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COLÉGIO SALESIANO DOM BOSCO

Peça teatral

O Quarto de Despejo

( Livre adaptação de Maria Eduarda, Gustavo e Arthur Vargas )

Cenário: Fundo digital no canva, caixas papelão com pixação

CENA 1

(Abrem-se as cortinas com as luzes desligadas, todos os personagens estão


com panelas nas mãos ou algo que faça barulho e bate neles repetidamente.
A luz branca liga em Carolina e os barulhos param)

CAROLINA - Existem mais de 21 milhões de pessoas em situação de


insegurança alimentar no Brasil

(A luz desliga e todos voltam a fazer barulho. A luz foca novamente na


vizinha 2, e todos param de bater. )

D. CECÍLIA - São mais de 21 milhões de mulheres que são vítimas de


violência, tanto física quanto sexual de seus parceiros ou ex-companheiros
no Brasil.

(A luz desliga e todos voltam a bater. A luz foca novamente em Vera, João
Carlos e João José e todos param de bater.)

VERA - Só em 2023, mais de 106 mil crianças foram abandonadas pelos pais
ainda no útero de suas mães.

JOÃO JOSÉ - Em 2022 foram registrados 11 milhões de mulheres que criam


sozinhas os seus filhos.

JOÃO CARLOS - Já foram registrados que o Brasil tem mais de 110 mil
certidões de nascimento sem o nome do pai.

(A luz desliga e todos voltam a bater. A luz foca no marido de D. Rosa e


todos param de bater)
MARIDO DA D. CECÍLIA - O abuso do álcool é responsável por 2,8 mb….
.A lhões de mortes por ano no mundo, sendo 100 mil delas só no Brasil.

(A luz desliga e todos os figurantes saem de cena batendo nas suas vasilhas.
A música começa a tocar e a luz liga novamente)

(Música: Eu sou a voz - preto no branco)

*Dança*

CENA 2

(A música acaba e as dançarinas vão embora, menos Carolina e sua filha. Ao


mesmo tempo que Dona Cecília (vizinha) aparece com seu filho nos
"braços".)

DONA CECÍLIA - Eu não já falei pra você não ficar roubando os outros
garoto! Se continuar assim, vão começar a te comparar com os filhos da
Carolina, e aí vou ter que te colocar no Juizado! Você quer isso?

FILHO - Não, mãe. ( triste )

DONA CECÍLIA - Então anda! ( empurra o garoto e sai de cena )

( Carolina observa tudo isso juntamente com Vera )

CAROLINA - Onde já se viu, uma mulher de 41 anos ficar implicando com


crianças de menos de 10! ( fala isso enquanto cata papel )

CAROLINA - Nossa vida na favela é assim: Temos que nos preocupar a todo
momento, já que não sabemos o que poderá acontecer nesse lugar. Nossos
filhos têm a possibilidade de virar ladrões por causa da fome, e nossas
crianças não conseguem ter muito futuro. É quase impossível sair.

(No meio do caminho, Carolina vai achando papel e ferros, e vai colocando
dentro do saco. Até que chega em Seu Manoel para trocar por dinheiro)

SEU MANOEL - Bom dia, Carolina. Veio cedo hoje. E como está bonita! Tem
certeza que não quer se casar comigo ? (Fala já entregando o dinheiro)
CAROLINA - Bom dia, Seu Manoel. E, sim, tenho absoluta certeza que não
quero me casar contigo. Obrigada e bom trabalho (Fala recebendo o
dinheiro e já indo embora)

SEU MANOEL - Obrigado.. (Semblante triste)

( desliga as luzes e os figurantes entram e suas posições. Liga as luzes e


Felipe *político* aparece com a caixa com comida )

MODESTO - COMIDAA!!

( Todos vão ir atrás da caixa desesperadas e ficam em suas posições.


Carolina, Vera, D. Cecília e Silva entram )

CAROLINA - Só 25 reais ?! Sorte que pelo menos sobrou um pouco de feijão


para o almoço.

(Carolina ia andando tristemente até observar que tinha muito favelado e


morador de rua perto do lixo )

CAROLINA - O que é aquilo ?

( os figurantes saem de perto da caixa e voltam para suas posições )

D. CECÍLIA - Um caminhão passou por aqui com um monte de comida que


ainda não estragou. Tem até carne!

SILVA - Meu Deus, isso é um milagre !!

( Silva e D. Cecília saem de cena )

( Carolina, percebendo sua oportunidade de conseguir um almoço melhor


para ela e seus filhos, se apressa com ansiedade e um pouco de felicidade
para poder pegar comida. )

CAROLINA - Dá pra aproveitar essas verduras, as frutas que os meninos


amam, o quilo de arroz e feijão!

( carolina percebe que Vera acabou se perdendo na multidão )


CAROLINA - Vera ? Vera, Vera ( fala
andando pelo palco ) VERAAA?!

VERA - Mamãeeee, olha o que me deram( chega correndo com 2 reais nas
mãos e mostra pra mãe )

CAROLINA - Pensaram que você tava pedindo esmola de novo, né ? Tá, já


consegui comida pro almoço. Só vamos passar no mercado pra comprar
sabão. Tem um monte de roupa suja lá em casa.

( Carolina, Vera e todos os figurantes saem de cena ao mesmo tempo que as


vizinhas entram no palco )

CENA 3

( Dona Rosa, Silva, Dona Cecília, Maria do Anjos e figurantes aparecem


cochichando sobre o novo acontecimento na manhã )

D. ROSA - Gente, vocês não sabem o que aconteceu!

SILVA - O que é, mulher ?

D. CECÍLIA - O que houve ?

D. ROSA - Roubaram o Doutor José ontem, quando ele veio atender uma
das filhas da Dona Maria. A coitada quase morreu de desnutrição. Se não
fosse o D. José, não sei o que seria dela. Ouvi dizer que o filho mais velho de
Carolina estava envolvido no roubo.

SILVA E D. CECÍLIA - O QUÊ?!

MARIA DOS ANJOS - Como assim, mulher ? O João José ?

D. CECÍLIA - Eu sabia que aquele pestinha não é flor que se cheire. Tinha
que ser filho da Carolina, viu. Que mulher estranha, vive escrevendo, não
conversa com ninguém e ainda por cima não tem marido!

( Carolina entra em cena )


MARIA DOS ANJOS - Pois é, eu também não gosto daquela criança. Ô,
menino encrenqueiro, já até foi pro juizado.

SILVA - É, menina, eu soube. Se ela tivesse um homem pra colocar ordem na


casa, tenho certeza que eles seriam mais disciplinados.

TODAS - Certeza absoluta!

CAROLINA - Toda semana é isso, toda manhã é isso, meu deus! Meu filho
estava no meu barracão na hora do roubo; estávamos jantando. Vocês
deveriam se preocupar mais com os seus filhos do que com os meus!

( D. Rosa, Silva, D Cecília e Maria do Anjos se entreolham, reviram os olhos e


vão embora porque seus baldes de água estão cheios )

( luz amarela em Carolina )

CAROLINA - Não vejo a hora de poder sair dessa favela. Às vezes me


pergunto se valeria mais a pena me suicidar e convidar meus filhos para
fazer isso comigo. Não posso ir e deixá-los sozinhos. Esse inferno vai ficar
pior pra eles. Afinal, estamos no quarto de despejo, e o que está jogando no
quarto de despejo queima-se ou jogasse no lixo.

( Carolina sai de cena )

CENA 4

( Entram figurantes e começam a conversar algo. O político juntamente com


seu fotógrafo entram em cena e o fotógrafo chama a atenção do povo )

POLÍTICO - Eu, como um dos candidatos para exercer o cargo de


deputado federal de São Paulo, PROMETO não me esquecer de vocês. Eu irei
mudar a situação dessa favela e vocês NUNCA MAIS serão esquecidos. É
muito triste ver os nossos atuais políticos olharem para essa situação e fazer
pouco caso; esquecerem da existência de vocês. Mas, comigo, será diferente.
Será melhor. EU VOU mudar a vida de vocês!

(O político parar de falar e os figurantes começam a cochichar alto)


( Carolina e Vera entram em cena )

*o fotógrafo vai tirando foto de tudo*

CAROLINA - O que tá acontecendo, Silva ?

SILVA - É um político que está se candidatando para ser deputado. Ouvi


falar que ele vai dar cesta básica para a gente!

( todos ficam quietos, porém continuam com as mesmas expressões)

*luz amarela em Carolina*

CAROLINA - Tinha até esquecido que estávamos em época de eleição. Eles


vêm aqui, fazem promessas, dão comida, abraçam nossas crianças,
prometem aumento no salário… Para, no final, quando forem eleitos, a única
coisa que aumentará é o nosso sofrimento.

( o barulho dos cochichos voltam )

POLÍTICO - E como prova de minha palavra, eu trouxe para todos vocês


cestas básicas!

( todos em volta comemoram e o político manda tirar foto do povo )

( Vera vai pegar a cesta e quando foi pedir pro político, ficou “ comovido”,
dando 45 reais para Vera. Enquanto isso, os figurantes vão indo embora
conforme pegam as cestas )

VERA - Toma, mãe. Ele me deu dinheiro também.

CAROLINA - Obrigada, filha. Vamos logo com esse dinheiro e a cesta. Não
preciso catar mais papel por hoje. Temos comida pra passar o dia

( Carolina, Vera e todos os figurantes sai de cena e no palco só ficou o


político e seu fotógrafo )

POLÍTICO - Se eu não for eleito depois disso, não sei mais o que fazer! ( vai
“limpando” sua roupa enquanto fala ) Gastei uma nota nessas cestas e ainda
dei 45 reais pra uma criança morta de fome. Meu dinheiro vai todo nessa
campanha ?! Tenho que aguentar visitar esse lugar fedido e imundo até
quando ?

FOTÓGRAFO - A época de eleição acaba em 3 semanas, senhor.

POLÍTICO - O QUÊ ?! Mais três vezes nesse lugar? Eca! Não sei se vou
aguentar. Vamos logo sair daqui. ( fala com nojo )

FOTÓGRAFO - Sim, senhor!

( saem de cena )

CENA 5

*desliga as luzes e os atores se posicionam, liga as luzes

( D. Cecília e o marido de D. Cecília entram em cena com o filho nos braços)

D. CECÍLIA - NÃOOOO, MEU FILHO NÃO ( expressão triste e desesperada.


Ela segura o filho, o balançando e tentando fazer de tudo para ele abrir os
olhos )

MARIDO - Meu filho, por favor acorde!

D. CECÍLIA - Isso é tudo culpa sua! Se não tivesse gastado todo nosso
dinheiro com bebida, invés de comprar comida para os nossos filhos, ele não
teria morrido de desnutrição. O NOSSO FILHO MORREU DE FOME! ( ela está
falando isso enquanto olha para o marido)

MARIDO - Nós não vamos discutir agora! A culpa não foi minha!

D. CECÍLIA - Nosso filho morreu de fomee! DE FOMEEE!

MARIDO - Vamos tirar ele daqui; fazer com que ele tenha algo digno na
vida: O seu enterro.

( eles saem de cena com seu filho nos braços e a mãe ainda chorando )

D. CECÍLIA Não, meu filho não !


( eles saem de cena e Vera, J.J, J.C e Carolina entram em cena )

CENA 6

( Carolina vai de encontro ao barracão, e seus filhos entram na cena )

J. J- Mãe, o que aconteceu ?

J. C - É, eu vi a D. Cecília chorando e brigando com o marido aqui fora. O


que houve?

CAROLINA - O filho de D. Cecília acabou morrendo de fome.

J.C - Nossa!

CAROLINA - É meu filho, infelizmente essa é a nossa realidade. Venham


almoçar..

( Carolina prepara a comida para eles, e o pai de Vera aparece )

PAI DE VERA - Carolina ? Você tá aqui ?

CAROLINA - J. Carlos, vá olhar quem é.

( J.C se levanta e vai olhar )

J.C - Ah, é o pai de Vera

CAROLINA - O quê?

( Carolina se levanta e vai se encontrar com o pai de seu filha )

PAI DE VERA - Oi, crianças! Eu vim trazer a pensão de Vera. Não consegui
colocar o dinheiro na justiça pra você pegar ontem.

VERA - Oi, pai!

PAI DE VERA - Oi, filha. Aqui tem dinheiro pra você comprar doce. Tem pra
você e seus irmãos.
J.C, J.J, VERA - Obrigado(a)!

J.C - A gente pode ir lá, mãe ?!

CAROLINA - Podem sim.

( J.J, J.C e Vera saem de cena )

PAI DE VERA - E aí , como estão as coisas por aqui ?

CAROLINA - Tudo certo ( diálogo desconfortável da parte de Carolina )

PAI DE VERA - Alguma doença, alguma coisa diferente ?

CAROLINA - Não. Vera está bem de saúde.

PAI DE VERA - Se você diz… Bem, podemos conversar sobre o seu diário ?

CAROLINA - O que tem ele?

PAI DE VERA - Eu só queria ter certeza que você não colocou meu nome
nele, sabe ? Como a gente combinou?

CAROLINA - Eu não me lembro desse combinado, eu coloquei seu nome sim!


Afinal, porque não mostrar a todos a hipocrisia de um homem ? Que tem
dinheiro para sustentar a filha mas deixa ela largada em uma favela,
passando fome.

PAI DE VERA - Carolina, não começa! A gente combinou sim sobre você não
colocar o meu nome em seus diários. Em troca disso eu pagava a pensão de
Vera.

CAROLINA - Pagar a pensão dela não é mais que sua obrigação! Eu não fiz
ela sozinha! Você só está pagando isso porque eu te coloquei na justiça, não
é por causa de combinado nenhum!

PAI DE VERA - Foi por causa do combinado sim, eu só acabei atrasando um


pouco o dinheiro, nada a mais!
CAROLINA - Que mentira, faz tempo que não ouvia um absurdo tão grande
vindo de você. Porque isso não me surpreende?

PAI DE VERA - Eu não vim aqui pra discutir, você vai tirar meu nome
daquele diário e acabou!

CAROLINA - Eu não vou tirar porcaria nenhuma o mundo precisa saber a


realidade! Eu coloquei o nome de todo mundo mas não vou colocar o seu ?
Tá achando que é quem ?

PAI DE VERA - Você vai tirar sim!

CAROLINA - EU NÃO VOU…!

( pai de Vera da um tapa em Carolina e a mesma cai no chão. O Pai de Vera


se abaixar e fala com ela de um jeito agressivo)

PAI DE VERA - Você vai tirar o meu nome na porcaria do seu diário ou irá
acontecer algo pior que isso. Pode ter certeza!

( pai de Vera sai de cena )

( Carolina volta pro barracão e pega seu diário )

CAROLINA - Eu já sofri com isso, mas não imaginei que aconteceria de


novo... Não consigo passar um dia sequer sem sofrer. Um dia!!

( carolina levanta, as dançarinas entram e a música começa a tocar )

*música: Dona de mim - IZA

( todas saem de cena )

CENA 7

*desliga as luzes, o apoio arruma o barracão e liga as luzes novamente

( Carolina entra em cena )


( Carolina continua escrevendo no seu diário até que passa um jornalista na
favela procurando depoimentos para fazer sua reportagem)

JORNALISTA - Com licença, eu sou Liam, escritor da coluna da cidade e eu


vim pra cá por que me disseram que a senhora escreve o que acontece na
favela né ? Se eu não me engano, o seu nome é Carolina ?

CAROLINA - Ah, sim meu nome é Carolina, mesmo.

LIAM - Ótimo! Eu posso levar o seu diário? Seria ótimo ter uma visão de
quem mora aqui. Se a coluna fizer sucesso, a senhora receberá uma
recompensa.

CAROLINA - Claro ( carolina pega seus outros diários ), sempre esperei por
esse momento. Dia após dia, esperando que as verdades da nossa favela
fossem reveladas.

LIAM - Muito bem, então.

CAROLINA - Aqui está (Entrega o livro para o jornalista)

LIAM -A senhora pode passar lá em frente da editora, que quando lançar eu


te dou seu dinheiro, certo ? Vou ter que ir agora, muito obrigada Carolina!

CAROLINA - Até! ( acena feliz e sai correndo pro outro lado do palco que o
jornalista vai )

( filhos entram em cena na direção contrária que Carolina saiu )

CENA 8

( Carolina foi caminhando para o seu barracão, até que..)

VERA - MAMÃEEEE! ( Vera aparece correndo com um folheto na mão e


mostra para carolina )

CAROLINA - O que foi, minha filha ? O que é isso ?

( J.J e J.C entram em cena correndo )


J.J - Mãe, mãe, é a revista. O seu diário aparece na coluna!

J.C - Abre logo!

CAROLINA - Ai, meu Deus, ai, meu Deus, ai, meu Deus! ( Ela dá pulinhos de
alegria e abre a revista, começando a ler o título da coluna )

CAROLINA - “ Diário de uma favelada, por Carolina Maria de Jesus”


( carolina comemora com seus filhos e eles fazem uma dancinha )

( nesse meio tempo, Seu Manoel aparece )

SEU MANOEL - O que tá acontecendo aqui?! ( olha pros meninos achando


graça )

J.C - A mamãe apareceu na revista em uma coluna e estamos


comemorando!

SEU MANOEL - Pera, o quê?!

VERA - É isso mesmo, Seu Manoel! Tá duvidando da minha mãe, é ?

( Carolina ri da situação e olha com orgulho e felicidade para seus filhos,


depois de muito tempo sem saber o que era sorrir )

CAROLINA - Olha aqui, Seu Manoel, é verdade! ( dá a revista para ele )

( Seu Manoel pega a revista, porém ao ler, ainda fica desconfiado )

SEU MANOEL - Ah, parabéns, Carolina, mas você já recebeu o dinheiro por
isso?

CAROLINA - Bem, ainda não, acabei de receber a notícia que a revista saiu.
Mas tenho certeza que irei receber em breve!

SEU MANOEL - Não tenho tanta certeza assim. ( entrega a revista e vai
embora )

J.J - Ele não gostou ?


CAROLINA - Pelo visto, não. Mas isso não é motivo para ficar triste. Que tal
irmos à cidade para pegar meu pagamento na sede da revista?

VERA - A gente vai andar de carro ?

CAROLINA - SIM!

VERA- Ebaaaaa!

J.C - Pera, e a escola ?

CAROLINA - Não tem problema, vocês faltam hoje. Agora, vamos, quero
mostrar pra todo mundo a revista!

( Eles saem de cena felizes da vida. )

CENA 9

( Vizinhas entram em cena )

SILVA - Isso é inacreditável. INACREDITÁVEL!!

MARIA DOS ANJOS - Eu não acredito nisso, sinceramente!

D. CECÍLIA - E não é que aquela mal amada realmente conseguiu o que


queria?

D. ROSA - Fala sério, como isso aconteceu?

SILVA - Fiquei sabendo que uma jornalista passou por aqui, querendo
informações sobre a favela. Aí, por pura coincidência, ele a encontrou
escrevendo.

MARIA DOS ANJOS - Tenho certeza que ela dormiu com ele. Aquela ali não
tem valor algum. Vive dormindo com todo mundo!

D. CECÍLIA - É, menina. O Seu Manuel vive indo no barracão dela à noite, e


vocês acham que é por quê? Ai ai, ela acha que ninguém vê, mas eu sempre
estou de olho.
D. ROSA - Sério? Eu ouvi por aí, mas nunca tive certeza de nada.

D. CECILIA - Tá achando que ela é santa, é?

TODAS - NUNCA!!

SILVA - Espera um pouco, se ela dorme com o Seu Manuel, por que não
aceita se casar com ele? O coitado vive rastejando atrás dela.

MARIA DOS ANJOS - Vocês sabem que ela conversa sozinha, né? Um dia
desses eu a ouvi falando sobre isso. Segundo ela, não irá se casar de novo
porque "já atingiu a maturidade” ( voz zombadeira )

D. CECÍLIA - Aff, que ridícula! Eu não suporto aquela mulher!

D. ROSA - Quer saber? Por que a gente tá dando atenção para aquela
ridícula? E daí que ela colocou nossos nomes naquele diário? Eu não ligo pra
isso, e vocês?

MARIA DOS ANJOS - Eu mesmo, não.

SILVA - Você tem razão. Ninguém liga pra ela! Tenho certeza que vai ser um
fracasso total, e eu não estou nem aí! ( começa a rasgar o jornal )

D. ROSA - É isso aí, Silva!

( todas começam a rir )

SILVA - Já me sinto até mais leve! ( rir )

D. CECÍLIA - Bem, já que acabamos, podemos voltar ? Meu marido chega


daqui a pouco.

MARIA DOS ANJOS - Falando em marido, querida, a relação de vocês


melhorou? E os seus outros filhos?

( começam a andar para fora do palco )

D. ROSA - É verdade, você ficou afastada esses dias.


SILVA - Nos desculpe por não ter perguntado sobre isso antes.

D. CECÍLIA - Tudo bem, eu precisava desta distração, mesmo.

( saem do palco )

Cenário: Todas as luzes apagam. Retiram todos os cenários, colocando uma


mesinha com um banco e um caderno para Carolina escrever.

CENA 10

( A luz branca liga no canto do palco, onde está a mesa da Carolina. Ela está
com um microfone e começa a escrever )

CAROLINA - A vida negra na favela é uma luta diária por dignidade, justiça
e esperança. É uma história de resistência, criatividade e solidariedade. É
uma história que merece ser contada, valorizada e inspirada. A vida negra
na favela é uma lição de coragem, esperança e fé. É uma prova de que nada
é impossível, de que tudo pode mudar e de que o futuro é nosso. A favela é
um lugar de resistência e cultura negra vibrante. É a luta diária contra as
adversidades, é a busca por justiça.

As mulheres negras na favela são artistas e educadoras. Expressam a sua


criatividade e cultura. Elas ensinam os seus valores, conhecimentos,
histórias. Lutam pelos seus direitos, espaços, sonhos, são inspiração,
transformação, revolução. Elas mostram que é possível superar os
obstáculos, resistir às opressões, mudar as realidades.

( no tempo em que Carolina vai falando, entram Duda, Maju e Sales no palco
em posição )

( Após a fala de Carolina, a luz branca desliga e Ayana vai pro centro da
arrumação e a luz novamente liga nas meninas )

AYANA - Eu sou Carolina Maria de Jesus, sou filha de uma lavanderia


analfabeta e neta de escravos. Fui descoberta por um jornalista na favela
onde morava e meus diários viraram um livro. Hoje, sou uma inspiração para
muitas mulheres, e o meu livro “ O Quarto de Despejo, diário de uma
favelada” já foi traduzido para mais de 12 países.
Maju - Eu sou Formiga, jogadora de futebol da seleção brasileira. Sou
recordista em participações em copas do mundo e jogos olímpicos e estou
em busca do meu sonho de ser treinadora da seleção brasileira.

DUDA - Eu sou Sônia Guimarães, sou física e professora universitária. Nasci


em São Paulo porém me mudei pro Rio de Janeiro onde morei em uma
favela. Me formei em física pela UFJR, fiz doutorado pela UPS e fui a
primeira mulher negra a se tornar professora titular do ITA.

SALES - Eu sou Taís Araújo, sou atriz, apresentadora e ativista brasileira.


Nasci na zona norte do Rio onde frequentei escolas públicas. Comecei minha
carreira artística aos 17 anos quando fui protagonista na novela Xica da
Silva. Foi a primeira atriz negra a protagonizar uma novela no Brasil e a
partir daí foi só história.

TODAS - Somos a resistência, e continuaremos a lutar! ( todas levantam o


braço direito em símbolo de resistência )

FIM!!

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