Professional Documents
Culture Documents
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal: Ano XVI - #92 Out-Nov 2019
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal: Ano XVI - #92 Out-Nov 2019
Revista Magister de
Direito Penal e Processual Penal
Ano XVI – Nº 92
Out-Nov 2019
Classificação Qualis/Capes: B1
Editores
Fábio Paixão
Walter Diab
Coordenador
Aury Lopes Júnior
Conselho Científico
Damásio E. de Jesus – Fernando da Costa Tourinho Filho – Luiz Flávio Borges D’Urso
Elias Mattar Assad – Marco Antonio Marques da Silva
Conselho Editorial
Adeildo Nunes – Amadeu de Almeida Weinmann
Carlos Ernani Constantino – Celso de Magalhães Pinto – César Barros Leal
Cezar Roberto Bitencourt – Élcio Pinheiro de Castro – Fernando Capez
Fernando de Almeida Pedroso – Haroldo Caetano da Silva
José Carlos Teixeira Giorgis – Luiz Flávio Gomes – Marcelo Roberto Ribeiro
Maurício Kuehne – Renato Marcão – René Ariel Dotti – Roberto Victor Pereira Ribeiro
Rômulo de Andrade Moreira – Sergio Demoro Hamilton
Umberto Luiz Borges D’Urso
A responsabilidade quanto aos conceitos emitidos nos artigos publicados é de seus autores.
As íntegras dos acórdãos aqui publicadas correspondem aos seus originais, obtidos junto ao
órgão competente do respectivo Tribunal.
A editoração eletrônica foi realizada pela LexMagister, para uma tiragem de 3.100 exemplares.
CDU 343(05)
LexMagister
Diretor Executivo: Fábio Paixão
Jurisprudência
1. Supremo Tribunal Federal – Telecomunicação. Exploração Clandestina.
Art. 183 da Lei nº 9.472/97. Serviço de Internet. Crime Formal. Tipicidade
Relª Minª Rosa Weber............................................................................................ 117
2. Superior Tribunal de Justiça – Embriaguez ao Volante. Tipicidade. Não
É Necessária a Comprovação de que Este Conduzia o Veículo com a
Capacidade Psicomotora Alterada
Rel. Min. Jorge Mussi............................................................................................ 124
3. Superior Tribunal de Justiça – Prescrição. Lesão Corporal no Trânsito.
Transação Penal. Acordo Celebrado. Descumprimento Parcial. Denúncia
Oferecida. Prazo Prescricional que Não se Suspende
Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro...................................................................... 129
4. Superior Tribunal de Justiça – Ação Penal de Competência do Júri.
Homicídio Qualificado. Réus Indígenas. Tradução da Denúncia para
o Idioma Kaingang. Desnecessidade. Perícia Antropológica. Não
Realização. Ausência de Impedimento. Acesso Integral aos Autos
Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz............................................................................. 136
5. Tribunal de Justiça de Goiás – Violência Doméstica. Ameaça. Detração
Penal. Prisão Preventiva. Monitoração Eletrônica. Condenação Mantida.
Pena. Redimensionamento. Suspensão Condicional. Manutenção
Rel. Juiz Subst. Eudélcio Machado Fagundes........................................................... 149
6. Tribunal de Justiça de Minas Gerais – Prisão Domiciliar. Gestantes e Mães
de Filhos Menores de 12 Anos. HC Coletivo 143.641/SP. Aplicação Restrita
às Presas Provisórias. Execução da Pena. Inaplicabilidade
Relª Desª Lílian Maciel.......................................................................................... 154
7. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – Furto. Desclassificação. Voto
Vencido que Reconhecia o Furto em sua Modalidade Tentada, com
Aplicação da Fração de Redução de 1/2 (Metade), Redução da Fração de
Aumento de Pena pela Agravante da Reincidência para 1/6, bem como o
Reconhecimento da Extinção da Pena pelo seu Integral Cumprimento
Rel. Des. Paulo Baldez........................................................................................... 165
8. Divergência Jurisprudencial............................................................................... 170
9. Ementário............................................................................................................ 171
Sinopse Legislativa. .............................................................................................. 190
Destaques dos Volumes Anteriores.................................................................... 191
Índice Alfabético-Remissivo................................................................................ 192
Doutrina
Introdução
Do ponto de vista criminal é recente a admissão de delitos praticados por
pessoas jurídicas no Brasil. Um dos argumentos mais enfáticos de resistência
inicial a essa possibilidade era a potencial utilização dessa forma de imputação
como um escudo, que asseguraria a impunidade do indivíduo no interior da
empresa que “realmente” perpetrasse o delito.
Essa visão está atrelada à noção simbiótica de que a empresa nada mais
seria que a longa manus de seus gestores e proprietários. Ela serviria ao propósito
de formalizar associações pessoais e possibilitar a afetação de um patrimônio
comum. Mas apenas isso.
O surgimento de corporações cada vez maiores, mais complexas, cujos
membros possuem atribuições cada vez mais especializadas, inviabiliza esse
raciocínio “protoatributivo”.
O termo compliance tem sua origem no verbo inglês in comply, cujo
significado é agir conforme uma regra, um comando, uma instrução, estando
em conformidade com as leis e os regulamentos internos e externos. Desse
modo, manter a empresa em conformidade significa estar de acordo com os
atos normativos, na proporção das atividades empresariais e seus regulamentos
internos. Este ensaio tem o propósito de analisar qual o ajuste e o campo de
incidência que a atividade de compliance deve ter num ambiente corporativo
de responsabilização criminal autônoma da pessoa jurídica.
1 “Art. 173. (...) § 5º A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a
responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem
econômica e financeira e contra a economia popular.”
2 “Art. 225. (...) § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas
físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 7
3 SHECAIRA, S. S. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. p. 102.
4 RODRÍGUEZ, L. Z. Bases para un modelo de imputación de responsabilidad penal a las personas jurídicas. Navarra: Aranzadi,
2000. p. 238.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
8
5 ZAPATERO, L. C.; LASCANO, C.; MARTINI, A. N. Derecho penal de la empresa. Buenos Aires: Ediar, 2012. p. 358.
6 WELLS, C. Corporations and criminal responsibility. Clarendon Press is the Academic Imprint of Oxford University
Press, 1994. p. 85-86.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 9
que não pode ser dividido, que é um todo, não necessariamente equivalente
a uma pessoa humana, ou mesmo que seja orgânico7.
O termo “pessoa” já possuiu significado mais estreito, em tempos anti-
gos, sendo usado para se referir a um papel social. A palavra latina “persona”
significava a máscara usada pelos atores no teatro romano, e servia para designar
tanto o ator como o papel desempenhado. Ao separar a noção de indivíduo das
conotações políticas que adquiriu, e compreendendo pessoa em um sentido
mais amplo, é possível imaginar a convivência de pessoas corporativas (cole-
tivas) e pessoas humanas (individuais), numa visão em que “as corporações
não são apenas multidões organizadas de pessoas, mas têm uma identidade
lógica metafísica que não se reduz a uma mera soma de pessoas humanas”8.
Superada a questão metafísica, deve-se apontar que nem todos os tipos
de coletividade devem atrair a responsabilidade moral. Distinguindo os tipos de
coletividade em agregado e conglomerado temos que uma “coletividade agregada”
é uma mera coleção de pessoas, como uma gangue que, embora possa ser con-
siderada como causalmente responsável por suas ações, não pode ser vista como
um agente moral. A identidade de um agregado mudará sempre que houver uma
mudança em sua associação. Já um conglomerado é uma organização de indi-
víduos cuja identidade não se esgota pela conjunção das pessoas na organização.
Três características separam um conglomerado de um agregado: (a) Os
conglomerados têm organização interna ou procedimentos decisórios; (b) Os
padrões de conduta compulsórios para indivíduos associados em um conglo-
merado são mais rígidos e específicos; e (c) Os membros de um conglomerado
exercem poderes sobre outros membros a partir de suas funções (não com base
em antiguidade ou prestígio pessoal). O reconhecimento do conglomerado
como uma pessoa moral (capaz de decidir) permite reconhecê-lo como agente
intencional e, portanto, responsável. A “intenção corporativa” é algo além das
intenções das pessoas físicas que compõem a corporação. Se as intenções são
tomadas amplamente como razões para atuar, isso requer a identificação dos
motivos da ação de uma corporação para além das razões dos indivíduos.
Então, o comportamento das organizações não pode ser traduzido
como o conjunto de comportamentos de pessoas físicas identificáveis em seu
interior e nem como uma referência ao design organizacional e seus atributos
(deixando de lado seus componentes humanos e levando em conta apenas o
conjunto de relações abstratas, num diagrama de fluxo conceitual do processo
7 WELLS, C. Corporations and criminal responsibility. Clarendon Press is the Academic Imprint of Oxford University
Press, 1994. p. 85-86.
8 WELLS, C. Corporations and criminal responsibility. Clarendon Press is the Academic Imprint of Oxford University
Press, 1994. p. 85-86.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
10
9 WELLS, C. Corporations and criminal responsibility. Clarendon Press is the Academic Imprint of Oxford University
Press, 1994. p. 88-89.
10 MARTÍN, L. G. Responsabilidad de directivos, órganos y representantes de una persona jurídica por delitos especiales. Barcelona:
Casa, 1986. p. 31.
11 ZAPATERO, L. C.; LASCANO, C.; MARTINI, A. N. Derecho penal de la empresa. Buenos Aires: Ediar, 2012. p.
195-196.
12 CRESPO, Eduardo Demetrio. In: ZAPATERO, L. C.; LASCANO, C.; MARTINI, A. N. Derecho penal de la empresa.
Buenos Aires: Ediar, 2012. p. 294-324.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 11
13 CODEÇO, C. E. Delitos econômicos: Decreto-Lei n. 28/84 comentado; legislação complementar. Coimbra: Livraria
Almedina, 1986. p. 19, item 8 e p. 33, item 10.
14 LEITE, Alaor. Autoria como domínio do fato. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 37.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
12
profere a ordem não precisa dominar o executor, mas, sim, o aparato de poder.
Partindo da crítica daqueles que não consideravam autor aquele que apenas
promove, organiza ou dirige o crime, não vislumbrando nessa forma de atuação
domínio real sobre o fato15, foram (no contexto da tese do domínio da orga-
nização) erigidos requisitos outros para se cimentar os caracteres indicativos
de ascendência na atuação dos executores e de dirigibilidade sobre o fato.
Essa modalidade de domínio da vontade não pode, em princípio, ser
transposto para a realidade da empresa, pelo simples fato da empresa não
atuar à margem do direito. Apenas num organismo que não tem amarras na
lei é que se pode sustentar que o temor de uma eventual represália por uma
desobediência gere acatamento irrestrito a qualquer comando superior. Num
ambiente lícito, o inferior hierárquico não tem obrigação de acatar ordens
ilegais, podendo a elas se opor legitimamente16.
No entanto, nem tudo é cristalino a ponto de permitir distinções sem
dificuldades. Assis, citando Hefendehl, pontua que “pessoas pertencentes a
determinados contextos tendem a adotar as normas e valores vigentes neste”17.
Não é evidente a linha divisória entre as determinações voltadas a maximizar
a produtividade ou o lucro da empresa, e aquelas que podem culminar num
dano ambiental ou consumerista, por exemplo. Identificar no emaranhado
de regras da empresa uma política existencial propensa à atuação ilícita já
tornaria a empresa entidade que atua à margem do direito? A resposta deve
ser negativa, uma vez que, na origem, a teoria do domínio do fato afirmava
como organização que atua às margens do direito: ditaduras, máfias, grupos
terroristas, entre outros18; ou seja, organismos que em momento algum se
pautam pela regra posta.
A existência de um conjunto de determinações que potencialmente
possam alcançar o espectro da ilicitude, não dá à corporação o status exigido
para conferir domínio do fato à pessoa física que emite a ordem na empresa.
Nesses casos, o gestor não fica impune, respondendo comissivamente pelo
delito, ainda que a título de partícipe, mas em conjunto com a empresa. A
consequência do reconhecimento do domínio da vontade no domínio da or-
ganização é afastar a imputação da organização e direcioná-la aos mandantes,
15 A conclusão sobre o controle completo da situação, nesses casos, é geralmente constatado posteriormente ao delito.
Quando se analisa a hipótese sob o ponto de vista anterior ao fato é inequívoca a incerteza sobre o domínio do fato
(cidadão contrata mercenário para eliminar seu desafeto e este foge com o dinheiro, ou é preso antes de executar o
homicídio ou se excede vindo a matar uma segunda vítima: todos esses casos revelam a ausência de domínio sobre
o fato).
16 LEITE, Alaor. Autoria como domínio do fato. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 29.
17 ASSIS, Augusto. Autoria como domínio do fato. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 103.
18 LEITE, Alaor. Autoria como domínio do fato. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 29.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
14
Conclusão
Pessoas jurídicas de pequena monta são indissociáveis de seus compo-
nentes individuais. A responsabilidade criminal que lhes cabe é mantida corre-
tamente dentro da realidade da dupla imputação. Já aquelas que alcançaram a
dinâmica do conglomerado as possibilidades de responsabilização são diversas.
Num primeiro momento, a pessoa coletiva responde sozinha, de forma
autônoma, sem a necessidade de identificar os autores individuais do comando
deflagrador do processo causal que culminou no evento típico. Atrelada a essa
responsabilização corporativa pode existir a responsabilização individual (que
não é o fundamento da primeira) em caso comissivo (quando se identificar
quem emitiu a ordem ou executou o serviço – provando-se dolo ou culpa) ou
omissiva (esta adstrita aos gestores), quando houver a comprovação de inob-
servância ao dever de vigília (normalmente sobre a conduta dos funcionários
na prestação de serviços), ao dever de proteção (normalmente sobre a atividade
de fornecimento de produtos) e nas hipóteses de ingerência (normalmente
relativas aos riscos inerentes à atividade desenvolvida pela empresa)20.
19 FRANÇA, Mayeny Elias; OLIVEIRA Jr., Moacir Leite de. A política criminal compliance e o combate aos crimes decor-
rentes da atividade econômica. Disponível em: <http://intertemas.toledoprudente.edu.br/index.php/CONGRESSO/
article/view/6907/67646831>. A política criminal compliance quer dizer “conformidade criminal” e sua inclusão no
direito brasileiro ocorreu com a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), muito embora sua maior força advenha do
direito norte-americano. Seu maior destaque é em matéria empresarial e tem a finalidade de proteger a empresa de
imputações criminais, de forma preventiva, além de sugerir o cumprimento de normas dentro da empresa e incen-
tivar uma cultura ética, fazendo com as irregularidades vindas de atividades da pessoa jurídica sejam denunciadas e
recebam punição, sem necessidade de se socorrer de um processo criminal.
20 ASSIS, Augusto. Autoria como domínio do fato. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 109.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 15
TITLE: On the dogmatic placement of compliance in the corporate environment form the perspective
of criminal responsibility of corporate bodies.
ABSTRACT: The criminal responsibility of legal entities is one of the most controversial subjects among
criminal jurists. The idea of punishment is naturally old, but only in the 20th century the criminal respon-
sibility of legal entities embodied aspects necessary for its effective enforcement by Courts. One of the
arguments against this idea was the possibility of using this form of imputation as a shelter, so that the
individual within the company that effectively commits the offense remains unpunished. The emergence
of increasingly complex corporations makes this “proto-attributive” reasoning unfeasible. Small legal
entities are inseparable from their individual components. Their criminal responsibility is properly kept
within the reality of double imputation.
Referências
ASSIS, Augusto. Autoria como domínio do fato. São Paulo: Marcial Pons, 2014.
CODEÇO, C. E. Delitos econômicos: Decreto-Lei n. 28/84 comentado; legislação complementar. Coimbra:
Livraria Almedina, 1986.
CRESPO, Eduardo Demetrio. In: ZAPATERO, L. C.; LASCANO, C.; MARTINI, A. N. Derecho penal
de la empresa. Buenos Aires: Ediar, 2012.
FRANÇA, Mayeny Elias; OLIVERIA Jr., Moacir Leite de. A política criminal compliance e o combate aos
crimes decorrentes da atividade econômica. Disponível em: <http://intertemas.toledoprudente.edu.br/index.
php/CONGRESSO/article/view/6907/67646831>.
LEITE, Alaor. Autoria como domínio do fato. São Paulo: Marcial Pons, 2014.
MARTÍN, L. G. Responsabilidad de directivos, órganos y representantes de una persona jurídica por delitos especiales.
Barcelona: Casa, 1986.
RODRÍGUEZ, L. Z. Bases para un modelo de imputación de responsabilidad penal a las personas jurídicas. Navarra:
Aranzadi, 2000.
SHECAIRA, S. S. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.
WELLS, C. Corporations and criminal responsibility. Clarendon Press is the Academic Imprint of Oxford
University Press, 1994.
ZAPATERO, L. C.; LASCANO, C.; MARTINI, A. N. Derecho penal de la empresa. Buenos Aires: Ediar, 2012.
Perícia na Descoberta da Causa Mortis; 1.3 Perícia e Laudo Pericial, sua Utilidade
no Processo, Importância e Princípios; 1.4 Processo Penal e Julgamento: a Apli-
cabilidade da Prova Pericial e sua Influência Diante das Decisões Judiciais; 1.5 A
Teoria Retórica Dentro do Processo Penal e dos Institutos que o Compõem. 2
Comprovação da Causa Mortis pelo Laudo Pericial e o seu Valor no Julgamento.
3 O Laudo Pericial como Instrumento Estratégico; 3.1 Como Condenar um
Inocente com uma Falsa Perícia; 3.2 Manipulação de Provas por Peritos e suas
Intenções Dentro do Processo. 4 Uma Posição mais Analítica da Perícia e suas
Contribuições para a Justiça. Considerações Finais. Referências.
1 LOPES Jr., Aury. Direito processual penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 343.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 19
2 “(...) a doença mental só resulta em inimputabilidade quando impedir que se possa exigir do sujeito a compreensão
da ilicitude de sua conduta ou a autodeterminação segundo tal compreensão, o que constitui claríssima valoração
jurídica imposta pela lei. Para eles, o fator valorativo, indispensável para o juízo de culpabilidade, estaria a rigor
excluído pela predominância biológica da doença mental; assim, ante o diagnóstico pericial, tocaria ao juiz apenas
referendá-lo (declarando a imputabilidade ou a inimputabilidade).” (ZAFFARONI, Eugenio Raúl et al. Inimpu-
tabilidade e semi-imputabilidade por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado. Revista
EPOS, v. 6, n. 2, p. 141-154, 2015)
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
20
3 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. v. 1. p. 328.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 21
4 LOPES Jr., Aury. Direito processual penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 423.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 23
5 A causa mortis médica está associada à maneira como foi desencadeada a morte, já a causa mortis jurídica aborda uma
visão mais específica, que investiga o período em que ela ocorreu, quem praticou a conduta que gerou o resultado
mortis, dentre outros aspectos ligados às evidências encontradas no cadáver. (VANRELL, Jorge Paulete. Manual de
medicina legal: tanatologia. 3. ed. Leme: JH Mizuno, 2007. p. 35)
6 FRANÇA, Genival Veloso de. Fundamentos de medicina legal. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
24
7 O princípio de Locard se funda originalmente na ideia de que “quaisquer que sejam os passos, quaisquer objetos
tocados por ele, o que quer que seja que ele deixe, mesmo que inconscientemente, servirá como uma testemunha
silenciosa contra ele. Não apenas as suas pegadas ou dedadas, mas o seu cabelo, as fibras das suas calças, os vidros
que ele porventura parta, a marca da ferramenta que ele deixe, a tinta que ele arranhe, o sangue ou sémen que deixe.
Tudo isto, e muito mais, carrega um testemunho contra ele. Esta prova não se esquece. É distinta da excitação do
momento. Não é ausente como as testemunhas humanas são. Constituem, per se, numa evidência factual. A evi-
dência física não pode estar errada, não pode cometer perjúrio por si própria, não se pode tornar ausente. Cabe aos
humanos, procurá-la, estudá-la e compreendê-la, apenas os humanos podem diminuir o seu valor”. Já o Princípio
da Identidade se funda em “uma coisa, um corpo, um ente, só pode ser igual a si mesmo” (REIS, Albani Borges dos.
Metodologia científica em perícia criminal. Campinas: Millennium, 2011).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 25
8 FRANÇA, Genival Veloso de. Fundamentos de medicina legal. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. p. 1.
9 Imputabilidade penal se apresenta como a capacidade subjetiva do agente causador do fato penalmente relevante em
cometer a ação e, também, como o elemento volitivo que possuía no momento de execução do crime.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
26
é uma teoria que se construiu historicamente desde a Grécia antiga. Ela foi
criada por advogados na pólis, que se utilizavam de construções linguísticas
e técnicas argumentativas para defender seus clientes.
A retórica é uma corrente filosófica do direito, diferente da ontologia
que se reduz à busca da “verdade”. Os filósofos retóricos realistas sustentam
a existência dos objetos a partir da linguagem, assim como o conhecimento se
constitui de convenções linguísticas entre sujeitos. É esse instrumento consti-
tutivo que forma o ambiente em torno do ser humano, de forma temporária,
contextualizada e passível de interrupções por outros conceitos formados ao
longo da evolução histórica da humanidade.
Ocorre na retórica uma tripartição, que acaba por recusar a ideia trazida
por Aristóteles de que ela é tão somente um meio de persuasão, fundamentada
pelo ethos, pathos e logos. A retórica se divide em material (método), estratégica
(metodológica) e analítica (metódica).
A retórica realista entende que a realidade é formada por um conjunto
de relatos vencedores (discursos estratégicos que constituem o alicerce do
mundo e da existência humana). Não é possível, então, se alcançar uma ver-
dade real; isso, porque os relatos mudam de acordo com as épocas, não há,
assim, um fato imutável, mas, sim, uma série de eventos que compõem o real.
Metodologias consistem em caminhos a serem seguidos para se alcan-
çar certa finalidade, e assim funciona a retórica estratégica. Esses caminhos
sugeridos por ela na práxis, são compostos pelo topos (apreciado pela “teoria
da argumentação, as figuras de linguagem e de estilo e, no direito, as doutri-
nas dogmáticas”10) e tropos, métodos entimemáticos que visam causar algum
efeito almejado.
A retórica material é o conjunto e o fluxo de diversos eventos, relatos
que em dado momento foram acolhidos pela maioria popular e designados
vencedores. É o alvo da retórica técnica, os discursos estratégicos visam aden-
trar e alterar os métodos estabelecidos na tentativa de se sobressaírem. Então
sua formação, em tese, se dá a partir do controle público da linguagem, ou
seja, da comunicação entre sujeitos, acarretando no que se diz por “realidade”.
10 ADEODATO, João Maurício. Uma teoria retórica da norma jurídica e do direito subjetivo. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2014.
p. 108.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 27
posiciona-se o réu. A prova pericial exerce benefício a uma das partes com seu
relato estratégico desenvolvido nas entrelinhas do laudo; então, inicialmente,
ela se põe no meio da linha. Mas no desenvolver das respostas dos quesitos,
tenderá a um posicionamento, mesmo que de forma não intencional.
Esse modelo também servirá para determinar se houve dolo ou culpa
na conduta, pois essa determinação também é um ponto crucial no debate
acusatório. E nisso a prova dos fatos emitida pela perícia também exerce
grande domínio, pois relata como se procedeu a conduta, descrevendo os
instrumentos utilizados, se houve uma premeditação na execução do crime,
dentre outras evidências decorrentes da causa fática do resultado.
Nas situações em que há no processo uma falsa perícia, o perito que
manipula o relatório utiliza-se diretamente da erística11 em seu relato, de
sofismas, diferentemente do que foi exposto nos dois parágrafos anteriores.
A retórica material se instaura por meio de jurisprudências, precedentes
ou aquilo que está na lei. Ela é o que se chama de relato vencedor, o discurso
que convenceu grande parte dos ouvintes sendo chamado de realidade, que
é o controle público da linguagem. Ela depende da recepção do próprio ser
humano e sua relação com o próprio meio ambiente.
11 ADEODATO, João Maurício. Retórica realista e decisão judicial. Revista de Direitos e Garantias Fundamentais, v. 18, n. 1,
Vitória, jan./abr. 2017. Disponível em: <http://sisbib.emnuvens.com.br/direitosegarantias/article/viewFile/928/322>.
Acesso em: 30 out. 2017.
12 Citado por LOPES Jr., Aury. Direito processual penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 424.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 29
Não é viável por a prova pericial num posto de “verdade real”. Várias
delas são somente relatos estratégicos que buscam influenciar o processo e a
decisão do juiz ou do júri, assim como as falsas perícias.
Dispõe o Código Penal sobre a falsa perícia:
“Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como teste-
munha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou
administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 1º As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado
mediante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a
produzir efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte
entidade da administração pública direta ou indireta.
§ 2º O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que
ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade.”
Na fase instrutória do processo penal produz-se provas para esclarecer
fatos tratados no litígio, assim como a prova pericial. É diante dela que a sen-
tença se baseia, ela reconstrói os fatos, e perante a esse fato, o ordenamento
jurídico deveria se atinar à aplicação de um meio de prevenir convicções
adúlteras e manipuladas expostas no laudo pericial.
O artigo citado anteriormente, que versa sobre uma conduta típica
do perito em si (crime de mão própria) que procede das ações de fazer uma
afirmação falsa, negar a verdade ou omitir-se, procura garantir a justiça.
O objetivo de um perito que elabora uma prova pericial falsa, assim
como aquele que pratica corrupção passiva ou é declarado suspeito13, é estri-
tamente persuadir o julgador ou o tribunal do júri, distorcendo os eventos
que constituíram o fato, a fim de beneficiar ou prejudicar o acusado.
13 A suspeição de peritos aplica-se por analogia nas hipóteses dos arts. 252, 254 e 279 do Código de Processo Penal,
por serem eles os auxiliares dos juízes, devendo ser imparciais a todo instante no exercício de suas funções.
14 Rogério Greco e William Douglas (2016, p. 2) atinam à importância de o julgador obter domínio sobre o produto
da perícia, discorrendo que “ao jurista é necessário o seu estudo a fim de que saiba avaliar os laudos que recebe, bem
como suas limitações, quando e como solicitá-los, além de estar capacitado a formular quesitos procedentes em relação
aos casos em estudo. É imprescindível que tenha noções sobre como ocorrem as lesões corporais, as consequências
dela decorrentes, as alterações relacionadas com a morte e os fenômenos cadavéricos, conceitos diferenciais em
embriaguez e uso de drogas, as asfixias mecânicas e suas características, os crimes sexuais e sua análise pericial etc.”.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
30
objetivo se faz por meio das provas, no entanto, a perícia, em especial, possui
grande valor para o processo cognitivo do julgador.
Contudo, dentro do processo, pode-se encontrar o uso da má-fé por
alguns profissionais para se alcançar certos objetivos. Essa é a finalidade
transpassada pela chamada falsa perícia, fator não tão incomum de ocorrer
em processos criminais durante a história.
Basta observar o caso das audiências públicas realizadas nos dias 24 e
25 de fevereiro de 2014 por representantes da Comissão Nacional da Verdade
e da Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva, que versou sobre três das
diversas ações propagadas pela Ditadura Militar das quais causaram a morte
de oito membros da Ação Libertadora Nacional. As famílias das vítimas, anos
após a ocorrência das mortes, resolveram contratar peritos particulares para
analisarem os corpos exumados, a fim de que fosse formulado um laudo
verossímil com os vestígios encontrados nos corpos.
Os peritos do IML que produziram o atestado de óbito durante a dita-
dura alegaram suicídio como a causa da morte de muitos militantes, omitindo
nos relatos as marcas de agressões, torturas e os assassinatos cometidos contra
essas vítimas.
Sem muitos fundamentos nos laudos que esclarecessem às famílias
sobre o ocorrido e com a reunião de algumas testemunhas, a Comissão Na-
cional da Verdade resolveu tomar frente do assunto, participando também
das análises dos corpos para se obter um atestado de óbito realístico, e ainda
propuseram a responsabilização dos peritos que manipularam os falsos laudos
para esconderem a barbárie que ocorria na época ditatorial no Brasil.
Como nesse exemplo narrado, muitos profissionais na área da Medicina
Legal adotam posturas antiéticas no exercício de suas profissões em troca de fa-
vorecimentos econômicos ou políticos. Eles adotam técnicas linguísticas ilusórias
dentro do laudo pericial, enfatizando acontecimentos que, se lidados de forma
individual, sugerem um novo fato que não se encontra no momento que se deu
a conduta do autor. Outra estratégia retórica formulada por falsas perícias é o
ocultamento ou criação de vestígios para incriminar ou inocentar uma pessoa. Essa
conduta de peritos judiciais ao aceitar propina em troca de trabalhos ilícitos, se
enquadra nos crimes de corrupção passiva previsto pelo Código Penal, no art. 317.
Considerações Finais
É notória a importância do instituto das perícias criminais dentro do
direito. Sua atividade, como auxiliar da justiça, é de grande valia no momento
de descoberta do indivíduo responsável por gerar resultado danoso a outrem
decorrente de uma conduta reprovável juridicamente. Sobretudo, o objetivo
executado no presente trabalho foi demonstrar uma inter-relação entre a atu-
ação, o modo pela qual a prova pericial é tratada diante de julgamentos, sua
importância e pontos dela que conflitam com a noção de exercício da justiça
dentro do direito, sob uma reflexão retórica. Foi possível visualizar como os
três níveis da retórica estão anexados dentro desse aparato jurídico em suas
atuações específicas.
Diante desse desenvolvimento conceitual e comparativo, faz-se mister
pensar em algumas mudanças dentro da metodologia científica utilizada na
elaboração do laudo e no manuseamento da prova pericial dentro do processo
judicial. Além disso, a garantia de uma boa atuação do profissional na inves-
tigação em busca de um culpado necessita de mais atenção perante o Estado,
criando normas que prevejam condutas menos parciais, que seja eficaz para
responsabilizar o perito que aceitar prejudicar o réu ou a vítima no processo
em função de propinas e enriquecimentos ilícitos.
É importante que uma instituição tão necessária tenha uma postura
mais analítica ao propagar seu saber ao juiz, não utilizando de sua posição de
prestígio para envolver-se no debate acusatório, por meio da dialética erísti-
ca, de forma intencional e parcial. Por ser auxiliadora do julgador, não pode
encontrar-se no conceito de prova como instrumento persuasivo15, devido a
sua grande influência na construção cognoscível do julgador e pela sua pre-
15 LOPES Jr., Aury. Direito processual penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 343.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 33
TITLE: Critical analysis of reports as strategic rhetorical arguments: the ideal of neutrality in the role of
expert testimonies in the criminal context.
ABSTRACT: Rhetorical philosophy seeks to demonstrate that knowledge is provided through a set of
accounts and expresses that language constitutes a “reality”. Its division into material (method), strategy
(methodological) and analysis (methodical) matches various legal activities. Official expert testimony,
the subject of this article, is requested by a judge to help clarify doubts in the criminal procedure. It is
regulated by the Penal Code, the Code of Criminal Procedure, the Sentence Execution Act, and Law no.
12,030/09, and its role is that of an assistant to Justice by investigating the cause of the criminally relevant
outcome in a technical and in-depth manner, often revealing who the responsible for the fact is. In view
of this, expert evidence is utterly important for the decisions of jurors or judges in criminal cases. Howe-
ver, it is of the utmost importance that expert testimonies are impartial, since experts are not responsible
for deliberately judging or defending the accused subject in a report, as in practice the influence of such
a probative resource is very broad, and it eventually deviates from its effective role, proving biased at
various times. The rhetorical analysis of this evidence means shows that a report prepared by an expert
uses intentional strategies and techniques to provide benefits to one of the parties that make up the pro-
cedural relationship. Therefore, this article aims at showing that impartial expert testimony is essential to
promoting fair decisions in criminal proceedings.
KEYWORDS: Expert Testimony. Reports. Critical Analysis. Strategic Rhetorical Arguments. Neutrality.
Criminal Context.
Referências
ADEODATO, João Maurício. As retóricas na história das ideias jurídicas no Brasil – originalidade e
continuidade como questões de um pensamento periférico. Revista da ESMAPE, Recife, v. 14, n. 29, p.
243-278, jan./jun. 2009.
______. Ética e retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
______. Retórica analítica como metódica jurídica. Argumenta – UENP, Jacarezinho, n. 18, 2013.
______. Retórica realista e decisão judicial. Revista de Direitos e Garantias Fundamentais, v. 18, n. 1, Vitória, jan./
abr. 2017. Disponível em: <http://sisbib.emnuvens.com.br/direitosegarantias/article/viewFile/928/322>.
Acesso em: 30 out. 2017.
______. Uma teoria retórica da norma jurídica e do direito subjetivo. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2014.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. v. 1.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
(Coleção Saraiva de Legislação)
______. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Institui o Código Penal. In: Vade Mecum.
15. ed. Saraiva, 2013.
______. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Institui o Código de Processo Penal. In: Vade
Mecum. 15. ed. Saraiva, 2013.
COSTA, Luís Renato da Silveira; COSTA, Bruno Miranda. A perícia médico-legal. Campinas: Millennium,
2011.
CROCE, Delton; CROCE Jr., Delton. Manual de medicina legal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
34
CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral. 6. ed. Salvador: Juspodivm, 2018.
FRANÇA, Genival Veloso de. Fundamentos de medicina legal. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.
GRECO, Rogério; DOUGLAS William. Medicina legal: à luz do direito penal e do direito processual penal.
12. ed. Niterói: Impetus, 2016.
LOPES Jr., Aury. Direito processual penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
OLIVEIRA, Marcelo. Audiência pública revela a história de 8 mortos da ALN em SP. 2014. Disponível em:
<http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/outros-destaques/435-audiencia-publica-revela-a-historia-de-8-
mortos-da-aln-em-sp.html>. Acesso em: 2 maio 2018.
REIS, Albani Borges dos. Metodologia científica em perícia criminal. Campinas: Millennium, 2011.
SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito penal: parte geral. 6. ed. Curitiba: ICPC, 2014.
TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de direito processual penal. 13. ed. Salvador:
Juspodivm, 2018.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl et al. Inimputabilidade
������������������������������������������������������������������
e semi-imputabilidade por doença mental ou desen-
volvimento mental incompleto ou retardado. Revista EPOS, v. 6, n. 2, p. 141-154, 2015.
1 Érika Mendes de Carvalho leciona com correção: “Portanto, a não criação de uma categoria adicional à punibilidade
e a não integração desta entre os elementos essenciais do delito não significa – ao contrário do que assevera parte da
doutrina – apenas a adoção de um conceito amplo de punibilidade, mas, sim, a aceitação de um conceito estrito e
rigoroso de delito, que não incorpora em seu âmbito circunstâncias inspiradas por valorações político-criminais ou
vinculadas à necessidade preventivo-geral e/ou especial de pena” (CARVALHO, 2005, p. 130).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 37
4 Em matéria penal tributária há quem sustente que as remissões, anistias ou parcelamentos situam-se “dentro do
espaço de conformação do legislador, no exercício de opções políticas que constituem a sua tarefa própria, não estando
sujeita a controle judicial quanto à oportunidade das medidas, desde que atendidos os critérios dos arts. 150, § 6º,
195, § 11, da CF” (BALTAZAR Jr., 2014, p. 881).
5 Luiz Regis Prado aclara que: “A fundamentação desse instituto pode ser analisada sob dois enfoques: o político-fiscal e
o jurídico-penal. No primeiro, vislumbra-se uma finalidade extrajurídico-penal da autodenúncia, baseada em critérios
essencialmente fiscais, como função de estímulo, de modo a facilitar o retorno do contribuinte à honestidade fiscal.
No segundo, fundamenta-se a autodenúncia no âmbito da teoria penal da desistência voluntária e da reparação do
dano” (2018, p. 283).
6 Luiz Carlos dos Santos Gonçalves defende que o preceito viola o princípio da proporcionalidade na vertente da pro-
teção deficiente ao bem jurídico tutelado nos delitos tributários; defende que temos uma clara violação do princípio
da isonomia no tratamento jurídico conferido pelo Fisco aos contribuintes inadimplentes e sonegador ao dizer que:
“Essa distinção é importantíssima, mormente em um país no qual a carga tributária é elevadíssima. Sonegador e,
em tese, criminoso, é aquele que se vale de fraudes e artifícios para o não pagamento ou o pagamento a menor dos
tributos; inadimplente é aquele que não pôde pagar os tributos. Note-se que o sonegador, se for um comerciante
ou industrial, pode oferecer seus produtos por preço mais acessível, em verdadeira concorrência desleal. Ora, uma
vez descoberto o não-recolhimento, o pagamento dos valores (acrescidos de multa e juros, ademais) extinguirá a
punibilidade; o problema é que, presumidamente, o sonegador terá melhores condições de honrar sua dívida do que
o inadimplente (que já não pagou em razão de dificuldades financeiras). Assim, a lei trata igualmente aos desiguais
(sonegador e inadimplente) e favorece o lado antissocial, o sonegador” (GONÇALVES, 2007, p. 116-117).
7 Por recebimento da denúncia José Paulo Baltazar Júnior leciona que: “(...) é aquele constante na decisão judicial que
recebe a denúncia (CPP, art. 399), após a resposta do denunciado (CPP, arts. 396 e 396-A), e não a do oferecimento
da denúncia mediante ‘protocolização’ na Vara Criminal ou Distribuição. Desse modo, o denunciado poderá efetuar
o pagamento ou requerer o parcelamento no prazo para a resposta. Uma vez comprovado o pagamento, consultando-
se a autoridade fazendária sempre que houver qualquer dúvida a respeito, o Juiz deverá absolver sumariamente o
acusado, em razão da extinção da punibilidade (CPP, art. 397, IV). Em caso de parcelamento, suspende-se a pretensão
punitiva do Estado” (2016, p. 882).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 41
8 Pode-se dizer que o dispositivo legal foi o gérmen do entendimento cristalizado na Súmula Vinculante nº 24 do
STF atinente ao exaurimento da via administrativa que diz: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributá-
ria, previsto no art. 1º, I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”. Evidencia-se que sua
natureza jurídica não desnatura a ação penal que remanesce como pública incondicionada.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
42
9 Renato Marcão assinala que nada fora dito na lei acerca das hipóteses de quitação à vista, sem a opção de parcelamento
da dívida tributária (2017, p. 49).
10 De modo igual tem-se que há base para se sustentar que estamos diante de norma penal temporária, que exauriu
seus efeitos, visto que o art. 1º da antedita lei delimitar que apenas as dívidas vencidas até 28.02.03 podem ser objeto
de parcelamento em 180 (cento e oitenta) parcelas mensais e sucessivas, abrangendo dívidas inscritas na dívida ativa
ou não, além daquelas que tenham ou não sido objeto de execução fiscal. Quando a lei fala em regime de parcela-
mento falaria no regime de parcelamento assentado por essa lei, por isso o exaurimento. Assim, os efeitos penais
estariam adstritos aos débitos existentes no termo legal que fixou o marco limítrofe para adesão ao programa não
se cuidando de norma geral de parcelamento, mas, sim, um programa específico vinculado a certas modalidades de
créditos tributários.
11 A razão é que o art. 1º da Lei nº 11.941/09, a despeito de contemplar programas especiais de parcelamento, assinala
em caráter genérico: “os débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e os débitos para com
a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional”, malgrado apresente esse caráter genérico que abrangeria todas as
modalidades de parcelamento tem-se que há a fixação de limite máximo para os débitos que podem ser objeto de
adesão, a saber, 30.11.08 (art. 1º, § 2º, da Lei nº 11.941/09). A lei agiu corretamente ao dizer que o parcelamento é
concedido automaticamente se a Fazenda Nacional não se manifestar formalmente acerca do pedido. Tem-se que é
correto que a legislação exigiu o pagamento da primeira parcela no requerimento e o pagamento antecipado de uma
parcela. Na doutrina é apontado que “poderão ser reconhecidos efeitos penais mesmo antes da concessão formal
pela administração quando atendidas as seguintes condições: a) existência de pedido formalizado; b) comprovação
dos pagamentos; c) clareza que o débito parcelado é o mesmo que gerou a ação penal; d) demora da administração
no processamento do pedido” (BALTAZAR Jr., 2014, p. 886).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 43
12 É permitido a reinclusão no parcelamento por força de decisão judicial ou tomada por autoridade administrativa, o
que promove a suspensão do curso da ação penal e da prescrição. Há também base para arguição de questão prejudicial
atraindo a aplicação do CPP.
13 O art. 146, III, b, da CRFB preleciona que cabe a Lei Complementar traçar as normas gerais em matéria de pres-
crição tributária e todos os diplomas acima indicados foram elaborados por Lei Ordinária. Nesse diapasão, houve
o manejo da ADI 3.002/DF, por parte da Procuradoria-Geral da República com a finalidade de declarar o art. 9º da
Lei nº 10.684/03 inconstitucional, além de invocar vícios de inconstitucionalidade material no texto impugnado. O
pedido foi julgado prejudicado em razão da posterior revogação tácita desse texto normativo.
14 Rodrigo de Grandis lembra das ADIs 3.002 e 4.273 ajuizadas pela Procuradoria-Geral da República contra sequen-
ciadas legislações que contemplavam normas que permitiam a extinção da punibilidade nos delitos contra a ordem
tributária quando houvesse pagamento integral do débito, onde foi defendido que havia “ofensa ao postulado da
igualdade e da proporcionalidade, sob a perspectiva da proteção deficiente, considerada a finalidade e o valor cons-
titucional da arrecadação tributária e da ordem econômica. Apontou-se, em resumo, que as normas combatidas
atribuem tratamento diferenciador não condizente com os fatos criminosos e suas respectivas consequências penais,
ou seja, os crimes contra a ordem tributária acarretam lesões mais graves aos bens jurídicos tutelados pelo Estado
Social e Democrático de Direito do que os crimes patrimoniais praticados sem violência, de feição individual. Assim,
por ausência de qualquer justificativa racional, não se poderia admitir a concessão legal de amplos benefícios a um
grupo de delitos sem que se outorgasse idêntico tratamento a outros, de menor severidade e reduzida expressão
constitucional”. Critica o autor a benesse legislativa ao pontuar: “previu-se a extinção da punibilidade de infrações
penais que ostentam considerável reprovabilidade e inegável valor constitucional” (2016, p. 460-461).
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
44
que por não apresentar marco final para ingresso em programa e representar
norma geral é aplicável e, nesse caso, incide o limitador do parcelamento ser
realizado antes do recebimento da denúncia promover a suspensão da preten-
são punitiva estatal e da prescrição penal. O pagamento do débito tributário,
independentemente do momento de sua ocorrência, promove a extinção da
punibilidade.
Observamos que a lei não restringe novo pagamento em hipótese de
reincidência, sem o estabelecimento de nenhum limitador dessa envergadura,
ao contrário do que ocorre no Código Penal, por exemplo, na fixação dos regi-
mes de cumprimento de pena (art. 33, § 2º, do CPB), na substituição por penas
restritivas de direito (art. 44, § 3º, do CPB) e na jurisprudência majoritária,
que não aplica o princípio da insignificância a agentes reincidentes (STJ, HC
491.970/SP e, como contraponto, admitindo a aplicação: STF, HC 137.425).
Os delitos previdenciários estão contemplados no Código Penal nos arts.
168-A e 337-A e recebem o mesmo tratamento jurídico-penal quanto à questão
envolvendo a punibilidade. Todavia, antes da uniformização acima indicada,
temos que o Código Penal adotava preceitos diferentes para a extinção da
punibilidade em delitos previdenciários, em que exigia-se o pagamento antes
do início da ação fiscal, que é o procedimento administrativo para apuração
de infrações administrativas; enquanto que, ao o contrapormos à sonegação
fiscal, tínhamos que o marco era até o recebimento da denúncia.
18 A Exposição de Motivos da Lei apresentada pelo Ministério da Fazenda é clara ao dizer que: “Estimativas indicam
que a arrecadação aos cofres da União poderá atingir cerca de 100 a 150 bilhões de reais. De fato, dados revelam que
os ativos no exterior não declarados de brasileiros podem chegar a US$ 400 bilhões. São dados estimados, mas o caso
do Brasil destoa de todos os demais, em virtude dos motivos que induziram muitos a destinar ou manter recursos
fora do País. Basta pensar nos sucessivos planos econômicos, como os Planos Cruzado I e II (1986), Plano Bresser
(1987), Plano Verão (1989), Planos Collor I e II (1990 e 1991) e Plano Real (1994). Foram as dificuldades no passado
para pagamentos no exterior e diga-se o mesmo quanto aos momentos de instabilidades cambial, política ou de crises
internacionais” (BRASIL. Exposição de Motivos 1222015/MF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_0
3%5CProjetos%5CEXPMOTIV%5CMF%5C2015%5C122.htm>. Acesso em: 25 fev. 2019). Todavia, os resultados
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
46
práticos foram frustrantes, visto que a expectativa gravitava em torno de R$ 120 bilhões de reais, mas o resultado foi
de pouco mais de R$ 4 bilhões e meio. Vide: BRASIL. Receita Federal. RERCT. Segunda etapa do RERCT permitiu
regularização de R$ 4,6 bilhões de ativos no exterior. Disponível em: <http://receita.economia.gov.br/noticias/ascom/2017/
agosto/segunda-etapa-do-rerct-permitiu-regularizacao-de-r-4-6-bilhoes-de-ativos-no-exterior>. Acesso em: 25 fev.
2019; e SALATI, Paula. Repatriação de recursos pode gerar até R$ 120 bilhões à União neste ano. Diário Comércio,
Indústria e Serviços. Disponível em: <https://www.dci.com.br/economia/repatriac-o-de-recursos-pode-gerar-ate-r-
120-bilh-es-a-uni-o-neste-ano-1.411922>. Acesso em: 25 fev. 2019.
19 A perspectiva apresenta uma mudança de ares no Direito Penal porque o agente “tem, agora, a oportunidade penal
econômica de, espontaneamente, declarar algo e, em troca, ter certos benefícios. No entanto, a própria norma esta-
belece, de outro lado, que essa extinção de punibilidade será restrita a uma origem lícita ou que forem provenientes
unicamente dos crimes mencionados no próprio dispositivo (art. 5º, § 5º). Assim, há de se entender, sem grande
divagação analítica, que o declarante afirma, em sua manifestação, que os bens são de origem lícita. Com isso, a
norma lhe dá garantia protetiva quanto à sua declaração, uma vez que prevê, também, que esse ato não poderá, de
qualquer modo, ser utilizado como único indício ou elemento para efeitos de expediente investigatório ou procedi-
mento criminal; ou para fundamentar, direta ou indiretamente, qualquer procedimento administrativo de natureza
tributária ou cambial em relação aos recursos dela constantes (art. 4º, § 12)” (SILVEIRA; SAAD-DINIZ, 2017, p.
152/153).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 47
20 O Ministro da Justiça Sérgio Moro em auxílio com a Receita Federal promoverá a investigação acerca da fonte do
RERCT ser lícita. (COSTA, Machado. Receita cria novas interpretações para investigar recursos repatriados. Disponível em:
<https://veja.abril.com.br/economia/receita-cria-novas-interpretacoes-para-investigar-recursos-repatriados/>.
Acesso em: 2 abr. 2019.)
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 49
com o fito de evitar a responsabilidade penal omissiva diante do art. 13, § 2º,
c, do CP (SILVEIRA; SAAD-DINIZ, 2017, p. 197).
A declaração deve assentar-se em alguns princípios, a saber, veracidade21,
lealdade22 e confiança23, o que demanda ser mais esclarecido pela interpretação
do sentido a ser preenchido quanto ao dever (positivo) de declarar e o direito
a não autoincriminação” (SILVEIRA; SAAD-DINIZ, 2017, p. 207). Ato con-
tínuo, pagaria os tributos e acréscimos indicados na declaração do RERCT
determinados pela Receita Federal e o juiz federal declararia a extinção da
punibilidade24 por força do art. 61 do CPP.
Como se tratou de lei penal temporária muitas dessas inquietações fi-
caram sem respostas, mas a jurisprudência e a doutrina terão que se debruçar
sobre o tema em virtude de prováveis desdobramentos penais advindos das
declarações de RERCT que foram efetuadas em sua vigência.
4 Colaboração Premiada
Em referência ao tema colaboração premiada temos que a legislação
prevê sua existência no direito brasileiro há alguns anos para os delitos con-
tra o sistema financeiro nacional, sonegação fiscal e lavagem de capitais que
contemplavam como benefício a diminuição de pena.
Todavia, a questão ganhou relevo e importância por ocasião da entrada
em vigor da Lei nº 12.850/2013, que trouxe um marco regulatório mínimo
na matéria, além do afloramento de questões envolvendo delitos socioeconô-
micos, a criminalidade organizada e a intervenção jurisprudencial que passou
a assentar, de modo não raras vezes, indevidos limites na atuação das partes,
os quais deveriam ser fixados por lei, e com arrimo na CF.
21 A verdade aqui é analisada sob o prisma da veracidade no prisma econômico (autônomos) ou amparados em uma
lei ou instituição (heterônomos). Sucede que “haveria uma expectativa de verdade na declaração, podendo, de outro
lado, haver uma dúvida quanto à certeza ministerial” (SILVEIRA; SAAD-DINIZ, 2017, p. 200).
22 Lastreia-se o princípio no dever de prestar as informações verdadeiras do que ocorre nas variadas hipóteses de eventos
na vida econômica. Fala-se aqui no dever não ser apenas negativo, ou seja, não agir com deslealdade, mas também
em um dever positivo de agir pautado na verdade e no pleno conhecimento da realidade (SILVEIRA; SAAD-DINIZ,
2017, p. 201/202).
23 Tem-se aqui uma perspectiva da justa expectativa de que ninguém agirá de forma antijurídica, ou seja, de que a in-
formação fornecida pelo agente é correta e verdadeira, o que é garantido, em partes, quando a lei diz que não servirá
de prova isolada para a apuração penal do fato (SILVEIRA; SAAD-DINIZ, 2017, p. 202-206). A confiabilidade dos
agentes é um dos fundamentos do sucesso da economia (SOUZA, 2012, p. 60 e ss).
24 Renato de Mello Jorge da Silveira e Eduardo Saad-Diniz sustentam que: “O elo reitor das noções penais relativas à
importância assumida pela prestação e não prestação de informações, sem dúvida alguma parece ser o da confiança.
De fato, ao se notar o deslocamento da ideia de regulação e autorregulação, passa-se a considerações muito específicas
sobre a confiança que deve reger o mundo negocial, em especial em relação à prestação de informações diversas. O
papel de garante assumido pelo declarante é, portanto, decisivo nesse sentido. Ele deve ter um mínimo de garantias
para poder efetuar sua voluntary disclosure e com isso obter o efeito premial pretendido. Embora não se bloqueie
nenhum tipo de investigação, essa somente seria de ser aceita se bem expostos os seus fundamentos” (2017, p. 206).
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
50
25 Paulo Cesar Busato e Cesar Roberto Bitencourt dizem que: “Não é necessário que seja espontânea, sendo suficiente
que seja voluntária: há espontaneidade, quando a ideia inicial parte do próprio sujeito; há voluntariedade, por sua
vez, quando a decisão não é objeto de coação moral ou física, mesmo que a ideia inicial tenha partido de outrem,
como da autoridade, por exemplo, ou mesmo resultado de pedido da própria vítima. O móvel, enfim, da decisão do
delator – vingança, arrependimento, inveja ou ódio – é irrelevante para efeito de fundamentar a delação premiada”
(BUSATO; BITENCOURT, 2014, p. 119).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 51
26 Aqui deixamos nossas ressalvas quanto ao Delegado de Polícia elaborar tal acordo, já que não é parte ou possui
capacidade postulatória nos moldes da acusação, além de usurpar função constitucional do MP, malgrado o STF ter
entendido em sentido oposto (STF, ADI 5508, Rel. Min. Marco Aurélio) Pensando assim: SIQUEIRA, 2018 p. 468
e segs; DE GRANDIS, 2015, s/n.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
52
da ultima ratio que orienta o Direito Penal. Infere-se que havia uma desconexão
entre direito administrativo e Direito Penal dentro do arquétipo tributário em
sentido amplo, posto que em havendo um delito previdenciário a extinção da
punibilidade era vinculada ao pagamento antes da deflagração dos procedimentos
administrativos de fiscalização enquanto nos delitos de sonegação fiscal estaríamos
diante de parcelamento e posterior pagamento até o recebimento da denúncia.
Se estamos diante de modalidades tributárias, o que se esperava do
legislador penal é que conferisse o mesmo tratamento jurídico-penal com
ambas, obtendo as mesmas possibilidades de extinção de punibilidade, dentro
de um limiar administrativo comum a ambos, o que conferiria um reforço às
atividades de fiscalização e estimularia o comportamento ajustado ao direito
sem sobrelevar modalidades tributárias.
Poder-se-ia justificar que na legislação previdenciária temos que as
receitas são vinculadas, custeiam o orçamento da seguridade social, e, por
isso, a matéria é regrada de modo mais restrito pelo limitador da ação fiscal,
enquanto nos delitos tributários não estaremos a tratar sempre de receitas
vinculadas, mas também de receitas livres.
O adequado seria que a extinção da punibilidade fosse limitada a um
marco temporal conectado com os instrumentos de fiscalização nas esferas
tributária e previdenciária, e pouco importaria aqui estarmos diante de receitas
livres ou vinculadas, porque o Estado necessitaria de ambas para o custeio das
promessas constitucionalmente feitas dentro do Estado Democrático e Social
de Direito, mas o que se verificou com a sobrevinda da Lei nº 11.941/09 foi a
ruptura com os limitadores temporais da extinção da punibilidade ao conferir
tal possibilidade a qualquer momento.
Tem-se que a Lei nº 11.941/09 cuida de aspectos referentes à extinção da
obrigação tributária pela instituição de programa de parcelamento tributário e
pagamento. A inconstitucionalidade da extinção da punibilidade ofertada em
troca da regularização fiscal27 fora objeto de ADI por violar os princípios da
27 A Lei nº 11.949/09 foi objeto da ADI 4.273/DF que encontra-se pendente de julgamento: STF. ADI 4273/DF. Dispo-
nível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.
jsf?seqobjetoincidente=2691501>. Acesso em: 16 mar. 2019. A Lei nº 10.684/03, em seu art. 9º, também fora objeto
de questionamento, mas a ação perdeu seu objeto pela revogação da lei. Sem vislumbrar incompatibilidade entre
as finalidades do Direito Penal e a reparação do dano José Paulo Baltazar Júnior leciona: “No entanto, é de se ver
que a reparação do dano é um objetivo a ser perseguido também pelo direito penal, que reconhece, de modo geral,
a mitigação da pena em caso de reparação por parte do agente, o que não é exclusivo do direito penal tributário (v.
CP, arts. 15, 16, 65, III, b, 312, § 2º, e 143). Mais que isso, modernamente a vítima ocupa um papel mais central na
justiça penal, que passou a ostentar um papel mais reparador ou restaurativo, como demonstram a previsão legal
expressa da composição dos danos civis como causa de despenalização (Lei nº 9.099/95, arts. 69 a 75), bem como da
existência de penas que revertem em favor da vítima (CP, art. 45, § 1º, e CTB, art. 297). Não há, então, incompati-
bilidade entre o fato de incriminar determinada conduta e, depois, emprestar relevância penal à reparação do dano
dela decorrente, o que, como visto, é regra geral de direito penal e não especificidade dos crimes contra a ordem
tributária” (2014, p. 880).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 55
TITLE: Regularization of taxes and negotiable instruments: legislative deregulation and dismantlement
of the punishability of Economic Criminal Law.
ABSTRACT: This article deals with the general principles that guide the punishability in Economic
Criminal Law and explains two of the main cases of extinction of punishability in this area.
KEYWORDS: Economic Criminal Law. Regularization of Taxes and Negotiable Instruments. Socioeco-
nomic Offenses. Punishability.
5 Referências
AQUINO, José Carlos G. Xavier de. A prova testemunhal no processo penal brasileiro. São Paulo: Letras Ju-
rídicas, 2016.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 57
BADARÓ, Gustavo Henrique. Colaboração premiada: meio de obtenção de prova ou um novo modelo de
justiça penal. In: MOURA, Maria Thereza de Rocha; BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Org.). Colaboração
premiada. São Paulo: RT, 2017.
BALTAZAR Jr., José Paulo. Crimes federais. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal econômico. São Paulo: Saraiva, 2016. v. I.
BOTTINI, Pierapolo Cruz; BADARÓ, Gustavo. Lavagem de dinheiro: aspectos penais e processuais penais.
3. ed. São Paulo: RT, 2017.
______; ______. Lavagem de dinheiro: aspectos penais e processuais penais. Comentários à Lei 9.613/1998
com as alterações da Lei 12.683/2012. 3. ed. São Paulo: RT, 2016.
______; ______. Lavagem de dinheiro: no que consiste o ocultar necessário ao crime? Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2015-set-22/direito-defesa-lavagem-dinheiro-consiste-ocultar-necessario-
crime>. Acesso em: 23 mar. 2019.
BRASIL. Exposição de Motivos 1222015/MF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03%5
CProjetos%5CEXPMOTIV%5CMF%5C2015%5C122.htm>. Acesso em: 25 fev. 2019.
______. Receita Federal. RERCT. Segunda etapa do Rerct permitiu regularização de R$ 4,6 bilhões de ativos no
exterior. Disponível em: <http://receita.economia.gov.br/noticias/ascom/2017/agosto/segunda-etapa-do-
rerct-permitiu-regularizacao-de-r-4-6-bilhoes-de-ativos-no-exterior>. Acesso em: 25 fev. 2019.
BUSATO, Paulo César; BITENCOURT, Cezar Roberto. Comentários à Lei de Organização Criminosa: Lei
n. 12.850/2013. São Paulo: Saraiva, 2014.
CALLEGARI, André Luís. Nunca a Lei de Colaboração Premiada foi tão debatida nos tribunais. Revista
Consultor Jurídico. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2018-ago-21/andre-callegari-nunca-
colaboracao-premiada-foi-tao-debatida>. Acesso em: 27 mar. 2019.
CARVALHO, Érika Mendes. Punibilidade e fins da pena. Revista da Associação Brasileira de Professores de
Ciências Penais, São Paulo, RT, ano 2, n. 3, jul./dez. 2005.
CARVALHO, Salo de. Juiz pode fixar pena abaixo do máximo estabelecido em acordo de delação. Revista
Consultor Jurídico. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2017-mar-10/salo-carvalho-juiz-fixar-pena-
menor-teto-delacao>. Acesso em: 13 abr. 2019.
COSTA, Leonardo Dantas. Delação premiada: a atuação do Estado e a relevância da voluntariedade do
colaborador com a justiça. Curitiba: Juruá, 2017.
COSTA, Machado. Receita cria novas interpretações para investigar recursos repatriados. Disponível em: <https://
veja.abril.com.br/economia/receita-cria-novas-interpretacoes-para-investigar-recursos-repatriados/>.
Acesso em: 2 abr. 2019.
CUNHA, Rogério Sanches; PINTO, Ronaldo Batista. Crime organizado: comentários à Lei 12.850/2013.
4. ed. Salvador: Juspodivm, 2016.
DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e análise do discurso. 2. ed.
Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2012.
______. Os reflexos da repatriação no delito de lavagem de capitais. Jornal Valor Econômico. 11 e 12.09.2016.
São Paulo, 2016.
______. Principais questões sobre a competência para a homologação do acordo de colaboração premiada.
In: MOURA, Maria Thereza de Rocha; BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Org.). Colaboração premiada. São
Paulo: RT, 2017.
DE GRANDIS, Rodrigo. A inconstitucional participação de delegados de polícia nos acordos de cola-
boração premiada. Jota. Disponível em: <www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/rodrigo-de-grandis-a-
inconstitucional-participacao-de-delegados-de-policia-nos-acordos-de-delacao-premiada-05052015>.
Acesso em: 15 mar. 2019.
______. Aspectos penais e processuais penais do Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária de
Recursos (RERCT). In: PAULA Jr., Aldo de; PEREZ, Eduardo Salusse; ESTELLITA, Heloísa (Coord.).
Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT): aspectos práticos. São Paulo: Noeses, 2016.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
58
1 Introdução
O presente artigo analisa o concurso de pessoas no crime autônomo
previsto no parágrafo único do art. 89 da Lei nº 8.666/93, que estabelece
normas penais especiais em matéria de licitações. Para aprofundar os temas
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
60
1 FERRAZ, Esther de Figueiredo. A co-delinqüência no direito penal brasileiro. São Paulo: José Bushatsky, 1976. p. 48.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 61
2 GRECO, Luís; TEIXEIRA, Adriano. Autoria como realização do tipo: uma introdução à ideia de domínio do fato
como o fundamento central da autoria no direito penal brasileiro. In: GRECO, Luís et al. Autoria como domínio do
fato: estudos introdutórios sobre o concurso de pessoas no direito penal brasileiro. 1. ed. São Paulo: Marcial Pons,
2014. p. 51.
3 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2017. v. 1. p. 608-609.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
62
4 FERRAZ, Esther de Figueiredo. A co-delinqüência no direito penal brasileiro. São Paulo: José Bushatsky, 1976. p. 12.
5 Idem, ibidem, p. 53-54.
6 ALMEIDA Jr., João Mendes. O processo criminal brasileiro. 4. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos. 1959. v. II. p. 183.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 63
7 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 1. ed. Campinas: Bookseller, 1997. v. II. p. 153.
8 GRINOVER, Ada Pellegrini, GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. As nulidades
do processo penal. 9. ed. São Paulo: RT, 2006. p. 109.
9 Idem, ibidem, p. 111.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
64
Por outro, o tipo exige que o agente tenha auferido benefício dessa ilegalida-
de para celebrar contrato com o Poder Público. Caso tenha colaborado para
a ilegalidade, tal circunstância, por si só, não é suficiente para incriminar o
particular, sem o benefício da referida contratação, e vice-versa.
Nesse sentido, ressalta Guilherme de Souza Nucci: “É lógico que o
particular, ao fornecer bens ou serviços à Administração, sem ter tomado
parte na ilegalidade cometida pelo servidor público, que agiu por interesses
escusos quaisquer, ainda que tenha lucro, não pode ser responsabilizado
criminalmente”10. Conforme conclui: “(...) é importante destacar que a in-
serção do parágrafo único restringiu o alcance da lei penal ao contratado (não
servidor), pois colocou, na figura típica, além da intenção de obter benefício,
a comprovada concorrência para a consumação da ilegalidade. Assim, caso o servidor
dispense a licitação, mas o particular não tome parte em qualquer ato ilegal,
que lhe diga respeito, ainda que se beneficie da contratação indevida, é inca-
bível a punição”11.
Na mesma linha de raciocínio, a lição de Cezar Roberto Bitencourt, para
quem o legislador condicionou a punição prevista para a infração do parágrafo
único do referido art. 89 a duas condições limitadoras: “a) comprovadamente
ter concorrido para a ‘consumação da ilegalidade’”; e “b) beneficiar-se contra-
tando com o poder público”12. Assim, mesmo se considerado que o particular
foi beneficiado, ao executar as obras contratadas, essa circunstância não é
suficiente para aperfeiçoar o tipo penal, que exige prova de ele ter concorrido
para a dispensa ou inexigibilidade ilegal da licitação.
Salientando a necessidade da presença cumulativa dos aludidos requi-
sitos típicos, Vicente Greco Filho esclarece que “o parágrafo único do artigo
incrimina aquele que se beneficia da dispensa ou inexigibilidade ilegal, desde que
tenha comprovadamente concorrido para a consumação, para celebrar contrato com
o Poder Público”13. Em igual sentido, Paulo José da Costa Jr. assim reforça:
“(...) aquele que, além de contribuir para a ilegalidade, beneficiar-se da dispensa
ou da inexigibilidade ilegal para celebrar contrato com o Poder Público, res-
ponde pelo delito”14.
Sobre o assunto, nas palavras de Jessé Torres Pereira Junior, a conduta
nuclear do tipo é beneficiar-se, ou seja, tirar proveito, obter vantagem, de
conteúdo patrimonial, valendo-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal da
10 NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2017. v. 1. p. 469.
11 Idem, Ibidem, p. 469-470.
12 BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito penal nas licitações. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 156.
13 GRECO FILHO, Vicente. Dos crimes da lei de licitações, 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 59, sem grifo no original.
14 COSTA Jr., Paulo José. Direito penal das licitações. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 23, sem grifo no original.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
66
licitação, isto é, aquela levada a efeito em arrepio ao prescrito nos arts. 17, 24 e
25 da Lei. Para a adequação típica da conduta, além do benefício auferido pelo
agente, exige a Lei que tenha ele comprovadamente concorrido para a consumação
da ilegalidade. Vale dizer, então, que, para a superveniência da punibilidade do
particular, se faz necessário que, de alguma forma, tenha ele colaborado com
o agente público, a fim de que este, fazendo tábula rasa do que dispõe a Lei,
dispense ou inexija a licitação, ou, ainda, a dispense ou inexija com inobser-
vância das formalidades que devem revesti-las15.
No mesmo sentido, a lição de Adel El Tasse, para quem: “é de suma
importância observar que o indivíduo beneficiado tenha comprovadamente
concorrido para a consumação da ilegalidade, praticando atos efetivos na realização
de indevida dispensa ou inexigibilidade da licitação. Registre-se que para a
tipificação penal na hipótese em comento exige que o agente, além de con-
correr para a consumação da ilegalidade, o tenha feito para contratar com o
Poder Público. Assim, somente pode cometer o ilícito em questão, quem se
beneficiou, para contratar com a administração pública, da indevida ausência
de licitação, que ajudou a operacionalizar”16.
Poderíamos pensar que não haveria necessidade de existir a figura autô-
noma do crime, prevista no parágrafo único do art. 89 da Lei nº 8.666/93, pois
quem atuasse, como partícipe, na ilegalidade cometida pelo servidor público,
beneficiando-se de contratação com o Poder Público, estaria incurso também
no caput do referido dispositivo, nos termos da norma de extensão da adequação
típica contida no art. 29, caput, do CP. No entanto, há uma limitação essencial
no parágrafo único do mencionado art. 89, no sentido de considerar a respon-
sabilidade do contratado particular somente nas hipóteses de ter positivamente
concorrido para a ilegalidade. A esse respeito, a lição de Wilson Lavorenti, Édson
Luís Baldan e Paulo Rogério Bonini: “Poder-se-ia argumentar que se trata de
disposição desnecessária, vez que a coautoria e a participação encontram-se
suficientemente disciplinadas no art. 20 do CP, merecendo reprimenda, na
medida de sua culpabilidade, todo aquele que induzir, instigar, auxiliar ou
solidariamente praticar ações correspondentes à conduta típica. Todavia, essa
figura equiparada estabelece importante limitação típica, pois somente está
incriminada a conduta do contratado que tenha concorrido de forma positiva
15 PEREIRA Jr., Jesse Torres. Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública. 8. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2009. p. 904.
16 TASSE, Adel El. Legislação criminal especial. Coord. Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha. São Paulo: RT,
2009. p. 675.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 67
4 Do Domínio do Fato
Nesta parte do estudo, veremos os requisitos para atribuir, hipotetica-
mente, a responsabilidade do sócio de uma empresa pelo crime definido no
art. 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93, da ótica da concepção doutrinária
da teoria do domínio do fato.
Na doutrina, Claus Roxin propôs a ideia de que o autor seria quem
detém o domínio do fato, quem de fato representa a figura central do acontecer
típico. Existem, segundo esse penalista, três manifestações concretas de do-
mínio do fato, como expressão da figura central do acontecer típico: a) o domínio
da ação; b) o domínio da vontade; e c) o domínio funcional do fato18.
Assim, em primeiro lugar, teria o domínio do fato o autor imediato, que
pratica a ação descrita no tipo penal. Na expressão de Luís Greco e Alaor Leite,
“é o domínio de quem realiza, em sua própria pessoa, todos os elementos de
um tipo” ou, em outras palavras, “quem comete o fato por si mesmo”19. Essa
condição de autor permaneceria ainda que o sujeito ativo tivesse agido sob o
comando ou a pedido de um terceiro.
Essa primeira condição de autoria imediata não se aplicaria ao sócio de
uma empresa que não participou diretamente dos fatos, caso a denúncia lhe
impute, por sua mera condição de integrante do quadro social, uma coautoria
com os demais sócios da empresa, que consiste em concorrer comprovadamente
para a ilegalidade (parágrafo único do art. 89 da Lei nº 8.666/93). Isso, porque a
autoria imediata exige a conduta de dispensar ou inexigir licitação, fora das hipóteses
previstas em lei ou sem as formalidades legais – prevista no tipo autônomo do art.
89, caput, da Lei nº 8.666/93.
A segunda forma de domínio do fato diz respeito ao domínio da vontade
(autoria mediata) de uma terceira pessoa, reduzida a mero instrumento do
autor mediato, que detém o controle da ação típica. Além das situações de
coação psicológica ou de utilização de inimputáveis pelo autor mediato, ou
de erro de terceiro, Roxin reconhece esse domínio da vontade em um aparato
17 LAVORENTI, Wilson; BALDAN, Édson Luís; BONINI, Paulo Rogério. Crimes de Licitação. In: Leis especiais
penais. 13. ed. Campinas: Millenium, 2016. p. 195.
18 Cf. GRECO, Luís; ASSIS, Augusto. O que significa a teoria do domínio do fato para a criminalidade de empresa.
In: GRECO, Luís et al. Autoria como domínio do fato: estudos introdutórios sobre o concurso de pessoas no direito
penal brasileiro. 1. ed. São Paulo: Marcial Pons, 2014.
19 Idem, ibidem, p. 25.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
68
20 GRECO, Luís; LEITE, Alaor. O que é e o que não é a teoria do domínio do fato. A distinção entre autor e partícipe
no Direito Penal. In: GRECO, Luís et al. Autoria como domínio do fato: estudos introdutórios sobre o concurso de
pessoas no direito penal brasileiro. 1. ed. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 27.
21 GRECO, Luís; ASSIS, Augusto. O que significa a teoria do domínio do fato para a criminalidade de empresa. In:
GRECO, Luís et al. Autoria como domínio do fato: estudos introdutórios sobre o concurso de pessoas no direito penal
brasileiro. 1. ed. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 90.
22 “Si se quisiera determinar formalmente el punto de vista de la interdependencia, de la imbricación de las aporta-
ciones de una manera adecuada a cualquier situación imaginable, solo podría decirse que alguien es coautor si ha
desempeñado una función que era de importancia esencial para la concreta realización del delito.” (ROXIN, Claus.
Autoría y dominio del hecho en derecho penal. Traducción de la novena edición alemana por Joaquín Cuello Contreras y
José Luis Serrano González de Murillo. Madrid: Marcial Pons, 2016. p. 277)
23 “(...) para el dominio funcional del hecho, o sea, el condominio del acontecer, no basta cualquier cooperación
insignificante en la fase ejecutiva, sino que la cooperación ha de ser esencial” (idem, ibidem, p. 716).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 69
24 GRECO, Luís; ASSIS, Augusto. O que significa a teoria do domínio do fato para a criminalidade de empresa. In:
GRECO, Luís et al. Autoria como domínio do fato: estudos introdutórios sobre o concurso de pessoas no direito penal
brasileiro. 1. ed. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 95.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
70
5 Conclusões
1) A figura típica do parágrafo único do art. 89 da Lei nº 8.666/93 exige,
para sua consumação, a presença de dois requisitos cumulativos: (i) a contri-
buição comprovada para a consumação da ilegalidade (dispensa ou inexigibilidade
ilegal da licitação), por parte do sujeito ativo, e (ii) o benefício dessa ilegalidade
para celebrar contrato com o Poder Público.
2) Em caso de concurso de pessoas, a denúncia deve individualizar a
conduta de cada acusado, descrevendo sua específica contribuição para a ilegali-
dade do art. 89, caput, da Lei nº 8.666/93 – dispensa ou inexigibilidade ilegal
da licitação –, que representa elemento essencial do tipo penal autônomo
contido no parágrafo único do mesmo dispositivo legal, sob pena de inépcia
da petição inicial (arts. 41 e 395, I, ambos do CPP). Além disso, tem de ser
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 71
TITLE: Co-perpetration under article 89, sole paragraph, of Law no. 8.666/93.
ABSTRACT: In this article, we analyze important aspects related to the co-perpetration provided for in
the sole paragraph of article 89 of Law no. 8,666/93, which establishes the general rules, including criminal
protection, in the bidding process. In the first part of the paper, from the study of the co-perpetration,
we appreciate the essential requirements for reporting on the said crime. Next, we make an in-depth
analysis of this crime, with the examination of its objective and subjective typology, able to configure the
co-perpetration in the exemption or illegal impossibility of bidding process. In the last part of the article,
from the perspective of Claus Roxin, in his studies on the theory of the domain of fact, we focused on
aspects related to the company’s member liability legally constituted in said criminal infraction.
6 Referências Bibliográficas
ALMEIDA Jr., João Mendes. O processo criminal brasileiro. 4. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos. 1959. v. II.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito penal nas licitações. São Paulo: Saraiva, 2012.
COSTA Jr., Paulo José. Direito penal das licitações. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
72
FERRAZ, Esther de Figueiredo. A co-delinqüência no direito penal brasileiro. São Paulo: José Bushatsky, 1976.
GRECO, Luís; ASSIS, Augusto. O que significa a teoria do domínio do fato para a criminalidade de
empresa. In: GRECO, Luís et al. Autoria como domínio do fato: estudos introdutórios sobre o concurso de
pessoas no direito penal brasileiro. 1. ed. São Paulo: Marcial Pons, 2014.
______; LEITE, Alaor. O que é e o que não é a teoria do domínio do fato. A distinção entre autor e par-
tícipe no direito penal. In: GRECO, Luís et al. Autoria como domínio do fato: estudos introdutórios sobre o
concurso de pessoas no direito penal brasileiro. 1. ed. São Paulo: Marcial Pons, 2014.
______; TEIXEIRA, Adriano. Autoria como realização do tipo: uma introdução à ideia de domínio do
fato como o fundamento central da autoria no direito penal brasileiro. In: GRECO, Luís et al. Autoria
como domínio do fato: estudos introdutórios sobre o concurso de pessoas no direito penal brasileiro. 1. ed.
São Paulo: Marcial Pons, 2014.
GRECO FILHO, Vicente. Dos crimes da lei de licitações. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance.
As nulidades do processo penal. 9. ed. São Paulo: RT, 2006.
LAVORENTI, Wilson; BALDAN, Édson Luís; BONINI, Paulo Rogério. Crimes de licitação. In: Leis
especiais penais. 13. ed. Campinas: Millenium, 2016.
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 1. ed. Campinas: Bookseller, 1997. v. II.
NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2017. v. 1.
______. Licitações. In: Leis penais e processuais penais comentadas. 7. ed. São Paulo: RT, 2013. v. 1.
PEREIRA Jr., Jesse Torres. Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública. 8. ed. Rio
de Janeiro: Renovar, 2009.
ROXIN, Claus. Autoría y dominio del hecho en derecho penal. Trad. de la novena edición alemana por Joaquín
Cuello Contreras y José Luis Serrano González de Murillo. Madrid: Marcial Pons, 2016.
TASSE, Adel El. Legislação criminal especial. Coord. Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha. São
Paulo: RT, 2009.
Silmar Fernandes
Aluno do Mestrado do Programa de Pós-Graduação
Stricto Sensu em Direito da Universidade Nove de Julho;
Desembargador no TJSP e no TRESP; Professor-Assistente
de Processo Penal nos Cursos de Pós-Graduação da Escola
Paulista da Magistratura.
Introdução
Trata o presente artigo do surgimento da norma supralegal e das conse-
quências advindas de tal surgimento para o ordenamento jurídico brasileiro,
a partir de uma análise da atuação do colendo STF no que tange à criação da
norma citada.
Com efeito, após a redemocratização do país, que teve como ponto central
a promulgação da CF/88, o Poder Judiciário deixou de ser um mero departamen-
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
74
1 BRASIL. Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto
de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
decreto/d0678.htm>. Acesso em: 9 jul. 2018.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 75
detido por dívidas. Esse princípio não limita os mandados de autoridade ju-
diciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação
alimentar”2.
Ocorre que o ordenamento jurídico brasileiro há muito permitia a
prisão civil não só para a hipótese de obrigação alimentar, mas também para
o caso do depositário infiel.
Com efeito, a previsão constitucional que veda a prisão por dívidas existe
no Brasil desde a Constituição de 1934, sendo que a Carta de 1946 acrescen-
tou exceções a tal vedação, dispondo que não haveria prisão civil por dívida,
multa ou custas, salvo o caso do depositário infiel e o de inadimplemento de
obrigação alimentar3.
Tal disposição foi repetida na CF/67 e mantida pela EC nº 01/69, a qual,
por registrar um rompimento formal com a ordem constitucional então em
vigor, foi considerada pelos constitucionalistas como nova Constituição4.
A CF promulgada em 1988, igualmente, manteve disposição seme-
lhante, prevendo em seu art. 5º, LXVII, que “não haverá prisão civil por
dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável
de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”.
Não bastasse, o Código Civil vigente à época da incorporação do Pacto
de São José da Costa Rica também admitia a prisão civil do depositário infiel5,
o que foi repetido pelo Código Civil promulgado em 10 de janeiro de 2002,
que dispõe em seu art. 652 que “seja o depósito voluntário ou necessário, o
depositário que não o restituir quando exigido será compelido a fazê-lo me-
diante prisão não excedente a um ano, e ressarcir os prejuízos”.
Surgiu, portanto, uma aparente contradição no ordenamento interno:
a CF/88 e o CC/1916 permitiam a prisão do depositário infiel. No entanto,
o Pacto de São Jose da Costa Rica, internalizado ao ordenamento em 1992,
não o fazia. E para solucionar tal contradição afigurou-se urgente determinar
a hierarquia normativa dos tratados internacionais, ou seja, se eles seriam
capazes de revogar lei ordinária ou mesmo norma constitucional.
6 MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de direito internacional público. Prefácio M. Franchini Netto à 1. ed.
12. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 119.
7 MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. O § 2º do artigo 5º da Constituição Federal. In: TORRES, Ricardo Lobo
(Org.). Teoria dos direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 25.
8 BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Op. cit. t. I. p. 207.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 77
9 BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Op. cit. t. I. p. 315.
10 Acerca da aplicação da tese da nulidade no Brasil, confira-se: “Trata-se do regime geral de desvaloração da incons-
titucionalidade adotado pelo modelo norte-americano desde o precedente Marburyvs Madison (1803), em que a
Suprema Corte americana assentou o raciocínio segundo o qual a lei inconstitucional é nula e inválida. A mesma
tese é adotada em países como Alemanha, Espanha e Portugal, bem como no Brasil, onde o regime de nulidade é
considerado princípio constitucional implícito” (Id. Ibidem. p. 338).
11 RHC 79.785/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 22.11.02.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
78
12 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva,
2010. p. 804.
13 TRINDADE, Antônio Augusto Cançado apud MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRAN-
CO, Paulo Gustavo Gonet. Op. cit., p. 805.
14 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Op. cit., p. 805.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 79
“(...) O quórum qualificado está tão somente a reforçar tal natureza cons-
titucional, ao adicionar um lastro formalmente constitucional. Na her-
menêutica dos direitos há que imperar uma lógica material e não formal,
orientada por valores, a celebrar o valor fundante da prevalência da digni-
dade humana. Isto porque não seria razoável sustentar que os tratados de
direitos humanos adquirissem hierarquia constitucional exclusivamente em
virtude de seu quórum de aprovação. A título de exemplo, destaque-se que
o Brasil é parte da Convenção contra a tortura desde 1989, estando em vias
de ratificar seu Protocolo Facultativo. Não haveria qualquer razoabilidade
se a este último – tratado complementar e subsidiário ao principal – fosse
conferida hierarquia constitucional, enquanto ao instrumento principal
fosse conferida hierarquia meramente legal. Tal situação importaria em
agudo anacronismo do sistema jurídico.”15
15 PIOVESAN, Flávia. Reforma do judiciário e direitos humanos. In: TAVARES, André Ramos; LENZA, Pedro;
ALARCÓN, Pietro de Jesús Lora (Coord.). Reforma do judiciário analisada e comentada. São Paulo: Método, 2005. p.
72.
16 Id. Ibidem. p. 72.
17 Id. Ibidem. p. 73.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
80
18 Por todos: LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 9. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Método, 2005. p.
47.
19 BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Direito constitucional: teoria da Constituição.
5. ed. Salvador: Juspodivm, 2015. t. I. p. 76-77.
20 LENZA, Pedro. Op. cit., p. 43.
21 BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Op. cit., t. I. p. 315.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 81
civil relativamente ao depositário infiel (art. 5º, LXVII) – não pode sofrer
interpretação que conduza ao reconhecimento de que o Estado brasileiro,
mediante tratado ou convenção internacional, ter-se-ia interditado a prerro-
gativa de exercer, no plano interno, a competência institucional que lhe foi
outorgada, expressamente, pela própria CR. A ESTATURA CONSTITU-
CIONAL DOS TRATADOS INTERNACIONAIS SOBRE DIREITOS
HUMANOS: UMA DESEJÁVEL QUALIFICAÇÃO JURÍDICA A SER
ATRIBUÍDA, DE JURE CONSTITUENDO, A TAIS CONVENÇÕES
CELEBRADAS PELO BRASIL. É irrecusável que os tratados e convenções in-
ternacionais não podem transgredir a normatividade subordinante da Constituição
da República nem dispõem de força normativa para restringir a eficácia jurídica das
cláusulas constitucionais e dos preceitos inscritos no texto da Lei Fundamental (ADI
1.480/DF, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno). Revela-se altamente desejável, no
entanto, ‘de jure constituendo’, que, à semelhança do que se registra no direito
constitucional comparado (Constituições da Argentina, do Paraguai, da Federação
Russa, do Reino dos Países Baixos e do Peru, v.g.), o Congresso Nacional venha
a outorgar hierarquia constitucional aos tratados sobre direitos humanos celebrados
pelo Estado brasileiro. Considerações em torno desse tema. CONCESSÃO
EX OFFICIO DA ORDEM DE HABEAS CORPUS. Afastada a questão
prejudicial concernente à inconstitucionalidade do art. 4º do DL nº 911/69,
cuja validade jurídico-constitucional foi reafirmada pelo STF, é concedida,
ex officio, ordem de habeas corpus, para determinar, ao Tribunal de Justiça
local, que prossiga no julgamento do writ constitucional que perante ele
foi impetrado, examinando, em consequência, os demais fundamentos de
defesa suscitados pelo réu, ora paciente.”23 (grifo não original)
36 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Op. cit., p. 818.
37 BARROSO, Luís Roberto. Ano do STF: judicialização, ativismo e legitimidade democrática. Revista Consultor Jurídico.
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2008-dez-22/judicializacao_ativismo_legitimidade_democratica>.
Acesso em: 15 jul. 2018.
38 Id. Ibidem.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 89
39 Id. Ibidem.
40 BARROSO, Luís Roberto. Ano do STF: judicialização, ativismo e legitimidade democrática. Revista Consultor Jurídico.
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2008-dez-22/judicializacao_ativismo_legitimidade_democratica>.
Acesso em: 15 jul. 2018.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
90
45 “(...) as normas infraconstitucionais de natureza secundária consistem naquela cujo fundamento de validade radica
diretamente em alguma norma infraconstitucional primária, e só indiretamente na constituição.” (BERNARDES,
Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Op. cit. t. II. p. 438)
46 “Sendo o poder constituinte originário ilimitado e sendo o controle de constitucionalidade exercício atribuído pelo
poder constituinte originário a poder por ele criado e que a ele deve referência, não há que se cogitar de fiscaliza-
ção de legitimidade por parte do Poder Judiciário de preceito por aquele estatuído” (MENDES, Gilmar Ferreira;
BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 117).
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
92
gal, no caso específico, com o Pacto de São José da Costa Rica, o qual apenas
permite a prisão civil no caso do devedor de alimentos.
De tal conclusão, aliás, é possível extrair a segunda consequência ad-
vinda da criação da norma supralegal. A partir do entendimento esboçado
pelo STF no RE 349.703/RS, não basta verificar a compatibilidade de uma
lei ordinária com a CF, é necessário também verificar se tal lei está material-
mente de acordo com a norma supralegal, que lhe é superior. E na hipótese
de uma lei ordinária estar em conflito com um tratado de direitos humanos
que, embora ratificado pelo Brasil, não foi internalizado conforme o procedi-
mento de emenda constitucional, tem-se que tal lei teria sua eficácia jurídica
paralisada. Não obstante, a primeira questão que surge é exatamente quem
teria competência para tomar tal providência.
O surgimento da norma supralegal fez com que a doutrina começasse a
discutir qual seria a forma específica para a solução de conflitos entre normas
supralegais e legislação ordinária. Criou-se, então, um sistema de controle de
supralegalidade, chamado por “controle de convencionalidade”, que em muito
se assemelha ao controle difuso de constitucionalidade, embora o parâmetro
de controle seja outro, no caso a norma supralegal.
Observe-se que, no caso da legislação ordinária contrariar a CF, há a
previsão expressa do controle de constitucionalidade para a solução do con-
flito, que pode se dar tanto na via difusa (arts. 97, 102, III, a a d, e 105, II a e b,
todos da CF/88) quanto na via concreta (arts. 36, III, 102, § 1º, 103 da CF/88).
O caso da supralegalidade, ao revés, por se tratar de criação jurispru-
dencial, não possui previsão legal, sendo que seu controle foi pensado pela
doutrina e tem sido aplicado por todos os juízes do território nacional de
maneira difusa, justamente em razão da inexistência de uma lei específica
disciplinando eventual controle concentrado, legitimidade, órgão julgador e
procedimento a ser seguido.
Conclusão
A partir deste trabalho foi possível observar a evolução do tratamento
dispensado aos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos pela
doutrina e jurisprudência, destacando-se a atuação do STF principalmente no
que tange a considerá-los, a partir de meados de 2008, como norma supralegal.
Com efeito, a partir da introdução, via emenda constitucional, do § 3º
ao art. 5º da CF, dispondo que os tratados e convenções internacionais sobre
direitos humanos que fossem aprovados, em cada Casa do Congresso Na-
cional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros,
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 93
TITLE: Activism of the Federal Supreme Court and the emergence of supralegal norms.
ABSTRACT: This essay deals with the emergence of supralegal norms, first analyzing the evolution of
the opinions of jurists and highlighting the activity of the Federal Supreme Court, in order to show the
nonexistence of such norms in the legal system, and that their creation happened based on the proactive
actions of the Supreme Court. Finally, some consequences brought by the creation of that new normative
species will be presented.
Referências
BARROSO, Luís Roberto. Ano do STF: Judicialização, ativismo e legitimidade democrática. Revista
Consultor Jurídico. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2008-dez-22/judicializacao_ativismo_le-
gitimidade_democratica>.
BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Direito constitucional: teoria da
Constituição. 5. ed. Salvador: Juspodivm, 2015. t. I.
______; ______. Direito constitucional: teoria da Constituição. 5. ed. Salvador: Juspodivm, 2015. t. II.
BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil (de 18 de setembro de 1946): artigo 141, § 32º. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm>.
______. Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos
(Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm>.
______. Decreto nº 7.030, de 14 de dezembro de 2009. Promulga a Convenção de Viena sobre o Direito dos
Tratados, concluída em 23 de maio de 1969, com reserva aos Artigos 25 e 66. Disponível em: <http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d7030.htm>.
______. Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L3071impressao.htm> Acesso em: 9 jul. 2018.
______. Supremo Tribunal Federal. Banco de jurisprudência. Disponível em: <www.stf.jus.br>.
CIDH. Convenção Americana de Direitos Humanos. Disponível em: <https://www.cidh.oas.org/basicos/
portugues/c.convencao_americana.htm>.
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Método, 2005.
MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de direito internacional público. Prefácio M. Franchini Netto
à 1. ed. 12. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
______. O § 2º do artigo 5º da Constituição Federal. In: TORRES, Ricardo Lobo (Org.). Teoria dos direitos
fundamentais. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 9. ed. São
Paulo: Saraiva, 2014.
______; ______; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de direito constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
PIOVESAN, Flávia. Reforma do judiciário e direitos humanos. In: TAVARES, André Ramos; LENZA,
Pedro; ALARCÓN, Pietro de Jesús Lora (Coord.). Reforma do judiciário analisada e comentada. São Paulo:
Método, 2005.
RESUMO: Em nosso dia a dia, certas condutas humanas praticadas, embora re-
vestidas de normalidade, contribuem para o crime. Tratam-se de ações “neutras”,
pois mesmo que integrem o curso do delito, não são manifestamente puníveis.
Por apresentar, de algum modo, uma conexão com o delito, é preciso estabelecer
os limites da participação criminal, delimitando quando se inicia uma conduta
passível de punição e em que ponto se interrompe o nexo de causalidade e, a
partir daí, considerar quais são ou não as ações criminosas. Por muito tempo,
o enfrentamento da questão se apoiou no Princípio da Insignificância, da Ade-
quação Social e na Proibição ao Regresso. Atualmente, o assunto tem recebido
a atenção e diversas concepções da doutrina jurídico-penal, sendo de grande
importância para o Direito Penal; afinal, é um estudo que diz respeito sobre o
que o Direito valoriza para si.
Introdução
No cotidiano da sociedade, ações completamente normais favorecem
a prática de delitos, muitas vezes, sem que se perceba esse fenômeno, sendo,
em alguns casos, imputada a responsabilidade criminal.
Este artigo, portanto, visa um breve estudo da possibilidade do Direito
Penal reconhecer certas ações como neutras, bem como compreender a sua
essência e fornecer alguns critérios, contribuindo, assim, para o fortalecimento
de um sistema penal justo e seguro que olha para a realidade e, ao mesmo
tempo, protege seus bens jurídicos.
1 SCHORSCHER, Vivian Cristina. A criminalização da lavagem de dinheiro: críticas penais. (Tese de Doutorado em
Direito). Faculdade de Direito da USP, São Paulo: 2012. p. 125-126.
2 Idem, p. 126.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 97
3 Beihilfe durch äusserlich neutrale Handlungen. München: Beck, 1996, p. 3. In: LOBATO, José Danilo Tavares.
Teoria geral da participação criminal e ações neutras: uma questão única de imputação objetiva. Curitiba: Juruá, 2010. p.
11.
4 RASSI, João Daniel. Imputação das ações neutras e o dever de solidariedade no direito penal brasileiro. 1. ed. São Paulo: LiberArs,
2014. p. 34.
5 LOBATO, José Danilo Tavares. Teoria geral da participação criminal e ações neutras: uma questão única de imputação
objetiva. Curitiba: Juruá, 2010. p. 31.
6 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. v. 1. p. 49.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
98
7 PONTE, Antonio Carlos da. Crimes eleitorais. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 82.
8 WELZEL, Hans. O novo sistema jurídico-penal: uma introdução a doutrina da ação finalista. São Paulo: RT, 2001. p.
36.
9 GRECO, Luís. Cumplicidade através das ações neutras: a imputação objetiva na participação. Rio de Janeiro: Renovar,
2004. p. 22.
10 BITENCOURT, Cezar Roberto, op. cit., p. 55.
11 PONTE, Antonio Carlos da. Crimes eleitorais. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 79.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 99
12 Idem, ibidem.
13 GRECO, Luís. Op. cit., p. 70.
14 JAKOBS, Günther. A imputação objetiva no direito penal. Trad. André Luís Callegari. São Paulo: RT, 2000. p. 14.
15 STIVANELLO, Gilbert Uzêda. Teoria da imputação objetiva. Revista CEJ, Brasília, n. 22, jul./set. 2003, p. 74.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
100
19 BUSATO, Paulo César. A evolução dos fundamentos da teoria do delito. 2012. Disponível em: <http://www.gnmp.com.
br/publicacao/156/a-evolucao-dos-fundamentos-da-teoria-do-delito>. Acesso em: 12 set. 2017. p. 333.
20 WELZEL, Hans. O novo sistema jurídico-penal: uma introdução à doutrina da ação finalista. São Paulo: RT, 2001. p.
27 e 36.
21 Idem, p. 27.
22 Idem, p. 36.
23 TAVARES, Juarez. Direito penal da negligência. São Paulo: RT, 1985. p. 16.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
102
autor do delito. Cria, assim, sua própria teoria, defendendo que o cúmplice,
na verdade, se solidariza com fato principal50.
Em sua concepção, há um desvalor do ato do cúmplice consistente em
uma solidariedade com o injusto alheio. A ação é considerada socialmente
lesiva, porque seu comportamento ignora os valores que revestem a ordem
jurídica, sendo inaceitável pela sociedade51.
Para a configuração da solidariedade, a contribuição do partícipe deve
se aproximar ao núcleo do tipo penal. Ainda assim, a teoria segue-se muito
imprecisa.
Como critica Paulo César Busato (2013, p. 339):
Logo, uma ação é idônea se visa a proteção do bem jurídico, que será
analisada em concreto. Nas discussões anteriores, segundo Greco, não é
necessário que a não prática da ação proibida salve o bem jurídico, bastando
apenas que ela melhore de alguma forma a situação em que se encontra bem.
Daí o raciocínio sobre a relevância e valorização dessa ação, bastando que ela,
em não inexistindo, não piora a situação do bem-jurídico53.
Então, por exemplo, aquele que vende machados para terceiros que
usará como arma de um crime, não se enquadrará partícipe, porque este,
diante da negativa daquele, pode realizar a compra em outro estabelecimento.
Conclusão
Conclui-se que existem simples ações, inocentes, comuns, do cotidia-
no, que podem fazer parte do curso de um delito cometido por terceiros. Do
mesmo modo, tais ações podem dificultar a prática de uma infração penal.
O que caracteriza o reconhecimento de ações como neutras pelo Direito
Penal é seu caráter inofensivo. Do contrário, se esses comportamentos carac-
terizarem infrações penais, serão ações criminosas, logo, estarão abarcadas pela
tipicidade. Portanto, as ações neutras estão fora da lei penal e não têm o condão
de um dia se tornarem legislação. No momento em que uma ação neutra for
tipificada, significa que há reprovação do comportamento pelo ordenamento
por presença de índole criminosa, deixando ela então de ser neutra.
É possível que as ações neutras sejam reconhecidas pelo Direito Penal,
bastando que se observe alguns critérios para a sua identificação, de forma
que ofereça segurança na sua prática, afastando a hipótese de se recaírem na
cumplicidade e sujeição a uma responsabilidade criminal. Para tanto, é preciso
olhar a realidade, o ordenamento jurídico como um todo e o próprio Direito
Penal, seu sentido e sobre o que se quer imputar.
No Brasil, o art. 29 do Código Penal, que trata do concurso de pessoas,
prescreve possibilidades de participação muito amplas e permite a respon-
sabilidade abrangente de todos os que cooperam para a execução do delito
e, ao mesmo tempo, não fixa limite temporal para interrupção do nexo de
participação.
O norte inicial para o Direito Penal separar as ações criminosas das neu-
tras está na análise da ação enquanto causa para um resultado. Nesse contexto,
é de se considerar a ação, em um primeiro plano, no sentido ontológico e,
em um segundo plano, no sentido jurídico dentro do tipo do injusto penal.
Mesmo que certas ações contribuam para um resultado delitivo não significa
uma obrigação de imputação penal. Nada impede ao Direito limitar a relação
causal, de se dizer o que é relevante, o que interessa à norma penal. Veja que
a relação de causalidade não deixa de se existir, apenas é submetida, em um
segundo momento, ao exame da relevância jurídica, se deve-se reprovar a
conduta ou não.
Assim, é imperioso ressaltar que as ações neutras não bem se comuni-
cam com a teoria da equivalência das condições ou da causalidade adequada,
destacando-se com mais propriedade a teoria da relevância típica da causali-
dade, que implica observar a causalidade se próxima ou distante da normal
penal que tipifica o comportamento proibido, o fim de zelo dessa norma, se
relevante ao Direito Penal e se de acordo com seu próprio sentido.
Em sequência, a Teoria da Imputação Objetiva fornece critérios im-
portantes como solução para as ações neutras. Como visto, há dificuldade de
reconhecê-las dentro dessa teoria que, de alguma forma, é falha, mas noto-
riamente tem um contexto interessante. Não obstante, no Brasil, se valoriza
os elementos subjetivos no percurso do crime.
Parece, assim, coerente, que a ação ganha o rótulo de neutra, no plano
da lei, se não criou ou incrementou um risco juridicamente desaprovado,
não oferecendo perigo ao bem jurídico protegido. E só se pode considerar
que houve a criação de um risco não permitido quando a recusa do potencial
contribuinte em realizar a ação, requerida pelo terceiro, dificulte de alguma
forma o cometimento da ação principal por ele. Isso quer dizer que se o
terceiro, que é agente do delito, puder conseguir uma mesma contribuição
de outra pessoa, a ação do potencial contribuinte é indiferente, logo, neutra.
No plano subjetivo, aquele cujo comportamento é neutro sob o viés
objetivo, passa a ter conhecimento de que sua ação contribuirá para o plano
criminoso do autor, após anunciada suas intenções delitivas, é evidente, de
acordo com uma leitura ordenamento jurídico-penal brasileiro, que há cum-
plicidade, não podendo, dentro de certas considerações, permanecer impune.
A princípio, por simples lógica sobre a essência do Direito, a finalidade
de proteger bens jurídicos, a manutenção da ordem social, o combate à cri-
minalidade e a luta pela justiça, não pode permitir ou admitir qualquer ato
que se coaduna com a ilicitude, que favoreça o crime.
Aquele que estiver diante de uma situação cujo comportamento, embora
completamente normal e de acordo com o Direito, tem ciência ou expres-
sivo grau de suspeita, de que estará contribuindo a um crime, deve, dentro
do possível, afastar sua ação, melhor dizendo, recuar ou recusar, desde que
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 115
ABSTRACT: In our day-to-day life, certain human behaviors practiced, although clothed with normality,
contribute to crime. These are “neutral” actions, because even if they integrate the course of the crime,
they are not manifestly punishable. Because it has somehow a connection with crime, it is necessary to
establish the limits of criminal participation, delimiting when a punishable conduct is initiated and at which
point the causal link is interrupted and, from there, to consider which are or not criminal actions. For a
long time, the issue was based on the Principle of Insignificance, Social Suitability and the Prohibition
of Return. Currently, the subject has received the attention and diverse conceptions of the legal-penal
doctrine, being of great importance for the Criminal Law, after all, it is a study that concerns what the
Law values for itself.
Referências
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. v. 1.
BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
BUSATO, Paulo César. A evolução dos fundamentos da teoria do delito. 2012. Disponível em: <http://www.
gnmp.com.br/publicacao/156/a-evolucao-dos-fundamentos-da-teoria-do-delito>. Acesso em: 12 set. 2017.
______. Introdução à dogmática funcionalista do delito: em comemoração aos trinta anos de “política
criminal e sistema jurídico-penal” de Roxin. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, n. 32, v. 8,
p. 120-163, out./dez. 2000.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Doutrina
116
______. O sentido da cumplicidade: uma visão crítica das chamadas ações neutras como grupo de casos da
teoria da imputação objetiva. Revista Duc In Altum Caderno de Direito, v. 5, n. 8, jul./dez. 2013.
CALLEGARI, André Luís. Imputação objetiva: lavagem de dinheiro e outros temas do direito penal. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2004.
GRECO, Luís. Cumplicidade através das ações neutras: a imputação objetiva na participação. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004.
HASSEMER, Winfried. Persona, mundo y responsabilidad: bases para una teoría de la imputación en derecho
penal. Trad. Francisco Muñoz Conde e Maria del Mar Diaz Pita. Tirant lo Blanch Alternativa, 1999.
JAKOBS, Günther. A imputação objetiva no direito penal. Trad. André Luís Callegari. São Paulo: RT, 2000.
______. Fundamentos do direito penal. Trad. André Luís Callegari. São Paulo: RT, 2003.
JESCHECK, Hans-Heinrich. Tratado de derecho penal: parte general. Granada: Editorial Comares, 1993.
LOBATO, José Danilo Tavares. Teoria geral da participação criminal e ações neutras: uma questão única de
imputação objetiva. Curitiba: Juruá, 2010.
PONTE, Antonio Carlos da. Crimes eleitorais. São Paulo: Saraiva, 2008.
PRADO, Luiz Regis. A imputação objetiva no direito penal Brasileiro. RT Online. Ciência Penais, v. 3, p.
81, jul. 2005.
______. Curso de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo: RT, 2005. v. 1.
PRAZAK, Maurício Ávila. Imputação objetiva e sua aplicação no direito penal brasileiro. São Paulo: Juarez
de Oliveira, 2009.
RASSI, João Daniel. Imputação das ações neutras e o dever de solidariedade no direito penal brasileiro.
1. ed. São Paulo: LiberArs, 2014.
ROXIN, Claus. Derecho penal: parte general – fundamentos de la estructura de la teoría del delito. Trad.
Diego Manoel Luzón Pena, Miguel Dias, Garcia Conlledo e Javier de Vicente Remesal. Madrid: Editorial
Civistas, 1997. v. 1.
______. Estudos de direito penal. Trad. Luís Greco. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
______. Imputação objetiva. Belo Horizonte: Mandamento, 2002.
______. La teoría del delito: en la discusión actual. Trad. Manuel Abanto Vásquez. Lima: Grijley, 2007.
______. Política criminal e sistema jurídico-penal. Trad. Luís Greco. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
SCHORSCHER, Vivian Cristina. A criminalização da lavagem de dinheiro: críticas penais. (Tese de Doutorado
em Direito). Faculdade de Direito da USP, São Paulo: 2012.
STIVANELLO, Gilbert Uzêda. Teoria da imputação objetiva. Revista CEJ, n. 22, Brasília, jul./set. 2003.
TAVARES, Juarez. Direito penal da negligência. São Paulo: RT, 1985.
WELZEL, Hans. O novo sistema jurídico-penal: uma introdução à doutrina da ação finalista. São Paulo: RT,
2001.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do
Supremo Tribunal Federal em conhecer do agravo e negar-lhe provimento,
nos termos do voto da Relatora e por maioria de votos, vencido o Ministro
Marco Aurélio, em sessão virtual da Primeira Turma, de 20 a 26 de setembro
de 2019, na conformidade da ata do julgamento.
Brasília, 27 de setembro de 2019.
Ministra Rosa Weber – Relatora
RELATÓRIO
A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): Trata-se de agravo regi-
mental interposto contra decisão em que neguei seguimento a habeas corpus
impetrado contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça, que negou provi-
mento ao agravo regimental no AREsp 1.063.923/PB.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Jurisprudência
118
VOTO
A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): O presente agravo regi-
mental objetiva rever decisão em que neguei seguimento ao writ aos seguintes
fundamentos:
“Extraio do ato dito coator:
‘PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ES-
PECIAL. CRIME DE TELECOMUNICAÇÕES. TRANSMISSÃO DE
SINAL DE INTERNET VIA RÁDIO. SERVIÇO DE VALOR ADICIO-
NADO. TIPICIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLI-
CABILIDADE. DELITO FORMAL E ABSTRATO. INÚMEROS PRE-
CEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
1. É pacífico o entendimento no Superior Tribunal de Justiça de que a prática
de serviço de radiodifusão clandestina, mesmo que de baixa potência e sem a
obrigatoriedade de autorização por parte do órgão regulador, como na hipó-
tese de serviço de valor adicionado (SVA), constitui delito formal de perigo
abstrato, o que afasta o reconhecimento da atipicidade material da conduta
pela aplicação do princípio da insignificância. Precedentes de ambas as Tur-
mas da Terceira Seção.
2. Agravo regimental improvido.’
Na hipótese, não detecto manifesta ilegalidade ou teratologia do ato apontado
como coator.
Quanto à tese defensiva de inviabilidade de reexame fático-probatório em
sede de recurso especial (Súmula nº 7/STJ), nada colhe o writ. A mera re-
valoração jurídica dos elementos de prova utilizados na apreciação dos fatos
pelo magistrado de primeiro grau não implica reexame do acervo fático-pro-
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 119
VOTO
O Senhor Ministro Marco Aurélio – O habeas corpus é ação constitu-
cional voltada a preservar a liberdade de ir e vir do cidadão. O processo que
o veicule, devidamente aparelhado, deve ser submetido ao julgamento de
Colegiado. Descabe observar, quer o disposto no art. 21 do Regimento In-
terno, no que revela a possibilidade de o Relator negar seguimento a pedido
manifestamente improcedente, quer o art. 932 do Código de Processo Civil.
Ante o fato de atuar na sessão virtual, quando há o prejuízo da organicidade
do Direito, do devido processo legal, afastada a sustentação da tribuna, provejo
o agravo para que o habeas corpus tenha sequência.
EXTRATO DE ATA
Ag. Reg. no Habeas Corpus 145.308
Proced.: Paraíba
Relatora: Ministra Rosa Weber
Agte.: Fabio Pereira Fernandes
Adv.: Defensor Público-Geral Federal
Agdo.: Superior Tribunal de Justiça
Decisão: A Turma, por maioria, conheceu do agravo regimental e negou-
lhe provimento, nos termos do voto da Relatora, vencido o Ministro Marco
Aurélio. Primeira Turma, Sessão Virtual, de 20.09.2019 a 26.09.2019.
Composição: Ministros Luiz Fux (Presidente), Marco Aurélio, Rosa
Weber, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.
João Paulo Oliveira Barros – Secretário da Turma
Jurisprudência
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e
das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo
regimental. Os Srs. Ministros Reynaldo Soares da Fonseca, Ribeiro Dantas e
Joel Ilan Paciornik votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.
Brasília (DF), 24 de setembro de 2019 (Data do Julgamento).
Ministro Jorge Mussi – Relator
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro Jorge Mussi (Relator): Trata-se de agravo re-
gimental interposto por Carlos Eduardo da Silva Cardoso contra a decisão
desta relatoria de e-STJ, fls. 273-277 e 288-290, que deu parcial provimento
ao recurso especial da defesa para obstar a execução provisória da pena res-
tritiva de direitos.
O agravante alega que, para a configuração do crime previsto no art.
306 do Código de Trânsito Brasileiro, não basta a comprovação da ingestão
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 125
VOTO
O Exmo. Sr. Ministro Jorge Mussi (Relator): Depreende-se dos autos
que o réu foi denunciado como incurso nas sanções do art. 306 do Código de
Trânsito Brasileiro, uma vez que conduziu veículo em via pública com capaci-
dade psicomotora alterada em razão da influência de álcool, com concentração
superior a 0,3 mgll (três miligramas por litro) de ar alveolar – e-STJ, fls. 5-6.
Julgada procedente a ação penal, o réu foi condenado às penas de 6
meses de detenção, em regime inicial aberto, substituída por uma restritiva
de direitos, e de 10 dias-multa, além da suspensão da habilitação para dirigir
veículos pelo prazo de 2 (dois) meses – e-STJ, fls. 85-86.
A sentença foi mantida em apelação da defesa (e-STJ, fls. 177-194).
A defesa requereu, preliminarmente, a concessão de efeito suspensivo
ao recurso especial (e-STJ, fls. 207-231) para que, somente apôs o trânsito em
julgado da sentença condenatória, o réu sofra as sanções impostas.
Ponderou que foram afrontados os arts. 306 do Código de Trânsito
Brasileiro e 156, 283, 397 e 617 do Código de Processo Penal, argumentando
que não ficou comprovada a alteração da capacidade psicomotora do réu em
razão do uso de álcool ou de outra substância.
Ressaltou que a alteração da capacidade psicomotora não pode ser pre-
sumida a partir do teste do bafômetro. Assim, o réu deve ser absolvido, pois
o acórdão confronta-se com as provas dos autos.
Aduziu, ainda, que, para a configuração do delito, não basta somente a
comprovação da ingestão de bebida alcóolica. É preciso que fique comprovado
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Jurisprudência
126
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-
cadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça,
por unanimidade, dar provimento ao recurso ordinário nos termos do voto
do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Sebastião Reis Júnior,
Rogerio Schietti Cruz e Nefi Cordeiro votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 1º de outubro de 2019 (Data do Julgamento).
Ministro Antonio Saldanha Palheiro – Relator
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro Antonio Saldanha Palheiro (Relator):
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Jurisprudência
130
VOTO
O Exmo. Sr. Ministro Antonio Saldanha Palheiro (Relator):
A questão a ser dirimida neste recurso cinge-se a definir se durante o
prazo fixado para o cumprimento dos termos de acordo de transação penal
corre a prescrição ou se permanece suspensa.
No caso em exame, conforme consignado no relatório, após ter sido
homologado acordo de transação penal, que previa o pagamento à vítima de
60 prestações mensais, que totalizariam a quantia de R$ 150.000,00, houve
o seu descumprimento por parte do ora recorrente, o que ensejou o ofereci-
mento de denúncia em seu desfavor, dando-o como incurso no art. 303 c/c
o art. 302, parágrafo único, II e III, da Lei nº 9.503/97 (e-STJ, fls. 288/290).
Tendo em vista o transcurso de lapso temporal considerável, a defesa
requereu a declaração de extinção da punibilidade do recorrente em razão do
advento da prescrição da pretensão punitiva.
O Juiz condutor do feito assim como o Tribunal de Justiça do Estado do
Ceará rechaçaram a tese defensiva. Confiram-se, a propósito, os fundamentos
que foram declinados (e-STJ, fls. 377/381):
“Em análise perfunctória ao caso em tablado, tem-se que o paciente deixou
de cumprir transação penal em favor da vítima sob a alegativa de dificulda-
des financeiras. Ao ser intimado para cumprir a obrigação assumida, não foi
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Jurisprudência
132
Público, pois havia pago à vítima apenas 40 (quarenta) parcelas das 60 (ses-
senta) parcelas fixadas na transação penal.”
Não obstante os judiciosos fundamentos apresentados pelo Tribunal de
origem, tenho para mim que a pretensão punitiva foi alcançada pela prescrição.
Embora a transação penal implique o cumprimento de uma pena
restritiva de direitos ou multa pelo acusado, nos termos do art. 76 da Lei nº
9.099/95, não há que se falar em condenação, muito menos em período de
prova enquanto durar o cumprimento da medida imposta, razão pela qual não
se revela adequada a aplicação do art. 117, V, do Código Penal.
Ou seja, a interrupção do curso da prescrição prevista no referido
dispositivo legal deve ocorrer somente em relação às condenações impostas
após o transcurso do processo, e não para os casos de transação penal, que
justamente impede a sua instauração.
Vale destacar que o regramento do referido instituto despenalizador
prevê somente que a aceitação da proposta não gerará o efeito da reincidência,
bem como impedirá a utilização do benefício novamente em um prazo de
cinco anos (art. 76, § 4º, da Lei nº 9.099/95).
Além disso, de acordo com o disposto na Súmula Vinculante nº 35
do Supremo Tribunal Federal, descumprido o acordo, poderá o Ministério
Público oferecer a denúncia, momento em que se dará início à persecução
penal em juízo.
Portanto, não há previsão legal de que, celebrado o acordo, e enquan-
to não cumprida integralmente a avença, ficará suspenso o curso do prazo
prescricional.
Impende rememorar, nesse sentido, que, “em observância ao princípio
da legalidade, as causas suspensivas da prescrição demandam expressa previsão legal”
(AgRg no REsp 1.371.909/SC, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma,
j. 23.08.2018, DJe 03.09.2018).
Cabe destacar que a Lei nº 9.099/95, ao tratar da suspensão condicional
do processo, instituto diverso, previu, expressamente, no art. 89, § 6º, que
“não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão do processo”. Assim,
determinou, no caso específico do sursis processual, diferentemente da transa-
ção penal, que durante o seu cumprimento não correria o prazo prescricional.
Da mesma forma, semelhante previsão consta do art. 366 do Código
de Processo Penal, que, ao cuidar da suspensão do processo, impõe, conjun-
tamente, a suspensão do curso do prazo prescricional.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 135
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Sexta Turma, por maioria, dar parcial provimento
ao recurso ordinário, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Vencidos os
Srs. Ministros Nefi Cordeiro e Antonio Saldanha Palheiro. Votaram vencidos
os Srs. Ministros Nefi Cordeiro e Antonio Saldanha Palheiro.
Dr. Paulo Machado Guimarães, pela parte recorrente: Nelson Reko
de Oliveira.
Exmo. Sr. Dr. Luiz Augusto dos Santos Lima, Subprocurador-Geral
da República, pelo MPF.
Brasília, 1º de outubro de 2019.
Ministro Rogerio Schietti Cruz – Relator
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Jurisprudência
138
RELATÓRIO
O Senhor Ministro Rogerio Schietti Cruz:
Nelson Reko de Oliveira e outros, por seus defensores, interpuseram
recurso em habeas corpus contra acórdão proferido pelo Tribunal de origem,
nos autos do Habeas Corpus 5021879-33.2017.4.04.0000, em que foi mantido
o indeferimento dos pleitos de tradução dos autos para o idioma dos réus, concessão de
intérprete para os atos processuais e, ainda, realização de estudo antropológico.
Consoante narra a defesa, os pacientes deste writ, indígenas integrantes
do povo Kaigang, são acusados de duplo homicídio qualificado por fatos ocorridos
“enquanto faziam manifestação pacífica em reivindicação à terra ancestral”
(fl. 149).
Depreende-se dos autos que o processo está concluso para prolação de
decisão de pronúncia desde 17.09.2018 (fl. 456), motivo pelo qual pugnaram
pela suspensão do trâmite da ação penal, dada a necessidade de provimento das
solicitações acima referidas.
Asserem os insurgentes que “o violento processo de colonização do
território brasileiro sobre os povos indígenas ressoa até os dias de hoje também
sob este aspecto, qual seja, o abandono forçado da língua materna por povos inteiros
em razão da repressão e da injustiça generalizadas a que foram submetidos em todo esse
tempo” (fl. 155, grifei).
Para os recorrentes, a tradução dos autos e a disponibilização de intér-
prete aos atos processuais são “direito líquido e certo dos indígenas e de pedido
totalmente possível, que garantirá, para além do seu direito fundamental, o
acesso amplo a (sic) defesa de 19 indígenas da mesma comunidade de apenas 80 famí-
lias, pertencentes a um mesmo povo. Por sua vez, com o intérprete se assegurará
o direito das testemunhas indígenas de defesa e dos réus no interrogatório
expressarem-se em sua própria língua, com a tradução será garantida a compreensão e a
ampla defesa” (fls. 155-156, grifei).
Alegam também que a circunstância de serem capazes de compreender
a língua portuguesa e conseguirem se comunicar com a sociedade “não pode
motivar a decisão sobre a necessidade de tradução e intérprete nos atos pro-
cessuais, mesmo porque não se nega tal situação. (...) O fato de os recorrentes
se utilizarem do idioma nacional para a sobrevivência do dia a dia dentro das
condições que lhe foram e são colocadas, não faz presumir que o possuem como
idioma materno, principalmente ao considerar que a primeira língua é o Kaingang” (fl.
157, destaquei).
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 139
o Ministério Público Federal emitiu novo parecer no qual pugna pelo não
provimento o recurso.
VOTO
O Senhor Ministro Rogerio Schietti Cruz (Relator):
I – Contextualização
Consoante apontado nas informações prestadas pelo Juízo da 1ª Vara
Federal de Erechim – RS, “[o]s pacientes foram denunciados na Ação Penal
5004459-38.2016.4.04.7117, originada do IPL 5003026-67.2014.4.04.7117,
por duplo homicídio qualificado: art. 121, § 2º, incisos III (emprego de meio
cruel) e IV (meio que dificultou a defesa dos ofendidos), c/c o art. 29, caput
(concurso de agentes), ambos do Código Penal, em face das vítimas Alcemar
Batista de Souza e Anderson de Souza, por fato em tese praticado no dia
28.04.2014” (fl. 519).
Encerrada a instrução processual, os autos estavam conclusos para
prolação de decisão de pronúncia, quando os recorrentes impetraram habeas
corpus perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que assim o deslindou:
“HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. RÉUS INDÍGE-
NAS. TRADUÇÃO DA DENÚNCIA PARA O IDIOMA KAINGANG.
DESNECESSIDADE. PERÍCIA ANTROPOLÓGICA. NÃO REALIZA-
ÇÃO. AUSÊNCIA DE IMPEDIMENTO. ACESSO INTEGRAL AOS
AUTOS. PEDIDO JÁ DEFERIDO.
1. Constatado que os denunciados compreendem a língua portuguesa, bem
como se comunicam sem dificuldades, não há como presumir que não te-
nham compreendido o teor da denúncia, sendo desnecessária a tradução para
o idioma Kaingang.
2. As especificidades do processo judicial devem ser de conhecimento dos
procuradores das partes, não sendo indispensável que os acusados conhecem
a técnica jurídica, mas apenas os fatos que são imputados.
3. Desnecessidade de perícia antropológica, pois a ilicitude do homicídio é
reconhecida por qualquer comunidade indígena, não havendo dúvidas que
a conduta de matar alguém não faz parte dos costumes e tradições do povo
Kaingang.
4. Acesso integral aos autos já deferido pela autoridade impetrada.
5. Ordem de haheas corpus denegada.” (j. 06.06.2017 – 8ª Turma do TRF-4).
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 141
“(...) a decisão atacada pela via do habeas corpus (e agora recurso ordinário)
assegurou a reanálise acerca da necessidade ou não de intérprete quando da
instrução e realização dos interrogatórios, sendo que finda a instrução a defe-
sa nada requereu a respeito.
De fato, possivelmente nada requereu porque também constatou a defesa que a instru-
ção se desenvolveu sem qualquer particularidade digna de nota pelo fato de os réus
e várias testemunhas serem indígenas da etnia kaingang, mas que, todavia,
possuem pleno domínio da língua portuguesa, seja para compreensão do que
é dito/perguntado quanto para expressar-se, utilizando-a com desenvoltura
(...)” (fl. 521, destaquei)
Com efeito, já aduzira o julgador, nos autos da ação penal em curso
na origem, que, “ao contrário do que alega a defesa, os denunciados, embora
possam de fato ter o domínio da língua nativa Kaingang, ao que tudo indica
comunicam-se e entendem a língua portuguesa e, por conseguinte, conhecem a acusação
que pesa contra eles” (fl. 111, grifei).
O Magistrado de primeiro grau frisou também que, “por entenderem
plenamente o idioma nacional inserido no inquérito, utilizaram o direito de
permanecer em silêncio quando perguntados, na condição de investigados,
acerca dos fatos que redundaram no homicídio das vítimas, o que mais uma
vez evidencia o domínio do idioma português” (fl. 111).
Além disso, asseriu que “não há falar em prejuízo do ato citatório cuja
certidão do oficial de justiça deixa claro que os denunciados declararam (presume-
se que em português por ser improvável que o oficial de justiça tenha domínio da língua
Kaingang) que já haviam constituído advogados para acompanharem suas defesas” (fl.
111, destaquei).
Enfatizou, a propósito, a Corte de origem, por sua vez, ao manter o
decisum atacado, que “percebe-se dos elementos trazidos aos autos que os indígenas
possuem pleno entendimento dos fatos delituosos a eles imputados, não havendo a
necessidade de tradução da peça acusatória, até porque a defesa dos pacientes
está sendo realizada por procuradores constituídos pelos próprios acusados”
(fl. 115, grifei).
Tais assertivas, proferidas tanto pelo magistrado de primeiro grau
quanto pelo Tribunal que analisou o habeas corpus impetrado pela defesa dos
ora recorrentes, indicam que:
1º) em nenhum momento, durante a instrução, a defesa técnica,
constituída pelos acusados, requereu a tradução da denúncia ou de outros
documentos do processo;
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Jurisprudência
144
VI – Dispositivo
À vista do exposto, dou parcial provimento ao recurso, apenas para deter-
minar que, na hipótese eventual de serem os réus pronunciados, se realize
estudo antropológico antes da data designada para a sessão do Tribunal do Júri.
Casso a liminar deferida, de modo a restabelecer o regular trâmite da
Ação Penal 5004459-38.2016.404.7117.
VOTO-VENCIDO
O Exmo. Sr. Ministro Nefi Cordeiro (Presidente):
Srs. Ministros, com a vênia do Ministro Relator, vou divergir parcial-
mente, porque vejo, no laudo antropológico, o tratamento igual a todas as
demais provas do processo em que, como valorador da prova, o destinatário
direto é o juiz. Apenas na situação de ser claramente absurda a valoração, é
que temos interferido, especialmente na via do habeas corpus e do recurso em
habeas corpus. Tanto o juiz quanto o tribunal consideraram desnecessária a
perícia antropológica justamente pela aptidão que consideraram presente, nos
acusados, de não apenas se comunicar, mas de compreender integralmente
o regramento normativo.
Inclusive, aqui temos um caso de crime contra a vida. O tribunal chega
a dizer que é desnecessária a perícia antropológica, pois a ilicitude do homi-
cídio é reconhecida por qualquer comunidade indígena e nisso não haveria
divergência, inclusive nos costumes e tradições do povo Kaingang.
O que mais me faz divergir neste ponto é que, volto a insistir, temos
considerado que essa valoração feita pelo magistrado somente pode ser corrigi-
da ante flagrante situação de ser ela desarrazoada e isso não verifico na espécie.
Eu divirjo para negar integralmente o recurso de habeas corpus.
Jurisprudência
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda o Tribunal de Justiça do
Estado de Goiás, pela 2ª Turma Julgadora de sua Primeira Câmara Criminal,
à unanimidade, acolhendo em parte parecer da Procuradoria-Geral de Justiça,
conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, para redimensionar a pena
imposta, nos termos do voto do Relator e da Ata de Julgamentos.
Participaram do julgamento, votando com o Relator, o Desembargador
J. Paganucci Jr., que o presidiu, e o Desembargador Nicomedes Domingos
Borges, que completou a Turma na ausência justificada da Desembargadora
Avelirdes Almeida Pinheiro de Lemos. Presente, representando o órgão de cú-
pula do Ministério Público, o Procurador Aguinaldo Bezerra Lino Tocantins.
Goiânia, 8 de outubro de 2019.
Juiz Substituto Eudélcio Machado Fagundes – Relator
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Jurisprudência
150
RELATÓRIO
Pedro Figueiredo de Carvalho foi denunciado nas sanções do art. 147
do Código Penal e art. 65 da Lei de Contravenções Penais, em combinação
com a Lei nº 11.340, porque nos dias 3 e 9 de novembro de 2014, na Avenida
T-14, nº 1.529, Edifício Excelence, apartamento 2101, Torre Monet, Setor
Bueno, nesta Capital, prevalecendo-se de relação íntima de afeto, ameaçou
Michelly Costa e Souza e Ana Carolina Costa e Souza de causar-lhes mal
injusto e grave.
Sobreveio sentença, desclassificando a conduta de pertubação da tran-
quilidade para injúria, e declarou extinta punibilidade de Pedro pela ocorrên-
cia da decadência, nos termos do art. 107, IV, do Código Penal. Na mesma
ocasião, absolveu Pedro pelo crime de ameaça em relação a Michelly Costa
e Souza. E, ainda, o condenou pelo art. 147 do Código Penal, em face de
Ana Carolina, a 5 (cinco) meses de detenção, em regime aberto, e concedeu
a suspensão condicional da pena, pelo prazo de 2 (dois) anos e submissão à
limitação de final de semana na Casa do Albergado, entre outras condições
legais (fls. 243/249).
Inconformada, a defesa recorreu (fl. 265). Requer o reconhecimento
da detração penal, sob o argumento que Pedro cumpriu integralmente a pena
em razão do período da prisão preventiva e da monitoração eletrônica. Alter-
nativamente, pleiteia a absolvição por insuficiência probatória ou redução da
pena ao mínimo legal (fls. 283/289).
O Ministério Público manifestou-se pelo conhecimento e improvi-
mento do apelo (fls. 291/298).
A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo acolhimento e parcial
provimento do apelo, para o redimensionamento da reprimenda (fls. 303/307).
É o relatório.
VOTO
Presentes os requisitos, conheço.
De início, incabível o pleito de detração penal, porquanto não há dados
suficientes nos autos para apurar o período correto que o apelante permaneceu
preso provisoriamente, cabendo ao Juízo da Execução Penal a análise.
Outrossim, a monitoração eletrônica não representa efetiva custódia
do acautelado, restringe sua liberdade, mas não o priva dela totalmente, ser-
vindo como mera ferramenta de fiscalização e vigilância estatal do paradeiro
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 151
do agente, razão pela qual seu período de uso não deve ser consideração no
cálculo da detração penal.
Neste sentido, esta Corte se posicionou:
“AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. MONITORAMENTO ELETRÔ-
NICO. DETRAÇÃO PENAL. A monitoração eletrônica, enquanto medida
cautelar diversa da prisão, art. 319 do Código de Processo Penal, não repre-
senta efetiva custódia do acautelado, restringe sua liberdade, mas não o priva
dela totalmente, servindo como mera ferramenta de fiscalização e vigilância
estatal do paradeiro do indivíduo, a fim de coibir a recalcitrância delitiva,
razão pela qual seu período de uso não deve ser considerado no cálculo da de-
tração penal. Agravo em execução desprovido.” (TJGO, Agravo em Execução
Penal 149003-36.2018.8.09.0175, Rel. Dra. Lilia Monica de Castro Borges
Escher, 2ª Camara Criminal, j. 25.06.2019, DJe 2.785 12.07.2019)
Com relação à autoria e materialidade, resultam comprovadas pelo
boletim de ocorrência (fls. 06/08), requerimentos para concessão de medidas
protetivas (fls. 13 e 14) e prova oral (mídias fl. 215).
Nada obstante, o acusado diz não ter ameaçado de morte Ana Caroli-
na, em juízo, ela ratificou as declarações da fase administrativa (fls. 09/10) e
detalhou a conduta incriminada.
Relatou que viveu maritalmente com o acusado pelo período de dois
anos; que o relacionamento era instável, pelas crises de ciúmes dele; que tentou
manter a união em prol da família, pois possuem um filho em comum, mas
não foi possível; que pediu a separação e ele começou a ameaçá-la, porquan-
to não aceita o término; que o divórcio ocorreu em 31.12.2012; que usava
drogas junto com réu; que Pedro disse que lhe daria um tiro na cabeça e o
filho ficaria órfão de mãe e o pai preso; que Pedro é motorista da Secretaria de
Segurança Pública e afirma ser policial; que Pedro enviou várias mensagens
escritas e de áudio, com cunho ameaçador; que tem muito medo do acusado,
pois não sabe do que ele é capaz; que as ameaças desencadearam uma crise de
pânico, insônia e pesadelos; que fez o uso de medicamento controlado com
acompanhamento médico; que mudou de endereço no ano de 2015 para a
casa dos pais, por medida de segurança; que Pedro criou um perfil falso na
rede social, com nome Aroldo Costa, e mandava ameaças e postava fotos do
casal, com a legenda “Essa mulher é minha!”; que a ex-sogra busca o filho para
passar o dia com Pedro; que não tem mais contato com o réu; que o apelante
está fazendo alienação parental, mandando recados através da criança que
possui 4 anos de idade: “Que o papai vai matar o namoradinho da mamãe!”,
“Que a mamãe feia e gorda!”, “Que o vovô é bandido!”, “Que a mamãe e o
vovô colocaram o papai na cadeia”; que nos dias 3 e 9 de novembro de 2014,
requereu medidas protetivas; que Pedro efetuou disparos de arma de fogo
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Jurisprudência
152
na frente da casa onde mora; que atualmente tem mais medo do acusado,
pois ele não faz mais o uso da tornozeleira eletrônica; que a família toda está
emocionalmente abalada; que o réu já foi diagnosticado com a Síndrome de
Boderline (mídia fl. 215).
Confirmando, a informante Michelly Costa e Souza, irmã da vítima,
disse na delegacia que o apelante ameaçou de morte várias vezes Ana Carolina
(fls. 11/12):
“(...) que na data de 03.11.2014, aproximadamente 02:28 horas, Ana Caroli-
na lhe mandou uma mensagem com um áudio no qual o autor disse que ‘o
que era dela tava guardado, que ia encher a cara dela e do namorado dela de
tiro’ e a agrediu verbalmente chamando-a de ‘desgraçada’, tendo sido essa a
ultima vez que o autor a agrediu verbalmente e a ameaçou e em outro áudio
enviado por Ana Carolina, o autor disse que ‘achava que era só a filha da puta,
desgraçada, vagabunda, da sua irmã que falava isso, aquela desgraçadinha’, se
referindo a declarante e a ameaçou dizendo que ‘ela iria ter o que ela merece,
que a irmãzinha dela poderia ficar esperta porque teria o que ela merece’;
que após o ocorrido, ainda na data de 03.11.2014, aproximadamente 08:00
horas, telefonou para o autor para perguntar o motivo dele estar a ameaçando,
porém o mesmo não atendeu; que na data de 09.11.2014, aproximadamente
07:00 horas, Ana Carolina lhe disse que havia descoberto que o autor fez um
perfil falso em nome de Aroldo Costa, onde há diversas fotos dela, cujo as
legendas estão escritas que ela é a mulher dele; que Ana Carolina lhe contou
também que mandou uma mensagem para o autor perguntando para ele so-
bre o perfil falso, ao que o autor respondeu que estava com saudade dela, e
que não era para ele sumir dele novamente; que não tem testemunhas do fato
(...)”. (sic – fls. 11/12).
Corroborando, as cópias das mensagens enviadas por Pedro à Ana
Carolina, com caráter ameaçador, comprovam a prática do crime tipificado
no art. 147 do Código Penal:
“(...) Se prepara para o inferno! Eu te amo muito, mais muito mesmo, mas
estou cansado das merdas que você faz! Se prepara para o inferno! (...)” (sic
– fl. 14)
“(...) Isso não vai ficar assim! Não aceito meu filho em boteco com gente que
não presta! E esse cara que esta do seu lado vai morrer! (...)” (sic – fl. 15)
“(...) Eu te aviso uma coisa, com o ódio que eu estou, eu nunca estive tão
preparado pra explodir a cabeça do preto do seu namorado! (...)” (sic – fl. 12)
“(...) Eae sua idiota, você não fala do prostituto pra mim, mas o alaor fala
tudo. Vc vai pagar caro! Mentirosa drogada desgraçada. (...)” (sic – fl. 19)
“(...) Ta na rua com o seu prostituto ne sua filha da puta. Eu vou te achar sua desgra-
çada!” (sic – fl. 19)
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 153
“(...) Pois e. vi você com o seu amiguinho prostituto. Sorte sua e do seu ami-
guinho, que me seguraram e não deixaram eu descer do carro. Da próxima
não vai ter isso. E ai gostou do novo local do seu puteiro? Próxima vez não
vou ter dó (...)” (sic – fl. 20)
Noutra versão, Pedro nega a imputação que lhe é feita, dizendo que
nunca ameaçou e agrediu fisicamente Ana Carolina; que Ana Carolina tem
ciúmes e inventou todas as estórias; que Ana Carolina foi quem criou um perfil
falso no Facebook para maltratar as ex-namoradas; que durante o término,
encontrou com Ana Carolina algumas vezes (mídia fl. 215).
Destarte, a declaração da vítima é coerente e compatível com os outros
elementos nos autos, constituindo prova apta a ensejar a condenação pela
ameaça, ao tempo que a versão apresentada pelo apelante mostra-se isolada.
Passo à análise da reprimenda imposta.
A pena-base restou fixada em 3 (três) meses de detenção, ao considerar
corretamente desfavoráveis os motivos. Porém, vislumbro que o patamar
encontra-se exacerbado, razão pela qual reduzo a basilar em 1 (um) mês e 15
(quinze) dias de detenção.
Mantenho a agravante do art. 61, inciso II, alínea f, do Código Penal,
e majoro a sanção em 15 (quinze) dias, patamar que reputo suficiente à re-
provação do crime.
Ausentes outras causas modificadoras, fixo a definitiva em 2 (dois)
meses de detenção, em regime aberto.
Presentes os requisitos do art. 77 do CP, mantenho a suspensão condi-
cional da pena, pelo prazo de 2 (dois) anos, conforme estabelecido na sentença.
Ante o exposto, acolho parecer ministerial, conheço do recurso e dou-
lhe parcial provimento, para redimensionar a pena imposta.
É o meu voto.
Juiz Substituto Eudélcio Machado Fagundes – Relator
Jurisprudência
ACÓRDÃO
Vistos, etc., acorda, em Turma, a 8ª Câmara Criminal do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos,
em conhecer em parte do recurso e negar provimento.
Desembargadora Lílian Maciel – Relatora
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 155
VOTO
Trata-se de agravo em execução interposto por Brenda Chagas Macedo
em face da decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara de Execuções
Criminais da Comarca de Belo Horizonte, que negou o pedido de substitui-
ção do cumprimento de pena privativa de liberdade por prisão domiciliar ao
fundamento de que a recorrente não seria presa provisória estando, na verdade,
em cumprimento provisório de pena, de forma que a decisão proferida no
HC/STF 143.641 não é aplicável ao caso em comento.
Aduz que a decisão proferida pelo magistrado a quo, fl. 09, merece
reforma, vez que a recorrente é mãe de uma criança menor de 12 anos de
idade fazendo jus à prisão domiciliar, em razão da presumida dependência
dos filhos em relação aos pais e do dever de assistência, criação e educação
dos filhos menores.
Requer, ainda, que em caso de não concessão imediata do benefício de
prisão domiciliar, seja apreciada a possibilidade de concessão de indulto nos
termos do Decreto nº 14.454/2017.
Em sede de contrarrazões, fls. 10/14v, o Ministério Público pugna pelo
desprovimento do recurso, ao fundamento de que a decisão proferida no HC
143.641 não é aplicável ao caso sub examine, vez que restrita às mulheres
presas provisoriamente e a recorrente estaria em cumprimento provisório de
pena privativa de liberdade.
Aponta, também, a impossibilidade de concessão da prisão domiciliar
com fulcro no art. 117, III, da Lei de Execuções Penais, vez que não estão
preenchidos os requisitos necessários por estar cumprindo pena em regime
semiaberto, além de não ter sido demonstrada situação excepcional que jus-
tifique a concessão do benefício de forma antecipada.
Juízo de retratação negativo à fl. 15, oportunidade em que a decisão foi
mantida por seus próprios fundamentos.
Remetidos os autos à d. Procuradoria-Geral de Justiça, essa apresentou
parecer às fls. 20/26, pelo parcial provimento do recurso.
É o relatório.
Passo ao voto.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Em análise dos autos, verifica-se que a recorrente encontra-se em
cumprimento provisório de pena em regime semiaberto pelo crime previsto
no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Jurisprudência
156
XII – Cuidados com a mulher presa que se direcionam não só a ela, mas
igualmente aos seus filhos, os quais sofrem injustamente as consequências
da prisão, em flagrante contrariedade ao art. 227 da Constituição, cujo teor
determina que se dê prioridade absoluta à concretização dos direitos destes.
XIII – Quadro descrito nos autos que exige o estrito cumprimento do Estatu-
to da Primeira Infância, em especial da nova redação por ele conferida ao art.
318, IV e V, do Código de Processo Penal.
XIV – Acolhimento do writ que se impõe de modo a superar tanto a arbitra-
riedade judicial quanto a sistemática exclusão de direitos de grupos hipossu-
ficientes, típica de sistemas jurídicos que não dispõem de soluções coletivas
para problemas estruturais.
XV – Ordem concedida para determinar a substituição da prisão preventiva
pela domiciliar – sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alter-
nativas previstas no art. 319 do CPP – de todas as mulheres presas, gestantes,
puérperas ou mães de crianças e deficientes, nos termos do art. 2º do ECA
e da Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiências (Decreto Le-
gislativo nº 186/08 e Lei nº 13.146/2015), relacionadas neste processo pelo
DEPEN e outras autoridades estaduais, enquanto perdurar tal condição, ex-
cetuados os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave
ameaça, contra seus descendentes.
XVI – Extensão da ordem de ofício a todas as demais mulheres presas, gestan-
tes, puérperas ou mães de crianças e de pessoas com deficiência, bem assim às
adolescentes sujeitas a medidas socioeducativas em idêntica situação no terri-
tório nacional, observadas as restrições acima.” (STF, 2ª Turma, HC 143.641/
SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 20.02.2018)
O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de inúmeras
mulheres grávidas e mães de crianças presas preventivamente em situação de-
gradante, privadas de cuidados básicos necessários à sua condição. Além disso,
a Corte Suprema afirmou haver no Poder Judiciário brasileiro uma “cultura
do encarceramento”, mediante a imposição exagerada de prisões provisórias
a mulheres pobres e vulneráveis, em virtude de excessos na interpretação e
aplicação da lei penal.
Anteriormente, o STF já havia reconhecido no julgamento da ADPF
347 MC/DF que o nosso sistema prisional encontra-se no denominado estado
de coisas inconstitucional, não tendo condições de garantir cuidados mínimos
em relação à maternidade e aos filhos de custodiadas, que acabam por sofrer
injustamente as consequências do encarceramento.
Ademais, diversos tratados e documentos internacionais preveem a
adoção de medidas alternativas à prisão, especialmente em casos em que ainda
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 159
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos Infringentes e de
Nulidade de nº 0025770-55.2017.8.19.0014 em que é embargante Weberson
Rodrigues de Almeida e embargado o Ministério Público.
Acordam os Desembargadores da Quinta Câmara Criminal do Tribunal
de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos, em conhecer
e dar provimento aos embargos infringentes e de nulidade para fazer prevalecer
o voto vencido, reconhecendo a tentativa e readequando a resposta penal pela
prática do crime do art. 155, caput c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, aos
patamares de 7 (sete) meses de reclusão, em regime semiaberto, e 5 (cinco) dias-multa,
no valor unitário mínimo, declarando extinta a pena privativa de liberdade
por seu integral cumprimento, com expedição de alvará de soltura e ofício à
VEP, nos termos do voto do Desembargador Relator.
Sessão de Julgamento, 1º de agosto de 2019.
Rio de Janeiro, 16 de outubro de 2019.
Desembargador Paulo Baldez – Relator
RELATÓRIO
Trata-se de Embargos Infringentes e de Nulidade em que se pretende
ver reconhecida a prevalência de voto vencido da lavra do eminente Desem-
bargador Paulo de Tarso Neves, proferido em julgamento realizado na egrégia
Segunda Câmara Criminal deste Tribunal, nos autos das apelações interpostas
por Weberson Rodrigues de Almeida contra a sentença de fls. 81/85 (e-doc.
000095), que julgou procedente o pedido formulado na denúncia para con-
denar o denunciado por infração ao art. 155, caput, do Código Penal, às penas
de 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, em regime semiaberto, e ao pagamento de
15 (quinze) dias-multa, à razão unitária mínima legal, mantida a prisão do réu.
O v. acórdão embargado de fls. 169/179 (e-doc. 000169), da lavra da
eminente Desembargadora Katia Maria Amaral, Relatora, deu parcial pro-
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 167
VOTO
Cinge-se a divergência ao reconhecimento do crime de furto simples em
sua forma consumada ou tentada, bem como ao reconhecimento da agravante
da reincidência específica, com aplicação na segunda fase da dosimetria da
fração de 1/5 (um quinto) ou reconhecimento da reincidência simples, com
aplicação da fração de 1/6 (um sexto).
Do exame dos autos, verifica-se que assiste razão à Defesa, merecendo
prevalecer o voto vencido.
No que tange ao pleito de reconhecimento da reincidência simples e
não específica, com a consequente redução da fração de aumento de 1/5 (um
quinto) para 1/6 (sexto) em razão da referida agravante, observa-se que esta se
configurou em razão da anotação de nº 2 da FAC de fls. 66/69v (e-doc. 000081)
e da certidão de fl. 70 (e-doc. 000089), referente à condenação transitada em
julgado pelo crime de roubo.
Todavia, apesar de correto o reconhecimento da reincidência, esta não
se revela específica, como bem pontuado no voto vencido, já que o crime
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Jurisprudência
168
para decretar-se a absolvição dos apelantes. 5. Recursos conhecidos e providos. (TJAP; APL
0006387-11.2016.8.03.0002; C.Un.; Rel. Des. Eduardo Contreras; DJEAP 24/09/2019; p. 61)
previsto no art. 50-A somente foi praticado com o intuito de proporcionar o sustento pessoal e
de sua família, amoldando-se perfeitamente ao que estabelece o § 1º deste mesmo dispositivo
o qual dispõe que “não é crime a conduta praticada quando necessária à subsistência imediata
pessoal do agente ou de sua família”. 5. Apelação a que se nega provimento. (TRF 1ª R.; ACR
0004291-84.2015.4.01.3902; PA; 4ª T.; Rel. Des. Fed. Néviton Guedes; DJF1 23/10/2019)
preceito secundário do tipo penal do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, deve a pena ser calcu-
lada utilizando os parâmetros do preceito secundário do art. 12 da Lei nº 6.368/76, conforme
determinado pelo STJ. Pena redimensionada, em novo julgamento do recurso de apelação
criminal. (TJMG; APCR 4229652-82.2007.8.13.0145; 4ª C.Crim.; Rel. Des. Júlio Cezar Gut-
tierrez; DJEMG 23/10/2019)
direitos, esta Corte castrense sedimentou o entendimento de sua inaplicabilidade nesta espe-
cializada, em razão de sua autonomia por incompatibilidade com a vida na caserna. Recurso
provido. Decisão. Provimento do apelo de Delmar Leonir Huppes (civil). Decisão unânime.
Provimento do apelo de Dimas Seba de Lima, Jorge Luiz de Moraes Henrique e Roger Viera
da Silva (militares). Decisão por maioria. (STM; APL 7000485-58.2018.7.00.0000; Relª Minª
Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha; DJSTM 17/10/2019; p. 8)
das qualificadoras reconhecidas pelo Conselho de Sentença, deixando a pena em seu patamar
mínimo. 4. Recurso não provido. (TJAP; RSE 0008927-98.2017.8.03.0001; C.Un.; Rel. Des.
Carmo Antônio; DJEAP 21/10/2019; p. 32)
parágrafo único do art. 56 da Lei nº 6.001/73 (Estatuto do Índio) é limitada aos indígenas em
fase de aculturação. Evidenciado, nos autos, que o apelante está integrado à sociedade, não há
falar na concessão do regime especial de semiliberdade. 6. Encerrada a jurisdição criminal de
segundo grau, deve ter início a execução da pena imposta ao réu, independentemente da eventual
interposição de recurso especial ou extraordinário. 7. Apelação desprovida. (TRF 4ª R.; ACR
5002805-40.2016.4.04.7012; PR; 7ª T.; Rel. Des. Fed. Luiz Carlos Canalli; DEJF 23/10/2019)
Igualmente, objetivando privar as vítimas de sua liberdade o apelante, para tanto, inseriu em
documento público (boletim de ocorrência), informação falsa, imputando a uma das vítimas
um crime que o mesmo não havia praticado. Recurso desprovido. (TJMT; APL 55966/2018;
3ª C.Crim.; Rel. Des. Juvenal Pereira da Silva; DJMT 23/10/2019; p. 155)
do c. STJ e desta egrégia Câmara Criminal, acerca da possibilidade da remição por leitura e
respectiva resenha. Interpretação extensiva do art. 126 da LEP. Desse modo, passei a adotar
o entendimento de que tal medida contribui no processo de reinserção social do apenado, já
que agrega valores ético-morais à sua formação. Decisão reformada. Recurso provido. (TJSP;
AG-ExPen 7003053-15.2019.8.26.0482; Ac. 12968917; 8ª C.D.Crim.; Rel. Des. Sérgio Ribas;
DJESP 18/10/2019; p. 2.542)
do crime desfavoráveis. 4. Inexistindo qualquer motivo para não seguir o critério de aumento
da pena-base em 1/8 (um oitavo) por cada circunstância judicial negativada, incidente sobre o
intervalo entre as penas máxima e mínima, seria razoável a fixação da pena-base acima dos 9
(nove) anos de reclusão estabelecidos pelo juízo de primeiro grau; porém, aquela foi mantida
por aplicação do princípio da non reformatio in pejus. 5. Mostra-se prescindível o exame de corpo
de delito para o arbitramento da fração pela tentativa, sendo plenamente possível demonstrar
por qualquer meio de prova admitido o iter criminis percorrido e a proximidade da consumação,
os quais devem ser utilizados como critério para aplicação da causa de diminuição do art. 14,
inciso II, do Código Penal. 6. Recurso conhecido e não provido. Decisão unânime. (TJAL;
APL 0025621-48.2012.8.02.0001; C.Crim.; Rel. Des. Washington Luiz Damasceno Freitas; DJAL
14/10/2019; p. 70)
Destaques do Volume nº 91
– Júri: Prisão e Vedação de Apelação para a Acusação – a Decisão do STF
por Lenio Luiz Streck, Pós-Doutor e Professor
– A Releitura do Princípio In Dubio Pro Societate no Rito Especial do Júri
por Rafael Estrela Nóbrega, Juiz e Especialista
– Ensaio sobre uma Segurança Jurídica Metamórfica
por Rogério Filippetto, Mestre e Doutor
– O Papel Transformativo das Corporações no Processo Penal: Ideias sobre Compliance e Vitimização
Corporativa
por Eduardo Saad-Diniz, Professor e Doutor
– O Combate à Pornografia de Vingança e a Tutela Penal da Imagem no Brasil
por Leonardo Estevam de Assis Zanini, Mestre e Doutor, e Silvio Luiz Maciel, Professor e Mestre
– Metacognição: Ofensa à Imparcialidade do Juiz Criminal na Fase de Investigação
por Luiz Fernando Kazmierczak, Mestre e Doutor, e Gustavo Carvalho Kichileski, Advogado e
Mestrando
Destaques do Volume nº 90
– Do Prazo Prescricional das Sanções Penais Previstas para as Pessoas Jurídicas em Crimes Ambientais
por Oswaldo Henrique Duek Marques, Professor e Doutor, e Paulo Henrique Aranda Fuller,
Professor e Mestre
– O Interrogatório do Réu no Projeto de Código de Processo Penal
por Sergio Demoro Hamilton, ex-Professor e ex-Procurador de Justiça
– O Controle de Constitucionalidade das Leis Penais e o Princípio da Proporcionalidade
por Gilmar Ferreira Mendes, Ministro do STF e Doutor
– As Criptomoedas e a Lavagem de Dinheiro
por Ronaldo Rodrigues de Oliveira Bortoletto, Advogado e Especialista, e Cinthia Obladen de
Almendra Freitas, Professora e Doutora
– Política Regulatória, Enforcement e Compliance: Análise dos Lineamientos da Oficina Anticorrupção da
Procuradoria Argentina
por Eduardo Saad-Diniz, Professor e Doutor
– Decisão Judicial e Limites Interpretativos: Reflexões Jurídico-Filosóficas Acerca da Interceptação
Telefônica no Caso Lula e Dilma Rousseff
por Felinto Alves Martins Filho, Advogado e Especialista, e Eduardo Rocha Dias, Mestre e Doutor
– A Relevância da Cooperação Internacional para o Aprofundamento do Combate à Corrupção no
Brasil
por Carla Abrantkoski Rister, Mestre e Doutora
– Entre Expansão ou Delimitação do Critério Biológico da Inimputabilidade Penal do Art. 26 do CP
por Rodrigo Silva Barreto, Advogado e Mestre
D
C
DA LOCALIZAÇÃO DOGMÁTICA
CARLA CORDEIRO VERLY E JOÃO DA ATIVIDADE DE COMPLIANCE
MAURÍCIO ADEODATO NO AMBIENTE CORPORATIVO
- Artigo: “Análise Crítica de Laudos Utilizados SOB O PONTO DE VISTA DA
como Argumentos Retóricos Estratégicos: o RESPONSABILIZAÇÃO CRIMINAL
Ideal de Neutralidade na Função das Perícias DA PESSOA COLETIVA
no Âmbito Criminal”..................................... 17 - Artigo de Flavio Rodrigues Calil Daher e
CARTEIRA NACIONAL DE Roberta Cordeiro de Melo Magalhães.......... 5
HABILITAÇÃO DANO E DESACATO
- Suspensão imposta em virtude de infração - O dolo do crime de dano consiste na vontade
administrativa. Absolvição mantida. Somente de praticar uma das condutas previstas no
a suspensão da habilitação imposta por con- núcleo do tipo penal insculpido no art. 163
denação penal pode ser objeto da violação do CP, sendo desnecessária a presença do
prevista no tipo do art. 307 do CTB, não dolo específico de causar prejuízo, bastando,
estando ali abrangida a hipótese de descum- tão somente, o dolo genérico da conduta
primento de decisão administrativa imposta perpetrada pelo agente para sua configura-
em virtude da prática de infração de trânsito. ção. Se o acusado, livre e conscientemente,
TJMG (Em. 92/64)........................................ 188 dirige palavras ofensivas a agente público
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 92 – Out-Nov/2019 – Índice Alfabético
194
específico. Serviços efetivamente prestados. período de uso não deve ser considerado no
Ausência de prejuízo ao erário. TJMT (Em. cálculo da detração penal............................... 149
92/3)................................................................ 171
- Crime do art. 90 da Lei 8.666/93. Fraude N
ao caráter competitivo do procedimento
licitatório. Crime do art. 288 do CP. Pre- NULIDADE
feito e membros da comissão de licitação. - Júri. Homicídio qualificado. Motivo torpe e
Superfaturamento. Máfia dos Sanguessugas. pelo emprego de recurso que dificultou ou
Insuficiência de provas quanto à prática do impossibilitou a defesa da vítima. Art. 121, §
injusto penal. Absolvição com fundamento 2º, I e IV, do CP. Alegação de decisão contrá-
no art. 386, VII, do CPP. TRF 1ª R. (Em. ria às provas dos autos. Suposta ausência de
92/14).............................................................. 174 provas suficientes de autoria. Acolhimento.
Condenação amparada, exclusivamente, em
LIVRAMENTO CONDICIONAL
testemunhos indiretos. Inexistência de outras
- Cometimento de nova infração. Declaração provas de autoria delitiva. Impossibilidade.
de falta grave. Impossibilidade. Ausência de TJAL (Em. 92/32)........................................... 180
previsão legal. No cumprimento de livra-
mento condicional a prática de nova infração
conduzirá, conforme o caso, à suspensão do
O
benefício e, havendo condenação, será decre- O ATIVISMO DO SUPREMO
tada sua revogação. TJMG (Em. 92/39)........ 182 TRIBUNAL FEDERAL E O
- Prática de conduta tipificada como crime do- SURGIMENTO DA NORMA
loso. Suspensão do benefício e configuração SUPRALEGAL
de falta grave. Possibilidade. O livramento - Artigo de Silmar Fernandes e José Renato
condicional não constitui causa de extinção Nalini.............................................................. 73
da pena, de modo que, mesmo agraciado pelo
benefício, o condenado não pode ignorar as OSWALDO HENRIQUE DUEK
regras atinentes à execução da reprimenda, MARQUES E PAULO HENRIQUE
que não se extinguiu. TJMG (Em. 92/40).... 182 ARANDA FULLER
- Artigo: “Do Concurso de Agentes no Crime
M Previsto no Art. 89, Parágrafo Único, da Lei
nº 8.666/93”.................................................... 59
MACONHA
- Cannabis sativa. Uso para tratamento tera- P
pêutico/medicinal individual. Salvo-conduto
expedido. TRF 3ª R. (Em. 92/6).................... 172 PENA
S T
SEGREDO DE JUSTIÇA TELECOMUNICAÇÃO
- Mandado de segurança. Almejada decretação - Acórdão do STF – Exploração clandestina.
de segredo de justiça em face da instauração Art. 183 da Lei 9.472/97. Serviço de internet.
do incidente previsto no art. 149 do CPP. Crime formal, e como tal, prescinde de com-
Admissibilidade. Proteção à imagem e à provação de prejuízo para sua consumação.. 117
intimidade, nos termos do art. 189, III, do
TÓXICOS
CPC e art. 5º, LX, da CF. Pretendida con-
denação da autoridade coatora nas custas e - Colaboração como informante para o tráfico.
honorários advocatícios. Impossibilidade Delito previsto no art. 37 da Lei 11.343/06.
jurídica do pedido. Encargos que devem ser Absolvição. Possibilidade. Ausência das ele-
impostos à parte vencida em processo, não mentares do tipo penal. TJMG (Em. 92/7)... 172
sendo aplicáveis ao Juiz que oficia no feito. - Maconha. Cannabis sativa. Uso para trata-
TJSP (Em. 92/41)........................................... 182 mento terapêutico/medicinal individual.
Salvo-conduto expedido. TRF 3ª R. (Em.
SENADOR DA REPÚBLICA 92/6)................................................................ 172
- Queixa-crime. Calúnia. Difamação. De- - Tráfico. Pena. Regime inicial fechado. Pedido
clarações prestadas nas dependências do de fixação de regime aberto. Ré primária.
congresso nacional. Imunidade material Circunstâncias judiciais favoráveis e funda-
absoluta. Reconhecimento da inviolabilidade mentação inadequada (gravidade in abstrato do
constitucional. Atipicidade da conduta pela delito). Manutenção do regime semiaberto
configuração de excludente de ilicitude. STF em sede de agravo regimental. STF (Em.
(Em. 92/50)..................................................... 185 92/61).............................................................. 188
contagem para progressão de regime. Fenô- punível. Não há que se falar que a conduta é
meno da interrupção que também não pode socialmente adequada. Pena e regime fixados.
ser aplicado a benefícios como o livramento TJSP (Em. 92/66)........................................... 189
condicional, indulto e comutação de pena,
por absoluta falta de amparo legal. TJSP (Em. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
92/4)................................................................ 171 - Acórdão do TJGO – Ameaça. Prisão preven-
- Continuidade delitiva. Motivação per rela- tiva. Detração penal. Monitoração eletrônica.
tionem. Possibilidade. Ausência de violação Condenação mantida. Pena. Redimensiona-
ao art. 93, IX, da CF. Análise da legislação mento. Suspensão condicional. Manuten-
infraconstitucional e do conjunto fático- ção................................................................... 149
probatório dos autos. Súmula 279/STF. STF - Medida cautelar inominada. Antecipação de
(Em. 92/21)..................................................... 177 tutela requerida pelo MP em sede de RSE,
- Sentenciado condenado a duas penas de visando a decretação de prisão preventiva em
reclusão em regime semiaberto. Fixação de face de agente acusado da prática de crimes
regime fechado para cumprimento. Cabi- envolvendo violência doméstica (art. 129, §
mento. Sanções corporais que, após unifi- 9º, art. 147 e art. 148, § 1º, I, todos do CP).
cação, somam mais de 8 anos de reclusão, Delitos perpetrados pelo réu contra sua
mesmo levando em consideração a detração. esposa. Preservação da integridade física da
Hipótese do art. 111, caput, da LEP. Inexis- ofendida (art. 12-C, § 2º, da Lei 11.340/06).
tência de ilegalidade. TJSP (Em. 92/63)........ 188 Antecipação da tutela recursal que se justifica.
Medida cautelar provida. TJSP (Em. 92/42). 183
V - Reclamação. Medidas protetivas de urgência
aplicadas. Alegação de ser a sentença pro-
VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL
ferida embasada apenas em declarações da
- A tolerância popular à contrafação de CDs vítima. Inocorrência. Relevância da palavra da
e DVDs não imuniza o agente contra as ofendida, corroborada por outros elementos
consequências penais da conduta, não sendo idôneos carreados aos autos, legitimam a
caso de incidência do princípio da adequação aplicação de tais medidas. Permanecendo a
social. TJGO (Em. 92/65).............................. 189 situação de risco para a vítima, continuam
- Materialidade e autoria devidamente com- a vigorar as medidas protetivas de urgência
provadas. Art. 184, § 2º, do CP. Fato típico e aplicadas. TJBA (Em. 92/67).......................... 189
Edital de Submissão de Artigos