e desonra, vida longa e
vida curta; Além disso, sublinha-se que a opção é dirigida na perspectiva da maioria,
provavelmente hoje se diria melhor.
Não se estabelece uma simples relação de meios com fins, o que por si só não exige
mais ou melhor, mas apenas uma adaptação entre os dois. Porém, desde o início dos
Exercícios Espirituais é oferecida a dinâmica que não se contenta com o mínimo nem com o
suficiente porque propõe uma relação que busca o melhor possível entre diferentes
alternativas.
TRADUÇÃO 12
A salvação não consiste tanto em ser salvo do inferno, mas em estar com o Filho,
vivendo o amor. A dinâmica do amor busca ser mais parecido com Jesus e escolher o
melhor caminho para segui-lo. O ser humano não foi chamado apenas a garantir a entrada na
vida eterna, limitando-se a procurar o que é conveniente, mas o ser humano foi chamado a
agir como filho que procura identificar-se o mais intimamente possível com Jesus. A relação
entre Criador e criatura não se coloca em termos de escravidão (o mínimo possível), mas no
horizonte da filiação (o melhor possível).
"Vejam que amor o Pai teve por nós ao nos chamar de filhos de Deus, pois somos! O
mundo não nos conhece porque não O conheceu. Queridos, agora somos filhos de Deus e
isso ainda não foi revelado o que seremos" (1 Jo 3, 1-2).
A condição de criatura
O Princípio e Fundamento não contém uma visão ética e pragmática, limitando-se a
distinguir entre boas e más obras, mas procura antes o seguimento radical do discípulo de
Jesus. É uma escolha de vida, de direção da própria existência. Não se trata tanto do que
você tem que fazer, mas sim de como você tem que ser. A partir da identidade mais profunda
de ser cristão, a pessoa é chamada a procurar a vontade de Deus Pai. A ação ética é uma
consequência de ser espiritual. Não é a entrega de obras, mas sim colocar a vida à
disposição de Deus Pai.
No episódio do jovem rico (Mc 10, 17-27) esta radicalidade de entregar a vida ao Senhor
é claramente sublinhada nas palavras de Jesus: «só te falta uma coisa: vai, vende o que tens
e dá aos pobres." e você terá um tesouro no céu; então venha e siga-me." Ao seguir Jesus, a
satisfação legalista de ter cumprido os mandamentos não é suficiente, porque seguir implica
entregar a vida ao serviço do Senhor.
O jovem está triste porque possuía muitas riquezas que impediam a entrega de sua
liberdade a Deus, ou melhor, a devolução de sua liberdade a Deus Criador. É difícil servir a
Deus com um coração puro quando se tem riquezas, não só materiais, mas também
humanas, culturais, espirituais e eclesiásticas. As riquezas, neste sentido, tornam-se o
fundamento da vida e perde-se a perspectiva de que tudo é um dom de Deus Pai a ser dado
aos outros. A liberdade necessária para seguir fica enredada e perdida porque a criatura não
aceita sua condição de total dependência de Deus Criador.
TRADUÇÃO 13
As palavras de Jesus são lapidares: “Quão difícil será para quem tem riquezas entrar no
Reino de Deus!” Estas palavras surpreendem os próprios discípulos e perguntam: “Bem,
quem pode ser salvo?” A resposta de Jesus não recua nem qualifica o que foi afirmado
anteriormente. Jesus responde que “é impossível para os homens, mas não para Deus,
porque tudo é possível para Deus”.
No nosso tempo, e todos somos filhos do nosso tempo, o significado de ser criatura não
é evidente; Além disso, pode até parecer estranho devido ao contexto do materialismo (só o
que se vê é real e só o que se compra tem valor) e das conquistas humanas através da
ciência e da tecnologia (até a configuração genética do ser humano é manipulada). A
sensação de mistério ultrapassou o horizonte pragmático. Não é fácil compreender que a
humanidade não é dona do jardim, mas apenas foi colocada para guardá-lo e administrá-lo.
Cabe perguntar como recuperar e promover esse sentido de ser criatura, como resgatar
o sentido do mistério e a atitude contemplativa, para se posicionar com reverência diante da
vida. Reverência significa o reconhecimento de um Criador, o conhecimento de que em cada
criação devemos descobrir um reflexo do próprio Deus Criador. A reverência diante da
criação é uma forma autêntica de orar, pois expressa a dependência do Deus Criador e o
reconhecimento de que tudo é um dom e que tudo esperamos dele.
A atitude de reverência para com a criação, descobrindo nela a própria presença de Deus
Criador, ajuda muito a não nos desviarmos do caminho e a não perdermos o entusiasmo
inicial. Nas palavras do profeta Miquéias, a atitude de reverência consiste em caminhar
humildemente pela vida na presença de Deus, praticando a justiça e amando com ternura (cf.
Miquéias 6,8).
A questão sobre a própria felicidade (serei feliz?) nada mais é do que a coincidência
entre fazer o que se pensa que deve fazer (o deveria) e fazer o que se quer fazer (o querer).
Quando você faz o que tem que fazer porque quer fazê-lo livremente, só então você encontra
a felicidade autêntica, sendo feliz e não apenas sendo feliz.
Pelo contrário, o descompasso entre essas duas experiências (devo e quero) provoca
uma experiência de vazio e escravidão e, consequentemente, a felicidade desaparece e entra
a amargura e a falta de sentido.
A aceitação de ser criatura de Deus e de que o sentido mais profundo da vida consiste
TRADUÇÃO 14
no serviço aos outros em nome deste Deus é a verdade sobre a qual se constrói a vida
baseada na fé. Mas rebelar-se contra a condição de ser uma criatura, querer que os outros o
sirvam, o elogiem, o reverenciem, é apenas autoengano.
Mas a verdade fundamental sobre o ser humano não é tanto a sua condição de criatura,
mas sim que esta criatura é infinitamente amada por Deus. Aceitar a condição de criatura,
saber que se é amado pelo Criador, abre um horizonte de segurança que se expressa no
serviço ao outro, porque este outro não é um concorrente, mas também uma criatura amada
por Deus.
O ser humano é o sonho de Deus desde a eternidade. Deus não se arrepende da sua
criação e a única coisa que sabe fazer é amá-la (Sb 11,(21)(22)(23)(24)(25)(26). Deus não
ama a pessoa porque ela é o bem, mas simplesmente a pessoa. Deus não condiciona o seu
amor pela criatura, mas ama-a sem condições. São Paulo diz que "a prova de que Deus nos
ama é que Cristo, sendo nós ainda pecadores, morreu por nós" (Rm 5, 8). ).
Esta é a verdade fundamental sobre a vida de cada pessoa humana. É uma verdade que
não se compreende porque o amor humano conhece limites. Mas Deus ama apenas como
um deus sabe amar. Jesus exclama que não veio para salvar os justos, mas para procurar e
amar os pecadores.
No Evangelho, quando Jesus é criticado por comer com pecadores e publicanos, Jesus
declara: “Os fortes não precisam de médico, mas sim os doentes; não vim chamar os justos,
mas os pecadores” (Mc 2). , 17). Deus quer misericórdia, não sacrifícios (cf. Mt 9, 13). É a
partir da situação de pecador que o ser humano faz a experiência inédita de saber que é
amado por Deus; É a partir desta experiência de saber-se amado que o ser humano é
TRADUÇÃO 15
Portanto, cada um tem uma história pessoal de Princípio e Fundamento. Vale a pena
perguntar-nos como se manifestou a livre iniciativa de Deus na própria vida e qual foi a
resposta pessoal a esta iniciativa divina.
Quem sou?
A maioria das pessoas não se ama tanto e, por isso, precisa da afirmação constante dos
outros, além de se mimar muito, para compensar essa falta de amor. Na fé, tomar
consciência do olhar amoroso de Deus sobre a própria vida é fundamental e ajuda a alcançar
uma aceitação serena de si mesmo.
Deus sabe tudo sobre a própria escuridão, o que ajuda a aceitar e integrar o lado negro
da própria vida. Naturalmente sentimos angústia quando temos que nos expor ao risco de
não sermos compreendidos. Esse medo pode levá-lo a jogar um jogo no qual espera se
proteger: esconder-se atrás de uma máscara para buscar certa segurança nos outros.
Diante de Deus esta máscara não é necessária porque o Santo conhece a sua criatura.
Com Deus você pode ser completamente honesto sem qualquer reserva. Esta é uma das
graças da oração: não precisa ser piedosa, mas pode e deve ser honesta. É vital que na
oração se coloque tudo diante de Deus: o bom, o mau e o medíocre. Tudo deve ser exposto
ao olhar de Deus.
Quando alguém se sente confuso ou indeciso, pode obter grande conforto de que
alguém “sabe tudo sobre alguém” (cf. Salmo 139), que realmente vê através de alguém com
absoluta clareza e que nunca irá decepcionar, mas sempre o fará, com fidelidade inabalável. ,
irá apoiá-lo como você é (não como deveria ser).
medo de não conseguir corresponder a tais expectativas; Por outro lado, quando alguém se
sente subestimado, sente-se ofendido. Quando Dietrich Bonhoeffer foi preso na prisão
nazista de Berlim-Tegel, ele expressou essa luta interior na forma de um poema. (Resistência
e Submissão, Salamanca, Siga-me, 1983, pp. 243-244) O olhar amoroso de Deus não só dá a
sensação do próprio valor autêntico, mas também cria um sentimento de segurança que
permite cruzar novas fronteiras continuamente. . O olhar abrangente de Deus intensifica os
próprios dons e capacidades, que de outra forma permaneceriam latentes.
A segurança que Jesus experimentou na sua união com o Pai tornou-o extremamente
aberto e permitiu-lhe relacionar-se com os outros de uma forma aberta, acolhedora e
amorosa. Às vezes, até discorde deles e permaneça fiel no conflito. Mas todas as suas
reuniões tinham o propósito de trazer à tona o que há de melhor nas pessoas.
No olhar de Deus encontramos o amor: o amor de Deus que criou cada ser humano. No
Livro dos Cânticos se diz: “Eu sou do meu amado e ele me procura apaixonadamente” (7, 11).
Abrir-se com fé e acreditar que Deus te busca apaixonadamente, assumindo-os de forma
muito pessoal, leva a uma amplitude e profundidade que proporciona plenitude e libertação
autêntica.
Em Oséias, Yahweh diz: “Eis que vou seduzi-la, levando-a para o deserto e falando ao seu
coração” (Oséias 2:16). A palavra seduzir significa fazer todo o possível para despertar o
amor da outra pessoa, mas sem coagi-la. Deus quer obter o amor dos seres humanos! Isto
significa que aos Seus olhos todo ser humano é valioso e desejável. Para Deus cada um
significa muito.
Jesus torna visível o modo de olhar de Deus. Quando Jesus olhou para o jovem rico, ele
o amou (cf. Marcos 10,21). A mulher pecadora, antes que Jesus lhe dissesse uma única
palavra, apenas através dos seus olhos, sabia que Ele não a condenava e que diante dele ela
poderia tirar a máscara, e foi isso que ela fez livremente (cf. Lc 7,( 36)( 37)(38)(39)(40)(41)
(42)(43)(44)(45)(46)(47)(48)(49)(50).Quando Jesus perguntou ao surpreso mulher em
adultério, se alguém a tivesse condenado, e depois acrescentasse: “Nem eu te condeno” (cf.
Jo 8, 1-11), ela deve ter visto nos Seus olhos a própria imagem do céu.
O olhar do Senhor não é indiferente. Diante da pergunta “Quem sou eu?”, o melhor é
colocar essa questão nas mãos do Senhor e deixar que Ele olhe para você.
TRADUÇÃO 17
A humildade não tem nada a ver com covardia ou respeito humano, ansiedade ou
insegurança. Pelo contrário, a humildade autêntica liberta-nos de uma dependência doentia e
do medo das opiniões dos outros, precisamente porque olha para Deus.
Ao longo da vida pública de Jesus, exemplos tristes de ambos os tipos de fraqueza são
ocasionalmente vistos entre os discípulos. Durante o julgamento contra Jesus, enquanto Ele
é objeto de todo tipo de ridículo, Pedro cede ao respeito humano e diz a quem o encontra ao
redor do fogo: “Não o conheço!” (Lc 22, 57). Depois da terceira predição da Paixão, os filhos
de Zebedeu (Tiago e João), numa demonstração de insensibilidade, sucumbem ao
carreirismo e pedem a Jesus que ocupe as primeiras posições no reino vindouro (cf. Marcos
10,(35) (36). )(37)(38)(39)(40) Casos semelhantes de fraqueza têm sido uma constante ao
longo da história do Cristianismo.
TRADUÇÃO 18
As Escrituras ensinam que Deus trabalha apesar das falhas humanas; além disso,
funciona nele; e é assim que a atividade criativa de Deus continua. Mas, mesmo assim, a
falta de humildade prejudica a credibilidade da Igreja e causa muito sofrimento
desnecessário, se não mesmo injustiça total.
“Certa ocasião ouvi um irmão velho, sábio, bom, perfeito e santo dizer: ‘Se você sente o
chamado do Espírito, procure ser santo com toda a sua alma, com todo o seu coração e com
todas as suas forças. , pela fraqueza humana, você não pode ser santo, então tente ser
perfeito com toda a sua alma, com todo o seu coração e com todas as suas forças. Se,
apesar de tudo, você não consegue ser perfeito, por causa da vaidade da sua vida, então
tente seja bom com toda a sua alma, com todo o seu coração e com todas as suas forças.
Se, no entanto, você não pode ser bom, devido às armadilhas do Maligno, então tente ser
sábio com toda a sua alma, com todo o seu coração e com todas as suas forças. Se, no final,
você não consegue ser santo, perfeito, bom ou sábio, por causa do peso dos seus pecados,
então tente carregar esse fardo diante de Deus e coloque sua vida nas mãos da misericórdia
divina. Se você fizer isso sem amargura, com toda humildade e com alegria de espírito,
movido pela ternura de Deus, que ama os ingratos e os maus, então você começará a sentir
o que é ser sábio, aprenderá o que significa para ser bom, você lentamente aspirará ser
perfeito e, finalmente, desejará ser santo. Se você fizer tudo isso dia após dia, com toda a
alma, com todo o coração e com todas as forças, então, irmão, garanto-lhe que estará no
caminho de São Francisco e não estará longe do reino de Deus'" (Leonardo Boff, San
Francisco de Asís: ternura e vigor, Santander, Sal Terrae 1994 6, pp. 185-186).
A aceitação permite que o indivíduo desenvolva seu potencial porque o outro acredita
TRADUÇÃO 19
nele. Somente através da aceitação do outro o indivíduo pode se tornar ele mesmo. Quando
alguém é apreciado pelo que faz, deixa de ser único, porque outra pessoa pode aparecer e
fazer a mesma coisa ou, talvez, até melhor; mas quando é amado pelo que é, torna-se único e
insubstituível. Aceitar o outro não significa negar seus defeitos ou idealizá-los. Pelo
contrário, a aceitação implica aceitar a pessoa tal como ela é, com os bons e os maus, com
os seus defeitos e virtudes.
Aquelas pessoas que não se sentem aceitas pelos outros, e por outras pessoas
importantes em suas vidas, costumam recorrer a mecanismos de substituição para
compensar o vazio que as sufoca: (a) exibicionismo para se concederem elogios que os
outros não lhes concedem ; (b) rigidez como expressão da falta de segurança e do medo
diante de tudo que é novo; (c) complexo de inferioridade por não acreditarem em suas
capacidades; (d) auto-erotismo para alcançar o prazer negado pelos outros; (e) uma atitude
exagerada de autoafirmação através de uma estrutura autoritária, a necessidade de se impor
aos outros, uma suspeita constante dos motivos dos outros, etc.
Deus aceita o indivíduo como ele é, como ele é e não como deveria
ser.
O indivíduo nunca é o que deveria ser, mas simplesmente o que é. Repetidamente tem
sido repetido que o que é importante é o amor de Deus pelo indivíduo. É verdade. Mas ainda
mais importante e estritamente essencial é que Deus ama os seres humanos. São João
afirma: «Nisto consiste o amor: não em que tenhamos amado a Deus, mas em que Ele nos
amou» (1Jo 4,10). No seu último discurso antes da paixão, Jesus pede ao Pai que faça saber
ao mundo “que os amaste como me amaste”, “para que o amor com que me amaste esteja
neles” (João 17, 23 e 26).
Realmente, parece incrível poder afirmar que Deus ama os seres humanos assim como
ama o seu próprio Filho Jesus. Acontece que Deus só pode amar como um deus, ou seja,
amar totalmente ou não amar. O amor humano não conhece o amor cem por cento porque é
um amor que cansa, que se frustra e que também dá medo. Os seres humanos têm amor,
mas Deus é amor. O amor divino não é uma atividade, mas o Seu modo de ser.
Fé é a coragem de aceitar a aceitação divina (Tillich). Mas por que é preciso coragem
para abraçar a aceitação? Em primeiro lugar, porque quando a vida fica difícil, você se
pergunta por que Deus permite isso e começa a duvidar do amor divino. Não é tão simples
confiar sempre em Deus, não importa o que aconteça. Em segundo lugar, o amor divino é
infinito e, portanto, impossível de compreender, muito menos de controlar. E por fim, é muito
mais fácil acreditar no amor em geral (Deus ama todos os seres humanos), mas é
incompreensível acreditar no amor de Deus por um em particular porque surge a pergunta:
TRADUÇÃO 20
porque é que Deus me ama? A auto-aceitação diante de Deus não pode basear-se nas
próprias qualidades, nas próprias obras, mas simplesmente na gratuidade total. Deus ama o
indivíduo simplesmente porque. Se Deus aceita o indivíduo como ele é, então fé significa
aceitar a si mesmo.
O fato de alguém poder ser você mesmo se deve a Deus porque Ele é o Criador.
Consequentemente, distanciar-nos de Deus produz um profundo problema de identidade
porque só podemos ser nós mesmos enquanto nos reconhecemos como criatura. Distanciar-
se de Deus é renegar-se. Em momentos de confusão espiritual, o problema não é Deus, mas
você mesmo. Deus está mais perto de alguém do que de si mesmo (Santo Agostinho).
Portanto, o verdadeiro problema está dentro de si mesmo: é a ruptura interior que produz a
desconfiança em Deus, considerando-o uma ameaça.
Deus é a fonte original da própria vida; a ameaça é você mesmo. Deus está sempre do
mesmo lado de você porque Ele é fiel à Sua palavra. Deus deseja o crescimento e a
realização mais plena de Sua criatura, mas quando o indivíduo considera isso uma ameaça,
então o alicerce mais sólido de sua vida se perde. Deus não é uma ameaça para o indivíduo,
mas a única garantia para que ele seja autenticamente ele mesmo.
Jesus viveu numa atitude de total abandono nas mãos de Deus Pai. A sua experiência de
Deus não foi de se sentir ameaçado, mas, pelo contrário, de total confiança. Jesus afirma que
Deus sabe tudo sobre as necessidades humanas e nos convida a confiar plenamente Nele. A
presença de Deus elimina a presença de preocupações na vida.
"Qual de vocês, por mais que se preocupe, pode acrescentar um só côvado à medida da
sua vida? (...) Seu Pai celestial já sabe que você precisa de tudo isso. Busque primeiro o seu
Reino e a sua justiça, e Todas essas coisas serão acrescentadas a vocês. Portanto, não se
preocupem com o amanhã: o amanhã se preocupará consigo mesmo" (Mt 6, 25-34).
Deus amou cada ser humano antes que eles existissem. Deus criou os seres humanos
porque os amou. Deus não ama o ser humano pelo que ele é, mas alguém é o que é porque
Deus o ama. O facto de o amor de Deus ser gratuito significa que nunca pode ser destruído.
Este amor não pode ser perdido porque não se deve a nenhuma conquista do indivíduo.
TRADUÇÃO 21
“Nisto consiste o amor de Deus”, diz São João, “não em que tenhamos amado a Deus, mas
em que Ele nos amou” (1Jo 4,10). O amor de Deus é um dom, totalmente gratuito.
do que não lhe convém, assumindo um papel divino que não lhe corresponde porque é
criatura e não criador.
Esta rejeição do plano de Deus introduz desordem na história. Esta desordem é indicada
em termos da tríplice relação do indivíduo com Deus, com os outros e com a natureza. Na
época da criação essa relação era harmoniosa.
A relação da pessoa com Deus era uma relação criaturial de dependência filial, de
confiança pela qual Deus se agrada dela e caminha com ela; Por sua vez, a pessoa não sente
medo na presença do Criador. A relação entre as pessoas é de apoio mútuo, troca,
complementaridade e sinceridade (não têm vergonha de andar nuas). A relação da pessoa
com a natureza é de um ambiente acolhedor e o trabalho é o desenvolvimento dessa relação
harmoniosa.
Contudo, este quadro apresentado nos dois primeiros capítulos sofre uma mudança
drástica quando os primeiros pais escolhem contra o plano de Deus para eles.
O ser humano esconde-se de Deus e tem medo Dele (cf. Gn 3, 10) e assim nascem
degenerações religiosas que se baseiam no temor de Deus. Nas relações interpessoais, a
complementaridade transforma-se em divisão, e assim começam as acusações mútuas
(Adão acusa Eva em Gn 3, 12) e as diferenças não são toleradas, levando ao assassinato
(Caim mata Abel em Gn 4, 8). A natureza torna-se inimiga da humanidade (o dilúvio em Gn
6-8) e o trabalho exige fadiga (cf. Gn 3, 17-19).
No ambiente do Antigo Testamento, a questão não era se Deus existe, mas quem é o
verdadeiro Deus. Portanto, a história do povo de Israel é a escolha constante entre Yahweh e
os demais deuses de outros povos. O Senhor intervém ativamente na história de Israel e os
TRADUÇÃO 23
seus atos são testemunho da Sua palavra: "Eu sou o Senhor, teu Deus, que te tirei da terra do
Egito, da casa da servidão" (Dt 5, 6). Mas o povo de Israel cai repetidamente na idolatria e cria
o seu próprio deus, mesmo que seja na forma do bezerro de ouro (cf. Ex 32, 1-10). A idolatria
não desapareceu na história da humanidade e vale a pena perguntar que ídolos são feitos
pelas próprias mãos para encontrar segurança.
A história do povo de Israel narra, por um lado, a fidelidade de Deus e, por outro lado, a
infidelidade do povo para com Ele. Repetidamente este povo não respeita a aliança e
esquece os seus compromissos com Yahweh. Diante desta infidelidade, a voz dos profetas
se eleva. No cântico da vinha, o profeta Isaías coloca a dor na boca de Javé face à
infidelidade do seu povo: «esperava deles justiça, e há homicídio; honestidade, e há gritaria»
(Is 5). , 7). Vale a pena perguntar sobre a própria história de salvação e considerar as próprias
infidelidades; já não olhamos apenas com critérios humanos, mas daquele que é fiel e
sempre foi fiel.
No início da história humana encontramos o assassinato por inveja. Caim mata o próprio
irmão, rebelando-se contra Deus: sou por acaso a ama do meu irmão? (cf. Gn 4, 1-16). A
injustiça é a não aceitação do outro em termos de apoio mútuo (cf. Gn 2,18); É a rejeição de
um Deus que se apresenta como Pai de todos e, portanto, irmãos uns dos outros. Caim mata
o seu próprio irmão, enquanto Jesus se identifica com a humanidade daqueles que dela são
marginalizados (cf. Mt 25, 31-46). Vale a pena perguntar pela própria justiça no cotidiano,
para além dos discursos.
A desordem é evidente, mas a consciência da raiz dessa desordem foi perdida. O que
falta é antes tomar consciência de que esta desordem nasce basicamente da oposição
humana ao amor e ao plano de Deus, bem como da nossa própria cumplicidade nesta
desconfiança em Deus Pai. Os bispos latino-americanos, ao assinalarem em Puebla (1979) e
Santo Domingo (1992) que a principal causa da injustiça no subcontinente é o pecado,
afirmam uma grande verdade. Com isso, a crítica social não se torna piedosa, mas aponta a
gravidade de uma injustiça proveniente de sociedades que se consideram cristãs.
No Salmo 32 está dito: “Reconhecei-te o meu pecado e não escondi a minha culpa; disse:
'Confessarei as minhas transgressões ao Senhor.' Diante do pecado, não há espaço para a
repressão da própria culpa, mas sim para a abertura ao perdão diante de Deus. “Bem-
aventurado aquele que é perdoado da sua culpa e cujo pecado é coberto” (Salmo 32, 1).
A cura dos enfermos e o perdão dos pecados constituem duas atividades da Sua
missão. Contudo, é interessante notar que Jesus curou aqueles doentes que lhe foram
trazidos, mas não os procurou. Pelo contrário, Jesus procurou os pecadores; Ele tomou a
iniciativa de demonstrar sua autêntica aceitação e acolhimento. Tornou-se amigo de
publicanos e prostitutas; eles o viram na presença de pecadores; Jantei com eles.
Uma pessoa só pode ser curada no momento em que reconhece a sua doença. Da
mesma forma, a salvação só é possível quando se confessa a necessidade de ser salvo.
Deus respeita a liberdade humana. «Se dissermos: ‘Não temos pecado’ — escreve São João
— enganamo-nos a nós mesmos e a verdade não está em nós. Se reconhecermos os nossos
pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de todos injustiça. Se
dissermos: 'Não pecamos, fazemo-lo mentiroso e a sua Palavra não está em nós' (1 Jo 1, 8-
10).
Jesus nunca relativizou o pecado nem negou as suas consequências, mas sempre
perdoou. “Ninguém te condenou?” Jesus pergunta à mulher adúltera. E diante da resposta
TRADUÇÃO 25
negativa, Jesus continua dizendo: “Nem eu também te condeno. Vai e não peques mais” (Jo
8, 10-11). É que “se somos infiéis, ele permanece fiel, pois não pode negar-se a si mesmo”
(2Tm 2,13). Sua fidelidade é sua própria salvação.
Dia 9: Pecado Pessoal, Uma História de Dois Homens O pecado pessoal situa-se neste
contexto mais amplo da desordem introduzida na história por uma rejeição humana inicial do
plano de Deus. A este respeito, Inácio sugere que o exercitante peça a graça de sentir
profunda e intensa dor e lágrimas pelos meus pecados. Isto é uma dádiva porque não é algo
que possa ser alcançado apenas pela força ou pela vontade humana. Somente quando o
próprio pecado é confrontado com a imensa bondade de Deus Pai, só então as lágrimas
podem fluir.
Não se trata tanto de enumerar alguns atos pecaminosos, mas antes de considerar a
falta de correspondência pessoal com o plano de Deus para a própria vida e como isso teve
consequências para os outros. Por outras palavras, sugere-se que, na presença
misericordiosa de Deus, se faça uma leitura do próprio itinerário de responsabilidade a partir
da própria vocação primária, daquilo que Deus chamou e daquele nome tão especial com
que Deus se inclinou. um desde a eternidade, do batismo à ordenação sacerdotal.
Não se trata de nutrir a própria culpa como um fenómeno puramente psicológico, mas
de pedir a graça de ter plena consciência da própria desconfiança, do próprio descuido, da
própria negligência e da preguiça face ao desígnio do Pai para a própria vida. Desta forma,
através do autoconhecimento mais profundo da própria vida - na sua pobreza, fragilidade e
fraqueza -, descobrir e conhecer melhor o mistério de Deus, da Cruz, o próprio mistério de
Cristo que supre, preenche, supera, e destrói com a sua misericórdia cada ruptura, cada
desordem da própria vida. Não nos interessa um sentimento de culpa amarga ou uma
revisão fria e pessimista da própria condição, mas antes descobrir uma admiração profunda
por este mistério infinito e inexprimível da misericórdia divina que se pronuncia diariamente
TRADUÇÃO 26
O fruto de uma oração pelo pecado é a descoberta do amor de Deus Pai sobre a história
da humanidade e sobre a própria vida. Conseqüentemente, este reconhecimento leva à
aversão ao pecado, isto é, àquela atitude interna de repugnância à ofensa contra Deus, a uma
aversão instintiva ao pecado devido ao amor ao plano de Deus e ao desejo profundo de ser
filhos e de não quebrar por qualquer motivo o vínculo de filiação.
Deus não tem medo do pecado porque ama profundamente o pecador. A contemplação
do pecado nos coloca, portanto, diante dos pecados mais cruéis do mundo, mas na
perspectiva de Deus Pai, que nada teme, que sabe pegar tudo nas mãos e devolver à graça,
que sabe como transformar o mal em bem. Ele quer levar-nos a esta verdade profunda,
consoladora e salvífica na primeira semana: uma meditação sobre a misericórdia divina e
sobre o próprio pecado. Dia 10: Um pecador perdoado, Situações de pecado Aquele que é
deixado sozinho com seu pecado cai em um abismo de culpa, remorso doentio e retorno
inútil à sua própria imagem. Por outro lado, quem finge sentir-se perdoado sem passar pelo
humilde reconhecimento do próprio pecado permanece muito longe da sua verdade. Só a
experiência do pecador perdoado permite um encontro autêntico com Deus Pai, e o horizonte
futuro abre-se na possibilidade de iniciar o caminho da reconstrução, da cura e da recriação
da própria vida num acto de profunda gratidão.
Saber que se está perdoado, depois de ter reconhecido o próprio pecado, abre-se à
dinâmica de uma compreensão profunda do outro numa atitude de «tudo desculpar, tudo
acreditar, tudo esperar e tudo suportar» (1 Cor 13, 7). No perdão recebido, descobre-se o
significado mais profundo do amor, sentindo-se acolhido tal como se é, na sua realidade
mais profunda, e ao mesmo tempo encontra-se a força para reconstruir a própria vida.
O episódio do encontro de David com o profeta Natã (cf. 2 Sm 11-12) narra a passagem
da culpa ao arrependimento. Davi se apaixona por Bate-Seba, esposa de Urias, enquanto ele
está na batalha; Ele a leva para seu palácio e dorme com ela. Mais tarde, quando ela o
informa que está esperando um filho, a reação de David é típica de culpa narcisista, porque
ele se sente culpado por ter infringido uma lei e sua autoimagem está em perigo. Por isso
manda chamar Urías e tenta por todos os meios fazê-lo voltar para casa e assim fazer
parecer que o filho era seu. Mas Davi não consegue e por isso ordena que Urias seja
TRADUÇÃO 27
colocado num local de máximo perigo na batalha, e ali ele morre. Desta forma a fama de
David está segura e o rei casa-se com Bate-Seba. Quando o profeta Natã aparece no palácio
e lhe conta a história da violação dos direitos de um homem pobre ocorrida em seu reino,
Davi reage com raiva, projetando culpa ética. David sentenciou que “este homem merece a
morte”. Mas Nathan esclarece que “Você é aquele homem” e começa a lembrá-lo da história
de sua vida com Yahweh. É o próprio Deus quem fala através do seu profeta: “Eu te ungi rei
de Israel (...), te livrei (...), te dei (...), e, em troca, tu (.. .)". David é introduzido no âmbito do
encontro e da relação pessoal, e só então a palavra pecado aparece na boca de David:
“Pequei contra o Senhor”.
Além disso, esta experiência de perdão altera o nível de relacionamento com Deus Pai
devido à situação de perda e reencontro. No caso da ovelha e da moeda esta consciência
não existe. Mas no caso do filho perdido e encontrado há um regresso a casa: é uma outra
forma de estar com o pai, nasce uma atitude de disponibilidade total, o desejo de retribuir o
acolhimento incondicional paterno. O encontro com o que foi perdido não restaura uma
situação anterior, mas cria outra diferente. É a transformação ditada pela gratidão.
Por último, a própria experiência encoraja-nos a não desistir de ninguém que está
TRADUÇÃO 28
irremediavelmente perdido. Nesta escola de Deus Pai aprendemos a não desanimar na busca
dos irmãos perdidos, a imaginar novos caminhos de reconstrução de relações, a ser criativos
na consideração de possibilidades de reconciliação.
Aceitar a própria aceitação de ser acolhido por Deus Pai a partir da gratuidade do amor
divino é fruto da graça. Ser aceito por alguém maior, cujo nome você mal conhece, significa
simplesmente aceitar o fato de ser aceito. Isto não é o resultado de um esforço moral, mas
da bondade de Deus Pai para com a sua criatura.
Nesta situação o missionário esquece as suas limitações humanas e, como todo ser
humano, necessita de momentos de descanso. Na verdade, nestas situações existe uma
contradição total entre o que é criticado na vida acelerada da sociedade, a falta de tempo
para rezar e contemplar, e a vida concreta de quem faz essas críticas.
Outras vezes, há uma tendência a criticar os outros sem amor ou misericórdia. Uma
coisa é ser crítico e buscar sempre o melhor, mas por dentro e com carinho, outra coisa é
focar apenas nos defeitos dos outros, observar apenas o negativo e encontrar uma
satisfação quase inconsciente em confirmar o quão longe eles estão. você está perdendo o
objetivo. Em vez disso, você deve fazer um esforço para encorajar os outros e parabenizá-los
pelo bem que fazem, porque muitas vezes tendemos a ver apenas o negativo.
A santidade dos santos não residia tanto nas suas boas ações, mas na crença de que
Deus era capaz de fazer grandes coisas através deles, apesar das suas limitações. Não se
trata de vangloriar-se das próprias limitações ou de resignar-se a elas, mas de confiar que a
força de Deus é superior a elas.
Por esta razão, São Paulo confessa que Deus «escolheu o que há de louco no mundo
para confundir os sábios; e Deus escolheu o que há de fraco no mundo para confundir o que
é forte» (1 Cor 1, 27). É que «carregamos este tesouro em recipientes de barro, para que
TRADUÇÃO 30
pareça que um poder tão extraordinário vem de Deus e não de nós» (2 Cor 4, 7). São Paulo
revela a sua própria experiência quando lhe foram reveladas as palavras do Senhor: “A minha
graça te basta, porque o meu poder é perfeito na fraqueza”, e conclui: “Portanto, com grande
prazer, continuarei a gloriar-me acima tudo nas minhas fraquezas, para que habite em mim a
força de Cristo. Por isso tenho prazer nas minhas fraquezas, nos insultos, nas necessidades,
nas perseguições e nas angústias sofridas por Cristo; portanto, quando estou fraco, então é
quando estou forte” (2 Cor 12, 9-10).
Ao considerar o próprio pecado, é ainda mais importante meditar sobre como Deus é o
oleiro que trabalha com o barro humano para nele manifestar a sua glória (cf. Jr 18, 1-6). A
sua maneira de trabalhar o barro é modelá-lo, desfazendo-o e refazendo-o, para que o seu ser
misericordioso apareça na humildade. Deus Pai recupera sempre o bom e até o mau, para
que a imagem do Seu Filho apareça no barro frágil que é o ser humano.
Leituras bíblicas: Êxodo 32, 1 -10: o bezerro de ouro Isaías 5, 1 O primeiro ponto é
colocar diante de mim um rei humano, escolhido pela mão de Deus nosso Senhor, a quem
todos os príncipes e príncipes reverenciam e obedecem. todos os homens cristãos. O
segundo ponto é observar como este rei fala a todo o seu povo, dizendo: a minha vontade é
conquistar toda a terra dos infiéis; Portanto, quem quiser vir comigo deve ter prazer em
comer como eu, e assim beber e vestir-se, etc.; Ele também deve trabalhar comigo durante o
dia e vigiar à noite, etc.; para que mais tarde ele participe comigo na vitória como teve na
obra.
O terceiro ponto é considerar quais bons súditos deveriam responder a um rei tão liberal
e humano; e, conseqüentemente, se alguém não aceitasse o pedido de tal rei, quanto seria
digno de ser insultado pelo mundo inteiro e considerado um cavaleiro perverso.
A segunda parte deste exercício consiste em aplicar o exemplo acima mencionado do rei
temporal a Cristo Nosso Senhor, de acordo com os três pontos mencionados. Quanto ao
primeiro ponto, se considerarmos tal vocação do rei temporal aos seus súditos, quão mais
digno de consideração é ver Cristo nosso Senhor, rei eterno, e diante de todo o universo do
mundo, que cada um em particular chama e Ele diz: minha vontade é vencer o mundo inteiro
e todos os inimigos, e assim entrar na glória de meu Pai; Portanto, quem quiser vir comigo
deve trabalhar comigo, para que, seguindo-me na dor, também me siga na glória. O segundo
ponto é considerar que todos aqueles que têm julgamento e razão oferecerão todo o seu
pessoal para trabalhar. O terceiro ponto é que aqueles que quiserem ser mais afetados e
TRADUÇÃO 31
apontados em todos os serviços ao seu rei eterno e senhor universal, não apenas oferecerão
suas pessoas para trabalhar, mas ainda mais, indo contra sua própria sensualidade e contra
sua sensualidade carnal. e amor mundano, farão oblações de maior estima e maior
momento, dizendo: (...) eu já quero e desejo e é minha determinação deliberada, só que seja
o seu maior serviço e louvor, imitá-lo de passagem em todos insultos e toda difamação e
toda pobreza, tanto real quanto espiritual, amando-me, sua santíssima majestade, para
escolher e receber em tal vida e estado. (Exercícios Espirituais Nos. 92-98)
Con respecto a esta contemplación sobre la llamada del Rey temporal, hoy en día resulta
muy difícil imaginar una situación en la que jueguen la lealtad, el reconocimiento de tipo
feudal, la audacia caballeresca, la fidelidad a un monarca, la reverencia a una empresa
aprobada por Deus. Tal situação é praticamente inexistente porque vivemos dias incertos,
cheios de desencanto. As ideologias da década de 1960 caíram e a utopia parece uma
ilusão.
Por isso, talvez seja mais oportuno colocar-nos diante de Jesus, Filho único do Pai,
Messias da humanidade, que se entregou por cada um e que, portanto, é o autêntico centro
da história colectiva e pessoal.
O ponto central é que o chamado para servir envolve a escolha do estilo, porque o
serviço não é uma forma qualquer, mas como Cristo se colocou a serviço do Pai e da
humanidade. Cristo também é o caminho.
O relacionamento pessoal no culto porque vir Comigo e comer, beber e vestir-se como
Eu é reiterado continuamente. O primeiro chamado de Cristo é estar com Ele; a segunda,
imitá-lo e segui-lo. Portanto, a ligação é intimamente pessoal. A pessoa é inseparável da
missão e é quem se entrega à missão.
A proposta do Evangelho é seguir Jesus, estar com Ele, participar de Sua companhia. No
Evangelho há muitos textos relacionados com o chamado. São textos vocacionais. Você
pode pegar o de Pedro encontrado em Lucas 5, 1-11.
Acima de tudo, sente-se privilegiado pela confiança de Jesus que escolhe o seu barco
para pregar. As pessoas se reuniram para ouvir Jesus e Pedro foi escolhido. Além disso,
certamente se sente recompensado pela confiança que depositou em Jesus, quando lhe
pediu que lançasse novamente as redes. Apesar do sentido profissional de pescador, ele
decide ouvir Jesus e acaba com uma enorme quantidade de peixes no barco. Pedro é um
homem honesto e percebe que está diante de algo divino e milagroso. Portanto, ele
reconhece a sua identidade mais profunda e a sua total inépcia diante deste homem Jesus.
De fato, embora a princípio o reconheça como Mestre (um entre muitos), no final o declara
Senhor (um só).
Mais uma vez Pedro é recompensado além das suas expectativas, porque a sua
confiança na palavra de Jesus é respondida pelo convite a colaborar num empreendimento
muito maior do que ele poderia imaginar, um empreendimento que estimula o seu
entusiasmo messiânico.
A vocação é a experiência de cada cristão, sendo pessoal e diferente para cada um. O
trabalho pastoral deve favorecer o encontro com esta experiência, explicitá-la e fecundá-la
em ações concretas. Não deveriam a catequese e toda a pastoral estar orientadas para esta
experiência dos membros do povo de Deus? Só então poderemos falar de uma comunidade
cristã adulta que se reúne em torno da celebração da experiência da sua fé e dela
testemunha na sua vida quotidiana.
Ninguém se chama. A iniciativa vem de Deus e nada tem a ver com méritos ou
qualidades próprias porque não tem orçamento. O único requisito é estar disposto a
responder ao chamado divino, confiando na Sua força para aproveitar a própria
mediocridade. A princípio tem-se a impressão de que a resposta se desenrola numa
intersecção entre a generosidade e a arriscada decisão de confiar no projeto que Deus tem
para nós. Há nela alguma verdade, mas, com o passar do tempo, sobrepõe-se a verdade
mais profunda do Magnificat (cf. Lc 1, 46-55).
Em todos os casos, a chave está em depositar a confiança nAquele que chama. Maria
não diz que quer fazer a vontade de Deus, mas sim que a vontade de Deus seja feita nela (cf.
Lc 1,38). Se Deus é o protagonista da vocação, a resposta humana é a confiança naquele que
é capaz de realizá-la. São Paulo recorda que Deus escolheu a insignificância deste mundo
para confundir aqueles que se consideram sábios e para que ninguém se glorie diante de
Deus (cf. 1 Cor 1, 26-31).
A vocação é vivida mais pela sedução divina do que pelo raciocínio ou pelo
voluntarismo. A única condição exigida é a confiança nAquele que chama. Por outro lado, a
fidelidade à própria vocação traz consigo uma promessa de recompensa abundante. “Em
TRADUÇÃO 34
verdade vos digo que todo aquele que partir (...) por minha causa receberá o cêntuplo e
herdará a vida eterna” (Mt 19, 29).
O desapego (pobreza e humildade) só faz sentido quando o propósito é seguir. Sem abrir
mão dos próprios (coisas, pessoas, ideias) não há seguimento possível. Só no desejo
profundo de seguir a Cristo o desapego encontra sentido, porque se torna condição de
coerência e de consequência.
As meditações das duas bandeiras e dos três binários têm este propósito de estar
disposto a seguir Jesus, a identificar-se com Ele, a estar com Ele e a gostar de Ele. É a oração
de consequência radical, atingindo as profundezas do mesmo desejo. Não está no âmbito
das normas legais ou disciplinares, mas sim no horizonte do amor, ou melhor, do amante,
porque sabe que foi perdoado e convidado a participar na construção do Reino de Deus.
Seguir Jesus é inseparável da identificação com Ele. Pelo contrário, um seguimento que não
gera maior distanciamento é suspeito pela sua autenticidade.
Os Exercícios Espirituais são uma escola de educação para a liberdade cristã, para
escolher sempre o que agrada a Deus Pai e ao estilo de Seu Filho Jesus, sem apegos ou
preconceitos ou simpatias arrogantes. O desapego total (dos próprios bens, da própria fama,
de si mesmo) visa alcançar a liberdade filial no caminho do seguimento de Cristo para
colocar a própria vida ao serviço e ser instrumento de Deus na salvação da história.
Este dom da liberdade de estar ao serviço do Reino de Deus é o pano de fundo da oração
inaciana, é o reconhecimento da criatura diante do seu Criador, do filho que confia no Deus
Pai, fiel seguidor de Jesus na história, os dóceis à ação do Espírito na obra de libertação e
salvação da humanidade.
Tome Senhor e receba toda a minha liberdade, minha memória, meu intelecto, minha
vontade, tudo que tenho e possuo. Você me deu; Eu devolvo a Ti, Senhor. Tudo é Teu: em
tudo dispõe conforme a Tua vontade. Dá-me o teu amor e a tua graça e só isso me basta
(Exercícios Espirituais nº 234).
Neste seguimento de Jesus, o Evangelho oferece critérios claros sobre o estilo de vida
do discípulo: + Desapego: “Se queres ser perfeito”, diz Jesus ao jovem rico, “vai, vende tudo o
que tens e dá-o aos pobres, e você terá um tesouro no céu; então venha e siga-me" (Mt 19,
21).
+ Uma fraternidade que se constrói em torno de Jesus Cristo: “Vós, porém, não vos
deixeis chamar de Rabino, porque um só é o vosso Mestre; e todos sois irmãos. Pai é: aquele
que vem do céu. Nem vos deixeis chamar de Preceptores, porque só há um Preceptor: Cristo”
(Mt 23, 8-10).
+ O discípulo observa uma hierarquia de serviço: “seja o vosso servo o maior entre vós”
(Mt 23, 11); «Quem quiser ser o primeiro entre vós será vosso escravo; assim como o Filho do
Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida» (Mt 20, 26-28; cf. Mt 18, 1
- 4; Jo 13, 13-15). + O discípulo é chamado a anunciar o Evangelho e a curar: “e enviou-os a
anunciar o Reino de Deus e a curar” (Lc 9, 2; cf. Mc 3, 13-15).
Dia 13: O caminho da sabedoria "Eles não se preocupam, dizendo: O que vamos comer?
O que vamos beber? O que vamos vestir? Porque os gentios se preocupam com todas essas
coisas; porque o Pai deles já sabe celestiais que têm necessidade de tudo isso. Buscai
primeiro o seu Reino e a sua justiça, e estas coisas vos serão dadas em acréscimo" (Mt 6, 31-
33).
Jesus mostra o que uma pessoa pode ser quando Deus é verdadeiramente Deus em sua
vida. O Reino de Deus, coração da Boa Nova, adquire Nele a sua forma perfeita. A visão de
vida de Jesus é aquela que dá prioridade absoluta e incondicional à vontade de Deus. “Faço
sempre o que agrada a meu Pai” (Jo 8,29). “O meu alimento é fazer a vontade daquele que
me enviou e realizar a sua obra” (cf. Jo 4,34).
A vontade de Deus não pode ser reduzida a um formato de bolso ou a um meio prático e
eficaz para tentar alcançar, junto com outros meios, os próprios fins. A vontade de Deus é,
em última análise, o critério que mede todo o resto; e como transcende tudo, não pode estar
sujeito a nenhum valor humano, seja ele qual for. Deixar Deus ser Deus, isto é, deixar Deus
ser Deus, é uma prioridade absoluta: o seu reinado e a sua justiça vêm em primeiro lugar, e
todo o resto é secundário.
Jesus mostra que o Reino de Deus nunca se estabelece à custa dos seres humanos,
mas, pelo contrário, constitui a sua única felicidade. A vontade de Deus nada mais é do que
isto: que o ser humano seja plenamente humano. A soberania intangível do Pai é a única
garantia que o ser humano tem de poder ser verdadeiramente ele mesmo. O Reino de Deus
TRADUÇÃO 36
revela algo sobre Deus e algo sobre o ser humano: sobre Deus na sua relação com a
humanidade e sobre o ser humano na sua relação com o fundamento mais profundo da sua
existência e, consequentemente, do seu significado.
Jesus não só prega o Reino de Deus, mas antecipa-o na sua Pessoa, dando testemunho
da verdade (cf. Jo 18,37). Jesus é a encarnação da verdade, isto é, do amor e do cuidado de
Deus Pai para com a humanidade. Jesus é a revelação definitiva do ser de Deus, porque Nele,
seu Filho, o Pai se expressa inteiramente como Ele é (cf. Jo 14, 9-11).
A vida do ser humano é muitas vezes dividida entre o que ele quer e o que deve, entre o
sentido e a falta de sentido, entre o bem e o mal. Mas Cristo é vida. Portanto, viver a Sua Vida
é a única maneira de viver autenticamente a sua própria vida e ser você mesmo. Assim diz
São Paulo: «e já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim» (Gl 2,20). O velho homem,
dividido, falsificado e, no entanto, tão real, opõe-se à vida de Cristo no ser humano, embora
tenha absoluta necessidade dela. Esta oposição deve ser mortificada (condenada à morte).
Assumir Cristo na vida envolve trabalho, trevas, purificação porque é preciso passar pelo
processo de conversão. Essa dor é produto da dureza do coração humano.
Alguém se pergunta como Jesus fez isso. Pois bem, Ele mesmo revela o seu segredo em
TRADUÇÃO 37
cada página do Evangelho: a sua orientação total para o Pai. O Pai era tudo para Ele. Seu
relacionamento com Ele era a fonte da qual Sua vida fluía. Ele estava tão certo do amor do
Pai que não se preocupava consigo mesmo. Esta proximidade com o Pai permitiu-lhe doar-se
completamente aos outros. O amor que Ele recebeu de Seu Pai era o segredo de Sua própria
caridade para com os outros.
Jesus ensina que o ser humano não é o centro da sua própria vida. “Quem quiser
salvar a sua vida, perdê-la-á, mas quem perder a sua vida por minha causa, encontrá-la-á” (Mt
16,25). Quando você aceita Cristo como o centro de sua vida, tudo se encaixa em seu devido
lugar e você ganha perspectiva, harmonia e paz.
Jesus não se colocou no centro de sua própria vida. Pelo contrário, para Ele o
crescimento ocorre por não cuidar de si; A vitória é alcançada colocando-se em último lugar;
É dando-se que se recebe; a vida brota da morte (cf. Jo 12, 24); a glória surge da cruz; Para
viver e se desenvolver é preciso morrer. Esses paradoxos ultrapassam e excedem a
capacidade de compreensão humana.
Se você não se assemelhar a Cristo, você falha diante de Deus e dos outros. Gandhi
costumava dizer que gostava de Cristo, mas não gostava dos cristãos, porque eram muito
pouco parecidos com ele. Um jovem africano comentou: “Estamos cansados de tantas
pessoas que não têm nada além de Cristo na boca, mas gostaríamos muito de encontrar
alguém que fosse verdadeiramente como ele”.
O famoso psicanalista suíço C. G. Jung disse que um terço de seus pacientes não sofria
de nenhuma neurose ou psicose, mas sim de uma incapacidade de dar sentido às suas
vidas. Também Victor Frankl, psiquiatra judeu nascido em Viena e que passou três anos nos
campos de concentração de Auschwitz e Dachau, baseia toda a sua logoterapia na procura
do ser humano por uma razão para viver, e a sua tese fundamental é que a principal força
motriz da o ser humano é o desejo de encontrar uma razão para viver.
TRADUÇÃO 38
A vida do cristão será comparada com a de Cristo e a partir desse confronto será
decidida a sua autenticidade. Cristão é aquele que encontrou em Cristo o sentido da sua
existência, na sua imitação e seguimento, e num crescimento cada vez maior Nele.
Pedido de Graça
Peça ao Senhor o conhecimento dos enganos do líder maligno e ajuda para se defender
deles, bem como o conhecimento da vida autêntica demonstrada pelo capitão supremo e
verdadeiro e a graça de imitá-lo (Exercícios Espirituais nº 139).
A vida cristã não consiste num itinerário simples, calmo e progressivo de assimilação à
Pessoa de Jesus Cristo, mas, pelo contrário, faz-se a experiência quotidiana de fazer o que
não se quer e de não fazer o que se quer. “Na verdade”, diz São Paulo, “não compreendo o
meu comportamento; pois não faço o que quero, mas faço o que odeio. (...) Tenho em meu
poder querer o bem, mas não posso faça-o, pois não faço o bem que quero, mas faço o mal
que não quero” (Rm 7, 15-19).
TRADUÇÃO 39
Há uma tendência a considerar a vida espiritual, bem como a situação pastoral, num
aspecto linear: evolutivo ou progressivo quando vai do mal para o bem e do bom para o
melhor, e involutivo ou regressivo quando vai do bom para pelo menos bom e até mesmo
chegar ao mal Além disso, tendemos a ficar frustrados quando tal desenvolvimento não
ocorre ou quando ocorre muito lentamente. Assim, denuncia-se o declínio da fé, da
frequência dominical, e almeja-se os tempos passados.
Mas a vida quotidiana do cristão não responde a este esquema simplista, porque a vida
espiritual é uma luta constante contra a atração dos ídolos. O caminho cristão mede-se não
só pelo metro do caminho percorrido, mas também pelo metro dos obstáculos superados e
dos assaltos aos quais resistiu.
entendida num contexto apostólico para sublinhar a profunda liberdade do discípulo. Não se
trata de masoquismo, mas de estar disposto a não ser compreendido e até criticado na
missão de anunciar o Evangelho. O indivíduo se constrói como pessoa aderindo e se
conformando a um sistema de valores que cria um estilo pessoal. O horizonte de valores
define a pessoa porque são os seus próprios objetivos, a razão dos seus esforços, a sua
forma de compreender o mundo e de agir na sociedade.
Os valores da sociedade atual são os objetivos que contam, aquilo pelo que as pessoas
são valorizadas. Esses valores giram em torno de riqueza, honra, prestígio, poder. Diante
destes valores, Jesus oferece os seus: simplicidade, pobreza, misericórdia; a opção pelos
pequenos, pelos marginalizados, pelos desamparados.
Há três personagens, três pequenos, no Evangelho que nos ajudam a refletir sobre os
valores de Jesus: Zaqueu (cf. Lc 19, 1 -10), o Publicano (cf. Lc 18, 9 -14) e a Viúva (cf. Marcos
12, 41-44).
Zaqueu é um homem rico que, ao ouvir que Jesus ia passar, sai para vê-lo, mas é de
baixa estatura e a multidão que cerca Jesus o impede de fazê-lo. Às vezes o ambiente
humano impede-nos de chegar a Jesus; Mesmo aqueles que se dizem amigos e seguidores
são como um muro que também dificulta a aproximação. Mas Zaqueu sobe em uma árvore,
sem se importar em fazer papel de bobo, porque seu desejo é sincero. Jesus o vê e concorda
em comer em sua casa. A visita de Jesus produz uma profunda conversão em Zaqueu, que
se compromete a dar metade do que tem aos pobres e a restituir quatro vezes mais àqueles
a quem enganou.
Por fim, há a viúva, mulher pobre e discreta, que, sem ser vista por ninguém, atira a sua
moeda ao mato e entra no Templo. Ninguém a nota, ninguém a vê; exceto Jesus. Os ricos
passam com a esmola, mas Jesus nota a viúva pobre.
O que é levantado nesta parábola inaciana não é tanto o desapego físico de um objeto
material, mas o apego às coisas que impede fazer não apenas o que é certo, mas também o
que é melhor aos olhos de Deus. Não se trata da busca de uma perfeição legalista (ética),
mas sim do caminho rumo a uma liberdade profunda (espiritualidade) para poder escolher
segundo a vontade de Deus. Não é cumprimento, mas monitoramento. Não se trata da
decisão entre o bem e o mal, mas a aquisição de uma liberdade interior para poder escolher
segundo a mentalidade de Deus Pai e o estilo do Filho Jesus.
“Eles não ficam preocupados, dizendo: O que vamos comer? que. Buscai primeiro o seu
Reino e a sua justiça, e estas coisas vos serão dadas em acréscimo” (Mt 6, 31-33).
Jesus mostra o que uma pessoa pode ser quando Deus é verdadeiramente Deus em sua
vida. O Reino de Deus, coração da Boa Nova, adquire Nele a sua forma perfeita. A visão de
vida de Jesus é aquela que dá prioridade absoluta e incondicional à vontade de Deus. “Faço
sempre o que agrada a meu Pai” (Jo 8,29). “O meu alimento é fazer a vontade daquele que
me enviou e realizar a sua obra” (cf. Jo 4,34).
A vontade de Deus não pode ser reduzida a um formato de bolso ou a um meio prático e
eficaz para tentar alcançar, junto com outros meios, os próprios fins. A vontade de Deus é,
em última análise, o critério que mede todo o resto; e como transcende tudo, não pode estar
sujeito a nenhum valor humano, seja ele qual for. Deixar Deus ser Deus, isto é, deixar Deus
ser Deus, é uma prioridade absoluta: o seu reinado e a sua justiça vêm em primeiro lugar, e
todo o resto é secundário.
Jesus mostra que o Reino de Deus nunca se estabelece à custa dos seres humanos,
mas, pelo contrário, constitui a sua única felicidade. A vontade de Deus nada mais é do que
isto: que o ser humano seja plenamente humano. A soberania intangível do Pai é a única
garantia que o ser humano tem de poder ser verdadeiramente ele mesmo. O Reino de Deus
revela algo sobre Deus e algo sobre o ser humano: sobre Deus na sua relação com a
humanidade e sobre o ser humano na sua relação com o fundamento mais profundo da sua
existência e, consequentemente, do seu significado.
TRADUÇÃO 42
Jesus não só prega o Reino de Deus, mas antecipa-o na sua Pessoa, dando testemunho
da verdade (cf. Jo 18,37). Jesus é a encarnação da verdade, isto é, do amor e do cuidado de
Deus Pai para com a humanidade. Jesus é a revelação definitiva do ser de Deus, porque Nele,
seu Filho, o Pai se expressa inteiramente como Ele é (cf. Jo 14, 9-11).
A vida do ser humano é muitas vezes dividida entre o que ele quer e o que deve, entre o
sentido e a falta de sentido, entre o bem e o mal. Mas Cristo é vida. Portanto, viver a Sua Vida
é a única maneira de viver autenticamente a sua própria vida e ser você mesmo. Assim diz
São Paulo: «e já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim» (Gl 2,20). O velho homem,
dividido, falsificado e, no entanto, tão real, opõe-se à vida de Cristo no ser humano, embora
tenha absoluta necessidade dela. Esta oposição deve ser mortificada (condenada à morte).
Assumir Cristo na vida envolve trabalho, trevas, purificação porque é preciso passar pelo
processo de conversão. Essa dor é produto da dureza do coração humano.
Alguém se pergunta como Jesus fez isso. Pois bem, Ele mesmo revela o seu segredo em
cada página do Evangelho: a sua orientação total para o Pai. O Pai era tudo para Ele. Seu
relacionamento com Ele era a fonte da qual Sua vida fluía. Ele estava tão certo do amor do
Pai que não se preocupava consigo mesmo. Esta proximidade com o Pai permitiu-lhe doar-se
completamente aos outros. O amor que Ele recebeu de Seu Pai era o segredo de Sua própria
TRADUÇÃO 43
Jesus ensina que o ser humano não é o centro da sua própria vida. “Quem quiser
salvar a sua vida, perdê-la-á, mas quem perder a sua vida por minha causa, encontrá-la-á” (Mt
16,25). Quando você aceita Cristo como o centro de sua vida, tudo se encaixa em seu devido
lugar e você ganha perspectiva, harmonia e paz.
Jesus não se colocou no centro de sua própria vida. Pelo contrário, para Ele o
crescimento ocorre por não cuidar de si; A vitória é alcançada colocando-se em último lugar;
É dando-se que se recebe; a vida brota da morte (cf. Jo 12, 24); a glória surge da cruz; Para
viver e se desenvolver é preciso morrer. Esses paradoxos ultrapassam e excedem a
capacidade de compreensão humana.
Se você não se assemelhar a Cristo, você falha diante de Deus e dos outros. Gandhi
costumava dizer que gostava de Cristo, mas não gostava dos cristãos, porque eram muito
pouco parecidos com ele. Um jovem africano comentou: “Estamos cansados de tantas
pessoas que não têm nada além de Cristo na boca, mas gostaríamos muito de encontrar
alguém que fosse verdadeiramente como ele”.
O famoso psicanalista suíço C. G. Jung disse que um terço de seus pacientes não sofria
de nenhuma neurose ou psicose, mas sim de uma incapacidade de dar sentido às suas
vidas. Também Victor Frankl, psiquiatra judeu nascido em Viena e que passou três anos nos
campos de concentração de Auschwitz e Dachau, baseia toda a sua logoterapia na procura
do ser humano por uma razão para viver, e a sua tese fundamental é que a principal força
motriz da o ser humano é o desejo de encontrar uma razão para viver.
A vida do cristão será comparada com a de Cristo e a partir desse confronto será
decidida a sua autenticidade. Cristão é aquele que encontrou em Cristo o sentido da sua
existência, na sua imitação e seguimento, e num crescimento cada vez maior Nele.
TRADUÇÃO 44
O jovem não fica satisfeito com a resposta porque quer mais. Jesus, diz o Evangelho,
olhou para ele com carinho e amou-o (cf. Marcos 10,21). Então, ele lhe oferece um convite,
não um mandamento. Como um dom muito especial “Só te falta uma coisa: vai, vende tudo o
que tens e dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu; depois vem e segue-me” (Mc 10, 21).
Somente na pobreza Deus se torna verdadeiramente tudo. Contudo, Jesus toca o jovem
no seu ponto vulnerável. Este é o radicalismo do Evangelho, porque é sempre específico, pois
o convite de Cristo é pessoal. A pobreza é uma condição de seguimento: “qualquer um de
vós que não renuncia a todos os seus bens não pode ser meu discípulo” (Lc 14,33).
Jesus destaca o perigo das posses porque as posses tendem a possuir a pessoa. Diante
da rejeição do jovem rico, Jesus insiste: “Quão difícil será para quem tem riquezas entrar no
Reino de Deus” (Mc 10,23). Não era comum um homem jovem, rico e educado se candidatar
para ser discípulo de Jesus. Contudo, Jesus não faz concessões porque a verdade é uma só
e o seu convite é autêntico.
Os discípulos ficam maravilhados e surpresos (cf. Marcos 10, 24). Jesus tenta fazê-los
compreender que não se pode ter dois senhores na vida. O fator determinante é se o
encontro com Cristo leva a uma escolha radical: reconhecer Jesus como único Senhor e,
portanto, não deixar que nada nem ninguém compartilhe deste senhorio.
Os discípulos ficam ainda mais maravilhados porque perguntam entre si quem pode ser
salvo (cf. Marcos 10,26). Só quando você tem consciência da impossibilidade do Evangelho,
só então você começa a vivê-lo, porque é verdadeiramente impossível vivê-lo. Você só inicia
o caminho do seguimento quando experimenta a necessidade da graça para poder assumir o
Evangelho como estilo de vida, porque nesse momento você começa a confiar em Deus e
não nas suas próprias forças.
alguém.
Jesus conclui com muita clareza: “aos homens é impossível, mas a Deus não, porque a
Deus tudo é possível” (Mc 10, 27). Somente construindo sobre a força de Deus é que a
realização do Evangelho como estilo de vida se torna possível. Ele realizará sua obra de
salvação na medida em que alguém estiver disposto a abandonar-se em Suas mãos e deixá-
Lo agir em sua vida. Depois de ter renovado a decisão de seguir a Cristo, aprofunda-se o
caminho de conhecer interiormente Aquele que se segue. É a dinâmica de conhecer melhor,
de amar profundamente e de servir com maior liberalidade.
Deus, por amor à humanidade, sai de si assumindo a condição humana. Deus recria a
humanidade a partir de si mesma, assumindo fragilidades e limitações, para oferecer aos
homens o seu projeto de salvação e de libertação autêntica. Inácio sublinha que esta opção
divina, opção que inclui nascer “na extrema pobreza, e depois de tantos trabalhos de fome,
sede, calor e frio, insultos e afrontas, morrer na Cruz” (Exercícios Espirituais nº 116), esta
opção é "para mim".
TRADUÇÃO 46
Oscar Wilde (1854 -1900) disse certa vez que “vivemos numa sociedade que sabe muito
bem o preço de tudo, mas não sabe o valor de nada”. Preços e valores. Uma sociedade em
que predomina a preocupação com a tabela de preços e há tendência para o esquecimento
das tabelas de valores. Se por um lado o preço é a quantidade em que uma coisa é estimada,
avaliada, por outro lado o valor é a extensão do significado ou importância de uma coisa.
Nunca uma sociedade se mudou tão rapidamente para qualquer lugar, porque se
preocupa com a forma como se vive, mas não pergunta por que se vive. Albert Einstein (1879
-1955) comentou que em épocas anteriores o ser humano tinha clareza de objetivos, mas
TRADUÇÃO 47
Somente valores (objetivos) dão sentido à vida. Os preços apenas indicam o poder de
compra, quanto custa, mas nunca indicam o seu valor, se vale a pena, porquê e porquê.
Somente o valor dá peso e direção ao que se faz como expressão de quem se é.
Ser cristão, ser missionário não nos isenta deste olhar humano. Em primeiro lugar,
somos pessoas humanas e filhos do nosso tempo. Você não está falando sobre os outros,
mas sobre você mesmo. Esse olhar está muito presente em cada um de nós porque nele
nascemos e nele crescemos. A questão é se ele está contagiado por esse olhar; mas não é
fácil responder honestamente. Às vezes a cabeça pensa de um jeito devido à formação
recebida, mas o coração vai para outro já que somos seres humanos.
São Paulo, na Carta aos Romanos, adverte: “Não vos conformeis com o mundo presente,
mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que possais distinguir o que é a
vontade de Deus: o que é bom, o que é agradável , o que é perfeito." " (Rom 12, 2). Por isso,
convida-nos a ter «os mesmos sentimentos de Cristo» (cf. Fl 2, 5).
Ao olhar para o Menino Jesus vale a pena perguntar: O que esta criança precisa de mim?
O que posso te dar? O que eu quero dar a ele? Ao entrar na cena do Nascimento, podereis
contemplar o carinho e a ternura de Maria enquanto olha e abraça o seu Filho. O bispo Fulton
TRADUÇÃO 48
Sheen, um americano conhecido por seus escritos sobre espiritualidade durante as décadas
de 1960 e 1970, disse: “Ninguém pode amar algo a menos que possa abraçá-lo”.
que isso aconteça; É a capacidade de não se surpreender com a própria fraqueza ou com a
dos outros; É a coragem de expressar sentimentos e demonstrar ternura.
+ Acolher o Deus que se aproxima com uma Criança na mão porque este Deus não se
aproxima com poder mas com fraqueza; Não se impõe, mas bate à porta; Ele não fala do
Sinai, mas de uma manjedoura.
Jesus disse a Nicodemos: “Em verdade, em verdade te digo: ‘A menos que alguém nasça
do alto, não pode ver o Reino de Deus’. Nicodemos respondeu: ‘Como pode um homem
nascer sendo já velho? entrar?' uma vez no ventre de sua mãe e nascer de novo?" (Jo 3, 3-4).
Nicodemos expressa todo o ceticismo e a relutância do “velho” que não acredita ser
possível viver como adulto as atitudes que o Evangelho chama de “tornar-se como criança”,
isto é, confiar, abandonar-se, ser simples, ter a capacidade de admiração, de saber-se amado,
de segurança de estar em boas mãos, etc.
A Encarnação é fruto totalmente gratuito da iniciativa divina. Deus é o Pastor que cuida
do seu rebanho (cf. Jo 10, 11-15) e o Pai atencioso (cf. Lucas 15, 11-32) que se emociona
com a miséria humana. Deus não quer que os homens sofram porque a sua glória consiste
precisamente na realização plena do ser humano. Na experiência da Criação foi a presença
do pecado que introduziu a dor, isto é, a negação humana diante do Criador (cf. Gn 3, 14-24).
O ser humano rejeita a sua condição de criatura e quer fazer as coisas à sua maneira,
TRADUÇÃO 50
introduzindo assim grandes rupturas em si mesmo e na sua relação com os outros. Deus
vem propor a libertação, oferecendo o perdão. Com isso, Deus quer fazê-lo compreender que
apesar das suas falhas e pecados, ele é sempre amado por ele.
Esta grande verdade está contida na parábola dos arrendatários assassinos. Depois de
ter enviado os seus servos (os profetas), o dono da vinha envia o seu próprio filho (cf. Mc 12,
6). No diálogo com Nicodemos, o próprio Jesus explica a sua missão: «Porque Deus amou o
mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigénito, para que todo aquele que nele crê não
pereça, mas tenha a vida eterna. condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por
Ele” (Jo 3, 16-17).
Deus não envia uma mensagem, mas Ele mesmo a faz na Encarnação. O Filho de Deus,
feito homem, transmite a mensagem não só com palavras, mas com a própria vida. Isto
implica kenosis (esvaziamento de si mesmo) porque "sendo divino na forma, ele não reteve
ansiosamente a igualdade com Deus. Mas esvaziou-se a si mesmo, assumindo a forma de
um servo, nascendo à semelhança dos homens e aparecendo na aparência como um servo".
homem; e humilhou-se, obedecendo até à morte, morte de cruz” (Fl 2, 6-8).
Neste caminho de salvação, Deus segue esta lógica de aniquilação. Antes Dele tinha
todo o Império Romano com toda a sua cultura e em toda a sua extensão, mas não escolheu
os centros movimentados da tecnologia ou da arte, da política ou da ciência, mas um recanto
escondido desse imenso Império Romano: o território ocupado da Palestina . Os governantes
romanos não tinham uma opinião melhor sobre os judeus que viviam lá. Na verdade, Tácito
os descreve como um rebanho dos escravos mais miseráveis e como um povo nojento. No
entanto, Deus escolhe essas pessoas.
Pero su elección va más lejos: dentro de Palestina se fija precisamente en la región más
despreciada y atrasada, Galilea, y, dentro de Galilea, la aldea de Nazaret que ni siquiera tenía
historia y era tan ignorada que su nombre no aparece ni en el Antigo Testamento. A
Encarnação é o mistério do último lugar.
O início do mistério da Encarnação pode ser resumido nas três fases deste diálogo:
+ Deus toma a iniciativa e se aproxima; o ser humano duvida + Deus propõe; o ser
humano pede + Deus age; o ser humano arrisca Maria arrisca-se e torna-se fecunda, com a
própria fecundidade do Espírito Santo, que excede todas as forças humanas. Com Maria, o
crente também pode pronunciar o seu Magnificat e acreditar que Deus também pode usá-lo,
pois tantas vezes escolhe instrumentos fracos quando estes aceitam servir e pronunciar o
seu humilde decreto. Só num sim a Deus a vida pode ser verdadeiramente fecunda e
construir o Reino de Deus.
Através do sim de Maria, Filho de Deus, ele se fez homem e partilhou a vida humana,
experimentando o que significa ser humano. Ele sabe o que é ter um corpo, sofrer limitações,
ser dominado, sofrer injustiças. Ele sabe o que significa submeter-se a leis que não são
perfeitamente adaptadas; conhece o sofrimento de viver em um ambiente que não pode ser
transformado. Ele conhece todas essas coisas por experiência própria porque fazem parte
da condição humana. Se o Filho de Deus escolheu a vida humana, a vida humana vale a pena.
Mas Jesus não partilhou apenas a condição humana, mas também o dom da filiação
divina, partilhou o que lhe era próprio, isto é, o amor do seu Pai. Muito mais que simples
homens e mulheres, somos filhos de Deus, irmãos e irmãs de Cristo, templos do Espírito
Santo, testemunhas da sua verdade e do seu amor. E graças a esses dons você pode
comunicar vida e carinho aos outros.
A Encarnação ocorreu num momento preciso da história, mas também se pode dizer que
é um processo permanente. Em cada momento de sua existência, Jesus é plenamente ele
mesmo, mas em Nazaré encarnou-se no ventre de Maria, em Belém tornou-se visível, em
Nazaré cresceu... Depois da Ressurreição Cristo continua a ser vida em nós e deseja crescer
TRADUÇÃO 52
em cada um de nós. O seu corpo místico continua a difundir-se ao longo da história (cf. Ef 1,
22-23; Gal 3, 27-28; Col 1, 18-19). “E “quando todas as coisas lhe forem submetidas, então
também o Filho se submeterá àquele que todas as coisas lhe submeteu, para que Deus seja
tudo em todos” (1 Coríntios 15:28).
Dia 20: A vida escondida O Evangelho conta que Jesus desceu com seus pais para
Nazaré e “se submeteu a eles” e, entretanto, o menino Jesus “cresceu em idade, em
sabedoria e em graça diante de Deus e dos homens” (Lc 2 , 51 -52).
Estas palavras recordam-nos que o crescimento do Reino de Deus está oculto; que o
silêncio e a pobreza são tesouros escondidos; que as coisas de Deus são conhecidas com o
coração e na fidelidade; que o próprio Filho se habituou a ser homem nas trevas da vida
quotidiana, a partir do trabalho anónimo numa pequena e perdida aldeia.
Noventa por cento da vida de Jesus (trinta de trinta e três) foi passada na insignificante
aldeia de Nazaré. São Lucas é explícito a este respeito (cf. Lucas 2, 39-40 e 51-52). Os
Evangelhos não cultivam simplesmente o gosto pelo mistério. Portanto, há uma mensagem
em Nazaré que deve ser decifrada e atualizada de uma forma ou de outra, porque constitui
um convite a partilhar mais intimamente a compreensão de Cristo sobre a sua missão e a
estendê-la cuidadosamente na própria vida.
Uma das características mais evidentes de Nazaré é a sua insignificância: não passava
de uma pequena cidade atrasada, desligada dos centros do mundo da época. Ao mesmo
tempo, o povo de Nazaré não tinha a menor ideia dos grandes centros metropolitanos. Jesus
passou muitos anos em Nazaré, no meio de uma população cujo conhecimento do mundo
praticamente não ia além do que a vista alcançava.
não aparecem em lugar nenhum. E Jesus, diz o Evangelho, viveu em submissão. Jesus viveu
em Nazaré o heroísmo do comum, aquela rotina diária que exige uma forma própria de
coragem.
É de se perguntar se esses anos foram uma perda de tempo, se não houve coisas mais
importantes para fazer. Mas será que esta pergunta não pode refletir também o erro de não
descobrir o que há de mais importante na vida? O fundamental na vida do crente é
permanecer em Deus (cf. Jo 15, 4) e tudo o mais está subordinado a isso. Se este horizonte
vital se perder, todo o resto não terá valor. Os judeus perguntam a Jesus: o que devemos
fazer para realizar as obras de Deus? e Ele lhes responde: “A obra de Deus é que acrediteis
naquele que Ele enviou” (Jo 6,29). O talento fundamental é acreditar em Cristo.
A lição de Nazaré é que Deus realmente tem prioridade em tudo e isso leva tempo. É
preciso estar em último lugar por um certo tempo para deixar crescer em mim a convicção
de que Deus é o que é verdadeiramente importante na vida de alguém. Para fazer isso, você
deve recuar para a própria Nazaré.
Maria aceita Jesus tal como ele era, o que significa que o recebeu como diferente; mas
não diferente como qualquer ser humano é em relação a outro, mas completamente
diferente: como o Filho de Deus, no sentido pleno da palavra.
Quando Jesus sai do Templo em Jerusalém, ele leva o templo consigo. A casa do seu
Pai está sempre onde Jesus vive, mesmo em Nazaré. A sua constante consciência de estar
em comunhão íntima com o Pai torna toda a sua vida semelhante a um templo. Porque Ele
viveu continuamente em Seu Pai, Jesus era verdadeiramente um templo vivo. A proximidade
com Jesus renova o apelo a segui-lo e com ele e através dele traduzir este amor num
compromisso concreto de serviço aos outros, permitindo-lhe deixar a sua marca na própria
TRADUÇÃO 54
vida.
Cristo é a razão da vida sacerdotal. Para Ele ele levanta cedo todas as manhãs ou, outras
vezes, fica acordado até tarde; para Ele a pessoa morre para seus próprios prazeres e
confortos; Para Ele, parte da vida fica em cada missão designada; Através Dele chega aos
mais pobres, aos doentes, aos desanimados, a todos os que necessitam de uma palavra de
encorajamento. Através Dele alguém se eleva depois de reconhecer a própria queda.
No Evangelho é apresentado um Jesus que não tem onde reclinar a cabeça (pobre), que
deve ser repreendido pelos mais velhos, pelos sumos sacerdotes e pelos escribas (injuriados
e desprezados, humilhados). Este Jesus é chamado a seguir; ao Jesus pobre e humilhado,
com cuja vida contrastam as ambições, o desejo de sucesso, as vaidades, o desejo de posse,
típicos do tempo atual.
São Paulo convoca o seguidor de Jesus a ter “os mesmos sentimentos de Cristo”.
Aquele que "sendo divino na forma, não considerou avidamente a igualdade com Deus, mas
esvaziou-se, assumindo a forma de servo, nascendo à semelhança dos homens e
aparecendo na aparência como homem; e humilhou-se, obedecendo até morte e morte de
cruz" (Fl 2, 6-8).
Inácio convida você a entrar em contato profundo com o Jesus do Evangelho, deixando-
O dizer quem Ele é através do que disse e fez durante Sua vida em Israel. Na catequese
ensina-se à criança quem é Jesus, mas o adulto cristão não pode permanecer com estas
imagens porque deve descobrir, por si mesmo e na comunidade, no encontro com Jesus, a
identidade mais profunda daquele que chama.
A Lectio divina é uma leitura orante da Sagrada Escritura que visa entrar no plano divino,
é um método evangélico para a transformação do coração pelo contato direto com a Palavra
de Deus. “Se um texto não te muda, significa que você não o leu” (G. Soares-Prabhu). A
Lectio divina tem quatro etapas:
Ler a Bíblia é um processo que consiste em três questões-chave: O que diz o texto? O
respeito pelo texto exprime-se na renúncia a impor qualquer ideia anterior, a retirar ou
acomodar qualquer coisa dele. Busca-se uma leitura objetiva e humilde. Leia o texto devagar
do início ao fim, releia e aos poucos os detalhes vão aparecendo e cada palavra faz sentir
TRADUÇÃO 56
seu peso. Trata-se de captar as ideias principais, aprofundar o sentido (consultar possíveis
textos paralelos, ler um comentário, etc.), contextualizá-lo, revisá-lo na própria imaginação.
O que o texto me diz (nós)? Associar o texto à vida e à própria vida, buscando luzes
que iluminem o significado profundo dos acontecimentos e o discernimento sobre o próprio
comportamento.
O que o texto me faz dizer? Pode ser o compunção do coração, a súplica, a gratidão, a
entrega.
Esse processo, no fundo, é o passo entre ter ouvido e sido contado até agora que
conheço você e vivenciei o encontro. Nas palavras de Jó: Eu te conhecia apenas por ouvir
dizer, mas agora meus olhos te viram (Jó 42, 5).
A contemplação da vida de Jesus é o pano de fundo para ordenar a vida segundo Deus
Pai, quer no caso de fazer a escolha do estado de vida, quer no caso de procurar o reencontro
(uma reforma na reconfirmação) com a vocação originária. Da Bíblia à Vida e da Vida à Bíblia.
Jesus se sente interpretado pelas palavras de João e entra na fila esperando sua vez. Jesus
não pede privilégios ou exceções. Jesus une-se à humanidade e escolhe partilhar a nossa
vida, mostrar solidariedade com a humanidade. Portanto, a solidariedade de Cristo não se
limita a misturar-se com todas as pessoas, mas envolve também a partilha da culpa e do
pecado humanos.
João fica escandalizado mas Jesus insiste porque quer receber o batismo de João, ou
seja, quer ser tratado como pecador. Mais tarde, esta solidariedade chega a tal extremo que
Jesus se tornará pecado. “Ele fez pecado por nós aquele que não conheceu pecado, para que
nele nos tornássemos justiça de Deus” (2 Cor 5:21).
Os céus se abrem e ouve-se uma voz: “Este é o meu Filho amado, em quem me
TRADUÇÃO 57
comprazo” (Mt 3,17). Esta frase é tirada do Antigo Testamento, sendo o primeiro versículo do
primeiro cântico do Servo de Javé: “Eis o meu servo, a quem sustento, o meu escolhido, em
quem a minha alma se compraz” (Is 42, 1). Os judeus conheciam as Escrituras e nesta frase
há uma clara referência às profecias que falavam do Messias que estava por vir.
Os quatro cânticos do Servo de Javé apresentam este Messias que havia de vir. Nestas
profecias podem ser destacados três elementos: (a) o Servo é enviado para cumprir uma
missão em nome de Javé (cf. Is 50, 4); (b) o Servo é enviado para servir o povo, para libertá-lo
(cf. Is 42, 3); e (c) o Servo pagará o preço, ou seja, a entrega completa de si mesmo (cf. Is
53,3). A vida do Servo, através da dor, dará frutos.
Ao ser batizado, Jesus aceita o conteúdo dos quatro cânticos sobre o Servo de Javé.
Jesus esvazia-se para cumprir a vontade de Deus; Jesus se coloca totalmente disponível.
São Paulo explica que os cristãos são batizados em Cristo, na sua morte, sendo Ele
sepultado pelo batismo para que, como Cristo, também sejam “ressuscitados dentre os
mortos pela glória do Pai” e assim “vivam uma vida nova” ( Rm 6, 1-4). O Baptismo significa
abrir-se e acolher a opção de Cristo para que ele continue a viver e a agir através da vida do
cristão hoje na história.
São três tentações e três são as respostas de Jesus: (a) diante da tentação de
transformar a pedra em pão, Jesus responde que o homem não vive só de pão; (b) diante da
tentação de receber o poder e a glória dos reinos, Jesus responde que é necessário adorar
somente a Deus; e (c) diante da tentação de se atirar dos beirais do Templo de Jerusalém
para ser defendido pelos anjos, Jesus responde que Deus não deveria ser tentado. “Se és
Filho de Deus, manda que essas pedras se transformem em pães” (Mt 4, 3). É o desejo de
apropriar-se, em vez de receber; o desejo de controlar a própria vida, em vez de viver de
mãos abertas. Os milagres não podem ser a base da nossa confiança em Deus; Você
simplesmente tem que confiar Nele, aconteça o que acontecer. Viver da Divina Providência é
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viver de mãos abertas. No contexto de uma sociedade de consumo isto torna-se ainda mais
difícil porque estamos habituados a tirar tudo o que podemos apropriar. Pelo contrário, Deus
convida-nos a viver numa atitude de receptividade, em vez de vindicação.
“Se és Filho de Deus, atira-te abaixo” (Mt 4, 6). É a tentação de restaurar o Reino de
Deus por meios humanos, através da ostentação, do banho das multidões, de gestos que
impressionam o mundo. Mas tudo isto é apenas um momento de entusiasmo, em vez de um
crescimento sólido e paciente. Pode ser que o Reino de Deus progrida em proporção direta
ao declínio da popularidade de alguém. Tentar impressionar os outros, pedindo a sua
aprovação, pode ser uma tentação muito real.
“Tudo isso te darei se você se prostrar e me adorar” (Mt 4, 9) É a tentação mais astuta
porque é adorar outras coisas que não a Deus. “Cuidado com os ídolos”, escreve João (1 Jo
5, 21). O orgulho raramente é uma rebelião aberta contra Deus porque seria muito grosseiro;
antes, o orgulho sempre coloca algo próximo a Deus. É a tentativa prática de servir a dois
senhores (cf. Mt 6,24). Às vezes, um princípio ou ideia é divinizado e todo o resto é
subjugado.
As tentações não visam tanto questionar a própria missão, mas sim o modo de realizá-
la. A questão chave é: Qual é o estilo messiânico? Qual é o estilo de Deus? Jesus sofre as
tentações de um messianismo régio, populista, brilhante, fácil e altamente espetacular.
Todos são atalhos para pular a cruz.
Jesus resiste às tentações porque escolhe o estilo do Pai, confia nele completamente,
até estar disposto a aceitar a aparente impotência do amor e da simplicidade quotidiana.
Também hoje o apostolado do espetáculo de massa sem chegar ao coração dos homens e
das mulheres continua a ser uma tentação. Pergunta-se como será possível fazer o bem sem
recorrer à eficiência, à riqueza e ao poder.
São Paulo diz que quem semeia miséria colhe miséria; Aquele que colhe generosamente
com generosidade (cf. 2 Cor 9, 6-10). A generosidade está colocada nos meios ou na pessoa
que se entrega com autenticidade, confiando n'Aquele que é o Protagonista da
Evangelização?
para admirar o trabalho. Não há nada além de solidão. O deserto é o lugar da verdade, que
mostra qual é a verdadeira inspiração da vida. Se você busca a Deus, e somente a Deus,
então você pode ir para o deserto sem medo, porque você tem certeza de que Deus está lá.
Mas se, pelo contrário, você espera algo mais da vida do que Deus, você não deve ir, porque
aquilo que você procura não pode ser encontrado lá.
Testado em tudo
O lugar ocupado pela história das tentações, logo após a narração do Batismo, revela a
importância que os evangelistas atribuíram a este acontecimento. A realidade das tentações
na vida de Jesus contém uma Boa Nova porque (a) põe em evidência um Jesus que foi
provado em tudo como todos (cf. Hb 2, 17-18; 4, 15), e ( b ) esclarece o discípulo sobre como
enfrentar as tentações.
Por um lado, «não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas
fraquezas» (Hb 4,15) e, por outro lado, «tendo sido provado no sofrimento, é capaz de ajudar
aqueles que são provados " (Hb 2, 18).
Na vida de Jesus, as tentações eram uma realidade: a tentação de abusar do seu poder
constituía para ele um perigo sempre presente. Ao longo da sua vida, e até ao fim, Jesus teve
de enfrentar situações que puseram em causa o significado e o espírito da sua missão. Estas
tentações não se limitam ao episódio do deserto, mas espalham-se por toda a Sua vida.
Diante da questão de quem sou eu?, Pedro responde: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus
vivo” (cf. Mt 16, 13-23). Depois Jesus começa a explicar o escândalo da cruz e a preparar os
apóstolos através do primeiro anúncio explícito da Paixão. Mas Pedro o chama de lado e
tenta dissuadi-lo. Jesus reage: “Saia da minha frente, Satanás! Você é uma pedra de tropeço
para mim, porque os seus pensamentos não são os de Deus, mas os dos homens!”
algo, que tal uma prova disso? O problema é que os escribas e fariseus, bem versados nas
Escrituras, querem que Jesus mostre a sua concordância com a imagem que fizeram do
Messias. O perigo escondido por detrás do seu pedido é grave porque afecta a própria
natureza da missão de Jesus: a sua falsa interpretação das Escrituras produziu neles certas
ilusões. É a tentação de responder às expectativas, de responder às esperanças dos outros,
de ceder ao respeito humano, de satisfazer os seus desejos, em vez de ser autenticamente
você mesmo. Jesus não cai na armadilha porque o que governa a sua vida é a vontade do
Pai, e não as expectativas humanas, porque o Reino de Deus se constrói sobre essa vontade.
"Aba, Pai! Tudo te é possível; afasta de mim este cálice; mas não o que eu quero, mas
o que tu queres" (Mc 14,36).
"Seus irmãos lhe disseram: 'Saia daqui e vá para a Judéia, para que também os seus
discípulos vejam as obras que você faz, pois ninguém age em segredo quando quer ser
conhecido. Se você faz essas coisas, mostre-se a mundo. Até os seus irmãos acreditaram
Nele” (Jo 7, 2-5).
Até mesmo sua família foi uma fonte de tentação para Jesus. A situação ainda é
atraente: se Jesus faz milagres, seus familiares querem que ele o demonstre. Por que não
realizar estes milagres em Jerusalém, onde terão mais repercussão? Quem quer se afirmar
não age em segredo. Mas Juan esclarece que seus familiares não acreditavam nele.
Portanto, seu interesse era antes aproveitar os talentos de Jesus. Evidentemente, Jesus
rejeita esta abordagem de abusar dos talentos fora da missão.
Jesus foi tentado em sua vida diária. O que sempre esteve em jogo foi o método do seu
apostolado. O Reino de Deus em si nunca foi questionado, mas apenas a forma de o
estabelecer. A tentação era usar a coroa sem tomar a cruz, estabelecer a realeza pelo
caminho do sucesso em vez do fracasso, escolher a popularidade em vez do sofrimento,
preferir uma abordagem superficial e egoísta da vida, em vez da vontade de Deus, o Pai.
Esta experiência pode ser um caminho que o aproxima de Deus, reconhecendo a sua
própria necessidade de salvação; Mas, quando nasce da falta de confiança, enfraquece a fé e
pode ter efeitos paralisantes.
A palavra não temas aparece diversas vezes nos lábios de Jesus, convidando-nos a
confiar Nele quando as situações parecem esmagadoras.
Na própria vida há momentos em que nos sentimos assediados por muitos medos, reais
e fantasmas. A oração é um momento privilegiado para enfrentar honestamente os próprios
medos e realizar um ato de total confiança no Senhor, na atitude humilde da criatura que
reconhece o seu Criador. É também um momento de apresentar ao Senhor os medos de
tantas pessoas conhecidas para que o Senhor os console.
Outra forma de medo que nos tira a liberdade é a ansiedade de possuir. Possuir, poupar,
acumular são uma forma de proteger e esconder o próprio desamparo. Mas Jesus pede uma
confiança capaz de renunciar a todas essas precauções e seguranças; uma fé que corre o
risco de deixar o cuidado da própria vida nas mãos do Pai (cf. Lc 12, 22-31).
“Não se preocupam com o que vão comer para viver, nem com que roupa vão cobrir o
corpo. Porque a vida vale mais que a comida, e o corpo mais que a roupa” (Lc 12,( 22)(23
“Não te aflijas” porque “tu tens um Pai que já conhece as tuas necessidades” (Lc 12,(29)(30).
“Não se vendem cinco pardais por duas moedas? não vos esqueçais de nenhuma delas.
Quanto a vós, até os cabelos da vossa cabeça estão contados um a um. Por isso não tenham
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Jesus prometeu Sua presença até o fim dos tempos. “Estarei sempre convosco, até ao
fim do mundo” (Mt 28, 20).
No Evangelho há três situações onde o encontro com Jesus produz uma libertação
profunda: a mulher samaritana (cf. Jo 4, 1 -42), o homem cego de nascença (cf. Jo 9, 1 -41) e
Lázaro ( cf. Jo 11, 1-44). Nas três narrativas encontramos uma dinâmica semelhante:
No entanto, ele não tem pressa, sem pressa: dialoga, entra em relação com a pessoa,
faz observações para refletir sobre dimensões mais profundas (fala à mulher samaritana
sobre a água viva cf. Jo 4, 10; aos cegos homem pergunta pelo Messias (cf. Jo 9, 35;
pergunta a Marta pela vida eterna (cf. Jo 11, 25).
São diálogos que provocam uma forte reação nos ouvintes (a mulher samaritana
pergunta se este não é o Cristocf. Jo 4, 29; o cego proclama que acreditacf. Jo 9,38; e Marta
declara que Jesus é o Cristocf. (Jo 11,27).
Jesus reconhece a ação do Pai e remete tudo a Ele: diz à Samaritana qual é o
verdadeiro culto que agrada ao Pai (cf. Jo 4,23), na cura do cego recorda que o milagre é
manifestação da acção de Deus Pai (cf. Jo 9, 3), e dirige-se ao Pai no caso de Lázaro para lhe
agradecer a escuta (cf. Jo 11, 42) e pede um sinal para que outros possam realizá-lo. As
bem-aventuranças têm uma espécie de pressuposto básico, uma preparação que as precede
e que constitui o coração da Boa Nova, a saber, que o ser humano é amado por Deus e que
os seus pecados foram perdoados; que o Reino de Deus está no meio da humanidade; que
chegou o tempo da salvação; que os dons de Deus cercam os seres humanos em todos os
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lugares; que todos são filhos de Deus, a quem podem chamar de “Pai”.
A mansidão evangélica é fruto de uma consciência profunda do amor que Deus tem, tal
como a pessoa é, sem condições. Ao se convencer deste amor-aceitação de Deus, então
alguém pode ser manso, porque se alguém tem tanto valor para Deus, não há necessidade de
se afirmar. A certeza da ternura infinita que Deus tem por alguém liberta de todo interesse
próprio e, consequentemente, pode-se abrir-se aos outros e realizar a tarefa sem dar
importância. Há pessoas que têm atritos internos excessivos porque se procuram demais no
trabalho, a ponto de sua maior preocupação ser a própria pessoa e a opinião que os outros
possam ter sobre elas. Essas pessoas gastam muita energia e ainda fazem relativamente
pouco. Justamente o oposto dos mansos do Evangelho, que não se levam muito a sério e
que o seu profundo sentido de humor os protege do fanatismo, pois estando firmemente
convencidos de que são amados por Deus, são capazes de considerar todo o resto como
relativo. Mansidão não significa fraqueza, mas, pelo contrário, o manso possui uma força
extraordinária que tem raízes no próprio Deus.
Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão satisfeitos (Mt 5,
6). A sede de justiça é a sede daquilo que Deus quer. Se esta sede provém de Deus, então
crescerão também os frutos do Espírito: amor, alegria, paz, paciência, mansidão, bondade,
fidelidade, mansidão e domínio de si (cf. Gl 5,22).
No Antigo Testamento era impossível ver Deus e permanecer vivo. Yahweh diz a Moisés:
“Tu não podes ver a minha face, porque ninguém pode ver-me e viver” (Ex 33,20). Contudo,
nesta bem-aventurança afirma-se que aqueles com um coração limpo verão a Deus. Ter um
coração limpo significa ter apenas um objetivo: o próprio Deus. “A lâmpada do corpo são os
olhos. Se os seus olhos forem saudáveis, todo o seu corpo será luminoso” (Mt 6, 22). É a
forma de olhar que, muitas vezes, determina o que se olha. A beleza está nos olhos de quem
vê, escreve John Keats. Santo Inácio repete constantemente que Deus pode ser encontrado
em tudo; São João da Cruz repete com a mesma constância que Deus não pode ser
encontrado senão pelo caminho do nada, porque enquanto se encontra satisfação em
alguma coisa, por mais santa que seja, é preciso renunciar a ela. Estas duas posições podem
parecer exclusivas, mas, na verdade, dizem a mesma coisa sob perspectivas diferentes.
Quem busca a Deus, e somente a Deus, o encontrará em toda parte (Inácio); ao mesmo
tempo que no nada Deus certamente será encontrado (João da Cruz)
Bem-aventurados os que trabalham pela paz, porque serão chamados filhos de Deus
(Mt 5, 9)
Trabalhar pela paz parece uma tarefa frustrante. Além disso, pode levar a mal-
entendidos porque alguns entendem este esforço como simplesmente uma conformidade
com o que existe, enquanto outros não compreendem como esta opção pode aliviar a sua
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pobreza e dor. Contudo, construir a paz é algo absolutamente alinhado com a missão de
Jesus. Não é fácil procurar e preservar a unidade na diversidade.
“Bem-aventurado aquele que não encontra em Mim escândalo” (Mt 11,6). Quando
Jesus visitou Nazaré e ensinou na sinagoga, o povo ficou maravilhado porque não é este o
filho do carpinteiro? Depois, “eles ficaram escandalizados por causa dele” (Mt 13, 57) e Jesus
não pôde realizar muitos milagres “por causa da falta de fé deles” (Mt 13, 58).
Bem-aventurados “aqueles que ouvem a Palavra de Deus e a guardam” (Lc 11, 28) no
contexto do que é a verdadeira felicidade. Uma mulher levanta a voz dizendo “Bem-
aventurado o ventre que te carregou e os seios que te criaram!”, mas Jesus ressalta que a
verdadeira alegria se encontra na escuta e na prática da Palavra recebida.
“Bem-aventurados aqueles que não viram e acreditaram” (Jo 20, 29) no contexto da
descrença de Tomé.
A dor produz instintivamente rejeição porque a pessoa não nasceu para sofrer. Uma das
grandes tarefas humanas é lutar contra a dor, seja ela própria ou alheia. Um dos perigos da
cultura cristã é reduzir a mensagem de Cristo à cruz, quando a cruz só é compreendida a
partir da Ressurreição.
Aquele arrepio de rejeição produzido pelo cadafalso, pela execução infame, pela morte
atroz de um inocente foi perdido. Se um dia entrássemos numa igreja e no altar houvesse
uma imagem de Cristo pendurado numa forca, com os olhos injetados, a língua de fora,...
sentiríamos um enorme desconforto. Pois bem, a forca, como a cruz, nada mais é do que um
cadafalso degradante.
de dor.
O mal é um mistério, mas a própria vida ensina que a dor purifica, humaniza, refina a
alma. A dor pode ser uma ocasião para se abrir para os outros. Abra-se, com misericórdia, à
dor dos outros. Cristo ainda está no jardim. O Cristo místico continua sofrendo e há muitas
pessoas que estão tristes, com medo, entediadas e sofrendo pela ausência de Deus. Vale a
pena perguntar se a própria dor é ocasião para se fechar em si mesmo ou para se abrir ao
outro para acompanhá-lo. O que Jesus dirá sobre cada um? Você está dormindo diante da
dor dos outros?
Dia 27: Diante do tribunal Às vezes na própria vida a pessoa se sente invadida pelo outro
porque atrapalha, incomoda, condiciona, obriga a fazer o que não quer ou não tem vontade
de fazer; outras vezes o outro invade a nossa vida através das suas críticas ou interfere na
nossa própria vida com os seus problemas; o outro às vezes limita o tempo através dos seus
pedidos, das suas imposições e das suas necessidades. Viver é viver junto: você vive com o
outro e sofre com e pelo outro.
Portanto, há uma dor que vem de fora. Jesus, na Paixão, passou por vários tribunais que
o fizeram sofrer muito e que também são reconhecidos na sua própria vida. 28-19, 11), mas
na presença de Herodes permanece em silêncio. Hoje em dia nos deparamos com essa
frivolidade, com pessoas que não querem ser questionadas, que não se preocupam em
aprofundar. O trabalho apostólico às vezes encontra esse muro.
O tribunal da ingratidão. As pessoas que Jesus curou, que Jesus ensinou, que Jesus
alimentou, essas mesmas pessoas, quando chega a hora da verdade, preferem Barrabás (cf.
Mt 27,17). Na pastoral também se encontra ingratidão, nem sequer conscientemente, por
parte dos outros. As pessoas se aproximam quando têm problemas e tendem a se lembrar
de você em momentos de dificuldade. E não há má vontade porque a vida é assim. Mas
também vale a pena perguntar se na pastoral se é grato aos colaboradores ou se eles os
consideram garantidos. Outras vezes você sente que está fora de moda, que está
envelhecendo, que não lhe pedem mais certas coisas, que pessoas mais jovens estão vindo
para substituí-lo. É a lei da vida, mas ainda dói profundamente. É tempo de recordar as
palavras de João Baptista: É necessário que ele cresça e eu diminua (Jo 3,30).
A própria dor nos ajuda a vislumbrar o imenso sofrimento de Jesus e, ao mesmo tempo,
a apresentá-lo Àquele que sabe do que estamos falando. Compartilhar a dor é
tremendamente curativo, sentir-se compreendido é libertador e acompanhar Jesus diante de
sua dor é típico do discípulo.
Devemos estar cientes de que uma parte da dor em nossa vida nem é culpa dos outros.
“Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23, 34). Mas é preciso reconhecê-lo
TRADUÇÃO 68
para não ficar amargo e fechado diante dos outros. Pelo contrário, no estilo de Jesus, a dor
deveria ser uma escola de abandono a Deus Pai e de crescimento na misericórdia para
acompanhar a dor na vida dos outros a partir de dentro.
Mas também há quem permaneça nas suas pequenas satisfações sem correr riscos. É o
caso dos convidados do banquete que, um a um, apresentam as suas desculpas: ver o
campo comprado, provar as cinco juntas de bois comprados, recém-casados (cf. Lc 14,(15)
(16)(17) (18 )(19)(20).É também a situação do jovem rico que renuncia ao seguinte porque
estava demasiado apegado aos seus muitos bens (cf. Marcos 10,(17)(18)(19)(20). )(21)(22
Essas pessoas preferem e optam pelo que já sabem, pelo que já possuem, e não se arriscam
diante do que é novo. No fundo, não depositam sua confiança naquele que chama , convida e
ama.
Pelo contrário, na vida de Jesus você está sempre disposto a sair de si mesmo diante
das necessidades dos outros. Ele tem compaixão diante da fome das pessoas (cf. Jo 6, 5-11
multiplicação dos pães); é movido pela dor (cf. Jo 11,33, ressurreição de Lázaro); acolhe os
rejeitados (em Lucas 15, 2 é acusado de acolher os pecadores); e identifica-se com aqueles
que sofrem todo tipo de necessidades (cf. Mt 25, 31 -46 o julgamento final).
Medo ou permanência?
A reação humana à alegria é mantê-la e prolongá-la (cf. Mc 9, 5, façamos três tendas
para perpetuar o momento da Transfiguração). Por outro lado, diante do sofrimento, tanto o
nosso como o dos outros, a tendência é fugir, fugir, ignorá-lo.
Mãe, a irmã da sua mãe, Maria Madalena e João, que permanecem junto à Cruz (cf. Jo 19, 25-
26).
Seguir a Cristo passa pela realidade da cruz. “O discípulo não está acima do seu mestre,
nem o servo acima do seu mestre” (Mt 10, 24). O acompanhamento autêntico deve ser lúcido
e realista. Não se trata de seguir Cristo, mas de segui-lo pobre, humilde e crucificado.
Não é que se procure a cruz, mas que a cruz apareça no caminho e nisso Jesus não
engane o discípulo. Esse conhecimento é fundamental não só para ter consciência do
caminho a seguir, mas também para se fortalecer e não desertar quando essa realidade
aparecer. A união íntima com Cristo, a identificação com ele, é por vezes a única coisa que
nos mantém fiéis neste caminho.
O medo da realidade da cruz pode paralisar. A Carta aos Hebreus adverte contra o perigo
de, por medo da morte, passarmos a vida sob o signo da escravidão (cf. Hb 2, 14-15). Quem
tem medo da morte passa a vida morrendo o tempo todo. Uma forma de escravatura tem as
suas raízes neste medo fundamental da morte nas suas múltiplas expressões: o medo de se
sentir diminuído, de fazer papel de bobo ou de ser descartado no final.
Na vida encontramos e temos que aceitar várias mortes parciais. A pessoa moderna foi
educada para ter sucesso, para ser vencedora, mas a presença da morte questiona
profundamente o real significado do triunfo. O que significa ter sucesso na vida? Hoje em dia
é mais difícil integrar o mistério da cruz na vida das pessoas porque vivemos em busca do
presente imediato, da gratificação do momento. Como disse o Papa Bento VXI: “O sucesso
não é o nome de Deus”
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O mistério da cruz significa que muitas vezes é preciso renunciar à gratificação imediata
para dedicar a vida ao serviço dos outros. Tendemos a fugir de situações complexas e é
mais difícil do que antes suportar situações duradouras. Portanto, é necessário refletir sobre
a importância da fidelidade no dia a dia, para além da atração efêmera da gratificação
imediata e dos resultados bem-sucedidos.
Toda a vida de Jesus, à primeira vista, fracassou na cruz. Jesus viveu a cruz em toda a
sua nudez. A Ressurreição veio como resultado da sua fidelidade ao Pai, mas na cruz sentiu a
dor profunda do abandono. Na cruz aprendeu a passar do abandono ao abandono nas mãos
do Pai. A angústia do “Meu Deus, meu Deus, por que você me abandonou?” (Mt 27, 46)
encontre a paz no “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 23, 46). A resposta é a
fidelidade ao Pai e a confiança nos seus planos.
Ao longo de Sua vida, Jesus teve que lidar com muitas mortes parciais; Ele comemorou
muitos duelos antes de chegar ao duelo final. Pense na falta de compreensão com a qual tive
que lidar no cumprimento de sua missão. Foi acusado de ser glutão e bêbado (cf. Mt 11,19);
foi considerado escandaloso (cf. Mt 13,57); Foi criticado por não estar no seu perfeito juízo
(cf. Mc 3,21); Foi considerado um simples agitador político (cf. Lc 23, 2); Ele foi até acusado
de ser blasfemador (cf. Mt 9,3) e líder de demônios (cf. Mt 9,34).
Verdadeiramente, Jesus experimentou na sua própria existência a palavra que dirigiu aos
seus discípulos: «Se o grão de trigo não cair na terra e não morrer, fica só; mas se morrer, dá
muito fruto. Quem ama a sua vida perde-a. quem neste mundo odeia a sua vida, guardá-la-á
para a vida eterna» (Jo 12, 24-25).
Jesus enfrenta a morte confiando em seu Pai. No Jardim do Getsêmani (cf. Lc 22, 39-
46), Jesus permanece fiel no meio de uma angústia profunda e pede aos seus discípulos que
perseverem e não fujam. Na vida às vezes parece que não há caminho a seguir, que não há
saída. Jesus, na mesma situação, vive a esperança em toda a sua nudez porque a sua
confiança no Pai é total.
Este abandono e esta confiança no Pai permitem-nos dizer: «Senhor, se Tu, na Tua
bondade, pusesses nas minhas mãos o projecto da minha vida, eu de bom grado o devolveria
às mãos do Teu Pai, para aceitar com alegria o que Tu queres. ."
TRADUÇÃO 71
O escândalo da Cruz
A palavra latina tradere significa tanto o fato de que Jesus foi traído para a nossa
salvação, quanto a entrega de Jesus pelo Pai a nós. A Paixão de Jesus proclama o que Deus
fez pela humanidade, mas, ao mesmo tempo, reflete o que a humanidade fez a Deus.
A Paixão assinala que Deus se apaixonou pela sua criatura, ou seja, Deus não só cria,
mas ama a sua própria criatura. Por isso, São Paulo assinala que só quer conhecer Cristo
Crucificado (cf. 1 Cor 2, 2) porque Nele reside toda a sabedoria (cf. Col 2, 3) e na Cruz se
manifesta o profundo amor de Deus (cf. Ef 3, 18).
Na Paixão Pedro não entende nada. Jesus parece fraco e com medo (cf. Mt 26, 37-56).
Pedro o ignora e, como consequência, perde também a própria identidade. É verdade que
Pedro não conhece este homem (cf. Mt 26, 72). Mas ele se converte e passa a aceitar a auto-
revelação de Deus em Jesus. Pelo contrário, Judas, diante da fraqueza do Mestre e não
correspondendo à sua expectativa do Messias, acaba frustrado com o verdadeiro Deus em
Jesus.
Portanto, existem dois caminhos para Deus: (a) reconhecer Deus nos pequenos e fracos,
e (b) reconhecer a força de Deus na fraqueza. Deus se oferece à liberdade humana. Jesus
continua a oferecer-se através dos outros à sua liberdade pessoal (cf. Mt 25, 31-46).
TRADUÇÃO 72
A morte é incompreensível. É uma experiência que não pode ser comunicada a outra
pessoa. A morte de Deus é ainda mais incompreensível. Jesus anuncia que “o Filho do
Homem será entregue nas mãos dos homens; eles o matarão e três dias depois de sua morte
ressuscitará. Mas eles não entenderam o que ele lhes dizia” (Mc 9, 31-32 ). Só que você não
consegue entender, não é compreensível.
Jesus assume livremente a morte (cf. Marcos 14, 21, 24 e 36). Jesus aceita a morte
porque aceita a humanidade em sua essência. O seu respeito pelos seres humanos (a sua
liberdade) e a sua lealdade ao Pai (a sua obediência) levam-no à morte.
1ª Estação: Jesus condenado à morte Jesus não engana ninguém: “Se o mundo te
odeia, sabe que ele me odiou antes de te odiar. não do mundo, porque escolhendo-os eu os
tirei do mundo, por isso o mundo os odeia” (Jo 15,19). Consequentemente, assumir o estilo
de Jesus implica também ser rejeitado pelos critérios da sociedade: a simplicidade e a
sinceridade não combinam com mentiras e aparências; a bondade e a misericórdia não
cabem num ambiente de avanço social a todo custo; A pobreza e a desapropriação colidem
com o desejo de consumo e riqueza.
2ª Estação: Jesus com a cruz nas costas No madeiro vertical podem-se colocar os
espaços de dor (casa, família, trabalho, paróquia, igreja, comunidade, etc.), enquanto no
madeiro horizontal os tempos de dor (tempos de dúvida, tentação, tristeza, solidão, falta de
sentido). Mas estes dois pedaços de madeira se cruzam e a figura de Jesus aparece na cruz.
Carregar a cruz sozinho é insuportável, mas com Jesus ao seu lado e à sua frente você
encontrará a paz. “Vinde a mim, os que estão cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei”
(Mt 11,28).
TRADUÇÃO 73
4ª Estação: Jesus encontra sua Mãe A dor do desamparo ao olhar para o sofrimento
dos entes queridos; a dor de quem sofre por um; a dor das pessoas ao seu redor; a dor
própria e dos outros. É hora de confiar sem fazer perguntas que nem sempre têm respostas.
6ª Estação: Verônica enxuga o rosto de Jesus Nem sempre é possível tirar a dor do
outro, mas sempre é possível enxugar seu rosto para que ele veja melhor o caminho. As
lágrimas impedem-nos de ver o caminho e existe o perigo de nos perdermos e desviarmos.
Cada vez que alguém limpa o rosto cansado do outro, é necessário deixar uma marca da
imagem da própria gratidão e da imagem da reconciliação.
9ª Estação: a terceira queda A primeira queda ocorre pelo fato de ser pessoa, a
TRADUÇÃO 74
segunda por ser irmão e a terceira por ser filho de Deus. É a dor do vazio, de sentir pura
ausência, de acreditar sem ver, de esperar sem ter, de dar sem receber. A dor diante do medo
de perder a vida, de abrir mão da liberdade, de apostar sempre em Ele. A terceira queda é o
tropeço na terra dura e seca, uma terra sem céu, sem luz, sem Deus.
10ª Estação: Jesus despido Vai para a morte despido, sem cobertura, sem qualquer
defesa. Vá para a morte cheio apenas de amor pela humanidade. É a dor da pobreza e da
desapropriação. É a hora da verdade.
11ª Estação: Jesus pregado na cruz Cada um tem a sua cruz e, também, cada um
prega a sua cruz. E, porque não dizê-lo, cada um prega uma cruz no outro, voluntária ou
involuntariamente, consciente ou inconscientemente, com intenção ou sem intenção. Uma
cruz sem Cristo não tem sentido porque é apenas um peso que cansa e oprime. Jesus deve
ser pregado na cruz; é preciso acreditar que Jesus está pregado; É necessário acreditar que
Jesus quer ser. No momento em que Cristo é pregado na vida, o cadafalso torna-se altar, o
sacrifício torna-se oferta, o vazio torna-se entrega, o abandono torna-se confiança.
12ª Estação: Jesus morre na cruz O véu do Santuário rasga-se, a terra treme e as
rochas partem-se (cf. Mt 27, 51). Só a Cruz permanece estável e firme. Esta terra, abalada e
convulsionada, que andava à deriva, fica subitamente ancorada para sempre no céu. A Cruz
de Cristo é a âncora. Como uma âncora recortada contra o céu do Calvário. É a âncora que
foi puxada da terra em direção ao céu formando uma ponte transitável. A Cruz de Cristo é
esperança de significado em meio à falta de sentido. A Cruz de Cristo é esperança para o
horizonte e luz no meio da confusão e das trevas. Não é a cruz, mas é a presença de Cristo
na cruz que convida à confiança, porque o Jesus da Cruz é o Senhor Ressuscitado (cf. Act 2,
36).
13ª Estação: Jesus nos braços de sua Mãe Em Maria há compaixão diante da dor. A
paixão se torna compaixão. A própria dor torna-se uma fonte de compaixão pelos outros. Por
um lado, o próprio Jesus dá a sua Mãe para acompanhar a humanidade no seu caminho
histórico (“Mulher, aí está o teu filho”, Jo 19, 25-27); Por outro lado, Jesus convida a Igreja a
ser não só Mestra, mas também Mãe da humanidade.
Acompanhando Jesus na sua Via Sacra, percorre-se com dolorosa lucidez o caminho
quotidiano da cruz. Um caminho que às vezes é percorrido sem vontade e na escuridão total.
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Mas o importante é continuar caminhando e seguindo Jesus, confiando Nele, porque só Ele é
o sentido e o Caminho. A confiança do discípulo está depositada na promessa do Mestre:
«Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará nas trevas, mas terá a luz da vida» (Jo
8,12). Nos momentos sombrios, Jesus pede aos seus apóstolos que não se confundam e
tenham confiança Nele (cf. Jo 14, 1), porque “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,
6). Jesus é o único caminho para descobrir a verdade profunda que leva à vida autêntica.
"Eloi, Eloi, lema sabactani?" (Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste) (Mc 15,
34; Mt 27, 46; cf. Salmo 22, 1) A dor do inocente, sem explicação possível, que te faz gritar
mas porquê. São os porquês que permanecem sem respostas. O mal nem sempre pode ser
explicado nem sempre compreendido. Resta apenas pronunciar uma palavra de protesto e
depois confiar num Deus Misericordioso.
“Garanto-te que hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23, 43) A dor que se abre ao
outro, que não fecha, que não apodrece, que não se rebela nem blasfema. A dor assimilada e
assumida é sempre uma oportunidade privilegiada para compreender o outro na sua própria
dor.
“Pai, nas tuas mãos confio o meu espírito” (Lc 23, 46) A dor da insegurança diante
das próprias dúvidas e limitações. É a dor da criatura que se reconhece como tal e se abre ao
Criador em quem aprende a confiar. É a desapropriação do vazio que se deixa preencher pela
presença de Deus. É a recuperação do significado ajoelhando-se diante de Deus.
"Mulher [Maria], aí está o seu filho [João]" "[para João] "Aí está a sua mãe" (Jo 19, 26 -
27) A dor que acompanha; simplesmente acompanha sem soluções ou remédios. Mas
acompanha a dor do outro em silêncio. Às vezes, não há palavra que possa ser pronunciada
diante da dor do outro, mais ainda, qualquer palavra estaria deslocada, é o momento de
silêncio que acompanha.
“Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23, 34). É a dor que perdoa e
perdoa com justiça porque é capaz de compreender. Você não pode perdoar se não tentou
entender antes. O perdão é fruto da compaixão. Às vezes as pessoas fazem o mal por
motivos de fraqueza e para sair da própria insegurança.
“Tenho sede” (Jo 19, 28) A dor que necessita dos outros. A dor que aceita a ajuda dos
outros. É a dor expressa no Salmo: “Como uma terra seca, tenho sede de Ti” (Salmo 42). É o
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“dá-me de beber” dirigido à mulher samaritana (cf. Jo 4, 7). É “tudo o que fizeram a um
destes meus irmãos mais pequeninos, a mim fizeram” (Mt 25,40).
“Está tudo consumado” (Jo 19, 30) A dor fiel que é fruto do esforço, do cansaço e do
cansaço de quem sabe permanecer até o fim sem tropeçar diante das dificuldades e dos
obstáculos. Só a cruz da fidelidade conhece também a felicidade da ressurreição, porque a
fidelidade confia na promessa de que quem confia em Jesus não ficará desapontado. "A
tribulação gera paciência; a paciência, a virtude provada; a virtude testada, a esperança, e a
esperança não falha, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo
Espírito Santo que nos foi dado" (Rm 5, Quatro. Cinco ).
Maria preserva as situações que vivencia ao lado do menino Jesus, mas não as
armazena simplesmente como conteúdos que se acumulam em sua cabeça, como
lembranças ou anedotas. Maria os preservou “e meditou neles em seu coração”. Maria
discerne para captar o significado profundo dos acontecimentos, abrindo-se à ação e
surpresa de Deus em sua vida. Maria conserva as coisas não só na memória, na lembrança,
na cabeça, mas no coração. Por isso, Jesus realça nela não tanto a sua maternidade física,
mas a sua total disponibilidade para cumprir a vontade de Deus (cf. Mt 12, 50), mesmo que
envolva situações de confusão e de dor profunda, porque ela sempre soube como confie e
espere quando ele pronuncia a palavra: “Faça-se em mim segundo a tua vontade”. Na fé não
buscamos a sabedoria humana, mas a de Deus. ""Falamos de sabedoria entre os perfeitos,
mas não da sabedoria deste mundo nem dos príncipes deste mundo, que estão
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enfraquecendo; mas falamos de uma sabedoria de Deus, misteriosa, oculta, destinada por
Deus desde sempre para a nossa glória, desconhecida de todos os príncipes deste mundo,
pois se a tivessem conhecido não teriam crucificado o Senhor da Glória" (1 Cor 2, 6-8).
Como não podemos dizer exatamente o que é a Ressurreição, podemos, por outro lado,
esclarecer em que ela não consiste. Em primeiro lugar, a Ressurreição não significa que
Jesus continue a viver na memória humana, que as suas palavras permaneçam na história e
que o seu Nome permaneça gravado nos corações dos homens e mulheres que acreditam
Nele. Neste caso, seria uma fenômeno bastante comum.
Além disso, neste caso, o ser humano torna-se o verdadeiro protagonista da ressurreição
de Jesus. Cristo ainda vive porque os seres humanos ainda falam sobre Ele. Em outras
palavras, Jesus deve sua ressurreição aos seus discípulos. Ele vive graças a eles e à sua fé
Nele. O ser humano torna-se origem e fundamento da Ressurreição.
Em segundo lugar, a Ressurreição de Jesus não foi um regresso à vida, como nos casos
de Lázaro (cf. Jo 11, 1-44), do filho da viúva de Naim (cf. Lucas 7, 11-18), e a filha de Jairo
(cf. Lc 8,(49)(50)(51)(52)(53)(54)(55)(56). Há uma diferença radical entre estas três pessoas
e Jesus.
A Ressurreição não é um regresso à vida, mas uma ruptura com a morte, inaugurando
uma vida onde a morte não tem poder. “Cristo, uma vez ressuscitado dentre os mortos, não
morre mais, e a morte não tem mais domínio sobre Ele” (Rm 6:9). Esta é a diferença entre
Lázaro e Jesus. Lázaro voltou à vida, mas morreu mais tarde. Cristo não retornou a esta vida
porque rompeu a morte para uma nova vida. Não há mais morte para Ele.
Jesus derrotou a morte, tirando a última palavra. Além disso, ele passa a preparar um
lugar para nós na casa do Pai. "Não se turbe o seu coração. Acredite em Deus: acredite
também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas; caso contrário, eu te teria dito;
porque vou preparar um lugar para você. E quando eu for e preparei um lugar para vocês,
voltarei e os levarei comigo, para que onde eu estiver vocês também estejam” (Jo 14, 1-3).
Por isso, São Paulo afirma que “também nós acreditamos e por isso falamos, sabendo que
aquele que ressuscitou o Senhor Jesus também nos ressuscitará com Jesus e nos
apresentará diante dele juntamente convosco” (2 Cor 4, 13-14). .
A Ressurreição é a vida sobre a qual a morte não tem poder. Este mistério pode ser
TRADUÇÃO 78
articulado em palavras, mas o seu significado não é explicado, porque o ser humano não
conhece uma vida sem morte. Os seres humanos só conhecem uma vida que termina em
morte. A experiência humana da vida é uma mistura de vida e morte. Mas a experiência
humana ignora a própria vida, a vida sem morte.
Todo ser humano morre. Chama-se vida, mas a morte está envolvida como parte
essencial dela. Conhecemos uma vida sobre a qual a morte tem um poder decisivo. Mas
Jesus, o Cristo, vive uma vida sobre a qual a morte não tem mais poder. Esta é a verdadeira
vida, uma vida completamente desconhecida da experiência humana.
A Igreja primitiva proclamou Jesus como o Kyrios, o Senhor. Jesus é o Senhor de todos
os poderes deste mundo, um poder sem restrições. E, sem dúvida, o maior poder deste
mundo é a morte. Um político pode ter muito poder, mas um dia morrerá; Um empresário
pode ter muito dinheiro, mas também morrerá. Jesus é Senhor, Ele não morrerá porque a
morte não tem poder sobre Ele.
"Porque, assim como em Adão todos morrem, assim todos serão vivificados em Cristo.
(…) ele deve reinar até que coloque todos os seus inimigos debaixo dos seus pés. O último
inimigo a ser destruído será a morte. Porque ele subjugou todas as coisas sob seus pés.
seus pés" (1 Cor 15, 22-27).
O Evangelho mostra como a busca de Madalena (cf. Jo 20, 11-18) foi mal orientada
porque não deixa espaço para a novidade radical de Deus e que, neste caso, consiste na
vitória sobre a morte. Ela procura Jesus entre os mortos, isto é, no contexto da sua própria
experiência humana quotidiana. Ela não deixa espaço para que Deus se aproxime de fora de
sua experiência limitada. Jesus a chama pelo nome para que ela possa reconhecê-lo.
Madalena, que não O reconheceu de vista (viu-O e não O reconheceu), soube quem Ele era
ouvindo a Sua voz, pois a voz expressa melhor a interioridade. Na sua interioridade
reconheceu o seu Mestre e viu o que antes não tinha reconhecido: Jesus não o abandonou.
Jesus comissiona uma missão. A experiência do encontro com Jesus ressuscitado não se
limita a ser uma consolação para a pessoa a quem Jesus aparece. Jesus sempre dá uma
missão a essa pessoa: anunciar e compartilhar a alegria. Ele diz a Maria Madalena “vá até os
irmãos”; os discípulos de Emaús regressam a Jerusalém; aos discípulos encerrados no
cenáculo: «assim como o Pai me enviou, eu também vos envio»; para Pedro, às margens do
Lago Tiberíades, "alimente minhas ovelhas".
Alguém comentou uma vez que quando lia o Evangelho se sentia compreendido e
perdoado, mas quando se aproximava da Igreja sentia-se condenado e rejeitado. Talvez,
objetivamente, não seja esse o caso, mas existe percepção subjetiva. Realmente, vale a pena
perguntar-nos se no trabalho ministerial se transmite o acolhimento e a compreensão, ou
melhor, por pressa, cansaço ou dureza de coração, costuma-se dar a impressão de
condenação.
O verbo consolar em hebraico tem um significado muito mais amplo e forte do que em
espanhol, porque expressa, mais do que encorajar alguém que está deprimido, a ação eficaz
de fazer desaparecer os motivos do seu desânimo. Neste sentido, consolar não é apenas
acompanhar, mas inclui também a acção de dar esperança, uma esperança bem
fundamentada, capaz de produzir uma mudança radical no estado de espírito do outro.
Nos relatos das aparições de Jesus Ressuscitado (cf. Mc 16; Mt 28; Lc 24; Jo 20-21),
esta experiência de consolação é muito evidente, porque passamos da angústia do túmulo
vazio à consolação no a presença d’Aquele que ainda vive; É a passagem da ausência
desconcertante à presença significativa.
O Ressuscitado aproxima-se como Presença viva que dá Vida: deixa-se ver, aproxima-se,
fala, desafia, corrige, encoraja, comunica paz e alegria. Em uma palavra, dê o Espírito. A sua
forma de estar presente é pessoal, personalizando, identificando: de nome em nome,
suscitando memórias e experiências comuns, vislumbrando projetos futuros. Mais uma vez
Jesus reúne a comunidade que se desintegrava depois da Paixão; e os seus discípulos
experimentam novamente o chamado e o envio, para serem testemunhas e cúmplices do
Espírito, porque vivem a certeza existencial de que o Crucificado é o Ressuscitado, a morte
foi derrotada, que Jesus foi constituído Senhor. Eu me pergunto: em que momentos da
minha vida me senti consolado por Deus?
Nos relatos das aparições de Cristo Ressuscitado, à primeira vista, parece que a
situação não muda. Aliás, os factos básicos permanecem os mesmos, mas não é menos
verdade que a interpretação desses mesmos factos assume um significado totalmente
diferente.
Aparentemente, a sua situação não mudou, porque ainda são pobres, mas agora as
coisas mais básicas que estão ao alcance da sua pobreza (pão, vinho, pesca) tornam-se uma
festa (cf. Lc 24,30.35;Jo 21, ( 10)(11)(12)(13).
Ao mesmo tempo, o preço a pagar não lhes está oculto (cf. Jo 21, 18, quando se diz a
Pedro que outro vos cingirá), mas Jesus também promete a sua presença prometendo:
«Estarei convosco todos os dias até o fim." fim do mundo" (Mt 28, 20).
Descubra a alegria
Nas aparições do Senhor Ressuscitado reitera-se a experiência de passar da tristeza a
uma alegria profunda que permite regressar com entusiasmo à missão. A presença de Jesus
Cristo Ressuscitado muda completamente o panorama da sua vida: estavam tristes, cheios
de medo, e de repente tornam-se homens e mulheres valentes, cheios de entusiasmo, de
esperança, começando a pregar e a dar testemunho no meio de todos os dificuldades. A
situação não muda, mas mudam radicalmente porque recuperam a confiança no Mestre. A
alegria transforma o medo em coragem, uma coragem que nasce da confiança Nele e nas
Suas promessas.
No meio da dor, os discípulos aprendem a confiar em Deus e a não se deixar levar pela
TRADUÇÃO 81
tristeza. Não devemos acreditar que a alegria começa quando terminam os problemas ou
quando termina a dor, mas sim que a alegria é uma opção de vida, uma expressão de
confiança em Deus, que permite enfrentar os problemas e a dor com esperança. A alegria
não elimina a dor, mas dá-lhe sentido. É precisamente no meio das dificuldades que os
outros necessitam de uma presença capaz de trazer alegria às suas vidas.
A alegria não ignora a dor, nem se desinteressa pelos problemas, mas enfrenta-os com
confiança e esperança porque acredita que a última palavra pertence a Deus Pai e Deus não
decepciona. Tudo é possível para Deus, desde que aprendamos a confiar Nele
completamente.
Esta atitude de profunda alegria torna credível o exercício ministerial do sacerdócio, que
consiste basicamente em criar comunhão e alcançar a reconciliação. Grande parte do
trabalho pastoral envolve ajudar a reconstruir pontes quebradas na vida das pessoas e entre
as pessoas. Isto significa ajudar a curar muitas feridas que atormentam tantas pessoas. A
celebração da Eucaristia e do sacramento da Reconciliação é um meio privilegiado para isso.
Jesus está sempre presente, embora às vezes experimentemos a dor da sua ausência.
É a experiência de Maria Madalena (cf. Jo 20, 11-18), quando, no meio da desolação e das
trevas, ouve a voz do seu Mestre.
para aceitar a aceitação de Deus e viver de forma consistente com ela (viver como
reconciliado). É uma ocasião única para uma profunda reconciliação consigo mesmo.
Obviamente, a tensão não desaparece, mas já não se vive em contradição existencial. É a
tensão da falta de coerência, mas dentro de um ambiente de profundo acolhimento e
aceitação.
O ser humano não é mais filho do pecado (Adão), mas filho da graça (Cristo). Esta é a
verdade mais profunda pronunciada por Deus sobre o ser humano: «Aquele que está em
Cristo é nova criatura: o velho já passou, tudo é novo» (2 Cor 5, 17). Deus cria o ser humano,
mas também o recria no Filho.
É difícil aceitar-se porque os limites sufocam. Isso traz uma insegurança muito grande
que faz vacilar vidas, construindo-se na areia. Ninguém se aceita se não for porque primeiro
se sente aceito pelo outro. O amor do Criador para com a criatura faz da autoaceitação uma
possibilidade de autenticidade na vida, pois não há necessidade de provar nada, nem fingir
ser o que não é, mas simplesmente aceitar o que se é e sentir-se infinitamente acolhido pelo
Criador .
Mas, então, aceitar-se significa não fazer nenhum esforço e aproveitar as próprias
fragilidades? A única pergunta é um sinal de não ter compreendido o significado da
aceitação, porque aceitar-se é aceitar ser criatura, aceitar que existe um Deus Pai que sabe
mais sobre si mesmo, aceitar-se é aceitar a vontade de Deus. plano, aceitar-se é seguir o
Filho. É claro que o acolhimento de Deus oferecido à humanidade significa também o olhar
de misericórdia e de compaixão diante das quedas para recolocar-se no caminho do
seguimento de Cristo.
Há muitas alegrias que são pura evasão e fuga, como uma anestesia que faz esquecer o
momento da dor. Isto não é alegria cristã. A alegria cristã é um profundo sentimento de
aceitação que leva, se for autêntico, a uma profunda aceitação também dos outros.
que Deus cumpre as suas promessas, porque o Senhor está próximo e, portanto, não vale a
pena preocupar-se com nada (cf. Fl 4, 6). "Sede sempre alegres. Rezai constantemente. Em
tudo dai graças, porque é isso que Deus, em Cristo Jesus, quer de vocês. Não apagueis o
Espírito; não desprezeis as profecias; examine tudo e retenha o que é bom" (1 Tess 5, 16-21).
"Regozijem-se sempre no Senhor; repito, alegrem-se. Seja a sua medida conhecida por
todos os homens. O Senhor está próximo. Não se preocupem com nada; mas, em todas as
ocasiões, apresentem seus pedidos a Deus, por meio da oração e súplica, acompanhada de
ação de graças. E a paz de Deus, que excede todo o conhecimento, guardará os vossos
corações e os vossos pensamentos em Cristo Jesus" (Fl 4, 4-7).
Anexo 5: A porta aberta “Eis que te abri uma porta que ninguém pode fechar” (Ap 3,8).
Estas palavras do livro do Apocalipse são um convite a sair dos limites estreitos do
ambiente quotidiano para fazer a experiência libertadora, e muitas vezes vivificante, do que
representa uma vida de fé. Abri-vos diante de vós: a fé é sempre um dom que constitui um
apelo permanente a novas descobertas.
A fé apela à superação dos tristes limites do próprio conceito de Deus. Em vez da visão
restrita e míope que temos Dele, a fé ensina Sua grandeza e transcendência. A busca de
Deus é uma peregrinação contínua, uma transição permanente para uma compreensão
sempre nova e cada vez mais profunda de Deus e do seu mistério insondável.
A fé também abre um universo que pode ter sido fechado, ajuda a compreender que o
mundo não é uma prisão, que a existência humana não é absurda, porque oferece uma nova
perspectiva e um novo sentido à vida e a tudo o que existe. Este horizonte liberta-nos do
desânimo, destrona os ídolos que nos escravizam e liberta-nos de valores falsos e artificiais.
A fé não se detém nos confins da vida, mas atravessa as fronteiras da própria morte. A
fé faz-nos compreender não só que Deus quer que o ser humano viva, mas que também quer
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que a existência humana exceda o tempo de uma existência terrena. Deus quer que a pessoa
humana viva para sempre. Deus mantém não apenas na vida, mas também na segurança,
mesmo depois da morte. O Deus da fé é um Deus dos vivos e, portanto, a vida não se entende
a partir da morte, mas, pelo contrário, a morte a partir da vida. “Quanto à ressurreição dos
mortos, vocês não leram aquelas palavras de Deus quando ele lhes diz: Eu sou o Deus de
Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó? dos vivos" (Mt 22, 32).
A fé ajuda também a adquirir aquele modo de ver o outro que torna possível qualquer
relação humana, porque apoia a compreensão recíproca e derruba os muros que separam;
Ajuda também a libertar o próprio passado, permitindo a possibilidade de um novo futuro (cf.
2 Cor 5, (17)(18). A fé elimina os sofrimentos mais pesados que sufocam o indivíduo e
dificultam as relações interpessoais, porque nos liberta do sentimento de culpa e o
transforma numa experiência íntima da fidelidade de Deus.
Mas o convite mais pessoal que a fé faz é a superação dos próprios limites, porque
afirma a certeza de que se pode mudar, de que a conversão é possível, de uma reorientação
profunda de toda a atitude perante a vida, de que um novo dia é possível. A pessoa não está
imutavelmente ligada ao estado em que nasceu, uma vez que a força de Deus, o Criador,
proporciona uma libertação. Todo ser humano é condicionado, mas não determinado.
Fé significa saber que você é aceito por Deus tal como você é e que, se estiver
convencido disso, também poderá aceitar-se da mesma forma. A autoaceitação autêntica é
um ato de fé. E aceitar-se não significa resignar-se ao que é e deixar as coisas como estão.
Pelo contrário, a aceitação autêntica leva a uma mudança profunda da própria realidade,
construindo sobre o que é sólido, porque o amor é um estímulo muito maior do que a
ameaça ou a pressão. Santa Teresinha de Lisieux disse: “Sou de tal natureza que o medo me
faz recuar; com amor, não só avanço, mas voo” (Manuscritos Autobiográficos, A, fólio 80).
A esperança impede a acomodação, deixa as coisas seguirem seu curso, porque aponta
para o alto e nunca se contenta com o que já foi alcançado. Contrariamente ao otimismo, a
esperança percebe com perspicácia as deficiências da situação atual, mas não desanima e
não aceita compromissos. A esperança inspira o amor, evitando a amargura e o fanatismo.
Na Carta de São Pedro somos exortados a estar «sempre prontos a responder a qualquer
pessoa que vos peça a razão da sua esperança. Mas faça-o com doçura e respeito» (1Pd 3,
15-16).
Mas a esperança requer perseverança. A esperança não é um caniço movido pela mais
leve brisa, mas deve estar ancorada na rocha sólida, no próprio Deus. Isto não significa que a
esperança exclua toda inquietação e toda agitação. A esperança é a mãe da paciência. A
esperança sabe esperar. Onde falta esperança, sente-se uma necessidade de movimento e
de sensações que se traduz em incontinência verbal, curiosidade e uma certa agitação
interna e externa. A esperança autêntica conhece a inquietação do desejo, mas não conhece
a ansiedade da impaciência.
“Que a vossa caridade seja sem pretensão; detestando o mal, aderindo ao bem; amando-
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vos cordialmente; estimando cada um mais altamente; com zelo sem negligência; com
espírito fervoroso: servindo ao Senhor; com a alegria da esperança; constante na tribulação ;
perseverando na oração; participando das necessidades dos santos; praticando a
hospitalidade" (Rm 12, 9-13).
O próprio São Paulo é a prova de que tudo contribui para o bem quando se procura
verdadeiramente amar a Deus. Não se tornou amargo diante das decepções, das
dificuldades e dos sofrimentos; Pelo contrário, tudo isto fez dele um apóstolo cada vez mais
entusiasta e generoso, que viveu na esperança e soube transmiti-la aos outros. "Quem nos
separará do amor de Cristo? Tribulação? Angústia? Perseguição? Fome? Nudez? Perigos? A
espada? Como diz a Escritura: Por amor de ti somos mortos o dia todo, tratados como
ovelhas destinadas ao matadouro. Mas de tudo isto saímos vitoriosos, graças Àquele que
nos amou» (Rm 8, 35-37).
O significado profundo da vida humana. Ou seja, a verdade sobre a própria vida como
criatura de Deus (Princípio e Fundamento). Ao se deparar com a sua verdade fundadora, o
exercitador reconhece a presença do pecado como uma falta de aceitação de sua condição
de criatura, um desejo de fazer as coisas de maneira diferente. Esta tensão entre a verdade
proposta e a mentira vivida é colocada sob o olhar de Deus Pai que oferece a sua
misericórdia e o seu perdão. “Onde abundou o pecado, superabundou a graça” (Rm 5,20).
Assim o exercitante é convidado a aprofundar o seu processo de conversão, renovando a sua
vida de serviço e de escolha segundo o plano de Deus. “Nem todo aquele que me diz Senhor,
Senhor, entrará no Reino dos Céus, mas sim aquele que faz a vontade de Meu Pai” (Mt 7, 21).
Veja como Deus vive nas criaturas, nos elementos que dão o ser, nas plantas que
vegetam, nos animais que sentem, nos homens que dão entendimento; e assim em mim me
dar ser, encorajar, sentir e me fazer compreender; da mesma forma, fazendo de mim um
templo sendo criado à semelhança e imagem de sua divina majestade. Com isso, reflito
também sobre o que de minha parte devo oferecer e dar à Sua divina majestade, a saber,
TRADUÇÃO 89
Considere como Deus trabalha e trabalha por mim em todas as coisas criadas na face
da terra. Assim como nos céus, os elementos, as plantas, as frutas, o gado, etc., dando ser,
conservar, vegetar e sentir, etc. Com isso, reflito também sobre o que de minha parte devo
oferecer e dar à Sua divina majestade, a saber, todas as minhas coisas e eu mesmo com
elas.
Veja como todos os bens e dádivas descem do alto, assim como o meu poder de
medida da soma e infinito do alto, e assim a justiça, a bondade, a piedade, a misericórdia,
etc., assim como os raios descem do sol, de a fonte as águas, etc. Termine então refletindo
sobre o que da minha parte devo oferecer e dar à Sua divina majestade, a saber, todas as
minhas coisas e eu mesmo com elas. Essa contemplação afeta o significado e a experiência
do tempo na existência da vida, porque (a) o passado torna-se uma memória dos benefícios
recebidos; (b) o presente torna-se ocasião de reconhecimento e comunicação, uma vez que
Deus habita a criação e a história, trabalhando e trabalhando pela criatura; e (c) o futuro se
transforma numa entrega divina contínua, à qual o exercitante é convidado a responder com
tudo o que tem e com tudo o que é.
É um momento privilegiado para a vida pessoal de fé, porque nos coloca numa
encruzilhada. Pode-se escolher o caminho do desânimo e do ceticismo, lamentando
secretamente a frustração dos próprios projetos de perfeição e escondendo-a sob todos os
tipos de disfarces pseudo-espirituais ou expressões cínicas.
Esta contemplação pode ser resumida na busca do rosto de Deus na criação, bem como
no compromisso de renovar a face da terra.
Nos Salmos, a raça que pertence a Deus é descrita como aquela que busca a Sua face
(cf. Salmo 24,6) e a criatura implora a Deus que não lhe esconda a Sua face (cf. Salmo 27,8).
Procurar o rosto de Deus significa procurar e descobrir as diversas características do amor
do Pai, na própria vida e na história, até podermos reconstruir o rosto divino. Significa
procurar ativamente as diferentes presenças de Deus na sociedade, nos outros, em si
mesmo.
“A ansiosa expectativa da criação anseia pela revelação dos filhos de Deus. A criação, de
fato, foi submetida à vaidade, não espontaneamente, mas por quem a sujeitou, na esperança
de ser libertado da escravidão da corrupção para compartilhar na liberdade gloriosa dos
filhos de Deus. Pois sabemos que toda a criação geme até hoje e está em dores de parto. E
não só ela, mas nós mesmos, que possuímos as primícias do Espírito, gememos dentro de
nós mesmos. ansiando pelo resgate do nosso corpo. Porque a nossa salvação é o objeto da
esperança; e uma esperança que se vê não é esperança, pois como é possível esperar por
algo que se vê? Mas esperar pelo que não vemos é esperar pacientemente." (Rm 8,(19)(20)
(21)(22)(23)(24)(25). A descoberta de que na própria vida tudo é graça é certamente
profundamente libertadora, mas também, e precisamente para por isso desaparece qualquer
motivo para deixar de servir e amar a Deus. Não há desculpa para não se dedicar, por amor a
Deus, a uma vida de serviço em atitude de total disponibilidade. Esta conclusão regressa ao
início (ao Princípio e Fundamento) porque é uma nova forma de se colocar diante de Deus,
diante dos outros e diante de si mesmo. A relação entre criatura e Criador tornou-se uma
TRADUÇÃO 91
"Vocês são meus amigos, se fizerem o que eu lhes ordeno. Não os chamo de servos,
porque o servo não sabe o que seu senhor está fazendo; chamei vocês de amigos, porque
tudo o que ouvi de meu Pai, eu tenho vos foi dado conhecer" (Jo 15, 14-15). Busco a face de
Deus e reconheço que tudo é Graça?
Dia 39: Abra os braços e revitalize a fé Numa pequena cidade alemã, no final da Segunda
Guerra Mundial (maio de 1945), havia uma pequena capela onde estava pendurado um
grande Cristo crucificado. Durante esses meses, cada vez que o alarme aéreo soava, toda a
cidade saía de suas casas para entrar nos abrigos subterrâneos, onde esperavam enquanto
durava o bombardeio.
Ao lado do antigo crucifixo há uma pequena placa com uma inscrição que diz: Vocês
serão meus braços. Na verdade, o cristão é chamado a ser o braço do Senhor na vida
quotidiana. E braço significa um ombro onde as pessoas podem se apoiar; uma mão sempre
pronta a dar; um abraço sempre pronto para acolher.
Revitalizar a fé
Uma das grandes necessidades do tempo atual é a revitalização da fé. Entusiasmar-se
com a fé, apaixonar-se pela Pessoa de Jesus, tem impacto direto na forma como nos
relacionamos com os outros e na construção de uma sociedade mais fraterna e justa. A base
da opção pelos pobres é a fé, porque é o próprio Deus que se vê no rosto dos pobres e
marginalizados. “Em verdade vos digo: tudo o que fizestes a um destes meus pequeninos
irmãos, a mim o fizestes” (Mt 25,40).
A fé autêntica traduz-se em obras concretas. “Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor,
Senhor’, entrará no Reino dos Céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai” (Mt 7,21).
TRADUÇÃO 92
“Aquele que faz a vontade de meu Pai celestial é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (Mt
12,50). No seu último discurso, Jesus declara solenemente: “Dou-vos um novo mandamento:
que vos ameis uns aos outros. Que, como eu vos amei, também vós vos ameis uns aos
outros. Assim todos saberão que sois discípulos”. : se tiverdes amor uns pelos outros” (Jo
13, 34-35).
Quando a fé é fraca ou ausente, a solidão torna-se uma ameaça muito maior. Numa
cultura impregnada de fé, as pessoas procuram a solidão porque nela podem encontrar
Deus, e sempre foi assim; mas quando Deus está morto, a solidão se torna isolamento.
Agora, o ser humano não pode viver sozinho e é por isso que as pessoas se encontram e
discutem para escapar do sentimento de solidão. De facto, parece que hoje há mais diálogo
do que noutros tempos, mas ao mesmo tempo há menos contactos verdadeiros porque se
procura o outro para fugir de si mesmo e não para comunicar com o outro.
Quando não há fé ou sentido espiritual, esta ausência pode levar a uma ênfase
exagerada na produtividade e na eficiência, a ponto de uma cultura orientada para Deus ser
substituída por uma cultura orientada exclusivamente para o trabalho. Isso acarreta muito
sofrimento, sobretudo, para quem está ou fica impossibilitado de trabalhar, pois se sente
inútil, rejeitado e frustrado. Mas também significa muita miséria para quem trabalha porque
muitas vezes outros valores mais importantes são sacrificados, como a família. Até o próprio
ministério, devido à sobrecarga de trabalho, pode perder a sua intuição primeira e degenerar
numa simples profissão ou ocupação.
se de projetos mais fraternos. Por outro lado, a crescente falta de interesse pelos problemas
sociais entre os cristãos torna a fé absolutamente inaceitável para o não-crente.
Como é possível acreditar no amor e na justiça quando quem faz do amor e da justiça o
centro da sua fé não os põe em prática?
Dia 40: GRATIDÃO A gratidão cria uma atitude positiva perante a vida e inaugura uma
forma alegre de encontrar Deus em todas as coisas. Pessoas gratas são seres agradáveis e
tornam a sua própria vida e a dos outros mais felizes e ricas; Pelo contrário, pessoas ingratas
e amargas tornam a sua própria vida e a dos outros bastante miserável.
Jesus era uma pessoa grata, demonstrando sua gratidão pelas coisas da vida, pequenas
e grandes: tanto pelo copo d'água da mulher samaritana quanto pela amizade que encontrou
em Maria, Marta e Lázaro. Ele fez uma oração de ação de graças antes da refeição (cf. Mt
15,36;26,27) e também antes de ressuscitar Lázaro da sepultura (cf. Jo 11,41).
Repetidamente se assinala que Jesus deu graças ao Pai (cf. Lc 10, 21).
A gratidão é fruto de uma dependência aceita. Seu extremo oposto é o orgulho, que nos
faz acreditar que só importam as conquistas pessoais e que tudo se deve unicamente ao
esforço próprio. A gratidão reconhece que algo é recebido e, consequentemente, a
dependência de outra pessoa que deu. Gratidão é aceitar o que o outro dá.
É preciso aprender a ser grato porque persiste em cada pessoa a tendência de atribuir
tudo a si mesmo ou de não valorizar as coisas. Na verdade, admitir a própria dependência
exige certa maturidade.
Uma criança fica feliz por um presente sem se perguntar sobre sua origem e tem que ser
educada para agradecer porque não lhe ocorre espontaneamente fazê-lo. As crianças
recebem os presentes que recebem sem pedir. Por outro lado, o adolescente entende de
onde vêm as coisas, mas muitas vezes tem dificuldade em admitir a dependência, o que leva
a comportamentos repetidamente desarmônicos e até injustos, que podem prejudicar muito
os outros. Por fim, o adulto aceitou as suas limitações e, consequentemente, é capaz de
reconhecer e aceitar com o coração agradecido. O adulto descobre que os valores mais
importantes da vida não podem ser comprados ou obtidos apenas com esforço, porque o
que dá profundidade e paz à vida é o dom, não tanto a conquista: o amor, a fé, a oração, a
TRADUÇÃO 94
Todas as quintas-feiras, uma idosa de uma casa de repouso recebia de sua filha um
lindo buquê de flores. A mãe ficava encantada e sempre colocava as flores em uma mesa no
centro da sala e deixava a porta aberta, esperando que alguém notasse as flores e fizesse
algum comentário, pois isso lhe daria a oportunidade de falar sobre a filha. No aniversário
dela, a filha viajou para passar o dia com ela. A mãe expressou à filha a alegria que sentiu ao
receber aqueles buquês de flores, pois significava que a filha se lembrava dela
constantemente. A filha, no decorrer da conversa, confessou que uma empresa
especializada foi a responsável pelo envio das flores, que ela pagou através de um banco. Na
quinta-feira seguinte as flores chegaram como de costume. A mãe colocou o buquê de flores
sobre a mesa, mas desta vez deixou a porta do quarto fechada porque o buquê havia perdido
parte do significado porque o doador estava menos presente no presente.
O crente pode vivenciar tudo como um dom em que o doador está presente, para que as
coisas, as situações e as pessoas adquiram uma plenitude e carreguem dentro de si uma
riqueza e uma referência ao Doador. Mas você também pode olhar as coisas, até mesmo as
pessoas, de uma forma prática e fria, avaliando-as pela sua utilidade e eficácia, sem ir mais
longe.
verdadeiros inimigos de todos os tipos de gratidão porque quem persegue apenas o seu
próprio interesse e centra a sua atenção em si mesmo nunca será uma pessoa grata, nem
quem se deixa absorver completamente pela dádiva até ao ponto de esquecer o doador.
Ser grato significa não se considerar o centro do universo nem se acreditar merecedor
de nada, mas sim confessar que tudo é devido a Deus. A gratidão não vê realidades
diferentes, mas sim vê as realidades de maneira diferente. A pessoa grata é capaz de obter
forças em momentos difíceis porque também é capaz de reconhecer o positivo em
horizontes negativos. Uma paciente com esclerose múltipla, sentada em uma cadeira de
rodas e com a mão esquerda completamente paralisada, consegue agradecer por ainda
poder usar a mão direita. Na verdade, quando nos deparamos com a doença dos outros,
percebemos o quanto devemos ser gratos por aquilo que normalmente consideramos
natural.
A pessoa grata não se minimiza porque essa atitude nada tem a ver com complexo de
inferioridade. Você não pode estar insatisfeito e grato ao mesmo tempo. O verdadeiro
problema não é ser objeto de reconhecimento, mas deixar que ele reverta exclusivamente
para si mesmo e não se estenda à fonte última de todo o bem. Uma vez que você reconheça
que todos os seus sucessos e conquistas têm origem em Deus, você poderá desfrutá-los
plenamente, sem qualquer orgulho ou vanglória. É o canto do Magnificat (cf. Lc 1, 46-55).
Gratidão é guardar uma lembrança no coração. O grato lembra e prepara o coração para
dar. A gratidão implica receptividade, mas de forma alguma passividade, porque transforma
o dom numa tarefa a realizar. Neste mundo há muito sofrimento e injustiça que são um apelo
a trabalhar com paciência e incansabilidade por uma sociedade mais fraterna. Para esta
tarefa, as pessoas gratas estão muito mais preparadas porque também reconhecem o mal
que existe nelas e se entregam com a confiança depositada n'Aquele que é justo.
Leituras bíblicas:
Salmo 104: Esplendores da criação 1 Jo 4, 7 -5, 4: Fé e Caridade 1 Cor 12, 1 -11:
os Carismas Efésios 1, 3 -14: o Plano Divino de Salvação PAUSA Sugestão IGNACIANA
para o dia a dia vida:
TRADUÇÃO 96
Conseqüentemente, a pausa inaciana não se reduz a ser um balanço que se faz no final
do dia para julgar o bom e o mau. Nem se trata de comparar-se a um modelo imaginário de
perfeição que só serve para frustrar e desanimar. A pausa inaciana pretende ser uma ajuda
para crescer na intimidade com Deus e na sua experiência prática na relação com os outros;
Como consequência, também percebo meus fracassos, mas somente a partir Dele.
1.-Seja grato * Acalme-se e coloque-se na presença de Deus * Reviva o dia sem julgar:
com quem estive, o que fiz, o que disse, o que me disseram * Tomar consciência dos meus
sentimentos: o que meu humor é, o que me incomodou, o que me deu alegria, etc. *Agradeço
por tudo 2.-Peço perdão e perdoo *Diante do Pai misericordioso peço perdão pelas minhas
inconsistências *Perdoo as pessoas que me machucaram, mesmo que sem querer
*Agradeço a Deus por me aceitar como sou (não para O que eu faço ou não faço)
3.-Ato de confiança em Deus * Abandonar-me nas mãos do Pai * Pensar nos meus
compromissos para o dia seguinte * Confiar nele Perdão significa etimologicamente dar
plenamente e expressa uma forma de amor ao extremo porque é amoroso apesar da ofensa
sofrida.
“Assim como o Senhor vos perdoou, vós também” (Col 3, 13). O Pai Nosso (Mt 6, 9-
13) é mais que uma condição, é um estilo de vida: assim como o Pai te perdoa, você também
aprende a perdoar (coerência e consequência).
3.-Perdão autêntico
Não existem apenas falsos perdão, mas também falsas razões para perdoar:
1.-Decidir não se vingar e fazer cessar os gestos ofensivos Renuncie à vingança (quem
TRADUÇÃO 97
se vinga deve cavar duas sepulturas provérbio chinês) porquefoca a atenção e a energia no
passadoreacende constantemente a feridaentra na mesma dinâmica do agressorgera
um profundo sentimento de culpaestar em um estado perpétuo de medo e ansiedade
esperando por um contra-ataqueo julgamento desvalorizador do outro se volta contra si
mesmopromove sentimentos de ressentimento, hostilidade, raiva levando ao estresse.
a se culpar três fontes básicas de si mesmo -ódio: decepção por não ter vivido à altura do
ideal, mensagens negativas recebidas dos pais e outras pessoas significativas e presença de
fatores reprimidos e não desenvolvidosidentificação com o agressor para sobreviver
tentando escapar da situação de vítima e assumir a aparência de autonomia ; Assim, alguém
se contamina pela ação do agressor e se torna cúmplice do agressor ao se perseguir (contra
si mesmo sou estúpido ou contra os outros eles são estúpidos); daí a necessidade de
perdoar a si mesmo devido à identificação com o ofensorse alguém é cruel consigo
mesmo, como pode ser compassivo com os outros?perdoar é aceitar-se 7.-Compreender o
ofensor Compreender não significa desculpar, mas descobrir sua motivação e sua
pessoaé impossível entender tudo, mas uma compreensão mínima facilita o perdão ao
encontrar alguns motivos para o comportamento ofensivoperdoar de olhos abertos para
não reduzir o ofensor ao mal personificado (fruto da obsessão)não julgar o evangélico
refere-se a não condenar ele (Mt 7, 1) e lembra uma visão objetiva ao estabelecer que é
preciso olhar para a própria trave antes do cisco no olho do outro (Mt 7, 3)condenar o
ofensor pode ser autocondenação quando o que alguém condena em outro é muitas vezes
parte de alguém que se recusa a reconhecer porque no fundo reflecte uma falta de auto-
aceitaçãomelhor compreensão do contexto familiar, social, cultural, ajudando a perdoar o
outro sem justificar o seu comportamentoajuda a descobrir intenções positivas embora
mal expressas ( humilhar para corrigir) Se alguns prejudicam com boas intenções, outros o
fazem sem querercompreender o agressor é respeitar a sua dignidade humana porque
quanto mais profunda a ferida, maior a tendência para reduzi-lo aos seus defeitos e querer
destruí-lo (capacidade de acredite em seu crescimento e correção). compreender é aceitar
que você não entende tudo 8.-Encontre significado para a ofensa em sua própria vida
Integre a ofensa em sua própria vida (o que aprendi?)a visão positiva ajuda você se
beneficia disso sem se trancar na autopiedade O primeiro impacto é a perturbação, mas
depois é preciso construirFolclore chinês: o filho de um fazendeiro quebrou a perna, os
vizinhos vêm lamentar o infortúnio mas o fazendeiro não diz nada; Mais tarde, os militares
chegam para recrutar jovens da cidade e não carregam o fardo dos jovens aleijados; Os
vizinhos chegam exclamando a sorte do agricultora ofensa leva a conhecer-se
melhorimportante é apelar ao potencial mais elevado do homem: transformar uma
tragédia pessoal em vitória; um sofrimento, em realização humana (Victor FranklPrisioneiro
em campo de concentração) 9.-Saber-se digno de perdão e já perdoado Entra-se num
horizonte espiritual onde não se trata tanto de fazer, mas de deixar-se fazer: a aceitação da
graça sem a experiência pessoal de se saber perdoado não é possível perdoarno
momento de se saber perdoado o Eu profundo sabe que está unido à fonte do amor e
inseparável dela (experiência de Madalena e Samaritano)obstáculos ao aceitação do
perdão: acreditar-se imperdoável pela enormidade das próprias faltas; não acreditar na
natureza gratuita do amor porque tudo tem um preço; não sentir necessidade por falta de
senso ético; considerar a culpa como uma lacuna psicológicao desafio é aceitar receber o
perdão sem se sentir humilhado ou rebaixadoem suma, quem não se ama e não se perdoa
não pode amar nem perdoar os outrosao mesmo tempo, amor e perdão para consigo
TRADUÇÃO 99
“Foi tão fácil identificar-se com os dois filhos! A desobediência deles é tão
compreensível e tão humana que a identificação com eles vem de imediato. (...) Mas e o pai?
O pai é o centro, aquele com quem devo me identificar?” 3. “Se Deus é misericordioso,
aqueles que amam a Deus devem ser misericordiosos. O Deus que Jesus anuncia e em cujo
nome ele age, é o Deus da misericórdia, o Deus que se oferece como exemplo e modelo de
comportamento humano. Tornar-se Pai celeste não é apenas um aspecto importante dos
ensinamentos de Jesus, é o próprio núcleo da sua mensagem. (...) A grande conversão à qual
Jesus nos chama consiste em passar da pertença ao mundo à pertença a Deus. (cf. Jo 17,
16-21)» 4. "O pai de Rembrandt é um pai que foi esvaziado de si mesmo pelo sofrimento.
Através de muitas mortes ele se tornou completamente livre para receber e dar. Suas mãos
estendidas não imploram, não amarram, não exigem, não avisam, elas não “Não julgam nem
condenam. São mãos que só abençoam, que dão tudo sem esperar nada” 5.
Referências
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oración, (Santander: Sal Terrae, 1995).
William Barry s.j., Finding God in All Things: a Companion de the Spiritual Exercises of St.
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Piet van Breemen s.j., As Bread is Broken, (New Jersey: Dimension Books, 1974).
Piet van Breemen s.j., Transparentar la gloria de Dios, (Santander: Sal Terrae, 1995).
Piet van Breemen s.j., Te he llamado por tu nombre, (Santander: Sal Terrae, 1997).
M. Cowan CSJ y J. C. Futrell s.j., The Spiritual Exercises of St. Ignatius of Loyola: a
Handbook for Directors, (New York: Le Jacq Publishing, 1982).
Juan Díaz s.j., “Ejercicios Espirituales 1995”, en Revista Católica 1107 (1995) pp. 183 –
TRADUÇÃO 101
229.
Ignacio Iparraguirre s.j., Cándido de Dalmases s.j., y Manuel Ruiz Jurado s.j., San Ignacio de
Loyola: Obras Completas, (Madrid: BAC, 1991, quinta edición).
Jean Laplace s.j., Diez días de Ejercicios: guía para una experiencia de la vida en el Espíritu,
(Santander: Sal Terrae, 1987 2 ).
Carlos María Martini s.j., Promise Fulfilled, (Canadá: St. Pauls, 1994).
Carlos María Martini s.j., Poner orden a la propia vida, (Bogotá: San Pablo, 1997, segunda
edición).
Fidel Oñoro, A la escucha del Maestro: iniciación a la lectura orante de la Biblia, (Bogotá:
CELAM, 1996).
Florencio Segura s.j., Ocho días de ejercicios según el método de San Ignacio de Loyola,
(Santander: Sal Terrae, 1992).
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2023. Carátula y Edición: El Autor Bogotá DC - Colombia