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AMG 180 8. O Oral e 0 Escrito Dut, Lad | 20005 Lf a Tas hua mente ce ad Ushea ; Univers dade “tet i oem Objectivos Com 0 capitulo O Oral e o Escrito, pretende-se sensibilizar os formandos Para: (a) a especificidade dos modos oral e escrito; (b) os tipos de relagdo que se estabelecem entre unidades do oral e unidades do escrito; (c) caracterfsti- cas dos sistemas ortograficos ¢ de pontuacao do Portugués europeu contem- ordneo, No final desta unidade, 0 formando deve ser capaz de: * identificar varios tipos de sistemas de representagdo escrita; * identificar e compreender especificidades fonéticas e fonoldgicas do oral, em particular, varios tipos de processos fonolégicos frequentes na oralidade; identificar e compreender especificidades sintécticas do oral; ‘conhecer os prinefpios fundamentais da reforma ortogréfica que deu ‘origem ao sistema ortogrdfico em vigor; identificar © compreender as relagdes entre som ¢ grafema que caracterizam o sistema ortografico em vigor; * identificar e compreender as relagdes entre factos prosédicos ¢ sinais de pontuacao. Introdugao Como ja foi referido no capitulo 2, a concepgao tradicional de gramética normativa era instrumental: a gramética servia para regulamentar 0 com- Portamento linguistico dos falantes ¢ para thes permitir aceder 4 com. Preensdo dos textos literérios. Como foi igualmente mencionado, este tipo de gramatica definia como objecto a lingua escrita literéria, negligenciando tanto a mudanca linguistica quanto as especificidades da oralidade. No inicio do século XX, a dicotomia saussuriana entre lingua ¢ fala ¢ a distingao entre lingua falada (oral) e lingua escrita (escrito) possibilita- Tam o reconhecimento do primado do oral sobre o escrito e, consequente- mente, a eleigio da lingua oral como abjecto privilegiado da descricio Linguistica A investigagio desenvolvida desde entdo permitiu estabelecer 2 natureza Primaria, dindmica e nio regulamentavel dos sistemas orais por oposi- cio & natureza secundéria, estatica e regulamentivel dos sistemas escrite 1. Natureza primdria dos sistemas orais vs natureza secundéria dos siste- ‘mas eserizos: a lingua falada é comum a todas as sociedades humanas, visto que decorre da capacidade biolégica para a linguagem especifica da espécie humana; pelo contrério, a lingua escrita nao se encontra em todas as sociedades humanas - s6 algumas desenvolveram sistemas secundérios de representago da lingua falada: n Natureza dindmica dos sistemas orais vs natureza estatica dos sistemas escritos: a lingua falada muda ao longo do tempo, de forma no pré- -determinada pelos falantes, enquanto os sistemas eseritos perduram ‘anto tempo quanto o decidirem as instituigdes relevantes de qualquer sociedade: 3. Natureza néo regulamenidvel dos sistemas orais vs natureca regulamen- ‘dvel dos sistemas escritos: a lingua falada nao & passivel de legislacdo que a altere: pelo contrdrio, os sistemas escritos so fixados por legisla gio produzida pelas instituigdes nas quais cada sociedade delega a com- peténcia para o fazer, através de reformas ortogréficas, de revisdes ortogréficas de major ou menor extensio e de acordos ortogréficos, Se considerarmos diversos sistemas escritos desenvolvidos por sociedades humanas ao longo do tempo, verificamos que muitos deles evoluiram num ‘mesmo sentido. Assim, inicialmente, desenvolvem-se sistemas pictogréfi- os, i.e..em que “desenhos" representam objectos do mundo. O sistema de escrita mais antigo que se conhece. 0 sumério’. £01 inicialmente pictogré- 0, 9 mesmo acontecendo com a escrita egipcia (baptizada pelos Gregos 1s sumerios enum pove que sexo no sul a Mesoptinis a ais de 50 nas, O eescimento © con Dletifcato da wa eotidade leneio de region, 0 que desenvolser um sistema “Alar” um composto ts dns pimeins lees do alfabeto rego: alfasbeta, Como se sabe. existe em Porrugeés um sinérimo se aifabet. qu € gualmente um ‘composi. consruda com base no nome das gusto pi meires lene do alfteto ‘no: abecaéio, Ge hieroglifica); encontram-se sistemas pictogréficos numa grande vaiie™ Gade de povos ¢ continentes: entre os Esquimés do Alasca, 08 Incas do Peru, em povos amerindios do Canada ¢ dos Estados Unidos. em Attica, Frequentemente, 0s pictogramas evoluiram para ideogramas, ie, o§ “desenhos" deixaram de simbolizar objectos para representar conceitos « Propriedades associdveis a esse objecto ~ por exemplo, o pictograma quis Fepresentava o sol passou a representar ideias como calor, dia, lus. Com a progressiva estilizagio dos ideogramas, perde-se a relagtio no arbi- tréria entre 0 “desenho" € a ideia que ele exprime: os “desenhos” podem entio passar a representar as palavras da lingua, tornando-se simbolos lin. Buisticos. A escrita suméria passou por este processo, tendo evoluido de tim sistema pictogréfico para um sistema de escrita de palavras (a escrita cuneiforme). A escrita chinesa ¢ essencialmente um sistema deste tipo, em. que cada caraeter representa uma palavra A escrita cuneiforme foi adoptada pelos Assirios quando conquistaram a Sumétia e, mais tarde, pelos Persas. Mas o que estes povos fizeram foi uti_ lizar os sinais da escrita cuneiforme para representar unidades linguisticas mais pequenas do que a palavra — as sflabas. Um sistema de escrita de alavras evoluiu entZo para um sistema de escrita silabica. A escritajapo- esa é um sistema misto, que utiliza caracteres chineses que representam palavras € outros caracteres que representam sflabas A escrita egipcia sofreu uma evolugao paralela a escrita suméria: inicial- mente pictografica, evoluiu para um sistema de escrita de palavras e, final- mente, para um sistema de escrita sildbica, que foi adoptado por varios Povos. Um desses povos, os Fenicios, desenvolveu, por volta de 1500 ac., tum sistema silabico com 22 caracteres, em que cada caracter representava uma silaba constitufda por uma consoante e uma vogal. Quando os Gregos importaram este silabario, a complexidade da estrutura sildbica da sua lin- gua levou-os a (ansformar 0 silabario num alfabeto*: i.2., a utilizar cada Simbolo para representar unidades ainda menores do que a sflaba, ou seja, 0s sons ménimos da fala (consoantes € vogais). Surgia o primeiro sistema de escrita alfabética, o sistema de representagao da lingua oral mais eco- nomico e mais "linguistico", uma vez que exige a identificago prévia das unidades fnicas sem significado que as linguas usam para construir signi- ficados, © Portugués, bem como a maioria das linguas da Europa, utiliza o alfabeto 'atino: © Grego moderno utiliza 0 alfabeto grego e muitas linguas eslavas (entre as quais 0 Russo) utilizam o alfabeto cirflico, adaptado do alfabeto 20 por S. Cito. o evangelizador dos povos eslavos. As linguas semfticas (e.g.. Arabe, Hebreu) usam alfabetos derivados do Primitivo silabério fenicio. Sumario Em sintese: * a dicotomia saussuriana lingua/falae a distingfo entre modo oral e ‘modo escrito possibilitaram 0 reconhecimento do primado do oral sobre 0 escrito; 4 investigagao linguistica permitiu estabelecer a natureza priméria, dindmica ¢ ndo regulamentével do modo oral por oposi¢o A natu- reza secundaria, estética e regulamentavel do mado escrito; historicamente, muitos sistemas de representagio escrita evoluiram no mesmo sentido: sistemas pictograficos -> ideogrificos -> de escrita de palavras -> silébicos -> alfabéticos: © sistema ortogrifico portugués usa o alfabeto latino. 8.1 Especificidades fonéticas e fonolégicas do oral O oral ¢ o escrito constituem dois modos que, embora estabelecendo rela- ges entre si, possuem principios de funcionamento distintos. A escrita deve ser entendida como uma forma de codificar o oral, logo, o ensino do COdigo escrito deve fazer apelo a oralidade, sem no entanto a reduzir. A Feflexdo sobre o oral baseada apenas na informago sobre a escrita inibe a capacidade de explicitacio do conhecimento sobre as propriedades lin- ‘guisticas presentes na oralidade e que correspondem ao funcionamento da lingua (cf. capitulo 5). E a oralidade, nao a escrita, que nos fornece toda a informacdo necesséria para a execucdo da descrigio gramatical. De facto, a escrita ¢ uma forma simplificada de representar a realidade mais complexa que € 0 oral. Pense-se, a titulo exemplificativo, no inventa- tio das vogais do Portugués; qualquer sujeito alfabetizado diré que o Portugués possui 5 vogais - , , , e ; no entanto, como se verificou no capitulo 5, © Portugués possui 9 vogais orais ({a, ®, #, ©, @, i 2,0, ul) e 5 vogais nasais ([@, €, 1, 6, )). A resposta dos falantes mostra que @ sua reflexdo sobre o oral se encontra condicionada pela informaczo Sobre a escrita. No percurso escolar. durante 0 qual o conhecimento da lin- gua ¢ explicitado através da descrigto gramatical, a informacdo sobre a eserita sobrepde-se normalmente 2 informacdo sobre 0 oral porgue as pro- Priedades do oral so mencionadas em fungo da necessidade de ensinar 8 eédigo escrito. A explicitagio das regras inerentes a cada um dos dois ‘modos facilita a determinacao das relagdes que ambos estabelecem entre sf © permite o desenvolvimento da capacidade de explicitar 0 conhecimento. do oral independentemente do recurso a escrita. Nesta secgio, serd feito um levantamento ndo exaustivo de propriedades especificas do registo oral (fonéticas, fonol6gicas e sintécticas), que nos Permitirdo, na secgio seguinte deste capitulo, avaliar as relagdes entre esctita e oralidade. No capitulo 5, foi apresentado o inventério de sons do Portugués, que a seguir se repete: Sons do Portugués Vogais Semivogais Consoantes [al (i) (p] [e] (w) [b] (3) {t] [d] le] Gl] (k] [e] IW] [9] fi) [f] 2] Iv] [0] [s] fu] [2] U1) [8] [3] [8] . ) [m] [9] [a] (0) [n] () [4] {e] Ik] ‘Como entio foi referido, cada palavra do Portugués € constitufda por um som ou por uma combinatéria dos sons acima listados. Assim, a palavra é produzida como [simi'£8ti, ou seja, é constituida por 8 sons do Portugués. No entanto, esta palavra s6 € produzida com os 8 sons pelos falantes em situagdes de fala formais: a forma mais frequente de pro- dugdo da palavra , em situacio conversacional, ndo é [simi'@ti] mas sim (sm'4@t], na qual foram produzidos 5 da totalidade dos sons presentes na versio mais alargada. Entre a versio mais reduzida (5 sons em [sm'@t]) e a mais alargada (8 sons em [simi'4éti]), existem outras versdes possiveis como [sim'48t] (6 sons), [Sim' sti] (7 sons) ou {simi'A@t] (7 sons). Em resumo, para uma mesma palavra do léxico do Portugués, existe uma tinica verso ortogréfica mas € possivel encontrar diferentes versdes fonéticas gramaticais, dependentes do tipo de situaggo de locugiio em que o falante se encontra: 1 palavra do léxico do Portugués | palavra onogréjica _versdesfonéticas posstiels semelhante __[simi'4@ti] 8 sons {sim'48ti] 7 sons {simi'£@t] 7 sons (sim'48t] 6 sons [sm'set] 5 sons Emibora haja vérias formas possiveis de produzir a mesma palavra no registo oral, a forma ortogréfica da palavra € sempre a mesma, o que argu- menia a favor das naturezas distintas do oral e do escrito, pela observagio da maior complexidade do oral relativamente ao escrito. © uso de um dos vérios formatos fonéticos possiveis para uma mesma palavra depende da velocidade adoptada pelo falante na produgao de um enunciado de fala. A forma mais répida ou mais lenta de falar é dada através de um parametro fonético, a velocidade de elocugao, que for- nece informacao quantitativa sobre o ntimero de unidades linguisticas (sflabas ou palavras) produzidas durante um determinado period de tempo (segundo ou minuto), a partir de medicBes actisticas da duragio de um enunciado de fala. Assim, num enunciado de fala com velocidade de elocugdo alta (valor elevado de sflabas por segundo ou de palavrag Por minuto), o formato fonético das palavras é normalmente de extensio inferior ao das palavras produzidas num enunciado com velocidade de elocugao baixa (velor reduzido de sflabas por segundo ou de palavras por minuto). Avvelocidade de elocugao de um enunciado de fala est normalmente asso- ciada & sua natureza discursiva, Assim, em situagdes formais de produgéo de fala, a velocidade de elocucao € normalmente baixa; € 0 caso da leitura oral ¢ dos discursos profissionais tais como a apresentagdo de conferéncia sem suporte escrito, a apresentacio de programas de televisdo ou de radio, © discurso na sala de aula, o discurso dos magistrados em tribunal, a apre- sentacdo de um relatério numa reunio, entre outros. Pelo contrério, em situagdes ndo formais de produgao de fala, a velocidade de elocugao € nor- ‘malmente alta; € 0 caso, por exemplo, de uma conversa entre amigos ou de um relato de um jogo de futebol. 8.2 Processos fonolégicos frequentes na oralidade a) Supressiio de segmentos Quando ouvimos alguém falar muito depressa, dizemos que mal percebe- ‘mos 0 que a pessoa disse. Falamos mais devagar quando nos dirigimos a um estrangeiro que dificilmente entende o Portugués porque falar depressa diminui o grau de inteligibilidade dos enunciados. Isto acontece porque, quando a velocidade de elocugio é alta, o ntimero de unidades lingufsticas or parcela temporal aumenta, o que provoca geralmente apagamentos de segmentos, tanto dentro da palavra como entre palavras produzidas em sequéncia: (i) apagamentos de segmentos dentro da palavra velocidade de elocuedo baixa velocidad de elocuedo alta (aifi' nie] > [dP nie] (pi'nucje} > [p'nuejey (dizi tiri'séti] > (daite'sét] ee ee a "REESE ESSA A en RUST RSE RSS Rs i) apagamentos de segmentos no contacto entre duas palavras velocidade de elocugio baixa ['gatueme'relu] ~ ['métiv'berte] > —_['komi ‘uvef) > [if'ta e ku'mer] > velocidade de elocugdo alta ['gat eme'relu] ('mét e'berte] ('kom ‘uvef] (‘ta ku'mer] Os fenémenos de apagamento de sons da fala em situagdes discursivas com velocidades de elocugéo elevadas afectam sobretudo as vogais. \Vejam-se os seguintes exemplos: Apagamento de vogais velocidade de elocugio baixa (difi'nir] > ——[krif'tine] > —_[fimi’ninu] > _[fietilitdadi] > —_[ri"kaidu] > (pi kadu] > [if'teade] - [sak] > [di métif] > —_[vieti’bradu] > {si'dadif] > velocidade de elocugao alta (df'nir) [kef'tine] (fm'‘ninu} [fctli'dad] [R{"kaidu] [p'kadu] ['teade] ('sak] [d'méty] [vet'bradu] {si'dadf] Das vogais que so apagadas em Portugués, a vogal [i] ¢ a que mais fre- uentemente sofre este proceso por ser a vogal foneticamente mais fraca, As vogais que sofrem apagamentos sao sempre as vogais dtonas e nunca as, tdnicas, como se vé pela gramaticalidade das formas da coluna I (anotada com ok antes das transcricSes) e pela agramaticalidade das formas da coluna TI (anotada com * antes das transcrigGes Acento apagamento de vogais I. vogal dtona apagada [si'kar] -> —ok[s*kar] (lekif] > ok{'lekf] Inter] > — ok[R'ter] IL, vogat ténica apagada [skar] > “[si'ke] [lekif] > *[lks] [niter] > *fri'te] Tal facto verifica-se pela natureza foneticamente forte das vogais t6nicas ¢ pela natureza fraca das vogais dtonas, que facilita o seu apagamento, Mas velocidades de elocugo elevadas podem também provocar apaga- mentos de consoantes, como se verifica nos exemplos abaixo listados: Apagamento de consoantes velocidade de elocucdo baixa —_velocidade de elocugao alta —lrif'tine\/fkef‘tine] > [kf"tine] Gf'tav(f'ta] > fal [iuu'mes'pasef] > __[ku'me ‘pasef] falar baixo> —_[fe'lar ‘bajfu] {fe'la 'bajfu] b) Alteracdo da qualidade dos segmentos Por vezes. 0 aumento da velocidade de elocucao nao provoca o apaga- mento do segmento mas apenas 0 seu enfraquecimento. E 0 caso das vogais que se transformam em semivogais. Tal como no caso dos apaga- mentos de segmentos até agora referidos, o processo de alteraco da quali- dade dos sons pode dar-se dentro da palavra ou no contacto entre duas palavras. Vejam-se os seguintes exemplos: ieee banana (i) Vogais que se transformam em semivogais dentro da palavra velocidade de elocugio baixa _velocidade de elocugio alta [pi'ade] > ['pjade] [ti'atru} > (tjatcu] [mu'ede] > ['mwede] [tu'ade] > [wake] (ii) Vogais que se rransformam em semivogais no contacto entre duas palavras Velocidade de elocugio baixa —_velocidade de elocugao alta [di e'sukar) > [dj e'sukar? (ki ‘une] 7 (kj ‘une) [si ome] > {sj ‘eme] [sitié'kotre] = > [si tj @kotee] Em termos fonéticos, a substituicdo de uma vogal por uma semivogal é considerada um enfraquecimento segmental porque uma semivogal distin- gue-se da sua vogal correspondente pela duracio do som: a produgdo da vogal dura mais tempo do que a produgao da semivogal correspondente (Lig) € {u.w)). Outro processo de alteragdo da qualidade dos sons por enfraquecimento ocorre com algumas vogais dtonas, quando o seu apagamento nao se veri- fica. O caso mais frequente é 0 da vogal [i] que se transforma em [3 Vejam-se os exemplos que se seguem: ‘Vogal {i] transforma-se em [i] [fimi'ninu] ->_—_[fim#'ninu}’ {dif'kretu] -> — (dif*kretu) —[milnifteu] > [mi'nifteu} > (prisi'pesku) —[firtili'dadi] > [firtili'dadiy (prisi'pef ku] [diftnic] > (dif nir] ® Nos casos de substiuigio de vogsl por semivolgal erm final de palara a esa fn alterativa € 4 do apags- tent da vogal (ede agiear> [el esukar)), proceso cade ‘vex ais frequent no Por suis uma vet mas, nos casos de sutetivigie de voaal [i or voga (if a esate ea > apagamento da vogal ‘feminino> [fse'ninu) ou (tornina) 9 propésto dees concsios de classitieagto fonetica, ‘consulee o ep 5 * Pare presemaeso do fuo- Pomiguts, vejase 0 capinio 386 Em termos de abertura da cavidade oral, a vogal [i] jé fechada’, ou seja, possui o grau de abertura mais fraco; neste caso, o enfraquecimento dé-se pela passagem de ndo recuado (o [i]) a recuado (o [3]). ©) Insercio de segmentos Por vezes, quando (i) a velocidade de elocugao € baixa ou (ii) quando a palavra se encontra no final de um enunciado, logo, antes de uma pausa, os falantes inserem uma vogal final em palavras que terminam em consoante <1 [r] ou [#], como nos exemplos que se seguem: Inserco de vogal em final de palavra 1 1 [fe'lar] > —_[fe'laci] [flor] -> ——["floré] ['mai] > —['mali] [e'ne#] > —[e'nelii] Este comportamento dos falantes pode estar relacionado com uma adopgdo do formato mais frequente das palavras no Portugués: a maior parte das palavras termina em vogal. A maior parte das sflabas do Portugués nao ter- mina em consoante mas em vogal: as sflabas finais das formas da coluna T tém sflabas fechadas* (terminam em consoante, com formato CVC); com a insergdo da vogal final (cf. coluna I), a sflaba final fechada deixa de exis- tir e geram-se duas sflabas abertas (terminam em vogal, com formato CV), correspondentes ao formato silébico mais frequente. d) Metitese Em algumas sflabas iniciais atonas, mais fracas pela posi¢Zio em que se encontram (inicio de palavra e auséncia de acento), hé tendéncia para os falantes comutarem a posi¢ao dos segmentos. O processo ocorre frequen- temente com a vogal [i] ¢ com a consoante [c]: na palavra {pic'fejtu), a vogal e a consoante sublinhadas trocam de posigao na pro- dugao [pri'fejtu}, que gera o ero de ortografia frequente *. Vejam-se alguns exemplos: Metétese {pie'fejtu) -> — [pri'fejtul [tirmi'nac] -> — [teimitnac] [pic'kursu] > [pri'kursu] Todos os processos da oralidade observados até agora siio dependentes da situago discursiva em que os falantes produzem os enunciados de fala. A velocidade de elocucio adoptada condiciona frequentemente o formato fonético das palavras, na oralidade. No entanto, o seu formato ortografico sempre 0 mesmo, o que argumenta a favor das naturezas distintas do oral € do escrito. A obrigatoriedade da forma escrita e a possivel variagdo foné- tica leva a que, no processo de ensino e aprendizagem do Portugués, o tra- tamento da escrita seja privilegiado, em detrimento do da oralidade. O desenvolvimento da capacidade de reflexiio e de explicitacao do conheci- mento global que um falante tem da sua lingua passa por um treino esco- lar de: (i) definigdo das especificidades do oral do escrito; (Gi) relacionamento entre os dois sistemas, que identifique semelhangas e diferengas. Sumario Em sintese: *+ 0 modo oral e 0 modo escrito, embora estabelecendo relacdes entre si, possuem principios de funcionamento distintos; ‘Aescrita é uma forma simplificada de codificar 0 oral, logo, o ensino do cédigo escrito deve fazer apelo & oralidade, sem no entanto a reduzir. A reflexio sobre o oral baseada apenas na informaco sobre a escrita no permite a explicitagio do conhecimento sobre as pro- priedades linguisticas presentes na oralidade e que correspondem a0 funcionamento da Ifagua: + no caso especifico dos sons da fala, os processos a que mais ire- quentemente so submetidos na oralidade so os seguintes: a) a supressio, b) a insercio. c) a alterag3o das prapriedades dos seg- mentos e d) a metitese. Actividades: p. 412 7 Tal como em essos ante Flores, 9 apagamento da vogal [2] nese coatexco é muito frequeste (fpe'fejtu), 388 8.3 Especificidades sintacticas do oral Quando usamos a lingua como ouvintes e destinatarios de discursos orais n&o nos damos sequer conta que recebemos como input um continuum fénico que segmentamos e analisamos para Ihe atribuir significado, de tal ‘modo répido e automético € © modo como processamos linguagem verbal Quando nos pedem ['néWsi'portedje'brirese'nele7], segmentamos a cadeia de modo a reconhecer as seguintes unidades lexicais: niio-se-importa- de-abrit-a-janela, Pelo contrério, na escrita, as palavras esto jé identificadas, uma vez que um espaco branco assinala as suas fronteiras iniciais e finais, Se considerarmos exemplo tipico do oral informal, a conversa espontiinea, (cf. capitulo 7) deparamos com propriedades que no encontramos no escrito. Assim, como sabemos, pela nossa experiéncia de falantes, os intervenientes num diélogo falam por vezes ao mesmo tempo (tecnicamente, diz-se que num Gidlogo hd sobreposigdes), pelo que, quando transcrevemos conversa espon- ‘nea, temos a sensagdo de que estamos a ouvir misica polifonica. Acontece igualmente que uma fala pode ser interrompida pela tomada de palavra de outro interveniente na conversa e retomada apés o fim da interrupeao, como se pode ver no seguinte excerto de uma entrevista do Portugués Fundamenta B: que € feito das criangas? X: ch, uma mitida...uma...foi dada a um casal A: pois X: que também no tinham filhos e adoravam ter filhos. vieram buscar aquela menina. ¢ a outra... B: deus queira que ela seja feliz, coitadinha fin Portugués Fundamental, Métodos e Documentos, Tomo 1. Lisboa: : INIC-CLUL. Pp. 278-279] Do ponto de vista sintéctico, a conversa espontinea apresenta quatro carac- teristicas que a distinguem tanto do oral formal como do escrito. Em pri- meiro lugar, predomina a parataxe, ie., existe preferéncia por perfodos simples, por perfodos compostos formados por oracdes coordenadas, em Getrimento de periodos compostos formados por subordinago, assim como por unidades sintécticas constitufdas por pares pergunta-resposta. Assim, no excerto acima, existe um par pergunta-resposta; a resposta con- tém uma oragdio relativa e o comentario de B inclui uma compietiva, sendo as restantes frases frases mples ou forma jas por coordenacio. 2) Sen gir eTRRN Enea NR NAR RRR REPT Em segundo lugar, ocorrem na conversa espontinea muitas elipses, recu- peraveis a partir do discurso anterior, ¢ expressées déicticas, recuperéveis a partir da situacao. Observe-se 0 seguinte excerto de uma entrevista do Portugués Fundamental: 1.A: podia-me dizer, uma vez que vive na reboleira, quais so os trans- portes que utiliza para, para se deslocar daqui para lé e de lé para cé, 2.X: bom, da reboleira vou até & amadora, posso ir a pé que so um quar{to}, um quarto de hora, vinte minutos de caminho, posso ir de camionete, que...hd uma camionete que dé a volta a0 bairro, por- tanto faz a circulagdo, depois apanho 0 comboio venho aqui até benfica, até a estagdo aqui pertinho da escola, 3.A: ah, vem de comboio at estago. 4.X: e portanto no, ndo perco muito tempo nos transportes. 5.A: nao perde. quanto tempo leva, mais ou menos? 6.X: nfo sei...meia hora talvez, depende do hordtio dos combios, 7. sim, mas (..) 8.X: hd altura em que apanho logo 0 comboio. 9.A: e andam, costumam andar atrasados? 10.X: as vezes, as vezes chegam (...) [in Portugués Fundamental. Métodos e Documentos. Tomo I. Lisboa: INIC-CLUL. Pp. 264] Repare-se que a tomada de vez 5 contém uma elipse, tecnicamente, uma Elipse de SV: o falante X, ao dizer ndo perde, esté a recuperar, a partir da fala anterior anterior, a expresso muito tempo nos transportes. Na tomada de vez 9, a identificagdo do sujeito nulo dos predicados andam e costumam andar atrasados € fixada pelo objecto directo 0 comboio, da tomada de vez anterior. Do mesmo modo, na tomada de vez 10, 0 predicado secundério atrasados & recuperado a partir da tomada de vez imediatamente anterior. Quanto as expressdes déicticas, atente-se no fragmento da tomada de vez 1 para se... deslocar daqui para lé e de Id para ed. O inicio deste frag- mento permite-nos fixar o referente de [4 como Reboleira, mas, neste ponto do discurso, s6 os intervenientes conseguem identificar 0 referente de (daqui e de cd, uma ver que é 0 espago em que decorre a conversa que thes permite tal identificagdo: o leitor sé 0 consegue fazer na tomada de vex 2, dado que a frase venho para aqui até benfica permite inferir que tal local é Benfica, Dado que na conversa espontanea os falantes tém pouco tempo para pla- near 0 seu discurso e sabem que o grau de expectativa quanto a "qualidade linguistica" da sua produgio nao é tdo elevado como em situagdes formais, ocorrem tipicamente hesitagdes ¢ rupturas sintdcticas, i.c., situagdes de desrespeito de propriedades lexicais ou de regras sintécticas categ6ricas. No excerto que a seguir se transcreve, igualmente de uma entrevista do Portugués Fundamental, observam-se varias hesitagdes e rupturas sintécti- cas: 1X: eles comegaram as nove da noite, eram quatro automéveis que esta- vam sinalizados com um quadradinho de fluorescente num dos para(...) num dos péra-choques, no de trés. ¢ comegaram as voltas Aquele quarteirzo. 2.B: cada uma, cada grupo tinha uma missio (...) 3.X. pois. e comegaram &s voltas, portanto eram quatro automéveis, em cada automével ia dois capities — iam dois capitées —e ao fim de. de darem umas tantas voltas, verificaram que continuava a, a haver 86, que continuava a haver 56 quatro automéveis, portanto no havia ninguém infiltrados — os automéveis com os quadradinhos conti huavam a ser 0s quatro. e eles levaram toda a noite. quer dizer, desde as nove até que, que assaltaram 0, 0 radio clube. [in Portugués Fundamental, Métodos ¢ Documentos. Tomo 1. Lisboa: INIC-CLUL. Pp. 254] Em todas as tomadas de vez’se observam hesitagdes resolvidas com a repe- tigdo de uma ou mais palavras (num dos para (...) num dos pdra-choques: € ao fim de...de darem; que continuava a, a haver s6, que continuava a haver sd) ou com uma nova seleccZo lexical (cada uma, cada grupo) Observam-se igualmente rupturas sintécticas, em particular erros de con- cordancia: um erro de concordancia sujeito - verbo corrigido pelo préprio locutor (ia dois capitées — iam dois capitdes) e um erro de concordancia entre um predicado participial e 0 pronome (ndo havia ninguém infiltra- dos). Em sintese, construgdes paratdcticas, elipses, hesitagdes ¢ rupturas so as caracteristicas sintécticas mais s. lientes do oral (informal), Sumario Em sintese: + a.conversa espontinea face @ face, exemplo por exceléncia do modo oral informal, apresenta propriedades sintécticas que a distinguem de outros discursos orais e escritos; sobreposicdes ¢ interrupgdes, predominancia de parataxe, hesita- ‘sOes, repetigbes ¢ rupturas sto caracteristicas sintdcticas da conversa informal decorrentes do imediatismo e do controlo da situacao; recurso frequente a elipse e uso frequente de expressdes déicticas so caracterfsticas da conversa informal que iJustram a importancia que 0 contexto discursivo e situacional assumem nesta situagao. Actividades: p. 417 8.4 Do oral ao escrito: a ortografia Quando usamos oralmente uma lingua, a comunicacio estabelece-se gracas a0 uso do aparelho fonador (que produz os sons da fala), a0 ar (que propaga esses sons) e a0 aparelho auditivo (que recebe tais sons). Por outras palavras, © suporte fisico da oralidade (que, como jé foi referido, ¢ 0 uso primario da lingua) € de natureza anatémica (a articulagéo ¢ a audicZo) e aciistica (a pro- pagagio das ondas sonoras no ar). Pelo contrério, os sistemas de representa- Gio escrita conhecidos envolvem suportes fisicos de natureza visual (“desenhos", grafismos e letras feitos com tinta, carvao, etc. ou gravados com estilete, etc., sobre papiro, madeira, placas de barro, pedra, papel, .., ou, mais recentemente, representados por meios electrénicos num écran), Num sistema de escrita alfabética, sinais convencionais, denominados le- tras (ou grafemas), ¢ digrafos' representam os sons minimos da lingua’; sinais auxiliares superscritos &s letras, os acentos, assinalam a proeminén- cia de uma sflaba dentro da palavra (como acontece em geral em Portugués, em que 0 acento gréfico assinala a sflaba tOnica) ou a qualidade vociilica (como acontece em Francés em palayras como ([e]) ou ({e])). Os sinais de pontuagdo representam caracterfsticas prosédicas da fala — pausas (virgula, ponto e virgula, ponto) e entoacao (ponto de exclamacio, ponto de interrogac3o) — ou fornecem indicagdes sobre 0 tipo de discurso — citado (aspas) ou directo (travessio). * Um aigao um conju de lets que representam um Pomug’s som , que represen som [nj ov em Inglés cam , que repre sent 00m * xinem igualmen leas omnis ances supers tos oa uberis av ep <>, uma das represeagtes Som [=] em Bortsuts. oo Ge . que representa 0 som in] em Castano, 391 eres espanhola © francesa. ‘quero sono XVI pubis ‘am sicondses, etografias © snsness. Asim, 2) Ret Academia Expannoia publica entre (7256 (739 um dione 1 Onowrafia expanhola @ em Uma vez que € aprendida ¢ nao adquirida espontaneamente, ¢ que existe convencionalidade na escolha dos simbolos, a representagio escrita num sistema alfabético precisa de ser normalizada. Como se sabe, a escrita medieval caracterizava-se por uma oscilaco de grafias, que os seguintes exemplos ilustram (todos os dados so retirados de Mattos e Silva (1994)): 1. Muitos nomes terminados em nasal apresentam dupla grafia:

, , 2. No sistema dos pronomes pessoais, ocorrem oscilag&es gréficus como as seguintes 3. Existiam oscilagdes de grafia que deixam transparecer uma indecisdo quanto & representagiio de cada unidade lexical como uma palavra grifica ou quanto a fonetizacdo da representacdo escrita, amalgamando vérias unidades lexicais numa s6 palavra gréfica; assim, na versio do século XIV dos Didlogos de S. Gregério, ocorrem os seguintes pares de grafias: < AA situagio acima exemplificada comeca a ser sentida como problemética quando, gragas ao Renascimento, 0 uso das linguas vernéculas se comeca a impor progressivamente’ na administracao, na literatura e na ciéncia e quando a invencdo da imprensa faz nascer um piiblico de leitores muito mais vasto que procura textos nas linguas vernéculas. As gramiticas renascentistas séo um produto destes dois movimentos e nelas merece especial atencdo a ortografia, como disciplina gramatical que fixa as regras de representacio escrita de uma lingua — por outras palavras, como disciplina que visa normalizar a representacdo escrita de uma lingua. Devido a varios factores, de entre os quais se destaca 0 escasso papel nor- malizador desempenhado, em tempo préprio, pela Academia de Ciencias Lisboa" e a crescente influéncia francesa nas camadas cultas. a tuguesa continua a viver numa situagio de grafia babélica até & implanta- do da Repiiblica, A influgncia da ortografia francesa, conservadoramente etimolégica, ¢ explicitamente referida pela comissio encarregada pelo governo da Repalica de realizar a Reforma Ortografica de 1911 "Havia, logo desde 0 inicio dos trabalhos, dois sistemas a que se aten- desse, um déles a ortografia francesa, que mais ou menos coerentemente se tem bé certo tempo imitado em Portugal” {in Diario do Governo, 12 de Setembro de 1911] Desta influéneia ¢ testemunho, por exemplo, o seguinte excerto de A Absbada, de Alexandre Herculano: "No adro do mosteiro de Saneta Maria da Vietoria, vulgarmente chamado da Batalha, fervia 0 povo, entrando para a nova igreja, que de mui pouco tempo servia para as solemnidades religiosas. Os frades dominicanos, a quem elrei D. Jodo I tinha doado esse magnifico mosteiro, cantavam a missa do dia debaixo daquellas altas abobadas, onde repercutiam os sons do orgam ¢ 08 ecchos das vozes do celebrante, que entoava os kyries.” [in Herculano, Lendas ¢ Narrativas, 1. 28* edigio. Lisboa: Livraria Bertrand. sid. P, 230}, ‘Ao darem-se conta deste problema, o eminente fonélogo Goncalves Viana e Vasconcellos Abreu, nas Bases da Ortografia Portuguesa de 1885, pos- tulam os seguintes principios gerais da ortografia e os princfpios particula- res da ortografia portuguesa: I PRINCIPIOS JERAIS DE TODA A ORTOGRAFIA 1.° Uma Ifngua ¢ um facto social; no depende do capricho de ninguém alteré-la fundamentaimente. 2. Como facto social é produto complexo, variivel por evolucdo prépria da sociedade cujas relacdes serve. 3°A ortografia € 0 sistema de escrita pelo qual ¢ representada a lingua dum povo ou duma nagdo num certo estado de evolucdo glowidjica {glotoldjica = lingufstica). 4° Esta representagdo deve ser exueta para ‘odo 0 povo, para toda a nagao © portanto deve respeitar a filiacdo histérica 5." E evidente, pois, que a ortografia no pode ser especial dum modo de falar, quer éste seja dum s6 individuo, quer duma provincia ou dialecto da lingua. 6° Em virtude disto a ortografia no pode representar a pronunciagao, que por certo nio seré una; ha de representar a enunciagdo [enunciaga forma fonétical, a qual é sempre comum ao povo, & nagio que fala uma 86 lingua como seu idioma préprio e exclusivo. 7 Na ortografia, por consecuéncia, nio se pode fazer uso de sinais que indiquem prontincia de uma qualquer letra vogal, excepto quando essa vogal carega de ser pronunciada com modulagao especial para a tingio conveniente do emprégo sintéetico do vocdbulo, ou ainda (¢ menos vezes em portugués) para distinguir na grafia tinica modos dife- rentes de silabizaciio, 8.° Para se representar a enunciagdo carece-se de acentuar grificamente 0 vocabulo, ¢ a ortografia deve ser tal que, subordinada as leis de acen- nna lingua falada, mostre para qualquer vocdbulo a sua silaba ‘6nica a quem desconheca o vocdbulo que Ie. Escélio. # evidente que a acentuacio grafica é initil na lingua escrita cuja constituigdo glotoldjica a determina invaridvelmente; tal o latim clis- sico © as linguas jerménicas. I PRINCIPIOS PARTICULARES DA ORTOGRAFIA DA LINGUA POR- TUGUESA ensino ortogréfico da lingua portuguesa reduz-se, portanto, na prética, a0 ensino de. 1. Leis da acentuagao nos vocébulos simplices e nos compostos. II Valor hist6rico dos fonemas ainda proferidos e dos que jé nio se proferem: influéncia déstes sbre a modulacdo da vogal precedente. TIL Conhecimento dos ditongos e sua dissolugto. IV. Silabizagai. V. Homénimos ¢ parénimos. VI. Fungdo dos sufixck. VII. Composi¢do dos vocabulos e formagao da perifrase nos verbos, ¢ uusos das encliticas Diremos destes assuntos em outros tantos parégrafos, definindo, todavia. primeiro, 0 que entendemos por ortografia portuguesa, "ORTOGRAFIA PORTUGUESA" é o sistema de escrita ou grafia repre- sentante comum de todos os dialectos do portugués falado, a sua base € a his- \oria da linguajem portuguesa considerada como lingua e como dialecto. [Goncalves Viana & Vasconcellos Abreu. Bases da Ortografia Portuguesa de 1885. apud Castro, Duarte & Leiria (1987) A Demanda da Onografia Portuguesa. Comentério do Acordo Ortogrfico de 1986 ¢ Substdios para a Compreensdo da Questo gue se ihe Seguiu. Lisboa: Edigdes Jodo Sé da Costa. Pp, 141-142] PERS "are ET ERA RH ee eee Empenhado no alargamento da escolaridade e no combate ao analfabe- tismo, 0 governo republicano nomeia, em 15 de Fevereiro de 1911, uma comissio composta por Carolina Michaélis de Vasconcelos, Goncalves ‘Viana, Candido de Figueiredo, Adolfo Coelho ¢ Leite de Vasconcellos, com a misao de "fixar as bases da ortografia que deve ser adoptada nas escolas € nos documentos e publicacées oficiais, e bem assim organizar uma lista ou vocabulério das palavras que possam oferecer qualquer difi- culdade quanto & maneira como devem ser escritas"". Em 16 de Margo do mesmo ano a Comissio ¢ alargada, passando a integré-la igualmente Gongalves Guimaraes, Ribeiro de Vasconcelos, Epifiinio da Silva Dias (que pediu escusa), Jiilio Moreira, José Joaquim Nunes e Borges Grainha” Esta comissio de luxo, que integrava os maiores filélogos e linguistas da época, escolheu como relator Gongalves Viana, tomou como ponto de par- tida os trabalhos deste jd publicados sobre questées ortogréficas e terminou ‘os seus trabalhos em 23 de Agosto de 1911, tendo o seu relatério sido publicado no Didrio do Governo, n° 213, de 12 de Setembro de 1911. Informada por um sélido conhecimento da estrutura fonolégica da lingua ¢ das diferencas entre dialectos setentrionais e centro-meridionais, assente num inteligente compromisso entre diacronia e sincronia, movida por intuitos de simplificagdo, a Reforma Ortografica de 1911 elimina anacronismos (grupos consondinticos como , , , <; consoantes duplas como

, , , ,

, ), define os prinejpios da acentuagio gri- fica, do uso do til e da escrita dos ditongos, fixa a escrita das sibilantes com base num critério etimol6gico ainda sobrevivente em dialectos mais conser- vadores ( vs ; vs ; vy ) e regula o uso do hifen. A ortografia em vigor em Portugal continua a ter como base esta reforma ortogriifica, alterada pelos Acordos Ortogréficos entre a Academia das Cigncias de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras assinados em 1931, 1945 e 1971” e pelo decreto-lei do governo portugués de 1973" Relacoes entre grafemas e sons da fala A relagio entre os grafemas da ortografia oficial e os sons da lingua é com- plexa (cf. capitulo 5). Dado que € tarefa do professor iniciar os seus alunos na utilizacdo da ortografia, a reflexdo sobre a oralidade pode ser mediada pela manipulacdo dos simbolos do cédigo escrito mas deve explicitar as diferencas bésicas entre o escrito e o oral, enquanto realidades distintas: 0 primeiro € uma convengdo ¢ o segundo decorrente da nossa capacidade bioldgica para comunicar através de sons produzidos pelo aparetho fona- dor. De uma forma simplificada, ¢ preciso demonstrar ao aluno que a orto- afia nao representa os sons do Portugués de uma forma biunivoca: ° Apu Casvo, Dust de Leis (987) A Demanda de Orrogrefia Portuguese Comentario do Acordo Ortogréfica de 1986 ¢ Subsdispara @ Cmpreensd da Questo que 2 Be Sepia Lisboa: Baigies Jado Si ot Cosa, Pp, 207-208 1a 208. Da hiss dos desencon ros onogrificos entre Ponagal eo Bail inten se 08 spsintes episSdios: fam 15 de Novembro de 1915, a Academia Brasileira aprova 2 asesio 2 Reforma Onogrifca de 1911; revogs tal adesio em 24 de "Novembro de 1919.0 Acordo de 1931. proposto pela Academia Brasileira de Levas. 36 € parcalmente accite pela Academia das CCitncias de Lisbos, & aus pens pla Corsini ra lei de 1934, sendo restabelecido pelo governo baileiro em 1938, O santo ae 1985 ¢ reapeiada em Porgal. mas dé orgem 3 uma longa buat planer: taro Bras, que conde 3 5 rio aplcagie. O- acordo (Onogsfico negocio em 1986 eae as dss academe, evido 3 polémics fevantad, cof. aleragdes aprovadas em. Pomugal em 1990 CConmad, devido 30 facto de sinda nfo ter sido catfiado ne todas os pases de lingua oficial portuguesa, no se "sw diploma elimina 0 scent grive © 9 crenfeno bare einalar oecetosecun em -cmente> © com sis imnutveincades por, 395 a) um mesmo grafema pode representar mais do que um som da fala; b) inversamente, um mesmo som pode ser representado por diferentes gra- femas; Se a iniciacao do ahino a reflexao sobre a oralidade for feita com o propé- sito exclusivo da aprendizagem do sistema ortogrifico oficial, a capaci- dade de explicitagao do conhecimento sobre o oral ndo serd desenvolvida. Para que tal nao se verifique, € preciso que o trabalho com o aluno incida sobre duas unidades: - 0 som da fala, unidade da oralidade; ~ 0 grafema ou letra, unidade da escrita Retome-se o exemplo classico das vogais: qualquer falante alfabetizado do Portugués afirmard que a sua lingua possui 5 vogais: , , , e . No entanto, sabemos jd que 0 inventario fonético do Portugués possui 9 vogais orais e 5 vogais nasais, conforme foi demonstrado no capitulo 5: Vogais do Portugués Vogais orais Vogais nasais 1. a vogal (a] em ; 1. a vogal (8) em ; 2. a vogal [e] em ; a vogal [&] em ; 3. a vogal [3] em ; 3. a vogal [i] em ; fe] em : 4, a vogal [6] em ; 5.a vogal [e] em ; - a vogal [ti] em : . a vogal [i] em a vogal [3] em ; avi [0] em ; a vogal [u] em : A afirmago dos falantes do Portugués (a lingua tem 5 vogais) ¢ assim condi- cionada pela aprendizagem da escrita e ndo pela reflexdio sobre a lingua falada. Em seguida, serfo apresentados exemplos dos vétios tipos de relacdes que sons ¢ ortogratia do Portugués estabelecem entre si I : i i £ Existem alguns casos de biunivocidade na relagdo entre som da fala ¢ orto- grafia, exemplificados a seguir (um dado som [x] € representado apenas pelo grafema ; 0 grafema representa apenas 0 som [x]): Relagées biunivocas entre som e ortografia Som da fala Ortografia a. som [p] em ['povu] grafema

em b. som {t] em ['teme) grafema em c. som [f] em ['favef] grafema em No entanto, a maior parte das representagdes dos sons na ortografia nao obedece a uma relacio biunfvoca entre os dois sistemas. Por um lado, um som pode ser representado por um tinico grafema mas esse grafema é usado na representagiio de outros sons; por outro lado, um som pode ser represen- tado por vérios grafemas. Vejam-se alguns exemplos de ambos os caso: Som representado por um tinico grafema, usado na representacdo de outros sons Som da fala Ortografia som {mj em['met] _grafema em (0 representa ainda a nasalidade da vvogal [8] na palavra ['s€pri] ) b.som [n]em ['nate}grafema em (0 e, com , forma o dfgrafo , que representa 0 som (p] em ['mepe] ) c.som (lJ em [‘late]__grafema em (0 representa ainda o som [4] na palavra ["fe¥] e, com , forma o digrafo . que representa o som [4] em ['maAe] )

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