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Roteiro Oficial
Roteiro Oficial
Peça teatral
O Quarto de Despejo
CENA 1
(A luz desliga e todos voltam a bater. A luz foca novamente em Vera, João
Carlos e João José e todos param de bater.)
VERA - Só em 2023, mais de 106 mil crianças foram abandonadas pelos pais
ainda no útero de suas mães.
JOÃO CARLOS - Já foram registrados que o Brasil tem mais de 110 mil
certidões de nascimento sem o nome do pai.
(A luz desliga e todos os figurantes saem de cena batendo nas suas vasilhas.
A música começa a tocar e a luz liga novamente)
*Dança*
CENA 2
DONA CECÍLIA - Eu não já falei pra você não ficar roubando os outros
garoto! Se continuar assim, vão começar a te comparar com os filhos da
Carolina, e aí vou ter que te colocar no Juizado! Você quer isso?
CAROLINA - Nossa vida na favela é assim: Temos que nos preocupar a todo
momento, já que não sabemos o que poderá acontecer nesse lugar. Nossos
filhos têm a possibilidade de virar ladrões por causa da fome, e nossas
crianças não conseguem ter muito futuro. É quase impossível sair.
(No meio do caminho, Carolina vai achando papel e ferros, e vai colocando
dentro do saco. Até que chega em Seu Manoel para trocar por dinheiro)
SEU MANOEL - Bom dia, Carolina. Veio cedo hoje. E como está bonita! Tem
certeza que não quer se casar comigo ? (Fala já entregando o dinheiro)
CAROLINA - Bom dia, Seu Manoel. E, sim, tenho absoluta certeza que não
quero me casar contigo. Obrigada e bom trabalho (Fala recebendo o
dinheiro e já indo embora)
MODESTO - COMIDAA!!
VERA - Mamãeeee, olha o que me deram( chega correndo com 2 reais nas
mãos e mostra pra mãe )
CENA 3
D. ROSA - Roubaram o Doutor José ontem, quando ele veio atender uma
das filhas da Dona Maria. A coitada quase morreu de desnutrição. Se não
fosse o D. José, não sei o que seria dela. Ouvi dizer que o filho mais velho de
Carolina estava envolvido no roubo.
D. CECÍLIA - Eu sabia que aquele pestinha não é flor que se cheire. Tinha
que ser filho da Carolina, viu. Que mulher estranha, vive escrevendo, não
conversa com ninguém e ainda por cima não tem marido!
CAROLINA - Toda semana é isso, toda manhã é isso, meu deus! Meu filho
estava no meu barracão na hora do roubo; estávamos jantando. Vocês
deveriam se preocupar mais com os seus filhos do que com os meus!
CENA 4
( Vera vai pegar a cesta e quando foi pedir pro político, ficou “ comovido”,
dando 45 reais para Vera. Enquanto isso, os figurantes vão indo embora
conforme pegam as cestas )
CAROLINA - Obrigada, filha. Vamos logo com esse dinheiro e a cesta. Não
preciso catar mais papel por hoje. Temos comida pra passar o dia
POLÍTICO - Se eu não for eleito depois disso, não sei mais o que fazer! ( vai
“limpando” sua roupa enquanto fala ) Gastei uma nota nessas cestas e ainda
dei 45 reais pra uma criança morta de fome. Meu dinheiro vai todo nessa
campanha ?! Tenho que aguentar visitar esse lugar fedido e imundo até
quando ?
POLÍTICO - O QUÊ ?! Mais três vezes nesse lugar? Eca! Não sei se vou
aguentar. Vamos logo sair daqui. ( fala com nojo )
( saem de cena )
CENA 5
D. CECÍLIA - Isso é tudo culpa sua! Se não tivesse gastado todo nosso
dinheiro com bebida, invés de comprar comida para os nossos filhos, ele não
teria morrido de desnutrição. O NOSSO FILHO MORREU DE FOME! ( ela está
falando isso enquanto olha para o marido)
MARIDO - Nós não vamos discutir agora! A culpa não foi minha!
MARIDO - Vamos tirar ele daqui; fazer com que ele tenha algo digno na
vida: O seu enterro.
( eles saem de cena com seu filho nos braços e a mãe ainda chorando )
CENA 6
J.C - Nossa!
CAROLINA - O quê?
PAI DE VERA - Oi, crianças! Eu vim trazer a pensão de Vera. Não consegui
colocar o dinheiro na justiça pra você pegar ontem.
PAI DE VERA - Oi, filha. Aqui tem dinheiro pra você comprar doce. Tem pra
você e seus irmãos.
J.C, J.J, VERA - Obrigado(a)!
PAI DE VERA - Se você diz… Bem, podemos conversar sobre o seu diário ?
PAI DE VERA - Eu só queria ter certeza que você não colocou meu nome
nele, sabe ? Como a gente combinou?
PAI DE VERA - Carolina, não começa! A gente combinou sim sobre você não
colocar o meu nome em seus diários. Em troca disso eu pagava a pensão de
Vera.
CAROLINA - Pagar a pensão dela não é mais que sua obrigação! Eu não fiz
ela sozinha! Você só está pagando isso porque eu te coloquei na justiça, não
é por causa de combinado nenhum!
PAI DE VERA - Eu não vim aqui pra discutir, você vai tirar meu nome
daquele diário e acabou!
PAI DE VERA - Você vai tirar o meu nome na porcaria do seu diário ou irá
acontecer algo pior que isso. Pode ter certeza!
CENA 7
LIAM - Ótimo! Eu posso levar o seu diário? Seria ótimo ter uma visão de
quem mora aqui. Se a coluna fizer sucesso, a senhora receberá uma
recompensa.
CAROLINA - Claro ( carolina pega seus outros diários ), sempre esperei por
esse momento. Dia após dia, esperando que as verdades da nossa favela
fossem reveladas.
CAROLINA - Até! ( acena feliz e sai correndo pro outro lado do palco que o
jornalista vai )
CENA 8
CAROLINA - Ai, meu Deus, ai, meu Deus, ai, meu Deus! ( Ela dá pulinhos de
alegria e abre a revista, começando a ler o título da coluna )
SEU MANOEL - Ah, parabéns, Carolina, mas você já recebeu o dinheiro por
isso?
CAROLINA - Bem, ainda não, acabei de receber a notícia que a revista saiu.
Mas tenho certeza que irei receber em breve!
SEU MANOEL - Não tenho tanta certeza assim. ( entrega a revista e vai
embora )
CAROLINA - SIM!
VERA- Ebaaaaa!
CAROLINA - Não tem problema, vocês faltam hoje. Agora, vamos, quero
mostrar pra todo mundo a revista!
CENA 9
SILVA - Fiquei sabendo que uma jornalista passou por aqui, querendo
informações sobre a favela. Aí, por pura coincidência, ele a encontrou
escrevendo.
MARIA DOS ANJOS - Tenho certeza que ela dormiu com ele. Aquela ali não
tem valor algum. Vive dormindo com todo mundo!
TODAS - NUNCA!!
SILVA - Espera um pouco, se ela dorme com o Seu Manuel, por que não
aceita se casar com ele? O coitado vive rastejando atrás dela.
MARIA DOS ANJOS - Vocês sabem que ela conversa sozinha, né? Um dia
desses eu a ouvi falando sobre isso. Segundo ela, não irá se casar de novo
porque "já atingiu a maturidade” ( voz zombadeira )
D. ROSA - Quer saber? Por que a gente tá dando atenção para aquela
ridícula? E daí que ela colocou nossos nomes naquele diário? Eu não ligo pra
isso, e vocês?
SILVA - Você tem razão. Ninguém liga pra ela! Tenho certeza que vai ser um
fracasso total, e eu não estou nem aí! ( começa a rasgar o jornal )
( saem do palco )
CENA 10
( A luz branca liga no canto do palco, onde está a mesa da Carolina. Ela está
com um microfone e começa a escrever )
CAROLINA - A vida negra na favela é uma luta diária por dignidade, justiça
e esperança. É uma história de resistência, criatividade e solidariedade. É
uma história que merece ser contada, valorizada e inspirada. A vida negra
na favela é uma lição de coragem, esperança e fé. É uma prova de que nada
é impossível, de que tudo pode mudar e de que o futuro é nosso. A favela é
um lugar de resistência e cultura negra vibrante. É a luta diária contra as
adversidades, é a busca por justiça.
( no tempo em que Carolina vai falando, entram Duda, Maju e Sales no palco
em posição )
( Após a fala de Carolina, a luz branca desliga e Ayana vai pro centro da
arrumação e a luz novamente liga nas meninas )
FIM!!