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Primeira, Segunda e Terceira Geragao 1 de Terapias Comportamentais Paola Lucena-Santos, José Pinto-Gouveia e Margareth da Silva Oliveira Construtmos muros demais e pontes de menos/ We build too many walls and not enough bridges. Isaac Newton E inegavel que o movimento da ‘Terapia Comportamental fundou uma nova fase na psicologia clinica, rompendo com a pratica psicolégi- ca dominante da época e instaurando a utilizagao de uma terapia em- basada cientificamente (Alvarez, 2006). Desde suas origens, a aborda- gem € caracterizada pelo estudo do comportamento humano de forma objetiva racional, com rigor cientifico ¢ com o desenvolvimento de leis de aprendizagem que sejam validadas empiricamente (Mafias, 2007). Os comportamentalistas defendiam que as teorias deveriam ser construfdas a partir de princfpios basicos bem estabelecidos do ponto de vista cientifico, ¢ que as tecnologias utilizadas deveriam ser bem es- pecificadas ¢ testadas (Hayes, 2004). Assim, o movimento instaurou um foco na promogio de satide mental através da observacio, predicio modificagio comportamental (Skinner, 1953). “Este capitulo apresenta um panorama histérico da primeira, se- ‘Terapias Comportamentais, abordando as- gunda ¢ terceira geracéo de Pectos referentes as terminolo; gias utilizadas, origem, evolugio e focos clinicos das referidas abordagens, Ts wan nga ot ee gna eta da Trea Comporamertal leagao »,Mfaplas embasadas cientificamente::. apse cone ‘A abordagem é caracterizada pelo estudo do comportamento humano'e” lo desenvolvimento de es de aprendizagom sb ume perspeciva 2 a 08 comportamentaistas defendlam que as tecnoloiag uilizadas o UE sam serbem cpecteates ptesacans DESENVOLVIMENTO DA ABORDAGEM. Neste ponto o leitor pode se perguntar: “O que impulsionou 0 desenvolvimento do movimento da Terapia Comportamental2”, A primeira geracéo da Terapia Comportamental foi, 20 menos ‘em parte, uma movimentacio contra as concepgées clinicas predomi- antes na época, visto que estas eram pouco relacionadas com princi- ios basicos cientificamente testados. As especificagdes das interven- ‘$6es utilizadas eram muito vagas, havendo fracas evidéncias cientificas que demonstrassem 0 impacto positivo dessas intervenes. Assim, as duas correntes comportamentalistas da época, 0 neobehaviorismo ¢ a andlise do comportamento, ambas fortemente embasadas cientifica. ‘mente, se uniram contra os paradigmas clinicos predominantes (Hayes, 2004), Em outras palavras, a Terapia Comportamental se contrapds & subjetividade ¢ & inefcdcia na psicoterapia (Braga & Vandenbergue, 2006), ¢ passou a ser largamente desenvolvida em resposta A fraqueza pereebida na teoria e na prética psicanalitica. Assim, o comportamen- talismo apontou a fraqueza cientifica das tradigées clinicas existentes ¢ realizou esforgos de mudangas de primeira ordem empiricamente estu. dados, os quais estavam relacionados a principio comportamentais que tinham como alvo aspectos clinicamente relevantes (Hayes, 2004). E importante ressaltar que, apesar de os trabalhos experimentais sobre aprendizagem terem sido conduzidos desde o inicio do século XX, marcando 0 surgimento da Terapia Comportamental Contemporinea, a abordagem s6 comegou a ganhar forsa ¢ a ser efetivamente levada a Terapias Comportamentas de Tercera Gerago_ 34. sério na década de 1950, por meio dos esforcos de Hans Eysenck, que desempenhou_um importante papel dentro do movimento. Eysenck examinou a efetividade das chamadas serapias de insight (sendo a psi- canilise a mais conhecida) por meio de registros de hospitais e de com- panhias de seguro. Seu estudo concluiu que as pessoas tratadas com terapias de insight nao tinham maior probabilidade de melhoras do que aquelas que nao recebiam tratamento algum. Dessa forma, Eysenck ob- servou ¢ disseminou a ideia de que os tratamentos psicoterépicos da época nao possuiam evidéncias dé eficdcia. Tal conclusio despertou nos psicorerapeutas a busca por alternativas mais efetivas, sendo que a me- thor alrernativa era a Terapia Comportamental (Spiegler & Guevremont, 2010; Eysenck, 1952). Retomando: * A primeira geragdo da Terapia Comportamental foi uma movimet ‘contra as concepgdes clinicas predominantes na época. + As duas correntes comportamentalistas da época, o neobehaviotisr @ andlise do comportamento, se uniram contra os paradigmas clinicds predominantes. ag + A Terapia Comportamental foi largamente desenvolvida em resposta & queza percebida na teoria e na pratica psicanalitica. + 0s trabalhos experimentais sobre aprendizagem foram conduzidos des de 0 inicio do século Xx, marcando 0 surgimento da Terapia Comportae ‘mental Contemporénea. 4 * Aabordagem sé comegou a ganhar forga e a ser efetivamente levad ‘ério na década de 1950, por meio dos esforcos de Hans Eysenc.. * Eysenck observou e disserninou a ideia de que os tratamentos ps rapicos da época nao possuiam evidéncias de eficécia, o que des tou nos psicoterapeutas a busca por alternativas mais efetivast Antes de uma explanacio mais detalhada das trés geragées do movimento comportamental, convém esclarecer 0 emprego da termi nologia “Terapia Comportamental” ¢ “Terapia Cognitivo-Comporta- mental”. 32 _Primeira, Segunda e Terceira Geracdo de Terapias Comportamental TERMINOLOGIAS: TERAPIA COMPORTAMENTAL OU TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL? A Terapia Comportamental é frequentemente chamada na litera- tura como Terapia de Modificagao do Comportamento e Terapia Cogniti- v0-Comportamental. Muitos terapeutas distinguem os termos, mas tais distingSes nao sao padronizadas (Martin & Pear, 2007; Wilson, 1978). Herbet ¢ Forman (2011), por exemplo, utilizam 0 termo Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) para se referit a todo 0 movimento de Terapias Comportamentais, Os autores ressaltam que o térmo se tor- nou tio amplo que ¢ dificil encontrar uma definigéo clara, uma vez que diversas teorias, modelos, principios ¢ técnicas est4o contemplados pela TCC. Adicionalmente, esses pesquisadores enfatizam que, assim como as demais disciplinas cientificas, a TCC possui caréter dinimico, uma vez que esta continuamente ¢ inevitavelmente evoluindo. Isso porque existe um reconhecimento geral de que as abordagens atuais so imper- feitas, ¢ que mesmo as nossas melhores teorias estio incompletas, em- bora ainda no saibamos precisamente de que forma. Hoffmann e Asmundson (2008) utilizam 0 termo TCC de forma ampla, incluindo © trabalho cognitivo-comportamental que utiliza estratégias bascadas €m aceitagéo, chegando a utilizar a denominagio “TCC enriquecida” para se referir & utilizagao de tais estratégias por parte dos terapeutas cognitivo-comportamentais. Por outro lado, na opiniao de Spiegler e Guevremont (2010), o ter mo Terapia Comportamental é 0 mais apropriado para se referir a todo campo de estudos que inclui as chamadas “trés gerac6es”, uma vex que © tetmo Terapia Cognitivo-Comportamental € utilizado por muitos pes- quisadores e clinicos para se refetir especificamente a tratamentos que incluem estratégias de reestruturacéo cognitiva. Os autores afirmam que no existe uma definigao geral que possa descrever de forma adequada e concisa o que ¢ Terapia Comportamental (no seu sentido mais amplo), porém salientam que essa abordagem possui temas ¢ caracteristicas cen- trais, sendo considerada: 1) Gientifica: possui o compromisso com uma abordagem cienti- fica precisa, avaliada e suportada empiricamente. Terapias Comportamentais de Terceira Geragao 33. 2) Ativa: os pacientes devem fazer algo para lidar com seus pro- blemas ¢ néo somente falar sobre eles. A Terapia Comporta- mental é uma terapia de ago, tanto dentro da sesso como fora dela, através do uso de tarefas de casa. 3) Focada no presente: os terapeutas comportamentais partem da premissa de que os problemas dos clientes que ocorrem no pre- sente sio influenciados por condigées do presente. Assim, os procedimentos empregados visam 4 mudanga de fatores aruais que estao afetando os comportamentos dos clientes. 4) Focada na aprendizagem: a énfase na aprendizagem & um fator distintivo da terapia comportamental, que assume que a maioria dos problemas comportamentais é desenvolvida, mantida ¢ mu- dada primariamente através da aprendizagem. Um forte compo- nente educacional esta presente, ¢ o desenvolvimento de algu- mas abordagens dentro desse campo foi originalmente embasado ‘em principios basicos e em teorias de aprendizagens (e. g., con- dicionamentos clissico e operante, os quais sero abordados nes- te capitulo). 5) Individualizada: as circunstancias especificas perante as quais os problemas ocorrem e as caracteristicas pessoais dos clientes so levadas em alta consideragao na terapia comportamental. 6) Progressiva: frequentemente se move do mais simples a0 mais complexo, do mais facil ao mais dificil, ou do menos ao mais ameacador. 7) Breve: a abordagem é relativamente breve, envolvendo menos sessbes ¢, frequentemente, menos tempo global do que muitos outros tipos de terapia. A duracio do tratamento varia confor- me a complexidade e a severidade do problema que esti sendo tratado. Geralmente, a duragio seré maior quanto mais com- plexo e severo o problema for. Em concordancia com Spiegler ¢ Guevremont (2010), Hayes, Masuda ¢ Mey (2003) empregam 0 termo Terapia Comportamental de forma ampla para se referir & Terapia Comportamental tradicional, 4 Tera- pia Comportamental tradicional, Anilise Clinica do Comportamento, 34 Primeira, Segunda e Terceira Geragao de Terapias Comportamentais Terapia Cognitivo-Comportamental, Terapia Cognitiva as Terapias de Terceira Geracio. Nesse sentido, o termo “Terapia Comportamental” & empregado de forma genérica para se referir a uma ampla variedade de técnicas que podem ser utilizadas para tratar de problemas psicolégicos, assim como para se referir & anélise comportamental ¢ & combinagio de tal andlise com a pritica psicoterdpica. De forma geral, seus métodos focam so- Mente os comportamentos, ou uma combinacéo dos comportamentos com pensamentos e sentimentos. Neste capitulo, optamos por adotar o termo Terapia Comporta- mental para se referir as trés fases do movimento. Retomando: *A Terapia Comportamental é frequentemente chamada na literatura como Terapia de Modifcagao do Comportamento e Terapia Cognite vo-Comportamental. Apesar de muitos terapeutas e pesquisadores Gis tinguirem os termos que utilizam, ainda nao hd definigdes padronizadas. . + Alguns autores utilizam 0 termo Terapia Cognitivo-Comportamental para se referir a todo o movimento de Terapias Comportamentais (incluindo ‘movimento de terceira onda), enquanto outros julgam como mais apro- priado 0 termo Terapia Comportamental, uma vez que o termo Ter Cognitive-Comportamental & frequentemente utilizado para se referi tratamentos que incluem estratégias de reestruturagao cognitiva. | + Nao existe uma definiggo geral que possa descrever de forma concisa, ‘adequada 0 que é Terapia Comportamental (no seu sentido mais am lo), porém é considerada uma abordagem cientifica, ativa, individual: zada, progressiva, breve, focada no presente e na aprendizagem: + 0 termo Terapia Comportamental 6 empregado de forma ampla para referir & Terapia Comportamental tradicional, Andlise Clinica do Com tamento, Terapia Cognitive-Comportamental, Terapia Cognitiva e as Te pias de Terceira Geracao. Bi Mas, de onde surgiu a proposta de classificacao do movimento em “geragdes” ou “ondas”? ‘Terapias Comportamentais de Terceira Geragso_35 PROPOSTA DE CLASSIFICAGAO EM TRES GERACOES Steven Hayes é considerado o grande difusor da ideia de evolucao da Terapia Comportamental em trés geragées sucessivas, ¢ tem recebido crescente apoio da comunidade cientifica, apesar desse tema no estar livre de controvérsias. O termo “Terapias de Terceira Geragao” se refere a um conjunto de terapias que emergiu nos anos de 1990 dentro da tradicao da terapia comportamental (Pérez-Alvarez, 2012), ainda que tal denominagio sé viesse a ser dada ‘em 2004. Dentre as terapias de terceira geracio, as primeiras que tiveram um nome especifico foram a Terapia de Aceitagao € ‘Compromisso (Hayes, McCurry, Afari, & Wilson, 1991), a Psicoterapia Analitico-Funcional (Kohlenberg & Tsai, 1991) ¢ a Terapia Comporta- mental Dialética (Linehan, 1993). Assim, “Terceira geracdo” € um termo relativamente recente, uma vez. que foi difundido em grade parte pelo tra- balho de Hayes, publicado em 2004, intitulado Acceptance and Commitment Therapy, Relational Frame Theory, and the Third Wave of Behavioral and Cognitive Therapies (Hayes, 2004), no qual o autor propée a existéncia de trés ondas sucessivas da Terapia Comportamental, as quais representam assung6es, métodos ¢ objetivos dominantes do movimento. Considerando 0 grande ntimero de terapias emergentes junta~ mente com a dificuldade de inclui-las em alguma das classificagées en- tio existentes, Steven Hayes emprega a expresséo “Terceira onda de ‘Terapias Comportamentais”, para se referir a um grupo especifico de terapias comportamentais emergentes que compartilham elementos co- muns (Hayes, ct al., 2004). A terceira onda de terapia comportamental ‘emergiu a partir das geragdes anteriores. Dessa forma, a terceira geracio reformula e sintetiza as geragbes prévias, além de direcion4-las para te- mas ¢ dominios previamente valorizados por outras tradigées terapéuti- cas, buscando melhorar seus resultados (Hayes, 2004). Essas novas in- tervengées se aventuraram em 4reas tradicionalmente consideradas co- ‘mo menos empiricas no ambito do trabalho clinico, enfatizando tépicos como mindfulness, desfusio cognitiva, aceitacao, valores de vida, entre outros. Em relacéo aos aspectos filoséficos, elas possuem carter contex- tual, ¢ no que tange as estratégias de mudanca, sio enfatizadas tanto as 36_Primeira, Segund mudangas de primeira como as de segunda ordem (Hayes, Masuda, & Mey, 2003). Segundo Hayes (2004), dentre as principais raz6es que suportam uma nova onda de terapias comportamentais estéo as irregularidades identificadas na segunda geragao e as mudangas filos6ficas, conforme es- pecificado no Quadro 1.1. Quadro 4.4 Razdes que suportam uma nova “onda” de terapias comporta- mentais™ \tregularidades: de acordo com a segunda onda, as limitagBes dos métodos com- Portamentais e dos modelos de condicionamentes eram superadas pela adigdo de ‘métodos e de modelos cognitivos de mudanga, Havia@ ideia central de que a mu- | + No que tange a sua aplicabilidade, desde a introdugdo ‘do protocolo ori” i ; ginal de Beck para depressao, os protocolos da TCC tem sido desenvolvi- dos para diversos transtornos émocionais, os quais utilizam diferentes ‘técnicas terapéuticas. i eae j eat 0s protocoles’de TCC compartilham a premissa de que cognicoes mal -adaptativas esto relacionadas de forma'¢ausal ao sofrimento emocional |) @, portanto, através da modificacao das cognicBes, 0 soffimento emocio. nal ¢ os comportamentas maladaptativos diminuem.. «+ A segunda onda procurou preservar a objetividade 0 foco tecnico pre senté na primeira geracao, ao mesmo tempo em que tentou valorizar 0 ‘ser hurhano raciénal. ; * =k i B CRITICAS A SEGUNDA GERAGAO: TECNICAS COGNITIVAS SAO NECESSARIAS? Apesar de a TCC ser considerada a abordagem psicoterdpica do- minante, existem muitas questdes que ainda nao esto resolvidas no que diz respeito & reestruturagdo cognitiva, sendo que, nos iiltimos anos, a validade do modelo cognitive comportamental tem sido questionada. Tal polémica teve inicio a partir da constatagao de que ainda nao foi encontrado um padrio de evidéncias que suporte a mudanga cognitiva como um mediador-chave da efetividade da TCC tradicional. Alguns estudos mostraram que a adicéo de técnicas cognitivas aos tratamentos comportamentais néo produz beneficios e, em alguns casos, pode re- duzit a eficdcia de ditas intervengées (Forman & Herbert, 2009). O estudo mais frequentemente citado demostrou que nao existem diferen- ‘gas significativas entre intervengbes que empregaram técnicas formais de reestruturagio cognitiva e aquelas que empregaram apenas técnicas comportamentais (Longmore & Worrell, 2007), 0 que levou muitos cxiticos da segunda onda a argumentar que os beneficios de adicionar técnicas cognitivas as estratégias tradicionais da terapia comportamental * ee Segunda eTeroeia Geragdo de ram inexistentes, e que os resultados da TCC ocorrem mais pela pre- senga de técnicas comportamentais do que pela combinacio de técnicas cognitivas ¢ comportamentais (Alvarez, 2006). Conforme colocado por Herbert e Forman (2011), apesar de muitos cognitivistas argumentarem sobre esses achados dizendo que as intervengGes comportamentais podem produzir mudanga cognitiva, 0 fato € que, mesmo que isso ficasse demonstrado, a seguinte diivida per- sistitia: as estratégias de mudanga cognitiva sio necessérias ou aconse- Ihaveis em adi¢ao aos tratamentos comportamentais? Corroborando essa linha de raciocinio, importa assinalar que, no ano de 1987, Wegner, Schneider e Carter realizaram um experimento no qual verificaram que os participantes foram incapazes de no pensar durante apenas 5 minutos em uma imagem mental (urso branco), quando foram especificamente instruidos a fazer isso. Apés 0 experi- mento, tentar eliminar a imagem por um tempo pareceu fazer com que os participantes pensassem nela de forma mais frequente ¢ intensa, mostrando que a supressio voluntéria de um pensamento é contrapro- ducente. Esse “efeito rebore” tem sido alvo de estudos experimentais ¢, em linhas gerais, os resultados sao replicados (Clark, Ball, & Pape, 1991; Cioffi & Holloway, 1993; Marcks & Woods, 2005; Marcks & ‘Woods, 2007). Barraca (2012) afirma que conclusdes acerca do papel contrapro- ducente da supressio dos pensamentos tém levado cada vex mais pes- quisadores a nao acreditarem na eficicia de determinadas estratégias cognitivo-comportamentais (e. g., parada do pensamento). De fato, a liveratura cientifica tem demonstrado que estratégias desenhadas para nos libertar de pensamentos desconfortaveis geralmente acabam por au- mentar a frequéncia e a intensidade dos mesmos pensamentos que dese- jamos evitar ou diminuir (Rassin, 2005). [isto a 2 Benes aes. 4 Existem multas questoes que alnda nao estao resolvidas no que Tes reestruturacao cognitva, sendo que, nos uiltimos anos, a va- : fem sido questionada.i, Terapias Comportamentais de Terceira Geragto_ 49 Veficdcia de determinadas estratégias cognitivo-compor | parada do:pensamento). pe eta ‘+A literatura ;cientfica tem -demonstrado .que estratégias. desenhades. d desconfortaveis geralmente acabam wsidade dos resmos pensai que’ f PIS Ss A ED SPREE OS DEE SEGUNDA E TERCEIRA GERACAO DE TERAPIAS COMPORTAMENTAIS Em resume, dentre as raz6es para o surgimento da terceira onda estio: a énfase diminuida da segunda onda no papel contextual; os questionamentos relacionados a eficdcia das estratégias cognitivas; ¢ a classificagao do cognitivo como uma categoria & parte, em detrimento de ser considerado um comportamento (comportamento verbal) (Al- varez, 2006). AACT (Acceptance and Commitment Therapy — Terapia de Accita- ‘so e Compromisso) tornou-se a mais proeminente terapia de terceira geragio (Pérez-Alvarez, 2012). No que diz respeito as similaridades € diferencas entre essa abordagem ¢ a TCC tradicional, existem muitas semelhangas do ponto de vista de estratégias de mudanga comporta- mental. Por exemplo, ambas utilizam-se de exercicios de exposigao, ha- bilidades de resolugées de problemas, role playing, tarefas de casa € mo- delagem. Ambas estabelecem objetivos claros e observiveis, encorajam maior consciéncia dos pensamentos, sentimentos € sensagdes ¢ objeti- vam melhoras gerais na qualidade de vida. Entretanto existem impor- tantes discrepdncias teéricas entre as duas abordagens em relagio ao pa~ pel das cognigées. As cognicées séo vistas pela ACT como uma forma © 30 Primelra, Segunda e Terceira Geracio de Terapias Comportamentals de comportamento (comportamento privado) que deve ser identificada € ter sua fungao alterada, enquanto o foco da CBT inclui a modificagao dos seus contetidos. Assim, a ACT nao objetiva refutar cognigées des- adaptativas com o objetivo de modificar a resposta emocional e/ou com- portamental associada a tais cognigées. Nessa abordagem, os pacientes sio ensinados a aceitar emogGes e pensamentos indesejaveis. J a TCC tradicional possui uma premissa bisica de que as cognicées desempe- nham um importante papel na manuten¢io dos transtornos emocionais, através de sua influéncia nas emog6es € nos comportamentos. Como consequéncia, frequentemente, 0 foco de mudanga da TCC tradicional esti no contetido dos pensamentos, enquanto os tratamentos baseados em mindfulness e a ACT focam a fungio dos pensamentos ¢ a promogao de estratégias de regulacdo emocional que se contraponham & esquiva das experiéncias internas. E digno de nota que o uso compartilhado en- tre a segunda e a terceira onda das mesmas técnicas de tratamento nao € incompativel, visto que tais técnicas sio usadas dentro de um emba- samento tedrico distinto (Hofmann, Sawyer & Fang, 2010). No que diz respeito as diferengas na pritica clinica, um estudo que objetivou investigar as potenciais similaridades e diferengas entre a pratica psicoterdpica de profissionais que utilizam abordagens de segun- da e de terceira onda observou que existem diferencas no nivel técnico entre os dois grupos, com os terapeutas de terceira onda reportando maior uso de técnicas de mindfulness e aceitacao, assim como de técni- cas de exposigéo, enquanto terapeutas de segunda onda reportaram maior uso de técnicas de relaxamento ¢ de reestruturacio cognitiva — sendo que os terapeutas de terceira onda se mostraram resistentes 20 uso destas tiltimas. Em linhas gerais, os terapeutas de terceira onda se mos- traram mais ecléticos do ponto de vista técnico, 0 que poderé levar a diferentes resultados clinicos (Brown, Gaudiano, & Miller, 2011). Se por um lado a TCC tradicional busca eliminar ou 20 menos reduzir a duragio, a frequéncia ¢ a intensidade de pensamentos intrusi- vos, de memérias dolorosas, de cognigées desconfortaveis ou de pen- ‘samentos ruminativos, questionando sua credibilidade e buscando substi- tul-los por pensamentos mais adaptativos, as novas terapias assumem que técnicas como distragao ou substituigéo de pensamentos, parada do | | Terapias Comportamentais de Terceira Geragao_ 54. pensamento ou reestruturagéo cognitiva nio séo mais aconselhdveis (Barraca, 2012), e encorajam 0 uso de técnicas de mindfiulness e aceita- io para lidar com as experiéncias internas, ao invés de tentativas de mudar os pensamentos ¢ as sensagdes internas consideradas negativas (Herbert, Forman, & England, 2009). De forma geral, as terapias de terceira geragao, assim como as de segunda, reconhecem a importancia dos processos cognitivos ¢ verbais em. suas teorias de psicopatologia e em seus tratamentos (Herbert & Forman, 2011). Entretanto, ao invés de lutar para mudar pensamentos e sentimen- tos desconfortaveis, as novas abordagens focam em cultivar uma atitude de aceitacao sem julgamentos em relacao a todas as experiéncias humanas, a fim de aumentar 0 bem-estar psicolégico (Herbert & Forman, 2011). Hayes desafiou as terapias de segunda onda ao afirmar que, enquanto os clientes tentarem controlar suas experiencias internas, como é preconiza- do na TCC tradicional, eles terao maior probabilidade de continuar expe- rienciando sofrimento emocional (Cullen, 2008). Assim, apesar de os tratamentos baseados em mindfulness © as intervengées de segunda onda estarem estreitamente relacionados, existem importantes diferencas entre as abordagens (Hofmann, Sawyer, & Fang, 2010). Retomando: Cionados a eficdcia das estratégias cognitivas; a classificacdo do cogni ‘como uma categoria a parte, em detrimento de ser considerado um o Portamento (comportamento verbal). + A segunda onda de terapia comportamental deixou um pouco a énf nas causas ambientais e contextuais (&nfase presente na primeira G40) e passou a dar mais énfase ao papel das cognigdes nos problk emocionais e comportamentais. * No que diz respeito as simitaridades e diferengas entre a ACT (mais nente terapia de terceira geragdo) e a TCC tradicional: (1) ambas zam-se de exercicios de exposicao, habilidades de resolugies de proi mas, role playing, tarefas de casa e modelagem; (2) ambas estabelec¢ objetivos claros e observaveis, encorajam maior consciéncia dos per Mentos, sentimentos e sensagdes e objetivam melhoras gerais na qué Fy 52, Primera, Segunda e Tercera Geracio de Torani Comportamentais dade de vida; (3) as cognigdes so vistas pela ACT como uma forma di comportamento (comportamento privado) que deve ser identificado & sua fungdo alterada, enquanto 0 foco da TCC inclui a modificagao di ‘seus contetidos; (4) a ACT nao objetiva refutar cogni¢des desadaptativas, com 0 objetivo de modificar a resposta emocional ¢/ou comportamental associada a tais cognigées. Assim, os tratamentos baseados em mindful. ness @ a ACT focam a funcdo dos pensamentos e a promogao das estraté est no contetido dos pensamentos, muito em virtude da premissa basica de que as cognigdes desempenham um importante papel na manuten¢éo | dos transtornas emocionais, através de sua influéncia nas emogdes © Nos. comportamentos. 4 +0 uso compartilhado entre a segunda e a terceira onda das mesmas_ técnicas de tratamento nao é incompativel, visto que tais técnicas S80 usadas dentro de um embasamento te6rico distinto. | + Em tinhas gérais, os terapeutas de terceira onda se mostraram mais ecl ticos do ponto de vista técnico, o que poderd levar a diferentes resul dos clinicos. eS + De forma geral, as terapias de terceira gerago, assim como as de 86° gunda, reconhecem a importancia dos processos cognitivos e verbais ‘em suas teorias de psicopatologia e em seus tratamentos. ae * Ao invés de lutar para mudar pensamentos e sentimentos desconforti=.; veis, as novas abordagens focam em cultivar uma atitude de aceitagao sem julgamentos em relagdo a todas as experiéncias humans, a fimr de ‘aumentar 0 bem-estar psicol6gico. = Apesar de os tratamentos baseados em mindfulness e as intervengoes de segunda onda estarem estreitamente relacionados, existem impor. tantes diferengas entre as abordagens. iS TERCEIRA GERACAO DE TERAPIAS COMPORTAMENTAIS A terapia comportamental continuou evoluindo, ¢ o final do sé- culo XX ¢ 0 inicio do século XXI testemunharam o desenvolvimento de terapias que se destinam a aliviar o softimento dos clientes através de abordagens que utilizam estratégias de aceitacéo e mindfulness. (Spiegler & Guevremont, 2010). As abordagens de terceira onda mais conhecidas so a Terapia de Accitacio e Compromisso (ver Capitulos 6-10 deste _Teraias Comportamentais de Teresita Geracto_ 53 livro), a Ativacéo Comportamental (Capitulo 14), a Terapia Cognitiva Baseada em Mindfiulness (Capitulo 5), 0 Programa de Reducao de Estresse Baseado em Mindfulness (Capitulo 4), a Terapia Comportamental Inte- grativa de Casais (Capitulo 17), a Psicoterapia Analitico-Funcional (Capitulo 11), a Terapia Focada na Compaixao (Capitulo 13) ¢ a Terapia Comportamental Dialética (Capitulos 15 ¢ 16). Essas novas terapias possuem um grande enfoque comportamental ¢, de fato, estio embasadas nessa tradigao. Por exemplo, o contextualismo funcional, embasamento filoséfico da ACT, refere-se a uma extensio do behaviorismo radical de Skinner, 0 qual se detém na emergéncia de com- plexas habilidades cognitivas e linguisticas, além da aprendizagem de com- peténcias, a partir de processos bisicos de aprendizagem. A Psicoterapia Analitico-Funcional é uma abordagem contextualista funcional que tam- bém segue o behaviorismo radical de Skinner. A Ativacio Comportamen- tal utiliza-se de principios comportamentais, e as raizes da Terapia Com- portamental Integrativa de Casais estio pautadas na distingao de Skinner entre comportamento moldado por contingéncias ¢ comportamento gover- nado por regras (Pérez-Alvarez, 2012). ‘A nova geracio da terapia comportamental foi caracterizada por Hayes, conforme transcrito a seguir: Fundamentada em uma abordagem empirica ¢ focada em princ{pios, a terceira onda de terapia cognitiva ¢ comportamental € particular mente sensivel a0 contexto e funges dos fendmenos psicolégicos, nia. somente nas suas formas, ¢ também tende a enfatizar estratégias de mudanca contextuais ¢ experienciais em adicio as estratégias diretas € didaticas. Estes tratamentos tendem a buscar a construcio de repertérios amplos, flexiveis ¢ efetivos, mais do que uma abordagem eliminativa para problemas estreitamente definidos, ¢ a enfatizar a relevancia des- ‘es aspectos tanto para clinicos como para os clientes. A terceira onda reformula e sintetiza as geragées prévias da terapia cognitiva e com- portamental e as levam de encontro a questées, problemas e dominios previamente enderecados primariamente por outras tradigées, na es- peranca de melhorar tanto a sua compreensio como os resultados. (Hayes, 2004, p. 658) ‘54 Primera, Segunda e Terveira Geracdo de Terapias Comportamentals Visando a uma melhor compreenséo da caracterizagio supracita da, a descricio de seus componentes maiores, conforme propostos pot Hayes (2004), esta detalhada no Quadro 1.2. Quadro 1.2 Caracterizagao da terceira geragao de terapias comportamentais* “Fundamentada em uma abordagem empitica e focada em principlos”: a terceia ge- ‘ago mantém o compromisso com as raizes empiticas da terapia comportamental,tan- to 20 nivel de resultados como a0 nivel de processos e princiias. “Estratégtas de mudanga contextuals © experiencials em adigio as estratégias diretas, focadas na funcao mals do que na forma”: a caracteristica distintiva das in- tervengdes de terveira onda é o seu grau de énfase nas estratégias de mudanga con- textuais e experienciais. Ao mesmo tempo, elas ndo abandonam as estratégjas diretas ou didéticas de mudanga. 0 objetivo das estratégias de mudanga contextuais e expe- rienciais ¢ alterar as fungaes de eventos psicolégioos problemiticos, mesmo que sua forma ou frequéncia néo sofram mudangas ou apenas mudem lgeiramente. “Construgo de repertérios flexivels ¢ efetivos, mals do que a eliminagao de pro- blemas estreitamente definidos”: enquanto a primeira e a segunda onda enifatizam ‘como primeiro propésito terapéutico a eliminagao de pensamentos, emocbes € com- Portamentos probleméticos especifices, a tercera onda foca em habilidades novas € aplicéveis em diversos contextos. As novas terapias comportamentais focam mais 0 ‘empoderamento dos clientes e 0 aprimoramento do repertério do que o problema ‘comportamental ou psicopatologia especificamente defnida, “Enfatizar a relevancia desses aspectos tanto para clinica como para os clientes”: © ressurgimento da relevéncia dos processos normais é importante ndo s6 para os cl- centes, mas tamibém para as terapeutas, os quais so encorajados a praticar as habil-

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