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ÉTICA
ÉTICA
1. Falta de Ética
Na sociedade de hoje impera o relativismo dos valores. Cada qual faz suas opções de modo subjetivo:
"Você decide". Na base deste relativismo está o individualismo moderno. Cada um busca sua
felicidade pessoal, segundo a "lei de Gérson: "tirar vantagem em tudo". A mídia é um potente difusor
dessa falta de uma ética sólida.
Não haveria normas objetivas, nem propriamente decisões, mas apenas preferências pessoais, como
num supermercado. Com o tempo o relativismo leva ao indiferentismo moral ou a-moralismo e
finalmente ao niilismo: "Ser imperador do mundo ou bêbado - dá tudo no mesmo" (Sartre, O ser e o
nada).
O certo é que hoje há uma des-orien-tação geral, sobretudo da parte da juventude frente aos perigos do
sexismo, das drogas e da violência. Os pais se queixam: "Não se sabe mais o que é certo e o que é
errado". Há confusão entre o bem e o mal (Is 5,20). Figura do "homem moderno" é Pilatos,
perguntando perplexo: "Que é a verdade?" (Veritatis Splendor = VS 84).
Na sociedade brasileira em particular, como afirma a CNBB (Ética: Pessoa e Sociedade = EPS, 41-
42), reina uma mentalidade que dificulta a criação de uma Ética pública consistente e que se exprime
nas formas seguintes:
o ethos autoritário que se exprime em frases como: "você sabe com quem está falando", "para os
amigos tudo, e para os inimigos a lei" e "quem pode, pode" - restos da mentalidade "Casa-Grande e
Senzala";
e a filosofia do "jeitinho", que pode ir até à conhecida malandragem.
Logicamente, o ethos relativista e egoísta de hoje, ou seja, a moralidade frouxa de nossa sociedade, só
faz reforçar as desgraças sociais já existentes: a injustiça social (desigualdade e exclusão), a corrupção
administrativa, as mentiras dos políticos e da mídia, a violência urbana, etc. (VS 98).
Contudo, em reação ao relativismo moderno, levanta-se hoje outro extremo: a rigidez moral, expressa .
2. Demanda de Ética
Busca-se cada vez mais hoje uma "bússola ética" que guia nosso agir. Sinais dessa busca são, entre
outros:
as numerosas publicações sobre Ética;
as "comissões de ética" e de "códigos de ética" (deontologia) de que estão se dotando muitas
Instituições, como empresas, partidos, o Congresso, o Governo;
o apelo eficaz que se faz na vida pública a "Carta dos Direitos Humanos" e a outros documentos,
como o "Estatuto da criança e do adolescente", a "Carta da Terra", etc.;
os grupos que cultivam a "solidariedade" social: igrejas, Ongs, o "povo de Seatle", etc.
B. Esclarecimentos terminológicos
1. Diferença entre Ética e Moral. No geral, se equivalem, até pela etimologia: ética é palavra grega
que corresponde à latina moral. Mas hoje tende-se a distingui-las:
Ética: falaria dos princípios ou dos fundamentos, como "faça o bem!". Tem a forma de um apelo
interior, de uma exigência ou aspiração íntima. Supõe convicção, "senso" de justiça, solidariedade,
compaixão, etc.
Moral se referiria a normas concretas, como "não matarás!". Teria a forma de uma obrigação mais
ou menos imposta. Aí age-se "por dever" ou "por lei".
Contudo, uma pede a outra: a Ética guia e inspira a Moral e esta concretiza a Ética. Naturalmente, esta
última é que é mais importante e deve ter sempre a primazia.
Às vezes, na linha de Hegel, distingue-se Moral como coisa privada, subjetiva; e Ética como coisa
pública, objetiva. Ética seria superior à Moral (cf. CNBB, Ética: Pessoa e Sociedade = EPS, 18).
2. Moral descritiva e moral prescritiva. Às vezes são confundidas, mas sem razão:
Moral descritiva. É a que as pessoas praticam de fato e que se pode inclusive pôr em estatística.
São os costumes reais de um povo (e q o V , ethos = costume, hábito). É a "Ética vivida" (Ethica
Elementos da Ética
A. Valor ou bem
1. Que é valor. A sociedade capitalista reduz cada vez mais o valor das coisas ao seu "valor
monetário" (o preço): é a "mercantilização geral" da vida. Mas o valor intrínseco ou ontológico das
coisas é sua dignidade, sua grandeza, excelência. É o "esplendor da verdade" das próprias coisas e de
nosso próprio ser. É como a irradiação ou o perfume que emana do coração mesmo das coisas. É mais
simplesmente a "bondade" das coisas. "Valor" é termo moderno para o "bem" dos clássicos.
Em verdade, "valor" ou "bem" é o objeto ou termo de nossa vontade, de nosso desejo. Daí a atração
que os valores (justiça, caridade, etc.) exercem sobre nós: são desejáveis, amáveis, fascinantes. Eles
movem o coração humano. Por isso mesmo, a Ética se apresenta como um "saber dinâmico" e não
como uma doutrina abstrata, idealista.
2. Tipos de valores. Segundo a tradição clássica, são três:
a.valor-fim. É o bem-em-si (bonum honestum). Por ex. a justiça, a caridade, a verdade, a fé em Deus, a
coragem e toda e qualquer outra virtude moral. Esses são valores que "valem por si mesmos";
b.valor-meio. É o bem-para (bonum utile). Por ex. o dinheiro, a saúde, a vida biológica, a beleza
exterior, o poder político, o saber cultural, etc. Esses são "valores médios": vale em função de outros
valores;
c.valor agradável (bonum delectabile). Por ex. o prazer da mesa e do sexo, o prazer estético (música,
poesia, pintura, etc.) e todas as formas de lazer: praia, futebol, passeios, etc. Diz-se que o segredo da
educação é "unir o útil ao agradável". Esses valores só "valem realmente", ou seja, só são "eticamente
bons" quando acompanham os outros valores. Assim, o prazer da mesa vale realmente quando
favorece a saúde; e o sexo quando promove o amor autêntico.
3. Bens ilusórios. Quando agimos, somos conduzidos sempre por algum bem ou valor, mesmo quando
fazemos o mal. É impossível "amar o mal" como tal. O mal só pode ser amado "sob as espécies" ou
"sob os véus" do bem. Nesse caso, se trata de um bem aparente, ilusório, falso (maia indiano).
4. Hierarquia de valores. Jesus insistiu muito nisso, especialmente contra os fariseus que igualavam
todos os preceitos da Lei (313). Para Ele havia o "primeiro e maior mandamento": amar a Deus; e
depois, o "segundo, semelhante ao primeiro": amar ao próximo" (cf. Mt 22,34-40). Punha o amor do
irmão sobre tudo, inclusive sobre os deveres do culto: "Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que
pagais o dízimo da hortelã, do funcho e do cominho, enquanto descuidais do que há de mais grave na
Lei: a justiça a misericórdia e a fidelidade... Vós filtrais o mosquito e engolis o camelo" (Mt 23,23-
24). "Quero a misericórdia e não (= mais que) os sacrifícios" (Mt 9,13 e 12,7). Para Jesus, o ser
humano vale mais que qualquer lei, estrutura ou sistema: "O sábado foi feito para o homem e não o
homem para o sábado" (Mc 2,27).
Por princípio, o valor-em-si é o mais importante, sendo por isso o "qualificador" objetivo dos outros
tipos de bem. Ex.: 1) O bem útil "dinheiro" é bom quando serve para "fazer o bem", e ao contrário; 2)
o bem agradável "sexo" é bom quando acompanha o "amor fiel", e o contrário. É o que veremos
melhor abaixo, falando das "fontes da moralidade".
5. Conflito de valores. Ética é corresponder à "natureza humana". Essa, porém, não é simples, mas
complexa: compreende corpo e alma, impulsos e liberdade. O instinto é natural, mas a razão também o
é, e mais ainda. Diz-se que a pulsão sexual é "natural", mas "mais natural" ainda é o respeito pelo
outro e por seu corpo.
Ora, quando há "conflito de valores", os valores maiores passam adiante dos menores. Assim, a vida
biológica é boa, mas pode ser sacrificada por um bem maior: o "amor pelos amigos" (Jo 15,13) ou a fé
em Cristo, como fizeram os mártires (Mt 10,28; VS 91). Também, o amor conjugal e/ou familiar é
santo, mas pode ser preterido pelo serviço do Evangelho (Mc 8,35; Mt 19,12).
B.As virtudes
Definição. São mais que atos; são atitudes estáveis ("hábitos bons") que se adquirem pela
repetição dos atos bons e que tornam a prática do bem espontânea e agradável. O que importa mesmo
é "ser bom" (ter uma atitude constante de bondade) e não tanto "fazer o bem" (praticar atos
esporádicos de bondade). Entre as "virtudes", costuma-se distinguir:
da Política, quando usa a palavra mais para esconder que para revelar a verdade - o que hoje já
virou "vício" (EPS 141);
da própria Igreja, quando faz "jogo de bastidores" em questões que envolvem diretamente o Povo
de Deus e que este tem direito de saber.
4. O dever do silêncio. Às vezes deve-se, não "deformar" a verdade (mentir), mas escondê-la, por
amor às pessoas e à sua privacidade. É o caso do sigilo confessional, do segredo profissional e da
reserva sobre confidências pessoais.
Isso vale em termos. Pois quando o silêncio prejudica a terceiros, então ele se torna abusivo. É o caso
do sigilo bancário para políticos ladrões ou do silêncio em tribunal para criminosos.
1. de nossos atos: os nossos desejos profundos. Eles tocam dois desejos poderosos: o sexual e o de
possuir coisas. Passa-se aqui dos atos externos para as atitudes interiores. Tomemos o primeiro,
referente ao IX Mandamento.
2. "Ordenar nossos amores" (Sto. Agostinho). Esse mandamento visa "governar nosso coração",
moderando seus sentimentos, recordações, sonhos e devaneios e possivelmente o inconsciente.
Concerne em particular o "desejo sexual" e a "paixão erótica". A tradição fala em concupiscência
(cobiça), enquanto desejo veemente ou mesmo paixão - impulso que, por causa do pecado, tende à
descoordenação e ao desequilibrado.
Por isso o IX Mandamento ordena a "disciplina do desejo amoroso", a fim de evitar o consenso e a
complacência, que criam apegos, subjugam o coração e tiram a serenidade. "Quem olhar para uma
mulher, com desejo de possuí-la, já cometeu adultério em seu coração" (Mt 5,28).
3. Paixões irresistíveis? Não há paixão humana tão avassaladora que atropele de todo a liberdade,
última determinação do agir. Só há "mulher fatal" ou "homem irresistível" se começamos por ceder
aos apelos de um eros ilegítimo. O mesmo vale para o "crime passional". Daí a sabedoria dos
Provérbios: "Cuida com toda a vigilância do teu coração, pois nele estão as fontes da vida" (Pv 4,23).
Assim mesmo, "a carne é fraca". Daí que só com a força da graça a pessoa consegue dar conta de seus
impulsos e paixões. Experimentou-o Sto. Agostinho: "Confiava em minhas próprias forças. Tolo! Não
conhecia ainda a Escritura que diz: Ninguém será continente se o Senhor não lhe concede a graça"
(Conf. VI, 11,20).
4. Mandamento contracultural. O "não desejar" (quer a mulher, quer o homem "comprometidos")
vai na contramão da atual "cultura do erotismo", cuja permissividade explora o impulso sexual sob as
formas mais sofisticadas e extremadas ("libertação sexual"). O resultado disso é, na verdade,
profundamente decepcionante: é banalizar o sexo e torná-lo desinteressante (quando o sexo precisa de
"tabus" para se valorizar: Freud).
A Ética cristã da sexualidade pede um respeito reverente pelo corpo, pela sexualidade, pela figura da
mulher, pelo casamento e finalmente pela família.
5. Virtude positiva: a pureza: "Felizes os puros de coração" (Mt 5,3). Esses são os "limpos de
mente" em face do outro sexo, disciplinando a imaginação e a vista (mídia, internet, etc.). Pureza é
uma atitude mais fina e interior que a mera continência ou mesmo que a castidade. Ela vê sempre no
outro e na outra uma pessoa, com nome, rosto e coração, sem coisificá-lo/a, reduzindo-o/a a mero
objeto fruitivo. Mais, chega a ver na corporalidade do varão ou da mulher a beleza e a sabedoria do
Criador.
6. Pudor: virtude anexa à castidade. Sinal e fator da pureza é o pudor ou a modéstia, como virtude
delicada que trata o sexo como algo de íntimo e precioso e não como algo de provocante, e que
mantém a discrição ou reserva da vista, do aspecto, da fala e dos gestos - isso tudo, porém, segundo os
hábitos de cada povo. Tal delicadeza, contudo, não deve levar à afetação do puritanismo rígido e da
"tabuização" sexual envergonhada, que é o extremo oposto, igualmente condenável, do permissivismo
desabusado de hoje. O pudor é o grau extremo do caminho que vai da Continência à Castidade, desta à
Pureza e da Pureza justamente ao Pudor.
1. Possessividade. Como o mandamento anterior, esse também desce no porão da alma humana para
atacar o "mundo do desejo", agora numa outra frente: o "desejo de possuir" bens materiais. Essa
ganância insaciável e desordenada é raiz dos pecados do VI Mandamento: roubo, exploração
econômica, etc. "O amor ao dinheiro é a raiz de todos os males" (1Tm 6,10).
O que está, em positivo, por trás do X Mandamento é a "pobreza de coração", como desapego das
coisas e liberdade interior frente aos bens materiais e procura pelo "tesouro espiritual" (Mt 13,44). O